Barcarena poderia ser indicada a um viajante que, querendo conhecer o Brasil, tivesse tempo apenas de visitar uma cidade. Em sua trajetória, desfilaram importantes capítulos de nosso país, da colônia até os dias de hoje. Dessa forma, a narrativa dos quinze entrevistados no projeto Memórias de Barcarena encarnam a saga do povo brasileiro.
Indígenas e jesuítas ocuparam a região por séculos com suas renhidas lutas. Em meio a isso, africanos escravizados vieram forçados a trabalhar no açúcar e no café da vila antiga. A passos antes da República, Barcarena já se levantava contra a opressão e pela liberdade, no episódio da Revolta dos Cabanos. Já no fim do século XIX, ela é tocada pelas levas migratórias que mudaram a cara do país, recebendo italianos, japoneses, portugueses e espanhóis. Veja, toda essa história está depositada no solo da cidade muito antes da chegada das grandes empresas, fato que deu a ela sua fama atual. O início dos anos de 1980 reservou a Barcarena mudanças importantes, com o desenvolvimento de indústrias em seus arredores. Para trabalhar ali, a massa de novos moradores vem, à época, de todas as regiões do Brasil.
Assim é que Barcarena acumula camadas sem fim de histórias próprias do mosaico que chamamos Brasil. Na narração de seus moradores, encontramos desde os mistérios eternos da Amazônia até a evolução concreta da economia nacional, em sua expressão nortista e paraense. A Barcarena atual vai aparecer para nós, assim, como uma expressão das misturas entre o moderno e o arcaico, o industrial e o artesanal, entre o indígena, o negro e o branco. Deve saltar aos nossos olhos, da mesma maneira, a trajetória de povos guerreiros, quilombolas e indígenas.
São também barcos, antes das atuais estradas e pontes, que conectaram esse município de vastas extensões. Foi pelos rios que chegaram a colonização e os padres; pelo mar que os africanos aqui aportaram; igualmente em pequenos botes iam e vinham de Belém o lavrador Eduardo Angelim e o cônego Batista Campos, líderes cabanos; ao fim e ao cabo, é por navios que ali se escoa o alumínio, a alumina e a bauxita do interior do Pará.
Esta coleção, que traz o resultado do projeto Memórias de Barcarena desenvolvido através da parceria entre a HYDRO e o Museu da Pessoa, foi feito conforme o objetivo maior do Museu da Pessoa: instigar, registrar e divulgar histórias que raramente seriam ouvidas em nossa sociedade. São 29 anos nessa missão, onde registramos mais de 16 mil entrevistas e 70 mil imagens, compondo um dos maiores acervos de memória do Brasil. E assim continuaremos, acreditando que uma história pode mudar o jeito de enxergarmos o mundo.
Em conformidade com tais valores, tal coleção busca representar a cidade a partir da experiência de seus próprios habitantes. E, por isso, esperamos que nesta obra os narradores se reconheçam e que, além disso, você - leitor - navegue junto e não se esqueça de Barcarena.