P/1 – Bom, Raquel, primeiramente muito obrigado por essa participação no nosso projeto.
R – Nada.
P/1 – Pra começar a nossa entrevista, eu gostaria que você dissesse o seu nome completo, a data e o local do seu nascimento.
R – Olha, meu nome é Tereza Raquel Iba, e eu nasci em Mogi das Cruzes, aqui em São Paulo mesmo, interior de São Paulo.
P/1 – E o dia?
R – Dia 08 de fevereiro de 1982.
P/1 – E o nome dos seus pais?
R – Meu pai se chama João Iba, filho de italianos, e minha mãe se chama Eva Gonçalves Iba, uma mistura de portugueses com judeus.
P/1 – E você tem algum irmão, irmã?
R – Eu tenho. Tenho dois irmão aqui em São Paulo, que é Daniel Gonçalves Iba e Andréia Cristina Iba.
P/1 – E eles são mais velhos ou mais novos?
R – São mais velhos. Eu sou a caçula. E aí meu irmão é o mais velho e minha irmã é a do meio.
P/1 – Você mencionou a ascendência italiana da sua família e portuguesa também.
R – Uhum.
P/1 – Você consegue resgatar pra gente a história da sua família, a chegada no Brasil. Quando, onde eles se instalaram...?
R – Então, o meu avô, , a família era uma família bem tradicional de italianos e meu avô, ele gostou...meu bisavô, desculpa, gostou de uma moça que não era , do mesmo tipo de elite, né, da classe elitizada deles na Itália. Então ele se apaixonou por ela e acabou vindo fugido em um navio em 1919. Desceu aqui no porto, em São Paulo, que seria o Porto de Santos e se instalou em Cristina, Minas Gerais. Aí lá ele formou toda a nossa família. O meu avô, o meu pai, a gente teve essa descendência. Então ele já veio fugido da Itália pra cá.
P/1 – Junto com essa moça.
R – Junto com essa moça que é a minha bisavó.
P/1 – E o seu pai já nasceu em Cristina ou nasceu em São Paulo?
R – Meu pai nasceu em Cristina, Minas Gerais. Em 1938.
P/1 – E você sabe em que ano ele chegou em São Paulo?
R – O meu pai chegou em São Paulo em 1970.
P/1 – E o que ele... por qual motivo ele veio pra São Paulo. O que ele veio fazer?
R – O meu pai veio pra São Paulo mais pra trabalhar mesmo, né. Meu pai, ele, meu avô cresceu na via férrea de Minas gerais. Trabalhava muito com essa parte de transporte de alimentos, né, pelo trem, tudo. E ele sempre teve uma vida nessa linha, meu avô. E meu pai morou muito anos em Cristina. Cristina é uma cidade pequena, né, não sei se vocês tem a oportunidade de conhecer, ela é muito pequenininha, então meu pai não via muita possibilidade de crescer porque lá era assim, ou o pessoal trabalhava na linha, ou o pessoal trabalhava em plantio de algumas coisas. Não tinha muita expectativa, então meu pai veio pra São Paulo pra trabalhar como torneiro mecânico, né? Aí fez os cursos dele e veio pra trabalhar nessa linha. Mas com o decorrer dos anos meu pai prestou concurso e acabou se aposentando na linha aqui de São Paulo, trabalhando pelo metrô de São Paulo.
P/1 – Então ele sempre trabalhou em linhas férreas e no metrô depois?
R – Isso. Hoje já está aposentado.
P/1 – E onde que ele se instalou quando ele chegou em São Paulo?
R – Então, meu pai se instalou em Mogi das Cruzes mesmo, onde a gente mora até hoje. Ele se instalou ali próximo à Vila Lavínia. É um bairro muito popular, próximo ao cemitério de Mogi das Cruzes, né? Aí se instalou ali, onde nós moramos ainda.
P/1 – Ele já chegou a descrever pra vocês como é que era Mogi das Cruzes aquela época?
R – Sim. Meu pai, ele... como ele tem muitos anos que ele tá em Mogi, ele viu várias empresas crescerem. Quando ele chegou ali era: muitas chácaras, não tinha quase residência, prédios comerciais, nada. Eram granjas que vendiam ovos, né? Galinhas, várias coisas, e tinha muita plantação de caqui. Eu me lembro quando eu era pequena, a gente ia num sítio todos os finais de semana visitar uns conhecidos dele. A gente apanhava muito caqui no pé e eu achava aquilo incrível, né? Como que tinha tanto caqui e como que eles criavam tantas galinhas. E hoje a gente vê muitas mudanças. Meu pai comenta, né, porque hoje a região que era granjas é apartamento. Quase você não vê uma região que tenha uma mata, que tenha um bosque, é tudo construções, prédios, casas.
P/1 – E você sabe identificar em que período que ocorreu essa mudança do perfil da paisagem ali?
R – Olha, meu pai diz que essa evolução começou em 1990. Ele fala que de 1990 pra cá aconteceram muitos trâmites, tanto da moeda, do Brasil, a economia, então começou a ter uma procura muito pela casa própria. Então as pessoas que tinham uma condição melhor fizeram o quê; investiram os seus terrenos em empreiteiras. Construíram casas geminadas, prédios e cederam, né? Então de 1990 pra cá Mogi das Cruzes teve um crescimento muito grande.
P/1 – E você vê que a zona leste acompanhou esse crescimento ou os bairros do entorno continuaram com o perfil mais de granjas e agricultura?
R – É que , Mogi era bem afastada de São Paulo. Ele já não se classifica como zona leste porque ele é outro município, né? Zona leste a gente classifica até Guaianases, se não me engano. Mogi, ele tá cinco distritos pra frente de Guaianases. As cidades vizinhas, algumas acompanharam a evolução, outras são mais tradicionais. Por exemplo, Guararema é uma cidade vizinha à Mogi Das Cruzes. Guararema ela evoluiu em paisagismo e a rede hoteleira. Ela é uma cidade turística, mas se você for; os grandes casarões foram conservados. Só foram adaptados pra receber a parte de turismo. Agora Suzano, que também é uma bem próxima, ela evoluiu muito, tanto no ramo de indústria, como na parte comercial.
P/1 – Quando você diz evoluiu você quer dizer que se urbanizou bastante...
R – Bastante.
P/1 – Recebeu muitos equipamentos públicos...
R – É, a gente fala , quando eu falo que ela evoluiu, Suzano, ela recebeu uma universidade, escolas técnicas, hospitais, várias indústrias, né? Ela é hoje um polo comercial muito bom, tanto pra parte de comércio como a parte residencial. Ela tem muitas boas residências, e as instalações são muito boas, bem acessível a transporte gratuito. Pra pessoa se locomover elas têm muito fácil acesso de transporte, e é perto de tudo, é bem localizado, com supermercados, hospitais, acesso a tudo.
P/1 – Então você nasceu numa época que, segundo seu pai, ainda não tinha ocorrido essa transformação, né? Você nasceu em 82 e ele falou que foi em 90. Você tem alguma lembrança de infância de como era o entorno ali da sua casa, o seu bairro, quando você era bem criança?
R – Então, onde eu moro, eu tenho muitas lembranças do bairro. Olhando hoje, tipo, vinte e poucos anos depois, eu não vejo mudança. É engraçado porque onde eu morava é um bairro classe média, e lá, esse lugar, ele tem várias casas construídas que são casas idênticas. Então, são várias casas iguais. , ao redor do bairro que eu vi, ele evoluiu, por questão de segurança. As casas continuam praticamente quase todas do mesmo formato. Foram reformadas... Surgiram muito prédios e hoje lá é um residencial, né? Eles fizeram mais uma parte de segurança, equiparam, então hoje é um condomínio. Então ele não é mais tão aberto. Mas próximo eu vi sim, a parte de...a gente tem uma via perimetral que passa próximo à Vila Lavínia, ela passa com acesso à Mogi-Bertioga. Então eu vi... ali foi a maior evolução que eu vi, porque quando eu era pequena eu lembro que eu estudei no SESI próximo à Valtra, a empresa de tratores do Brasil, né? E eu estudava no SESI e eu lembro que a gente passava por uma ponte, extremamente mal feita, pra ir pra escola, e tinha um córrego horroroso. E com o decorrer dos tempos eu comecei a ver a evolução, eles construíram uma via perimetral, eles despoluíram todo o rio, canalizaram, e fez uma via de acesso à Mogi-Bertioga. Então, eu vi que, quando eles fizeram a via perimetral o comércio expandiu, as casas evoluíram, então, teve uma mudança muito grande nessa via perimetral.
P/1 – E com essa inclusão de prédios ali teve um aumento populacional também?
R – Teve, teve um aumento populacional, mas não foi desordenado, porque a Vila Lavínia, como é um bairro mais organizado, ele não foi desordenado. É um bairro classe média. Então, o bairro ficou mais populoso e menos acessível, porque eles construíram prédios mas não foi um prédio de fácil acesso, é um pessoal que busca um nível mais de segurança. E é um bairro que ele não tem tanto acesso ao centro, é um bairro extremamente residencial. Então a pessoa pra morar ali ela tem que ter mais... depender mais de carro e mais de condução. Ela não dá um fácil acesso. Mas ele ficou mais populoso e mais bem organizado.
P/1 – E em relação ao comércio? Você disse que aumentou bastante. Aumentou no sentido de diversificou, aumentou o número de lojas, em qual sentido aumentou?
R – Não, ali eu vejo que aumentou... a diversificação. Porque é uma via que vai de encontro à praia. Então eles colocaram vários comércios atacadistas, eles colocaram muitas lojas de roupa, e isso pra nós, moradores, foi muito legal, porque a gente tinha pouco acesso a comércios variados. Por exemplo, a gente tinha a opção de uma rede só de mercado. Isso era o preço tabelado, absurdo. Então como eles abriram uma via perimetral, a gente tem vários atacadistas próximo, então a gente tem um melhor acesso a preço e qualidade de mercadoria, né?
P/1 – E antes de ter esse aumento do comercial, onde é que vocês buscavam comprar as coisas, onde é que eram os grandes centro comerciais pra fugir um pouquinho desses preços tabelados?
R – Então, quando eu era mais nova, eu lembro... Centro comercial, quando eu era bem mais pequena, eu lembro : Mogi das Cruzes tem muita chácara, então a gente atravessava a linha do trem, tem umas passarelas ali perto de Brás Cubas... A gente comprava realmente dos verdureiros, nas próprias chácaras, né? Comprava alface, tomate...ovos a gente comprava em granja, e supermercado a gente fazia, eu lembro, que meu pai fazia compra uma vez por mês. Aí era sempre nos supermercados mais bem centralizados. Um antigo que tem em Mogi é o Shibata. A gente ia muito na rede Shibata, que é um dos mais antigos que tem em Mogi. Meu pai costumava fazer compras ali. Mas verduras, essas coisas, não tinha um hortifrúti ainda em Mogi então a gente comprava em chácaras mesmo. Isso eu me lembro.
P/1 – E esse aumento populacional também gera algum impacto no trânsito, no fluxo pra região. Dificultou, facilitou?
R – Olha, isso eu não tenho dúvida. Isso eu não tenho dúvida, porque o trânsito sempre foi muito tranquilo eu lembro, e hoje, com essa via perimetral, é meio complicado. Por exemplo, feriado prolongado a gente tem uma demanda muito grande de carros. A gente tem problemas em caixas de supermercado, né, porque é muitas pessoas e o fluxo, por ter aumentado... os mercados ainda são pequenos, né, não são tão habituados a receber um fluxo de pessoas porque é só em alta temporada, então a gente percebe. O trânsito também, porque com a evolução da cidade trouxe muitos polos industriais, por exemplo, fábricas de pães, de cinto, de roupas; atraiu muitas pessoas de fora. Então o que acontece, tem pessoas que moram em São José dos Campos e trabalham em Mogi. Então o fluxo de manhã de carro, veículo, é muito grande. Pra você sair na Dutra ou chegar em Mogi é um trânsito praticamente parado, parece o da capital aqui. (risos)
P/1 – Mogi das Cruzes é um bairro que é atendido, se não me engano, pela última estação da linha do trem, né, Estudantes, Mogi das Cruzes...
R – Isso, Estudantes.
P/1 – A ligação com a cidade de São Paulo é feita ainda especialmente, por essa linha de trem, ou tem outras vias de acesso que são mais utilizadas atualmente?
R – Não, aí acho que depende muito do local que a pessoa quer chegar e o tempo que ela quer gastar. Porque... Mogi, ela é bem localizada. A gente tem o acesso à Ayrton Senna, né, tem um acesso de Mogi até a Ayrton Senna, e a gente tem também a Mogi-Dutra. Então o que acontece; se a pessoa quiser vir de carro, ela pode vir pela Dutra ou pela Ayrton Senna. Têm pessoas que preferem fazer o acesso via Radial, então a pessoa vai vir até Guaianases, aí de Guaianases ela pega, ela vai cortar por dentro, ela vem até Guaianases, de Guaianases ela pega a Radial Leste, que não seria um bom caminho, né, porque o trânsito é muito parado. Mas o trem é uma ótima opção. Eu pego o trem há mais de nove anos, que eu trabalho aqui em São Paulo... O trem ainda tem que ter algumas melhorias, né, porque a demanda é muito grande e eles não suprem a necessidade. Então o trem, em horários de pico, ele é muito cheio. Só que ele é o meio mais rápido ainda. Eu pegando ele em Mogi... de manhã, eu pego ele tipo, seis e meia da manhã, eu costumo estar chegando na estação do Brás por volta de sete e quarenta, então eu gasto uma hora mesmo sendo no horário de pico. Então ele é muito rápido, que você vem até Guaianases, de Guaianases você pega uma baldeação, que você desce na Luz ou em qualquer via de acesso ao metrô, né?
P/1 – Mas antes de entrar nessa sua relação com o Brás, vamos falar mais um pouquinho da sua infância, tá? Então a casa que você morava lá em Mogi, você lembra como é que era, tem como descrever pra gente como era essa casa?
R – Tenho, a minha casa ela era uma casa bem ampla. Eu entrava, eu lembro que a gente tinha uma pequena área antes de entrar, ai tinha a porta da sala, aí tinha uma sala bem grande, ampla. A sala tinha um corredor que passava pra cozinha, aí tinham dois quartos. A casa em si, ela dá uma impressão que era pequena, que eram quatro cômodos, mas era uma casa bem planejada. Foi meu pai que construiu. Era uma casa própria, e era uma casa bem planejada, por quê? O meu pai fez as articulações, por exemplo, a porta da sala ela dava uma abertura de um corredor que atravessava a cozinha e saia no quintal dos fundos. Então era uma casa muito bem arejada, que o ar circulava totalmente dentro da casa. No fundo da minha casa, era uma casa bem antiga, isso eu lembro, a gente tinha uma área coberta com telha – aquelas telhas bem antigas, aquelas telhas laranjas, amarelinhas – e construída com tijolinho, aquele tijolinho raspado, meu pai fez a área, e a gente tinha um poço. Um poço artesanal mesmo, de tirar água, que você jogava um balde e puxava como se fosse uma manivela manual, né, e tirava água do poço. Aí no quintal ele tinha vários pés-de-fruta. Ele tinha pés de pitanga, ele tinha pés de mexerica, abacate, ameixa... era uma casa grande, o quintal.
P/1 – E essa casa é da sua família até hoje?
R – Não, hoje meu pai já vendeu e a gente comprou uma outra maior. (risos) Acabamos saindo de lá.
P/1 – E bom, você é de uma família de ascendência italiana. Quando seu pai chegou em Mogi das Cruzes ele encontrou outras pessoas da mesma ascendência...? Quem morava em Mogi das Cruzes quando ele chegou?
R – Então, o meu pai encontrou... Quando ele veio pra Mogi ele veio sozinho. Mas ele foi recebido por uma família de italianos. A família do senhor Vicente, é comerciante de Mogi. Ele trabalha no ramo de comércio de lojas, né, eles têm joalheria. E ele recebeu meu pai. E meu pai percebeu que várias pessoas... A esposa dele era uma italiana, cozinhava muito bem, dona de uma pensão. Quando ela chegou no Brasil, ela montou um pensionato pra jovens rapazes que precisavam de trabalho. Então meu pai foi e começou a morar na casa deles, nessa pensão, até ele se estabelecer. E esse senhor ajudou muito meu pai, né? Meu pai trabalhou uma época com ele, ele direcionou meu pais pra alguns cursos, até que meu pai se estabelecesse. Tanto é que quando o meu pai comprou esse terreno da nossa casa, o meu pai comprou desse senhor. Comprou e construiu a nossa casa e tudo. Ele tem... Se não me engano tem uns quatro anos que o Seu Vicente faleceu, mas foi uma pessoa que a gente teve um contato muito grande. A minha vida inteira eu convivi com ele.
P/1 – E na sua infância quem eram seus amigos? Eram os vizinhos, eram os irmãos... Do que vocês brincavam ali?
R – Então, meus amigos de infância, por incrível que pareça, ainda tenho os mesmos. A gente foi criado , desde pequeno... É engraçado porque o meu pai se estabeleceu nesse lugar... Ele era uma pessoa muito sozinha, né? Ele veio pra São Paulo e passado uns anos a minha avó veio morar com ele aqui em São Paulo, porque ela ainda morava com o meu avô em Minas, aí ela veio morar com meu pai aqui em São Paulo, então ficou só ele e a minha avó. Então ele começou a trabalhar na mineração, uma firma super antiga, e fez amizade com um casal. Esse casal de namorados, era um senhor e uma senhora, casaram-se na mesma época. E nós, os filhos, crescemos na mesma época, e até hoje convivemos. Então eu tenho vários amigos. Eu tenho... Tenho a Raquel, que é uma amiga de infância também, que é a minha xará até; eu tenho a família Gouveia, ali em Mogi, que são pessoas... As meninas são professoras de educação física, uma delas é até ginasta. E , são os mesmos. Eu estudei a minha vida inteira, desde o prézinho, a primeira série, o colegial com as mesmas pessoas. E hoje, como a gente vê, a gente tem muito acesso à rede social, eu não perdi o contato. Meus amigos eram realmente vizinhos da rua. A gente brincava muito de amarelinha, carrinho de rolimã, esconde-esconde... Brincadeiras bem tradicionais, né? A gente fazia aquelas festas juninas de rua, que eram as coisas mais tradicionais, antigas, né? Meus amigos de infância foram vizinhos da rua mesmo. A gente conhecia muito o pessoal do bairro, do distrito , mais próximo.
P/1 – E você mencionou que estudava no SESI, né? Como é que era na escola, você já tinha uma ideia do que você gostava de estudar, o que você gostaria de ser quando crescesse?
R – Olha, eu vou te falar que nessa época da escola era uma coisa muito interessante. Eu gostava muito da escola. O SESI foi uma escola que me deu uma base muito boa. É uma escola muito bem estruturada, mas eu nunca pensei... Na época do SESI... O SESI te oferece várias estruturas, né, pra você partir pra parte desportiva, que ele te dá cursos gratuitos, por exemplo de basquete, teatro. Na época do SESI eu fiz teatro, eu fiz handebol, eu fiz várias coisas. Eu fiz natação, fiz ginastica olímpica, então eu fiz varias coisas, mas , dentre elas, eu não tinha um perfil: “Ah, eu quero fazer isso!”. Porque era um acesso muito fácil, então a gente ficava meio perdido, né? Mas, no SESI eu sempre tive, acho, que uma veia pra área que eu estou hoje, que é a área da saúde. No SESI a gente tinha a horta cultural. Os alunos iam lá, plantavam as verduras, depois a gente mesmo colhia, levava pra merendeira e ela preparava no SESI. Então isso foi uma coisa que eu sempre achei que eu fui mais chegada à alimentação mesmo. Sempre gostei muito da atividade de oficina, que era a parte de desenvolver algumas coisas na oficina da escola e nessa parte de alimentação.
P/1 – E foi lá que você teve as primeiras noções de valores nutricionais? Foi lá no SESI?
R – Não, as minhas primeiras noções de valores nutricionais foram dentro de casa, porque meus pais, como são bem tradicionais com alimentação, o meu pai sempre foi muito... Usar comida natural. Por exemplo, em casa eu nunca vi o meu pai comprar refrigerante, açúcar refinado, alguns tipos de alimentos, porque, por exemplo, a minha mãe ela tem todo o conhecimento de uma cultura judaica, então no judaísmo você já tem uma alimentação mais elaborada. O meu pai vem de uma cultura italiana, que come muita massa, muitas coisas, só que os dois juntos eles agregaram valores, tipo: “Isso é bom? Mas isso é saudável?”. Então a gente já teve essas noções dentro de casa. Meu pai instruiu muito a gente: “Ah, não é que eu não queria que você não coma. Você pode comer, mas você tem que comer moderadamente porque isso não vai te fazer bem”. Ele sempre privou a gente nesse aspecto: instruir, não proibir.
P/1 – Na infância ainda, você mencionou que vocês compravam verdura com o pessoal que produzia ali perto, comprava ovo na granja. Mas tem algum comércio específico que você lembra, que era o que você mais gostava ou o que você mais frequentava?
R – Lembro.
P/1 – Qual que era?
R – Eu lembro da mercearia do Seu José. Era uma mercearia bem no alto do bairro, era muito engraçado gente, eu olho assim hoje, parece coisa de filme. Era aquela mercearia bem antiga, com pouco luz sabe, escura, você entrava não tinha muita luminosidade. Ali tinha tipo uma prateleira... Não, era um balcão, era tipo um armário velho, escuro, num tom marrom, onde ele colocava os docinhos: doce-de-leite, pé-de-moleque, essas coisas. E eu lembro que era uma mercearia que ele tinha tudo. Ele vendia farinha, mas era em saco, ele tinha um saco aberto e ele pegava aquela concha e colocava num saquinho, tipo de papel, e vendia pra você a porção de farinha que você precisava. Tinha uma balança de precisão ali, ele pesava o tanto de farinha que você precisava. Leite de saquinho, ele pegava pra você na hora e o pão era tipo caseiro, né, ele mesmo que fazia. Era o comércio que a gente mais recorria, que era pequenininho, era pertinho, qualquer coisa que precisava corria lá na mercearia.
P/1 – E aí você estava fazendo a escola no SESI, gostava de participar da horta, né? E como é que foi a decisão na hora de prestar o vestibular, o que você estava pensando naquela época?
R – Então, na época de vestibular ainda foi meio confuso. Porque eu fiz o quê, eu terminei os meus estudos, só que quando eu terminei os meus estudos eu já tive a oportunidade de conhecer alguma coisa no ramo de produtos naturais. Eu estava no segundo colegial quando eu tive um contato maior. A gente teve uma feira de saúde na escola e uma professora pediu pra eu falar a respeito do fígado, da nossa maior glândula do organismo, e eu fiz uma feira de saúde voltada ao fígado. Então eu tive que estudar toda a parte de anatomia do sistema nervoso, tudo, falar qual era o funcionamento do fígado. E quando eu andei na feira de saúde eu vi várias... Que eu achei interessante. Eu vi um setor que o pessoal falava de ervas medicinais, alimentos integrais, e eu achei muito interessante. Então eu comecei a olhar. Eu fiz amizade com uma pessoa que estava trabalhando, que no outro ano ia ser amiga de turma minha. E o noivo dela tinha uma loja de produtos naturais. E aí quando eu fiz contato com ela na feira, eu achei muito interessante, e fiz amizade e aí desenvolvi um vinculo com ela. Aí no outro ano a gente estudou um ano inteiro junto e eu comecei a frequentar muito a loja do marido dela. Hoje ela é casada, e comecei a frequentar a loja. Então me bateu uma curiosidade, eu ia na loja e perguntava muito né: “Ai, pra que que serve isso, pra que que serve aquilo.” E o pai dele foi uma pessoa que me incentivou, um comerciante de Mogi, o Seu Adão Leopoldino. Ele falou: “Olha Raquel, eu acho assim, se você tem interesse, faça um vestibular, estude na área de saúde que você vai se dar bem, você leva jeito.” Então eu pensei muito no que o Seu Adão falou e aí fui pra Curitiba e comecei estudar nessa área de saúde.
P/1 – Então você chegou a morar em Curitiba pra fazer o vestibular?
R – Fiquei um tempo em Curitiba pra fazer o curso lá de Naturopatia Aplicada.
P/1 – Em que faculdade foi? Como é que foi essa época em Curitiba?
R – Curitiba foi uma coisa meio de impulso. Umas amigas falaram: “Oh, a gente tá indo pra Curitiba. Será que você não quer ir com a gente, Raquel, passar uma temporada lá?” Aí eu falei: “Nossa, mas assim, do nada. Onde a gente vai se instalar?” Falou: “Ah, a gente se vira. A gente vai pra lá.” A gente foi um sábado na igreja, no sábado à noite, eu levei uma mochila, eu lembro, e as meninas levaram mala, tudo, e a gente foi pra Curitiba. Aí chegou lá, o dono de um laboratório de produtos naturais que eu já conhecia aqui de São Paulo falou: “Oh, você podem ficar na minha casa.” E aí a gente foi, que é o Rogério Prates, do Laboratório Sunflower aqui de São Paulo. E a gente foi, ficou na casa dele, deu uma boa estadia, e eu procurei algumas pessoas que o Seu Adão tinha me indicado, né, em Almirante Tamandaré, Curitiba, o professor Antônio Tomé, fundador do Hospital Oásis Paranaense, que é o primeiro hospital de naturismo do Brasil, e ele me indicou pro INAP, que é o Instituto Nacional de Terapias Alternativas, aí eu fui pro INAP. Aí, dentro do INAP eu comecei a fazer o curso. Aí fiz o curso durante um ano e meio em Curitiba, depois eu fiz um convênio com eles porque não tinha mais condições de ficar em Curitiba, porque eu larguei o meu emprego aqui em São Paulo, né? Só que meu patrão falou: “Oh, quando você tiver aberta pra vir, pode vir.” Aí eu voltei pra São Paulo e trouxe o curso. Aí meu patrão, então comerciante aqui de São Paulo, da zona cerealista, patrocinou o curso. Ele fez o quê? Ele fez um convênio pra que o curso que eu estava fazendo em Curitiba eu continuasse em São Paulo, mas como eu continuasse, eu abrisse a oportunidade de os clientes me acompanharem no curso. Aí a gente começou a fazer o curso em São Paulo. Aí ele fez , ele patrocinou no seguinte: os professores vinham dar aula em São Paulo, ele pagava passagem aérea, a hospedagem dos professores, em São Paulo pra que o INAP não tivesse um problema maior.
P/1 – Desculpa, então você já trabalhava antes de ir pra Curitiba?
R – Já.
P/1 – Em que local que era? Como é que foi que você começou a trabalhar nesse local?
R – Aqui em São Paulo... Não era em São Paulo ainda. Eu trabalhava em Mogi. Eu sempre fui mais focada na área da saúde e eu trabalhei muito tempo na Escola Isaac Newton, que é uma escola adventista, né? Eu comecei a trabalhar na Isaac Newton, nessa escola, e conheci um instrumentador cirúrgico. As crianças dele ficavam comigo no berçário da escola e um dia ele falou pra mim: “Olha, Raquel, se um dia você quiser sair daqui...” Porque eu trabalhava nesse berçário. Ele falou: “Oh, eu tenho um escritório de instrumentação cirúrgica aqui em Brás Cubas. Se você quiser ir, é uma oportunidade que eu te dou.” Aí eu fui trabalhar como instrumentador, eu trabalhava nesse escritório separando instrumentos cirúrgicos. O pessoal vai fazer algum tipo de cirurgia, ele me passava uma lista por fax de todos os instrumentos que eu precisava esterilizar, higienizar e deixar separado. Então eu trabalhava nesse escritório de instrumentação.
P/1 – Então seu primeiro emprego foi no berçário, com educação infantil?
R – Isso, com educação infantil.
P/1 – E depois você passou pro laboratório?
R – Pra um laboratório... Um escritório de instrumentação cirúrgica onde eu separava materiais pro pessoal.
P/1 – Uma questão mais de curiosidade: você se lembra o que você fez com o seu primeiro salario?
R – Olha, o que que eu fiz com o meu primeiro salario... Olha, isso daí é engraçado. As pessoas falam: “Será que você lembra?” Não, eu me lembro sim. O meu primeiro salario eu fui pra um evento da minha igreja em Serra Negra. Eu fui pra um EMUSA. E eu peguei, eu recebi o meu primeiro salario, deu as minhas partes de ofertas todas e paguei pra ir pro EMUSA, que era um Encontro de Música Sacra em Serra Negra. Faz tempo, viu? (risos)
P/1 – Então você foi trabalhar no laboratório...
R – De instrumentação.
P/1 – E lá como é que foi? Quanto tempo você ficou nesse laboratório?
R – Lá eu fiquei quase um ano no laboratório.
P/1 – E de que maneira ele ajudou você a se encaminhar ainda mais pra essa área da saúde?
R – Então, ele... Dentro do laboratório eu não tinha muito acesso, eu tinha muito acesso... Eu fiquei mais curiosa, porque eu separava muitos instrumentos e ficava pensando: “Nossa, mas que tipo... Como que a pessoa usa esse aparelho?” Eu perguntava muito pros médicos que iam lá. Eles falavam: “Não, esse daqui a gente vai fazer um corte assim, é um corte longitudinal, é um corte distal.” E eu ficava : “Nossa, que interessante.” Então esse, ele me direcionou mais , pra parte científica, porque eu sempre tinha visto coisas mais leigas, né? Erva medicinal, essas coisas. Ele me mostrou mais uma parte científica, que é uma parte de pesquisa, que é através das intervenções cirúrgicas você também pode salvar vidas, que não é só alimentação natural, que tem alguns outros recursos legais. Então ele me direcionou no aspecto de eu ser uma pessoa mais... Estudar mais, me focar mais, ler mais. E ele me direcionou nesse aspecto. Mas no decorrer desse tempo eu já conheci outras pessoas, né, que eram aqui de São Paulo. Aí fiz amizade com uma jovem aqui de São Paulo que tinha o interesse de abrir uma loja de produtos naturais. Ela falou: “Oh, eu tenho o interesse de abrir uma loja de produtos naturais, mas não tenho condições de administrar a loja porque eu faço faculdade de Educação Física, e eu acho que você seria uma pessoa bacana pra ficar cuidando da minha loja em São Paulo”. Aí eu aceitei. Aí foi a primeira proposta pra eu vir pra São Paulo.
P/1 – Onde era essa loja?
R – Essa loja ela ainda existe, ela é no Tatuapé, na rua Serra de Bragança. Isso foi em março de 2002, quando eu aceitei vir pra São Paulo. Nove de março de 2002.
P/1 – E foi nesse período que você, pela primeira vez, a fazer esse caminho entre São Paulo e Mogi das Cruzes? Antes ficava mais restrito à Mogi das Cruzes.
R – Foi. Foi.
P/1 – E como é que foi essa...
R – Olha, nas primeiras semanas o impacto foi meio grande, não pra mim como aspecto físico, mas foi pro meu pai. Porque eu era bem novinha e meu pai começou a ficar com medo. Ele falou: “Ah, você não vai dar conta. Sua estrutura física é muito fraca. Você não vai aguentar pegar trem todo dia, é muito cedo.” Porque eu abria a loja oito da manhã e fechava às seis da tarde. Então tinha que sair de Mogi umas cinco e meia da manhã, seis horas. E meu pai tinha muito medo, né? Ele falava: “Nossa, mas você vai pra São Paulo sozinha.” Eu falei: “Não, eu vou.” Aí eu comecei a vir e comecei a abrir a loja e tudo. E eu gostei. Quando eu comecei a ver eu falei: “Gente, eu quero ficar por aqui. Não quero voltar mais não.” Porque eu comecei... eu saí daquele mundinho que eu morava. E era uma...tipo uma gôndola. Mogi é uma cidade ótima, mas eu fiquei reclusa ali. Eu trabalhei, eu estudei, eu conhecia todo mundo que eu trabalhava, conhecia o dono da padaria. Então quando eu vim pra São Paulo eu vi o meu horizonte expandido. Eu conheci pessoas novas, diferentes, de vários tipos de nacionalidade e religiões, crenças, então aquilo me fascinou. E o comércio, claro, né?
P/1 – E nesse período você dividia o tempo de trabalho e escola ainda ou já tinha terminado?
R – Não, nessa época eu já tinha terminado o meu cursinho. Aí eu ainda estava fazendo Naturopatia Aplicada, porque na realidade o curso de Naturopatia eu fiz quatro anos. Quatro anos, terminei em 2008 agora, né? Então eu trabalhava o dia inteiro e comecei a fazer o curso, as adaptações, sábado e domingo. Eu fazia sábado, tipo, das oito da noite até às dez, e domingo das oito da manhã às dez da tarde. Todos os finais de semana durante um ano inteiro eu fazia o curso.
P/1 – E como é que você encara essa sua primeira experiência numa loja de produtos naturais? O que acrescentou pra sua vida? Como é que foi?
R – Olha, eu acho que apesar de eu estar falando, conversando com vocês, eu sempre fui uma pessoa muito introvertida pra alguns tipos de conversa. O comércio ele me abriu muitos horizontes, ele fez com que eu me tornasse uma pessoa mais segura, porque eu ficava na loja sozinha. E eu tinha vários itens na loja, e geralmente o cliente, ele não chegava lá com uma orientação, ele chegava pra ser orientado. Então ele chegava e falava pra mim: “Pra que serve esse chá?” Então eu fui forçada a estudar algumas coisas dentro da loja. Quando a gente foi pra abrir a loja eu já peguei vários livros e estudei cada erva que tinha. Então, quando a pessoa chegava lá e falava, por exemplo: “Ah, eu tenho um problema de diabete.” Eu já sabia me orientar melhor. Então o comércio; o que essa loja me impulsionou na minha vida foi eu ser uma pessoa mais segura e ter um foco, tipo: “É isso que eu quero? Então é isso que eu vou fazer.” E ser segura, tipo: “Isso vai dar certo. Isso não vai dar certo.” Tipo, não me preocupar tanto com o que as pessoas pensam, mas sempre me preocupar em oferecer o melhor pras pessoas, o melhor de mim, o que eu posso estar oferecendo. Então essa loja, ela me estimulou a isso, a ser uma pessoa mais segura de mim e sempre saber ouvir mais o cliente e opinar menos. Fez eu ter mais tato, né? Então foi uma loja que fez eu crescer, profissionalmente, nesse aspecto.
P/1 – E nesse bairro do Tatuapé, um bairro da zona leste, que tinha uma loja de produtos naturais. Qual era o perfil do público que ia nessa loja? Como as pessoas enxergavam essa alimentação, utilização de remédios naturais, ervas, nessa época que você começou a trabalhar?
R – Então, ali no Tatuapé é bairro Gomes Cardim, subindo ali é bem na Serra de Bragança, é bem no meio do Tatuapé. É um bairro extremamente classe média-alta. Um bairro mais elitizado. É muito difícil o acesso das pessoas à alimentação natural. Por que? Geralmente essas pessoas elas quase não comem em casa. Os que comem em casa eles têm empregado, e pra você agregar uma alimentação natural você tem que não convencer, mas você tem que esclarecer muito elas, porque elas são muito desconfiadas. Elas vão comprar um pão, elas querem saber se ali é de farinha branca, se é importado, como é que é, quem manuseou, de onde vem. Eu vi que a gente teve uma barreira muito grande no começo, mas o que a gente fez? A gente criou um vínculo com os clientes. Eu comentando com você um pouco antes, a gente sempre teve um vínculo maior, por exemplo: lá tem muitos residenciais, então a gente tinha pão na loja e tinham várias pessoas que moravam em apartamentos, mas moravam sozinhas e não tinha condições de ir na loja, então elas me ligavam e falavam: “Raquel, que dia que vai chegar o pão?” Falava: “Vai chegar tal dia.” Então a gente começou a fazer um serviço mais domiciliar. Chegava o pão, o que eu fazia? Eu ligava na portaria do prédio e falava: “Olha, chegou o pão, eu posso ir aí levar?” “Pode.” Então eu pegava os pães daqueles clientes e ia na portaria do prédio e entregava pro porteiro. Então cada vez que algum deles chegava do serviço o porteiro falava: “Olha, já trouxe o seu pão.” Então a gente foi criando um vínculo com as pessoas ao ponto de elas criarem uma amizade e desenvolverem um vínculo de comprarem produtos na loja. Por que? Elas estabeleceram confiança e a gente conseguiu ter um acesso melhor.
P/1 – Essa ideia de atendimento diferenciado partiu de você, partiu da dona da loja...? Como é que foi?
R – Então, eu acho que foi uma ação em conjunto minha com ela, porque ela estudava, fazia faculdade de manhã, então geralmente ela chegava mais no período da tarde, após as quatro horas, pra fechar a loja. Eu ficava sozinha. Então se eu fosse fazer alguma entrega eu tinha que fechar a loja. Então ela falou: “Chegou o pão, você vai lá, entrega na portaria rapidinho e volta aqui pra loja. Você pede pra alguém aqui do salão – que tinha um salão de cabelereiro do lado – pede pra alguém do salão dar uma olhadinha pra você, você vai lá, entrega o pão e volta pra loja. Então foi uma ação em conjunto, que a gente viu que tinha essa necessidade.
P/1 – Então você trabalhava nessa loja, no Tatuapé, e foi aí que partiu o convite pra ir pra Curitiba?
R – Não, eu já tinha voltado de Curitiba.
P/1 – Já tinha voltado de Curitiba?
R – Já.
P/1 – Quando você foi pra Curitiba o emprego que você estava era o laboratório?
R – Eu estava no laboratório. Aí eu fui pra Curitiba, fiquei e depois voltei. Aí quando eu voltei de Curitiba eu já tinha uma base de produtos naturais. Aí essa minha amiga que já me conhecia da igreja...
P/1 – Foi aí que você conheceu essa moça...
R – Ela falou: “Olha, você faz o curso, acha interessante, eu quero abrir a loja, mas eu não conheço tanto, eu faço Educação Física, eu acho que seria interessante a gente agregar isso, né? O seu curso com a loja.” Aí eu comecei a fazer o trabalho com ela na empresa.
P/1 – E como é que foi a saída dessa loja, por qual motivo?
R – Então, a saída dessa loja foi uma coisa... foi um pontapé inicial pra onde eu estou até hoje. Eu trabalhava já na loja, e eu conversava muito com os clientes, era uma pessoa muito dada. E eu fiz amizade com vários clientes. Aí teve um autor de livros, aqui de São Paulo, de cardápios, doutor Augusto Fajardo, ele estava lançando um livro de cardápios naturais. E ele precisava de uma demonstradora do livro. Ele ia fazer várias feiras em São Paulo e ele estava montando um estande. Precisava de alguém que ficasse no estande divulgando o livro de produtos naturais dele. Eu não o conhecia nem nada, e uma cliente pegou e falou pra ele: “Olha, eu conheço uma moça que ela pode fazer esse trabalho pra você.” Aí ele pegou e falou : “Ah, mas como?” Aí ela falou : “Ela trabalha, ela tem uma loja ali no Tatuapé. Ela fica lá, né, tudo.” Aí ela foi lá e conversou comigo na loja. E ela me falou. Falou: “Oh, Raquel, vai vir um senhor aqui conversar com você.” Só que ela não falou quem era nem nada. E ele foi lá na loja e começou a perguntar: “Pra que que serve isso? Pra que que serve aquilo?” Eu fiquei pensando: “Meu Deus do céu, ele não vai levar nada. Esse homem tá me testando.” Conversou bastante, né, aí ele falou pra mim: “Olha, eu gostaria que você fizesse um trabalho pra mim de divulgação de um livro.” Eu falei: “Olha, mas é meio difícil porque eu trabalho aqui na loja e tudo. Não tenho como, né?” Aí ele falou : “Não, eu queria que você fizesse uma divulgação.” Eu falei: “Ah, vamos ver, porque eu estou pra tirar uns dias e aí eu converso e a gente vê o que que vai dar.” Aí o que que aconteceu? Ela... peguei e conversei com ela, né? Falei pra ela a respeito desse trabalho. No começo ela não foi muito acessível. Não queria me liberar, mas depois ela acabou me liberando. Aí eu fiquei uns dias. Aí o que que aconteceu? Na primeira... no primeiro dia do trabalho ele falou: “Olha, a primeira loja que você vai pegar é o Cerealista Helena.” Eu falei: “O Cerealista Helena?” Ele falou: “É.” Isso foi 2003. Aí ele pegou e falou: “Oh, você vai pegar o Cerealista Helena.” “Ah, pra mim tudo bem.” Aí ele montou um estande e deu todo o material dele de livros. Então eu fiquei no estande... eu não abordava os clientes. Eu estava com o livro e os clientes vinham até o estande e perguntavam sobre o material... então eu falava sobre o livro. Só que eu fiquei fascinada com a loja. Quando eu cheguei a loja era muito grande. Ela tinha duas divisórias... Eu olhei toda a loja antes de ir pro estande. E fiquei lá. Então os clientes chegavam e falavam: “Moça, você tem suco de uva?” Todo mundo me perguntava qualquer coisa menos a respeito do livro. Eu pegava e falava: “Tenho.” Aí eu saia do estande e ia lá e mostrava pra pessoa. Aí mostrava pra pessoa alguma coisa e voltava pro meu lugar. E fiquei lá um dia inteiro. Quando foi no final do dia, veio um senhor e falou comigo: “O que que você faz?” Eu falei: “Eu trabalho com uma loja de produtos naturais, não sei o que, tomo conta de uma loja, tudo.” Ele falou: “Nossa, eu preciso de uma pessoa do seu perfil.” Eu falei: “Do meu perfil?” Ele falou: “É”. Eu falei: “Pra que?” Ele falou : “Preciso de uma pessoa do seu perfil pra orientar os meus clientes. Eu sou dono de uma loja de produtos naturais e eu acho que você tem esse perfil, de conversar, abordar o cliente. Eu achei legal.” Eu falei: “Moço, mas eu estou aqui nessa loja só pra fazer a divulgação de um livro. Onde é a sua loja?” Ele falou: “Eu sou o dono do Cerealista Helena.” Então foi o Valdir, do Cerealista Helena. Aí surgiu a primeira oportunidade pra eu estar indo pra zona cerealista.
TROCA DE FITA
P/1 – Então você estava contando pra gente como é que começou essa sua aventura na zona cerealista.
R – Isso.
P/1 – Então o dono da Cerealista Helena abordou você e disse que você tinha o perfil que ele procurava. E aí?
R – Aí eu fiquei mais confusa, porque eu ainda tinha o meu emprego, estava fazendo a divulgação de um livro e tinha recebido uma proposta, né? Então eu peguei, cheguei e falei pra minha patroa: “Olha, eu gosto muito da loja, mas surgiu uma oportunidade nova, diferente. Eu acho que eu vou tentar”. Ela falou: “Olha, Raquel, eu vou ficar muito chateada de estar perdendo você...” Porque era só nós duas, né? “Mas, se for uma oportunidade pra você crescer, ser uma pessoa melhor, eu quero que você vá.” Aí eu peguei e fui. Aceitei a proposta dele, mas totalmente perdida, né? Eu falei: “Gente, é uma loja muito grande. Eu não sei nem o que eu vou fazer.” Aí comecei a trabalhar com ele. Aí ele falou pra mim: “Olha, eu quero que você oriente os clientes. Eu não quero você no balcão, eu não quero você pesando a mercadoria, o seu diferencial vai ser atender os clientes. O que você sabe fazer.” Quando ele falou pra mim, eu falei: “Meu, como assim o que eu sei fazer? Sei falar de comida, produto natural, conheço muito de loja.” Então ele falou: “É isso que você vai fazer. O cliente vai chegar aqui e vai perguntar pra você: ‘pra que que serve isso?’ Eu quero que você oriente ele. Você é vegetariana?” Eu falei: “Sou.” “Então eu quero que você ensine o meu cliente a fazer um arroz integral, uma comida natural, que você esclareça ele. Você tá entendendo? A única coisa que você vai trazer aqui no balcão pra mim é o que você não conseguir resolver.” Aí eu falei: “Tá bom.” E comecei a fazer o trabalho que eu estou fazendo, né? Aí comecei a instruir os clientes, tudo, e continuei fazendo o meu curso, que ainda não tinha terminado, né? Foi muito tempo atrás, né? Aí continuei fazendo curso e me especializando. Aí quando eu comecei a entrar dentro da loja, ali no Cerealista Helena, que foi a primeira empresa que eu trabalhei na zona cerealista, eu comecei a ver o meu horizonte se ampliando de novo. Eu comecei a fazer um trabalho de divulgação pro cliente sobre produto natural. Só que eu comecei a me interessar muito por compra. Por que? Muitos clientes me abordavam e falavam: “Ah, já que você tá aqui, sempre instruindo, por que você não põe tal produto pra vender na loja? Por que você não introduz tal mercadoria? Olha, isso é interessante. Eu vim da Europa agora e isso é bacana. E aí começou, né, ter esses enlaces, né, dessas coisas, dessas pessoas trazerem várias coisas. E eu trabalhando no Cerealista Helena. Aí quando foi em 2007, eu estava na loja, tranquila, e eu recebi uma proposta pra ir pra Europa. Uma pessoa falou pra mim: “Olha, eu estou indo pra Europa e gostaria muito que você fosse comigo pra você conhecer algumas coisas diferentes na linha de produtos naturais, e quem sabe você fazer até algum curso, alguma coisa de diferenciado. E eu peguei e fiquei pensando: “Meu, ele não vai deixar.” Porque eu era uma pessoa muito responsável com a loja, não faltava, era uma pessoa que dava muita instrução e era uma pessoa que os clientes me abordavam muito. Eu falei: “Meu, ele não vai deixar.” Eu já estava dois anos, tinha negociado as férias, não tinha tirado nenhuma férias devido à procura muito grande de produtos naturais, então eu fiquei quieta. Eu falei: “Quer saber...” Isso foi no final de 2006. Eu falei: “Eu vou.” Mas eu não falei nada pro meu patrão que eu ia viajar, nem nada. Peguei, tirei toda a minha documentação, arrumei toda a minha passagem, fiz tudo. Aí quando foi dia 28 de fevereiro de 2006 eu cheguei e falei pra ele... eu fiquei meia tensa passeando pela loja e ele me chamou. Ele falou: “Raquel, tá tudo bem com você?” Eu falei: “Tá.” “Eu acho que você tá meio tensa. Você tá andando numa direção só.” Eu falei: “Sabe o que é, Valdir? Eu estou sim, eu estou um pouco tensa.” Ele falou: “O que acontece?” “Então, a partir do dia três eu não venho mais pra loja.” (risos) Foi muito engraçado. Aí ele falou: “Como é que é?” Eu falei: “É, Valdir, a partir do dia três de março eu estou indo pra Europa.” Ele falou: “Como assim? Como assim?” Eu falei: “Olha, Valdir, eu gosto muito da empresa, mas eu não posso perder essa oportunidade. Se você quiser me dar uns dias, uns meses, eu vou aceitar, agora se você não quiser considere que eu estou me demitindo.” Aí ele pegou e ficou: “Vou pensar.” Eu falei: “Tá bom.” E ficou. Isso foi dia 28. Aí chegou dia primeiro, dia dois, ai quando foi dia três ele me chamou no escritório. Ele falou: “Olha, Raquel, eu vou te dar uma oportunidade. Eu gosto muito do seu trabalho. Você é uma pessoa que eu confio muito, que eu confiei a minha loja, e eu admiro muito essa sua capacidade de ousar. Eu sou uma pessoa que sou dono de loja, sou empresário e eu nunca tive coragem de me ausentar aqui, deixar o meu comércio e me aventurar. Não que eu tenha medo. Eu tenho condições, mas , eu não tenho aquela coragem de ousar, sabe, do novo, a mudança. Eu acho isso legal. Então vai, aproveite bem, eu não vou descontar, eu vou te dar os dias que você precisar.” Aí eu viajei. Eu fui pra Europa, passei primeiro pela França, fiquei alguns dias lá, não vi muitas coisas da minha área. Assim, não achei muitas coisas interessantes...visitei algumas partes de culinária, restaurantes, muitos museus, coisas que não eram agregadas na minha área profissional, mas aí a gente foi pra Suécia. Quando eu fui pra Suécia eu realmente vi algumas coisas que eu gostei. Quando a gente foi pra lá eu tive a oportunidade de conhecer a Faculdade de Uppsala, na Suécia. É uma faculdade muito especifica na área de alimentação natural com tratamentos inéditos aqui no Brasil. Então eu fui, acompanhei alguns cursos que têm lá, que seria Auto-hemoterapia, que aqui no Brasil acho que tem uns dois anos que chegou, que é um curso com tratamento sanguíneo, né? E conheci o Laboratório Weleda, que é só produtos naturais, né? Aqui no Brasil ele é muito grande e eu não sabia que ele tinha uma abrangência tão grande na Europa. Conheci, pesquisei e fiz algumas coisas paralelas. Aproveitei o tempo que eu estava lá e conheci várias coisas legais. Aí depois voltei, pra Paris ainda, fiquei um tempinho. Passeei, agreguei mais conhecimento na minha área, fiz algumas pesquisas também e voltei pro Cerealista Helena. Aí voltei e continuei lá.
P/1 – Essa sua viagem pra Europa. Esse contato... esse convite partiu de uma pessoa que trabalhava com você, que trabalhava nessa mesma área?
R – Não. O convite pra ir pra Europa veio de um amigo aqui de São Paulo, o Leandro Vasconcelos, aqui de São Paulo. O Leandro trabalhou na área de tripulação de voo, trabalhou na área de voo, e quando ele me chamou pra ir pra Europa ele já trabalhava com voo internacional, né? Ele sempre foi da parte de comissário de voo e a gente sempre foi muito amigo, né? E aí o Leandro estava indo pra Europa, ele já tinha feito voos na América Latina, mas nunca tinha ido pra Europa. Como a gente sempre foi muito próximo, ele falou: “Eu vou pra Europa, mas eu queria que você fosse comigo, pra eu conhecer a Europa e você fosse junto.” Então ele que me chamou.
P/1 – E no caso, os cursos que você fez, o aprendizado que você teve, eram pagos por alguém ou você mesma teve que investir do seu dinheiro?
R – Não, eu fiz..., tanto da viagem, como cursos, pesquisas, tudo foi investimento próprio.
P/1 – Então foi uma aventura pessoal sua...
R – Foi. Minha.
P/1 – Com um investimento pessoal seu?
R – Foi, eu comecei a trabalhar muito jovem e meu pai sempre ensinou valores, né? Então eu fui uma pessoa desde pequena que... abrir mão. Desde que eu comecei a trabalhar eu sempre tive poupança, então tudo o que eu tive de emprego, tudo, eu nunca gastei. Eu sempre guardei. Então quando ele me chamou pra ir pra Europa eu não pensei. Eu não pensei duas vezes porque a gente fez cálculos. A gente sentou e falou: “Olha, vai gastar tanto.” Eu não ia gastar passagem porque eu sou a beneficiária dele, ainda, na empresa, né, que ele trabalha. Então eu já não ia gastar tanto com passagem internacional, ia pagar mais taxas de embarque e hospedagem. Então a gente fez a conta, eu vi quanto eu tinha na poupança, quanto eu podia levar e quanto que o meu pai poderia me ajudar. E a gente foi. Fui, paguei, voltei e não fiquei endividada. (risos)
P/1 – E o roteiro: França, Suécia... ele foi estabelecido por... foi uma vontade turística de conhecer esses lugares ou você pesquisou pra visitar lugares que você sabia que poderia estudar, se especializar?
R – Então, na questão de turismo foi estabelecido pelo Leandro, que ele tinha muita vontade de conhecer Paris. E Suécia não estava no nosso cronograma. Foi muito engraçado, eu já tinha visto varias pesquisas da Faculdade de Uppsala na Suécia e de uma faculdade que é em Granada, na Espanha, então eu já tinha muito interesse de ir pra lá, tanto pra Suécia como pra Espanha conhecer a faculdade. Só que a gente foi pra Paris e ele tinha uma tia que já tinha morado na Suécia, né? E a gente estava em Paris, tudo, encontramos essa tia dele em Paris, e ela pegou... e a gente lá, todo programado em Paris, já sabia o que eu ia me direcionar, e ela pegou e falou: “Porque vocês não vão conhecer a Suécia? É um lugar lindo. Vocês vão adorar.” E , a gente muito jovem, né, meio , inexperientes com algumas coisa: “Ah, vamos!” Pegamos e falamos que íamos. De repente quando eu vi a gente estava no aeroporto pegando outro voo, que a gente não falava o idioma de maneira nenhuma, que na Suécia não se fala francês nem inglês, é um idioma típico, é um país... é um reinado, né? Eles têm uma moeda própria, né, não é Euro, não é Dólar. E quando a gente viu a gente estava desembarcando em Estocolmo, totalmente perdido, não sabia nem pra que lado ir. (risos) Foi muito engraçado. E a gente foi muito bem recebido por um casal que... O Leandro, o pai dele é um pastor aqui em São Paulo, então o pai dele já morou em vários lugares do Brasil, inclusive Vitória. E em Vitória o pai dele fez amizade com um casal, um engenheiro e uma professora suecos, e esse casal mora na Suécia. E o que aconteceu? Quando a gente estava lá na Suécia, a gente pegou o telefone e ligou pra eles e falamos: “Olha, nós estamos aqui na estação de Sundsvall. Estamos indo pra aí. A gente vai chegar ai por volta de meia-noite. Vocês podem receber a gente na casa de vocês?” E esse casal tinha visto o Leandro , com cinco anos. O Lê já estava agora com uns 28 anos, e eles foram muito breves em buscar a gente. E buscaram a gente na estação e levaram a gente pra dentro da casa deles, receberam a gente super bem. E a gente ficou passando uma temporada lá na casa deles. Foi muito bom.
P/1 – E esses cursos que você fez na Europa mudaram definitivamente os seus conceitos sobre a alimentação natural, contribuíram muito, confirmaram teorias que você já tinha...? Como é que foi?
R – Então, as coisas que eu vi, aprendi, na Europa, elas me deram um suporte maior de credibilidade, porque é uma coisa você estudar aqui, fazer várias coisas, outra coisa é você trazer procedimentos diferenciados. O que... As coisas que eu aprendi na Europa, elas me trouxeram uma base: “É isso que eu quero realmente pra minha vida.” O que eu trouxe de lá, foi o que eu tinha comentado anteriormente com você, lá existe um projeto chamado “Saúde primária”. É um procedimento muito diferente do Brasil que a gente não vê. Lá as pessoas médicas, a área médica e a área de saúde ela acompanha o paciente em casa, então ela não espera o paciente ter um problema mais grave e ir até o hospital, eles fazem agentes de saúde comunitários. Eles vão até a casa, oferecem o tratamento de uma forma preventiva, pra que a pessoa não venha a cair num problema maior, né, então isso foi uma coisa que eu trouxe de lá. E a alimentação alergênica. Nossa, eu vi muitas coisas lá que eu falei: “Gente, olha, isso é muito diferente.” Tudo o que eu vejo hoje aqui no Brasil são coisas que eu já tinha visto há muito tempo lá, por exemplo, dieta sem glúten, dieta do Mediterrâneo, óleos vegetais, que hoje é uma febre no Brasil, é uma coisa que pra eles lá é uso habitual. É uma coisa muito acessível. E os parâmetros deles são muito diferentes dos nossos. Nossa, a gente tem produtos bons, de qualidade, mas não são tão acessíveis em valores. Lá são produtos de ótima qualidade com um valor muito menor, bem mais acessível à população.
P/1 – Essa temporada na Europa durou quanto tempo?
R – Não durou muito tempo não. Eu acho que ficou... Eu acho que ficou entre... eu fui em... Espera aí, eu fui em março e voltei no final de abril. Quase uns dois meses.
P/1 – E aí de volta à zona cerealista?
R – De volta à zona cerealista. E foi muito engraçado. Hoje eu tenho um patrão que na época não era o meu patrão, ele era uma pessoa que frequentava muito a empresa que eu trabalhava. E ele fez uma brincadeira com o meu patrão que eu não esqueço. Logo que eu voltei da Europa ele brincou com o meu patrão. Ele falou: “Ô Valdir, você já ouviu falar que jogador que joga na Europa o passe fica mais caro? Você não vai conseguir segurar ela aqui muito tempo não.” E o meu patrão deu risada. Eu nunca imaginei que esse um dia iria vir a ser o meu patrão hoje. E foi engraçado, eu voltei pra zona cerealista, continuei trabalhando, a gente fez muitas mudanças ali na loja, muitas, muitas, , não foram poucas, foram muitas. Quando eu voltei, eu voltei naquele espirito que o pessoal fala que é o primeiro amor, né, que você tá , enlouquecido, encantado. Eu queria mudar a loja toda. E a gente foi agregando. A primeira mudança que a gente fez na loja eu não me esqueço, a gente parou de trabalhar com famílias. Aqui no Brasil o pessoal trabalha com famílias, por exemplo. Família que a gente fala é igual supermercado. Você coloca lá família Hellmans. Você coloca todos os produtos da Hellmans. Família Arisco, aí você coloca produtos da Arisco. A gente trabalhava assimna zona cerealista. Tipo, aqui tem um produto só da Olvebra, aqui eu tenho um produto só do Chicão Comercial, aqui eu tenho um produto só da Casa de Saron. Então quando eu voltei eu falei: “Não, não é isso. Isso não é legal.” Eu comecei a agregar algumas coisas que eu vi fora. Localização. Por exemplo, se você é uma pessoa diabética e entra numa loja, estabelecimento, o que você quer encontrar? Produtos que satisfazem a sua necessidade comercial. Então eu comecei a comentar com o Valdir. Eu falei: “Olha, eu acho seria interessante a gente dividir a loja por setores.” “Como ? A loja tá aqui”, ele falou, “a loja tem quase 28 anos, como que a gente vai mudar?” Eu falei: “Não, a gente pode fazer algumas mudanças. Vai ser interessante.” “Raquel, os clientes vão se perder dentro da loja.” Eu falei: “Não, vai ficar mais fácil.” Então a primeira mudança que a gente fez, a gente criou um corredor só de soja e derivados, eu não me esqueço. Foi o primeiro corredor que a gente criou. Aí a pessoa tinha desde extrato de soja até o sabonete de soja. Tudo derivado de soja encontrava ali. Depois a gente criou um setor de produtos diet. Só diet, desde sobremesa... de cobertura de sorvete até um adoçante mais simples, era só o corredor de diet. Aí a gente foi criando esses setores dentro da loja, e foi uma coisa que foi se estabelecendo.
P/1 – Essas mudanças, inovação que você trouxe da Europa... O processo durou quanto tempo pra se concluir? Ou não concluiu até hoje? Conta...
R – Não, no Helena eu levei um ano e meio pra mudar toda a loja. Um ano e meio. Aí durante um ano e meio a gente fez várias mudanças dentro da loja e a mudança não foi só em prateleiras, a nossa mudança foi no quesito funcionário. A gente trocou muito o quadro de funcionários, e treinamento. Por quê? A facilidade que às vezes eu tenho pode ser uma dificuldade pra você, pra qualquer outro cliente, e às vezes a sua facilidade pode ser a minha dificuldade, porque você não pode cobrar da pessoa o conhecimento que você tem. Então o que a gente começou a fazer? Eu comecei a conversar com os funcionários, dar uma instrução pros nossos próprios funcionários: “Olha, produto sem glúten é isso; produto sem açúcar é isso; produto light é isso. Diferenciar. Quando vocês tiverem alguma duvida, aí vocês podem me chamar.” Porque até então eu já comecei a ter várias funções dentro da loja, que não ficava mais tão focada no cliente, eu já estava fazendo compra, estava respondendo e-mail, tirando dúvida, escrevendo artigo, elaborando o site da loja. Então ficou mais difícil, então eu comecei a fazer discípulos – como ele diz, né – ensinar outras pessoas a ter conhecimento agregado, aí comecei a fazer parcerias. Fiz parcerias com a Dona Sueli, uma culinarista aqui da USP, formada. Ela começou a lecionar um curso de culinária vegetariana todo primeiro domingo do mês em uma localização aqui de São Paulo, então o que eu fazia: o cliente chegava, comprava: “Ah, eu queria aprender mais.” “Olha, tá o convitinho, a senhora vai lá, procura a Dona Sueli, fala que o Cerealista Helena indicou a senhora e ela vai te instruir.” E essa senhora ajudou muito a gente. Estabeleceu um curso de culinária focado à nossa loja.
P/1 – Então quando você voltou pra Cerealista Helena você nem voltou pra sua função anterior, você já voltou com varias funções...?
R – Já...
P/1 – Como é que foi essa negociação com o seu patrão? Ele já sabia que você ia assumir outras funções? Ele mesmo ofereceu? Como é que foi?
R – Não, porque quando eu cheguei, na realidade, eu cheguei pra ele e foi assim, eu cheguei e ele não queria que eu saísse da loja. O maior medo que ele teve foi que eu pedisse demissão, que não ia demorar muito pra eu fazer isso. Eu voltei no final de 2007. Então aí, quando eu cheguei eu comecei a ver a loja com outros olhos, eu comecei a ficar muito insatisfeita com as coisas, e até então eu conversava muito com os clientes, eu não opinava em organização de prateleira. Só que eu voltei muito mais pés no chão, então eu comecei a falar com ele. O Valdir ele sempre foi muito... O Valdir ele é muito fechado. As pessoas tem impressão que ele é uma pessoa brava, mas ele não é. Ele é português, então ele é uma pessoa muito desconfiada, mas se você acha um canal de acesso ali com ele é muito mais fácil. Então eu comecei a comentar as coisas com ele, falar: “Oh, Valdir, eu vi isso aqui, eu achei interessante, mas olha, eu fotografei algumas coisas que eu queria que você visse.” Que eu trouxe muito material fotografado da Europa. De lojas, gôndolas, organização de prateleira. Então eu tirei foto. Então eu falei: “Olha, Valdir, eu queria te mostrar algumas coisas que eu achei interessante. Eu acho que se a gente fizesse isso eu acho que ia ficar um diferencial na loja. Eu acho que isso facilitaria mais tanto pros funcionários se localizarem como pros clientes.” E ele começou a ser mais maleável com algumas mudanças, então ele pegava e conversava entre os sócios, que são os irmãos dele: o Hilton, também, o Vagner e o seu Wilson, né, que é o pai, fundador da loja. E eles começaram a ver que realmente algumas coisas faziam sentido, que não é só o que eu estava falando, que muitos clientes chegavam no balcão e falavam pra ele: “Olha, eu estou procurando um adoçante, você pode me ajudar? Eu não achei.” Porque às vezes algum funcionário falava : “Olha, o adoçante fica no segundo corredor à esquerda.” Só que o cliente ele não queria isso, ele queria que você fosse até a prateleira e mostrasse pra ele. Então ele começou a falar: “É, realmente tem que mudar algumas coisas, porque os clientes... eu tenho mercadoria, mas tem cliente que sai daqui e vai comprar em outra loja porque não consegue se localizar dentro da minha própria loja.” Então a gente começou a fazer a mudança. Quando ele... Quando eu comecei a fazer algumas mudanças de prateleira, como eu falei, eu comecei a ter uma parte agregada de compra, porque como eu organizava prateleira sempre às vezes eu estava mexendo, visualizando a prateleira, algum cliente chegava e falava: “Você é de compra?” Eu falava: “Não, mas pode falar, senhor.” “Então, quando eu viajei, eu achei um adoçante muito legal. Era legal você comprar esse produto aqui que eu acho que ia sair bem.” Então aí eu comecei a ver, então eu comecei a fazer o que? Por conta própria eu comecei a fazer uma lista com o nome dos produtos, né, e passar pro Valdir. Falava: “Olha, eu acho que seria interessante você comprar isso. Os clientes têm pedido muito.” Aí ele começou a ficar na dele, depois eu falou pra mim: “Raquel, eu acho que eu vou começar a ensinar a você mexer no balcão. Você a mexer com nota, mexer com cadastro de mercadoria.” Aí ele me deu a oportunidade de entrar dentro do balcão, aí foi onde eu comecei a mexer com outras funções agregadas mais com a parte comercial mesmo.
P/1 – E essa introdução de sugestões aos clientes, né, isso implicou na... No contato de novos fornecedores, de importadores, como é que foi?
R – Tudo! Nossa! Muito! A gente teve que mudar muito a loja. Muito, muito. Porque , quando eu entrei pra parte de compras eu já tinha trabalhado em outras lojas, eu já tinha morado em outro estado, eu já conhecia outras pessoas do comércio, então a gente abriu praticamente uma nova cartela de fornecedores. Quando ele me deu uma autonomia pra compra, eu comecei a fazer as coisas não na minha maneira, mas de uma maneira mais... Não é mais clara, que eu posso dizer, que ele sempre agiu de boa fé, eu comecei a fazer as coisas com um padrão mais de exigência, por exemplo: ele sempre comprou muito azeite. Eu fiz uma especialização em azeite, então o que que eu quis fazer? Quando a gente começou a fazer compra, eu comecei a descartar alguns tipos de azeite: “Não, esse daqui eu não gostaria.” “Por que?” “Porque ele tem esse defeito.” Eu comecei a testar azeite, pegar azeites específicos, que eu conhecia que eram mais renomados. “Ah, o leite de soja. Eu não gostaria de trabalhar mais com essa empresa.” “Por quê?” “Porque eles usam muito açúcar, esse produto é mais refinado.” Então eu comecei a ser mais seletiva com os meus fornecedores. Comecei a estabelecer uma parceria, tipo: eu vou fornecer pro meu cliente o que eu consumo em casa, porque além de ser uma pessoa profissional, eu sou uma vegetariana, então eu não vou vender pro meu cliente um produto que eu não tenho capacidade de comer. Então eu comecei a falar com ele: “Olha, Valdir, eu gostaria de trabalhar com isso.” “Porque?” “Porque eu comprei pra minha casa e eu achei legal. Eu acho que os clientes vão ter uma boa aceitação.” Ele falou: “Ah, tudo bem.” Então a gente começou a mudar mesmo, muitas coisas. Muita. Por exemplo, eu lembro que a gente chegou uma época que a gente tinha setenta tipos de granola. Setenta. Tipo, dentro de granola com chocolate tinha cinco marcas. Granola de morango tinha oito empresas. E a gente foi reduzindo, reduzindo, a chegar um ponto de a gente ter dez marcas. Você entendeu? Porque a gente foi selecionando, tipo : “Ah, eu quero um produto mais integral. Quero comer uns açúcar, quero comer uns crisps de arroz, eu quero atender à demanda que o pessoal tá pedindo. Não quero ter várias marcas e um estoque parado, eu quero ter produto que gira e que o cliente leve.”
P/1 – Você chegou a fazer dessa vivencia atrás do balcão com notas, você chegou a fazer algum curso específico ou foi na vivência, foi na experiência?
R – Não, o meu melhor professor, o pessoal fala – o César que me desculpe, meu patrão, mas ele vai ficar uma fera – o meu professor dentro de sistema foi o Valdir, do Cerealista Helena. Olha, o Valdir, ele me deu uma parte muito boa, uma base muito boa de cadastro de mercadoria. Eu nunca tinha mexido num sistema, né? Ele usava... Ele usa um sistema, que agora eu não lembro o nome da empresa... É muito bacana, porque , você cadastra o seu cliente ali, tanto pessoa física como jurídica, então você cadastrou aquele cliente. A partir do momento que você cadastrou ele, ele passou qualquer compra no caixa, o caixa já joga lá. Então se alguém vai fazer uma compra posterior pra ele, o que acontece? Pode ser que não é ele, é o empregado, aí o empregado chega lá e fala : “Ah, eu vim comprar um azeite, mas eu não lembro.” Qualquer pessoa que tá no balcão, ela pega o histórico de compra, então ela não vai errar. A gente vai errar pra bem menos. Então o Valdir... O sistema do Cerealista Helena sempre foi um sistema ótimo, extremamente funcional. No momento em que o cliente está fazendo o pedido com você, você vê se ele tem alguma pendência, se ele está com algum débito, se ele tem preferências comerciais, de transportadora, você vê tudo. Todo o aspecto pra você errar pra bem menos, então, ele me fez ver que a loja não é feita por um nutricionista, não é feita por um gerente, mas é feita por uma equipe, porque ali se trabalha uma equipe. Eu senti isso. Trabalhei ali no Helena quase três anos e meio com ele, e eu sinto que a gente trabalhou sempre num espirito de equipe. Era desde a pessoa que dava a senha até a moça que passava a mercadoria no caixa. Então não tinha: “Ah, você é superior porque você estudou, porque você morou fora. Ai, eu sou dono.” Não, não existe isso, ele sempre trabalhou numa equipe. Era conhecimento agregado e uma parte funcional: “Esta loja funciona.” Isso foi muito legal.
P/1 – Quando você começou a trabalhar na Cerealista Helena, o Valdir, ele te ofereceu um cargo que era bem especifico, que era o contato unicamente com o cliente.
R – Exatamente.
P/1 – Era comum ter um cargo desses ou foi uma criação dele, era comum ter em outras lojas da zona cerealista uma função dessa? Como é que é?
R – Então, isso... É comum, eu vejo na Europa. É muito bacana. Você chega e você tem uma pessoa que tem uma pessoa que te atende especificamente. Aqui em São Paulo eu nunca tinha visto. Esse trabalho eu já tinha visto numa loja em Curitiba, na Pop House, em Curitiba, ele tem esse serviço especializado, e na rede Mundo Verde, né, que você chegando dentro da Mundo Verde eles têm uma pessoa que fala sobre... Dermatologista, e tem uma pessoa pra cada setor da loja, que te atende, mas isso foi uma criação dele, foi uma coisa... Foi uma inovação. Eu lembro que as primeiras conversas ele falou pra mim: “Olha, eu acho muito legal isso, porque apesar de eu ser dono de uma loja de produtos naturais eu não sou um consumidor, então eu não sou uma pessoa tão indicada pra dar instrução pro meu cliente. Às vezes alguém chega aqui e fala: ‘Valdir, você já tomou esse leite de soja?’ Eu falo: ‘Ah, eu não tomo soja. Não gosto disso.’ Então é uma coisa meio complicada.” Então ele falou: “Então eu acho que você vindo pra loja, a gente vai ter um vínculo melhor com o cliente. Eu quero uma proximidade do meu cliente melhor com a minha empresa.” Então foi uma coisa que ele criou. Não era comum.
P/1 – Foi uma lacuna que ele observou e que ele escolheu você...
R – Ele tem uns olhos muito comerciais... Ele tem os olhos muito comerciais. Eu falo que o Valdir, ele tem ideias assim que você fala: “Gente, como que eu não pensei nisso?”
P/1 – E essa prática foi adotada pelas outras lojas ali na zona cerealista depois disso?
R – Então, eu continuo aqui na zona cerealista e não tem nenhum outro terapeuta da região. O que aconteceu? Foi conhecimento agregado. Hoje tem uma pessoa ali na zona cerealista, um amigo que fez um curso comigo, o Tiago, Tiago Wendland, ele atende ali numa loja. O Tiago ele fez um... Ele faz um trabalho bem parecido do que eu faço, só que o Tiago ele tem especializações diferentes, por exemplo, ele é Sommelier, ele é degustador profissional de vinho. Só que o Tiago ele agregou várias coisas porque ele também tem uma alimentação mais natural. A gente se conhece há muito tempo, fora da zona cerealista a gente sempre teve um vínculo amigável, e o Tiago ele fez um curso junto comigo aqui em São Paulo, que é esse mesmo que eu fazia em Curitiba, o Tiago também fez um ano e meio o curso aqui em São Paulo. Depois ele fez um técnico de Nutrição e Dietética, e ele gosta, então ele é uma pessoa também gabaritada, que ele faz o que? Ele instrui o cliente. Nutrição esportiva a pessoa tira duvida com ele, ele esclarece. Então na zona cerealista nós somos só dois pra demanda de lojas, só que como as pessoas conhecem a gente há muito tempo, muitos clientes vão no meu serviço e falam: “Eu vim aqui porque o Hilton do Cerealista Helena falou pra eu falar com você.” Então as pessoas, elas me acompanham. Geralmente eu saio de uma loja, eu estou em outra, mas eu conheço pessoas em toda a região de São Paulo. Eu atendo clientes de Araraquara, Jaú, Jundiaí, Empório Santa Luzia, que é mais próximo. Tem clientes que vem e falam: “Ah, eu fui no Empório Santa Luzia, o Esaú pediu pra vim falar com você.” E vem conversar comigo: “Ah, eu fui lá no restaurante vegetariano lá em Suzano do Zaqueu e ele falou pra eu vim conversar com você aqui na zona cerealista.” Então forma, é tipo uma família. Indicação, o boca a boca faz muito profissional.
P/1 – E na sua segunda passagem pela Cerealista Helena você menciona aquele monte de transformações que você impôs na loja, né, na distribuição das prateleiras. Esse é um modelo que também passou a ser adotado por outras lojas ou ficou restrita a aquele seu trabalho na Cerealista Helena?
R – Então, esse modelo ele ficou bem restrito no Cerealista Helena, porque nós sempre fomos a maior loja, né, era uma loja que predominava na região, era a loja... Uma das mais antigas e a mais bem conceituada, porque ela tinha muita variedade. Ela não era muito grande, mas ela tinha muita variedade de mercadoria. Na época que eu ainda trabalhava pro Valdir, em 2008, a gente tinha cinco mil e quinhentos itens cadastrados. Hoje eu nem sei mais quantos itens ele tem, né, porque faz quase uns quatro anos que eu sai da loja dele. Só que o que acontece? A loja era grande, então ficou restrito à loja, porque as outras empresas achavam interessante, mas não disponibilizava de um espaço e condição financeira pra fazer essas mudanças, então ficou mais padronizado. Aí foi indo, passou algum tempo, quando foi em setembro de 2008 eu decidi sair do Cerealista Helena.
P/1 – Como é que foi essa saída, essa decisão? Qual o motivo? Pra onde você foi?
R – Olha, eu acho que o Valdir não soube e vai saber hoje, né? (risos) Eu trabalhava ali no Helena, mas sempre tive uma boa política de boa vizinhança com todos os meus vizinhos. Eu sempre fiz uma ótima amizade com o pessoal do Laticínios Santa Rosa, que era uma casa de queijos ali na frente da nossa empresa, e eu conheci o Senhor Nenê, conheci o Senhor Cláudio, Senhor Luís, todos eles comerciantes antiquíssimos ali de São Paulo, e fiz muita amizade com o Cláudio, o Cláudio Gouveia. E o Senhor Cláudio Gouveia ele é o fundador e dono da marca Camanducaia aqui em São Paulo, e eu sempre comia lá, conversava com ele, às vezes ele ia tomar um suco na loja, eu conversava com ele. Aí um dia ele me chamou lá e falou: “Raquel, eu queria conversar com você.” E eu ainda trabalhava na Helena, eu não me esqueço, eu com o uniforme do Cerealista Helena conversando com ele no balcão da loja. Eu falei: “Pode falar, Seu Cláudio.” Ele falou: “Sabe, a minha esposa, ela tem um sonho muito grande de montar uma loja de produtos naturais.” Eu falei: “É, Seu Cláudio, legal. Então se ela quiser alguma instrução...” Eu já fazia isso, dar uma orientação pra abertura de empresa. Quanto que a pessoa precisaria de dinheiro, e o material e o que era legal pra ela focar. Eu falei: “Ah, pede pra sua esposa ir lá. Se ela tiver interesse ela conversa comigo.” Aí: “Tá bom.” E fiquei... continuei trabalhando. Aí um dia a esposa dele me procurou, a Dona Derly Gouveia, e falou: “Oh, Raquel, eu queria conversar com você.” Só que eu achei que era uma cliente, eu não sabia que era a esposa do Seu Cláudio. Aí ela pegou e falou: “Olha, eu queria que você me instruísse como abrir uma loja. Eu queria abrir uma loja de produtos naturais, é o meu sonho, o meu marido gosta muito de queijo, vinhos, e a gente queria somar, porque às vezes os nossos clientes compram queijo Camanducaia e deixam de comprar algumas coisas pra comprar aqui no Helena. Então eu queria que o meu cliente já saísse com a compra completa, comprasse tanto a parte de vinhos, laticínios, como de produtos naturais, mas da nossa própria empresa. Eu falei: “Olha, Dona Derly, então a gente pode fazer.” E comecei a fazer o projeto pra ela de consultoria, né? Mas dentro do Helena, sem falar nada. Aí comecei a falar: “Olha, a senhora... eu acho interessante a senhora pegar um estabelecimento numa rua secundária, que tenha estacionamento próprio.” Aí comecei a explicar: “Porque o cliente quer chegar, ter comodidade de deixar o carrinho bem guardado, é legal a senhora ter um lugarzinho pra servir um lanche, porque ele... como ele demora na sua loja, ele vai ter necessidade de comer, então é legal a senhora agregar várias coisas.” Comecei a falar, né: “Ah, você pode indicar pessoas?” Eu falei: Olha, posso indicar...” E indiquei várias pessoas, não sei o que, e aí... continuei meses conversando com ela. Até que chegou um dia que ela falou : “Olha, Raquel, eu achei muito legal, realmente, eu vou te mostrar o lugar que eu quero abrir a loja.” Aí ela me mostrou o ponto de comércio que ela queria abrir a loja era vizinho ao Cerealista Helena, ela ia ser a minha concorrente de loja. Eu falei: “Meu Deus!” Ela me mostrou um galpão grande. Ela falou: “O que você acha?” Eu falei: “Olha, eu acho ótimo, mas a senhora vai concorrer comigo.” Ela falou: “Não, não vou concorrer com você.” Eu falei: “Por que?” Ela falou: “Porque eu quero que você trabalhe pra mim.” Aí eu falei: “Como?” Ela falou: “Olha, eu vou te fazer uma proposta, e eu quero que você trabalhe pra gente. A partir de agora eu quero que você trabalhe, eu quero que você seja tipo a minha gerente pra montar essa loja. E eu fiquei meio... Porque, tipo , o Valdir foi uma pessoa que me abriu o leque da minha... Ele me deu uma bagagem profissional imensa. Então eu cheguei e conversei com ele a possibilidade de eu trabalhar pra ele meio período. Trabalhar tipo, da uma às seis e na parte da manhã eu voltar a estudar, mas na realidade eu não queria voltar a estudar, eu queria dar consultaria. Ele falou que não, não haveria essa possibilidade. Então eu falei: “Valdir, vamos fazer um acordo. Você me manda embora, eu te devolvo o valor da multa, fica tudo acertado de uma forma amigável.” Ele falou: “Não, Raquel, não vou te mandar embora. Não vou dispensar você nunca.” Eu falei: “Então eu estou me demitindo.” Aí eu peguei e pedi demissão pra ele. Aí pedi demissão pra ele oito de setembro de 2008 e comecei trabalhar com a família do Camanducaia. Aí fui pro Camanducaia, aí foi onde a gente mudou a expedição do Laticínios Camanducaia pra um outro departamento, e aí eu comecei a fazer tudo que eu queria fazer na época da Europa: montar uma loja do zero, como se fosse minha. Aí a gente montou o Andorra Comércio de Alimentos hoje, né, uma loja extremamente diferenciada. A gente fez padrões dentro da loja, parâmetros, altura. A gente calculou desde a altura das prateleiras, as larguras dos corredores, a forma das prateleiras e a organização das equipes, né, quem ia trabalhar com que, quem quer receber tal instrução, e a gente inaugurou o Andorra. A gente inaugurou essa loja em setembro de 2009. Um ano.
P/1 – Então agora eu quero que você descreva pra gente como é que... O que você pensou pra inaugurar essa loja, então , você descreveu a largura do corredor, então quero que você explique detalhadamente o que você queria, partindo do zero, como você gostaria de montar uma loja. Então descreve pra gente: como que era a Andorra nessa inauguração?
R – Olha, o Andorra... Você falou : “Descreve como era a inauguração como eu peguei?” (risos)
P/1 – Como você planejou?
R – É porque foi assim, quando eu peguei o galpão eram dois... Duas lojas, só que ele fazia de expedição, e tinha uma parede que separava um ambiente do outro. Quando eu entrei, eu falei: “Não, vai ficar muito pequena.” Eu falei: “Vai ficar uma loja muito estreita. Vai ficar muito pequena.” Aí eu comecei a bater na parede junto com o Seu Vagner, que era um dos engenheiros que atendia a obra. Eu falei: “Nossa, vai ficar muito pequena.” E comecei a bater na parede. E comecei a ver as paredes que eram ocas. Só que lá é o comércio embaixo e em cima é apartamentos, né, então a gente não podia quebrar muita coisas porque poderia comprometer o alicerce das estruturas. Aí eu comecei a falar com o Seu Vagner: “Ah, mas essa parede é oca, essa outra.” Ele falou: “Vamos quebrar?” E eu sozinha, porque o Seu Cláudio me deu seu balcão, ele e a Dona Derly foram... Porque era loja só, tipo, o que você precisar a gente vai pagar, quem você quiser chamar pra te ajudar, a gente vai confiar, o que você precisar a gente vai mexer. A loja vai ser como se fosse sua na montagem. Eu falei: “Legal.” Aí o Seu Vagner falou: “Vamos quebrar?” Eu falei: “Vamos!” A primeira vez que a gente deu uma marretada a gente estourou um cano de água. A gente tinha acabado de assentar o piso. Molhou tudo, estufou todo o piso. O pessoal do apartamento desceu e falou um monte. Aí a gente viu que aquele não podia quebrar, porque ali era encanamento. Tinha uma coluna, mas por dentro dessa coluna passava um cano, então era uma coluna só pra esconder o encanamento. Então a gente fez o quê? A gente começou a quebrar. Então, quando a gente quebrou, então a gente... Dois estabelecimentos ficou um, então ficou uma loja grande, aí ficou aquele galpão enorme, aí eu comecei a pensar, eu falei: “Nossa, como que vai ser, o que eu vou fazer?”. Aí eu comecei a pensar, eu vou colocar um balcão, falei: “Oh, tem que ter pelo menos três máquinas aqui, uma pra cadastro de mercadoria, outra pra recebimento de e-mail e uma só pra emissão de nota”, pra diferenciar as máquinas, né, pela questão de ética profissional, por tudo, né, por vírus, tudo, é legal você ter uma máquina pra cada função. Aí eu comecei a fazer desenhos, eu comecei a desenhar, peguei um papel; eu tenho guardado tudo isso em pastas, em casa, tenho todas as fotos do que eu estou te falando, da construção, das marretadas, guardei tudo. Aí peguei, comecei a desenhar, olhando pra rua comecei a desenhar, falei : ”Oh, aqui eu vou por um balcão pra gente sentar, aqui eu vou colocar uma cerca”, o pessoal: “Cerca, pra quê?”, eu falei: “Não, a cerca é o seguinte, a cerca é uma questão de manter a qualidade do produto” “por quê?”, eu falei: “Porque eu não gosto de ir em loja e chegar, ver o cliente enfiando a mão dentro daquilo e comendo, a sua mão pode estar limpa pra você, cliente, mas pra uma outra pessoa que está na loja não, e você tem que tomar um cuidado porque na sua casa você come o seu pote de bolacha, mas numa loja, a loja atende várias pessoas, você não pode chegar e por a mão”, eu falei: “Eu quero uma cerca” “mas como?”, eu falei: “Eu não quero uma cerca de madeira”, aí já começou a confusão, porque o pessoal falou: “Mas a cerca de madeira é bonita”, eu falei: “Não”, na Europa a gente viu muita cerca de, tipo aqueles ferro do metrô, eu falei: “Oh, eu quero uma cerca daquela, eu quero que faça um muro e uma cerca tipo de metrô” “por quê?”, eu falei: “Porque é fácil de limpar, você vai poder higienizar melhor”.
TROCA DE FITA
P/1 – Então a senhora contou pra gente da abertura da sua loja, que você começou do zero nos moldes que você queria e que você viu na Europa, enfim. E aí, como é que foi a abertura da loja, como é que foi essa nova empreitada na sua vida?
R – Olha, eu acho... Quando foi pra gente inaugurar essa empresa, foi uma coisa assim, uma mudança geral na minha vida. Eu saí de todos os padrões que eu já tinha, os amigos, a equipe que eu tinha de trabalho e parti do zero, com pessoas que eu mal conhecia, conhecia , da rua, conhecimento casual, não tinha uma amizade. Foi uma coisa bem inovadora, mas que eu tive um suporte muito grande. O Senhor Cláudio, ele foi como se fosse um pai profissionalmente, ele, a esposa dele, a filha deles foram pessoas essenciais ali, porque eles nunca me deixaram pender pra um lado, eles sempre fizeram eu me sentir uma pessoa capacitada. Às vezes eu estava fazendo alguma coisa junto com a equipe, o pessoal da obra, tudo, e eu achava que não ia dar certo, eu lembro várias vezes que a Claudinha chegava e falava: “Não, vai dar certo, você tem capacidade, eu acredito em você, Raquel, vai ficar legal, a sua loja vai ficar ótima”, quando eu fazia algumas coisas que não dava muito certo, eu não sabia muito mexer, às vezes eu estabelecia umas coisas depois eu não conseguia mudar, eu ficava pensando: “Mas se eu tirar isso daqui, esse balcão e pôr ali...” “Gente, o que que eu vou fazer com aquele lado da loja?” “Vou ter que pôr muita mercadoria aqui”, e a Claudinha chegava e falava: “Não, não tem problema, a gente põe um monte de mercadoria e depois que a gente abrir a loja, se não funcionar a gente muda de lugar, Quel, estressar por causa disso....” e era muito engraçado que na época eu estava extremamente tumultuada porque nós queríamos inaugurar a loja antes do final do ano porque a gente queria pegar todo o fluxo do final do ano, e a gente começou a montagem dessa loja em março, pra inaugurar antes do final do ano é difícil porque era muito item pra cadastrar, não tinha funcionário em vista, tinha que treinar o pessoal, organizar a loja e várias coisas, e a Claudinha, que é a proprietária dessa loja hoje, ela estava no último semestre da faculdade dela, ela estava com o TCC, tudo pra escrever, tudo, então tipo , ela queria me ajudar muito, mas ela precisava ser ajudada, porque ela estava fazendo um trabalho da faculdade, a maior correria, então eu falo que a loja, ela não foi uma loja montada só Raquel, mas foi uma equipe, uma equipe da família deles, tipo do Seu Cláudio, dona Derli, da Claudinha, o Senhor Vagner, foram, o Alexandre foi uma pessoa muito essencial, que me ajudou muito também, que era uma pessoa que já tinha trabalhado num outro ramo, também era vegetariano e quando falaram : “Oh, você quer chamar alguém pra te ajudar na loja” eu falei: “Eu quero, quero que chame o Alexandre”, ele foi uma pessoa que me ajudou muito, todas as vezes eu queria chorar e perder a cabeça e o Xan falava: “Não, vai dar tudo certo”. A loja, ela foi uma expectativa muito grande quando foi pra gente inaugurar, porque foi uma loja muito pensada, foi igual um filho programado, né, então foi uma loja... Nos mínimos detalhes. O dia que a gente inaugurou, eu lembro, a gente abriu até champanhe. A gente abriu champanhe, comeu bolo e comemorou mesmo, foi oito de junho de 2009 que a gente inaugurou a loja, e quando a gente abriu, muita gente achou a loja extremamente diferenciada, e mesmo quando eu não estava na loja várias pessoas falavam: “A Raquel trabalhou aqui”, mesmo quando eu não estava porque as pessoas diziam: “A loja tem o perfil dela de organização de prateleira”. Então quando a gente abriu foi uma loja muito bem aceita, as pessoas se sentiram mais confortáveis. Ela estava bem agregada, bem organizadinha, então eu percebi que as pessoas tinham mais facilidade, e é a primeira coisa que eu vi que fez uma mudança geral na região foi a inauguração dessa loja. A gente inaugurou e eu fiz um padrão com eles, porque eu sou baixinha, né, e muitos clientes também são baixos, eu sentia dificuldade, em algumas lojas, eu não alcançava as coisas na prateleira, então a gente estabeleceu que no máximo que as prateleiras teriam era um metro e, um metro e 50, então a gente inaugurou a loja baixa, então o cliente chegava, ele mexia na prateleira de uma forma que ele tinha acesso a loja inteira, ele via todos os outros itens, então isso foi uma coisa que os clientes gostaram muito, a largura dos corredores porque quando a gente foi montar a gente pensou nisso, “eu quero um corredor que caiba um carrinho e um cliente na lateral”, de uma forma que quando o cliente tiver passando ele não vai ter que parar pra esperar o outro cliente sair da frente e ele continuar caminhando, então eu quero que ele tenha uma locomoção normal, e isso foi uma coisa também muito comentada, e não só isso, os padrões de higiene, a visualização das mercadorias, tudo, desde o piso, a cor da parede, tudo isso o pessoal achou interessante porque a gente trabalhou um tom de parede claro, de uma forma que descanse a vista, pra que a pessoa não ficasse cansada de ficar dentro da loja e ela se sentisse confortável. Trabalhamos com um verde bem claro, água, e no final da loja, atrás do balcão que eu me sentava, a gente colocou um papel de parede como se fosse... Dá a impressão que é uma imagem, uma fotografia de um lugar bem calmo, uma casinha no interior, um lago, então a pessoa chega e fica olhando aquele papel de parede, é um descanso, , sabe, às vezes tem gente que vai lá na loja, não ia nem comprar, veio olhar o papel de parede. Então foram vários diferenciais que eu vi, e a partir do momento que a gente inaugurou essa loja eu vi um pontapé muito maior pra minha parte de consultoria em logística, que começou a ter várias pessoas da região que começou a falar: “Olha, eu queria fazer mais ou menos isso na minha empresa, e eu queria que você desse uma passadinha lá pra gente conversar”, aí a gente já entrou em outra etapa.
P/1 – E nessa atribuição, nessa loja, você saiu bastante desse perfil de atendimento ao público pra ficar mais na parte atrás do balcão...
R – Administrativo.
P/1 – Administrativo. Como é que foi pra você?
R – Pra mim a parte administrativa é... Eu gosto, mas foi meio entediante, eu fiquei muito frustrada. Quando a gente, quando estava na correria, abria a loja, era muito legal, é ótimo, porque eu tinha muita coisa pra fazer, mas depois da loja aberta eu fiquei muito frustrada, porque eu já estava com a loja aberta, já tinha os funcionários todos trabalhavam em equipe comigo, eu ficava muito parada, porque , eu tinha cliente, mas já tinha uma pessoa que estava instruindo alguns clientes, então eu me sentia... Tipo “meu, eu parei aqui, eu parei de crescer”, então, porque eu sempre fui muito ousada, de descobrir o novo, o que é interessante pra minha vida. E eu comecei a sentir isso, comecei a sentir falta daquele contato direto que eu tinha com o público, porque a pessoa só chegava até mim se ela tivesse um problema tipo um cheque devolvido, uma entrega que não foi bem feita, uma mercadoria que foi vencida, mas até ela chegar lá comigo, ficou mais distante, então eu senti esse bloqueio, eu falei: “Gente, nossa, não, não, eu queria ficar na frente de loja de novo”, e fiquei. Aí o que aconteceu, fiquei lá mais um tempo nessa empresa, foi quando surgiu uma nova oportunidade, o que aconteceu: eu resolvi, eu já estava lá no Andorra há mais de um ano, resolvi que eu queria sair da empresa, porque geralmente sempre é de mim que parte isso, né, peguei e queria sair da empresa porque eu queria voltar a fazer faculdade. Falei: “Ah, eu quero fazer especialização”, eu já tinha terminado o curso de Naturopatia, tinha acabado de me formar em 2008, e falei: “Não, quero fazer especialização, eu quero me focar agora em nutrição clínica, quero trabalhar na elaboração de alimentos naturais, alimentos alergênicos”, aí eu comecei a falar que queria fazer, aí fui, conversei com o pessoal, falei: “Olha, eu entro aqui das oito as seis, não consigo fazer mais nada, minha vida é só a empresa, eu queria fazer um curso, estudar”, aí ele falou pra mim: “Olha, você pode fazer o curso, mas dentro do período da empresa, a gente não vai conseguir te liberar um período integral nem nada”, aí foi quando eu comecei a fazer, tive a oportunidade de fazer especialização de azeite. O Vitor Fratini que é o fundador da Mille Sensi na Itália estava no Brasil, entrou em contato comigo e falou: “Oh, vou dar um curso de ministração de azeite pra degustador profissional, vou dar em Campinas e em São Paulo, queria convidar você pra participar do curso”, eu falei: “Olha, não tenho condições, trabalho aqui na empresa, fico o dia inteiro”, aí conversei com Seu Cláudio, né, falei pra ele: “Queria fazer muito esse curso, sou apaixonada por azeite”, e fui, fiz o meu curso e tudo, né, de assaggiatori, fiz o curso mas faltei na empresa, aí ficou uma situação meia complicada, né, eu queria fazer vários cursos e tinha que ficar faltando porque ele não conseguia me disponibilizar. Aí chegou o ponto que eu falei pra ele, falei: “Oh, Seu Cláudio, eu queria fazer um acordo com o senhor, eu queria trabalhar da uma às seis e voltar a estudar de manhã, porque eu estou me sentindo muito parada, eu queria aprender mais coisas, né?”, ele falou: “Olha, Raquel, não existe essa possibilidade, a gente precisa de você o dia inteiro aqui na loja, e não tem como”, ele falou : “Eu não posso abrir exceção pra você porque você está há pouco tempo com a Família Camanducaia, tem funcionários aqui que trabalham há mais de oito anos comigo e estudam a noite”. Eu, por motivos religiosos, não tinha condições de estudar no período da noite na sexta-feira, então eu falei: “Oh, não vai ser possível”, então a gente tentou entrar em um acordo, né, ele falou: “Olha, não tem como, se você precisar fazer um curso rápido tipo um mês, uma semana, eu até faço, mas uma faculdade, você não vir todos os dias de manhã vai ficar difícil”, aí eu falei pra ele: “Olha, Senhor Cláudio, então eu gostaria que o senhor me dispensasse, porque pra mim não vai dar mais”, essa vez foi a primeira vez que eu saí de uma empresa que eu falei : “Gente, nossa...”. Foi como se eu tivesse largando minha casa, porque a loja foi do zero, a gente pegou um balcão vazio, e eu peguei e falei isso pra ele, aí ele pegou e conversou com a esposa dele e a dona Derli pegou e me dispensou, né, aí me dispensou, aí peguei e falei : “Olha, eu estava desde...” isso já era 2009, né, setembro de 2009, e eu estava desde 2000, direto, eu, comentando com você, sem férias, só correndo, correndo, correndo, aí eu peguei e falei : “Olha, eu vou tirar umas férias”, falei pra mim mesma, falei: “Oh, vou tirar umas férias, vou esfriar a cabeça que eu não estou a fim de fazer nada”. Era setembro, né, falei: “Oh, vou ficar outubro, novembro, dezembro, aí quando for em janeiro eu começo a procurar serviço”, pensei comigo, né, eu pensei. Aí saí do Camanducaia, do Andorra, despedi do pessoal, estava indo na rua, encontrei um comerciante lá do Mercado Municipal. Ele falou: “Raquelzinha, tudo bem com você?”, eu falei: “Tudo”, ele falou: “Você tá indo embora?”, eu falei: “Tô, tô indo embora do ramo cerealista, ele falou: “Como assim você está indo embora do ramo cerealista?”, eu falei: “Tô”, falou: “Por quê?”, eu falei: “Ah, porque pra mim já deu, eu quero voltar a estudar, eu acho que eu vou voltar pra consultório”, eu falei pra ele, “porque eu tô cansada de comércio, sabe, não tô, eu tô muito acomodada, eu acho que eu não tô fazendo nada pelos outros, né, e não é isso que eu quero, eu quero algo mais”, aí ele falou: “Então, eu vou te falar uma coisa, eu tô querendo abrir uma loja de produtos naturais”, ai, quando ele falou isso eu falei: “Ai meu Deus”, falei: “Cara, eu tô saindo de férias”, ele falou: “Então, mas , eu tô com quase tudo montado, tô com tudo organizado, mas, eu nunca trabalhei na Santa Rosa, não sei como é o comércio”, ele era dono de uma banca até então dentro do Mercado Municipal, eu falei: “Ai meu Deus do céu, mas pra quando?”, ele falou: “Ai, oh, a gente tá em setembro, eu quero inaugurar a minha loja em novembro”, eu falei: “Cara, dois meses? Não, não dá”, falei: “Dois meses, dois meses, uma loja?”, ele falou: “Não, a gente consegue, Raquel”, e eu falei: “Tá bom”. Cara, eu pedi demissão no dia oito de setembro e comecei a trabalhar pra esse cara dia dez, falei: “Meu Deus, eu não acredito”, aí começamos a correr atrás de organizar a loja dele e fizemos um trabalho bem bacana, aí quando foi dia 20 de novembro a gente inaugurou a loja dele, que é Empório Árabe na Rua Santa Rosa também. A gente estabeleceu vários padrões e conjuntos, o João, a parceria, toda a equipe dele, quando eu fui pra lá pra ajudar ele, a loja já estava praticamente estruturada, eu só entrei com a minha parte, que era produto natural, o que pode ser vendido e o que não pode, porque que isso sai, porque que isso entra. Aí fiquei lá com ele, aí fiquei outubro, novembro, aí novembro eu já não aguentei, estava muito cansada, aí quando foi dia 20 de novembro eu falei pra ele: “Não quero mais”, ele falou : “Ah, mas eu queria que você ficasse comigo, como funcionária”, eu falei: “Não, João, só te dei uma força porque você queria inaugurar a loja, gosto muito da sua empresa, dos seus funcionários, mas eu tenho um padrão, eu sou focada em produto natural, você vende muito bacalhau, muito vinho, e eu não me sinto confortável de trabalhar com esses tipos de mercadoria, porque eu foco mais em saúde, e eu vender esses tipos de alimentos, pra mim, no meu parâmetro, eu não acho muito agregado”, eu falei pra ele, “eu vou entrar em conflito com as minhas próprias convicções, né?”. Aí, amigavelmente ele: “ah, tudo bem”, aí eu saí da loja dele e fui embora. Estava indo no caminho ainda, conversando até então com o meu namorado, no caminho, eu indo com o meu namorado, aí passei nessa empresa, né, entrei na Casa de Saron, que conhecia a esposa do César, a Maira, e entrei lá no Saron pra conversar, né, e pra despedir deles, porque eu estava indo pra viajar, né, passear, falei: “Oh, vou ficar uns dois meses fora, qualquer coisa se precisar vocês tem meu e-mail”, porque eu tinha uma política de boa vizinhança, então saí despedindo de todo mundo, falando: “Olha, estou saindo da região mas se você me ligar, meu e-mail”, aí eu fui lá e falei com a Maira e com o César, né, falei: “Olha, Maira, eu estou indo viajar, estou indo agora, dia primeiro de dezembro, e eu vou voltar lá pelo final de janeiro, se vocês precisarem de alguma coisa vocês podem me ligar, esse é meu telefone”, e não sei o quê. Aí o César pegou e falou : “Olha, as portas da casa Saron estarão abertas pra você”, eu falei: “Como , César?” “Não, se você quiser vir trabalhar com a gente, eu estou te fazendo um convite”, aí eu comecei a rir, porque eu nunca pensei que ele fosse fazer isso, né, eu falei : “Você está falando sério?” Aí ele falou: “É, eu e a Maira, a gente esteve conversando e a gente acha que seria interessante, a gente queria te mostrar algumas coisas aqui na loja”. Aí me mostrou algumas coisas na loja, conheço muito a loja dele porque já tinha sido do meu ex-patrão, e ele me mostrou uma coisa, , na loja, que foi uma coisa que eu falei: “Meu, eu acho que eu vou querer isso sim”, subimos a escada e me mostrou um cômodo, mas até então esse cômodo era tipo um estoque de farinha, farinha até o teto, , uma sala enorme, ele falou: “Você está vendo essa sala?”, eu falei: “Tô” “Que você tá pensando?”, eu falei: “Nossa, seria uma sala de curso muito legal, hein, César”, ele falou: “É, a minha esposa tem a mesma ideia que você”, ele falou: “Olha, aqui no Saron a gente atende vários clientes, só que apesar de ter a loja a gente consome poucos produtos naturais, eu e a minha esposa, então a gente sente uma dificuldade tanto com os funcionários como com os clientes de desenvolver isso, então, , se você vier pra cá, a minha esposa, ela quer agregar várias coisas, ela tem vontade de lecionar curso, fazer palestra, e eu acho que você viria pra somar a nossa equipe. Mas , olha, Raquel, o convite tá feito. Boa viagem, que você aproveite bem suas férias, e pensa”. Mas ele falou isso, eu já não queria mais nem viajar (risos), eu já não queria nem pensar mais, só que eu já estava com tudo marcado, passagem aérea, tudo comprado. Aí eu fiquei pensando, aí eu fui, viajei, viajei, levei o computador, levei tudo, aí fiquei lá na viagem com o computador mexendo, mexendo, mexendo... quando eu viajei meu namorado não foi, que ele teve um outro compromisso aqui do Doutorado, e um amigo meu foi comigo, né, e meu amigo ficava , a gente sentado na praia, na areia, lá em Arraial d’Ajuda e eu no computador, e meu amigo: “O que você tá fazendo, Raquel?” “Ah, eu tô vendo umas coisas pra loja”, ele: “Meu Deus, você tá de férias, você não desliga”, eu falei: “Cara, eu nunca estive tão frustrada na minha vida, eu queria tanto estar em São Paulo”. Então foi, né, aí quando foi dia dois de janeiro eu já comecei a querer vir embora, já não aguentava mais ficar de férias, ele falou: “Não, vamos ficar até o dia 20, até o dia 20”. Aí acabou o mês de janeiro e eu vim pra São Paulo, aí quando eu vim pra São Paulo, quando foi dia dois de fevereiro o César me ligou, ele e a esposa dele, “e aí Raquel, você já está por aqui?”, eu falei: “Tô”, ele falou: “Queria que você viesse aqui pra nós conversarmos, né?”. Aí eu fui na loja e começamos a conversar, né, aí negociamos horários, valores, aí a primeira coisa que eu não exigi, que eu entrei em acordo com ele, que eu achei , maravilhoso da parte dele e da esposa dele foi a questão... Eles tinham necessidade de me ter como profissional na loja pra agregar algumas coisas, mas eles também queriam me ver como uma pessoa realizada, então o César falou: “Oh, eu tenho necessidade de você estar ajudando a gente aqui na empresa, estabelecer curso, dar treinamento, tudo, mas a gente quer ver o que que, qual é a sua intenção”, eu falei: “Olha, César, eu já tenho uma formação, já trabalhei aqui bastante tempo, você conhece o meu serviço, a gente e tudo, mas eu gostaria de voltar a fazer faculdade”. Ele falou: “Tudo bem, a gente te ajuda no que for possível, você precisa que a gente ajude você a pagar o curso, alguma coisa?”, eu falei: “Não, não é isso. A minha questão, César, é o horário”, ele falou: “Como assim?”, eu falei: “Olha, eu gostaria de trabalhar com você mas num período diminuído, não período integral porque eu quero estudar de manhã porque o rendimento é melhor”, ele ficou meio , ele falou: “Nossa, mas tipo...”, meu, comecei trabalhando na empresa e já cheguei falando “eu quero trabalhar meio período, não quero trabalhar período integral”, aí ele pegou e conversou com a esposa dele, a Maira, e aí eles conversaram bastante, aí eles chegaram e falaram pra mim: “Olha, eu acho que a gente não vai ser lesado por você fazer uma faculdade de manhã. Eu acho que vai ser um conhecimento agregado, a gente só vai somar e vai trazer coisas melhores pra nossa empresa, então tudo bem”. Aí foi onde eu comecei a trabalhar na Casa de Saron, onde estou há quase dois anos.
P/1 – E na Casa de Saron você conseguiu implementar esses cursos, aquele atendimento personalizado que você viu na Europa, como é que é?
R – Não, no Saron, a loja ela já é extremamente bem organizada. No Saron a gente tem feito poucas mudanças, porque é uma loja que, quando foi montada, meu ex-patrão montou essa loja, então eu já dei vários pitacos antes de eu ir pra essa loja, eu conheço o Saron antes de ser desse proprietário, então eu convivi muito com a montagem, então é uma loja muito bem organizada. Meu ex-patrão errou bem pouco quando montou ela. Aí, no Saron, o que a gente começou a fazer, o atendimento personalizado, o César, ele permitiu que eu... Ele me deu uma liberdade de conduta dentro da empresa, eu trabalho com ele na parte de compras da loja, que é a parte administrativa de compras, e introduções de mercadoria também faço, atendimento ao cliente, então ele intercalou as duas coisas, eu consigo trabalhar direto com o meu público, atender o cliente na loja, e consigo comprar mercadoria, organizar prateleira. Então eu trabalho na loja num conceito geral, no espírito de equipe. Eu estou, atuo em todos os setores da loja, não me sinto presa, “olha, eu só faço compra” “olha, eu só atendo cliente”. Então, dentro do Saron, o que a gente está fazendo? A gente hoje, a gente modificou as prateleiras, cortamos elas, né, que elas eram bem altas, faziam como se fossem muros dentro da empresa, mudamos a iluminação, a loja ficou uma loja bem mais ampla, a gente esclarece muito os funcionários, a gente procura dar um treinamento, a gente está terminando de montar uma cozinha profissional, que a partir do ano que vem a gente pretende estar ministrando cursos, né, na área de comida vegetariana, alimentação saudável, e palestras sobre saúde. Então, dentro do Saron a gente já estabeleceu várias coisas bacanas, o vínculo maior que a gente estabeleceu no decorrer desses anos é o meu vínculo com o fornecedor e com o cliente, é uma parte intermediária, porque, por exemplo, o cliente vai e compra a mercadoria, eu não vou por ele em direto contato com o fornecedor, mas eu vou chegar ao fornecedor como um cliente, eu, Raquel, como cliente, e vou chegar no meu fornecedor e vou questionar todas as possíveis dúvidas que o meu cliente venha a ter. Então isso é uma coisa bem bacana.
P/1 – E, eu queria... Você mencionou aquele atendimento de visitar a casa do cliente pra ensiná-lo a preparar uma comida natural, como é que você consegue realizar isso na casa de Saron? Como é que funciona esse contato? O cliente pede, vocês oferecem, como é que é?
R – Então, no Saron, a gente é muito próximo do cliente, tanto eu, o César como a Maira, a gente sempre escuta a opinião do cliente, e o que acontece, esse atendimento personalizado, ele funciona : eu tenho clientes que são mais amigáveis, todos são amigos, mas tem aqueles que são mais íntimos, que a gente já estabelece alguma coisa. O que ele faz? Ele chega lá e fala: “Olha, eu quero levar esse leite de soja. Como eu preparo?”, aí eu explico pra ele como prepara. Às vezes ele fala pra mim: “Ô Raquel, eu achei legal, mas eu não vou lembrar de fazer isso em casa, você pode ir lá alguma dia me explicar?”, e eu vou, aí o César fala: “Não, pode ir”. Ou senão a pessoa chega e fala: “Ai, César, eu queria testar esse cacau, eu não sei se esse cacau é legal”, eu tô na loja, a gente tem uma cozinha lá na loja, eu levo o cliente lá dentro testo e faço o teste da comida pra pessoa ver. O atendimento agregado no Saron, no momento, hoje, como eu te disse, eu tenho indicado muito pra uma outra pessoa, mas eu, dentro da loja, a gente faz o atendimento personalizado, sim. Às vezes o cliente me liga e fala: “Ai, Raquel, eu queria ir na loja fazer uma compra, que horário que você tá aí?”, aí eu falo: “Olha, eu tô das 13 as 18 horas” “Então tá, eu posso passar aí?”, eu falo: “Pode”, aí a gente chega, tem uma conversa, o cliente chega, conversa comigo, eu faço uma anamnese bem rápida com ele, anamnese seria uma avaliação, mas você conversando sobre o hábito da alimentação saudável da pessoa. Então ela me fala: “Olha, meu hábito é assim, eu faço isso, faço aquilo”, a gente começa a conversar e eu começo a não mudar o cardápio dela, mas eu começo a agregar alimentos que são mais saudáveis e que vai dar uma resolução melhor pro problema dela. Então eu faço, às vezes tem clientes que são, exigem um pouco mais, é uma consultoria gratuita específica da Casa de Saron, eu converso com o cliente, faço uma anamnese, estudo o problema dela, monto um cardápio personalizado, ela vem até a loja, eu acompanho ela na compra e depois eu ensino ela a fazer todo o alimento que ela tá levando.
P/1 – Bom, vamos falar um pouquinho agora dos clientes, do perfil do cliente. Qual, quem é o cliente da Casa de Saron e da zona cerealista em geral, é mais o varejista, é mais o atacadista ou tá muito equilibrado, quem são esses clientes?
R – Olha, hoje eu posso te falar, o público da zona cerealista, ele é bem dividido. Ele fica entre 80% varejo e 20% atacadista. Então, é o público que vai muito fiel ali, na região, eu já tinha te comentando, a gente atende muitos culinaristas profissionais, restaurantes, hoje a gente está pegando mais rede hoteleira, e no varejo a gente atende um percentual muito grande de aposentados, pessoas idosas, da terceira idade, tudo, que estão mais focadas em ter uma alimentação natural e preventiva de doenças posteriores.
P/1 – E tem algum público que acaba consumindo mais esse tipo de... Dá pra você traçar um nicho da sociedade que consome mais produtos naturais ou é uma coisa que já tá muito espalhada pela sociedade em geral? Como é que é?
R – Hoje, com a mídia falando mais sobre saúde, a gente tem um público muito diversificado. Eu tenho eu não posso colocar taxas criteriosas, se é que você me entende, mas , eu tenho públicos bem específicos. Público que compra muito comigo é a comunidade islâmica aqui de São Paulo, que são muitos árabes, né, o pessoal da comunidade judaica que usa muitos produtos kosher, eu também atendo uma linha muito grande de simpatizantes, né, GLS, gays, lésbicas, esse é um público, é um percentual muito grande, eles trabalham com produtos naturais, elaboram pratos diferenciados e trazem nas origens deles... Eles são pessoas que buscam um conhecimento agregado fora, eles vem de fora, trazem pratos sofisticados, são donos de restaurantes, e vão até nossa empresa pra buscar coisas diferentes. Também tenho pessoas evangélicas, né, que tem filosofias de vida, por exemplo, tenho um público muito grande que é o público Adventista, que segue uma alimentação vegetariana mais focada ao natural, mas é um público muito diversificado. Mas basicamente a gente tem na linha dos árabes, judeus, essa parte que seriam os GLS e o pessoal, em geral, adventista, esse é o nosso público, e a gente tem algumas pessoas que são etnias diferentes, né? Os veganos, esse pessoal que é, que mexe muito com erva, alopatia, essas pessoas que são, esqueci o nome agora, me faltou a palavra, que moram nesses lugares isolados, tipo do budismo, mas não é budismo, monges.
P/1 – Monges.
R – A gente atende muito.
P/1 – E do pessoal atacadista que compra lá, eles também... Eles se... Eles oferecem pra esses grupos sociais que você mencionou? Então tem muito restaurante árabe que compra ali pra oferecer? Também tá bem dividido dessa forma entre os atacadistas?
R – Não, atacadista não. Hoje a maior parte dos atacadistas que a gente atende, eles compram em atacado e eles montam distribuidoras, eles repassam, por exemplo, eu tenho atacadistas na Bahia, que compram da nossa empresa, aliás, o produto vem da Bahia pra mim e eu revendo e volta pra Bahia, o pessoal não consegue lá da empresa, ela tem que comprar da casa de Saron. Então o que eles fazem? Eles são os distribuidores, por exemplo, eu tenho algumas empresas que compram só um item, ela compra só óleo de coco, ela só distribuiu óleo de coco. Eu tenho uma que só compra suco de uva meu, e distribui só suco de uva. Mas eu tenho outras que compram em atacado mas são lojistas, eles tem a própria loja de produtos naturais em outros municípios em outros estados do Brasil fora.
P/1 – Em outros bairros de São Paulo também?
R – Também. Eu tenho, aqui em São Paulo eu tenho poucos clientes de bairro, os que eu tenho mesmo, é em outros estados, por exemplo, eu tenho na Bahia, eu tenho em Sergipe, eu tenho em vários lugares mais distantes, Rio Grande do Sul, Curitiba, então a gente atende várias lojas, e a gente atende um polo muito grande que é setor de desenvolvimento de produto, por exemplo, eu tenho uma parte da Casa de Saron que eu tenho muitas castanhas, amendoins, então eu atendo indústrias que fabricam o que, granolas, cookies, barras de cereais, então a gente atende esse comércio também, a gente fornece o produto semiacabado, e eles fazem o produto final que vai chegar na sua casa, na sua prateleira.
P/1 – Antes da gente falar dos fornecedores, ainda um pouquinho sobre os clientes, tem alguma dia, algum horário que seja mais marcada, que seja uma presença mais forte de clientes varejistas e atacadistas, dá pra diferenciar por dias e horários o atendimento ali?
R – Então, né, geralmente a gente sempre estabeleceu isso muito ligado com a Feira da Madrugada. A Feira da Madrugada é aquele comércio que vende roupa aqui próximo ao Brás, e a gente conseguiu agregar os nossos movimentos à Feira da Madrugada, porque muitas pessoas falam: “Nossa, não tem nada a ver”, não, tem. Geralmente as pessoas viajam de domingo pra segunda-feira pra Feira da Madrugada, então na segunda-feira o que elas fazem? Toda a compra têxtil pra levar pros estados dela, que é a parte de roupa. Na terça-feira eles vão vir embora, na terça a noite, na terça-feira eles migram pra zona cerealista, eles vão pra zona cerealista, pro Mercado Municipal, pra região da 25, então o nosso movimento que é muito grande de varejistas e atacadistas, geralmente é terça e quinta-feira. Segunda-feira o movimento, ele é mais tranquilo, porque já passou o fluxo do sábado, o sábado é um dia que o movimento é muito grande, apesar de eu nunca ter trabalhado um sábado, né, na minha vida, é um movimento, eu sei que é muito grande, porque eu tenho os meus relatórios de venda na segunda-feira, então eu vejo as planilhas. Então segunda-feira é um dia de organização, organização de prateleira, limpeza, tudo. Mas na terça o nosso foco é muito grande, atacado e varejo por causa da Feira da Madrugada. A quarta-feira é meio de semana, já é mais equilibrado. Quinta-feira o movimento também é muito grande, porque o pessoal, geralmente, que mora no interior tá saindo da capital e voltando pra casa. Sexta-feira o movimento, ele é mais light porque o pessoal tem medo de ir pra região na sexta-feira devido ao trânsito na hora de voltar, o congestionamento. Mas, basicamente, o movimento grande é terça, quinta e sábado, são os dias cruciais da loja.
P/1 – Então a força da indústria têxtil do Brás acaba...
R – Movimenta a nossa região.
P/1 – Movimentando todos os outros tipos de comércio da região também.
R – Sim, todo setor, eu não tenho como negar isso pra você, tanto é que quando começou a ter, há pouco tempo atrás, alguns protestos com a Feira da Madrugada a gente se sentiu muito lesado, muito, porque o nosso movimento caiu. O que aconteceu? A mídia, ela divulgava que eles estavam fazendo um quebra-quebra, muitas coisas. Eles não estavam fazendo quebra-quebra, eles estavam apenas protestando pelo direito deles. Só que, o que acontece, como eles estavam fazendo passeatas na rua, eles tumultuavam por causa da passeata, então o que aconteceu? Os nossos clientes não foram até a zona cerealista, porque “vou pegar trânsito” “não vou ter onde estacionar” “eu tenho medo”, então nós fomos muito lesados.
P/1 – A presença do Mercadão Municipal ali bem próximo, o Mercadão, hoje, talvez até mais do que um centro de compras, ele também é um ponto turístico da cidade.
R – Sim.
P/1 – A zona cerealista, ela pode se dizer que ela é incluída nesse passeio turístico da cidade, aquela região, ou ela tá separada, tem uma relação muito próxima de clientes do Mercadão com clientes da zona cerealista ou não?
R – Não, não tem. Ligação existe entre os comerciantes, a maior parte dos comerciantes que tem bancas dentro do Mercadão Municipal tem bancas na zona cerealista, mas o público é diferente. O público do Mercado Municipal em si é um público... Ele atende vários tipos de pessoa na parte do turismo, vão vários tipos de classes sociais, mas a classe econômica que compra, consome mesmo como consumidora no Mercado Municipal é uma classe elitizada, porque a diferença de preço do Mercado Municipal pra zona cerealista tende a ser muito grande. Então a gente costuma brincar que o dia que o pessoal descobrir a zona cerealista o Mercado vai ficar meio desabitado, a não ser pela parte de turismo. A diferença de valores é grande, porque o Mercado, ele trabalha com produto top de linha, a zona cerealista também trabalha, mas os tipos de fornecedores nossos são diferentes do Mercado. O Mercado, ele costuma trazer muitas coisas importadas, coisas que nós às vezes temos no Brasil, mas as nossas às vezes sai com algum defeitinho, alguma manchinha e eles não querem por isso no padrão deles, né? Então eles não pegam, e a gente trabalha, a gente trabalha com vários tipos de produto, a gente, tipo, se você vai comprar uma castanha nossa, no Saron, eu não tenho um tipo de castanha-de-caju, eu vou ter sete, então você vai escolher entre a mais simples e a mais bem elaboradas. O Mercado não, ele não te dá essa opção, ele te dá um produto de primeira linha. Então você chega lá, você não vai chegar que você vai achar oito tipos de castanha, você vai achar no máximo dois, tipo exportação w4 e a w1, dois tipos, então é um público mais elitizado, que é aquele público que não vê preço: chego, compro, levo embora, eu quero um produto diferente e exótico. O Mercado, o público dele é de turistas, estrangeiros, você andar lá, nossa, encontra muito estrangeiro fascinado com a nossa alimentação. Então é um público que busca coisas diferenciadas e com um preço acessível a qualidade de vida deles.
P/1 – A zona cerealistas é um polo distribuidor pra esse comércio gastronômico da cidade assim como o CEAGESP, ou esse ramo de cereais está mais pulverizado?
R – Não, a zona cerealista, ela é um polo comercial do Brasil. Ela não... Não falo pra você que ela agrega só a região de São Paulo, Mercado Municipal, e tudo. Ela é um polo de distribuição nacional, a nível nacional. Eu já viajei em vários estados, vários lugares, tive oportunidade de conversar com várias pessoas e eu fiquei impressionada a ver aonde as pessoas conhecem a zona cerealista. Ano passado eu tive a oportunidade de ir pra Porto Seguro, e conversando com o gerente de uma rede de hotéis... Que é, ele é gerente da rede de hotel, esse hotel pertence à CVC, e ele tem uma rede muito grande em Porto Seguro. Eu falando com ele e ele falando pra mim: “Olha, a gente compra castanha na zona cerealista”, compram castanhas pra atender a rede hoteleira dele, porque, o que acontece, eles tem o frigobar e eles fazem saquinhos fracionados de castanhas, amêndoas, tudo, e ele faz o que, ele compra na zona cerealista. Meu, o cara tá Bahia e compra o produto aqui pra levar pra lá. Então a credibilidade que a zona cerealista tem num polo nacional, ela é muito grande. E ela não atende pessoas especificas. Ela atende tudo. Hoje, a única rede que a gente ainda não pegou pra atender como zona cerealista foi a rede de hospitais de São Paulo, porque hoje está sendo estabelecida uma alimentação mais saudável, mas merenda escolar a gente já tem um trabalho em parceria, rede hoteleira, a gente já tem uma parceria, clínicas, spas, tudo, restaurantes, tudo, agora o pessoal tá entrando com a parte de turismo, turismo agregado à alimentação saudável. Então, hoje, a única parte que a gente ainda não atende é a parte de hospitais públicos aqui de São Paulo. Só isso. Fora isso, a rede zona cerealista atende uma rede muito grande de comércio no geral.
P/1 – Agora, entrando nos fornecedores, quem são os fornecedores da zona cerealista da Casa de Saron? Mudou muito com o passar do tempo, continuam os mesmos?
R – Não, mudou. Mudou, no começo, mais antigamente, a gente comprava de pequenas empresas, a gente comprava ainda de distribuidores, pessoas que pegam direto da fábrica e passam pra nós né? Com o decorrer do tempo, como o nosso público foi aumentando, por exemplo, às vezes tinham pessoas que compravam tipo “ah, eu compro dois quilos da farinha porque eu faço pão”. Hoje esse pequeno empresário que comprava dois quilos, ele compra 300 quilos de farinha, então eu não tenho como comprar de uma pequena empresa, então a gente compra de grandes indústrias, por exemplo, eu não compro de distribuidora, uma empresa grande, que é conhecida nacionalmente e atende a nossa empresa com ótima qualidade de serviço é a Ferla do Brasil. A gente compra aveia da Ferla, que é uma empresa muito grande, aveia, farelos, flocos. Outra empresa muito grande que a gente costuma trabalhar e que a gente tem um retorno muito grande na fibra de trigo, farinhas em geral é a ALKIBS, que fornece muitas mercadorias legais pra gente, e entre outras, né, empresas que a gente também trabalha, dependendo de qual setor, soja é uma empresa específica, só que varia também, né?
TROCA DE FITA
P/1 – E como é que a questão da importação? Tem muitos produtos que são importados ou a maioria é do mercado nacional, como é que é?
R – Então, dentro da empresa a gente trabalha com, o percentual é bem mesclado, a gente pode se dizer, a gente tem 60% de produtos nacionais e 40% de produtos importados. Aí varia muito, né, do tipo de mercadoria que você estabelece na loja, por exemplo, dentro da nossa empresa, ali, na Casa de Saron, a gente trabalha com um percentual grande de produtos importados na linha de frutas, que seriam frutas desidratadas, alguns tipos de castanhas, né, que não seriam nem castanhas, seriam amêndoas, avelãs, esses produtos vem mais daquela região árabe, né, nem a região árabe, desculpa, seria mais ali da Turquia, do Líbano, tem produtos que são específicos, que aqui no Brasil você acha, mas não são produtos originais, já foram, um pouco , mesclados. Temperos exóticos a gente trabalha com uma linha muito grande de produtos indianos, árabes, zattars, alguns doces importados, tem bastante coisa. Dentro da parte nacional é os produtos que a gente tem de época, né? Frutas da nossa época, de algumas regiões do Brasil, mas importado a gente trabalha muito com a parte de frutas e grãos, e na região, em geral, zona cerealista, a demanda maior de produtos importados são alguns peixes, né, que eles trazem de fora, e muitos vinhos, né? Muitas boas vinhas, né, que eles trazem. Alguns vinhos de Portugal, Itália, de toda a Europa, tem muitos produtos diferentes.
P/1 – E na questão do transporte dessas mercadorias, tanto em relação a vocês como fornecedor quanto na entrega pros clientes, como é que feita? Vocês que tem um caminhão da empresa que vai buscar essa mercadoria ou o fornecedor que vai entregar na Casa de Saron, como é que é essa...?
R – É, aí é assim, nós, nossas compras geralmente as empresas costumam entregar, porque geralmente , alguns produtos que nós compramos são, quase todos são fora do estado de São Paulo, é raríssimo alguma mercadoria que a gente compra aqui em São Paulo, que a gente possa buscar com carro próprio, a não ser que seja algum enlatado, alguma coisa. A maior parte das empresas, elas tem um itinerário, então é uma compra programada, por exemplo, tem alguns produtos que eu compro da Bahia, então eu já sei que eu só posso fazer minha compra na segunda-feira. Então eu ligo na segunda-feira porque na terça-feira essa empresa da Bahia, ela despacha a carreta dela pra São Paulo, então ela despacha na terça-feira, ele vai chegar pra mim aqui entre quinta e sexta-feira. Então não adianta eu ligar pra ele na terça-feira e fazer um pedido, porque eu não vou receber, só vou receber na outra semana, então é uma venda programada, então as empresas costumam me entregar a mercadoria. Quanto a Casa de Saron, a gente tem um padrão muito bem organizado de entrega, a gente trabalha : a gente, no momento a gente não faz entrega pra pessoa jurídica, oh, desculpa, pessoa física, a gente faz só pra pessoa jurídica. Quando é uma pessoa física que quer me fazer uma compra, o que ela faz? Ela me passa uma cotaçãozinha dela, que ela deseja, e eu respondo com o orçamento. Ela aprovou o orçamento, eu ponho esse pedido pra separação. Aí ela pega os meus dados e faz um depósito no banco. Eu confirmei o meu depósito, eu vou acionar o correio, e ela vai receber via Sedex, ou, se ela quiser, ela solicita um motoboy que vai entregar a mercadoria. Agora pedidos pra empresas grandes, a gente tem carro próprio, nossos carros, a gente tem um itinerário e tem um padrão de compra, cada região é estabelecido um valor mínimo de compra. Então, aí, a pessoa mora em uma determinada região, digamos que é um valor X, trezentos reais o mínimo pra entrega pra pessoa jurídica. Só que , não adianta ela me comprar, por exemplo, ela, eu tenho entrega sexta-feira pra região da Avenida Paulista, aí ela me liga sexta-feira de manhã, “ai, eu quero que você me entrega isso hoje”, não tenho condições, porque os nossos carros, eles tem itinerário, então, tipo, segunda-feira zona norte, eu tô dando só uma suposição, viu, não que seja . Segunda-feira zona norte, terça-feira...cada dia o nosso carro segue um itinerário de entrega, a gente não tem só um carro, a gente tem vários carros, então cada carro tem o seu itinerário, então a gente procura trabalhar com essa venda casada com os nossos clientes.
P/1 – E abrange a cidade toda?
R – Toda. A gente só não atende arredores, por exemplo, Guarujá a gente ainda não atende, geralmente a gente separa e eles solicitam transportadora, a gente pede coleta, a transportadora manda, mas a gente atende a região comercial, , zona cerealista central, do centro de São Paulo, zona cerealista, que abrange a capital, a gente atende todo mundo.
P/1 – E o estoque, como é que é, ele é reposto em quanto, em que, tem um dia específico pra isso, tem uma pessoa específica que cuida disso, como é que é? Tem um espaço dentro da loja que é...?
R – Dentro do estoque, como que eu vou te falar, o pessoal acha engraçado, né, geralmente, quando você trabalha na loja você trabalha em todos os setores, eu sou uma das pessoas que controla o estoque. O meu estoque, ele é organizado de uma forma bem bacana, a loja, ela é bem ampla em cima, então o meu estoque, ele é organizado por setores, da forma que eu e o César e a Maira procuramos organizar a loja embaixo, a mesma forma a gente procura organizar em cima, porque a gente estabeleceu. A gente tem um setor que é só farináceos, a gente tem um setor que é só drageados, a gente a nossa câmara frigorífica que guarda só frutas cristalizadas, essas coisas, então a gente separando por setores. O estoque, ele é controlado de que forma? Tem uma pessoa que fica lá em cima, que só recebe mercadoria, eu tenho uma que só desce e eu tenho uma que só repõe barricas, e eu tenho uma moça que me ajuda com a prateleira, então o que acontece, cada caixa fechada que desce a gente estabeleceu um padrão, o sistema dá a baixa, então, chegou uma caixa fechada o nosso sistema dá a baixa, então ele mostra se saiu em unidade, que seria varejo, e em caixa fechada. Então o estoque, ele é controlado de uma forma assim. Quando ele vai, ele é extremamente programado no computador. Quando ele chega no limite, o meu computador, ele já me avisa que já tá na hora de eu fazer aquele pedido, que eu tô com o estoque mínimo, por exemplo, se eu compro 20 caixas de um produto, quando eu tiver com cinco caixas ele já me avisa que eu estou com o estoque mínimo, que é necessário que eu compre antes que acabe, ele, nunca aconteceu de acabar mercadoria e eu não perceber, só se eu for muito desligada, só que isso é um padrão que é estabelecido não só pelo sistemas mas por todas as pessoas que tão envolvidas: a pessoa do faturamento, o recebedor da mercadoria e a pessoa que expõe na prateleira, porque a pessoa que expõe na prateleira, ela tá ali, visualmente ela tá percebendo que está acabando, porque às vezes ela vê um buraco na prateleira, ela sobe lá e fala: “Você pode descer tal mercadoria pra mim?”, o que que aquela pessoa fala pra ela, “não tem essa mercadoria”, então essa contadora da prateleira, ela vai chegar pra você no balcão e falar: “Olha, tá faltando isso, isso, isso”, aí eu vou fazer o que, a confirmação dela, ela me falou, eu vou entrar no meu estoque e vou ver no meu estoque mínimo, vou ver quanto saiu em varejo, quanto saiu em atacado, quando foi a última data da compra, vou fazer uma nova compra.
P/1 – E a Casa de Saron trabalha com brindes, promoções pra atrair clientes ou não?
R – Trabalha. A gente trabalha com... Em parceria, é claro, com os fornecedores. Como sempre, o Saron, a gente tem uma política muito diferente, né, nessa parte de divulgação de empresa, a gente, dentro da nossa empresa a gente criou um jornal, o jornal próprio da Casa de Saron, é um jornal que inclui informações muito interessantes. A gente procurou fazer... A Maira criou esse jornal com o intuito de tirar dúvidas dos clientes e agregar sugestões, por exemplo, a cada estação do ano a Maira elabora um jornal diferente, ela em parceria com os clientes nossos, funcionários dela, então o que ela faz, “ah, é verão, o que que é falado no verão?”, então os clientes dão opinião, falam: “Olha, no verão é legal falar sobre protetor solar”, o que a gente faz, a gente senta em conjunto eu, ela e mais alguns funcionários, todos que tem interesse de participar do jornal, e vê o que tá acontecendo, por exemplo: “Ah, é verão, como que a gente vai proteger a pele?”, a gente agrega isso aos nossos produtos, por exemplo: “Ai, tá chegando o verão, quero proteger minha pele”, aí você tomou bastante sol, queimou bem a pele, você vai comprar óleo de coco, você não vai passar um hidratante, você vai passar óleo de coco, aí a gente escreve como matéria e publica no nosso próprio jornal, então a gente tem esse jornal de promoção e a gente procura participar de eventos, como convidados. Há um ano atrás a gente fez um evento muito bacana que foi com a prefeitura de São Paulo, patrocinada pela Nutri Materno, foi mês de junho, mês de prevenção da obesidade infantil, foi um evento feito dentro do Horto Florestal de São Paulo, a qual nos convidaram, nós montamos uma loja móvel, deixamos a nossa loja aqui e passamos um fim-de-semana, né, um domingo todinho dentro do Horto Florestal, com a nossa mini loja montada não pra venda, só pra mostrar o produto, mas eu, a Maira, o César e mais alguns funcionários, esclarecendo e orientando pessoas que foram ao nosso stand, falando: “Olha, esse produto serve pra tal coisa, você compra a tal preço na zona cerealista”, porque dentro não pode se vender, a gente só fez uma divulgação, mas a gente trabalha , com eventos, “ai, vai ter uma palestra, vai ter uma feira de saúde”, a gente sempre está disposto a estar participando pra levar um conhecimento mais agregado pras pessoas.
P/1 – E o comércio online, é praticável nesse tipo de comércio, a Casa de Saron tem um comércio online também?
R – Então, no momento agora nós estamos montando a nossa loja virtual e o nosso site. Isso é uma coisa muito legal, muito viável pra todas as empresas que tem interesse de montar uma loja virtual, é uma coisa que você tem um retorno muito grande. Só que, no momento a gente tem algumas prioridades na casa de Saron, como eu te falei, a gente tá montando uma sala de curso, algumas coisas, então a gente deixou meio de lado ainda, mas a gente tem um projeto sim de ter uma loja virtual. A loja virtual é muito bacana porque você atende pessoas de várias localizações ao mesmo tempo, e a loja virtual é interessante porque você não precisa ter um estoque físico, você tem que ter produtos a pronta entrega, então é mais fácil de você se controlar, você, dificilmente você vai ter um produto parado. A loja virtual você trabalha com itens que tem uma procura muito grande, então você não necessariamente tem que ter milhares de itens, você pode pôr poucas coisas, mas que tenha procura.
P/1 – Falando agora sobre o sistema de pagamento, qual que é o mais usual atualmente, a forma de pagamento?
R – Como, você fala?
P/1 – Dinheiro vivo, cheque, cartão, o que que é mais usual?
R – Então, aí é a necessidade do cliente, porque por exemplo, quando é um fornecedor nem fornecedor, quando eu forneço a mercadoria pra alguém, é um cliente meu de loja, e tudo, a gente estabelece – isso é um padrão de zona cerealista – geralmente as três primeiras compras a pessoa faz a vista, a partir do terceiro a gente começa a parcelar, mas a maior parte dos comerciantes hoje, que negociam, utilizam cheques. Cheques porque eles acham mais seguro, o juros é menor e o cheque... Eles tem muito medo, né, de vir pra região com dinheiro, então eles trazem cheque, “ah, se eu for assaltado eu susto o cheque”. O cartão a pessoa tem muito medo de ser assaltada, acontecer algum roubo, então ela quase não usa cheque, e na parte do varejo o pessoal compra muito a dinheiro. Varejista, pessoas que compram, porque é melhor, porque, por exemplo, se você leva uma garrafa de suco, tem um valor, se você compra uma caixa fechada no dinheiro, a gente ainda consegue te dar um desconto melhor, então as pessoas, elas já pensam mais, elas guardam mais um dinheiro, aí uma certa época do mês ela já vai lá e já faz uma compra padronizada, “não, esse dinheirinho é pra eu comprar à vista”, então varejista é mais no dinheiro e atacadista é mais no cheque.
P/1 – E tanto na parte varejista quanto atacadista é usual a utilização de caderneta, de abrir uma continha pra um cliente, pra determinado cliente mais antigo?
R – Sim, isso acho que é uma coisa do padrão do comércio que acho que é uma coisa que nunca vai mudar, é aquele cliente que sempre tem um valinho pendurado com você ali. A gente tem, sim, alguns clientes que são mais amigos, que a gente tem intimidade, que leva a mercadoria e fala: “Olha, você vai faturar, mas você marca, marca pra próxima, joga isso lá pra uma próxima” “olha, eu tô com uma pendência mas eu vou pagar, eu tô indo pagar”, a gente sempre tem aqueles que tem caderneta, que tem ali um balancete diferenciado que a gente faz, a gente tem sim, continua, é sempre a mesma coisa, isso é uma coisa que acho que nunca vai mudar.
P/1 – Indo pra um lado mais pessoal agora, pra gente já ir finalizando, o que que mais mudou no seu trabalho desde que você entrou na zona cerealista, aliás, desde que você começou a trabalhar com produtos naturais lá no Tatuapé pra hoje, o que que mais mudou pra você?
R – Olha, eu acho que o que mais me mudou é a minha realização profissional. É... Quando eu trabalhei no Tatuapé eu trabalhava mais por um ganho de dinheiro, que às vezes a gente entra nisso. Hoje não, é uma realização profissional, eu sou uma pessoa que eu não penso tanto no que eu ganho, eu penso no que as pessoas vão levar, então eu não penso: “Ah, eu tô vendendo isso, fulano tem aquilo”, não, a minha realização hoje, como pessoa, é ver uma pessoa realizada, tipo, ela chegar e falar : “Olha, eu comi, eu fiz esse tratamento e deu certo”. Então pra mim, o que me mudou é a minha forma de pensar em relação ao outro, não é, assim, venha a mim, mas é o que o outro está sentindo, o que ele precisa, o que eu preciso fazer pra que a qualidade de vida dele seja melhor, então, pra mim isso foi uma coisa que mais me mudou.
P/1 – E no comércio, mudou a demanda do público, mudou, você teve que mudar o atendimento, o que que mudou no comércio, na atividade comercial?
R – Na atividade comercial eu vejo... Eu fico até admirada porque antes a gente atendia um público muito grande de pessoas idosas. Hoje, eu tô vendo que a juventude já tá sendo mais despertada pra isso. Hoje eu atendo muitas pessoas de academia, bem jovens, tipo 14, 15, 17, 18 anos, rapazes extremamente jovens, preocupados com a aparência, com a definição de massa corporal, de tudo, então eu vejo que o nosso público hoje tem muitos jovens, os jovens tão se focando mais. Não que as pessoas idosas estejam deixando, elas tem os mesmos hábitos, mas hoje o conhecimento agregado dos pais tá realmente ficando herdado pros filhos, os pais estão conseguindo passar uma conscientização melhor de produto natural na vida dos filhos, né? Eu tenho observado que o público tem mudado muito nessa variação. Antes, a gente tinha um público, antigamente, há uns dez anos, nosso público era muito adventista, muito. Você olhava a pessoa, você falava: “Você é adventista, né?”, porque era muito adventista. Hoje eu não posso falar: “Olha, tenho muito público adventista”. Às vezes eu atendo dez pessoas na loja por dia, nenhuma é adventista, antigamente não, você atendia dez, dois não eram adventista, hoje não, hoje é um público muito jovem e de várias etnias, é bem bacana.
P/1 – Esse ramo de comércio de produtos naturais, ele é suscetível a crises econômicas, num período de crise, de mudança de moeda, se nota uma diminuição...? Mudança de moeda você não vai poder falar porque já faz tempo, mas de crise econômica, se nota uma diminuição do público ou ele é um público já consolidado que atravessa essas crises sem muitos traumas?
R – Então, o nosso público, ele é um público consolidado, porque por mais que o Brasil, o país passe por uma crise, a última coisa que a pessoa vai deixar de fazer é comer, o que a gente percebe é crise em moeda, por exemplo, euro e dólar, isso é um problema seríssimo pra gente que trabalha com essa parte de produtos importados, porque quando o euro sobe, ou o dólar, a gente tem um problema pra trazer algumas mercadorias, então, a gente traz a mercadoria mas existe um repasse de valores, então o que acontece, até o cliente se conscientizar que não foi a Casa de Saron, que é um problema de mudança, mesmo, de moeda, que é o dólar que tá subindo ou que tá caindo, é uma parte meia complicada mas a alimentação natural é uma alimentação que está sendo consolidada, ela ainda não é uma coisa que faz parte da vida do brasileiro. Tipo, ela passa sem ainda. Não é: “Eu não posso ficar sem comer minha granola”. Eu não posso, eu Raquel, mas o público brasileiro ainda não é assim, não, eles ainda deixam meio de segundo plano. Mas na questão de crise econômica, o nosso setor nunca caiu muito, de a gente falar: “Ai, caiu muito as vendas, por que estava tendo essa crise”. As únicas defasagens é quando a moeda do dólar sobe, agora Brasil passa por crise igual essa última que teve, o nosso comércio foi normal na parte de alimentícios, pelo menos na Casa de Saron (risos).
P/1 – Agora, realmente indo pra uma parte bem mais pessoal, você participa de algum tipo de sindicato ou associação comercial, ou já participou, ou pretende participar?
R – Não, nós participamos, nós temos uma associação que eu vou ficar até na falha com você que eu não me lembro agora o nome, a gente faz parte da Associação Comercial dos Comerciantes da Zona Cerealista, essa associação, ela abrange duzentas lojas da região, inclusive o Mercado Municipal, e é uma associação que ela traz muitos vínculos pra nós, é uma, a gente não faz um... A gente não faz um padrão de preço, mas a gente estabelece regras pra que todos os comerciantes trabalhem de uma forma legalizada, e bem estruturada. Essa nossa associação, ela funciona... Ela tem um programa conveniado, que é uma rádio, uma emissora de rádio, e essa emissora de rádio, ela divulga todos os eventos que nós estamos fazendo, nós zona cerealista. Por exemplo, a Casa de Saron vai dar uma palestra, aí essa rádio, em conjunto com a associação, fala: “Tal dia a Casa de Saron estará fazendo uma palestra de saúde na comunidade de São Dimas, aqui em São Paulo, a partir de tal horário. Vocês podem retirar o convite em tal, em tal, em várias lojas”. Então a gente faz isso que é um meio de levar o cliente não pra uma loja, mas pra região, divulgar a nossa região, falar que, apesar de ter algumas deformidades ali a região não está muito limpa, a pessoa ir pra lá que ela vai achar produtos de boa qualidade.
P/1 – E agora, gostaria que você falasse um pouquinho como é que é o seu cotidiano, o seu dia-a-dia hoje. Como é que é, você acorda que horas, vai trabalhar de que horas a que horas, como é que é?
R – Nossa, isso é complicado, viu? (risos) Oh, o meu dia-a-dia, como que eu posso te dizer, a minha vida é a zona cerealista, eu não consigo ter uma vida... Eu sempre brinco com o pessoal, não vejo uma vida fora da região, eu moro em Mogi das Cruzes, então eu saio de Mogi por volta de cinco horas da manhã, estudo aqui no campus do Tatuapé, né, na UNIP, fazendo minha especialização ali, aí estudo até o meio-dia, aí saio do Tatuapé, chego na zona cerealista por volta de uma hora e fico até as seis da tarde, aí a gente fecha a loja, aí eu volto pra Mogi oito horas da noite. Então, de segunda a sexta a minha vida é dividida entre a faculdade, a zona cerealista e a minha casa, de fim-de-semana a gente tem atividades voluntárias, eu mesma não trabalho de sábado, aí faço uma atividade voluntária com o pessoal da AACC, que é a Associação de Crianças com Câncer aqui na parte de nutrição pra oncologia pediátrica, e domingo é o dia que eu tiro livre, que é meu, pra eu curtir minha casa, a minha vida, passear e ficar com as pessoas que eu amo.
P/1 – E então, o que que você faz nessas horas de lazer, o que você costuma fazer?
R – Então, nas horas de lazer, geralmente eu não consigo me desprender dos meus hábitos, né? Eu gosto muito de ler, nas minhas horas de lazer, o que eu mais faço é ler, eu tenho acesso a todas as redes sociais, tudo, mas eu não sou muito apegada com computador. No meu lazer eu gosto de fazer caminhada, já participei, esse ano participei da maratona do Ibirapuera, gosto muito de correr, gosto muito de fazer rapel, algumas atividades diferentes, né, inclusive a gente vai até saltar de paraquedas mais pra frente, então, nas horas vagas eu gosto muito de ler, fazer caminhada, participar de maratona e estar entre amigos, gosto muito de conversar, bater papo, nunca sem fugir da parte profissional, que é a área de saúde que, pra mim, é a melhor que tem.
P/1 – E de fazer compras, você não gosta?
R – Muito difícil, o pessoal pergunta isso pra mim, eu sou aquela mulher que não nasci pra shopping, não sei nem andar em shopping, na realidade. Shopping eu vou geralmente direcionada a alguma livraria, alguém fala: “Ai, eu vi tal livro, vai lá pra você ver”, aí eu pego e vou, eu não sei andar muito, agora se você falar pra mim: “Ai, aonde você compra um óleo essencial, uma essência?”, eu sei tudo, da zona cerealista pra Silveira Martins, que é Praça da Sé, nossa, eu conheço todos os comércios. Agora como, pra andar assim, não. Compra, eu gosto de fazer sim, mas não aqui. Por exemplo, quando eu tenho a oportunidade de viajar, fazer uma viagem pra fora, é melhor em questão de valores, preços de mercadoria, a gente paga um preço melhor.
P/1 – E nesse seu cotidiano de Mogi das Cruzes, Brás, zona cerealista, você continua utilizando o trem ou você já encontrou alternativas de transporte?
R – Então, eu continuo utilizando o trem, mas hoje eu tenho alternativas que não seriam meios de transporte, seriam de hospedagem, eu tenho duas pessoas aqui em São Paulo que me recebem muito bem, uma é a Lurdinha Vasconcelos aqui da Vila Matilde, uma amiga que sempre abriu a casa dela, porque tem me ajudado muito no decorrer desses anos, que a gente convive há muito tempo, e às vezes eu fico aqui em São Paulo na casa dela, então fica mais fácil o acesso, porque é Vila Matilde, eu só pego o metrô, né, saindo da Vila Matilde, indo até a zona cerealista, e outra é a minha tia, que também mora na Vila Matilde, a Selma, mas pra mim, a minha melhor opção ainda é o trem, devido à faculdade, né, o acesso é bem mais fácil.
P/1 – Mas é o que a gente falou, a zona cerealista, por ser um polo de comércio, então ela acaba ultrapassando esses limites do trânsito, as pessoas se deslocam, mesmo que tenha o trânsito, pra consumir. Mas no caso, você vê alguma perspectiva de mudança se criassem novas alternativas pra se chegar àquela região? Um aumento de clientes... você vê essa perspectiva?
R – Oh, a perspectiva que eu vejo, que acho que todo comerciante ali da zona cerealista sonha é com o desafogar a Avenida do Estado, porque o nosso maior problema na zona cerealista é a Avenida do Estado. O trânsito é muito grande, porque a Avenida do Estado, ela liga Santana a alguns outros pontos, né, então quem vai pra zona norte pega muito trânsito, então ele, até a pessoa chegar em Santana, a Avenida do Estado é muito parada, então aquele fluxo, ali, que sai Senador Queirós, Avenida Mercúrio, Rua do Gasômetro, que vai se dividir pra quem vai pra zona norte, zona sul e zona central, é um trevinho, que eu falo pra você, é fechado. O nosso sonho é que eles tirassem, tipo, aquele modelo de rotatória que tem e que estabelecessem uma via como se fosse um monotrilho, passasse por cima, que por terra a gente não tem condições, seria mais fácil. O que a gente tem problema é o pessoal que vem do Sacomã, Vila Madalena, pessoal que frequenta hoje a linha amarela, tem muita dificuldade de se localizar na zona cerealista.
P/1 – Existe algum movimento dos comerciantes da região pra que se criem essas alternativas de transporte?
R – Sim, a gente tem, a gente graças a Deus tem conseguido muito retorno, né, em todos esses anos o maior, como que eu posso te dizer, a maior vitória que a gente teve foi a demolição do Treme-treme, né, que era aquele prédio muito mal habitado, porque tipo já não tinham mais moradores, tinham muitas pessoas da Cracolândia que estavam migrando para aquela região, assaltos, então eles demoliram o Treme-treme, e com ele, entrou um projeto de fazer como se fosse um estacionamento pro Mercado Municipal, eles querem fazer uma plataforma pra desafogar um pouco o trânsito, e os carros vão sair, interligar, saindo da zona cerealista e cruzando por cima do Mercado Municipal. Eu não vejo como eles vão fazer isso, mas eles já tem todo esse projeto, né, de estar mudando essas coisas.
P/1 – Agora uma pergunta de cunho bem pessoal, você ainda é muito jovem, acho, pra ter filhos.
R – Sim.
P/1 – Mas se tiver filhos um dia gostaria que eles se encaminhassem pra essa atividade do comércio também, ou não?
R – Não, eu não sei, olha, a questão é , filhos eu ainda não tenho, pretendo sim tê-los, não sei se eu colocaria eles na linha do comércio, eu acho... Hoje eu vejo várias coisas agregadas, acho muito interessante, vejo a minha irmã que tem filho, meu sobrinho estuda. Eu, hoje, eu acho muito interessante os pais que tem filhos dão a oportunidade de fazer um curso de idiomas, mandam as crianças fazer um intercâmbio, porque a criança, quando, qualquer pessoa que tiver a oportunidade de fazer uma viagem pra um outro país, é muito interessante porque você volta com outras expectativas que às vezes você estando aqui sempre, você não tem. Você volta com outro tipo de olhar, então eu acho que se um dia eu tiver a oportunidade de ter um filho, eu gostaria de focar meu filho mais, assim, de fazer um intercâmbio, estudar fora, outras culturas, outros tipos de relacionamentos diferenciados, não ficar só a mesma, agregar sempre o conhecimento que eu tenho, não, eu quero que ele tenha o horizonte um pouco mais ampliado do que eu tive.
P/1 – E os planos pra você, Raquel, no futuro? Você agora voltou a estudar, tá trabalhando, mas qual o seu sonho, as suas perspectivas de futuro?
R – Olha, no momento, hoje, eu não consigo dizer alguma coisa. Eu tenho esse foco, porque eu sempre fui muito focada em algumas coisas, mas vai mudando. O meu orientador da faculdade, ele mesmo me falou: “Você vai mudar tudo isso”, porque quando eu entrei pra fazer a especialização eu falei: “Olha, eu quero ser, fazer especialização em alimentos sem glúten, eu quero desenvolver um produto sem glúten saboroso”, porque no começo hoje é difícil, você acha produtos sem glúten mas o pessoal acha que é produto pra doente, não tem gosto, não tem aparência, você não tem o prazer de comer, então eu sempre pensei : “Eu quero montar uma linha de desenvolvimento industrial de alimentos sem glúten”, isso foi quando eu entrei pra voltar a estudar. Aí, no meio do curso, eu comecei fazer voluntariado na AACC, que é filiada ao hospital GRAAC, hospital do câncer da criança aqui de São Paulo. Hoje eu já sou uma pessoa extremamente apaixonada pela área de oncologia pediátrica, então eu penso : “Gente, olha, depois que eu terminar isso, o curso, a especialização, eu acho que eu gostaria de trabalhar com crianças com câncer, fazendo cardápios específicos pra amenizar os efeitos da quimio e da radioterapia nas crianças”, só que eu não posso falar : “Olha, eu quero isso pra minha vida”, mas , a minha vida profissional, que eu penso sim, é , eu quero terminar, eu quero fazer uma pós-graduação, um doutorado, e eu sonho em lecionar uma matéria específica na faculdade, ligada a área de saúde, eu queria dar uma matéria especifica , focada na desintoxicação do organismo. Eu tenho muita vontade de dar aula, já faço um trabalho com uma turma de Teologia aqui em São Paulo, dando Teologia e nutrição pra que o pessoal aprenda a cozinhar e ter uma alimentação mais saudável, mas o meu foco ainda, eu penso em dar aula, lecionar e sempre ensinar as pessoas a fazer uma alimentação mais saudável.
P/1 – Tem alguma coisa que a gente não perguntou que você gostaria de abordar ou de deixar registrado, algo que você acha que tá faltando falar?
R – Família.
P/1 – O que que você gostaria de falar da sua família?
R – Não, eu acho... Igual você falou, né, foi uma coisa que a gente passou muito por cima, né? Eu acho que família é a base de tudo. Eu não me considero , uma super pessoa, não me considero uma mulher maravilha, mas acho que a família é tudo. Você pode ter os melhores cursos, morar fora, estudar, mas você não é nada se você não tiver uma pessoa, como, se for um pai, uma mãe, que te agregue um conhecimento, que te passe coisas de caráter, porque isso você não aprender numa faculdade, e nem num grupo de amigos, e nem numa vida social. E eu acho que a família, ela estabelece valores que você leva pra uma vida inteira. Então, eu penso assim, hoje se eu sou alguém, sou uma pessoa profissional, sou cabeça, sei dividir, sei pensar, foi porque a minha família me deu uma base. Meu pai, João Iba, e minha mãe, Eva Gonçalves Iba. Minha família, ela é a minha base de tudo, eu tive muitos professores na vida, mas os meus pais são a minha maior estrutura, que tudo que eu aprendi e que eu tenho até hoje, eu devo a eles.
P/1 – E o que que você achou de ter participado dessa entrevista, de ter falado sobre a sua vida, sobre a sua atividade, qual que é o balanço que você faz de ter participado desse projeto?
R – Ai, eu me senti muito lisonjeada, honrada com o convite, quando você, David, me ligou, conversou comigo, eu achei muito legal, o projeto de vocês em si é uma coisa maravilhosa, é levar um conhecimento maior e mais abrangente a pessoas que às vezes não vão ter esse conhecimento de outra forma, só vão ter através da pesquisa de vocês, que está sendo feita, eu acho que vocês devem continuar e cada vez mais vir a somar na vida das pessoas, que é um projeto muito legal e inovador. Eu gostei muito de ter participado, foi um prazer.
P/1 – Então, Raquel, em nome do Museu da Pessoa e do SESC São Paulo a gente agradece muito a sua participação, muito obrigado.
R – Obrigada, eu queria fazer só um agradecimento, se é que eu posso.
P/1 – Por favor.
R – Eu quero agradecer algumas pessoas, né, que me incentivaram muito pra estar aqui, eu quero agradecer um professor que é uma pessoa fantástica, é o professor Carlindo Baieda, que tem me incentivado, é meu professor de Bromatologia, tem me ajudado muito. Quero agradecer em primeiro lugar o César e a Maira que me cederam pra estar aqui hoje, né, na Casa de Saron, e em especial a uma pessoa que me apoia muito, tem me apoiado sempre, o Hilton Augusto da Costa, que é um dos proprietários do Cerealista Helena e a vocês, que me receberam tão bem, muito obrigado.
P/1 – Muito obrigado.
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