P/1 – Bom dia!
R – Bom dia.
P/1 – Gostaria de começar a nossa entrevista agradecendo pela presença da Sra. aqui. A gente começa a entrevista pedindo nome completo, data e local de nascimento.
R – Ok. Muito obrigada pelo convite. É um prazer estar aqui com vocês também, bom dia. Meu nome é Marcia Buckley, eu sou natural do Rio de Janeiro e nasci em 14 de novembro de 1959.
P/1 – E qual o nome dos seus pais?
R – Leda de Melo Mendonça e José Carlos Taranto de Mendonça.
P/1 – E qual a origem da sua família?
R – Olha, meus pais são do Rio de Janeiro. Meu pai na verdade é falecido, eles nasceram no Rio de Janeiro e a família deles também era aqui do Rio. Os meus bisavós maternos eram Polonês e Austríaco. Minha bisavó era Austríaca, meu bisavô do lado paterno era Italiano. Minha família tem várias origens, principalmente europeias, é uma filial da ONU [Organização das Nações Unidas], vamos dizer assim, tem muitas nacionalidades misturadas (risos).
P/1 – Você se lembra de sua infância? Como que era a sua casa, o lugar onde a Sra. morava...
R – Eu nasci no Rio mas cresci em Volta Redonda, que meu pai trabalhava na Companhia Siderúrgica, lá. Volta Redonda é uma cidade interessante, pelo menos na época. Era bem interessante porque ela foi uma cidade planejada, foi uma cidade construída em função da usina, que por sua vez, foi construída pela US Steel, pra produzir aço para construção de navios da Segunda Guerra. A cidade era bem americanizada, as ruas eram com números, muito organizada, agora já está um pouco mais descaracterizada, mas na época era uma cidade bem americanizada e tinha um afluxo muito grande de americanos. E esse foi um dos motivos também que me fez, ainda quando pequena, ter interesse em conhecer os Estados Unidos, viajar e tudo mais.
P/1 – E quais eram as brincadeira preferidas?
R – Quando pequena eu andava muito de bicicleta. Eu era uma menina que gostava de brincar muito com os meninos, soltar pipa, jogar futebol, mas principalmente bicicleta, andava muito de bicicleta.
P/1 – Tem alguma história marcante da sua infância?
R – História marcante da minha infância. Teve uma vez, eu era muito pequena, eu fugi de casa, quer dizer fugi de casa entre aspas, porque eu fui atrás do meu avô. Nossa casa era numa rua transversal, mas as paralelas eram avenidas muito movimentadas e na época na cidade estava havendo sequestro de criança. Minha mãe quando me pegou, brigou muito comigo e falou que a mulher das galinhas ia me levar. Eu nunca mais esqueci aquilo. Eu lembro até a roupa que eu usava (risos), pra você ter ideia como ficou marcante. Essa mulher, aparentemente, era uma mulher que andava com uma sacola com galinhas e a bronca da minha mãe foi "a mulher das galinhas".
P/2 – Você tinha irmãos?
R – Eu tenho uma irmã só, do primeiro casamento. Depois meu pai se casou e eu tenho dois irmãos do segundo casamento, sendo que um é falecido.
P/1 – E, você tem alguma lembrança do período escolar? E como que foi a sua entrada na escola, foi em Volta Redonda?
R – Foi em Volta Redonda, Eu saí de Volta Redonda para o intercâmbio. Eu sempre fui uma aluna muito aplicada, gostava muito de estudar e gostava muito de esportes também. Embora, eu estudasse num colégio católico só de meninas, não era uma escola com programa esportivo muito forte, mas eu sempre me voluntariava para participar das competições de natação, corrida, atletismo. Recentemente, no último mês de julho, nós fizemos um encontro da turma lá em Volta Redonda, missa na mesma capela, foi bem interessante...
P/1 – E nessa época, você já sabia o que queria ser quando crescer? Pensava em ser alguma coisa ligada ao esporte?
R – Não, na verdade a minha primeira tendência foi para Medicina. Mas depois, eu sempre gostei muito e tenho facilidade com idiomas, foi uma coisa natural. A minha profissão hoje de uma certa forma é consequência do intercâmbio e dessa habilidade, vamos dizer assim.
P/1 – E o contato com outro idioma acontece quando? Na adolescência?
R – Sim. Como lhe falei, lá em Volta Redonda havia um afluxo muito grande de estrangeiros. E eu fiz amizade com uma menina americana, o nome dela era Tracy. Nós duas tínhamos 11 par 12 anos e era aquela empatia mesmo. Ela não falava português e eu não falava inglês, só aquele inglêzinho de escola e um dia ela telefonou lá pra minha casa e eu falei algumas palavras em inglês com ela, e aí meu pai: "ah, minha filha fala inglês" (risos). Me colocaram num cursinho de Inglês e quando eu tinha 14 anos me convidaram pra dar aula. Era interessante porque eu com 14 dava aula pra crianças de oito, nove, quase da mesma idade. Eu comecei a dar aula de inglês com 14 anos.
P/1 – E como seguiu a sua trajetória escolar?
R – Bom, no AFS era um mini vestibular. Eu estudei no Colégio Nossa Senhora do Rosário até o segundo ano do Ensino médio. E no terceiro ano, que era o ano em que o AFS fazia provas, eu fiz a seleção do AFS. Eu me lembro que em uma das salas onde eu fiz a seleção, eram mais de 30 candidatos e eram pouquíssimas vagas. Eram provas de Geografia, História, Inglês, conhecimentos gerais. Era uma seleção muito disputada e acirrada.
P/1 – Como que você conheceu o AFS? Ficou sabendo do processo seletivo?
R – Através de outras meninas na escola, que viajaram. Inclusive a minha irmã mais velha. Eram colegas dela de turma que foram, viajaram e retornaram e eu fui também conhecendo a organização por meio delas.
P/1 – Era algo comum da escola onde você estudava, da cidade?
R – Não era muito comum. Na cidade havia um glamour inerente a essa coisa de intercâmbio, mas como as vagas eram muito poucas, pouquíssimas pessoas viajavam. Você tinha em universo de mil e poucos alunos duas que tenham viajado. Mas mesmo assim, foi uma coisa interessante porque nós convivemos na mesma escola e elas fizeram algumas palestras com os alunos e foi nascendo o interesse em fazer o intercâmbio do AFS.
P/1 – Pra onde a Senhora foi?
R – Eu fui para Modesto, no estado da Califórnia. Vou até fazer um parênteses aqui dessa história, da minha história do AFS. Eu fiz a prova e entre o período em que você faz a prova e viaja efetivamente, existe quase um ano, entre uma coisa e outra. Nesse período, os meus pais se separaram. Nós passamos de um situação estável para uma situação caótica. Não tinha dinheiro para pagar o intercâmbio. E os voluntários que tinham feito a minha seleção, se mobilizaram, entraram em contato com o AFS que era aqui no Rio e eu fui chamada pra fazer uma reunião com a superintendente, que era na época a Liliane Costa Reis. Era lá no Flamengo o escritório. Eu vim de Volta Redonda sozinha pra fazer essa entrevista, e o AFS me concedeu uma bolsa de 50% na época. Aí a família se cotizou, minha madrinha, meus avós, todo mundo. Fizemos uma vaquinha e eu tinha um dinheirinho guardado das minhas aulas de Inglês e nós conseguimos pagar o intercâmbio. Eu fui para Califórnia e depois de muito tempo que eu já estava lá eu vim a saber que meu pai americano também tinha perdido o emprego pouco antes de eu chegar e eles quase que desistiram, mas pensaram bem como isso impactaria a pessoa do outro lado que seria eu e resolveram prosseguir com o compromisso deles. Eu fui pra uma casa em que a mãe era professora de música, o pai contador. Eram três filhas, sendo que só uma morava em casa. E foi uma experiência muito marcante, uma experiência sem preço porque durante o intercâmbio você não só viaja, aprende um outro idioma, você convive com uma outra família, tem a vivência do cotidiano de uma escola diferente, eu tive a oportunidade de conhecer muitas pessoas, de colocar em prática uma poesia do Mário Quintana, que é: "a amizade é um amor que nunca morre". Nesse período, cultivei amizades e mantenho essas amizades vivas, muitas delas até hoje, principalmente com a minha família. Nós já viajamos juntos, de férias, eles já vieram ao Brasil várias vezes, eu já retornei algumas vezes também. A experiência nos Estados Unidos, no meu intercâmbio, e como em todos os intercâmbios, eu costumo dizer que a experiência é a mesma, muda só a intensidade porque a sensibilidade de cada um é diferente. Mas, eu sou muito grata ao AFS até hoje, trabalho como voluntária pro AFS, estou sempre disposta a ajudar porque eu sei o bem que me fez. E estou indo pra Macapá hoje, para ajudar na seleção de candidatos, porque eu quero também que essas pessoas usufruam.
P/1 – Antes da gente avançar na sua história com o AFS, queria saber como que foi a chegada, o primeiro momento. Houve alguma dificuldade? Porque você já falava inglês, um outro tipo de estranhamento, com os hábitos e costumes distintos?
R – Eu não tive muitas dificuldades porque era a realização de um sonho. É uma coisa que eu queria muito, eu não via dificuldade em nada, pra mim aquilo tudo era diferente, só era diferente. Eu me lembro que quando eu cheguei, já cheguei balançando uma bandeirinha do Brasil e a minha família me acolheu muito calorosamente. Alguns dias depois, eles tinham um trailer e nos fizemos uma viagem de carro pela Califórnia, eles tentaram me mostrar o estado. Nós fomos à São Francisco várias vezes, que era uma cidade próxima. Eles estavam sempre tentando me mostrar coisas sobre os Estados Unidos, falando da história dos EUA. Eles conversavam muito comigo sobre a estrutura socioeconômica, eles foram muito didáticos comigo. Na questão do inglês foi interessante porque meu pai americano é ex-militar e tinha na época um seriado chamado MASH que é tipo uma comédia. O cenário é um grupo de serviço, atendimento médico, cirúrgico, na Guerra da Coréia, são situações engraçadas, mas eu levei quase seis meses para entender as piadas. Eu vi que eu falava inglês, mas tinha muita coisa que eu não sabia, com o convívio eu fui aprendendo, comecei a rir das piadas da comédia, que eram coisas muito sutis, que você tinha que ter um entendimento até da cultura pra poder entender o que eles estavam falando.
P/1 – E você foi por qual programa?
R – Pelo AFS.
P/1 – Sim, mas tinha algum programa específico?
R – Ah, sim. Na época chamava-se World Program. Era o programa anual, eu não creio que na época eles tivessem semestral, acho que só tinha anual mesmo.
P/1 – E você foi estudar em alguma escola americana?
R – Sim, sim. O programa é um programa escolar, continua sendo até hoje pra faixa etária. Você passa um ano frequentando, quer dizer, um ano letivo numa escola americana. Eu estudei na Grace M. Davis High School e fiz parte do time do Volei. Nosso time ficou em segundo lugar no estado, naquele ano. Inclusive até me ofereceram uma bolsa de estudos para uma universidade, que eu não pude aceitar, mas participei do coral (risos), eu era uma intercambista que participava de tudo: "olha vai ter uma competição de natação na Baía da Guanabara, você quer ir?", "eu vou". As coisas que me chamavam pra fazer, passeios, volei, joguei basquete, cantava no coral da igreja, minha mãe era condutora do coral. Fiz umas aulas muito interessantes na escola, na época datilografia, aprendi a datilografar, tanto é que até hoje eu não consigo digitar em teclado ABNT [Associação Brasileira de Normas Técnicas], porque eu aprendi no teclado americano. Fiz uma aula também muito interessante, que era uma aula de Literatura, mas com analogia ao cinema.
P/1 – Você fez bastante amizade durante esse período?
R – Sim, sim. Fiz muitas amizades. Infelizmente, com o tempo você acaba perdendo alguns contatos, mas eu tive a oportunidade agora, nesse último mês de outubro, de retornar à minha família e participar das comemorações das bodas de Diamante deles e pude revê-los. Inclusive foi surpresa, eles não sabiam que eu ia, rever algumas pessoas da época de escola também.
P/1 – E como que você foi recebida na escola? Há uma mudança a partir do momento em que ingressa na escola do país onde você está, há uma rede? Começa a se abrir uma rede de sociabilidade? Ou não?
R – A estrutura dentro das escolas dos Estados Unidos, existe um clube AFS, as pessoas que já participaram, simpatizantes, fazem parte. Existe um suporte muito grande dos professores. E quando você vai, chega, eles apresentam a escola inteira, que tem tipo uma assembleia geral, o diretor da escola diz: "Olha, essa aqui é a Marcia, ela é do Brasil, toda cortesia será bem vinda", esse tipo de coisas. Às vezes as pessoas encontravam comigo no corredor: "Ah, você é a estudante brasileira, e tal?” Nas aulas também me perguntavam muito sobre o Brasil, eu tive uma acolhida muito boa. A infraestrutura, tanto do AFS lá, como organização acolhedora, hospedeira, quanto da escola, da família, todos foram muito, muito, muito importantes e me deram um apoio enorme.
P/1 – O que mais te marcou desse período? Você foi em 1977 e voltou em 1978.
R – 1977, correto.
P/1 – Você sentiu alguma diferença em seguida, na sua volta?
R – No retorno?
P/1 – Isso...
R – Ah, sim. Eu sempre digo que o choque cultural da volta é pior do que o da ida porque da ida você de certa forma já está preparado psicologicamente para o novo, para o desafio. A volta, eu me recordo que a primeira coisa que eu vi que foi um balde de água fria, foi a favela da Maré. Você já sai do aeroporto, vem de um país todo organizado, limpo, que existe pobreza sim, mas você não vê tanto, e não assim tão abertamente. Foi um choque muito grande essa volta. Quando eu voltei a minha mãe já tinha mudado pro Rio [Rio de Janeiro], não retornei pra Volta Redonda, pros meus amigos, minha escola, essa parte toda do passado ficou pra lá e eu comecei realmente uma vida nova aqui no Rio também. Foi uma outra etapa a ser galgada, foram novas dificuldades, vestibular, estudar, trabalhar e tudo mais.
P/1 – Como que foi escolher uma profissão? Entrar na universidade?
R – Quando eu fiz vestibular, eu fiz para Comunicação. Eu passei na PUC [Pontifícia Universidade Católica], até passei bem, a escola que eu estudei em Volta Redonda me deu muita base, passei bem no vestibular, mas eu não me identifiquei muito com os alunos em geral. Na época tinha até um quadro do Jô Soares, ele falava que fazia Comunicação na PUC, não sei se vocês já viram essa quadro. Tinha umas pessoas muito doidas e eu comecei a me perguntar: "Poxa, não é exatamente isso que eu quero". Eu queria ser jornalista, comecei com Medicina, depois mudei para jornalismo, por essa questão de viajar, ser correspondente internacional, esses sonhos de jovem e comecei a ver que não ia ser bem assim. E na época, a PUC oferecia só Administração de Empresas, Comunicação e mais um outro curso que não me recordo agora à noite. Eu trabalhava durante o dia então eu passei para Administração de empresas. Eu já estava trabalhando na época como Assistente do Gerente Geral de uma empresa de serviços de petróleo. A Administração de Empresas, na verdade, já se encaixava melhor com a minha realidade naquele momento. Só que acabou que eu tranquei a matrícula e fui embora pra Macaé anos depois e acabei fazendo Letras lá, onde eu me formei pela Faculdade de Filosofia e Letras de Macaé.
P/1 – Fale um pouquinho desse período de faculdade? Como que foi? A relação com os amigos, família e também, que foi logo depois do intercâmbio.
R – Minha época de faculdade foi uma época muito corrida porque eu trabalhava o dia inteiro, chegava e ia pra faculdade à noite, cansada. Nós tínhamos um grupinho amigo, mas não era, você não tinha nem tempo de socializar muito. Eu me casei dois anos depois e começou a ficar mais complicado ainda. E depois que eu engravidei, que eu já estava prestes a ter o bebê, tranquei a matrícula.
P/1 – E qual foi a decisão de ir para Macaé? Por que ir para Macaé?
R – Por que ir pra Macaé? Bem, meu marido trabalhava numa empresa ligada a petróleo, de serviços de petróleo e em 1984 ele foi transferido para os Estados Unidos. Nós ficamos lá, de 1984 a 1985, no Texas. E em 1985 ele teve convite para retornar ao Brasil. Nós voltamos para o Rio e alguns meses depois ele foi solicitado a ir para Macaé, onde a maior parte das atividades ocorriam em Macaé, não havia sentido ele estar no Rio quando o trabalho acontecia em Macaé. Nós fomos pra lá em 1986.
P/1 – Só um detalhe: esse emprego de Assistente Geral de serviço de petróleo foi o primeiro emprego da Senhora?
R – Não, eu comecei dando aula de Inglês...
P/1 – Isso...
R – A minha carteira é assinada...
P/1 – Ah, é assinada?
R – Não como professora de Inglês que não podia...
P/1 – É não podia, era errado.
R – Não podia com 14 anos...
P/1 – Era menor, né? (risos)
R – Era menor, inclusive minha mãe teve que ir comigo para tirar carteira profissional. Depois quando retornei do intercâmbio, eu trabalhei numa imobiliária durante pouco tempo e eu não estava feliz com a situação. Eu tinha já marcado três entrevistas de emprego para o mesmo dia, uma era na Varig, pra ser aeromoça, uma na H.Stern, que seria um trabalho de meio expediente e uma nessa empresa aqui de serviços de petróleo e eu fui contratada logo na primeira entrevista, que foi nessa última empresa. Eu trabalhei lá e fui assistente do Gerente Geral.
P/1 – E aí, quando vai para Macaé?
R – Eu já não trabalhava mais...
P/1 – Como que ficou a sua vida em Macaé?
R – Bom a minha vida em Macaé... Na época era uma cidade com muitos estrangeiros. A comunidade estrangeira era bem numerosa e era bem interessante porque as pessoas se reuniam muito. Como a cidade não oferecia muito lazer, as pessoas se reuniam em jantares e as mulheres faziam muito trabalho filantrópico. Eu fui uma das fundadoras do Macaé International Women’s Club, do qual eu participei até pouco tempo. E nós fazíamos atividade de arrecadação de fundos e revertíamos para as instituições. Na verdade nós não dávamos o dinheiro, nós comprávamos o que eles precisavam, por exemplo: em Macaé tem a Associação Macaense de Apoio aos Cegos. Eles precisavam de material de informática e gravação pra áudio livros e nós compramos todo material. Então, creches: "Olha, precisamos de colchões pra berço". Nós íamos e comprávamos. É bem interessante o trabalho feito e eu também fui uma das fundadoras do Comitê Macaé do AFS, e comecei a trabalhar com bastante afinco, mas foi em 1990 que nós abrimos o comitê em Macaé.
P/1 – Fala um pouquinho sobre esse período, como ele foi fundado?
R – Ah, foi bem interessante porque o AFS na verdade é uma confraria. Você quando encontra uma pessoa, a pessoa vê, reconhece o logo e "você fez AFS eu também", a amizade instantânea. Eu tinha ido pra um churrasco e comecei a conversar com um casal, ela brasileira e ele Irlandês. Descobri que eles tinham se conhecido no intercâmbio, ambos tinham feito AFS, e surgiu a ideia de abrir o comitê em Macaé. Eu sempre andava com um pin ou alguma coisa do AFS. Um dia fui abastecer o carro no posto de gasolina, a dona do posto me viu, veio, olhou e disse: "Você fez AFS?", "Sim, eu também". E nós nos tornamos melhoras amigas, a Maria Teresa, ela sempre foi meu braço direito no comitê. Nós fazíamos as entrevistas juntas, é Chitãozinho e Xororó, nós nos apelidamos. O comitê floresceu, eu fui presidente do Comitê Macaé durante 20 anos. Tirei um ano dia de folga, vamos dizer assim, fazendo parte do Conselho Fiscal do AFS, voltei para a presidência do comitê Macaé, depois fiz parte do Conselho Diretor e fui Presidente do AFS até o final do ano passado.
P/1 – E em qual período você foi fundadora do Comitê?
R – Nós fundamos em 1990 e recebemos o primeiro estudante. Que começa com uma representação e depois que você recebe o primeiro estudante passa ser comitê. Existe uma votação, é mais ou menos assim que funciona. Nós recebemos, a minha família acolheu o primeiro estudante de Macaé, que foi um Islandês, é um viking, 1,90m, ruivo. E foi bem interessante, que meu filho na época, o Mário, tinha 11 anos, ele era filho único e automaticamente, ele passou ser o caçula, ele tinha um irmão mais velho. Foi uma experiência bem legal pra ele também.
P/1 – E dessa experiência, porque você nesse momento já era voluntária do comitê. Como que foi essa experiência de ser também família hospedeira?
R – Muito interessante porque eu já tinha vivido a experiência. Você vê o outro lado. Na verdade, eu vivenciei três facetas do AFS: como participante, como mãe hospedeira e como mãe de participante, que meu filho também fez AFS.
P/2 – E pra onde ele foi?
R – Ele foi para o estado de Maryland. Também teve uma experiência fantástica, porque de filho único passou automaticamente a mais velho de cinco, até trocar fralda ele aprendeu no intercâmbio.
P/1 – Mas voltando a essa experiência, como que foi hospedar uma pessoa da Islândia, por exemplo?
R – Da Islândia? Foi muito bom. Era um rapaz muito solícito, ele que gostava de sair pras baladas como qualquer jovem da idade dele. Mas nós mantemos contato até hoje, ele é pai de quatro filhos, a gente se comunica mais por Facebook agora, mas a experiência foi muito positiva.
P/1 – Mas teve algum estranhamento inicial, pela diferença cultural?
R – Existe sim uma diferença, mas eu acho que essa questão do carinho. O AFS ensina você a ver o mundo de uma forma diferente, você passa ver mundo com mais tolerância, passa a ver que as diferenças são importantes pra nossa sociedade, você passa ser tolerante com essas diferenças, respeitar essas diferenças. Com essa visão, mesmo que você tenha uma divergência cultural, vamos dizer assim, isso tudo é superável porque é uma questão de diálogo você entender porque daquilo. Esse é um dos motivos que o trabalho com tanto amor e carinho pra essa organização. Essa questão da solidariedade, de você tentar entender as pessoas pelo que elas são e não com olhos de crítica mas de aprendizado.
P/1 – O que é ser voluntário do AFS?
R – Olha, ser voluntário do AFS é uma grande oportunidade de você colocar em prática tudo isso que eu falei. Te dá essa oportunidade de você conhecer outras pessoas, de aprender outros modos de se viver, não existe o certo e errado, existe o diferente. Se todas as pessoas tivessem essa visão, nós não teríamos hoje esses ataques por religião, não teríamos racismo, intolerância que a gente vê hoje em dia no mundo.
P/1 – E como que foi ser fundadora do comitê Macaé e depois passar para o conselho. Quando você passa para o Conselho Fiscal e depois Conselho Diretor, você já está lindando com algo nacional. Você sai de uma esfera local e regional pra uma esfera nacional. Fala um pouco sobre como o AFS atua nesse sentido nacional em relação aos comitês...
R – O comitê, na verdade é um órgão executivo porque o Conselho Diretor cria as políticas. A Secretaria Executiva é o braço executivo dessas políticas a nível nacional. Eles tem o staff, eles que fazem tudo acontecer, mas as políticas surgem da comunicação da Secretaria Executiva, dos voluntários com conselho e o conselho crias políticas. O Conselho Diretor, na verdade, é o órgão legislativo. Foi muito interessante porque com a bagagem que eu tinha desses 20 anos de mão na massa, ver o quê que funciona, a seleção, as orientações. Tudo isso acaba refletindo... Tem sempre alguma coisa que você pode ajustar, as políticas de tempos em tempos tem que ser revistas. Até pra se adequarem à nova realidade, até estruturais mesmo da organização. Foi um passo bem interessante. Eu servi no Conselho Diretor durante três anos e fui presidente do AFS durante um ano, que foi último ano do meu mandato. Foi uma forma de você ver a organização de um outro ângulo, ajudar a criar os mecanismos pra que ela consiga e continue sendo uma organização líder no mercado de aprendizagem intercultural.
P/2 – Quais foram os desafios que vocês enfrentaram sendo líderes desse comitê?
R – Os desafios que você se depara são geográficos. Você tem um país de dimensões continentais, com diferenças culturais dentro de nós mesmos e realidades diferentes. Às vezes, o que funciona em Caicó não funciona no Comitê de Lages. É interessante você tentar agradar a todos e criar mecanismos, políticas que possam ser executadas por todos uniformemente. Isso aí é um desafio. Nós todos trabalhamos muito bem juntos, procuramos deixar à parte as questões de personalidade e preferências, em busca de desse quadro maior, a gente tem que ver o quadro maior. O bem do AFS que é objetivo final. Eu diria que o desafio geográfico e cultural dentro do próprio país é o maior desafio.
P/1 – E como que é ser Presidente do AFS?
R – Olha, é uma honra. Eu tive uma experiência muito boa de lidar cotidianamente com a Andreza, com o staff aqui, com os colegas do conselho diretor também. De participar das festividades do centenário do AFS em Paris, foi um prazer muito grande, uma satisfação pessoal muito grande de poder doar esse meu tempo, essa minha energia para a organização.
P/1 – A Senhora foi a primeira mulher a ser Presidente do AFS?
R – Não, não. Eu acho que primeira a primeira mulher Presidente do AFS foi Teresa Baumotte, mas eu não tenho certeza. Desde a época que eu ingressei, ela foi a única mulher que eu vi como Presidente.
P/1 – Quais são as atribuições do Presidente do AFS?
R – Em primeiro lugar, você é representante da organização em todas as esferas, inclusive jurídicas. Você é o maestro da orquestra, você cria as pautas, media discussões, cria grupos de trabalho, tudo é feito consensualmente, mas como em qualquer conselho você tem que ter uma liderança que possa distribuir as responsabilidades, delegar e distribuir as atribuições também. É basicamente isso, é você coordenar os afazeres do Conselho Diretor.
P/1 – E o Presidente ele é eleito por qual órgãos?
R – Dentro do AFS os presidentes do comitê é que votam. Os comitês se reúnem com seus voluntários, debatem, existe todo um processo eleitoral por trás disso: as pessoas se candidatam, preenchem uma ficha que é padronizada, existe um debate, mas quem vota nos candidatos são os presidentes dos comitês.
P/1 – O que significou pra Sra. ser Presidente?
R – Do AFS? Como eu te falei, foi uma honra muito grande, você poder devolver um pouquinho daquilo, eu estou aqui hoje porque outros voluntários fizeram por mim muita coisa boa, é uma forma de devolver.
P/1 – E a Senhora foi recompensada por tantos anos de trabalho voluntário, não foi? Foi vencedora de prêmios?
R – Em 2008 eu recebi o Prêmio Galatti, que é um prêmio internacional concedido aos voluntários. São dois a três voluntários no mundo que são escolhidos e em 2008 recebi esse prêmio com muito orgulho. Recebi também o prêmio Tachi Cazal que também é por destaque no voluntarismo. Recebi alguns prêmios regionais também, como voluntária destaque, mas o prêmio maior, eu acho que é essa satisfação de você trabalhar, de ver jovens desabrocharem. Em Macaé, nós já mandamos mais de 200 pra fora, eu me sinto um pouco mãe de todos eles. Nós tivemos uma experiência muito interessante, quando o comitê de Macaé fez 20 anos, os jovens queriam uma festa, "ótimo, fazemos festa!", mas a festa acabou, você só tem as fotografias. "Vamos fazer uma coisa mais indelével, mais ousada, vamos juntar dinheiro e vamos mandar uma criança carente para fora" e assim foi. Nós fizemos livro de ouro, fizemos festa, na minha família não houve presente, qualquer tipo de presente de natal, aniversário, era doação. Nós conseguimos arrecadar 13.800 reais na época e pagamos o intercâmbio para um jovem. Essa seleção da qual eu participe, foi uma coisa muito impactante porque os candidatos... Nós tínhamos um limite de renda, todos eles eram jovens que não teriam condição de pagar o intercâmbio, tinham que ter notas, eles tinham uma série de pré-requisitos e nós tivemos 12 finalistas de excelente calibre, de você ficar com coração apertado de só ter um. E na seleção, uma menina chamada Giulia... Uma das fases da seleção é a auto seleção, na qual você coloca todos os candidatos como se fosse um debate político e eles tem dizer porque que ele ou ela é merecedora aquela bolsa. E essa menina começou com um discurso, com uma extrema humildade, dizendo que todos eram capazes, que todos eram merecedores. E aquilo me deixou muito emocionada. Eu pensei comigo "é ela". Nós tínhamos outros selecionadores na hora também e ela ganhou a bolsa. Ela foi pra República Tcheca, nós pagamos o intercâmbio dela, mala, passaporte, visto e ainda levou foram 500 Euros, uma quantia em dinheiro para gastar. Uma questão interessante dessa menina: no dia da seleção ela morava numa favela em Macaé e essa favela foi invadida pela polícia. No dia da seleção a mãe ligou pra mim e falou assim "olha, a Giulia não vai poder participar". Eu escutava os tiros "pá-pá" e a menina "não, mãe, é a chance da minha vida, você tem que deixar eu ir", eu falei: "Meu Deus do céu, quê que eu faço agora?”. Eu falei: "Não, fica calma, fala com a Giulia que a gente dá um jeito". Sabendo que não ia ter como porque era edital, não ia ter como fazer a prova com ela, eles teriam que arrumar uma solução. Mas o pai dela conseguiu uma moto emprestada, saiu por umas vielas alternativas lá da favela e a menina chegou pra seleção. Eu acho que tudo conspirou, o universo conspirou pra ida dela. Hoje ela está cursando Relações Internacionais na Universidade Rural. Ela voltou da República Tcheca, falando Tcheco, que é uma língua extremamente difícil, falando inglês, deu aula de Inglês num curso, se não me engano foi o FISK, um desses cursos de inglês. Passou pra uma universidade Federal, mudou a vida dela. Como outros também, ela foi um dos expoentes da história do comitê Macaé. Nós temos também um outro rapaz, que é o Cleiton Pacheco, o pai dele era nível técnico da Petrobras e a mãe dele fez unha, era técnica de enfermagem e fez unha pra fora pra ajudar pagar o intercâmbio filho. Ele é um menino extremamente esforçado, ele estudava na escola técnica, que é gratuita e era bolsista numa escola particular, pra cursar as disciplinas que a escola técnica não tinha, que ele ia precisar no vestibular. Ele estudava em duas escolas. Foi para os Estados Unidos e o intercâmbio dele os pais pagaram. Chegou no Estados Unidos ele só tirava notas altas, chamou atenção da direção da escola. Terminando o ano escolar nos Estados Unidos, ele foi convidado a fazer o curso universitário. A família continuou acolhendo, comprou um carro velho pra ele se locomover. Ele fez a faculdade lá, terminando a faculdade, foi convidado a fazer medicina, que lá você cursa os quatro anos normais e depois que é você passa para a faculdade de Medicina. É cardiologista, especialista em marca-passo, é outra história de sucesso do AFS.
P/1 – Por que a Sra não continuou nos EUA?
R – Ah, sim. Foram duas coisas: primeiro que eu estava morrendo de saudade da minha família e segundo era uma questão financeira porque a minha bolsa seria pra jogar vôlei, eu teria que estudar, treinar e trabalhar em algum momento pra poder me sustentar. Essa equação não ia fechar nunca (risos). No momento, eu fiquei um pouco decepcionada, triste, mas hoje eu vejo que foi a coisa certa a fazer, vim embora, sou feliz e é isso que importa.
P/1 – E atualmente, você é Presidente do comitê de Macaé?
R – Não, não. Atualmente eu estou desempregada. No AFS eu sou voluntária, mas de tempos em tempos eu ajudo, como agora estou indo pra Macapá ajudar nessa seleção e quando precisam de alguma, chama-se uma consultoria, vamos dizer assim. Eles sabem que, quando precisam, podem contar comigo, que eu estou sempre disposta a ajudar.
P/1 – E qual é a sua atividade atual?
R – Eu sou tradutora, especialista na área de óleo e gás. Inclusive, eu tenho dois livros publicados, dois dicionários de termos técnicos publicados na área. Eu atuo como tradutora freelancer, na verdade, desde 1976, sou menina precoce. E eu adoro o que faço, é a minha profissão hoje, eu acho que até eu não conseguir mais digitar (risos).
P/1 – A gente está chegando no final da nossa entrevista, queria perguntar ainda algumas coisas de cunho pessoal. Você disse que tem filhos. Um já fez intercâmbio.
R – Só tenho um filho, Mário David.
P/1 – E ele faz?
R – Ele é Advogado, vai fazer 35 anos agora, está com 34 e meio (risos).
P/1 – E você é casada?
R – Sou casada, com um americano, há 35 anos.
P/1 – Tem netos?
R – Tenho duas netinhas lindas, a Lina e a Kailen, uma egípcia e uma texana (risos).
P/1 – Voltando, existe uma especificidade do comitê Macaé?
R – Olha, o comitê Macaé foi um comitê que começou pequenininho e houve um engajamento muito grande dos jovens. Nós chegamos a ser o maior Comitê do Brasil no momento. Teve um ano em que nós enviamos, se não me engano, 25 ou 27 candidatos. O comitê cresceu e passou até a ser referência nacional, mas tudo é um trabalho de grupo, não existe uma pessoa específica que tenha sido essencial. Todo grupo foi essencial para esse sucesso. Nós sempre tivemos esse reconhecimento das pessoas, eram jovens, universitários ou secundaristas, mesmo muito jovens, com muita responsabilidade e com muita seriedade no trato das coisas, dos afazeres do AFS.
P/1 – O que mais te marcou, porque foram quase 40 anos de contato com AFS. Foi bolsista, mas ainda continuava usando um broche...
R – Ah, sim...com muito orgulho (risos).
P/1 – Depois foi voluntária, mãe hospedeira, Presidente de Comitê, exerceu funções executivas, o que foi mais marcante disso tudo?
R – Eu acho que o mais marcante disso tudo é você ver que o Mario Quintana tinha razão: "Que a amizade é um amor que nunca morre". Você cultivar essas amizades, a acolhida, o retorno à minha família hospedeira, nós fizemos surpresa, chegamos lá, eles botaram no convite "a sua presença é o melhor presente". Então, eu abri a porta da casa como se lá morasse ainda e disse: "Olha, vocês falaram que a minha presença era o melhor presente: aqui estou!". As próprias reuniões do AFS, as comemorações do centenário. Você sentar na ambulância que uma vez esteve no fronte da Primeira Guerra Mundial. Uma ambulância bem antiga e você escutar as histórias dos motoristas de ambulância, ouvir deles como surgiu essa organização que é maravilhosa e como as pessoas até hoje empunham essa bandeira de solidariedade, tolerância, de paz mundial. Isso é muito legal.
P/1 – Teve alguma situação difícil? E como foi superada?
R – Difícil no meu intercâmbio ?
P/1 – Ao longo desses quase 40 anos?
R – Nós tivemos algumas situações, mas foi como eu te falei, tudo é contornável, você tem que ter a cabeça fria e ser sensata, ter sensatez. Há muitos anos atrás, telefone celular era uma coisa nova e um intercambista nosso se acidentou nos Estados Unidos. A família hospedeira dele veio a falecer, foi um acidente de carro. Foi primeiro de janeiro, me lembro, nós estávamos vindo pro Rio, pra um enterro de um tio que tinha morrido no dia 31 e no caminho, tocou aquele celular, aquele tijolão, que era antigamente, com a notícia de que o rapaz tinha se envolvido num acidente, e a você vê essa confiança que a gente tem no AFS, nos voluntários. Tudo foi tratado de uma forma extremamente profissional, ágil, antes de eu chegar aqui no Rio [Rio de Janeiro], já sabia o hospital que o menino tinha ido, pra passar pra família natural que não tinha acontecido nada com ele, só tinha machucado pé, mas nada grave. Foi um momento difícil e angustiante pra todos nós, saber que uma pessoa nossa lá fora, passando por um problema difícil, mas que foi contornado. Não me recordo de nenhum problema que eu tenha tido dentro do AFS, coisas assim, triviais, mas nunca tive nenhum problema, graças a Deus, eu acho que é em função também dessa nossa filosofia. Como eu te falei, é uma confraria, nós somos todos AFSers, em suma, nós somos todos a mesma coisa.
P/1 – E o que o AFS terá pra contar nos próximos anos? Qual será o futuro do AFS?
R – O futuro do AFS eu acho que é um futuro brilhante, porque a organização, ela é totalmente dependente dos voluntários, os voluntários é que fazem a organização. Todos trabalham com afinco, com toda essa energia, pra que os jovens que estão ingressando hoje tenham esse afinco e essa energia, pra perpetuar essa nossa missão de paz, mesmo.
P/1 – Gostaria de colocar alguma coisa?
P/2 – Eu só queria perguntar, que você citou que sua neta é Egípcia, queria que você contasse um pouquinho sobre isso.
R – Meu filho foi intercambista, como falei pra vocês. Ele estudou Direito aqui na Cândido Mendes e terminando estágio foi contratado por uma empresa também de serviço de petróleo e foi transferido para o Egito, ou logo depois. E o primeiro fim de semana que ele passou no Cairo ele conheceu a Hala que é esposa dele hoje. Ele se casaram seis meses depois, a minha netinha nasceu no Cairo, Alina, ela hoje está com cinco anos. E depois de cinco anos no Cairo, eles foram transferidos para Dubai, meu filho ficou lá dois anos com a família, e depois, foi transferido para os Estados Unidos, onde está por mais de dois anos.
P/1- Gostaria de contar mais alguma história, falar algo que não foi tratado...
R – Uma das experiências muito interessantes que eu tive foi ver as minhas duas mães juntas, isso é muito legal. Meu pai é falecido, mas a empatia das duas. Em 2012 nós retornamos à Califórnia, eu levei, inclusive, um grupo de amigos. Nós éramos nove pessoas, viajando juntos e a minha mãe hospedeira fez almoço pra todo mundo, foi muito interessante a minha mãe, Leda, ver onde a filha dormia, a casa onde eu morei, levei na escola, foi bem interessante a experiência que ela teve de ver o que eu vivi.
P/1- E por parte da sua família não houve uma reação, uma resistência a ir?
R – Não, pelo contrário. Sempre incentivaram muito, houve até uma vaquinha pra me ajudar a viajar. Todos ajudaram.
P/1- Não precisou aquela insistência de "eu quero, eu quero, eu quero!"?
R – Não e inclusive, eu posso lhe dizer por experiência própria não dá certo quando os pais insistem dos filhos participarem do intercâmbio. Nos tivemos um caso, lá em Macaé, que o rapaz não queria ir. Ele a princípio queria, mas depois arrumou uma namoradinha aí não queria mais viajar e os pais insistiram muito e ele não curtiu intercâmbio com uma pessoa que quer ir. Quando você quer ir é igual sapato aquele sapato lindo maravilhoso que você adora, mas aperta ali um pouquinho e você usa assim mesmo. É uma analogia prática do intercâmbio quando você quer mesmo as dificuldades por maiores que sejam elas nunca são grandes suficientes pra minar aquela felicidade, mas quando você não quer ir tudo até a coisa mais maravilhosa do mundo parece trivial e sem graça.
P/1- E o que acha de contar a história do AFS, deixar registrado a sua história como a de outros colaboradores, voluntários, deixar registrado a história das pessoas que construíram o AFS?
R - Eu acho essa iniciativa maravilhosa porque, como eu lhe disse, o AFS é uma organização muito especial e muito sui generis. São as pessoas que fazem a organização e nesse universo de AFSers, colaboradores e funcionários existem milhares de histórias. Muitas histórias de sucesso, encontros, eu acho que isso é um combustível, é uma energia que isso gera, muito grande, para as pessoas que não conhecem passarem a conhecer, se simpatizarem e quem sabe até se tornarem também voluntárias, outras escolas e pessoas envolvidas com escolas que virem essas entrevistas histórias, esses depoimentos também sensibilizem, abram as portas para os intercambistas, famílias que queiram abrir suas portas para receber um estudante. É um alicerce formado por vários pilares, você tem os voluntários, o staff, as escolas, as famílias, os participantes, as famílias dos participantes, as família dos que vão e dos que vem, são vários pilares e isso é bem bacana de mostrar todas essas nuances, todas essas facetas do AFS.
P/1- Como foi para você dar esse depoimento pra gente?
R - Foi uma honra muito grande, eu fiquei muito feliz de tudo ter se encaixado porque vir ao Rio, nem sempre é fácil, até por questão profissional e tudo mais. E calhou de ser um momento que estou em trânsito aqui pela cidade maravilhosa e ter essa oportunidade de conversar com vocês, foi muito bom.
P/1- Em nome do Museu da Pessoa, a gente gostaria de agradecer mais uma vez a sua presença e o depoimento, muito obrigada.
R - Eu gostaria de agradecer vocês todos que estão ouvindo, que ouçam esse depoimento. E vocês também pela entrevista e se precisarem de mais alguma informação, estou sempre à disposição, muito obrigada.
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