Projeto BNDES 50 Anos
Depoimento de Mariane Sardenberg Sussekind
Entrevistado por Solange Lisboa e Márcia Paiva
Rio de Janeiro, 25/04/2002.
Realização Museu da Pessoa
Entrevista BND_HV004
Transcrito por Marcília Ursini
Revisado por Gustavo Kazuo
P/1 – Solange Lisboa
P/2 – Márcia Paiva
R – Mariane Sardenberg Sussekind
P/1 – Mariane, me diga qual é o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Mariane Sardenberg Sussekind. Eu sou natural do Rio de Janeiro e minha data de nascimento é 22/2/1954.
P/1 – Qual é o nome dos seus pais?
R – Nome dos meus pais é Irto Sardenberg e Ruth Silveira da Mota Sardenberg.
P/1 – Você se lembra do nome dos seus avós?
R – É... Lembro sim. Os avós, por parte de mãe, é Davi e Walkíria Silveira da Mota, e por parte de pai é Olinto e Etelvina Sardenberg.
P/1 – E a atividade profissional do seu pai e avós?
R – Meu pai era Oficial do Exército.
P/1 – E seu avô, seus avós?
R – Meu avô... O pai do meu pai era Oficial do Exército. Ele inclusive... O meu pai foi filho póstumo porque o meu avô morreu, fixando fronteiras em Mato Grosso. E o pai da minha mãe, ele era... Ele trabalhava em cartório. Ele tinha um cartório em Curitiba, Paraná.
P/1 – Você tem quantos irmãos?
R – Nós somos quatro. Eu sou a caçula.
P/1 – Quatro. Sardenberg é da sua mãe?
R – Não.
P/1 – Do seu pai?
R – Sardenberg é meu nome de solteira, do meu pai, né? Minha mãe é Silveira da Mota.
P/1 – Silveira da Mota.
R – É.
P/1 – E o seu pai é de Curitiba... De...
R – Paraná, Curitiba.
P/1 – Do Paraná.
R - E minha mãe também.
P/1 – Sua mãe também. Agora, Mariana...
R – Mariane!
P/1 – Mariane. Eu gostaria...
R – Posso falar, né?
P/1 – Claro...
R - Depois vocês tiram.
P/1 – Mariane...
R – É, porque senão vai Mariana, daqui a pouco fala Mariângela, Marilene e eu sou ultra complacente com isso porque todo mundo lá em casa...
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Depoimento de Mariane Sardenberg Sussekind
Entrevistado por Solange Lisboa e Márcia Paiva
Rio de Janeiro, 25/04/2002.
Realização Museu da Pessoa
Entrevista BND_HV004
Transcrito por Marcília Ursini
Revisado por Gustavo Kazuo
P/1 – Solange Lisboa
P/2 – Márcia Paiva
R – Mariane Sardenberg Sussekind
P/1 – Mariane, me diga qual é o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Mariane Sardenberg Sussekind. Eu sou natural do Rio de Janeiro e minha data de nascimento é 22/2/1954.
P/1 – Qual é o nome dos seus pais?
R – Nome dos meus pais é Irto Sardenberg e Ruth Silveira da Mota Sardenberg.
P/1 – Você se lembra do nome dos seus avós?
R – É... Lembro sim. Os avós, por parte de mãe, é Davi e Walkíria Silveira da Mota, e por parte de pai é Olinto e Etelvina Sardenberg.
P/1 – E a atividade profissional do seu pai e avós?
R – Meu pai era Oficial do Exército.
P/1 – E seu avô, seus avós?
R – Meu avô... O pai do meu pai era Oficial do Exército. Ele inclusive... O meu pai foi filho póstumo porque o meu avô morreu, fixando fronteiras em Mato Grosso. E o pai da minha mãe, ele era... Ele trabalhava em cartório. Ele tinha um cartório em Curitiba, Paraná.
P/1 – Você tem quantos irmãos?
R – Nós somos quatro. Eu sou a caçula.
P/1 – Quatro. Sardenberg é da sua mãe?
R – Não.
P/1 – Do seu pai?
R – Sardenberg é meu nome de solteira, do meu pai, né? Minha mãe é Silveira da Mota.
P/1 – Silveira da Mota.
R – É.
P/1 – E o seu pai é de Curitiba... De...
R – Paraná, Curitiba.
P/1 – Do Paraná.
R - E minha mãe também.
P/1 – Sua mãe também. Agora, Mariana...
R – Mariane!
P/1 – Mariane. Eu gostaria...
R – Posso falar, né?
P/1 – Claro...
R - Depois vocês tiram.
P/1 – Mariane...
R – É, porque senão vai Mariana, daqui a pouco fala Mariângela, Marilene e eu sou ultra complacente com isso porque todo mundo lá em casa chamava Mari alguma coisa. Então, servia, entendeu? (risos) E aí, hoje em dia, eu falo "não, Mariane”.
P/2 – Qual são os nomes das irmãs?
R – É Marília, Marilda e Mariane. Ainda tinha uma prima Marisa. Então, o meu pai, por exemplo, jamais acertava.
P/1 – E o Sardenberg é de origem?
R – De origem suíço-alemão, mas longe. Ninguém tem sentimento, assim, de imigrante não, porque é bastante... Nós já estamos no Brasil há muitos anos.
P/1 – Mas você sabe... Muitos anos?
R – É.
P/1 – Quando?
R – Desde o Bloqueio Continental. Desde a época de Napoleão, Bloqueio Continental. Quando Dom João VI veio para o Brasil, veio o primeiro Sardenberg.
P/1 – Agora, eu gostaria que você me descrevesse um pouco a sua infância, sobre a sua infância, a rua onde você... A rua onde você morava, a casa da sua infância. Enfim, falasse sobre a sua infância.
R – Olha...
P/1 – Que bairro que você morava...
R – Olha, a minha infância foi... Uma infância ótima, graças a Deus. Estou até preocupada porque... (risos) Foi, eu acho que foi tudo bem, foi ótimo, foi... Eu morei em Copacabana durante toda a minha infância até me casar e, apesar de meu pai ser militar, como eu fui, já era mais, um pouco temporona assim, eu não me mudei várias vezes pelo Brasil. Já peguei uma época mais estável da vida da família e eu estudei muitos anos no mesmo colégio, que era na mesma rua, na Rua Toneleros. Eu estudava no Sacré-Coeur de Marie. Estudei dez anos lá. Depois, eu pelo Colégio Pedro Álvares Cabral, que também era em Copacabana e era um colégio público, excelente. E depois de lá eu já fui para a universidade, para a Faculdade de Direito. Então, foi uma infância, assim, de classe média de Rio de Janeiro com o que, na época a classe média do Rio de Janeiro tinha acesso, né? Quer dizer, não era exatamente essa sociedade de consumo hoje, mas era muito bom. Eu tenho ótimas recordações.
P/1 – E conte algumas dessas recordações?
R – Algumas dessas recordações de... Eu acho que a maior recordação, a melhor recordação que eu tenho era a minha família que jantava todo dia junto, às 19h00. Esse é o lado mais interessante de ter pai militar porque as coisas tinham, assim, uma previsibilidade grande com relação a horários e acontecimentos. E realmente, o jantar sempre foi um momento privilegiado na nossa casa, que era a hora que todos comíamos juntos. E mesmo eu sendo sempre a caçula e tal, eu podia participar das conversas e escutar as coisas que estavam acontecendo. E meu pai era uma pessoa muito interessada em... Assim com uma visão muito humanista das coisas. Então, eram conversas muito interessantes, que eu desde cedo gostava de ouvir. Depois mais tarde, de participar lá a minha maneira. Então, eu acho que essa é uma das melhores lembranças, esses jantares que nós tínhamos lá, né? E muitas outras coisas. Naquela época, todo mundo via televisão junto, né? Imagina, falava-se que a televisão desunia a família. Imagina, hoje em dia! Há cinquenta canais, cada um fica vendo o seu, né? Naquela época não, a gente via Repórter Esso, Papai sabe tudo, via Noites de Gala e era muito divertido, via concurso de Miss. E a minha família sempre foi muito crítica, então era... Eu achava muita, muita graça em fazer essas coisas. Coisas assim simples e praia, cinema, normal.
P/1 – Que cinema que você frequentava quando criança? Se lembra de algum filme?
R – Claro, eu me lembro sim... Cinemas de bairro, né? A vida era, assim, de bairro. Copacabana não era um bairro de avós como é hoje em dia. Assim, era, a gente tinha muitos cinemas e eu gostava, particularmente, do Rian que era na praia, do Caruso, que era no Posto 6. Estou me sentindo um rinoceronte porque tudo acabou já. (risos) Mas, enfim, eram ótimos cinemas de se ir e eu gostava de... Eu me lembro, especificamente quando estreou o Help, que eu fiquei horas na fila para ver os Beatles. Também tinha uma coisa boa porque, apesar de ser uma coisa muito caótica, porque você podia sentar no chão, não necessariamente tinha lugar para você se sentar, os direitos do consumidor eram mais, mais difusos ainda do que hoje, por outro lado você entrava numa sessão, assistia uma, assistia duas... Ai, como eu gostava de ver, assim mesmo. Quando eu gostava de um filme, eu gostava de ficar uma segunda vez para assistir a segunda vez. Era melhor. Não devia... Realmente, devia ser difícil para eles terem lucro, o cinema, mas isso é uma das coisas que eu me lembro que eu gostava de fazer. Também tinha o Metro que, era assim, me lembro muito bem de... Na Nossa Senhora de Copacabana, sessões do Metro, de tarde e tal. Muito bom. De ir ao Bob’s tomar sorvete. Eram coisas assim boas, muito boas.
P/1 – Isso já era mais na adolescência. E, na infância, qual era a sua... As brincadeiras que você mais gostava?
R – Olha, na infância eu... Eu tive uma infância de cidade. Quer dizer, não tive contatos, assim, íntimos com a natureza, nada disso. Tirando a praia, que eu acho que era a grande, grande diversão durante toda a minha vida de... Desde criança pequena até começar a vida profissional, acho que a praia era o máximo assim. Eu fiz... Eu tenho muitas horas de praia. (risos) E fiz todas as coisas possíveis para ficar muito morena, e passei óleo de motor de avião, misturei Coca-Cola com coisa, fiquei perseguida por moscas na praia por causa da Coca-Cola; não tinha Coca-Cola sem açúcar. Mas, enfim... Depois óleos argentinos, Rayito de Sol. Então, todas essas coisas porque a praia era um grande divertimento. E, fora isso, tinha uma coisa que a gente brincava na rua, embaixo do prédio, né? Você tinha possibilidade... Até a Toneleros teve uma época que ela era uma rua tão calma que aos domingos tinha rede de vôlei e o pessoal jogava vôlei. Não exatamente eu. Eu descia e ia assistir porque eu ainda era menor. Quando chegou na época de eu poder fazer isso, aí já não... A Toneleros já não tinha mais essa tranquilidade. Mas eu ia à praça, fazia essas coisas. Eu ia à missa aos domingos. Uma vida bem, assim, bem tranquila.
P/2 – E na escola, o que é que você gostava mais de estudar? Tinha algum já...
R – Acho que na escola, eu gostava de estudar... Acho que História; eu gostava muito de História e sempre tive mais facilidade para Português, que é a tristeza do meu pai. Mas, eu acho que... Sei lá, eu gostava da escola, eu gostava de estudar. Naquela época, assim, não era muito, muito bem visto não, né? O colégio era feminino, até eu passar para a escola pública, né? O colégio, o Sacré-Coeur, então, eram só meninas. Era muito bom. Eu não tive nenhum... Nunca fui perseguida por nenhuma freira tarada, nunca me aconteceu nada assim. Pelo contrário, era tudo muito assim, o nível era bom. Depois que eu saí do colégio, eu nunca tive dificuldades com escolaridade, nem para fazer vestibular, nem para fazer outros concursos. E eu acho que, naquela época, assim, o currículo, ele era um currículo assim, bastante, bastante grande, bastante... Dava para você sempre ter alguma coisa para você se interessar, mas eu acho assim que, de um modo geral, as pessoas... Não era, assim, muito na moda você dizer que era estudioso como... Eu acho que isso é uma coisa até que mudou bastante, né? E até isso é uma das coisas que me marcou muito quando eu entrei para o BNDES, porque as pessoas que entraram como estagiárias como eu, elas eram todas tão estudiosas ou muito mais do que eu. Eram pessoas que tinham as mesmas leituras. Aliás, uma coisa que eu não mencionei, mas que eu gostava muito de fazer quando eu era menina era ler. Lia-se muito, né? Li muito durante a infância, adolescência e tinha o hábito de ler livro. Ler em casa... Então, é isso.
P/1 – E do seu pai e da sua mãe, quem exercia dentro de casa a autoridade? Que tipo de autoridade os dois exerciam?
R – Ah, era bem separado assim. Meu pai... Como a minha mãe ficava em casa e trabalhava, nossa, muitíssimo por nós todos, a minha mãe era assim... É, né? Mas, como dona de casa, mãe de quatro filhos, ela era prendadíssima, e responsabilíssima, e cortava todos nós, e tinha aquela preocupação de alimentar a gente, e de... Que as alimentações fossem corretas e... Então, a minha mãe cuidava, assim, de toda essa logística, toda infraestrutura da casa dependia dela, exclusivamente dela. Meu pai, nessa parte, ele mal passava, assim, da porta da cozinha, né? Agora, quando era uma questão, assim, mais de alta indagação jurídica, aí recorria-se ao meu pai que, então, ele... Meu pai dizia que queria dar uma opinião, mas a gente sabia que quando meu pai dava uma opinião, na verdade, era mais uma sentença, assim, de juiz, que ele era bastante, bastante atuante, assim. Meu pai, é, foi bastante importante na minha escolha de carreira. Por exemplo, ele conversou bastante comigo a respeito de escolher um caminho para... E eu acho que com todos nós, de um modo geral, ele influenciou. Como eu te mencionei, meu pai era... Foi filho póstumo. Eu acho que isso foi uma coisa que marcou muito ele porque, de certa forma, delimitou o destino, um pouco, que naquela época havia uma lei que filho de, órfão de Oficial Militar tinha direito a educação gratuita no colégio militar. Então, o meu pai saiu ainda pequeno de Curitiba e ficou no Rio de Janeiro muitos anos, sempre em colégio militar. E assistiu de perto a dificuldade da minha avó de criar seis filhos. Ele era o sexto, né? Viúva e muito jovem. Então, é curioso porque a minha família ela é de origem conservadora, extremamente conservador, Paraná, Curitiba, criar filhos em Copacabana. Todos esses fantasmas. Mas meu pai tinha uma visão curiosamente progressista, assim, em relação à autonomia das filhas mulheres. Ele era extremamente preocupado que a gente tivesse uma formação que nos garantisse sustento, independentemente de casamento ou de qualquer outra... Como nós mesmos não tínhamos fortuna, nada disso, heranças, ele sempre falava nisso. Então, o ângulo que, desde muito cedo, ele abordou sobre escolha de carreira foi a importância de você garantir a sua independência financeira. Não que ele tivesse, imagina, qualquer intenção que uma filha não se casasse ou... Não é isso! É que ele tinha preocupação que ninguém ficasse casado por conta de dependência financeira ou ficasse numa situação de necessidade, né? Então, eu acho que ele influenciou a todos nós na minha casa com isso.
P/1 – Mariane, você falou que o seu pai era póstumo.
R – Filho póstumo, é.
P/1 – Me conte um pouco dessa história sobre...
R – É, ele sempre contava muito isso. Ele, na verdade, ele... Eu acho que a minha avó estava assim, mais ou menos, no quinto mês de gravidez quando meu avô, ele teve uma doença silvestre. Se não me engano é Beribéri, que hoje em dia até parece que é uma coisa facilmente medicável, mas na época ele estava no interior de Mato Grosso, como eu falei, fazendo... Demarcando fronteira, e aí ele teve essa doença e não deu tempo. E ele tinha 38 anos.
P/1 – Isso no século XX ou XIX?
R – Boa pergunta. (risos) Não sei. Não, mas o meu pai é um homem de século XX. Ele é... Meu pai morreu em 1982; ele tinha 69 anos em 1982. Então, isso aconteceu no início do século XX. (pequena interrupção)
P/1 – Voltando, nós estávamos falando do seu pai.
R – Isso. Eu comentei isso, que ele tinha essa história, uma história, assim, quase como um romance. Quer dizer, todo romance é assim mesmo, né? Essa história de ter vindo e ter ficado no Rio de Janeiro sozinho. Eu acho que isso marcou bastante ele. De certa forma, levou-o a uma carreira militar, não que ele não gostasse não, ele gostava muito, mas eu acho que ele nem levou em consideração outras possibilidades. Mas isso também acho que tinha a ver com um pouco da época do Brasil, que era... Uma das opções de carreira para homem era realmente militar, padre, advogado, tal.
P/1 – Mas, Mariane, eu vou voltar um pouquinho no tempo e perguntar uma coisa que me deixou curiosa, que a família Sardenberg chegou ao Brasil, pelo que você me contou, quer dizer 1908, nas invasões napoleônicas.
R – É, no Bloqueio.
P/1 – Eles vieram no Rio, chegaram no Rio. Me conte um pouco do que você sabe disso.
R – Olha, eu só... Eu sei que, na verdade, este Sardenberg que é o responsável pela... De quem a gente descende diretamente era um dos preceptores de Dom Pedro, que veio, então, justamente na comitiva e aqui resolveu ficar. E eu sei que houve um núcleo, então, dos Sardenberg que se estabeleceram depois em Friburgo. Inclusive, a um tempo atrás foi curioso porque houve uma festa em Friburgo da colonização alemã, porque eu acho que tem várias famílias que até hoje estão lá, e me telefonaram para casa me perguntando se eu queria desfilar como filha de imigrante. Eu fiquei surpreendida. Eu falei: “Mas filha de qual imigrante?” (risos) Porque, para nós, o sobrenome é assim meio complicado, tal, mas nós somos... Ninguém lá em casa fala alemão, está completamente... Nós estamos 100% aculturados. Eu me sinto, acho que mais negra do que alemã. Não posso... Isso é o tipo da coisa que não é para deixar, né? Pelo amor de Deus! (risos) Mas, realmente, estou mais perto de, entendeu... De Bahia do que de Freiburg, entendeu? Então, eu falei: “Olha, descendente. Agora filha de imigrante não, porque o meu pai, coitado, vai se mexer no túmulo porque tem muitas gerações.” Quer dizer, como todos nós que estamos aqui nessa sala, cada um veio... Todo mundo aqui, de certa forma, é filho de imigrante, né? Quem não é descendente legítimo de índio é filho de imigrante. Mas foi engraçado na época porque o meu marido é muito, assim, brincalhão e obviamente pegou no meu pé com isso. Passou meses brincando que qualquer coisa que acontecia ele dizia: “Ah, isso é problema de filho de imigrante, que ainda está com saudade da terra natal.” Ficou, virou uma brincadeira. Mas a família está há muito tempo aqui e especificamente esse ramo da família do meu pai é do Rio Grande do Sul e do Paraná, né? Dos pais do meu pai.
P/1 – E do... Agora vamos falar um pouco mais especificamente da juventude. Você falou que estudou no Sacré-Coeur. Estudou até que idade no Sacré-Coeur?
R – Olha, eu estudei no Sacré-Coeur quase o tempo todo. Naquela época, dizia Primário e Ginásio. Eu fiz primário e ginásio no Sacré-Coeur. Eu entrei, assim, no pré-primário. Aliás, o pré-primário eu fiz em Santos. Fiz no colégio Stella Maris, em Santos. Depois, quando cheguei no Rio de Janeiro, as minhas duas irmãs já estudavam no colégio, eu entrei também no mesmo colégio e fiquei lá ao todo onze anos. E quando saí de lá é que já era Ensino Médio. Eu saí no Ensino Médio.
P/1 – Você morou em Santos?
R – Eu morei em Santos na época do pré-primário.
P/2 – Em São Paulo?
R – Em São Paulo. Morei, assim que eu me lembro, acho que um ano, um ano e pouco, em Santos. Eu me lembro de que eu fui alfabetizada em Santos. Aliás, eu fui alfabetizada pela minha mãe.
P/2 – Como era, como é? Você se lembra de como era ser alfabetizada por sua mãe?
R – Eu me lembro, eu me lembro que era... Que foi muito, muito bom, porque eu tenho uma irmã quatro anos mais velha, que era, assim, a mais próxima de mim. Então, obviamente, a gente tinha um relacionamento mais sem... Conflituoso, né? E ela gostava muito de brincar comigo que ela era a professora e eu era aluna. Sempre. Ela que era a professora, eu era aluna, óbvio. E interessante é que foi ela que percebeu que eu não estava alfabetizada, porque nessa época eu tinha uma memória, assim, incrível. Morro de pena porque hoje em dia isso já não é verdade. Mas, naquela época, eu podia decorar qualquer coisa. Portanto, eu decorei todo livro da cartilha, conforme tinha figura, conforme apontava a linha, eu lia, mas eu não sabia ler. Eu só... Eu não sabia exatamente nem o que era exatamente ler. Eu achava que lia, mas eu não sabia ler. E ela com a brincadeira de brincar de professora, ela obviamente escrevia outras coisas e aí eu não conseguia ler nada, e ela sempre me dizia: “Você é burra!” A importância de ter irmã. “Você é burra, você é muito burra.” (risos) Aí, enfim, acabou que a minha mãe começou a dizer: “Não, realmente, ela não está...” Tinha, sei lá, cinco, seis anos. E aí a minha mãe começou todo dia de manhã quando a casa ficava assim vazia, ela me levava para o quarto, me punha no colo, pegava uma cartilha que não tinha nada, não era nem colorida, e mostrava as letras. E aí em uma semana eu aprendi a ler. É uma lembrança muito boa que eu tenho da minha mãe também; foi essa descoberta do que era exatamente a leitura no colo da minha mãe. Foi muito bom; coisa maravilhosa.
P/1 – E na juventude, como eram as suas paqueras?
R – Na juventude? Ah...
P/1 – Você era muito paquerada?
R – Ih, era! Era bom, tão bom. (risos) Era assim, eu acho que dizer que as coisas eram diferentes é o maior lugar comum do mundo, mas eram assim diferentes. E... Mas rolava todas, né? Era muito... Essa coisa da gente ter colégio feminino, poxa, como no Santo Ignácio. Ia visitar o colégio, eu acho que era coisa louca e tudo. Agora, eu não era, assim, especificamente uma pessoa nem vistosa, nem... Era tudo que eu queria na vida, né? Não tinha a menor vontade de ser inteligente. Eu queria ser assim gostosa, bonitona, entende? (risos) Mas eu não era, eu era muito magra, super magrinha, assim, pouco... Assim, não era... A minha popularidade não era pelo lado assim da beleza física e tal. Tem uma idade que a gente super se preocupa com isso, né? Até uns quinze anos, dezesseis anos, eu era meio, assim, muito tímida, sempre muito tímida. Morria de medo de negócio de festa, de dança. É o tal negócio, né? Naquela época você tinha que esperar ser tirada para dançar. Eu nem sabia o que é que eu tinha mais medo, de não dançar ou de dançar. Sinceramente, ficava, assim, imaginando aquela coisa de... Depois, passou. Eu sempre tive, assim, bastante relacionamentos sentimentais, afetivos, paqueras. Tudo isso normal.
P/1 – E qual é a diferença que você sente mais entre hoje e na época da sua juventude?
R – Com relação ao quê?
P/2 – Você falou, disse bem, que falar, que é diferente hoje, dos namoros....
R – É lugar comum, né?
P/1 – É lugar comum. Agora, que diferença são essas que você sente?
R – Olha, eu acho que, em primeiro lugar, hoje em dia é muito mais indistinto o papel que cabe aos meninos e as meninas. Eu acho que é uma coisa mais saudável assim. Primeiro, todo mundo estuda junto desde criança, que eu acho super saudável porque te tira a timidez com relação ao sexo oposto, né? Depois, que, por exemplo, no meu caso, o meu irmão... Eu tinha um irmão homem, mas quinze anos mais velho. Então, a relação era quase de pai, obviamente. Então, eu acho que é uma coisa muito boa você poder ter todo mundo estudando junto desde o início porque corta um pouco essa coisa de menino, tal, essa preocupação, né? E eu acho que hoje em dia, como eu disse, é mais indistinto, não cabe, o que devia ser horrível também para os meninos da época a iniciativa de cruzar um salão, tirar uma menina e de repente levar um não, uma coisa assim. Devia ser, eu detestaria ser, entendeu, menino; e não queria ser. Mas também aquela coisa de chá de cadeira, quem dançou, quem não dançou. E eu levava tudo a sério. Então, ficava preocupada, não queria levar chá de cadeira de jeito nenhum. (risos) E... Mas tinha muita festa assim. Teve uma época da minha vida que tinha festa todos os fins de semana. Mas... Essa é uma outra diferença, as festas eram festas em casa de família e eram festas de alguém, que alguém era responsável. Não é como hoje que você tem grandes festas pagas, que são festas públicas. Quer dizer, você, de certa forma hoje expõe os filhos mais cedo assim... É menos protegido, né? Porque você paga e aí ali qualquer um passa a ser o denominador comum. E quem pode pagar aquilo. Fica sendo só o dinheiro e eu acho que o dinheiro é um denominador fraco para uma certa idade assim. Eu acho que é melhor que seja em lugares com pessoas conhecidas, que você leve os filhos. Mas faz parte.
P/1 – Você se lembra de alguma festa especial dessa sua época? Como eram essas festas?
R – Ah, pelo amor de Deus, Solange! (risos) Eu sei lá! Se eu pensar, eu vou lembrar! Mas eu me lembro que, assim, a lembrança que eu tenho grande é da coisa da música porque naquela época a gente tinha sempre música estrangeira, né? Eu acho que um dos motivos que me fez querer aprender inglês é porque tudo que eu cantava eu não entendia nada e achava aquilo uma coisa louca. Não se tocava música nacional em festa porque era considerado cafona, né? Bossa Nova era uma coisa de coroa, assim, no meu tempo. Tocava Beatles, tocava... E rock, né? Mas nada nacional. Não tinha música nacional. Isso eu me lembro muito. Tinha, assim, algumas músicas que eram assim um pecado se você não fosse dançar, que era tipo Johnny Rivers, Do you wanna dance, que todo mundo dançava de rosto colado. Era muito divertido, era bom. Eu lembro disso como boas lembranças, sabe? Uma época que... Tinha uma turma também, porque eu acho que... Eu não sei se isso, não poderia generalizar, mas na minha experiência, desses onze anos que eu fiquei no colégio praticamente não houve mudança na turma. Então, nós crescemos juntas e isso, obviamente, cria um grau de intimidade grande. Até hoje quando eu encontro uma colega eu normalmente lembro do nome, do sobrenome por causa da chamada, lembro se tem irmãs, se não tem porque é um longo período da minha vida de convivência com essas pessoas. Eu estudei com a Regina Casé. Eu acho que isso é uma... (risos) Uma coisa que sempre as pessoas acham engraçado porque nós estudamos dez anos juntas e éramos vizinhas na Toneleros. Então, foi a primeira casa que eu pude ir sozinha porque não tinha que atravessar a rua. A Regina morava do mesmo lado da rua que eu e ela era, assim, exatamente como é hoje em dia; muito criativa, muito interessante. Isso é uma coisa que eu me lembro muito do pai dela fazer, ser diretor do programa do Roberto Carlos. Sabe, eu acho que é uma... Para não parecer que tudo eram flores, né? Eu tenho a grande frustração que o meu pai nunca deixou eu ir assistir a gravação ao vivo do Roberto Carlos. Tanto que hoje em dia se o Roberto Carlos tocar eu vou assistir porque eu acho que em desagravo aos anos, que toda sexta-feira ela ia. Acho que a TV Rio, sei lá, tinha um show e o pai dela era o diretor; o Geraldo Casé. Eu achava aquilo o máximo! A minha casa era toda pintadinha de creme, o quarto das meninas cor de rosa. A casa da Regina era toda grafitada nas paredes pelo pai, que botava poesias de amor nas paredes! Aquilo, para mim, era transgressão pura, né? Uma coisa inacreditável o meu pai rabiscar parede. Era outro... Mas era ali do lado e a gente convivia. Eu tenho excelentes recordações da casa dela. Era muito divertido a gente brincar lá e estudar lá muitos anos. Foi muito bom, gostei muito.
P/1 – Como é que você conheceu o seu marido?
R – Eu conheci o meu marido primeiro porque ele namorava muitas amigas minhas. Isso durante muitos anos. Eu sempre fui pessoa de ter namoros longos e ele não. (risos) É claro. Então... Mas eu sempre ouvia falar nele, ouvia falar nesse nome, assim, Carlos Eduardo Sussekind, tal. Eu ouvia isso. Depois, curiosamente, no casamento de uma dessas amigas, eu fui apresentada a ele. Eu fui ao casamento na Reitoria e eu olhei para trás, assim, e vi ele chegando, tal, mas eu não lembrava, assim, mais porque eu já estava na faculdade. Aí, a gente foi apresentado e óbvio que imediatamente eu me lembrei de quem era ele. Até tem uma história engraçada porque uma das minhas amigas, essa que casou, teve, nossa, uma seríssima paixão, aos catorze anos, por ele. Então, ela escrevia, mas ela não era boa no português. (risos) Então, ela pedia para eu consertar. Então, cansei de escrever cartas para ele. Também se usava. Acho que hoje em dia não se usa mais, né? Sei lá, se usa. Mas ela escrevia e depois eu botava as vírgulas, botava os pontos, dava uma ajeitadinha e tal. Então, eu tinha uma certa... (risos) Eu já tinha um namorado - ele -, indiretamente, né? E aí foi assim. A gente se apresentou. Aí, uns meses depois nós começamos a namorar e namoramos um ano, mais ou menos, e casamos.
P/1 – E descreva um pouco, assim, teve noivado?
R – Teve noivado, teve pedido de casamento. O meu marido sempre foi, assim, extremamente ligado ao meu pai, sempre gostou muito dele e fez isso mesmo como uma homenagem. Na época que eu me casei... Eu comecei a namorar o Carlos em janeiro; dia 20 de janeiro. Ele me pediu para namorar ali no Bar Lagoinha. E, assim, era feriado, né? A gente estava tomando um chope e nós começamos a namorar. Aí no dia 20 de dezembro, que era aniversário de casamento dos meus pais, ele fez o pedido; no mesmo ano. E aí no dia 2 de abril do ano seguinte nós casamos. E a gente acabou de fazer, agora, Bodas de Prata, né? Isso não é para colocar não. E, assim, assustador a passagem do tempo. (risos)
P/1 – Então descreva um pouco o seu noivado e o dia de seu casamento. Como é que aconteceu, que vestido você estava, quem estava, o bolo?
R – Nossa! Quem passa por isso aqui não precisa fazer análise, né? (risos) Negócio regressivo. Olha, eu me lembro muito bem do dia do meu noivado. O meu... Foi uma coisa na minha casa, uma coisa absolutamente simples. Família do meu marido veio visitar a minha família, mas foi aquela coisa. O meu pai gostava de coisas formais. Então, o Carlos fez questão de levar o pai dele, e falar e tal. E falaram sozinho, imagina? Fiquei do lado de fora, esperando. Aí, uma grande surpresa, que eu fiquei noiva. Eu já sabia, né? Mas isso não se usava não, hum, entendeu? Nessa época já era démodé, assim. É só porque o Carlos fez questão de fazer uma coisa que deixasse o meu pai contente, quis dar essa alegria para ele. Foi pura generosidade. Mas naquela época, pelo contrário, a gente estava, assim... O casamento era uma coisa um pouco, considerada meio out cast. Assim, você ficar, entendeu, fazendo grandes casamentos, tal. Os casamentos eram simples. Época de paz e amor, de Era de Aquários e tudo isso. Então, a gente casou na Capela do Palácio Guanabara, que era um lugar bem pequeno, e um casamento, assim, 17:00, 18:00 da tarde. E foi super importante para mim assim. Eu queria muito... Eu queria muito me casar e eu acho que o meu marido também queria casar. E tem alguns anos de comprovação disso. E, assim, eu me lembro que quem tocou a música foi a minha tia, o padre que celebrou era o padre da Paróquia de Copacabana, que eu conhecia. Era uma coisa com significado, assim. As coisas que estavam lá, nada que estava lá estava por acaso. Tudo tinha uma história, uma coisa. Eu me lembro... Eu me casei vestida de noiva e me lembro que tinha uma coisa, assim, na cabeça, como era na moda. Usava-se coisas assim. Me lembro que... Enfim, me lembro que tinha damas, que era a irmã mais moça do meu marido e minha sobrinha mais velha. E, enfim, foi assim uma coisa muito... Foi... De acordo com a época foi um casamento solene, tá? Porque eu acho que se usava mais coisas mais informais, assim, as pessoas... Mas o nosso foi, de certa forma, bastante solene.
P/1 – Em que ano foi, Mariane?
R – 1977.
P/2 – Você já estava na faculdade?
R – 2/4. Estava na faculdade. Só não tinha formado ainda. Estava... Já estava no Banco e já estava na faculdade. Justamente, eu comecei a namorar o Carlos em janeiro e fiz concurso para o Banco em fevereiro. Para estagiária, né? Para estagiária.
P/1 – Agora vamos falar um pouco da sua educação superior e formação profissional. Havia na sua família alguma expectativa para que seguisse, que você seguisse alguma carreira? Foi direcionado, Direito...
R – Ah, eu já respondi, né?
P/2 – É, o seu pai...
R – Ah, sim, o meu pai tinha essa expectativa. Ele tinha uma convicção que... Eu assim, durante muito tempo realmente tinha uma cabeça super aberta, assim, para vários interesses. Eu gostava... Mas eu gostava de coisas que ele tinha toda razão. Eu ia me ferrar sim porque eu gostava de Arqueologia, gostava de Museologia, gostava de coisas, como eu disse, ligadas à História e tal. Mas eu também gostava, por exemplo, de Assistência Social, de coisas, assim, voltadas para o social. E... Mas eu não tinha nenhum problema com Direito não. Eu acho que eu nunca quis, assim, muito era trabalhar com máquina. Nunca tive muita fascinação por coisas industriais, peças, engrenagens e tal. Na parte, assim, humana eu acho que eu gostava de praticamente tudo. E aí eu acho que meu pai direcionou porque no ano do vestibular começou haver o curso de Comunicação. Eu fiquei achando que esse nome, Comunicação, assim, apesar de eu ser ultra tímida, enfim, eu achava que Comunicação era a coisa que eu queria ser. E aí meu pai disse: “Olha, isso é uma coisa que está começando, se você tiver, depois, vontade, você faz mais tarde, mas primeiro faça Direito, tal, porque por enquanto os seus pais são vivos, você tem uma estrutura.” Enfim, ele teve uma visão extremamente pragmática, né? Mas assim, a gente teve muitas conversas, sabe? Algumas até de conflito, mas assim, a coisa que eu me lembro mais é disso, é da presença, né? Porque é uma pessoa... Meu pai tinha opinião e ele dava opinião, né? E, olha, na verdade, ficou meio estranho porque ficou muito valorizado o papel do meu pai, parece que a minha mãe era uma anta que só arrumava as coisas. Não é verdade. Minha mãe tinha uma... Nossa, é uma pessoa... No momento está doente, mas, na verdade, é uma pessoa extremamente sábia, assim, sempre foi uma espécie de exemplo de mulher, bem sucedida na maneira de conduzir a casa, e de tentar ajeitar as coisas entre os filhos e tal. Quer dizer, é um outro tipo de interesses que a minha mãe tinha ou que ela atuava. Mas ela atuava muito fortemente. Era uma mulher muito forte também. E eles, meus pais sim, esses casaram muito... Minha mãe, eu acho que casou com dezesseis, dezessete anos. Então, tinha uma história de vida muito, assim, muito unidos porque com a coisa de ser militar, de morar longe, sair tão cedo de casa, e nunca mais voltar, é uma coisa que deixa o casal muito unido. Eles eram muito unidos.
P/1 – E qual foi... A tomada de decisão Direito, o que é que motivou realmente a fazer Direito? Qual foi a motivação que levou você a optar juntamente... Quer dizer, seu pai é...
R – Que gostaria, né?
P/1 – Gostaria... E o que é que motivou realmente você a fazer essa opção?
R – Bom, primeiro, como eu disse, a vontade do meu pai não era muito assim... Ele era uma pessoa, assim, que influenciava mesmo. Mas eu sempre achei Direito assim... Achava que, por exemplo, como eu gostava de História, e tudo mais, você tinha toda uma parte de Direito romano, de coisas que eu poderia me interessar da mesma forma, entendeu? Como coisas de cultura, tá? Agora, quando eu comecei a estudar Direito, eu comecei a perceber uma porção de coisas que eu gostava, e coisas que eu não gostava, coisas que eu queria e coisas que eu não queria. Por exemplo, uma coisa que todo mundo gosta e eu adoro filme de julgamento, né? Isso, eu sempre percebi que eu não achava que eu tinha muito jeito para isso. Nem para acusar, nem para defender, e muito mais ainda para julgar. Eu sempre achava que essa parte, assim, contenciosa não me atraía. Também a parte penal, eu percebi de cara que não era uma coisa que me atraísse. Mas o que eu gostava muito de Direito era, assim, da capacidade de prever situações e de tentar, de certa forma, evitar exatamente os conflitos. A parte preventiva você... Eu acho que me chamou atenção. De uma coisa que só cursando mesmo é que eu pude perceber, que você tinha tanto um Direito já atuante, a posteriori de qualquer conflito, mas... Ou conflito, ou crime, o que você quiser, mas você também tinha um Direito que podia vir antes e que podia evitar uma série de efeitos, né? E isso me chamou mais atenção.
P/1 – E tem alguma lembrança, durante o período da faculdade, na graduação, que tenha sido marcante?
R – Olha, os meus anos de faculdade, eles foram anos que o Brasil não estava no regime democrático. Então, isso foi muito marcante porque o Direito, nessa época, era muito desvalorizado. E a faculdade não tinha uma atividade acadêmica que fosse, assim, fascinante, nem atraente. Pelo contrário, a gente não tinha... Dos cinco anos que eu passei na faculdade, em quatro não tinha nem refeitório aberto. Havia uma política explícita de não favorecer, assim, o debate, agrupamentos ou ajuntamentos, e tal. Então, essa é uma lembrança marcante que eu tenho da faculdade. E ela foi ficando mais marcante à medida que depois eu vi a diferença, entendeu? Quer dizer, claro que quando estava vivendo isso eu não conhecia a outra realidade, não conhecia outra faculdade que não fosse essa, daquele jeito. Então, eu acho que os meus anos de faculdade eu fiz algumas amizades e tal, mas lá não era um ponto de encontro. Inclusive, porque de Direito tinha toda uma tradição do Caco, do Calabouço, daquela coisa toda. Então, ali era um lugar que a gente não tinha uma... Assim, naquele período isso não era muito... Não era efervescente a faculdade. Enfim, não estimulava ninguém intelectualmente, assim, para... Era um curso...
P/1 – E teve algum fato?
R – Olha, eu gostava muito das aulas do professor Afonso Arinos porque justamente ele dava aula de Constitucional, que é uma coisa que eu gosto até hoje. E ele ao dar o curso de Constitucional ele contava uma série de fatos, assim, a respeito do Brasil, e tal, e dava às aulas um colorido. Ele já era uma personalidade muito importante e ele já tinha uma certa idade e não faltava as aulas, ele era presente e contava para gente coisas que a gente nem fazia ideia com aquela idade etc, entendeu? Então, eu acho que a coisa marcante, em termos do curso, uma pessoa que eu destacaria, foi o professor Afonso Arinos. Eu nem sei se o pessoal chama de Embaixador, de Senador. Eu sei que ele foi tudo. A vida dele era incrível e ele era, assim, um velhinho muito... Ele ia de suspensório, todo arrumadinho, às vezes ele falava: “Olha, semana que vem, eu não venho...”, isso eu me lembro, “porque eu fui convidado para ir à Paris no voo inaugural do Concorde”. Aquilo foi um... Naquela época ninguém era convidado, assim, para ir à Paris num dia. Ele falou: “Mas na outra semana estou aí sem falta e tal”. Quer dizer, ele era uma pessoa toda antenada com as coisas, dava aulas muito interessantes. Eu gostava muito.
P/1 – E a pós-graduação? Como foi esse período depois de...
R – Cruzes, agora pulou para longe.
P/2 – Quer... Vamos deixar para o final?
R – Não, não, não tem nenhum problema, zero de problema. Só posso beber água?
P/1 – Claro.
P/2 - Eu acho que a gente podia deixar para o final, Solange, que eu acho que tem mais a ver com a trajetória, como a Mariane acabou de defender.
R – Posso perguntar uma coisa? Não, eu só vou perguntar...
P/1 – Hum...
R – Olha só, não está muito grande demais não as respostas? Se tiver, faz sinal para mim que eu faço menor.
P/1 – Não, por favor, não, é assim mesmo.
R – Entendeu? É assim mesmo?
P/1 – É.
R – Poxa! Então, olha só. A pós-graduação; a pós-graduação ou o inverso de tudo isso, né? Porque já é... Eu estou fazendo uma... Fiz uma pós-graduação no momento já, assim, super maduro da minha vida, já com as crianças grandes, já com a minha carreira no Banco. Ih, não digo definida, mas com grande parte dela já corrida. Eu escolhi isso. O Banco me deu oportunidade de fazer. Eu me interessei pelo curso e foi, assim, uma experiência sensacional para mim porque eu estava sentindo falta de uma reciclagem... Não é reciclagem. Reciclagem não é uma boa palavra porque reciclagem, assim, é um lugar comum, um clichê, mas não é bem isso. É porque eu tive tantas experiências no BNDES, eu lidei com tantos fatos, uma sucessão de fatos, e eu vi muitas coisas acontecendo no Brasil, no mundo. De uma forma ou de outra, no Banco a gente tem um local de observação privilegiadíssimo para ver essas coisas e nunca dava, assim, para refletir sobre isso muito porque a gente estava sempre no calor de tomar providências, e fazer coisas operacionais em cima de coisas que tinham repercussão muito grande nos países. Poxa, os planos econômicos, as crises entre Coréia, Rússia, não sei quê, o que você quiser; o programa de desestatização, todas as coisas grandes que o Banco participou ativamente e que eu sentia, assim, um pouco de falta de sistematizar isso, de ter um tempo de refletir sobre essas coisas. E eu encontrei exatamente na PUC essa oportunidade. Fui lá, me informei sobre o curso, mas sempre, logicamente, foi um passo no escuro, né? Porque eu podia chegar lá e não ser exatamente o que eu esperava. Mas eu acho até que foi mais do que eu esperava, em termos de... Outro dia, uma pessoa muito conhecida minha me disse uma coisa interessante. Me disse que eu revi em dois anos tudo o que eu não tinha visto. Então. E foi... É mais ou menos isso porque organizou coisas que eu intuitivamente sabia, trabalhando... Eu acho que até o meu aproveitamento no curso foi maior por causa disso, porque certas explicações muito elaboradas a respeito de problemas aí do Estado brasileiro, do Estado-Nação, da globalização etc, coisas, explicações teóricas muito perfeitas, para mim, bastava ler uma vez porque aquilo caía como uma luva com uma série de coisas que eu já tinha tido contato na prática, no dia-a-dia. Então, eu gostei imensamente de ter tido essa oportunidade, sem falar do lado de mudar de ambiente, de repente ser totalmente desconhecida, né? E o Banco, assim, é um grande colo, todo mundo sabe... Todo mundo não, mas uma, digamos, um número significativo de pessoas sabem de você, da sua vida etc. E eu cheguei na faculdade, eu fiz prova para ser selecionada para fazer o Mestrado, fiz entrevista e tive, inclusive, muito medo de alguma forma ser discriminada por, sei lá, até por trabalhar no Governo com assuntos sensíveis, e pela minha idade, ou fosse pelo que fosse. Isso não aconteceu. Pelo contrário, eu tive lá um ambiente de muita liberdade, muita coisa. Mas cheguei num lugar que, justamente, ninguém me conhecia e a recíproca era verdadeira; também não conhecia ninguém. Então, também foi uma coisa, assim, desafiadora, né? No início, eu me senti, assim, meio só porque o Banco realmente é uma coisa que te envolve muito, né? E dois anos depois eu até já conhecia bastante gente, mas obviamente não como no Banco, que as pessoas me conheciam ainda menina.
P/1 – E qual foi a área...
R - Do Mestrado?
P/1 - Da pós-graduação, do mestrado?
R – Olha, é justamente Direito Constitucional, Teoria Geral do Estado. Eu fiz a pós-graduação no Departamento de Direito e escolhi como tema Reforma do Estado, mais especificamente sobre o ângulo da regulação, sobre as agências reguladoras e tal porque é um assunto que eu acho que vale a pena a gente refletir, está aí na nossa vida todo dia. A gente... Até no dia que eu fui defender, todas as manchetes dos jornais eram sobre agências reguladoras, problemas com Anatel. A gente, esse ano, teve negócio de crise energética, e teve... Quer dizer, isso é um assunto, assim, que todo mundo, de uma forma ou de outra, tem uma opinião para dar. Eu acho que vale a pena refletir sobre isso e o Banco também tem que refletir sobre isso. E eu acho que... Eu acho que eu fui buscar, de certa forma, uma... Assim, um reforço teórico, entendeu? Para ficar com uma visão um pouco mais abrangente de coisas que eu estava lhe dando na prática. Isso foi muito bom. Eu gostei muito.
P/1 – Então, vamos dar uma paradinha?
R – Vamos, que eu estou assim... Quer dizer, eu nem sei se estou... Eu acho que é de vergonha, sei lá de que... (pausa)
P/2 – Mariane, então vamos chegar no seu ingresso no BNDES. BNDES foi o seu primeiro trabalho, não?
R – Foi. Na verdade, eu trabalhei antes, assim, em curso de línguas, tal, mas enquanto eu estava na faculdade ainda num nível de escolaridade que eu ainda não podia fazer estágio, né? Estava esperando para fazer estágio. Aí trabalhei, cheguei a trabalhar seis meses no curso Berlitz, assim, de idiomas e tal. Mas como um emprego na área de Direito já direcionado para a minha carreira, o BNDES foi o meu primeiro emprego.
P/2 – Conta como é que você entrou?
R – Eu entrei no Banco assim: na verdade, eu... Um colega meu do Cabral é que foi o grande responsável por eu ter feito concurso para o Banco, que naquela época o concurso de estagiário era concurso público nacional. E ele me disse... Ele fez Administração, que são quatro anos, e o estágio podia ser a partir do penúltimo ano. Portanto, o penúltimo ano dele era o terceiro, e o meu era o quarto. A gente se encontrou em uma festa e ele me falou: “Olha, eu estou fazendo um estágio que é a sua cara. É um lugar...” Eu achei aquilo... Falei: “É mesmo, é?” O nome dele é Guilhermo; Guilhermo Graziane, meu colega lá no Cabral. Eu falei: “É mesmo? Por quê?” Ele falou: “Olha, mas o pessoal lá é muito legal. Você vai gostar. É interessante. Faça o concurso.” Ah, eu falei: “Mas como é que eu fico sabendo disso e tal?” Ele me disse: “Olha, vai sair no Jornal dos Esportes, mas se eu souber, eu te aviso.” E aí, um ano depois, ele me ligou e me disse: “Vai sair no jornal dos esportes. Presta atenção que vai sair o edital, não sei o quê.” Naquela época, a prova era feita na PUC. E aí eu me inscrevi e fui fazer. Mas era, assim... É interessante isso porque... Sei lá, quando você acorda de manhã, você nunca sabe quando é que um dia vai fazer muita diferença ou nenhuma diferença. Eu me lembro do Guilhermo, ele falava umas coisas assim: “No Banco, olha, o pessoal lá é ótimo, você pode faltar nas vésperas de prova para estudar. Você tem uma série de benefícios, inclusive despesas médicas.” E eu era tão, assim, sei lá, desligada, que eu perguntei para ele: “Que despesas médicas?” (risos) Eu achei que o trabalho dava algum tipo de problema. Porque naquela época, para mim, eu não era minimamente preocupada com plano de saúde, nem tinha médico, entendeu? Aquilo para mim... Achei aquilo esquisitíssimo, dizer “eles cobrem as despesas”. Eu falei: “Mas quais?” Pensei: “Que diabo que acontece lá que a pessoa precisa fazer despesa...” (risos) Aí, ele falou... Eu me lembro tão bem que ele falou assim para mim: “Olha, tudo, qualquer coisa que você precise.” Aí, eu disse: “Até dentista”, que era a despesa médica que eu conhecia, né? Aí ele virou para mim, disse assim: “Tratamento odontológico também.” E eu pensei: “Nossa, o Guilhermo está tão chique", porque ele já usava jargão, né? Da coisa da... Essas coisas para mim eram novidades, eu não conhecia, assim, as coisas de trabalho, de relações de trabalho, né? Então, foi assim, eu fui para o concurso e justamente foi uma época que o Banco admitiu estagiários. Foi uma época, assim, de ouro porque o Banco admitiu e sabia que ia ter um rush de trabalho. Então, no caso, por exemplo, de Direito, eu acho que chegou a admitir uns catorze estagiários nesse concurso. E eu passei. E aí, assim, foi no dia 18/5/1976, eu entrei no Banco. Foi uma coisa, assim, muito marcante porque fizeram uma adaptação e falaram uma porção de coisas. Mas é curioso isso, né? Porque eles falaram... Me foram dadas muitas informações, mas eu não tinha, assim, muito bem a ideia, né? E eu acho que isso é interessante porque eu era uma pessoa razoavelmente bem, mais para bem informada, mas eu não tinha, assim, ideia do que o Banco fazia. Estava curiosa de saber como, na formação de Direito, eu iria atuar. Eu pensava, assim, em caixa, em coisas muito bancárias, no sentido do Banco que eu conhecia, né? Eu não tinha uma visão histórica do BNDES não. E aí o que aconteceu é que quando foi em junho teve uma festa de 25 anos do Banco e eu recebi o convite. E eu fui com o meu namorado, que é o meu marido; foi no Canecão. Chamava-se... Era: Tinha um espetáculo, que era Uma noite em Buenos Aires, e quando eu cheguei no Canecão eu me dei conta que todas as pessoas que estavam lá, que aquela noite era uma noite só do BNDES que as pessoas que ocuparam o microfone eram pessoas todas do Banco, esse dia eu percebi que eu tinha entrado num lugar especial, assim, que era uma coisa, uma instituição com uma característica, com uma personalidade. Eu fiquei, assim, muito impressionada. Quer dizer, e olha que eu não tinha capacidade assim, de nem entender muito bem as piadas porque eram coisas de colegas. Era uma festa entre colegas. E eu era uma colega totalmente recém-chegada ali. E mesmo assim, pelo jeito que as pessoas que falaram no microfone falaram do Banco, e falaram uma das outras, e as brincadeiras, e foi uma coisa, assim, tão... Um momento, assim, para mim que me marcou, que eu percebi naquele momento que o Banco tinha, assim, uma coisa, uma personalidade muito marcante, que aquelas pessoas ali tinham um espírito assim de... Sei lá, não sei como dizer, de...
P/1 – Uma integração.
R – De comunidade, ou de... Poderia se dizer hoje em dia de corporativismo, no sentido positivíssimo, assim. Que as pessoas estavam muito orgulhosas e muito empolgadas de serem do Banco e de o Banco estar fazendo 25 anos. Aquilo... Sabe, eu achava 25 anos uma eternidade, né? Eu nem tinha isso. Então, isso me chamou muita atenção. E depois, eu, em seguida, fui muito rapidamente integrada no trabalho. Logo, assim, com menos de um mês de Banco, eu comecei a viajar, e visitar projetos, e ter, assim, oportunidade de conhecer exatamente qual era o tipo de trabalho que eu podia fazer. Aí eu fiquei muito satisfeita porque justamente tinha esse caráter preventivo. Eu fui trabalhar, em primeiro lugar, justamente na área de indústria química. Quando me disseram isso, na minha cabeça eu só via as pessoas, assim, de jaleco, na área de indústria química. Pensava: “Meu Deus, será que tem algum erro? Eu sou advogada. Eu quero ser advogada, eu vou para a indústria química?” Cheguei na indústria química, era o período da implantação do Pólo de Camaçari. Então, tinha muitos projetos. O Banco estava trabalhando no esquema de correção monetária pré-fixada. Tinha... Trabalhava-se loucamente. E o que é incrível, não tinha computador ainda. Então, a gente tinha aquele negócio de conferir datilografia dos trabalhos e redatilografar tabelas com erros, coisas que hoje em dia parecem... No entanto, estava ali na nossa frente aquilo. E, justamente, eu fui parar nessa área junto com vários outros estagiários porque ali já estava detectado que ia haver uma demanda muito forte de trabalho.
P/2 – Era o foco de atenção naquele momento?
R – Eu acho que sim, entendeu? Acho que era um... Pelo menos um dos focos importantes, que foi a implantação do Pólo, que tinha um tempo para ser implantado. E aí eu entrei em contato com a ideia de contrato de tecnologia, de contratos de tudo, da montagem de um projeto, como é que o Banco atuava. Tudo fazendo, né? Aprendendo e fazendo. E percebi exatamente que não era nem uma coisa de defender, nem de acusar, nem de... Mas de tentar fazer da melhor maneira possível as tarefas que a gente tinha como Governo, né? Que o Banco é instrumento do Governo, tinha aquelas tarefas. Isso, para mim, foi, assim, uma... Um início; eu considero privilegiado porque acelerou e muito a minha formação profissional. Eu fiquei muito mais... Num curto espaço de tempo, aquela noção de estagiário que lê Diário Oficial, que serve cafezinho, que normalmente as pessoas falam, poxa, no Banco estagiário era muito valorizado.
P/2 – Você já foi viajar como estagiária?
R – Fui no primeiro mês de...
P/1 – Acompanhando projeto?
R – Vendo. Nunca só, né? Sempre em grupos e ia à Camaçari. A gente trabalhava loucamente porque a gente ficava em Salvador e ia normalmente para Camaçari antes da hora do rush da Estrada do Parafuso. Então, a gente não raro saía do hotel 7:00, 7:30, e voltava depois do rush. Então, eram viagens, assim, num ritmo paramilitar, né? Assim, eu estava até acostumada por causa da minha casa e tal, mas era uma coisa, considerando que eu ainda tinha faculdade, né? Mas isso acelerou muito a minha compreensão do trabalho do Banco e as oportunidades de usar o conhecimento da faculdade. Até a faculdade para mim ganhou uma outra graça, porque ficou uma coisa muito mais concreta, né? O que eu ia usar, o que... Qual era a aplicação do Direito que era esperada de mim no Banco. Então, foi uma coisa assim... Foi uma fase muito rica, muito interessante do ponto de vista estritamente profissional e do ponto de vista pessoal porque eu conheci muita gente. E o Banco, justamente, não só queria os estagiários, mas tratava os estagiários como matéria-prima para trabalhos... Para uma carreira, com uma visão de longo prazo. Então, investia nas pessoas de maneira para deixar a gente participar das coisas entendendo. O Banco tinha, nessa época, pessoas... O corpo sênior do Banco era extremamente generoso com o que sabia e dividia as coisas com a gente, ensina mesmo porque você... Eu tinha muita boa intenção e boa vontade, mas saber mesmo, sabia pouco, né? E encontrei pessoas nessa época, assim, mas com uma capacidade de ensinar fazendo, que é uma coisa que eu acho que é uma coisa... Uma qualidade muito grande, sabe? Muito... Não só do ponto de vista de talento, mas também do ponto de vista de generosidade, de pessoal, de se dispor a ensinar. E a gente... Eu acho que eu não falo só por mim não. Muitos de nós tivemos essa recepção, essa acolhida no Banco. Foi muito bom.
P/2 – E com uma generosidade comum mesmo, não individual, de algumas pessoas?
R – Não, eu diria de... A ideia era essa né, das pessoas de... Eu nunca tive dificuldade de ter acesso a nenhum tipo de informação. Sempre ia aprender uma coisa, saía com mais de uma. E eram pessoas que, para todos os efeitos, eram ícones do Banco, eram pessoas na escala hierárquica de um nível alto. Principalmente para quem é estagiário, né? Você olha para as pessoas com aquele temor reverencial, assim. As pessoas eram extremamente generosas com o seu tempo, inclusive, de partilhar com a gente. Foi muito, muito interessante. Foi muito rico, muito bom.
P/2 – E de estagiária você foi contratada logo como advogada?
R – O estágio demorou dois anos. A gente era avaliado de seis em seis meses. A gente tinha que se compro... A gente tinha que comprovar as notas na faculdade. A gente tinha que estar no primeiro quartil da turma e não podia ter nenhuma dependência. E isso era comprovado de seis em seis meses, né? E depois que a gente se formava, a gente passava a uma categoria de advogado contratado, que depois que você fazia a prova da Ordem etc., etc., no caso dos advogados, você passava para uma figura que chamava-se adestrando, que não era mais o estagiário e, portanto, trabalhava em tempo integral. E... Não era advogado do Banco, do quadro do BNDES. E aí, nessa qualidade de advogada contratada, fiquei dois, três anos, eu acho. Só entrei para o quadro do Banco a partir de um novo concurso. Aí eu já até tinha a minha filha, a mais velha; acho que foi em 1979, 1980, por aí. Aí que eu entrei para o quadro do Banco. Quando eu entrei para o quadro do Banco, de certa forma eu já conhecia muita gente, já tinha trabalhado, o Pólo já estava implantado, já... Nós já estávamos em outro momento da economia e tal.
P/2 – Além do Pólo, outro projeto que você se lembra, assim, projeto grande dessa época?
R – Olha, onde eu fiquei nos primeiros anos de Banco era a indústria química, né? Então, não é só o Pólo de Camaçari não. O próprio Copesul [Companhia Petroquímica do Sul], o Pólo do Rio Grande do Sul, eu cheguei a trabalhar lá também, tal. Mas era basicamente a indústria química, né? Mas para o Banco tinha... Nessa época também estava atuando em infraestrutura, bastante, tal, mas era um outro departamento, né? Uma outra... Onde eu estava... Uma outra área. Onde eu estava era uma área de indústria química e... E eu acho que sempre no Banco teve projetos, assim, comentados, mais comentados, menos comentados, e dessa época a gente tinha muito essa... Foi, assim, muito interessante porque foi uma visão muito... Eu aprendi muito a fazer o trabalho que, na verdade, depois sobe e vai ser objeto de deliberação da diretoria. Aprendia um pouco de como é que o Banco alimentava, como é que era o sistema de alimentação e de contato com clientes etc., formação dos projetos e tal, mas basicamente na área de indústria química. A minha primeira experiência foi com indústria química. Depois eu trabalhei com... Na época que criou-se o Fundo Social e o Banco começou a aplicação no social, eu fui gerente jurídica da parte do social. E aí foi, assim, uma mudança total, mas isso já foi anos depois.
P/2 – Com a inclusão do ‘S’, depois?
R – Com a inclusão do ‘S’. Justamente ali, em 1983, fui trabalhar com essa parte e foi também muito interessante porque quando... Aí, a parte da indústria química já estava praticamente esquematizada, assim, a gente já tinha um padrão, digamos, de financiamento, alguns parâmetros. Na parte social a gente não tinha nada. Então, foi uma coisa, assim, muito interessante de trabalhar. Era mudar a cabeça totalmente, sair da coisa lucrativa, da coisa lucrativa financeiramente. Eu quero dizer, pensar em outros tipos de lucro, outros tipos de coisa, outros ganhos e botar a cabeça para pensar no social. A gente não tinha modelo de nada e teve que fazer isso mesmo do zero. Então, foi uma outra experiência que eu prezo muito porque foi também na parte operacional, mas pegando uma coisa completamente diferente. Um outro momento do Banco e uma coisa sob um foco muito agudo, assim, da opinião pública porque você tinha recursos públicos, a fundo perdido muitas vezes, então a sua responsabilidade de aplicar, por incrível que pareça, um dinheiro que não vai retornar é muito maior do que aquele dinheiro que vai retornar com juros, correção monetária, tem contrato, tem hipoteca, tem não sei o quê. Esses outros eram outros compromissos que a gente pedia. Era outra concepção. O que me deixou, assim, fascinada na época era justamente ser outra concepção de financiamento. Era financiamento, era Brasil, era tudo e era uma coisa que você tinha que ter, mudar as coisas que você estava acostumada a usar na sua cabeça para poder tirar daquele projeto o melhor e ver se era possível fazer acontecer. Foi muito... Foi muito proveitoso para mim isso.
P/2 – Como é que foi a recepção no Banco dessa nova área? Parte do corpo dos funcionários...
R – Olha, eu, sei lá...
P/2 – Quais eram as expectativas?
R – É, eu estou falando assim... Aliás, todo tempo, só impressões pessoais porque eu nunca tive procuração de ninguém para dizer qual foi a repercussão, mas (risos)
P/2 – Não, tudo bem. Não, claro, por isso que eu estou te perguntando.
R – Mas... Eu acho que o Banco, durante muito tempo, teve aquela ideia assim de que o que a gente fazia já tinha um efeito social, né? Porque, obviamente, se você transforma algum local num... Com potencialidade para emprego, para... Você mexe na economia de qualquer local, obviamente isso tem um impacto social quase que imediato. Mas a gente não pensava nessa coisa de entrar em áreas como, sei lá, financiar flúor na água, merenda escolar, medicamentos. Era, assim, um mapa que a gente não conhecia; o mapa dos ministérios sociais, da... E foi um contato muito interessante porque também os ministérios sociais não conheciam a maneira do Banco trabalhar com a ideia de compromissos, de metas. Era muito mais numa linha de verbas, que até então esses ministérios estavam acostumados. Então, teve todo... Foi necessária uma costura do Banco, política, para ser aceito como um mediador...
P/1 – Parceiro?
R – Como um parceiro etc. E dentro do Banco, obviamente, teve muita gente que ficou entusiasmada com essa ideia e teve gente que também... O Banco todo tempo tem isso, está sempre discutindo. Aliás, isso é curioso aqui. Não só quando eu cheguei no Banco. O Banco discutia o seu papel, quando fez 25 anos, mas agora quando eu cheguei da minha licença também percebi que o Banco nesse período passou por um processo de reformas etc. e ele está de novo discutindo papel. Eu acho que isso é, assim, característica número um do Banco. As pessoas estão sempre inquietas, entendeu? E nunca há uma unanimidade a respeito de nada. E é ótimo, no meu modo de ver.
P/2 – Uma característica boa?
R – Eu acho que é porque ao mesmo tempo que pode ser, às vezes, um pouco angustiante, você nunca se dá totalmente por satisfeita, né? Eu acho que isso o Banco tem a inquietação e tem, assim, um descontentamento de buscar o seu papel, que no fundo traduz uma preocupação mesmo de rever, de rechecar as coisas e tal. O Banco... Eu acho que isso é uma coisa que faz diferença. O Banco é instrumento do Governo, não tem dúvida, ele é feito para isso, para ser um instrumento do Governo, mas ele não tem só esse lado de instrumento do Governo. Eu acho que ele também faz umas coisas, assim, de Estado, no sentido de procurar propor coisas de mais longo prazo. Tem sempre, da história que eu me lembro do Banco, uma preocupação com um lado propositivo, assim, de tentar também propor, a partir desse fato que eu mencionei. Eu acho que a gente tem, às vezes, uma visão privilegiada de certos setores, de certos problemas e dá, de repente, para fazer uma proposta, dá para apontar ou fazer um diagnóstico de alguma coisa e colocar isso um pouco debaixo de uma luz. Isso eu acho que historicamente o Banco cumpriu esse papel. Eu espero, eu aposto nesse papel. Eu acho isso interessante. Eu acho que isso faz a gente se mexer. Então, se você conversar com gente do Banco, sempre você vai encontrar pessoas que estão mais satisfeitas e menos satisfeitas pessoal ou profissionalmente, e o Banco está sempre discutindo o seu papel. Assim, num primeiro momento eu achava isso... Não tinha maturidade para perceber o que isso exatamente significava, né? Hoje em dia eu fico, assim, eu fico orgulhosa. Acho que a gente nunca considera que já tem um papel, entendeu? E não tem mesmo, né? Você pegar esse período aí de quando eu entrei para cá, se eu mudei, nossa, mudou o mundo completamente, o Brasil mudou, mudou todo mundo, mudou... As coisas mudaram. Portanto, o BNDES também tem que ficar constantemente rechecando os seus... Ainda que instrumento de Governo que ele é, né? Eu acho que é por aí. Então, social entrou nessa linha. Hoje em dia, eu acho que o social é ultra adaptado ao Banco. Quando o social chegou ao Banco, eu diria assim que a gente não tinha os instrumentos, a gente não sabia muito bem...
P/2 – Nem a prática.
R – É, exatamente. Não sabia operar, né? Assim, nós aprendemos operando, digamos. E hoje em dia eu acho que isso está totalmente assimilado. A área social no Banco é uma realidade e está consolidada.
P/2 – O Banco teve projetos próprios na área social? Montados internamente no Banco?
R – Ah, sim.
P/2 – Tem algum que você se lembre que, na época, você gostava mais, achava mais interessante? Você falou do flúor na água.
R – É que eu procurei pegar exemplos de coisas bem diferentes, assim, para você pensar em...
P/2 – Esse era montado dentro do Banco?
R – Em criar condições contratuais. Pensa você montar condições contratuais para apoiar o índio, depois para apoiar a merenda escolar, distribuição de remédios e, sei lá, um saneamento numa zona de baixa renda. Entendeu? São coisas totalmente diferentes. Os interlocutores são diferentes porque você tem no social todo tipo de interlocução, né? No início, a gente procurava ter um interlocutor sempre público do outro lado por conta do que eu já referi, que é a característica do dinheiro ser um recurso público. Portanto, a gente queria ter... Não queria ter nada, assim, privado que fosse apropriado por... Por ninguém. Nenhum tipo de coisa que a gente pudesse estar, de alguma forma, transferindo o que seria para aplicar no social para a iniciativa privada. Agora, eu não tenho trabalhado mais na área social, mas eu acho que até isso mudou no Brasil. Eu acho que a gente teve um processo de democratização que está em curso, mas que foi galopante, e se você pegar a parte da... Hoje em dia, da participação da sociedade, inclusive em projetos sociais, as ONGs e tudo isso, a gente vê que hoje em dia essa coisa não está mais só Governo, só Estado. É uma coisa de melhores, assim, grandes iniciativas; não vou dizer as melhores. Tem sempre a parceria da sociedade, tal, e a gente eu acho que já está mapeando trabalhar com isso também, entendeu? Acho que é isso aí.
P/2 – Mariane, eu vou voltar um pouquinho. Antes de você ir para a área social, você chegou a assessorar...
R – Eu fui, primeiro, para uma assessoria do presidente.
P/2 – Presidente?
R – É, foi a primeira...
P/2 - Quem era o presidente na época?
R – Boa pergunta! (risos)
P/1 – Era o Sande, não?
R – Era o Sande. Exatamente, era o Sande.
P/1 – E o que é que era o papel de uma assessora?
R – É, pois é, na verdade foi, assim, uma grata surpresa que eu tive porque em seguida que eu entrei para o quadro... Aliás, o Banco, de um modo geral, promove as pessoas rápido. Eu fui para ser assessora do presidente pouco mais de um ano depois de ter entrado no quadro. Então, eu virei executiva muito rápido, que na época era - acho que hoje em dia ainda é também - uma distinção você sair de técnico para ter uma função executiva. E a função executiva, no caso, não é nem executiva stricto sensu, né? Era uma responsabilidade de fazer assessoria do presidente num grupo de assessores. Não era uma assessoria, assim, pessoal... Como mais tarde eu cheguei a ser assessora do presidente sem ser exatamente fazendo parte de um grupo. Na época havia uma unidade do Banco, chamava Cotec, que era justamente uma consultoria técnica a que o presidente recorria quando ele ia receber pessoas, quando havia reunião de diretoria a gente preparava o material. E eu, então, integrei este grupo. Foi o meu primeiro cargo executivo, assessorando o presidente junto com outros, fazendo esse trabalho aí de intermediação daqueles trabalhos que eu tinha visto como é que eram feitos porque eu fazia e depois eu tive a oportunidade de ver como é que isso chegava numa diretoria, ou o tempo que os executivos dispunham para ler as análises, e como é que funcionava o outro lado. Isso foi um grande ganho que eu tive. Aí foi sorte minha, foi um privilégio meu porque em um curto espaço de tempo eu vi um lado, depois eu vi o outro. Eu vi fazer e mandar, e depois eu vi receber e deliberar, né? E eu aprendi bastante com isso. Foi muito interessante. Eu fiquei um tempo relativamente curto como assessora do presidente. Nessa época, nasceu a minha segunda filha. Quando eu voltei de licença, se eu não me engano, em 1983, eu fui para o fim social, aí como gerente jurídica, voltando um pouco mais, assim, na coisa de advogada mesmo, mais dentro da... Porque na assessoria é um espelho partido, né? Você, na verdade, tem todo dia uma bola da vez que você tem que responder e...
P/2 – Vários setores?
R – Isso. E acho que isso também é uma característica do Banco muito interessante; você aprende a trabalhar interdisciplinarmente, você não fica, entendeu, restrito exclusivamente a... “Se não é jurídico não faço, entendeu, não tomo conhecimento.” Não é assim. Você faz trabalhos que integram com o grupo. Faz um relatório de análise, por exemplo. Você tem a sua parte que é jurídica, mas você conversa com o economista, com o engenheiro, com... Dependendo do que seja o importante naquele projeto, né? Então, eu acho que essa... Para mim foi muito interessante porque foi, continuou sendo, interdisciplinar porque essa consultoria técnica tinha pessoas... Inclusive a Bete, senhor Paulo fazia parte. Pessoas de formação totalmente diferente para justamente atender às demandas, né? Mas era, assim, o que pintasse, né? É outro tipo de abordagem, entendeu? Foi isso. Aí, depois, eu fui para o fim social, e depois do fim social...
P/2 – Do fim social você foi para uma outra área também diferente.
R - Entrei em infraestrutura.
P/2 - Infraestrutura. Fala um pouco dessa área.
R – Ah, foi muito... Sei lá... Estou aqui me sentindo meio mal, assim, porque na verdade foi fundamental ter ido para a área de infraestrutura, né? O que eu vou fazer? Eu dei sorte, tive muitas oportunidades; não só eu não. O Banco estava... Nós já estávamos, assim, sentindo umas dificuldades na parte de financiamento de infraestrutura, porque até então a gente financiava tudo; empresas estatais que já estavam sem capacidade de nos pagar. Então, eu fui ser assessora da superintendente da área de infraestrutura. Isso para mim foi uma coisa, assim, que realmente é digna de registro. Se tem alguma coisa aqui que é digno de registro é reverenciar essa pessoa. Ela, infelizmente, não está mais... Já faleceu. Mas ela foi uma pessoa que exerceu uma influência...
P/2 – Quem era?
R - O nome dela é Maria do Rosário Piso; Rodrigues de Piso. E eu fiquei perto dela e foi uma coisa, assim, muito importante porque ela tinha um... Ela era, assim, toda entusiasmo. Foi talvez uma das primeiras mulheres que eu tenha visto ocupando uma função executiva de nível de superintendente. Talvez até ela tenha sido a primeira, eu não sei. Mas ela era, assim, muito entusiasmada, e ela era toda Brasil, toda, sabe? Uma pessoa, assim, com ideais, com... E tem mais: ela era uma pessoa que tinha um prazer de viver, e tinha um amor à família, tinha uma relação super prazerosa com os filhos. E ela me ensinou muito. Nossa, eu acho que eu devo a ela muito, muito mesmo das coisas que eu consegui depois superar, assim, na minha vida com o exemplo que eu tive de conviver perto desta pessoa. Ela era o máximo mesmo. Assim, como executiva, competente e, ao mesmo tempo, como pessoa mesmo. Já que é o Museu da Pessoa, essa era, assim, integrava as duas coisas na maior felicidade, sabe? Tudo para ela era leve. Mas é uma pena, ela realmente não está mais aí. Mas eu tive realmente muita sorte de ter conhecido, ela ter passado na minha vida. E eu, até hoje, vários momentos eu penso nela. Inclusive quando eu fui chamada para falar aqui.
P/2 – Ela já era funcionária antiga?
R – Era, ela era funcionária antiga, mas eu não a conhecia. Eu fui apresentada quando fui ser assessora dela. E ela fazia um trabalho justamente discutindo essa coisa do esgotamento do modelo que a gente estava vivendo.
P/2 – Fala um pouco disso?
R – Porque...
P/1 – Desse modelo, das propostas.
R – É? Vocês me avisam se eu estiver falando demais. Mas ela era... Ela estava estudando isso e trouxe até uma foto dela junto com o professor Ignácio Rangel, que também... Que eu falei antes dos ícones do Banco, né? O professor é, sem dúvida, um ícone do Banco. Ele já era aposentado e ele vinha ao Banco para ter reuniões com a gente porque ele gostava de participar dessas discussões. E ele estava preocupado com, justamente, com o passo seguinte; o que é que ia acontecer quando se esgotasse aquela possibilidade de financiar, como é que o Brasil ia crescer na parte de infraestrutura.
P/2 – Como é que estava a situação econômica? Que você está falando, só para dar uma esclarecida, né?
R – É... Na verdade, o que acontecia é que durante muito tempo o Banco financiou, tomando por lastro dessas operações receitas futuras. O pessoal até tinha uma maneira de explicar isso, dizendo “um dia o futuro chegou” porque a gente foi comprometendo as receitas e as empresas foram ficando com problemas. O Estado foi tendo uma... Diminuindo a sua capacidade de se financiar, de... E de, portanto, também tomar empréstimo e tal. E a gente começou a perceber isso, que não tinha mais garantias. Os financiamentos estavam... Digamos, assim, que a gente estava ficando vulnerável na parte de garantias para financiar setores como energia elétrica, como estradas, como... Os setores básicos de infraestrutura, que por outro lado eram fundamentais para qualquer possibilidade da gente dar um salto qualitativo no país; sem infraestrutura é impossível. Então, tinha esse gargalo, esse nó, e a gente começou a estudar a coisa da concessão, rever como é que tinha sido antigamente. E esse era basicamente o meu trabalho. Trabalhava com ela e com assessoria do professor Ignácio Rangel, que era, assim, uma honra, uma coisa incrível, ele era uma pessoa já de idade, ele vinha sempre ao Banco uma vez por semana encontrar com a gente. E era bom, era bom para... A impressão que eu tenho, obviamente, é que era bom para todo mundo. Acho que ele adorava vir e a gente adorava que ele viesse, e a gente agregava as pessoas. A gente, obviamente, a iniciativa e a responsabilidade era da Maria do Rosário. Agora... Então, ela levou essa discussão num período em que isso não se falava ainda, entendeu? Em que a gente estava com dificuldade de financiar a Eletrobrás, com dificuldades... Isso eram coisas, assim, que você não encontrava isso escrito em lugar nenhum, mas ela já estava percebendo.
P/2 – Não se comentava a crise? A crise econômica ainda não?
R – Não, a gente estava antevendo aqui pela... Por causa da nossa dificuldade de financiar, entendeu? A gente começou a perceber que ia chegar um momento que ia haver uma série de... Que nessa época tudo era interligado, os pagamentos etc. Então, em algum momento essa coisa estava começando a não fluir como era o previsto. Então, ela já estava imaginando como é que a gente poderia sair disso. Aquilo que eu tinha falado da coisa propositiva, né? De ter o dia-a-dia operacional e tal, mas ao mesmo tempo ter uma atividade de prospecção, de pensar um pouco introspectivamente no como seria o dia seguinte, né?
P/1 – E qual era, nessa época, o projeto que você considera mais importante? Ou quais os projetos, nessa época, que você considera mais importantes?
R – Eu acho que, no caso, eu não trabalhava, assim, diretamente com projeto nenhum. Eu acho que, no caso, a gente fez uma minuta de lei de concessão que depois, na época, o presidente, que era o Márcio Fortes, ele levou para Brasília e foi... Na verdade foi discutido e mais tarde, um tempo mais tarde, esse projeto, ele virou lei. Ele começou... Ele não virou lei, obviamente, exatamente igual ao que ele era projeto, mas digamos que o embrião dessas discussões foi exatamente nesse grupo que a gente ia procurando pessoas que pudessem nos ajudar e pudessem conversar sobre isso. Então, eu acho que, nessa época, eu destaco esse projeto que a gente trabalhou porque ao tentar fazer um projeto de como seria uma lei de concessão, que era uma coisa que estava prevista na Constituição, mas que não havia, a gente começou a antever uma série de dificuldades. Quais eram as dificuldades para se operar, por exemplo, serviço público através de iniciativa privada, que é o que hoje em dia está acontecendo. Mas é que aí agora já tem a lei; naquela época não tinha. Então, a gente mais ou menos começou a mapear as dificuldades que a gente tinha a partir desse trabalho. E era uma coisa, assim, prazerosa porque a gente tinha discussões. Não era uma coisa, assim, com grandes pretensões, a coisa não era... Era uma coisa levada num nível de informalidade, a gente escrevia notinhas, a gente trocava papéis com pessoas que criticavam, que... Era uma coisa, sabe, num nível de informalidade grande, mas que a gente percebia avanços. Então, o prazer vinha daí, que a gente começou a incorporar cada vez mais gente que estava conversando sobre mais ou menos a mesma coisa. Eu adorei esse período que eu fiquei com ela.
P/2 – Mais como um grupo de estudos?
R – Isso. Organizado por ela, idealizado por ela e ela, no momento... Quando ela chamou, me chamou, me convidou para ser assessora era para isso. Ela não precisava, assim, de assessora para nada dessas coisas que assessor normalmente faz. Ela era totalmente independente, autônoma. Ela queria alguém para fazer uma coisa que ela queria fazer também, além da parte operacional. Então, eu acho que foi uma lição, assim, de vida ter trabalhado com ela. Estou contente por dizer isso aqui porque é a pura verdade. Enfim, daí, quando chegou... Eu acho que eu fiquei próxima a ela até 1990; justamente. Aí, em 1990, eu fui assessorar o presidente Modiano. Acabou a área em que ela era superintendente, houve uma série de modificações no Banco e eu fui assessorar o presidente que tinha chegado, que eu também... Que eu não conhecia. Aliás, essa é uma característica. Todas as pessoas... Tirando o presidente Zé Pio Borges, que foi o meu primeiro gerente e aí então eu conhecia muito mesmo, tirando ele, os outros todos eu fiquei conhecendo no trabalho. Não conhecia antes.
P/2 – Quem faz essas nomeações? Você era nomeada?
R – É. No caso, quando fui ser assessora do Modiano, eu fui chamada na presidência e fui avisada que eu ia ser assessora dele. E que ali, em quinze minutos, eu ia ser apresentada a ele e tal. E eu fiquei, assim, Nossa Senhora, fiquei morrendo de medo, que eu achei aquilo um... Eu estava, assim, muito confortável com a pessoa, assim, que eu estava lá, fazendo uma coisa que gostava etc. Então, aquilo me deu uma impressão de fim de mundo; de começo de Governo e fim de mundo. (risos) Um pouco... Que foi exatamente ali a época do Collor, que juntou com a coisa da poupança, de segurar a poupança. Era tanta transformação ao mesmo tempo, eu fiquei um pouco tonta assim. E fiquei amedrontada com essa responsabilidade de ficar perto de uma pessoa que eu não conhecia e que não me conhecia. E, olha só, eu acho que a gente encontra as coisas... Às vezes, a gente julga, assim, uma coisa difícil e tal, ou acha que aquilo você está sendo contrariado nos seus projetos, e depois você descobre que não. E eu acho que esse foi exatamente um caso assim. Eu tive uma experiência fantástica, trabalhando nesse processo de privatização; o início, com o presidente Modiano. Eu tenho muito respeito por ele.
P/2 – E como foi montado esse programa? Como é que ele estava organizando? Ele estava setorizado ou ele era...
R – Nesse início não estava nada. Justamente quando eu cheguei, não tinha... Eu até achei que era para ser assessora dessas normais que, assim... Quer dizer, era normal, né? Na verdade normal não é uma palavra boa. Mas, na verdade, eu achei, assim, que a gente recebia pessoas, estava presente nas audiências etc. Mas a ideia dele era montar uma equipe para a privatização. Então, nós conversamos... Só que eu tinha zero de experiência de privatização. Fui muito franca com ele, mas ele me disse que eu ia aprender. E aí eu fui aprender mesmo. A gente teve reuniões com... Assim, durante fins de semana em hotéis com pessoas de outros países. Que o Banco Mundial mandou pessoas de outros países para contar experiências em outros países. Eu me lembro que teve uma Copa do Mundo que no dia do jogo Brasil e Argentina a gente estava no hotel assistindo essas experiências. Foi uma época de muito trabalho. Era enlouquecedor. Mas ele era uma pessoa extremamente segura nos objetivos que ele tinha e eu tive, assim, um ganho enorme porque eu acho que eu fiquei com um desafio, assim, na frente, sem ter ninguém que fosse meu amigo, nem... Entendeu? Aquela relação confortável que eu tinha construído com a Maria do Rosário sumiu, né? E... Eu tive que começar do zero com uma pessoa que eu não conhecia e que tinha fama de temperamental - e eu digo isso porque todo mundo sabe, ele deve saber que ele tinha essa fama. E ele até fazia jus mesmo. (risos) E eu, no início, ficava super, assim, amedrontada e tal de colocar as minhas posições. Mas isso durou um tempo. Depois as coisas foram acontecendo e o trabalho foi sendo grande. Na verdade foi o que começou a unir as pessoas e chamar outras pessoas do Banco para compor esses grupos. Ele montou uma estrutura que era matricial. Em cima das áreas que já existia, ele pegou pessoas de todas as áreas para cuidar de projetos específicos de privatização de empresas. Então, foi uma experiência de novo rica e diferente de trabalho, sabe? De novo uma...
P/2 – Uma mudança, uma mexida.
R – É, uma coisa interessante porque é o mesmo emprego, mas são muitos empregos.
P/1 – Mas, de certa maneira, você já tinha tido com a Maria do Rosário uma certa experiência nesse setor?
R – É, eu sabia dessas coisas, de por quê.
P/1 – Já estava pelo menos...
R – Exatamente. É, mas parava por aí, né? Que isso era uma coisa. Outra coisa é você pensar em venda de ativos. Essas coisas eu nunca tinha pensado. E o Banco já tinha vendido ativos pela BNDESPAR, pela subsidiária do Banco. Nessa época, a gente tinha, por força de empresas que deixaram de pagar ao Banco, tinha assumido o controle de várias empresas. Então, o Banco estava... A primeira experiência de privatização que ele fez foi com os seus próprios bens que ele tinha, na verdade, recebido sem muito querer exatamente assumir. Assumir o... Por falta de pagamento, né? E essa experiência dessa venda eu não participei. Eu entrei exatamente quando foi criado o programa de desestatização na fase do Modiano. E eu acho que foi uma coisa, um processo extremamente instigante. E foi o tempo todo depois da privatização assim porque eu justamente ia trabalhar com uma coisa que todo mundo na rua tem uma opinião. Teve uma época que eu fiquei enlouquecida.
P/2 – Como é que foi lidar com isso?
R – Assim, não podia ir ao cabelereiro que o meu cabelereiro me pedia para eu explicar para ele se era verdade que vendendo a Vale do Rio Doce a gente estava entregando as riquezas de subsolo. Eu ficava louca com isso porque eu não tinha sossego e, ao mesmo tempo, é muito interessante você estar mexendo com uma coisa que todo dia está no jornal, que todo dia está dando manchete, está dando debates, você tem que responder, você tem que... Inclusive, aí que está a riqueza da coisa. Muitas coisas a gente inclusive recebeu de contribuição a partir das críticas e mudamos no processo, no meio do caminho, várias coisas por conta dessas contribuições, desses debates que aconteceram o tempo todo na sociedade durante o programa. Foi uma coisa, assim, que eu diria que não foi nada confortável, entendeu? Não vou dizer que foi confortável. Foi uma época, assim, de sobressalto, de liminares, de coisas...
P/2 - De manifestações.
R - De oficial de justiça que está na casa do presidente à noite e coisas desse tipo. A gente ficava muito desassossegada assim, né? Não tinha nada de rotineiro. Agora, por outro lado, era interessantíssimo você ter esse contato que a gente não estava muito acostumado. Eu pelo menos... A gente, eu digo eu porque, de repente, a gente precisou conversar com gente, conversar com o Congresso, conversar com deputados, conversar com pessoas de todos os setores da sociedade, também com juizes, com o Judiciário, e fazer a defesa das ações...
P/2 – Foram muitas batalhas judiciais?
R – Foram muitas batalhas judiciais. Eu não me ocupava diretamente das batalhas judicias. Nessa época, o nosso superintendente jurídico era o Cláudio Neves e ele levava essa coisa da batalha judicial. Mas era... A gente tinha que acompanhar no gabinete. Tudo era acompanhado no gabinete durante todo o período de privatização, Isso, mesmo depois da saída do presidente Modiano, eu continuei como assessora do presidente Antônio Barros de Castro. Depois, eu fui ser assessora de privatização do diretor Zendron, quando a privatização ficou toda ela só com ele, numa fase que o presidente era o Delben Leite. Depois que eu estava com o Zendron, aí fui ser chefe de gabinete do presidente Pérsio Arida, no Governo Itamar Franco.
P/1 – Mariane...
P/2 - Convidada também por ele?
R – Por ele quem?
P/1 – Pelo Pérsio Arida ou também foi como aconteceu com o outro convite quando o Modiano entrou?
R – Quando o Modiano entrou ele me convidou, mas ele me convidou, assim, sem me conhecer, né? Conhecendo indiretamente, imagino, né, claro! Mas... E Pérsio Arida também. Pérsio Arida, inclusive, foi uma coincidência. Eu acho que foi a primeira vez que eu tinha pensado em fazer o mestrado foi exatamente nesse momento aí. Eu me lembro que no dia que eu fui descobrir como é que eu pegava um histórico escolar da faculdade para fazer inscrição para fazer prova no mestrado, quando eu cheguei tinha um recado que o presidente tinha me convidado para almoçar. Aí, eu achei engraçado porque eu pensei "não pode ser eu, né, porque ele não me conhece". Então, claro que esse recado veio parar numa... Eu achei engraçado porque eu tinha saído de manhã para ir ao Fundão e isso nunca acontecia. (risos) Então, eu pensei: “Poxa, justo no dia que eu vou no Fundão eu chego e tem esse recado, que logicamente não é endereçado a mim, né?” E liguei para as secretárias e disse: “Olha, gente, tem um recado aqui que tem que repassar aí para alguém.” Ela falou: “Não, mas é você mesmo que ele está convidando.” E aí, vê só como é que são as coisas, né? Assim contando é... Eu acho que é uma coisa assim, não sei, sei lá, o que acreditar, no acaso, ou na sorte, ou nas coisas, não sei. Muitas vezes... Às vezes índio, às vezes robô, né? Não sei o que dizer disso, mas foi exatamente nesse dia que ele almoçou comigo, me convidou para ser chefe de gabinete dele, e de tarde eu já estava na reunião de diretoria.
P/1 – Mariane?
R – Entendeu? Ninguém sabia, entendeu? Ninguém sabia até porque eu não tive tempo. Eu já saí do almoço para a reunião, e as pessoas que me viram na reunião é que ficaram sabendo que eu iria trabalhar com ele.
P/1 – Mariane, voltando um pouquinho só, teve uma pergunta que eu fiquei um pouco curiosa. Dentro do programa de desestatização, nessas idas e vindas, você falou que alguns processos vocês recuaram ou deixaram de fazer por algumas críticas, e que muitas vezes essas críticas...
R – Não, não, desculpa. Então eu me expressei mal. Não é exatamente recuar. A gente, às vezes, percebeu que tinham alguns problemas e a gente modificou o projeto...
P/1 – Exatamente isso.
R – Pelo feedback, entendeu, que a gente teve da...
P/1 – Exatamente. Você se lembra de algum caminho que vocês tinham tomado e devido a essa... vocês chegaram à conclusão que algumas críticas estavam certas, exatamente?
R – Inúmeras coisas. Eu me lembro, assim, especificamente eu vou citar um, da Vale do Rio Doce quando a gente percebeu que havia tanta celeuma em torno dessa coisa do contrato do subsolo etc., a gente justamente... Quer dizer, eu falo a gente, é o presidente, obviamente o presidente Luís Carlos. Ele achou que a gente devia, na verdade, partir para fazer uma coisa separada, fazer um contrato. Um contrato com relação a esses... Isso que a gente ainda não sabia o que era, que era o subsolo, as riquezas do subsolo, estabelecendo que nessa parte especificamente que viesse a ser descoberta depois a União teria exatamente a mesma quantidade de ações que já tinha naquele momento para de alguma forma deixar, dar uma resposta a isso, que era uma coisa sem resposta. Eu me lembro assim: isso foi uma coisa tão marcante que eu me lembro uma noite que a minha filha veio no quarto e disse para mim: “Mãe, eu sei que você conhece todo mundo que você trabalha. E eu sei que você confia nas pessoas. Mas, olha só, no colégio todo mundo está dizendo que vocês estão roubando. E eu estou brigando com todo mundo porque eu digo 'a minha mãe não'.” (risos) Eu fiquei, assim, impressionada porque aquilo era o exemplo da... Exemplo de duas coisas, né, na verdade. Era um exemplo, em primeiro lugar, de que a sociedade estava conversando sobre uma coisa que nunca conversava. E, segundo, que havia, na verdade, uma animosidade, uma coisa que um pouco ideológica, sem dúvida, porque você colocar lá umas pessoas ainda de ensino de Primeiro Grau numa sala e dizer que todas as pessoas envolvidas nisso estavam, de alguma forma, se locupletando não deixa de ser uma coisa que não é muito de fé, né? Então, eu falei para ela: “Olha, minha filha, eu vou te falar o seguinte: você não tem... Não tem nenhuma, nenhuma... Não tenha nenhuma preocupação de me defender porque essa discussão é uma coisa... Isso é um projeto do Governo. A gente está trabalhando para um Governo que foi eleito com essa plataforma. Agora, você não vai dizer isso, entendeu? Eu estou contente de saber que você sabe que eu não, mas você não precisa, entendeu, tomar isso pessoalmente porque obviamente que ninguém está falando de mim nesse processo.” Mas cheguei, inclusive, a comentar isso no Banco; que havia uma pressão até, assim, em nível escolar, nas crianças e tal. Isso nunca tinha me acontecido antes, de ter um trabalho que a minha filha ficasse preocupada com a minha reputação. Imagina que... Porque todo mundo sabia que eu trabalhava nisso, e tinha lances, a gente ia para os leilões de helicóptero. Então... E eu morro de medo de helicóptero. Então, eu não sabia nem o que eu tinha mais medo; se era briga na Praça XV ou helicóptero. (risos) Era a própria cruz e a caldeirinha. Mas foram dias, assim, incríveis. E aí depois que passou a privatização, especificamente da Vale, a gente até teve uma oportunidade de encontrar com o Presidente da República, ele quis cumprimentar. Eu acho que de alguma forma chegou para ele... De alguma forma não! Pela presidência do Banco chegou a ele o nível de envolvimento que os funcionários estavam, estavam tendo nesse tipo de coisa. Foi diferente mesmo. Foi uma experiência, de profissional, eu acho que completa em termo de você aprender a dialogar, escutar num momento, assim, que tinham lances muito emocionais, as coisas que eram escritas, que a gente tinha que responder e tal; eram coisas, muitas vezes, emocionais. Por outro lado, eu acho que isso também toca num ponto que é nevrálgico, né, que é o problema da comunicação. Como é difícil você, na verdade, estar aberto para responder, e conversar com as pessoas e poder explicar a todas as pessoas porque elas têm direito de saber o que é que você está fazendo. Não adianta você dizer “não, eu sou..., eu estou agindo super corretamente". Mas você tem que ter outras... Não vou falar em transparência não que é clichê, mas é muito, assim, difícil essa tarefa de trocar em miúdos, e se fazer conhecer, e mostrar o seu esforço e dizer para as pessoas que ninguém tem monopólio de patriotismo, nem monopólio de nada, que todas as pessoas, de alguma forma, estão querendo acertar, né? E essa... Eu acho que isso é uma coisa, assim... Eu acho que é muito difícil, viu? Muito difícil de fazer. Eu acho que a gente mais uma vez aprendeu fazendo com todos os... Eu não estou querendo dizer que foi extremamente bem sucedida não. Estou querendo dizer que a gente teve, em alguns momentos, que a gente perdeu algumas coisas pela nossa incapacidade entre aspas de, ao mesmo tempo, dialogar com todos os setores. A gente esteve até com a Igreja. Quer dizer, não estou discriminando a Igreja não! Mas, quer dizer, inclusive a Igreja. Todo mundo se manifestava a respeito e nós nem tínhamos, nem éramos tantos assim para fazer esse corpo a corpo, e explicar, e audiências públicas, e televisão. Então, eu acho que foi uma coisa que ocupou o corpo técnico do Banco e que eu acho que os executivos, assim, os diretores, o presidente que trabalharam nisso ficaram pessoalmente com a sua disponibilidade de tempo físico completamente tomados, engajados por esse projeto. Foi uma coisa, assim, interessante. Interessante, para dizer o mínimo, né? Porque a coisa...
P/2 – Mariane, me conta um pouquinho, você se refere no seu currículo sobre as negociações com a Siderbrás, a extinta Siderbrás.
R - Pois é.
P/2 - Me conta, um pouco, para a gente entender.
R – Essa foi a primeira privatização. Foi na época do Modiano. Foi, assim... A privatização estava marcada para o dia 24/9, quando chegou em agosto nós estávamos fazendo levantamento de pendências. Nós estamos... Era o primeiro, né? A nossa primeira experiência. Então, todos os dias a gente encontrava novas, novos detalhes, novas coisas que a gente, às vezes, não tinha antecipado ou às vezes a gente tinha antecipado, mas esperava um desdobramento diferente. Mas aí apareceu essa tarefa na nossa frente porque, na verdade, a Siderbrás era 100% do Governo. Tinha sido extinta e, portanto, a gente... Ela estava amarrada na coisa da negociação da dívida externa do Brasil. E se a gente começasse a vender empresas sem ter o assentimento, o waiver, dos credores, isso poderia desencadear o vencimento de toda a nossa dívida porque nos contratos dizia isso, entendeu? E, na verdade, com a extinção da Siderbrás e aquela operação do desmonte, isso tinha ficado um pouco, assim, relegado ao segundo plano, eu diria. Tanto que em agosto, a gente... Eu soube numa quinta-feira que eu ia embarcar no sábado para Nova York para participar de uma missão para tentar conseguir num tempo recorde com os credores, essa, essa... Esse, digamos, esse assentimento que estava previsto nos contratos da dívida externa. Que é uma coisa... Normalmente você não pode... Quando você está devendo, você não pode se desfazer dos seus bens sem perguntar ao credor antes e era isso do que se tratava. Nós íamos anunciar nos jornais que nós estávamos nos desfazendo. Então, eles teriam todos os motivos do mundo para no dia seguinte vencer a dívida. Nós tínhamos que arrumar essa parte aí, tanto fosse isso formal, exclusivamente ou não, a gente não sabia, nós tínhamos que acertar esse lado. E aí houve uma missão em que foi, justamente, quem levou... Foi o... Que capitaneou essa missão foi o Pio Borges, que era vice-presidente do Banco. E foi ele, eu e foi a Maria Silva, que hoje em dia está... Desculpe, na CSN, que era assessora do Modiano e tinha ficado no Banco. Nessa altura era inspetora da... Aliás, eu acho que não. Isso aí eu estou fazendo confusão. Ele, o Pio, era vice-presidente do Modiano. Isso foi na primeira privatização. Foi na Era Modiano. Ela era assessora do Modiano, eu era assessora do Modiano, nós fomos juntos, assim, num sábado a noite para chegar domingo em Nova York, segunda começar a trabalhar. Trabalhamos uma semana inteira. Eu nunca vou esquecer. Nova York estava, assim, muito mais quente do que o Rio de Janeiro em fevereiro. Estava assim 40 graus, tudo melado, tudo... Sabe quando você está numa de horror mesmo. Estava, não sei com quê que eu estava mais preocupada; com a responsabilidade, com o impacto de está ali fazendo aquele trabalho e com a pressão do prazo, né?. E a gente encontrou em Nova York pessoas do Tesouro, inclusive o Sturzenegger, que nessa época eu acho que estava... Eu não tenho certeza se ele estava no Banco Central ou se ele já estava na PGFN, na Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. Mas que também nos ajudou nessa negociação. Nós marcamos inúmeros encontros com os líderes porque a dívida é toda em cadeia. Você tem líderes de... Bancos líderes. Então, em três, quatro dias nós tivemos muitas reuniões sempre para explicar como era o processo, qual era a legitimidade do processo, qual era a base legal, qual era o objetivo. E foi, assim, incrível porque a gente... No final da semana nós conseguimos, começamos a receber os fax de resposta, conseguindo os waivers. Quando nós saímos de Nova York nós já tínhamos, assim, 80%, considerando que em cadeia, quando os líderes dão, imediatamente os bancos que estão associados também dão, nós já tínhamos 90% disso feito. Foi, assim...
P/2 – Uma vitória?
R – Uma coisa tipo... É, foi tipo missão... Sabe? Missão de última hora, inesperada. Foi muito interessante ter feito isso. A gente... Eu digo sempre interessante por falta de outra palavra, mas foi extremamente desafiador fazer isso, assim, de novo, no meu caso específico porque a Maria Silvia ela tinha uma certa experiência com negociação de dívida externa. Mas no caso meu, aprender a fazer, fazendo, né?
P/2 – Mariane, a gente já está com o tempo um pouco esgotado...
R – Pois é, eu estou imaginando isso.
P/2 – Vamos só fazer um bate-bola rápido?
R – Lógico.
P/2 – Alguns presidentes que você assessorou nesta última década de 90 tiveram um espaço de tempo muito curto; o Calabi... Enfim, são vários ao longo desses últimos anos. É possível deixar uma marca em tão pouco tempo ou, enfim, só dar continuidade para os projetos que já estão em andamento? Se é possível, você pode destacar um de cada...
R – Um de cada presidente?
P/2 – Que você assessorou?
R – Olha, eu acho que... Eu acho que difícil é a pessoa não deixar uma marca, né? Eu acho que a pessoa sempre deixa uma marca. Acredito nisso. E acho que às vezes... Às vezes, dar continuidade em alguma coisa em determinados momentos é extremamente importante e, às vezes, lançar a semente de uma coisa que ainda virá depois, se o outro der continuidade, também é extremamente importante. Então, eu acho que todos eles deixaram uma marca. E eu não sei, assim, o que é que você considera de pouco tempo porque teve... Não sei se a gente pode estabelecer o que é que seria pouco tempo porque os presidentes que tiveram...
P/2 – Alguns meses.
R – Mais, mais, mais tempo, claro que eles deixaram marcas e todo mundo pode destacar, assim, de cara. Mas, por exemplo, no caso, quem é que teve meses?
P/2 – Calabi.
R – O Calabi, ele deixou claro quando chegou a intenção e anteviu a necessidade do Banco passar por um processo de estruturação, de repensar a sua estrutura, de reestruturação. Então, quer dizer, ele não chegou a implementar isso mas ele já deixou essa ideia no ar, né? Já conversou com as pessoas sobre isso, ele trouxe experiências que ele já tinha vivido na vida pública em outros lugares sobre isso, para nós, sem dúvida.
P/2 – O Lara Resende também ficou menos de um ano.
R – O Lara Resende também ficou menos... O André ficou... O presidente André Lara Resende ficou menos de um ano, mas ele também, sem dúvida, deixou uma marca porque ele fez um esforço enorme na época na privatização do setor das telecomunicações, que é a época que o Luís Carlos era Ministro das Comunicações. E ele atuou exatamente numa sintonia; o Luís Carlos, ele e o Zé Pio Borges, levando esta coisa que não foi, todo mundo sabe, que não foi uma coisa trivial, para dizer o mínimo. E ele deixou uma marca.
P/1 – Telecomunicações?
R – É. Deixou a presença dele. Sem dúvida ele foi muito atuante e, ao mesmo tempo, extremamente discreto e teve uma atuação importantíssima para o Banco.
P/2 – Mariane, você está voltando para o Banco. Quais são as suas expectativas agora? Está na sua primeira semana...
R – As melhores possíveis. É, as melhores. É como eu disse...
P/2 – Você vai para que área?
R – Eu estou na área que se chama... A sigla é SP2... SP1.
P/2 – Setores Produtivos 1.
R – É, porque isso é o que estou aprendendo, né? Um novo jargão. Agora vocês me puseram numa... Nem pensei nisso, né? Mas é que também eu cheguei esta semana. Então... Mas eu estou com... Trabalhando próximo ao superintendente Jorge Kalache, que vocês vão ter a oportunidade de entrevistar. E é uma coisa, assim, até supersticiosa porque ele foi uma das primeiras pessoas com quem eu trabalhei quando eu entrei no Banco da primeira vez, né? Então, eu estou lá próxima dele e estou tendo essa visão, assim, agora de... Estou ouvindo as pessoas, falando sobre estas reformas. São coisas que eu ainda não estou... Não tenho opinião nenhuma formada, mas tenho, assim, exatamente esta sensação que nós continuamos com a preocupação de pensar, e de melhorar, e de ajustar, e ver se isso está de acordo, não está. A inquietação das pessoas é a mesma e eu tenho uma preocupação pessoal de que a gente consiga, ainda que sejam outros os tempos, mas tentar dar para as pessoas que estão no Banco chegando agora exatamente o tipo de suporte que a gente recebeu. Eu acho que é fundamental a gente pagar agora o que a gente recebeu, passando para as pessoas a história, e passando para as pessoas o máximo de conhecimento possível para que elas se integrem e façam parte deste esforço que o Banco está fazendo, entendeu? Não deixar a peteca cair no sentido da gente procurar... Eu tenho que dizer para vocês o seguinte: eu, uma vez, já vi uma espécie de projeto memória, pessoas falando sobre o Banco, sabe, sobre a experiência. Fiquei, assim, abaladíssima. E, realmente, tenho que dizer para vocês que eu acho incrível hoje ter feito isso, sabe, assim de alguma forma. E certamente vou demorar a dormir esta noite porque eu fiz um...
P/2 – Balanço.
R – Uma viagem aqui no tempo. Posso ter sido... Sei lá, posso ter cometido omissões imperdoáveis, mas é muita coisa mesmo e eu fiquei pensando nisso; que coisa incrível, que chegou a minha vez de falar e de... E de dar o depoimento. Quanta responsabilidade.
P/2 – Só para não deixar as meninas de fora... (troca de CD)
P/1 – Mariane, como é que foi, ao longo desses anos, a dupla jornada trabalho e casa?
R – Olha, eu acho que, sem dúvida, foi uma coisa bastante, assim, complicada, né? Uma coisa complicada quando você quer estar presente em dois lugares. Parece que ainda não conseguiram inventar isso, né? E a gente, quando está trabalhando sério assim, comprometido com um projeto grande, e aí eu estou falando do lado profissional, é muito... Às vezes você fica com muitas... Se sentindo muito exigido pelo fato de precisar, de não poder deixar cair a peteca do outro lado por uma questão de compromisso maior que você tem. O maior compromisso que você tem, sem dúvida, é com você como pessoa, com família etc. Eu acho que, no caso, eu posso dizer que o banco me ajudou muito nisso porque na minha família eu acho que fui a primeira mulher a trabalhar, mesmo em gravidez etc., sem interrupção, só com os meses de licença maternidade regulamentares. E muitas das coisas, das soluções que eu arrumei, eu arrumei, e o meu marido, claro, ouvindo experiências de outras pessoas, que isso o Banco tem de maravilhoso. Quando você está no Banco não existe problema que alguém não tenha tido, que possa te dar uma gama de informações. Você pode escolher qualquer coisa, entendeu? Alguém sempre já fez aquilo ou conhece alguém e isso funcionou demais. Nós tínhamos um... Temos, graças a Deus, lá um grupo grande de mulheres. Nenhuma abriu mão de nada, entendeu? Todo mundo queria mesmo ter os filhos, casar, dançar, ir ao cinema, fazer compras e também trabalhar muito sério, também ir a Brasília, e fazer as coisas. E a gente, de uma forma ou de outra, foi descobrindo soluções. Assim, trocando ideias. Tendo pessoas que têm exatamente as mesmas dificuldades que você tem ajuda demais, né? Porque, às vezes, você conversar com alguém que não tem essa dificuldade, a pessoa até fica aflita, começa a dizer "Ah, meu Deus, isso não vai dar certo." Aí alguém diz: "Não, isso vai dar e tal." E eu citei aqui, expressamente, o caso da Maria do Rosário, que foi uma pessoa que sempre me disse isso: "O importante é ter prazer". E filho é prazer, né? Então, na verdade, as minhas duas meninas, elas só vieram para ajudar, assim, fazer... Ficar com mais harmonia, a vida ficar com mais graça de também ter esse outro lado, o lado das crianças, de ouvir, de ter... Para nós era um... Sempre foi uma... A melhor coisa que a gente fez na vida realmente foram elas. São...
P/2 - Quais são os nomes delas?
R - A minha filha mais velha chama Carolina. Quando eu dei esse nome, achei que estava sendo super original. Depois eu descobri que na faixa etária dela tem uma quantidade de Carolina assim... E a outra chama Cláudia. Então, é engraçado porque elas estudaram todas as duas no Colégio Santo Agostinho, e lá a organização das turmas é por letra. Então, por isso, que eu estou citando expressamente isso. A Cláudia, ela é única Cláudia... Foi a única Cláudia, que agora ela já é universitária. E Carolina já está formada. Mas a Carol, quando estava numa turma do Santo Agostinho lá, praticamente todas se chamavam Carolina. Eu fiquei, assim, meio desconfiada da minha capacidade de ser original porque eu acho que... Achava o nome lindo, achava que ninguém tinha pensado nisso. Mas elas participaram de todas essas coisas com a gente e, especialmente... Claro que eu tenho que dizer isso porque o meu marido também tinha a mesma visão que eu e ajudou nessa empreitada. Porque não é simples, não é trivial não. Não é dourar a pílula e dizer que isso é uma coisa que a gente faz com o pé nas costas. A gente tem momentos que a gente fica muito dividido, né? Mas não dá para abrir mão também, não chega a ser uma coisa de abrir mão. Acho que a gente não deve abrir mão não, porque vale a pena.
P/1 - Carolina é formada em...
R - Direito. É formada em Direito...
P/2 - Seguiu a mãe.
R - Está trabalhando.
P/1 - E a Cláudia?
R - A Cláudia está fazendo Economia. Lá em casa é tudo assim, né? A Cláudia está fazendo Economia e o meu marido é economista. E ela está no primeiro ano. E a Carol é advogada. Então, agora é advogada mesmo.
P/1 - Está trabalhando no Banco?
R - Não, não, a Carol desde o terceiro ano faz estágio... Fazia estágio e agora virou uma associada, como diz hoje em dia. Faz parte do escritório; escritório de advocacia no Rio de Janeiro. Então ela não está no Banco não. Não foi tanto também os passos da mãe porque aí não... Mas, enfim, eu acho que elas são uma coisa que eu acho que faz com que tudo entre no lugar, todas as peças, até os esforços que você faz você olha para casa, você pensa no seu país, nas suas coisas, no seu emprego, e olha especificamente para os seus filhos, né? Toda hora você faz isso. Você olha para os seus filhos e pensa, assim, no dia de amanhã. A gente hoje em dia toma decisões que vão ser... As repercussões vão acontecer quando a gente, provavelmente, não estiver aqui, né? Mas talvez os nossos filhos, nossos netos estejam, então a gente está ali. A que não pode esquecer disso não. Tem que...
P/2 - Você ainda agora falou que você fez um balanço na sua vida.
R - É, assim, né?
P/2 - Se você tivesse que mudar alguma coisa você mudaria o quê? Não mudaria nada?
R - Olha, boa pergunta. Certamente, em algum momento teria mudado alguma coisa, mas você vê que nesse momento não me ocorre, entendeu? Não me ocorre nada, assim, que eu tenha como uma grande, um entendimento completo de que foi algo que eu fiz que não devia ter feito, entendeu? Não me ocorre não. Agora, certamente, alguma coisa eu devo ter feito que eu faria diferente, ou muitas coisas talvez.
P/1 - Nas horas de lazer, o que você gosta de fazer nas horas de lazer?
R - Olha, em primeiro lugar, eu adoro hora de lazer. (risos) Eu gosto muito de... De praia, continuo gostando, eu gosto muito de ler, eu gosto de cinema, de sair com os amigos e de estar com a família. Eu acho que são as coisas, assim, que... Sabe? Gosto de cinema, gosto de teatro, adoro morar no Rio de Janeiro e fazer a vida do Rio de Janeiro; andar na praia aos domingos e fazer as coisas que todo mundo faz aqui.
P/1 - E quais são os seus sonhos?
R - Os meus sonhos? Bom, isso é uma pergunta... Eu acho que eu estou numa fase interessante da vida agora porque já estou, assim, bem madurinha, assim muito madura e ao mesmo tempo eu tenho a sensação de estar recomeçando por causa dessa, desse intervalo aí, desse breve intervalo que eu passei na Academia. Então, eu acho que eu estou até na hora de pensar em sonhos. Eu acabo de realizar uma coisa que eu tinha assim, não vou colocar numa categoria sonho exatamente, mas um projeto que eu tinha que eu acabo de completar. Acho que eu estou na hora de pensar em outros e tal. Estou num momento, assim, interessante por causa disso, que eu estou pensando, mas eu não citaria nada assim expressamente, pontualmente. Eu acho que eu estou, assim, feliz, sabe? De ter voltado, apesar de ter adorado a vida na Academia, ter achado que ser professor... Talvez se eu... Uma coisa que eu devesse ter feito era mestrado antes para também ter tido, ao mesmo tempo do Banco uma vida acadêmica mais intensa. Tivesse começado mais cedo esse lado, que eu acho muito bacana a vida de professor de nível, assim, universitário, tal. Achei que uma coisa... Gostei do que eu assisti. Então, talvez, até respondendo a outra pergunta, eu acho que, talvez, eu pudesse ter feito isso ao mesmo tempo, mas nunca uma coisa pela outra, entendeu? Que eu acho que aí é... É complementar uma coisa com a outra. Eu acho que, agora, eu estou... Eu tenho que pensar alguma coisa por aí; projetos para ter pela frente.
P/1 - Falando em projeto, o que você acha... O que está achando desse projeto BNDES 50 anos e o que você achou de ter prestado esse depoimento?
R - Bom, eu acho que... O que eu achei de prestar o depoimento, eu até já respondi, né? Eu acho que eu me antecipei a sua pergunta. Se eu soubesse!
P/1 - Não, mas, é para responder de maneira...
R - Tinha deixado para o... Eu fiquei... Olha, eu acho assim, que comemoração dos 50 anos do Banco é devida. Eu acho que a gente deve comemorar, não só os funcionários, mas a sociedade e a gente deve procurar continuar se esforçando para estar à altura das responsabilidades que a gente tem e para que... Se esforçando para que quem está do lado de fora perceba isso, que a gente está se esforçando, que não adianta, como eu disse, hoje em dia é fundamental você ter as suas pontes, aprender a fortalecer as suas pontes. Então, eu acho que o Banco fazer essa comemoração de 50 anos é devida. Eu presto a minha reverência aqui ao Banco, a mínima parte que eu tenha tido participação nisso, mas muito mais na história mesmo em torno do Banco desde a sua criação muitas pessoas que passaram lá de um valor enorme, que prestaram serviços, e que são coisas, assim, complicadas porque são na maior parte das vezes, assim, intangíveis, né? É um serviço que é prestado muitas vezes e que a visibilidade é difícil, né? Então, eu acho que sou 100% a favor da gente comemorar os 50 anos do Banco e participar aqui. Então eu achava que desde a primeira vez que eu li e que ia ter captação, depoimento, não sei o que, sempre pensei: "Ah, esse é o tipo da coisa que histórias ótimas sobre o Banco todos nós temos lá. Faz parte lá da nossa vida." Mas nunca esperava ter tanto tempo e nunca esperava ser tão perguntada, para falar a verdade assim. (risos) Eu não sabia que... Eu pensei o tempo todo, como eu disse no início, vocês até... Na verdade, ali, quando eu perguntei: "Vem cá, a ênfase é no Banco, né?" Depois que chegou numa certa hora, eu falei: "Olha, espera aí, eu não estou entendendo? Não me chamo BNDES. Nós estamos indo, indo, indo." Mas, foi, de qualquer forma, eu adorei. Achei que foram perguntas super, assim, encadeadas, super... Para mim foi ótimo conversar com vocês.
P/1 - Então, muito obrigada, Mariane. Também foi um prazer.
R - Também muito obrigada.
P/2 - Muito obrigada. Foi um prazer.
R - Obrigada. Espero que a gente se encontre. Quero ver depois como é que vai ser o...
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