P1 – Boa tarde, Dona Maria.
R – Boa tarde.
P1 – A gente costuma pedir para que as pessoas se apresentem, então eu queria que a senhora dissesse o seu nome completo, a data e o local do seu nascimento.
R - Meu nome é Maria da Encarnação de Brito Fernandes Brandão. Sou do Minho, Portugal. Sou portuguesa e nasci no dia 18 de abril de 1949.
P1 – E o nome dos seus pais?
R – João Pereira Fernandes e Rosa de Brito
P – A senhora veio pequenininha para o Brasil? Como é que foi isso?
R – Eu vim para cá com oito anos, vim fazer nove anos aqui no Brasil.
P – E lá em Portugal, do que a senhora lembra do Minho? O que seu pai fazia, sua mãe...
R – Eu era muito criança. Meu pai já estava aqui no Brasil, ele veio para cá e de três em três anos ele ia para lá. Eu lembro muito pouco, eu era criança.
P1 – E seu pai veio para o Brasil por quê, Dona Maria?
R – Ele veio porque o meu avô – o pai dele – já estava aqui. Então, ele veio para cá para fazer alguma coisa, procurar algum trabalho, né? Veio junto com o pai dele e de três em três anos ele ia para lá. Depois, no final, em 1957, mais ou menos, ele resolveu trazer a família.
P1 – E ele veio para o Rio de Janeiro?
R – Para o Rio de Janeiro.
P1 – E ele ficou exatamente em que local da cidade?
R – Aqui no Rio de Janeiro mesmo, né? Ali na Tijuca.
P – E a senhora não lembra o que ele fazia nesta época?
R – Ele trabalhava com construção civil.
P1 – Ah, então ele participou de um momento em que o Rio de Janeiro estava em mudança?
R – Exatamente.
P1 – O que a senhora lembra desse período?
R – Não tenho muita recordação assim, não.
P1 – E os avós portugueses, a senhora conheceu?
R – Muito pouco, porque quando a minha avó faleceu eu era garota, criancinha ainda, com quatro ou cinco anos, a mãe da minha mãe....
Continuar leituraP1 – Boa tarde, Dona Maria.
R – Boa tarde.
P1 – A gente costuma pedir para que as pessoas se apresentem, então eu queria que a senhora dissesse o seu nome completo, a data e o local do seu nascimento.
R - Meu nome é Maria da Encarnação de Brito Fernandes Brandão. Sou do Minho, Portugal. Sou portuguesa e nasci no dia 18 de abril de 1949.
P1 – E o nome dos seus pais?
R – João Pereira Fernandes e Rosa de Brito
P – A senhora veio pequenininha para o Brasil? Como é que foi isso?
R – Eu vim para cá com oito anos, vim fazer nove anos aqui no Brasil.
P – E lá em Portugal, do que a senhora lembra do Minho? O que seu pai fazia, sua mãe...
R – Eu era muito criança. Meu pai já estava aqui no Brasil, ele veio para cá e de três em três anos ele ia para lá. Eu lembro muito pouco, eu era criança.
P1 – E seu pai veio para o Brasil por quê, Dona Maria?
R – Ele veio porque o meu avô – o pai dele – já estava aqui. Então, ele veio para cá para fazer alguma coisa, procurar algum trabalho, né? Veio junto com o pai dele e de três em três anos ele ia para lá. Depois, no final, em 1957, mais ou menos, ele resolveu trazer a família.
P1 – E ele veio para o Rio de Janeiro?
R – Para o Rio de Janeiro.
P1 – E ele ficou exatamente em que local da cidade?
R – Aqui no Rio de Janeiro mesmo, né? Ali na Tijuca.
P – E a senhora não lembra o que ele fazia nesta época?
R – Ele trabalhava com construção civil.
P1 – Ah, então ele participou de um momento em que o Rio de Janeiro estava em mudança?
R – Exatamente.
P1 – O que a senhora lembra desse período?
R – Não tenho muita recordação assim, não.
P1 – E os avós portugueses, a senhora conheceu?
R – Muito pouco, porque quando a minha avó faleceu eu era garota, criancinha ainda, com quatro ou cinco anos, a mãe da minha mãe. A mãe do meu pai faleceu justamente um pouco antes de nós virmos para o Brasil, ela também estava muito adoentada, e meu avô faleceu aqui; e eu nem conheci; e também se conheci eu não lembro.
P1 – E quando a senhora veio para o Brasil, garota, vocês vieram de que, de navio?
R – Navio.
P1 – E da viagem a senhora lembra, não lembra?
R – Ah, lembro!
P1 – E o que a senhora lembra?
R – Das besteiras que a gente faz, pegar maçã, jogar no mar...
P1 – Quantos dias durou essa viagem?
R – Vinte e um dias.
P1 – Vinte e um dias?
R – É
P1 – E veio a senhora, a sua mãe e quem mais?
R – Nós somos seis filhos, quatro são portugueses e dois, brasileiros, então viemos eu, mais três irmãos e minha mãe.
P1 – Ela veio sozinha com três crianças?
R – É, e eram todos pequenos. Eu era a mais velha.
P1 – E de onde vocês saíram de Portugal para pegar o navio?
R – Nós saímos de Lisboa.
P1 – De Lisboa. A senhora lembra alguma coisa da cidade?
R – Não, não tenho a mínima lembrança...
P1 – Nem do Minho?
R – Eu me lembro que nós fomos lá e, na época, o meu avô por parte de mãe tinha um parentesco com o Salazar. Eu lembro que nós fomos ao gabinete dele para fazer alguma coisa, mas lembro muito pouco, não tenho a mínima ideia.
P1 – E lá no Minho, que é uma região em que deve ter sido uma delícia ser criança... O que a senhora lembra do Minho?
R – Com certeza, eu tinha de tudo, todo o conforto possível. Porque o meu avô tinha quintas. Então, eu morava numa casa de três andares; a gente tinha um conforto muito bom, nunca faltou nada, sei lá. A gente brincava daquelas brincadeiras de criança, né? Às vezes, a gente roubava uns cachinhos de uva, tinham umas uvas lá que o pessoal tinha mania de guardar: “É pra missa, é pro padre”. A gente pegava e saía escondido para roubar cachos de uva, depois a gente apanhava, mas a gente aprontava, né? Essas coisas assim de brincadeiras de criança, de ir para o rio, de ficar brincando no rio...
P1 – Comia amêndoas, castanhas?
R – Ah, sim! Com certeza! Muito! Castanhas, então, a gente pegava do pé, tirava a castanha, era muito bom.
P1 – A senhora voltou para Portugal depois?
R – Não. Eu ia agora, há uns quatro anos, mas aí a minha sogra ficou doente e não deu para ir.
P1 – Tem alguma lembrança de que a senhora sinta saudades da sua infância lá em Portugal?
R – Só mesmo a casa do meu avô.
P1 – Como era o nome dele?
R – Era João Souza.
P1 – E ele produzia nas quintas?
R – É, tinha tudo. Ele produzia azeite, vinho, tudo, farinha. Ele tinha um moinho também, por causa da farinha. Eu sinto saudades do local, da casa onde eu praticamente nasci. Tinha vontade de voltar lá só para ver... A casa ainda está lá. Fizeram umas reformas e tudo, mas também tem o medo de andar de avião...
P1 – A casa ainda está lá?
R – Está.
P1 – Mas ainda é da família?
R – Ainda é da família. É porque meu avô deserdou minha mãe, quando nós viemos para cá, então minha mãe...
P1 – Por quê? Como assim?
R – Porque ela era a caçula e ficou tomando conta dele. O meu avô faleceu com 98 anos e ela veio escondida porque se ele soubesse não ia deixar ela vir para cá. Então, quando ele soube, nós já estávamos praticamente chegando aqui ao Brasil. Aí é que ele deserdou minha mãe. Esta casa seria dela, como ela não comunicou e saiu, deixando ele lá sozinho com as minhas outras tias, então ela ficou para uma prima. Minha prima é que herdou a casa no lugar dela.
P1 – Mas por que ela veio escondida?
R – Talvez por medo, de emoção, de deixar ele lá sozinho, porque ela era muito querida por ele.
P1 – Deve ter sido difícil para ela fazer isso também?
R – Ah! Foi muito difícil, com certeza!
P1 – E como foi chegar no Brasil? O que a senhora lembra de chegar de navio no Rio de Janeiro?
R – Ah, sei lá! Eu não tenho muita recordação assim, não.
P1 – Onde era o porto, onde era o desembarque?
R – Era na Praça Mauá.
P1 – E como é que era?
R – Ah, não sei, não lembro. São detalhes que a gente esquece. A gente é criança e não...
P1 – E do que a senhora se lembra, então? Porque a gente esquece algumas coisas, mas a gente guarda outras. Quais são as coisas que a senhora guarda desse período?
R – Do que, do desembarque?
P1 – De você chegando ao Brasil, um país diferente, com costumes diferentes, alguma coisa lhe chamou a atenção?
R – Que eu me lembre não. Está difícil de lembrar.
P1 – Está nervosa, né?
R – Também.
P1 – Não precisa ficar nervosa... E, uma vez aqui no Rio, vocês foram viver na Tijuca?
R – Eu morei ali na Rua Sampaio Ferraz, no Estácio, né? Ali a gente morou um bom período. Moramos ali uns quinze anos. Dali nós fomos para o Méier, aliás, Engenho de Dentro. No Engenho de Dentro, ficamos 22 anos também. E agora continuo no Méier, na Rua Getúlio. Casei e continuo vivendo lá.
P1 – E a sua infância já no Rio de Janeiro, Dona Maria, como é que foi?
R – A minha infância... Eu praticamente não tive infância. Porque o meu pai, logo em seguida... Eu devia ter o que? Uns doze anos, por aí... E meu pai começou a ter deficiência renal. Aí começou aquela rotina de sempre, né? Eu era a mais velha e tinha que ajudar a minha mãe. Tinha os meus dois irmãos brasileiros e eu tinha que cuidar deles também. Então, não tive muita infância, não.
P1 – Mas a senhora teve que trabalhar?
R – Eu trabalhava em casa, ajudava mais em casa. Fazia as coisas, porque a minha mãe tinha que sair com o meu pai e as crianças não podiam ficar sozinhas. Eu estudava, ainda tinha o meu colégio, tinha que ir para a escola, né? Foi uma dificuldade grande, porque lá eu já estava na escola, então você aprende o vocabulário, aí chega aqui e ele muda totalmente, então eu apanhava muito por causa desse negócio, a pronúncia das letras...
P1 – As crianças da escola achavam engraçado?
R – Achavam engraçado, porque se era “erre” e eu falava “re”, “eme” eu falava “me”, tudo ao contrário. Então, eles começavam a rir. Sei lá, achavam engraçado.
P1 – E essa escola ficava também no bairro?
R – Ficava.
P1 – Como é que ela era, as professoras, o ambiente da escola?
R – Era bom, muito bom o ambiente. Não tenho nada contra, não. A gente tinha as nossas festinhas, as nossas brincadeiras, os hi-fis, que tinham na época. A gente armava lá os hi-fis, então era sempre bom, era divertido.
P1 – E o que a senhora achou da cidade do Rio quando chegou e viu as montanhas, o mar?
R – Achei ótimo. O mar, a água eu já estava acostumada, por causa do rio, essas coisas, assim, a gente frequentava muito. Eu achei maravilhoso!
P1 – O que mais marcou a senhora?
R – Ah, não tem nada assim marcante.
P1 – E a casa aqui na Tijuca? Como é que ela era? Era uma casa grande também a que vocês viveram?
R: – Era uma casa grande, tinha três quartos, sala, cozinha, um banheiro enorme.
P1 – O bairro, pelo menos, a senhora lembra como era?
R – Lembro.
P1 – Então, conta pra gente um pouquinho.
R – O bairro... Ah, ele mudou muito, hoje! Sei lá, tem aquela favela que antigamente não tinha...
P1 – Então, conta pra gente como é que era, para a gente tentar entender as mudanças da cidade.
R – Ah, mudanças na cidade tiveram muitas. Realmente ficou difícil. Hoje é totalmente diferente. Antes não tinha aquele viaduto [da Avenida] Paulo de Frontin, hoje já tem, a Cidade Nova está totalmente diferente, antigamente não tinha nada disso. A gente andava tranquilamente ali no Morro de São Carlos, hoje a gente não pode passar ali... Quer dizer, mudou bastante.
P1 – E a senhora estudou até que série?
R – Eu fiz até o segundo grau.
P1 – Sempre no mesmo bairro?
R – Sempre no mesmo bairro.
P1 – E começou a trabalhar quando?
R – Eu comecei a trabalhar em 1977.
P1 – E onde?
R – Na Sociedade de Medicina e Cirurgia [do Rio de Janeiro]. Foi o meu primeiro emprego e estou lá até hoje.
P1 – E como foi que a senhora foi parar na Sociedade?
R – Eu tinha um pessoal conhecido e o filho dessa senhora trabalhava com seguros, seguro de carro, né? E uma vez ele falou: “Vem trabalhar comigo”. Eu falei: “Não sei se vou dar pra isso”. “Não, dá sim, vamos lá”. Aí eu fui com ele lá no Sindicato [dos Empregados] do Comércio [do Município do Rio de Janeiro] e ele ficou me ensinando as coisas como tinham que ser feitas, o que eu tinha que fazer... Então eu marquei com ele para começar no dia seguinte e ele falou: “Olha, vamos passar ali, que eu vou na minha prima, na Sociedade de Medicina, vamos dar uma passadinha lá, vamos até lá comigo”. “Está bem, vamos embora”. Eu fui com ele e ali eu fiz amizade com a prima dele. Por eu fazer amizade com a prima dele, ela me convidou para ir trabalhar lá com ela. Eu falei: “Ué, tudo bem, mas eu já falei com o seu primo”. “Tudo bem, isso com ele eu me entendo”. “Então tá, se você achar...”. “Tudo bem, você vai fazer um teste” – naquela época era de datilografia. Aí eu fiz o teste, passei, e ela disse: “Você vai começar a trabalhar comigo”. E assim eu fiquei trabalhando com ela, não fui fazer nada com seguro...
P1 – E a senhora começou fazendo exatamente o que na Sociedade?
R – Era datilógrafa, comecei como datilógrafa.
P1 – E como era o ambiente?
R – Era muito bom. Nossa! O ambiente de trabalho era fora de série. Não tem nada do que falar.
P1 – Mas tinha muita gente trabalhando?
R – Tinha, tinha muita gente trabalhando, a Sociedade era muito atuante, fazia palestras, cursos, seminários a toda hora; as salas, os auditórios ficavam cheios de manhã, de tarde e à noite, até 10h da noite... E depois, como eu era datilógrafa, comecei a fazer a parte noturna, a ficar secretariando os cursos da Sociedade. Quer dizer, eu entrava às 9 horas, eu tinha horário para entrar, mas não tinha horário para sair. Tinha vezes que eu saía de lá às 10h30, 11h da noite. E eu gostava, fui gostando, tomando amor por aquele trabalho, né?
P1 – E o que a senhora sabe sobre a história da Sociedade? Como ela foi fundada? A senhora sabe essas coisas?
R – Não, não sei muito da história da Sociedade, não.
P1 – Mas e os médicos que por lá passavam, a senhora tinha contato? A senhora conversava com eles sobre esses assuntos?
R – Não. A história da Sociedade... Eu não sei como ela foi fundada... Porque a Sociedade é muito antiga, tem 106 anos [em 2005]. Ela começou na Rua do Ouvidor. É, ela começou na Rua do Ouvidor, não sei o tempo que ficou lá também, só sei isso: que ela foi fundada lá. Depois eles herdaram essa casa na [Avenida] Mem de Sá, que foi herdada de um casal de portugueses que fizeram a doação para a Sociedade de Medicina. E aí eles foram para lá, mas até então eu não sei.
P1 – E essa casa sofreu alterações desde o tempo em que a senhora entrou ou ela sempre teve aquela configuração por dentro?
R – Sempre. Por dentro? Não, por dentro ela realmente sofreu algumas modificações. Porque ela não tinha aquele jirau, era aquele teto alto de casas antigas, né? Depois eles fizeram aquele rebaixamento das duas entradas da secretaria e o resto não teve muita modificação.
P1 – E o bairro?
R – O bairro?
P1 – Ela [a Sociedade] está na Lapa, né? E a Lapa tem história no Rio. Da década de 1970 para cá mudou alguma coisa, não mudou?
R – Ah sim, mudou, mudou bastante. Ali também era um lugar muito frequentado. Depois caiu um pouco, ficou muito perigoso, agora [o movimento] já está praticamente normalizando também, já está tendo muitos eventos ali, principalmente naquela parte mais para o lado da Lapa. Quer dizer, acho que já mudou bastante. Na época ali já era também bem frequentado, porque tinham bares em quase tudo o que era lugar, hoje em dia não tem, e muitas casas estavam abandonadas, agora tem mais comércio, tem umas lojinhas, mas já mudou bastante e acho que vai mudar mais ainda.
P1 – Mudar em que sentido?
R – Para melhor.
P1 – Por que?
R – Porque estão aparecendo muitas casas noturnas e isso é bom, dá mais movimento, porque ali é meio parado, meio deserto.
P1 – E da diretoria? Quando a senhora entrou na Sociedade quem é que era da diretoria? Quem era o diretor? Quem dirigia a Sociedade?
R – Quando eu entrei acho que era o doutor Celso Ferreira Ramos.
P1 – E tinha muita gente da Unimed? Ela ainda não existia, existia?
R – Existia.
P1 – E o que se falava da Unimed já nessa época?
R – Ela já existia, a Unimed foi fundada em 1971, se não me engano. Unimed, não. Ela não tinha esse nome Unimed, ela tinha um outro nome: Comeg. Eu acho que foi em 1972 ou 1973 [1974] que foi criado o nome Unimed. Os fundadores eram o Doutor Júlio [Sanderson], Doutor Celso [Ramos], Doutor [Umberto] Perrotta, Doutor Arnaldo Bomfim, Doutor Djalma Chastinet... Quer dizer, aquele grupo todo que fundou a Unimed. Quando eu fui para a Sociedade em 1977, a Unimed estava na Praça Mauá, na [Rua] Mayrink Veiga. Mas antes ela tinha saído da Sociedade para ir para a sede na [Avenida] Presidente Wilson – Presidente Wilson ou [Avenida] Franklin Roosevelt? –, na Franklin Roosevelt, e de lá eles foram [para a Mayrink Veiga]. Porque a Sociedade naquela época era muito atuante e a Unimed começou a crescer ali dentro dela. Chegou a um ponto... Porque tinha muita gente trabalhando, tinha a diretoria, tinham as outras sociedades em volta... Além da Unimed tinham mais 23 sociedades funcionando ali dentro, quer dizer, o espaço da Sociedade não dava mais para comportar a Unimed e aí eles tiveram que alugar uma sala. Foi quando eles foram para a Franklin Roosevelt, da Franklin Roosevelt foram para a Praça Mauá, porque ela também começou a crescer demais, e é isso aí.
P1 – E esses homens que a senhora citou, os fundadores, também pertenciam aos quadros da Sociedade?
R – Sim, eles faziam parte da diretoria da Sociedade e até hoje isso continua, né? Até hoje ela ainda tem diretores, como o Doutor Celso Ferreira Ramos, o Doutor Arnaldo Bomfim, quer dizer, alguns do pessoal da antiga ainda continuam, como o Doutor Perrotta...
P1 – Como era o relacionamento desses homens com os funcionários da Sociedade?
R – Ah, era muito bom! Muito bom! Eles são pessoas assim... Eles são humanos, tratavam a gente com carinho, era diferente. Eu não tenho o que dizer deles, sinceramente.
P1 – Na Sociedade a senhora teve contato com homens notáveis que, como a senhora já disse, ajudaram a criar a Unimed. A força da criação de uma cooperativa surgiu lá na Sociedade?
R – Foi lá.
P1 – E como era esse burburinho sobre cooperativa? Não rolava um burburinho de corredor, vocês não comentavam?
R – Não, desse burburinho eu não participei, porque eu não estava lá ainda.
P1 – Não estava?
R – Eu entrei depois, né? Até então eu não estava lá. Porque isto foi em 1970 que começou, foi a Sociedade de Medicina e Cirurgia junto com o Cremerj, que fizeram a fundação da Unimed e, nessa época, eu não estava lá; eu entrei em 1977. Quando entrei, a Unimed não estava mais na Sociedade de Medicina.
P1 – Ela já tinha saído?
R – Já tinha saído.
P1 – E como era, nesse começo da senhora, a relação da Unimed com a Sociedade?
R – Só porque eu era usuária, né? Eu era funcionária e usuária da Unimed, mas ligação diretamente com a Unimed eu não tinha, só indiretamente, porque quando a gente precisava de patrocínio, essas coisas, a gente tinha um pouco mais de contato.
P1 – E a Unimed ajudou muito com patrocínio? Quais, por exemplo?
R – Sim, mas datas, essas coisas assim eu não sei... O Dia do Médico, por exemplo, e o do Médico Parlamentar. Tem o Dia do Médico Parlamentar e o Dia do Médico, dia 2 de julho e dia 18 de outubro.
P1 – O que é o médico parlamentar?
R – São os médicos que são deputados. Eles criaram esse dia em homenagem aos médicos parlamentares.
P1 – E tinham muitos médicos parlamentares ligados à Sociedade?
R – Tinham alguns, não tinham muitos, não, tinham muito poucos...
P1 – Me diz uma coisa, Dona Maria, a senhora conviveu com o Doutor Júlio [Sanderson], com o [Doutor Djalma] Chastinet. Fala um pouquinho deles para a gente que não teve a possibilidade de conhecê-los.
R – O doutor Djalma Chastinet era uma pessoinha muito querida por nós. O doutor Júlio também – ele era médico do [Hospital do] Andaraí –, era uma pessoa muito prestativa, sabe? Uma pessoa muito humana. Às vezes tinham até casos de cirurgias que não podiam ser feitas no hospital, porque naquela época não tinha o INPS [Instituto Nacional de Previdência Social], né? E se as pessoas não podiam ser operadas, ele as colocava numa Kombi e levava lá para a terra dele, em Minas, e lá fazia a cirurgia das pessoas. Era uma pessoa muito humana, sabe? Sei lá, uma pessoa diferente, muito querida por todos e que deixou saudades.
P1 – Esse é o doutor Júlio.
R – O doutor Chastinet também, ele era uma pessoa que eu não sei nem o que dizer dele, da pessoa dele. Sei lá, deixou saudades também porque...
P1 – E além desses dois, quais os outros que a senhora conviveu? O doutor [Eduardo] Bordallo?
R – O doutor Bordallo foi meu presidente lá na Sociedade, em 1982. O Doutor Bomfim também sempre fazendo parte da nossa diretoria, sei lá. O Doutor Bordallo teve uma passagem pela Sociedade e a gente ia para a rua com cartaz, junto com ele, para fazer aqueles movimentos médicos, de tabela de honorários da AMB [Associação Médica Brasileira], aquela coisa toda. A gente saía por aí nessas batalhas, a gente trabalhava bastante. Mas eles eram muito simpáticos com a gente.
P1 – E na época que a senhora entrou, em 1977, teve algum problema político lá junto com médicos da Sociedade? Porque a gente estava na ditadura, não é?
R – Teve. Eu não sei a data, não sei o ano, não sei nada, mas teve sim. Teve uma intervenção no Sindicato dos Médicos e eles passaram a se reunir lá na Sociedade, né? Até que uma vez o doutor [Roberto] Chabo foi preso lá dentro. A Polícia Federal entrou e prendeu ele lá dentro, aquelas coisas. Ele foi preso.
P1 – E como os médicos reagiram? Os amigos?
R – Eles começaram a fazer de tudo, a trabalhar em cima pra ver se soltavam ele. Conseguiram soltá-lo e tudo, sabe como é que é político, né?
P1 – Qual a importância da Sociedade, na opinião da senhora, junto aos médicos do Rio de Janeiro?
R – A Sociedade era um órgão onde tudo o que os médicos precisavam eles procuravam por lá. Por exemplo, um médico para ter o título de especialista tinha que passar pela Sociedade e a Associação Médica Brasileira. Na época, quem dava o título de especialista era a Associação Médica Brasileira junto com a Sociedade da especialidade. Então todos eles tinham que passar por lá. Hoje já não precisa, mas antigamente sim. Tudo, né? Na época tinha o departamento jurídico, então, se eles precisassem de alguma coisa juridicamente, tinham que procurar a Sociedade. E assim sucessivamente, o que eles fossem precisando, à medida que fossem precisando de alguma coisa eles procuravam a Sociedade para tentar resolver o problema deles.
P1 – Quando a senhora entrou tinham mais funcionários do que tem hoje?
R – Ah, sim, com certeza! Quando eu entrei lá éramos 22 funcionários.
P1 – E agora?
R – Agora estamos reduzidos a três.
P1 – O que aconteceu? Conta pra gente, Dona Maria, o que aconteceu de mudança na Sociedade nesses vinte anos?
R – Eram sempre diretorias atuantes, quer dizer diretorias atuantes e políticas e nessas mudanças saiu o doutor Bordallo, que era o presidente, e entrou o doutor José Assad, que foi Secretário de Saúde. Mas nessas saídas entrou um que não era político, né? Até aí nós tínhamos participações de laboratórios que ajudavam a Sociedade. Então ele foi cortando tudo, achou que a Sociedade tinha que viver só dos seus associados. É difícil dizer que a Sociedade ia sobreviver só com seus associados porque os jovens não procuram a Sociedade, mesmo porque eles não têm condições de manter uma mensalidade, uma anuidade, e as pessoas antigas vão saindo fora por alguma razão, por doença, ou porque faleceu, e assim sucessivamente. Então, o que aconteceu? Ele acabou com a Sociedade, ele não quis mais saber, foi deixando correr frouxo, e hoje está aí a Sociedade. Depois também surgiu a Somerj [Sociedade Médica do Estado do Rio de Janeiro]. A Somerj veio como uma filial da Associação Médica Brasileira. O Doutor Bordallo, na época, estava saindo da Sociedade de Medicina e Cirurgia e assumiu a diretoria da Somerj. Aí ficou a Somerj fazendo tudo o que a Sociedade de Medicina e Cirurgia fazia, então isso esvaziou muito a Sociedade. Passou tudo para a Somerj, a Sociedade ficou sem nada e os sócios também foram parando, deixando de pagar, e ela foi caindo um pouco, não tinha como agüentar os funcionários todos e com isso eles foram mandados embora.
P1 – E a senhora acha que esse quadro pode ser revertido?
R – De que? De voltar?
P1 – É.
R – Pode.
P1 – O que a senhora acha que é preciso fazer?
R – Tem que entrar uma diretoria que queira trabalhar. Trabalhar assim: fazendo eventos. A prioridade da Sociedade é isso: são os eventos, é procurar outros tipos de recursos, não só da parte associativa, porque aí não vai avante. Sei lá, fazer alguma coisa, tem que trabalhar, porque a Sociedade não pode parar, a Sociedade tem uma história e eu acho que essa história tem que continuar. A Somerj começou agora, quer dizer, a história da Somerj é bem pequenininha em vista da outra.
P1 – E o que a senhora acha que aconteceu com essa diretoria? Por que eles não têm mais uma atuação de trabalho?
R – Talvez porque eles não escolham direito a sua diretoria, porque na maioria das vezes só quem trabalha é o presidente, mas tem o secretário, o diretor de eventos, tem o diretor cultural, tem o diretor... Então eu acho que todo mundo tem que fazer a sua parte, só que não fazem, e também isso não é cobrado, se fosse cobrado talvez fizessem, né? Então fica só o presidente para fazer tudo e o presidente não pode fazer tudo sozinho. E com isso vão se deixando outras coisas, outras prioridades, como a atualização de eventos, essas coisas.
P1 – Hoje a senhora faz o que na Sociedade?
R – Hoje eu faço um pouquinho de tudo, né?
P1 – Como é o cotidiano da senhora lá?
R – São contas a receber, a pagar, o controle dos associados, essas coisas assim.
P1 – E quando a senhora foi trabalhar na Sociedade já era casada, ou não?
R – Não, eu casei depois.
P1 – Como a senhora conheceu seu esposo?
R – Ele morava perto da minha casa e, na época, ele era casado. Foi até uma história, porque em 1982 ele era radialista. Era não, é. Ele trabalhava na Rádio Globo e era bancário também, em 1982. E nós fizemos um evento de doação de sangue no Dia do Médico, no dia 18 de outubro, e eu queria que ele fizesse a publicidade disso. E não achei ele em lugar nenhum, ele tinha mudado de onde morava, lá perto de casa. Passaram-se anos e a gente nunca mais teve contato. Então eu conhecia ele e a esposa dele: “Oi, tudo bem?”. Ele sumiu, eu fiquei noiva por 11 anos –eu já era noiva quando ele morava lá– e depois, sem querer, sem mais nem menos, ele passou na minha porta, parou e eu falei assim: “Ué, você por aqui? O que houve? Onde é que você está morando? Você sumiu, sumiu todo mundo!”. “Ah, eu casei, descasei, estou separado, “num” sei o que...”. E ali começou a história, né? Nós marcamos um encontro e ali tudo começou, foi em 1987.
P1 – E vocês casaram?
R – Não, em 1987, nós começamos a sair, a namorar, aquela coisa toda; ele já estava separado da esposa... O casamento mesmo foi em 1995, nós casamos em 1995. Estou com ele há dezessete anos, entre namoro e casamento.
P1 – Vocês têm filhos?
R – Não. Ele tem duas filhas.
P1 – E como é a relação?
R – É muito boa, a gente se dá maravilhosamente bem. Elas vivem na minha casa. Agora tem a netinha também. A ex-esposa dele também, me dou muito bem com ela.
P1 – E nessas festas dos médicos que ele ajudou a senhora a fazer? Era campanha pelo rádio?
R – É, pelo rádio.
P1:– Como é que foi essa campanha?
R – Eu não consegui falar com ele e aí ela não foi feita.
P1 – Não? O que aconteceu?
R – Não consegui porque foi aí que eu perdi o contato com ele, né?
P1 – E depois ele ajudou em alguma campanha?
R – Ah, sim. Quando tem alguma coisa assim, Dia do Médico, homenagens, essas coisas, aí ele fala, ele faz a publicidade no ar: “Vai ter o Dia do Médico e os médicos homenageados são...”. Então, ele bota no ar o nome dos médicos.
P1 – Que tipo de eventos a Sociedade organizava para a festa dos médicos, do Dia dos Médicos?
R – Ultimamente ela não tem organizado nada, só mesmo a festa, que é um coquetel, essas coisas assim. Só teve um ano, foi em 1982, em que teve essa coisa de doação de sangue, esse evento de doação de sangue. Mas no Dia do Médico, não tem [outros] eventos assim.
P1 – Agora não tem mais, mas também não tinha?
R – Não tinha, não tinha.
P1 – Tinham algumas campanhas, não é?
R – Nem campanha não tinha.
P1 – Que atividades a Sociedade de Medicina fazia para o público externo? Ou faz ainda?
R – Para o público externo, nenhuma.
P1 – Para se comunicar com a classe médica?
R – Nada, ela está parada.
P1 – Está tudo parado?
R– Parada, parada, parada.
P1: E como está sendo conviver na Sociedade agora, nessa fase?
R – Está horrível, horrível! Está péssimo! Se você quer saber está péssimo.
P1– Está desanimador?
R – Muito. Tem dias que dá vontade de pegar a bolsa e ir embora. Porque você vem de uma época em que você via a casa cheia de gente, era um entra e sai, às vezes, tinha fila para cursos, para fazer inscrição de cursos, o auditório vivia cheio, superlotado. Hoje não tem nada, você não vê nada, você fica ali o dia inteiro sem fazer nada. Quer dizer, você faz, sempre tem alguma coisa para fazer, né? Nós temos 1.700 sócios pagantes e sempre tem alguma coisa para fazer, mudança de endereço, essas coisas assim, alguma correspondência para mandar para os sócios. Mas é aquela coisa, sei lá, sabe? Dá uma tristeza na gente!
P1 – É, né? Mas então, para sentir tristeza é porque a gente já conheceu alguma coisa que era legal, para falar: “Puxa, mudou!”. Que Sociedade alegre que não te dava tristeza que a senhora trabalhou? Como é que era? Isso é que a gente queria saber. O que acontecia lá? Essas reuniões de médicos, como era o relacionamento de vocês com esses médicos? Tinha camaradagem, os médicos ajudavam vocês? “Ah, tô como uma dorzinha aqui!”...
R – Ah sim, com certeza, com certeza! Eu mesma, a Unimed que o diga! Eu tive um câncer de mama e tem certas coisas que o plano não cobre e eu cansei de pedir socorro ao doutor Bordallo, socorro ao doutor Celso: “Doutor Celso, preciso disso assim, assim”, entendeu? Isso aí não tem... Eles sempre ajudaram a gente nessa parte.
P1 – E, na Sociedade, esses médicos eram mais velhos? Tinham médicos mais novos ainda ou era só a geração mais velha?
R – Era só a geração antiga. Novos só agora, como o Doutor Celso Barros, o Doutor Bordallo, mas os anteriores eram tudo gente mais idosa.
P1 – Qual é a lembrança que a senhora tem mais saudades da Sociedade? O que mais marcou?
R: O que mais marcou foi na época de 1978 a 1984, por aí.
P1 – O que aconteceu nessa época?
R – Muita coisa, congressos, muitas atividades...
P1 – Os congressos aconteciam no próprio Rio de Janeiro ou eram fora?
R – No próprio Rio de Janeiro.
P1 – Nas dependências [da Sociedade]?
R – Não, no Hotel Glória, no [Hotel Le] Meridien, onde sempre tinham eventos.
P1 – Como eram esses congressos, duravam quantos dias, o que acontecia? A senhora devia participar da organização, né?
R – Três, quatro dias. Eu trabalhava muito, trabalhava bastante, mas era muito gostoso.
P1 – E o que a senhora gosta de fazer, além de querer que a Sociedade melhore? Fora do trabalho o que a senhora gosta de fazer?
R – Eu não sou muito de sair, sou mais de ficar dentro de casa. Gosto de assistir a um “showzinho”, um show de vez em quando, sou muito fã do Roupa Nova. Aí eu gosto. Mas não sou muito de sair, não.
P1 – Hoje, então, está acontecendo tudo isso que a senhora estava dizendo: tem poucos funcionários na Sociedade. Mas vai ter eleição logo mais, não vai?
R – Já teve.
P1 – E a senhora não ficou com esperança?
R – Com esperança a gente fica, né? Mas vamos ver se muda, estou torcendo pra isso. A nova diretoria deve assumir agora dia 18 de outubro, Dia do Médico. É o doutor Celso Ferreira Ramos Filho. Estou com esperança de que vai mudar.
P1 – É o filho do doutor Celso?
R – O filho do doutor Celso Ramos.
P1 – Doutor Celso é um homem...
R – Nossa! Muito bom! Ele foi muito bom pra gente também, sabia? O doutor Celso.
P1 – Dona Maria, o que a senhora acha dessa preocupação da Unimed em resgatar a história? A história da Unimed, da cooperativa, das pessoas? O que a senhora acha desse movimento?
R – Acho muito bom, né? A recordação, guardar isso, acho que vale a pena.
P1 – Na Sociedade tem algum movimento assim para se resgatar a história?
R –Não. Por enquanto não.
P1 – Não tem nenhum projeto?
R – Não.
P1 – A senhora acha que daria para fazer alguma coisa lá?
R – Eu acho que sim.
P1 – Nesses anos todos não tem nenhuma história engraçada ou pitoresca que a senhora tenha vivido lá?
R: Não. História assim engraçada...
P1– E o que a senhora achou de vir dar entrevista para a gente?
R – Olha, é o que eu falei, eu não sei muita coisa. Eu tinha até comentado isso, não sei por que eu. Porque eu não tenho muita coisa para falar.
P1 – A senhora foi convidada porque a senhora praticamente está lá [na Sociedade] há mais de vinte anos e conheceu muitos diretores [da Unimed-Rio]...
R – Sim, mas só assim contato com a diretoria, né? Mas me aprofundar mesmo no assunto da Unimed, isso aí não.
P1 – Mas da Sociedade, sim.
R – Alguma coisa também, não tanto também, porque eu tenho o que? Vinte anos só, de lá pra cá.
P1 – E do que a senhora tem mais saudades na Sociedade nessa fase que a senhora citou, que foi de 1977 a 1984? Porque a senhora falou que foi um período muito bom. Do que a senhora tem mais saudade?
R– Ah, sim, foi. Daqueles diretores da época, né?
P1 – Por quê?
R – Sei lá, era uma diretoria mais atuante, uma diretoria mais amiga, uma diretoria mais participante em tudo da Sociedade.
P1 – O que a senhora fazia nessa época, trabalhando na Sociedade? A senhora passeava? Quais eram os programas que a senhora tinha de moça, no Rio de Janeiro?
R – Nessa época eu saía, ia para o cinema, ia para a praia, eu sempre gostei muito de praia.
P1 – Que praia a senhora freqüentava?
R – Praia Vermelha.
P1 – Praia Vermelha é bacana, é na Urca. Tem muitos militares lá?
R – Ah, ali tem. Ali é o lugar mais seguro pra gente ir. Atualmente também, continua com aquela segurança permanente.
P1 – E a praia é bonita ainda?
R – Olha, eu gosto dali. Independente de ser bonita ou não, eu sempre gostei daquele lugar ali. Eu gosto, eu acho um lugar bonito, sei lá.
P1 – E hoje a senhora vive onde? Em que bairro a senhora mora?
R – Eu moro... Ali é Méier. Quer dizer, uma parte é Méier, outra parte é Cachambi, outra parte é Todos os Santos... Pra mim é Méier, tudo ali é Méier, né?
P1 – As pessoas costumam dizer que o Rio de Janeiro é bem português. A senhora concorda com isso? Tem muito de Portugal aqui?
R – Tem, bastante.
P1 – Que hábitos portugueses a senhora tem na sua casa, que a sua mãe deixou para a senhora?
R – Sei lá tem tantas coisas...
P1 – A senhora não faz pastéis de Belém, fios de ovos, pastéis de Santa Clara?
R – Não, nada de doce.
P1 – A senhora faz bacalhau?
R – Bacalhau, sim. Aliás, eu tenho uma história lá na Sociedade. Todo ano –isso consta até em ata– eu tenho que fazer a bacalhoada para o pessoal da diretoria, em dezembro, que é o jantar de final de ano, a confraternização. Então, eu faço o bacalhau da Sociedade, é até um bacalhau famoso, né? O pessoal chama de “O Bacalhau da Maria”.
P1 – E como é esse bacalhau? Como é a receita dele? Ele é diferente dos outros?
R – Não, é uma salada com bacalhau desfiado, batata, azeitona, azeite...
P1 – Como é que a senhora prepara ele?
R – Dá trabalho, viu?
P1 – Não vai nem dar a receita pra gente, pelo visto?
R – Não, não vou dar, não. Dá trabalho, não é mole não fazer uma bacalhoada para 50 pessoas!
P1 – E a receita é segredo?
R – É segredo.
P1 – A senhora conhece bacalhau com broas?
R – Não.
P1 – Também não vou lhe dar a receita.
R – Ah, é? Então empatou. Mas eu faço, sim. Doce lá em casa a gente não faz muito, não, é mais a parte de salgado... Por exemplo: arroz de polvo, polvo à espanhola, bacalhau à portuguesa, à Gomes de Sá, essas coisas assim.
P1 – E o vinho verde? Tomam vinho verde?
R – Vinho verde, vinho tinto, muito bom.
P1 – E o fado? A senhora gosta de fado?
R – Não sou chegada.
P1 – E da música brasileira?
R – Ah, eu gosto!
P1 – Do que a senhora gosta?
R – Ah! Olha, Roupa Nova, Roberto Carlos, quem mais? Jovem Guarda, não é mais Jovem Guarda, é antiga, né?
P1 – E o marido da senhora sendo radialista não mandava pôr umas musiquinhas para a senhora de vez em quando?
R – De vez em quando ele põe.
P1 – Como que ele faz? Na rádio ele fala: “Essa é para a Maria!”?
R – Não, o negócio dele é trova, é mais a parte de trova, tem as trovinhas, a “cantiga do trovador”. Aí ele manda trova: “Olha, essa trova é da minha mulher! Toda trova que tiver Maria é da minha mulher!”.
P1 – Tem alguma que a senhora se lembre?
R – Não, não lembro.
P1 – Não lembra, não é? Mas quando a senhora escuta no rádio o que a senhora sente?
R – Eu sei que é pra mim, sei que ele está mandando pra mim.
P1 – Aí capricha no bacalhau, né?
R – É, no bacalhau.
P1 – Então é isso Dona Maria. Tem alguma coisa que a senhora gostaria, sem que a gente lhe pergunte, de deixar registrado em relação à Sociedade de Medicina, ao seu trabalho lá, aos seus amigos de trabalho, aos presidentes, diretores?
R – Difícil. Sei lá, eu tô muito nervosa, não tá saindo nada.
P1 – Está bem. Por que a senhora acha que está nervosa? O que está incomodando? É muita pergunta, né?
R – Não, sei lá, a gente esquece, não lembra, isso deixa a gente nervosa.
P1 – Então tá bom, Dona Maria. Eu vou agradecer por a senhora ter vindo, pelas fotos lindas que a senhora trouxe, mas eu não vou lhe abandonar, não, eu vou ficar no seu pé, a gente ainda vai se encontrar.
R – Eu quero agradecer também a vocês, ao doutor Celso, pela lembrança, ao doutor Bordallo, ao doutor Arnaldo Bomfim. Me desculpe, mas eu estou muito nervosa.
P1 – Então tá bom. Mas não tem problema, a gente entende.
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