Projeto Museu do Futuro CTBC Telecom
Realização Museu da Pessoa
Depoimento de João Batista Coura
Entrevistado por Luiz Egypto de Cerqueira
Uberlândia, 24 de novembro de 1999
Entrevista CTBC_HV002
Transcrito por Stella Maris Scatena Franco
Revisado por Teresa de Carvalho Magalhães
P/1 – Seu nome completo, data e local de seu nascimento.
R – João Batista Coura. Nasci em 19 de junho de 1951, em Delfim Moreira, estado de Minas Gerais.
P/1 – Qual o nome de seus pais?
R – Geraldo Ribeiro Coura, agricultor, e Maria José Ribeiro, dona de casa, ambos de Delfim Moreira, Minas Gerais. Eu tive oportunidade de trabalhar com a Volkswagen, Scania Vabis, e outras empresas grandes conhecidas no Brasil. Tinha um colega meu de sala que trabalhava na CTBC, senhor Mário Gonçalves, que em fez um convite, que a CTBC estava necessitando de profissional, de onde eu vim para cá. Isso em setembro de 1974, eu vim para a cidade de Uberlândia, onde eu passei a fazer parte do quadro de funcionários da CTBC, do departamento de transmissão, que era conhecido por Departamento de Longa Distância, que funcionava lá no centro da cidade, onde a CTBC ainda era uma empresa pequena e fiquei um ano nesse departamento, quando o Vice Presidente da empresa, o doutor Luiz Alberto Garcia me fez um convite para assumir a gerência regional de Itumbiara, do sul de Goiás, que eu aceitei. Eu fiquei um ano aqui em Uberlândia. Quando foi mais ou menos em setembro de 1975, o doutor Luiz Alberto me convidou para ir para a cidade de Itumbiara. Aí fiquei de setembro de 1975 até mais ou menos setembro de 1980, quando no processo de implantação das denominadas centrais cross point, que é a tecnologia, a central eletro-eletrônica da Siemens, que estava sendo implantada no país, que era a central coqueluche do momento. Devido ao curso de seis meses que eu fiz em Curitiba deste equipamento eu fui convidado pela diretoria da CTBC a formar um departamento de comutação na cidade de...
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Realização Museu da Pessoa
Depoimento de João Batista Coura
Entrevistado por Luiz Egypto de Cerqueira
Uberlândia, 24 de novembro de 1999
Entrevista CTBC_HV002
Transcrito por Stella Maris Scatena Franco
Revisado por Teresa de Carvalho Magalhães
P/1 – Seu nome completo, data e local de seu nascimento.
R – João Batista Coura. Nasci em 19 de junho de 1951, em Delfim Moreira, estado de Minas Gerais.
P/1 – Qual o nome de seus pais?
R – Geraldo Ribeiro Coura, agricultor, e Maria José Ribeiro, dona de casa, ambos de Delfim Moreira, Minas Gerais. Eu tive oportunidade de trabalhar com a Volkswagen, Scania Vabis, e outras empresas grandes conhecidas no Brasil. Tinha um colega meu de sala que trabalhava na CTBC, senhor Mário Gonçalves, que em fez um convite, que a CTBC estava necessitando de profissional, de onde eu vim para cá. Isso em setembro de 1974, eu vim para a cidade de Uberlândia, onde eu passei a fazer parte do quadro de funcionários da CTBC, do departamento de transmissão, que era conhecido por Departamento de Longa Distância, que funcionava lá no centro da cidade, onde a CTBC ainda era uma empresa pequena e fiquei um ano nesse departamento, quando o Vice Presidente da empresa, o doutor Luiz Alberto Garcia me fez um convite para assumir a gerência regional de Itumbiara, do sul de Goiás, que eu aceitei. Eu fiquei um ano aqui em Uberlândia. Quando foi mais ou menos em setembro de 1975, o doutor Luiz Alberto me convidou para ir para a cidade de Itumbiara. Aí fiquei de setembro de 1975 até mais ou menos setembro de 1980, quando no processo de implantação das denominadas centrais cross point, que é a tecnologia, a central eletro-eletrônica da Siemens, que estava sendo implantada no país, que era a central coqueluche do momento. Devido ao curso de seis meses que eu fiz em Curitiba deste equipamento eu fui convidado pela diretoria da CTBC a formar um departamento de comutação na cidade de Uberlândia, onde o seu primeiro chefe foi o José Cândido Alves Pereira, que chegou a ser nosso diretor técnico, que recentemente estava na Tess, empresa de telefonia celular. A convite do seu Wilson Costa, nosso falecido e querido diretor e do diretor técnico Cláudio Leigh. Nesta época eu vim para Uberlândia para acompanhar então a montagem da central telefônica 232, que até hoje ainda está instalado no prédio da Avenida João Pinheiro 4020, que entrou em funcionamento em aproximadamente 1981. E desde essa época então eu passei a fazer parte deste departamento de comutação, onde estou até hoje, depois de ter passado por diversos endereços aqui na cidade de Uberlândia, e atualmente dentro do Centro Administrativo inaugurado agora neste ano de 1999.
P/1 – Eu queria voltar um pouco lá atrás e falar de Delfim Moreira. Como era a sua casa da infância?
R – Eu nasci no município de Delfim Moreira. O local que eu nasci, o município de Delfim Moreira, antigamente chamava-se Queimada. Queimada era o nome antigo. Em 1964 esse lugar chamado Queimada passou a ser município e o primeiro prefeito deste município foi um tio meu, que tinha que escolher o nome da cidade entre Marmelândia e Marmelópolis, e ele acabou escolhendo o nome de Marmelópolis. Por quê? Porque a cidade de Marmelópolis era o único lugar que explorava comercialmente a produção de marmelo para a fabricação de marmelada. É uma região no sul de Minas, montanhosa, de clima europeu, onde a temperatura chega a até 3º, 4º abaixo de zero. É uma região de características européias, que se cria truta, e lá é uma região de muita produção de fruta. Lá dá marmelo, pêssego, ameixa, cidra, figo, castanha e até azeitona. Fica próximo de Maria da Fé e de Campos do Jordão. É uma região muito conhecida no Brasil em vista de acidentes com helicóptero e avião. Quando uns anos atrás vocês devem ter ouvido falar de uma escoteira que sumiu, que andou muito tempo sendo procurada? Ela foi achada lá. Então é uma região assim, muito bonita, ainda tem reserva florestal do governo onde existem até pessoas que pulam de asa delta lá. Eu tenho umas fotos aí inclusive que mostram as nuvens abaixo da montanha. E é uma região que produzia marmelo, meu pai era um produtor de marmelo, meu pai chegou a produzir 100 toneladas de marmelo em 1959 mais ou menos. E meu pai sustentava os meus oito irmãos tudo na base do marmelo, porque o meu pai era um simples agricultor e ele conseguiu formar os oito filhos tudo na base do marmelo. Quando ele conseguiu formar o último filho a indústria do marmelo parou sem mais nem menos e não se produziu mais marmelo na cidade. Foi um caos para a cidade, uma cidadezinha de uns cinco mil habitantes e muito bonita. É um lugar que eu gosto muito, eu tenho tido muita saudade. Ainda nós temos essa propriedade lá até hoje, eu tenho fotos do local com as plantações de marmelo. Era um povo muito sofrido, a gente trabalhava embaixo de chuva, com frio, carregando esses balaios feitos de taquara, de bambu, para produzir, porque o marmelo quando madurava você tinha que apanhar. Ele é derrubado em vara, cai no chão e você anda por cima do tapete amarelo de marmelo. Você tinha que carregar esse marmelo e não podia perder, porque era o nosso sustento, a nossa garantia de estadia na cidade, que embora a gente tivesse um sítio na cidade de Cruzeiro, estado de São Paulo, virando a Serra da Mantiqueira, no sul de Minas está a cidade de Marmelópolis. Então existem até fatos pitorescos: a gente andava 30 quilômetros a cavalo por meio de floresta até chegar de Cruzeiro a Marmelópolis na época das férias, ou seja, o meu pai protegia a gente para poder estudar quando tivesse que estudar, mas chegava nas férias a gente ia ajudar ele a conseguir o dinheiro para o sustento do ano seguinte. E isso aí marcou muito a vida da gente pelo trabalho que a gente teve e a gente viu o quanto ele sofria para poder garantir a formação acadêmica. O meu pai era uma pessoa que lutou a vida com tanta dificuldade que teve uma ocasião que o Rotary Club da cidade de Cruzeiro fez uma homenagem para ele a respeito de ele ter oito filhos formados em curso superior e um homem da mão toda calejada. Ele me marcou muito.
P/1 – É uma história de vida, um exemplo de vida.
R – Então Marmelópolis tem muita recordação para mim.
P/1 – E a sua mãe? Por que você não fala da sua mãe?
R – Meu pai e minha mãe são primo-irmãos, que ali naquela época era muito comum primo casar com primo. A família do meu pai é descendente do Presidente Rodrigues Alves e o Presidente Rodrigues Alves era de Guaratinguetá e o meu avô era... eu não sei que grau de parentesco o meu avô era, era primo, era alguma uma coisa assim do Rodrigues Alves, tanto é que o meu avô chamava-se Francisco Rodrigues Coura. Então, a origem da família de Rodrigues Alves é de Guaratinguetá. E o meu pai conheceu a minha mãe porque eles eram primos lá na cidade de Marmelópolis e a minha mãe também era uma pessoa simples, fez só até o terceiro ano primário, vivia praticamente da lavoura, uma família grande. O meu pai teve 23 irmãos e a minha mãe teve eu acho que uns oito ou nove. São pessoas muito humildes mesmo, sabe? Assim, informações a respeito da história da vida da minha mãe, eu sei que a mãe dela era de uma família de Pouso Alegre e que o pai dela era ali da região mesmo de Marmelópolis. Mas a minha mãe também é da mesma humildade do meu pai, fomos criados num ambiente bastante religioso, o que marcou muito a característica da minha família é a participação na vida religiosa. A minha mãe é ministra de eucaristia da cidade de Cruzeiro, ajudou a trabalhar na Fundação João Paulo II, que é aqui de Canção Nova, do padre Jonas Abílio, tivemos três irmãos em seminário e eu também estive um ano no Seminário Diocesano de Lorena, em 1964 com Dom José Meliá dos Campos, eu tenho um irmão que é ministro de eucaristia na cidade de São Paulo, no bairro de Perdizes, e o meu irmão quase se formou padre. Então a gente tem uma vida religiosa muito intensa e eu acredito que essa vida religiosa, esse tipo de formação, esse tipo de segurança, o meu pai foi capaz de transmitir isso para os filhos, de tal maneira que nós somos uma família muito unida, uma família muito ponderada. E essa segurança foi transmitida a nível até de bisneto, ou seja, podemos falar de três ou quatro gerações de uma família de bastante harmonia e unidade, e que veio de um ambiente bastante humilde. Qual a diferença que existe entre o meu pai, um homem, agricultor humilde e um empresário bem sucedido hoje? É que o meu pai viveu num ambiente onde... (choro). É uma pessoa que eu respeito muito.
P/1 – Somos filhos dos nossos pais.
R – Eu, falar dele eu... Eu tenho as fotos ali de Marmelópolis, se você quiser dar uma olhada.
P/1 – Ah, sim.
R – Então, como você me perguntou, sobre o ambiente de Marmelópolis, é um lugar agradável, é um lugar que se fosse explorado o turismo... lá em Marmelópolis é muito bonito, mas infelizmente os políticos da região não têm essa visão. Recentemente trouxeram uma reportagem da televisão, da cidade de Marmelópolis, falando das belezas do lugar. De repente a cidade de São Paulo invadiu Marmelópolis: chegou lá um povo não tinha onde ficar e foram embora, entendeu? Lá a região de turismo é maravilhosa, que é entre Maria da Fé e Campos do Jordão. Existe criação de trutas ali, é muito bonito o lugar, muito bonito mesmo! Agora, é uma população de pessoas carentes, muito pobres, na região você não consegue colocar trator ali, ali é só na base de boi e burro. Eu lembro daquelas tropas de burro que iam andando um atrás do outro, o primeiro com o sininho no peito, ia tocando... e os balaios carregados de marmelo e o tropeiro atrás, tocando, levando para as fábricas. As fábricas eram a Cica, a Pauletti, a Peixe, a Colombo, a Casa da Banha... lembra da Casa da Banha do Rio de Janeiro? Doces Cruzeiro do Sul, Estrela do Sul... todas essas fábricas existiram lá. Teve uma época que chegou a existir 20 fábricas de polpa de marmelo.
P/1 – Na própria região?
R – Na própria região. E foi acabando. A última que acabou foi a Cica e a Peixe. A cidade vivia em função disso. É uma cidade muito agradável, um clima gostoso! Existe uma riqueza que tem naquela cidade que não é palpável: é o ar. Ou seja, você vai numa cidade, vai ver beleza, piscina, vai ver coisa... Lá é o ar. A pureza do ar é tão gostosa! O ar é gostoso de se respirar, sabe? Então é um lugar maravilhoso onde pelo menos ali a poluição ainda não tomou conta. É muito bonito, é muito bonito lá. E fica no eixo Rio-São Paulo, vamos dizer assim. Muito bonito, vale a pena conhecer para passear.
P/1 – Como era a sua casa? Como você se lembra da sua casa de infância?
R – Eu tenho foto da minha casa de infância. Eu tenho guardado comigo. Não está aqui, está lá em casa. A casa ainda existe, hoje ela foi reformada. Para você ter uma noção do tradicionalismo, o empregado que morava com o meu pai, quando eu era pequeno, é empregado até hoje, ou seja, ele está com a mesma idade: o meu pai está completando 80 anos e o empregado dele está com 70 e poucos anos. Ainda existe ele lá. A casa... a minha lembrança é de uma casa... a casa lá é o seguinte: existe um rio de água cristalina que corre do lado. Deste rio se escuta o barulho das águas na pedra, então é muito comum você escutar o coaxar do sapo, o pirilampo, muito passarinho... e quando chegava de manhã cedo... porque somente nos meses de dezembro a janeiro que a gente fazia a colheita do marmelo. Nós tínhamos que acordar cedo, tomar o café e o café lá dá uma fome na gente! A minha mãe fazia aquelas caneconas de café com leite e tacava farinha de milho. Aquilo lá depois dava uma azia que eu vou te contar, mas era gostoso! Que aquela fome, você tomava aquilo e punha o agasalho e ia colher o marmelo. Então existia aquele conjunto dos homens que vão batendo com bambu no marmeleiro... porque o marmeleiro é uma árvore mais ou menos do tamanho desta sala aqui, então você planta uma do lado da outra e elas se fecham, ali você é capaz de passar de 20 árvores em cima da outra sem descer no chão. E quando você apanha o marmelo, ele cai no chão... O marmelo é uma fruta mais ou menos do tamanho de uma laranja assim, mais ou menos do tamanho de uma laranja Bahia, e ela cai no chão amarelo, de tal maneira que o chão forra, você vê só um tapete amarelo. Isso quando o terreno é côncavo. Quando ele é plano, ele se espalha. Então as pessoas vão batendo a vara no marmeleiro, ela vai caindo no chão, as mulheres vão enchendo os balaios de taquara e de bambu, balaios em torno de 25, 30 quilos, e eu ia carregando. Eu e os meus irmãos íamos carregando, íamos formando as chamadas “bandeiras”, formava monte de marmelo assim, de tonelada. E os animais eram carregados e eram levados para a fábrica. Aliás, o meu primeiro emprego foi de pesador de marmelo, ou seja, eu trabalhava na Peixe, onde eu pesava marmelo, porque eles precisavam de pessoas que tivessem uma certa escolaridade, porque lá na região o pessoal não tinha escolaridade, né? Então eu trabalhei de pesador de marmelo.
P/1 – Isso foi quando?
R – Esse emprego meu foi em 1971. Eu tenho até a minha carteira registrada em 1971. Eu tinha 20 anos. Porque eles me davam uma pessoa que não sabia ler e escrever, punham lá no meu lugar trabalhando para eu ficar trabalhando na fábrica porque não tinham pessoas que tivessem escolaridade para poder fazer contas. Então eu vinha, porque nessa época, ou seja, em 1971 – eu casei em 1969 – a gente já tinha dois anos de casado. Eu estava com 21 anos. Mas trabalhei também antes, só que aí não era registrado em carteira, aí era troca simplesmente de mão de obra, uma mão de obra que sabia ler por uma que não sabia ler. E eu ficava cuidando da parte de escritório.
P/1 – Da Peixe?
R – Da Peixe. E esta fábrica até recentemente... eu acho que ela ainda existe lá em Marmelópolis, só que o município hoje virou... essa parte de marmelo praticamente acabou, hoje a população vive só da agricultura.
P/1 – A sua escola, a primeira escola que o senhor teve foi lá na região mesmo?
R – Não, a minha primeira escola primária foi na cidade de Cruzeiro, eu estudava no Instituto Oswaldo Cruz, de Cruzeiro, onde eu fiz o Jardim da Infância. Eu fiz o Jardim da Infância no Instituto Oswaldo Cruz, de Cruzeiro, aí o meu primário eu fui estudar na escola Major Hermógenes, de Cruzeiro. Ainda lembro, até recentemente ainda tive contato com a minha primeira professora, estava conversando com ela, eu acho que ela ainda é viva e por sinal ela trabalha na igreja, como ministra de eucaristia da igreja. Ela ficou emocionada conversando comigo. Eu participei de um coral... sempre, desde pequenininho eu gostei de música. Naquela época, quando existia os Pequenos Cantores da Guanabara... não sei se você lembra.
P/1 – Lembro!
R – Que tem os Canarinhos de Petrópolis e os Pequenos Cantores da Guanabara, eu fazia parte dos Pequenos Cantores de Dom Bosco. Eu fui educado em colégio salesiano, e eu fazia parte dos Pequenos Cantores do Dom Bosco e uma vez nós fomos competir com os Pequenos Cantores da Guanabara. Naquela época nós fomos cantar na TV Tupi, que foi o primeiro canal de televisão... Porque a televisão entrou o Brasil em 1951, mais ou menos 1950, 1951, então tinha aquelas televisões preto e branco redondas, parecia uma lente... E eu fui cantar num programa da TV Tupi chamada Gincana Kibon. É, Gincana Kibon chamava o programa. E eu fui cantar em São Paulo, eu era solista, e a professora, a nossa maestra, vamos dizer assim, do coral, chamava-se Maria Isabel Bastos. E se você souber quem é ela? Ela é irmã do Márcio Tomás Bastos, ex-presidente da OAB. É irmã dele. Ela era nossa professora do coral. Eu cantei nesse coral durante oito anos. Eu tinha uma voz muito boa... até hoje. Eu sempre gostei de cantar, né? Eu fiquei nesse coral durante oito anos, aliás o meu nome está numa escola, que eu inaugurei uma escola lá nesse colégio salesiano de Cruzeiro, eu fui uma das pessoas que participou da primeira turma de inauguração do colégio. Aí eu fui para o Colégio São Joaquim de Lorena, o colégio salesiano São Joaquim de Lorena, onde eu fui estudar num seminário. Dom José Meliá dos Campos foi o bispo desse seminário. Tem até uma história marcante na igreja católica por causa dele, foi quando ele foi o confessor do Bispo de Maura, o fundador da Igreja Católica Brasileira, essa Igreja Católica Brasileira que existe. Mas eu fiquei um ano nesse seminário e eram 100 alunos.
P/1 – Desculpa, como era o nome do Bispo mesmo?
R – Dom José Meliá dos Campos. Ele foi Bispo em Botucatu e era Bispo da diocese de Lorena. Aí eu fiquei um ano nesse seminário, eram 100 alunos e eu ficava interno no seminário e estudava no Colégio São Joaquim de Lorena. O seminário fechou um ano depois, só ordenou um padre, hoje eu acho que ele é vigário da cidade de Queluz, se não me engano. Colega meu. E eu peguei e fiquei lá em Lorena durante um ano, estudei só um ano em Lorena, fazendo a segunda série do ginásio, e depois lá em Lorena também eu era solista do seminário, puxava os cantos da Catedral de Lorena. Aí vim embora para Cruzeiro novamente, acabei de fazer os meus dois anos seguintes de segundo grau, naquela época ginásio, foi quando os meus irmãos foram fazer engenharia em Itajubá. Um foi na frente, outro foi atrás e o próximo seria eu. Fui também morar em Itajubá, estudar um Itajubá. Aí fiz os três anos de colegial em Itajubá, e eu casei muito novo, porque quando eu tinha 18 anos, eu estava tirando o terceiro ano do colegial... Eu casei com 18 anos, quer dizer, antes de eu tirar o colegial e antes de eu servir o Exército eu já eram casado. Aí, o que aconteceu?
P/1 – Os seus pais não se opuseram?
R – Não, é aquela história, né? Os apressadinhos, né? Comer lanche antes do recreio. Foi o que aconteceu comigo. Foi interessante... não vem ao caso aqui agora, mas depois em off eu posso até contar para vocês isso, que é a coisa mais engraçada.
P/1 – Pode contar.
R – O meu irmão já era casado e morávamos eu e o meu irmão numa casa em Itajubá. E eu tinha 18 anos e nós éramos muito brincalhões. E uns tempos eu comecei a ficar meio aborrecido, meio triste, meio quieto, porque eu fiquei sabendo que a minha esposa, que a menstruação dela estava atrasada. Eu já sabia que o negócio estava feio, porque eu lembro que eu tinha feito coisa errada mas eu não sabia que a coisa... né? Aí eu cheguei para a minha cunhada e perguntei para ela assim: “Adianta tomar pílula se a mulher já estiver grávida?” Olha a minha inocência! Eu era bem criança. Ela falou assim: “Não, não adianta não”. A minha cunhada já olhou pra mim com o olho arregalado, sabe? Aí me deu um desespero, eu dei um murro na mesa e comecei a chorar. Eu falei: “Nossa Senhora! Eu acho que a minha namorada tá grávida”. Aí chamaram ela lá, mandaram fazer o exame de laboratório e ia ficar pronto no outro dia. No outro dia eu fui lá no laboratório buscar o resultado, quando deu positivo – e Itajubá é uma cidade cheia de morros – eu desci do laboratório e vim correndo de bicicleta. Quando chegou na travessia da estrada de ferro, a bicicleta me jogou e eu meti a cabeça no asfalto e fiquei lá zonzo, grogue. O pessoal veio, me socorreu! E eu com o exame agarrado na mão. Na hora que eu cheguei em casa com a cabeça toda machucada peguei e falei assim: “Olha, ela tá grávida”. Aí o meu irmão falou: “Nossa, e agora? Como vai avisar o pai dela e avisar o meu pai?” Aí eu disse assim: “Olha, vamos fazer o seguinte, nós temos que avisar o papai”. Aí tinha uma estrada de ferro que liga Itajubá a Cruzeiro, passando por São Lourenço. Você sai de Itajubá, sai em Jesuânia e depois em São Lourenço e vem pra Cruzeiro. Um meu irmão vinha de ônibus por Piquete que chegava mais rápido, e mandou eu vir de trem com o meu outro irmão. Aquele foi mais rápido para avisar meu pai. E mandou o sogro dele avisar o pai dela, que eu não conhecia o velho lá, não sabia se ele era bravo... Aí ele foi por um caminho e eu fui por outro. Aí eu peguei e cheguei em Cruzeiro. O meu irmão já tinha avisado a minha mãe. Eu cumprimentei a minha mãe, do jeito que eu cumprimentei eu sentei no sofá. Isso era uma hora da tarde, o meu pai chegou quase às 18 horas. Eu fiquei sentado cinco horas no sofá parado, sentado, calado. Não sei se piscava, mas acho que piscava, esperando o meu pai chegar. A hora que o meu pai chegou ele passou limpando a garganta assim, na minha frente, foi lá para o quarto. Me cumprimentou assim, rude, e foi lá para o quarto. Eu pensei assim: “Nossa Senhora! Ele vai me bater. Ele vai me bater!” Olha a idéia: “Ele vai me bater”. E eu travado ali nas quatro rodas. Daqui a pouquinho ele me chamou lá no quarto, e no quarto da minha mãe tem o oratóriozinho de Nossa Senhora, aquela luzinha acesa assim. Ele chegou lá no quarto, olhou para mim e eu pensei assim: “Caramba, vou ter que trabalhar agora na roça, na enxada. Eu não sei fazer nada, a única coisa que o meu pai faz é isso, eu vou ter que trabalhar com ele, né?” Ele chegou, olhou pra mim, me abraçou e falou: “É, meu filho, agora que você vai ter que estudar com vontade”. Eu não esqueço disso nunca, sabe? Aí me abraçou. Aí e pensei: “Meu Deus, que homem! Eu já admirava esse homem, agora que danou tudo, né?” Aí acabou. Me deu aquela injeção de ânimo. Aí marcamos o casamento para o dia 20 de dezembro. Eu fiquei noivo três meses. Aí já estava começando a aparecer barriga, aí tivemos que marcar o casamento. Eu casei no dia 20 de dezembro, casei na Basílica de Aparecida com mais 30 casais, inclusive do lado de um jogador do Cruzeiro, eu lembro disso, que o cara pôs um Galaxie bonito, preto, lá parado! Casei do lado dele, casei na Basílica de Aparecida. Aí, quando foi no dia 23 de janeiro eu tentei vestibular. Para você ter uma noção do que é a necessidade e a força de vontade, eu, em 23 dias, fiz um programa de estudar os três anos de colegial. Eu estudava 16 horas por dia. Dezesseis horas por dia e fiz um programa. Eu resolvia todos os problemas de matemática, física, química dos livros que eram recomendados pelos vestibulares que fizeram parte do meu estudo de segundo grau, que eu resolvia todos os problemas, não largava nenhum para trás, durante 16 horas, 23 dias. Eu fui fazer o vestibular, no meio de 350 candidatos eu passei em 23º lugar.
P/1 – Em Itajubá?
R – Não, tentei em Itajubá... aí aconteceu uma coisa curiosa. Como é que eu escolhi as telecomunicações? Eu não sabia que existia uma Escola de Telecomunicações no Brasil, nem sabia o que era isso. Eu ia para Itajubá para me formar em engenheiro eletricista. E a minha esposa falou assim: “João, tem uma escola de engenharia em Santa Rita que forma engenheiro em três anos”. Aí eu falei: “Mas o que é essa escola?” “É engenharia de telecomunicações, mexe com telefonia, essas coisas”. Eu não sabia.
P/1 – Que ano era isso?
R – Isso foi em dezembro de 1969. Aí ela falou assim: “Lá tem essa escola de engenharia e telecomunicações. Por que você não tenta lá? Forma em três anos”. Aí eu falei: “Bem, mas é particular”. Aí fui conversar com o meu pai. Ele falou: “Não, tenta!” Aí, pela tradição eu tentei em Itajubá, só que em Itajubá eu fiquei na lista de espera por uns 30 candidatos, não dava para eu entrar. Aí eu fui, tentei em Santa Rita e passei em 23º lugar. “E agora, como vai pagar essa escola?” Aí fizeram um acordo entre o meu pai e o meu sogro. O meu pai sustentaria a escola, pagaria a escola e o meu sogro me sustentaria dois, três anos. Durante três anos eu viajei de carona 88 quilômetros por dia, entre Itajubá e Santa Rita do Sapucaí. Eu ia de carona e voltava, porque na beira da estrada de Santa Rita os estudantes iam disputando a tapa uma carona. Disputa mesmo, porque é tudo duro! Disputava no tapa uma carona. Aí eu peguei e durante três anos fiquei estudando, me formei em Santa Rita. Aconteceram lances curiosos comigo, de eu chegar a dormir na beira da estrada, cansado, com fome, quando ia acordar de noite todo mundo tinha ido embora e eu estava no meio do mato dormindo, perdia as caronas todas! E me formei em Santa Rita, me formei com praticamente 21 anos. E daquela data em diante, todo o sucesso, tudo que eu subi na vida, vamos dizer assim, foi com esforço próprio. Mudei de longe de casa, vamos dizer assim: o meu pai me deu o pontapé inicial e dali para frente eu fiz o jogo da minha vida, entendeu? E sofri... no último ano fui quase internado com início de tuberculose, porque eu passava fome, cheguei a passar fome. Eu lembro que levava uma marmita térmica carregando maionese... Eu não podia nem ver a maionese na minha frente, de tanta maionese que eu comi. Eu preferia comer sanduíche, não queria ver maionese na minha frente. E me formei. Naquela época emprego era maravilha! Não faltava emprego para ninguém, tinha 30 empregos para um engenheiro. Eu podia escolher em trabalhar na Embratel...
P/1 – Como conheceu Mário Gonçalves, que lhe convidou para trabalhar na CTBC?
R – Eu conheci ele em 1966, colega de colegial. E nós íamos estudar na casa dele, a gente ficava jogando baralho e estudava, né? Nós éramos três estudantes, eu era o único casado, o apelido nosso era Três Porquinhos. Um era gerente da Telesp em Bauru, o Mário Gonçalves veio ser chefe de departamento de transmissão aqui em Uberlândia, eu e ainda tinha mais o Alencar, que é um engenheiro que trabalhou na CTBC muitos anos e depois foi embora, hoje é empresário aqui em Uberlândia na área de construção civil. Teve o Hélião, que trabalhou aqui uns anos, que foi marido daquela menina, a Goreti, uma menina que trabalhou aqui e cuidava dos serviços gerais e depois foi embora, saiu da CTBC. Eu esqueci o primeiro nome dela. O nosso apelido era Três Porquinhos, porque nós estudávamos sempre juntos e pegávamos carona juntos, né? E eu era praticamente o único casado que tinha na escola. E naquela época tinha muito emprego, a Marinha levava todo mundo. A Marinha veio procurar engenheiro e nós preparamos os nossos currículos e mandamos para a Marinha, só que ao invés de mandar para a Marinha no Rio de Janeiro, nós mandamos para Belo Horizonte. Todo mundo que mandou para o Rio de Janeiro foi servir na Marinha, e eu e o Mário mandamos para o lugar errado, não deu certo. E naquela época nós já tínhamos até oficiais da Marinha que formavam em Santa Rita, inclusive um deles você conhece, que era da Polícia Militar, hoje é deputado, o Paulo Heslander, que foi presidente da Telemig, foi colega de sala meu. Aí também a Usiminas foi procurar a gente. Aí fizemos um concurso lá... fizemos inscrição na Usiminas, eu e o Mário Gonçalves e outros colegas nossos, o Mário não quis ficar lá porque eu acho que na época apareceu a CTBC e ele veio embora para cá e eu fui para Ipatinga. Depois ele que me trouxe para cá um ano e meio, dois anos depois.
P/1 – Qual era a sua função em Ipatinga?
R – Eu era chefe do setor de balanças, porque a usina siderúrgica tem muitos tipos de balanças, né? Tinha balança de lingotamento, balança comparadora, analítica... lá tem sinterização, aciaria, laminação de tiras a frio, tiras à quente... Então eu cuidei do setor de balanças da Usiminas. Eu cuidava da balança de lingotamento. Balança de lingotamento é aquela balança que ele vem e pega uma panela aqui em cima e você vê num display digital. Naquela época, o display digital era novidade, aqui no Brasil não tinha. Então, na medida em que o aço derretido vai saindo, ela vai marcando a quantidade de aço que está saindo e que está ficando. Aí eu ia para o Japão, eu já estava com viagem marcada para o Japão. Foi quando aconteceu que eu estava trabalhando e de repente me chamaram, que a minha esposa estava sofrendo uma forte hemorragia. Lá é muito poluído: lá na Usiminas você abre a janela e quando você enche o peito de ar você já fumou para o dia inteiro, de tanta poluição que tem: naftalina, benzol, alcatrão, nafta...
P/1 – Agora não tanto, né?
R – Não, agora não tanto, mas chegou a nascer criança com problema de cérebro.
P/1 – Naquela época não se tomava cuidado com isso.
R – Não tomava cuidado com nada disso. Aí, quando eu vi o estado da minha esposa, peguei o carro e a levei para o hospital. Aí ela perdeu o neném, estava grávida, e eu me aborreci com aquilo lá. Eu aborreci. A gente estava com o apartamento novinho, casa mobiliada, novinho de tudo. Eu falei: “Aqui eu não fico mais, vamos embora!”. Eu saí de lá sem emprego. Vendi tudo que eu tinha, tudo! Depois não deu pra comprar uma televisão. Vendi uma casa inteira e não deu pra comprar uma televisão. Porque eu vendi barato demais. Eu apavorei. Imaturo! Eu tinha 21 anos, eu era meio bobo ainda. Vendi, aí vim embora. Vim embora para lá e vim trabalhar nessa empreiteira em São Paulo...
P/1 – Que empreiteira era?
R – Manter Engenharia e Comércio, era de um pessoal daí de Ribeirão Preto que mexia com construção civil em São Paulo.
P/1 – Só lugar poluído.
R – Também. Eu morei numa favela lá em São Paulo. Eu morava embaixo da linha de transmissão da Light, em Rudge Ramos, sabe? Fui conhecer lá. Eu não conhecia ninguém, como eu ia arrumar avalista para me fiar, fazer fiador no aluguel? Aí a minha mãe arrumou uma parente dela que tinha um barraco lá, eu fui morar nesse barraco, eu trabalhei seis meses.
P/1 – Nessa época sem filhos ainda?
R – Eu já tinha o menino de três anos. Aí foi quando a empresa quebrou e eu entrei em contato com o Mário Gonçalves, meu colega dos Três Porquinhos lá de Santa Rita. Ele já estava aqui, em Uberlândia. Aí pegou e me chamou, falou: “Vem trabalhar pra cá”. Naquela época o seu Wilson Costa, que era diretor superintendente nosso, era diretor da Ceterp, lá de Ribeirão Preto. O Mário falou: “Olha, João, tem duas vagas aqui, ou você vem trabalhar no departamento de transmissão da CTBC, que eles querem criar um departamento de comunicação, ou então você vai substituir o seu Wilson lá em Ribeirão Preto, na diretoria da Ceterp”. O seu Wilson também explorava linhas de som na cidade de Ribeirão Preto. Mas aí eu pensei assim: “Poxa, mas prefeitura, ser diretor de empresa de prefeitura, de quatro em quatro anos eles trocam diretor. É fria. Então eu não quero ir pra lá não”.
P/1 – Já não estava tão imaturo assim.
R – “É, eu não quero ir mais pra lá não. Esse negócio de ficar mudando de emprego não é comigo”. Aí eu falei: “Então eu vou pra Uberlândia”. Aí vim para Uberlândia e fiquei trabalhando com o Walter Machado. O Walter Machado é irmão do Albano, irmão do Celso, que foi da ABC Propaganda, e tio do Carlinhos Machado, que era amigo do seu Alexandrino, do doutor Luiz... Hoje ele tem uma empresa de equipamentos de telecomunicações no Rio de Janeiro, ele trabalhou também na ABC, no Rio, na ABC-TI, no Rio. Aí vim trabalhar com ele um ano.
P/1 – A família ainda era pequena?
R – Nessa época ainda tinha só um filho. Foi quando fui para Itumbiara que a minha filha Cristiane nasceu.
P/1 – Como foi o seu primeiro ano aqui em Uberlândia?
R – O primeiro ano em Uberlândia é o seguinte, eu estava trabalhando no departamento de transmissão... É até interessante falar: nós trabalhávamos naquele prédio lá na João Pinheiro, 620, era um predinho de três andares e no último andar do prédio tinha uma Central Trânsito F-1 da Standard Electric, que era trânsito de Uberlândia da Telemig. No andar debaixo funcionava contabilidade, faturamento, administração da empresa, e lá trabalhavam o seu Alexandrino e o doutor Luiz. O doutor Luiz naquela época agarrava junto mesmo o serviço de caseiro, ele estava ali do lado, administrando. E ele trabalhava ali junto, isso no andar de cima. No andar de baixo, onde era a sala de repouso das telefonistas, abaixo da central 235, ali trabalhava o distribuidor geral com a parte de exame de linha... porque exame de linha tinha aquela pessoa que todos os dias testava as linhas interurbanas para ver se elas não estavam com defeito. Isso porque naquela época não tinha equipamento de microondas, não tinha nada disso. Existia, sim, uns equipamentos de DQ-12 Multiplex que vão em cima de linha física, e você punha 12 pessoas falando simultaneamente com 12 pessoas em cima de uma linha física de fio nu. Esses eram os equipamentos que existiam naquela época, o DQ-12, o EAF, os K-32... K-32 era um equipamento que permitia colocar somente quatro pessoas em cima de uma linha física. Ele era uma espécie de uma sorveteira, é antigo, tudo maciço, tudo à válvula. E tinham os equipamentos DQ-12, que ainda temos aí guardado talvez algum – mas é peça de museu, já não se usa mais. Então, naquela época o Etelino, que foi o gerente regional da CTBC em Itumbiara depois de mim, em 1980, que era o representante numa empresa de telefonia celular em Itumbiara, fazia o exame de linha. O Walter Machado era chefe de departamento de longa distância. O Dilson Dalpiaz Dias, que hoje é diretor de comunicação do Grupo Algar, era chefe de departamento de rede de Uberlândia. Nós trabalhávamos todos no mesmo salão. Existia o desenhista João Morbeti, que já não trabalha mais na empresa há muitos anos, tínhamos o Mário Gonçalves, que trabalhava junto comigo também que era o serviço de bancada; eu tenho o meu colega de trabalho que nós entramos juntos para a CTBC, ele começou em Ribeirão Preto, que é o Tadashi Takahashi, e que trabalha até hoje na transmissão, nós entramos juntos e ele sempre ficou na parte de transmissão. Também temos um que entrou um ano depois, é o Miúche Cano, é técnico e administrador de empresas que trabalha no CPL, planejamento aqui da engenharia, foram contemporâneos meus. Tem outras pessoas que trabalharam assim, antigamente conosco. Nós trabalhávamos num salão só.
P/1 – E o seu Alexandrino e o doutor Luiz perto?
R – Trabalhavam no andar de cima.
P/1 – Como era a relação com os dois?
R – Olha, no primeiro ano que eu estive aqui o meu relacionamento com o doutor Luiz foi muito pequeno, foi muito pouco, porque a gente ainda era muito novo e tinha certa timidez. Mas ele sempre foi investido e revestido de uma humildade fabulosa. Eu passei a ter uma intimidade até maior com o doutor Luiz no decorrer dos anos quando eu fui gerente regional, até porque a gente frequentava a mesma igreja. Então, no decorrer do tempo, o conhecimento vai aumentando, a admiração pelas pessoas vai aumentando. Eu pude sentir isso. Você conhece a história? O pai da gente é bom, mas quando ele morre aí que você descobre que ele era excelente, não é verdade? Não é um fato que acontece isso? O seu Alexandrino para mim foi isso. O seu Alexandrino, na época em que ele era vivo, era aquela pessoa assim, que você tinha uma admiração por ele, mas era uma admiração assim meio temerosa, ou seja, quando ele vinha para afrontar você frente a frente, você tinha medo de conversar com ele – pelas promessas que você fazia e pela memória que ele tinha e pela capacidade dele de cobrar de você e de exigir de você aquilo que você prometia. Ou seja, ele tinha imã no olho para buscar e achar as coisas erradas. O doutor Luiz também tinha essa coisa. A primeira admiração que eu tive do seu Alexandrino era uma admiração servil. Depois que o seu Alexandrino adoeceu e depois que ele morreu, eu passei a perceber que o seu Alexandrino tinha para mim o que eu tenho pelo o meu pai, que você pôde presenciar aqui hoje, quando eu me engasguei quando eu falava do meu pai. A responsabilidade que aquele homem tinha e a determinação... Eu comparava o seu Alexandrino com a determinação do meu pai. O meu pai, saído da agricultura, nos transformou em oito profissionais de nível superior. O seu Alexandrino foi muito maior. O seu Alexandrino, que veio de Portugal e que era simplesmente motorista de caminhão ou verdureiro, transformou essa empresa e formou esse grupo tão grande que chegou a ter seis mil funcionários na holding. Quer dizer, então o respeito do seu Alexandrino deixou de ser uma coisa servil e passou a ser uma coisa de idolatria.
P/1 – E como era a relação com ele de trabalho mesmo?
R – Com ele, olha, eu tinha muito pouco. Eu confesso a você que eu tinha pavor dele. Pavor assim, um pavor de respeito, certo? Eu mantinha distância, existia uma distância. Os fatos que aconteceram na cidade de Itumbiara... porque o seu Alexandrino não gostava muito de Itumbiara não, porque ele teve um problema com um gerente anterior que eu fui substituir.
P/1 – Logo depois de um ano chegado já foi gerente lá em Itumbiara?
R – É, eu fui ser gerente, exatamente. E eu lembro que um dia eu fiz um telefonema para ele. Eu era ainda era imaturo, mas tinha esse pepino na minha mão: eu precisava de alguém para me ajudar resolver. E tinha que construir a Companhia Telefônica de Goiatuba, que era minha responsabilidade. E aconteceu que a Companhia Telefônica de Goiatuba, no passado, havia uma empresa chamada Teleatlas – não lembro o nome do dono da empresa – que arrecadou dinheiro na cidade de Goiatuba para poder automatizar a cidade, porque na cidade de Goiatuba a ligação local era toda manual. Existia uma mesa telefônica para mil telefones. Então, para eu falar com você dentro da cidade você tirava o telefone do gancho, a lampadazinha acendia, a telefonista enfiava a pega e dizia: “Pois não?” “Quero falar no 1001”. Aí ela pegava a outra ponta da pega, enfiava lá, acionava a chave, dava toque de campainha, o camarada atendia e ela pegava e enfiava a pega e punha os dois para falar. Quando os dois começavam a falar, ela puxava a chave e caía fora. A hora que o camarada colocasse o telefone no gancho novamente a luzinha acendia, ela ia lá e puxava a pega. Às vezes ela esbarrava a mão, puxava, caíam duas ligações. Essa chama mesa DF-14, da Ericsson, que era uma mesa manual. Goiatuba e Morrinhos foram as últimas cidades a sair desse sistema manual. Então, essa pessoa que eu estou tentando lembrar o nome dela... O doutor Júlio, da Teleatlas – foi lá em Goiatuba e arrumou dinheiro, pegou dinheiro com o público e ia automatizar a cidade. E ele pegou esse dinheiro e sei lá, sumiu, não automatizou a cidade, nada. E foi nessa época que a CTBC veio e comprou, incorporou a Companhia Telefônica de Goiatuba, porque a CTBC começou pequenininha e foi comprando, comprando, comprando, comprando... A cidade foi crescendo e aí o que aconteceu? O doutor Júlio vendeu a Telefônica de Goiatuba para a CTBC. Então eles tinha de construir uma Telefônica nova e queriam automatizar a cidade, né? Então eu fui nessa época. Isso foi em 1978. Nós compramos três centrais telefônicas: uma para Morrinhos, uma para Goiatuba e uma para Itumbiara. Aí compramos a central telefônica lá na cidade de Goiatuba, aí construíram um prédio novo. Quando estava acabando de construir o prédio, cheguei com a carreta lá e fui descarregar a central telefônica e começamos a descarregar a central telefônica, uma dessas de três eixos, acabei de descarregar e vim embora. Quando eu estou chegando em Itumbiara, o telefone toca e eu atendo. É o doutor Luiz: “Oh, João..”. Ele falava desse jeito: “Oh, João, volta lá em Goiatuba novamente e carrega a central telefônica que nós acabamos de ser encampados pela TeleGoiás”. Fomos encampados. Houve alguns encampações: foi Goiatuba, Morrinhos, Lagoa da Prata. Foram essas três cidades. Aí voltei lá novamente, carregamos a central telefônica.... Mas contando essa história aqui eu perdi um pouco os fio da meada.
P/1 – Você estava dizendo do seu Alexandrino...
R – É, tá certo, me lembrei. Então o seu Alexandrino e o doutor Paulo Fernando, que era o gerente anterior, os dois não passavam na mesma porta, ele e o seu Alexandrino. O seu Alexandrino adquiriu uma certa birra contra o Paulo Fernando, o doutor Paulo Fernando mandou descarregar um caminhão lá em Goiatuba de material de construção e o seu Alexandrino era contra aquilo. Então o seu Alexandrino não gostava muito da regional de Itumbiara. E eu peguei a carona da intriga dos dois. E eu não sei o que eu falei com o seu Alexandrino que o seu Alexandrino deu uma resposta seca: “Moço, o senhor é pago pra resolver e não pra me trazer problema”. E “pá!”. Desligou o telefone. Para mim era tudo na vida pela telefônica e, de repente, ele me deu aquela resposta seca. Para mim aquilo foi uma frustração tão grande. Eu me lembro que eu peguei o meu carro e saí com ele de Itumbiara e fui parar lá na serra de Buriti Alegre, debaixo de uma floresta que tinha lá. Parei o meu carro lá e sumi, fiquei lá umas cinco horas sentado embaixo de uma árvores lá. Até chorar de raiva eu chorei, pela maneira como ele me tratou. Então o seu Alexandrino era assim: ele era um homem de 8 ou 80. E essas convivências é igual briga de marido e mulher, essas coisas que aconteciam. Mas ele era uma pessoa determinada, ele se preocupava com tudo. Para ele não existia obstáculo, para ele não existia não. Ele queria aquilo e acabou, você entendeu? É uma pessoa determinada, ou seja, são pessoas como Thomas Edison, como o Martin Luther King, como outras pessoas assim, ou seja, são santos que não são canonizados. Não sei se eu poderia dizer assim, na área do empreendimento. Seu Alexandrino é uma pessoa que sabia aquilo que queria. E a gente vem descobrir isso depois que a pessoa morre. Então essa é a impressão que eu tinha do seu Alexandrino e esse primeiro ano de empresa foi esse processo de adaptação com essas pessoas que eu convivi nesse tempo. Eu lembro de um fato marcante: quando o doutor Luiz queria transferir o escritório de baixo, dali do centro da cidade para o escritório da Industrial, nós tínhamos construído o escritório da Industrial e o doutor Luiz queria trazer o escritório do centro para lá. E o seu Alexandrino não queria e o seu Alexandrino ficou no pé da escadaria e falou assim: “O primeiro que tiver que descer com qualquer móvel de escritório aqui em cima tem que passar por cima do meu cadáver”. Os funcionários sumiram todos para trás dos bastidores, ninguém queria carregar nada. Enquanto o filho dele não foi lá conversar com ele não começou a aparecer as pessoas para poder descarregar, começar a subir com os móveis. Mas todo mundo tinha medo dele, né? Ele afirmava e acabou, entendeu? A turma sumia, que tinha que descer móveis, isso e aquilo, e ninguém queria.
P/1 –O doutor Luiz costuma dizer que o pai era uma pessoa que enxergava atrás do morro.
R – Enquanto eu enxergava daqui até ali na esquina, o filho dele enxergava ali até no primeiro horizonte, o pai dele enxergava dez horizontes na frente. Uma pessoa ímpar mesmo, gênio mesmo. Tem ruas aqui em Uberlândia que têm nomes de vereadores e deputados que nunca fizeram nada para Uberlândia. Infelizmente só deram nome de uma avenida e um viaduto para ele. A cidade de Uberlândia não tinha que chamar cidade Uberlândia, tinha que chamar cidade Alexandrino Garcia. O De Gaulle falou uma verdade muito grande: “Todo povo tem o governo que merece”. E é verdade, porque eu vou te contar, eu nunca vi povo de memória curta. Um homem que fez tudo para Uberlândia não poderia ter tido seu nome só num viaduto e só numa avenida de Uberlândia. Não podia de jeito nenhum.
P/1 – Ele era uma pessoa que tinha muita gana de aprender, até porque entrou na telefonia sem entender nada de telefones e construiu um grupo cujo de atendimento e atualidade são ímpares.
R – E tem uma frase famosa do seu Alexandrino, uma frase que marcou muito: “Eu não queria fazer telecomunicações, o que eu queria era servir às comunidades”. Você conhece essa frase, é famosa. E era aquilo! Tem uma hora que você fica se perguntando: “Por que uma pessoa que é bem financeiramente quer chegar a ser Presidente da República?” Tem alguma coisa, um algo mais de auto-afirmação no indivíduo. É um instinto de auto-afirmação insaciável. Nós somos pessoas de instinto de afirmação com pouca sede. Ele é insaciável no instinto de auto-afirmação. A verdade é essa. É uma pessoa que não tem limite para a sua auto-afirmação – ela queria, queria e queria, você entendeu? Então é assim que eu enxergava o seu Alexandrino. E o dia que eu me emocionei muito do seu Alexandrino foi no dia do velório dele, lá na mansão dele para baixo de onde é hoje o Call Center, aquele Rolando, que é cabeleireiro e é pastor, ele cantou aquele Salmo 90 ... (canta) Ele cantou aquela música. Aquilo ali marcou muito. As pessoas de mão dadas, cantando. Até a lembrança de morto do seu Alexandrino para mim é viva. A verdade é essa, até a lembrança dele morto pra mim é viva. Aquele homem não morreu, aquele homem para mim não morreu. E o filho dele herdou o dinamismo dele, talvez nem tanto quanto o pai, mas herdou o que o pai dele deixou e sempre correspondeu. Eu sempre admirei o filho dele também, até por herança. Mas o pai dele realmente era uma pessoa que marcou muito. Quem conheceu ele aprendeu a amá-lo.
P/1 – Essa idéia de servir à comunidade é uma coisa que sempre esteve presente no trabalho e no desenvolvimento da CTBC. Como a tecnologia acompanhou isso? Como foi construída essa base tecnológica? Como nós saímos do telefone de magneto, lá, da velha Teixeirinha e chegamos a esse celular inteligente?
R – Um parênteses antes disso que você me perguntou. Eu acho que o fato de eu ter percebido no seu Alexandrino a vontade de servir, eu aprendi com ele também a ser servo, porque no decorrer de todos esses 26 anos de CTBC que eu tenho eu pude... No passado, você pegava uma obra no início e ia até o fim, então você passava por todas as fases, desde a necessidade e a carência, até a necessidade atendida. E eu tive a oportunidade de participar disso porque... Por que eu estou falando que eu pedi um adendo disso aí? Que é uma parte que ficou esquecida do problema do servir e de aprender a servir, ou seja, o seu Alexandrino pra mim foi um evangelizador porque eu aprendi com ele a servir. Então nesse decorrer do tempo, quantas cidades que não tinham sistema telefônico nenhum, eu posso enumerar aqui uma lista de umas 40 cidades que não tinham sistema telefônico nenhum e que quando eu trabalhei lá eu coloquei junto com o capital e a vontade do seu Alexandrino, como Lindinópolis, Cachoeira Dourada de Goiás, Inaciolândia, Buriti Alegre, Centralina, Canápolis, Indianópolis, Pedranópolis, Nova Ponte... pegando aí para o lado de Pará de Minas, Pequi, Papagaio, Maravilha, Perdigão, Araújo... nada tinha telefone. Dá pra enumerar uma lista enorme aqui de 40, 50 cidades. E a gente sentia, toda vez que você implanta um sistema telefônico numa cidade, com certeza ela começa a ter progresso, porque a comunicação é a base de tudo e a cidade cresce. Eu lembro de um lugar que ficou bastante famoso, que demorou demais para ser atendido. Em 1979, um dentista na cidade de Almerindonópolis, distrito de Cachoeira Dourada, que é conhecida também por Arraial do Boteco... lá não tinha telefone, você tinha aqueles armazéns gerais e não tinha sistema telefônico. E esse dentista chegou com um abaixo-assinado na minha mão de pessoas que queriam comprar 30 telefones. Ele era boticário, ele não era dentista não, ele não era dentista formado. E eu labutei naquela época para tentar conseguir colocar um equipamento lá e acabou que eu vim embora para Uberlândia, não deu tempo para colocar telefone lá e eu vim embora. Quando foi agora, acho que quatro anos atrás, a mesma lista existia lá com o pessoal querendo colocar telefone e foi colocado telefone em Almerindonópolis. Olha que luta! Foi uma luta de 20 anos para o pessoal ter telefone no lugar. Só tinha telefone no posto de gasolina. Então eu fico imaginando no mundo hoje, onde você tem Internet, onde você tem TV parabólica, uma pessoa ainda não ter o direito de poder falar, de ter telefone e de ter a comunicação isolada do mundo, em plena região Centro-Oeste brasileira. Então quando você vê isso aí funcionando é que a gente vê o trabalho da gente de servir. É maravilhoso, isso é muito bonito.
P/1 – Essa é uma característica da Companhia, de ter sempre esse foco no serviço de qualidade porque é um tipo de serviço que acaba aproximando as pessoas de um lado e acaba gerando desenvolvimento econômico do outro. Não suponho que isso seja racionalizado por parte de quem está gerindo o processo, mas de fato é esse o papel que ela acaba desempenhando na operação dela, não é?
R – Olha, o ser humano cresce quando ele conhece. Ele tem que conhecer. Diz que o Oitavo Sacramento que existe no mundo é a ignorância, porque você ignorando você nem sabe o que você ignora. Então, teoricamente você não é culpado. Mas eu diria que a pior coisa que existe no mundo é a ignorância. A ignorância para mim é pior do que a loucura, é pior do que qualquer outra coisa. Existem para mim dois tipos de ignorância: o ignorante que não quer aprender e o ignorante que não tem acesso à educação. E a educação se faz pela comunicação. Ela se faz pela comunicação! Então, como se educa um povo? Como você leva educação, leva saúde para as pessoas? Tem que ser através da educação! Educação é qualidade de vida. Se você não leva o sistema de telecomunicações para um lugar, como a pessoa fica sabendo das coisas que estão acontecendo no mundo? Então as telecomunicações estão intimamente ligadas com a qualidade de vida das pessoas, e não tinha isso antigamente. Eu lembro da minha cidadezinha de Marmelópolis que as pessoas tinham uma cultura tão atrasada que eu chegava com um violão para tocar um violão, era uma maravilha! Nem violão eles conheciam, nem rádio eles tinham. De repente entrou a TV parabólica, entrou a energia elétrica primeiro e depois entrou a TV parabólica, e agora vai lá conversar com as pessoas: a mentalidade mudou totalmente. É diferente. Se tivessem palavras para expressar a diferença que existe entre uma pessoa que não tem acesso à cultura e à educação, antes e depois, é tão evidente que você tem que fazer parte da história para perceber a mudança que ocorre. Então a comunicação está intimamente ligada à educação, à transformação e à qualidade de vida. E o projeto de qualidade total que o pessoal fala tanto hoje não poderia ficar para trás, porque quando você é educado você vai se tornando mais exigente. Então não basta mais você simplesmente dar arroz com feijão para as pessoas. Agora elas querem filé mignon. Não adianta você dar só arroz com feijão, mas primeiro você tem que tratar delas com arroz e feijão, para depois dar o filé mignon. Então agora o povo está exigindo filé mignon, porque o arroz com feijão já foi seu tempo, embora ainda exista gente que não tem arroz com feijão na área de telecomunicações. Mas a CTBC, as últimas 20 cidades, os últimos 20 municípios que ainda não tinham comunicação, estão encerrando este ano e ainda vão ficar algumas para o começo do ano que vem. Ou seja, a CTBC, até o primeiro semestre de 2000, não deve ter mais nenhuma cidade que não tenha o arroz com feijão das telecomunicações, e todos eles já estão exigindo filé mignon, precisam de filé mignon, é um direito que eles têm. Ninguém tem o direito de se contentar só em querer ter só arroz com feijão na área de comunicação. Então as pessoas primeiro precisam ser educadas, e depois de educadas, aprimoradas. E as telecomunicações fazem isso. A CTBC está hoje em 80 municípios, quase 200 localidades, vamos dizer assim, em distritos e povoados, mas a CTBC devia ter umas dez cidades na época, das maiores. A primeira, Uberlândia. Quando eu vim para Uberlândia, a cidade de Uberlândia tinha os equipamentos eletro-mecânicos que...
P/1 – Como foi o desenvolvimento da base tecnológica da CTBC?
R – Eu vou fazer um traçado para você da linha evolutiva dos equipamentos de telecomunicações. Os equipamentos de telecomunicações da nossa era, vamos dizer assim, da era Teixeirinha-CTBC é aquele equipamento que eu descrevi pra você agorinha mesmo de Goiatuba: a mesa DF-14 e ADK-16. Eram mesas, como eu falei, onde uma telefonista tinha em frente dela um display – display no termo mecânico – onde você tinha um painel de lâmpadas e de jacks, e a tampa da mesa era um conjunto de pegas. Pegas são cordões de duas pontas. E essas pegas são controladas por chaves. Então quando a pessoa lá na ponta tira o telefone do gancho, ela fecha o circuito elétrico contínuo que acende a lâmpada na mesa, dizendo: “Olha, eu quero falar”. Então, como acendeu a mesa na posição 001, a telefonista sabe que é o telefone 001. Ela pega a pega, enfia lá na mesa, atende a pessoa e conversa com ela acionando a chave dela de monitoração. A pessoa simplesmente fala para ela: “Quero falar no número 2000”. Ela pega, deixa a chave de monitoração ligada, pega a outra pega aqui do lado de cá, enfia na posição 2000 e aciona a chave de ring, de campainha, de corrente de toque. A pessoa do lado de cá atendeu, e tira o telefone do gancho, ela simplesmente desliga a chavinha dela, enfia a pega, restabelece a comunicação entre as duas pessoas. A hora que uma delas desliga, e põe o telefone no gancho, o loop é aberto e a lâmpada apaga. Então ela vai lá e puxa a pega. Então esse é o primeiro sistema telefônico manual que existiu. Anterior a esse ainda existiu um mais antigo ainda. Nós temos uma senhora, a primeira telefonista de Itumbiara, chamada dona Joaninha. A dona Joaninha era sogra de um juiz famoso de futebol daqui de Belo Horizonte que foi da Federação Mineira de Futebol, eu não lembro mais o nome dele, era genro dela. A dona Joaninha era uma senhora já bem de idade, mas você olhava o braço dela era um tarugo de braço que parecia que ela era halterofilista, de tanto tocar aquela manivela assim e de tanto mandar a corrente de chamada no telefone da pessoa. Em Itumbiara, quando a CTBC chegou lá, ainda existia uma telefônica velha onde tinha essa dona Joaninha, que tinham poucos telefones na cidade, era pequenininha mas tinha, né? Ainda existia aqueles telefones onde as pessoas chegavam a utilizar uma linha da cerca da fazenda e a outra ponta dela era enterrada no chão com uma haste de ferro, onde você falava por uma linha e o retorno era pela terra. Existia aqueles telefones de fazenda, chegou a existir isso. Então esse foi o primeiro tipo de central telefônica que teve e a última mesa dessa veio sair da CTBC, isso comercialmente, no ano de 1978, nas cidades de Goiatuba e Morrinhos.
P/1 – Era eficiente, então?
R – É, para aquilo que tinha na época, né? Agora você vê, Morrinhos e Goiatuba, cidades grandes, daquele tamanho e tinha mil terminais telefônicos. Foi em 1978 que veio a acabar. Mas a CTBC ainda usou essas mesas como paliativo, chamadas mesas semi-automáticas. O que acontece? Você tinha que ter uma central telefônica funcionando, a CTBC lançava um plano de expansão. E antigamente as centrais, sendo as centrais analógicas, aquela centrais-mastodonte, demorava seis meses para você montar uma central telefônica. Então a CTBC para atender e antecipar as necessidades do usuário, pegava essas mesas telefônicas que foram desativadas dessas localidades e ativava elas como mesas interurbano/local, que eram as chamadas mesas de 106. Você chega a lembrar dela, né? Então ela atendia mil assinantes através das mesas de 106, antecipando a montagem da central telefônica. Quando a central era ativada, eles eram migrados para a central automática. Até 1985, por aí, 1987, a CTBC ainda usou desses recursos. Era a maneira que ela tinha de antecipar aos assinantes para eles não ficarem naquele sufoco de esperar um projeto durante dois anos.
P/1 – E otimizar a utilização do...
R – ...do equipamento, vamos dizer assim. Está certo que não tinha o melhor recurso, mas é o que tinha na época. Então é o seguinte: no primeiro momento das telecomunicações existia esse tipo de central, de mesa manual. Aí, por volta de 1946 nós tínhamos a primeira AGF, acho que foi montada em 1946. É uma central eletromecânica, onde os registradores dela ainda eram mecânicos também. Havia AGF modelo OS que era de registrador mecânico, e tinha as AGF com modelo elétrico, que os registradores dela já eram eletro-mecânicos. Nessa o reg era mecânico mesmo. Você via os racks funcionando, aquelas engrenagens... Os relés ao longo do tempo soltavam uns fiapos do barbantes que envolviam a bobina e quando você olhava e parecia que o relé era cabeludo. Parecia um relé cabeludo. Então funcionavam as centrais AGF. Em 1946 já tinha essa AGF em Uberlândia. Ou seja, a primeira central telefônica que tinha em Uberlândia ela foi transferida lá para a cidade do Prata. Eu não sei se ela está montada ainda até hoje no Prata, essa que deveria ser a central mais antiga que a CTBC teve, embora nós ainda tenhamos essas centrais por aí. A última foi desativada agora, uns meses atrás, a central do prefixo 234. Ela está montada lá no prédio do centro, mas ela já é a segunda geração, ela já é da geração de registradores eletro-mecânicos, ela não é da geração de registradores puramente mecânicos. Mas a primeira foi para o Prata. Uberlândia começou com um grupo de 500 linhas. Quando eu cheguei aqui em Uberlândia eu não lembro se Uberlândia já 3, 4 ou 5 mil linhas AGF. Os números assim ao certo eu não lembro, mas era a central que existia em Uberlândia em 1974, que essa é a central 234, que é essa que ainda tem até hoje aí. Mas existia essa antiga que foi remanejada para a cidade do Prata e foi botada uma mais moderna, entre aspas, aqui na cidade de Uberlândia. Depois muitas outras foram instaladas. Foi instalada na cidade de Ituiutaba, que é a central 262 que foi desativada o ano passado, foi ativada uma central dessa na cidade de Itumbiara... Quando eu fui para Itumbiara, em 1975, a cidade de Itumbiara tinha 500 linhas AGF e eu lembro que antes de ir para Itumbiara eu tive que fazer um estágio de quinze dias na cidade de Pará de Minas. Aí o doutor Luiz mandou que eu fosse para a Pará de Minas junto com o Jaime de Oliveira Araújo, o Alemão, que foi gerente da CTBC de Ituiutaba, de onde eu fui para Pará de Minas. Quando eu cheguei em Pará de Minas, estava montando a central AGF de Pará de Minas, e quem estava lá era o Mário José dos Santos, que é o técnico da telefonia celular hoje aqui em Uberlândia. Tem uma filha dele, Camila, que já trabalha conosco aqui. Então estava montando a central AGF, tem o José Manoel Chaves de Miranda que hoje é empresário lá no Pará, também mexia com montagem dessas mesas telefônicas, e o José Mário. Aí eu fiquei 15 dias lá na montagem dessa central AGF. Então a central AGF passou a entrar na vida da CTBC quando ela começou como CTBC, Companhia Telefônica do Brasil Central, aqui em Uberlândia. Essa linha de equipamento, a última foi desativada agora este ano, que é a central 234. Olha que vida longa!
P/1 – A procedência dela é...
R – Ela é Ericsson. E essas primeiras centrais vieram da Suécia. Inclusive teve alguns engenheiros nossos que foram à Suécia alguns anos atrás e lá na Suécia ainda tinha essa central funcionando, e ainda tinha a central dessa nova. Eles trouxeram uns seletores de lá, até uns anos atrás, quando eu estava aqui no prédio do centro ainda tinha um seletor desse novinho atrás da minha cabeça. Depois foi distribuído, eu não sei para onde foi o seletor, mas nós temos ele usado aí da 234, que é uma boa peça de museu. Eu não sei se AGF do Prata ainda está lá na cidade do Prata, que essa é a principal, a central mais antiga que existia na CTBC.
P/1 – Quer dizer, houve uma geração de centrais AGF na Companhia. E isso redundou no quê?
R – Aí bom, essas centrais telefônicas foram morrendo, morrendo, morrendo e sobraram as últimas, as duas últimas foram de Ituiutaba e de Uberlândia. Isso era Ericsson. A Siemens entrou com uma linha de equipamentos de igual capacidade, porém já um pouco mais aprimorado, vamos dizer assim. Eu diria um step a mais, um passo a mais na linha dos equipamentos. Porque essas centrais são denominadas crossbar, porém de rotativo. O braço do seletor gira e depois entra. Por isso que chama de rotativa em dois passos. Essas são as chamadas centrais passo a passo. O reg é crossbar, o registrador é crossbar, ele é que registra os números discados. O seletor que vai fazer a comutação entre um assinante aqui e outro assinante aqui, ele é de rotativo, ele dá um passo aqui, no que você disca, aí você disca outro número e o braço entra. Então essa é a central passo a passo. Aí a Siemens lançou uma central chamada Mixegenes e a Standard Electric lançou a central F-1, que era mais moderna do que a central AGF, certo? E a Siemens lançou no Brasil uma central chamada B-64. O próprio nome está dizendo: 64. B de Brasil e 64... inclusive eu tive a oportunidade de conhecer o camarada que projetou essa central, uma vez ele esteve aqui na CTBC, eu fiquei até admirado de ver o camarada porque o cara bolou um tipo de equipamento. Então tinha a central B-64, que é uma central chamada de elevação e giro. Essa central teve muito tempo na CTBC, a última foi desativada por volta de três anos atrás, porque houve um decreto, houve uma lei que proibia o serviço de multimedição interurbana e de agora em diante todas as chamadas telefônicas teriam que ser bilhetadas. E como essas centrais só trabalhavam com multimedição teve um promotor, um juiz de Goiânia, que falou para a TeleGoiás: “Olha, você tem que tirar da planta até uma data ‘x’ todos os equipamentos que geram multimedição interurbana”. E a TeleGoiás tinha umas 70 centrais dessas e a CTBC tinha umas 30.
P/1 – E qual é o motivo disso?
R – Porque multimedição interurbana não determina para você para onde você falou, é contagem de pulso, descarrega um trem de pulso à medida que você fala. Então, pelo nosso Código de Defesa do Consumidor tem que saber para onde ele falou e o que eu estou cobrando. Então essas centrais não possibilitavam esse tipo de tarifação, e teriam que sair do mercado. Foi há uns três anos atrás quando isso ocorreu, que foi o fim dessa era de equipamentos chamados B-64. Então existiu em muitas cidades da CTBC que tinham esse tipo de central, mas muitas mesmo: Nova Serrana, que hoje é uma cidade industrial, tem quase 250 fábricas de sapato, Indianópolis, Pedrinópolis, Cachoeira Dourada, Buriti Alegre, Nova Ponte... Nossa! Eram umas 30 e tantas centrais dessa. Então elas funcionaram até três anos atrás, essa central. Inclusive essa central telefônica tem uma parte marcada com a minha vida. Em 1993 foi lançado na CTBC o projeto “Prêmio Qualidade”. Aquele que conseguisse gerar um projeto, ia ser escolhido um projeto do ano e no meio lá de cento e tantos projetos, um projeto que eu prolonguei a vida das centrais B-64 e a KD-860, na planta da CTBC, ganhou o projeto do ano. Nós conseguimos bolar uma maneira de botar essas centrais telefônicas por mais uns três ou quatro anos na planta e ficou realmente essas 30 centrais, né? Então em 1993 ganhou esse projeto do ano. Até pouco tempo atrás eu tinha foto da gente numa revista, eu acho que eu tenho essa foto, está guardada em algum lugar, eu sei que tem. E nessa foto quem ficou na empresa ainda foi eu, o Jesus, teve um técnico de Pará de Minas que já não trabalha mais, teve o Marivaldo que trabalha hoje na Telesp e tem o Jesus Caldeira, que ainda é funcionário da empresa, que nós ganhamos esse projeto, esse prêmio desse projeto aí na CTBC. Mas então houve essa geração das centrais B-64 que também morreu. Bom, depois da geração da linha... que a CTBC está distribuída em duas linhas de equipamentos, é Ericsson e Siemens.
P/1 – Sempre foi?
R – Sempre foi. Entraram outras duas linhas de equipamentos na planta da CTBC, mas elas foram meio a contragosto. Uma foi empurrado goela abaixo que foi a central Plessey de Pará de Minas, que era uma central portuguesa, também era crossbar, era uma geração depois do AGF. Entrou só uma e a Plessey funcionava na cidade de Santos. É portuguesa. Plessey-ATE. E essa a empresa de Santos quebrou e foi empurrado goela abaixo pelo Ministério a central na gente e nós tivemos que instalar a central. Ela funcionou. Saiu este ano de funcionamento.
P/1 – Funcionou a contento?
R – Funcionou. No final estava dando muito trabalho a parte de multi-frequência-compelida, que é o protocolo que a central telefônica troca com outra linguagem, que elas falam entre si, né? Mas aí então teve essa Plessey e tivemos três centrais SESA, que quer dizer Standard Eletric Sociedade Anônima. Era uma central que tinha lá em Irajá, no Rio de Janeiro, tinha a SESA antiga. Nós tivemos quatro centrais dessa instaladas, onde as duas últimas foram tiradas este ano também... central PC-32, também crossbar. Então foi uma geração de dois equipamentos que entraram de vilão, de sapo e saíram.
P/1 – Qual a capacidade desse equipamento?
R – Ah, a Plessey podia até dez mil linhas, a PC-32 podia até quatro, cinco mil linhas, e tinha a F-1, que é aquela central que eu falei para você que tinha no último andar do prédio lá da João Pinheiro, que também era central eletro-mecânico e que era capacidade até de dez, 15 mil linhas. Central de 15 mil linhas naquela época era um supra-sumo de tamanho. Mas o máximo que chegava eram dez mil linhas. Então esses foram os vilões que entraram, mas sempre na CTBC predominou a Siemens e a Ericsson.
P/1 – E a transmissão física? A linha antes era de ferro, depois passou a ser de cobre, depois passou a ser de microondas... Como se deu esse processo?
R – Essa parte de transmissão foi o seguinte: antigamente a transmissão começou através dos chamados equipamentos carrier. O que é carrier? É o equipamento de ondas portadoras. Você usa como leito um par de fio físico, fio nu, esses fios nus que você tem na beira da rodovia. Em cima dele você faz uma multiplexação de canais de vozes, de tal maneira que você consegue encavalar e colocar em cima até 12 pessoas falando com 12 pessoas. Isso via linha física, via linha física o maior número de canais que você tinha possibilidade interurbano de fazer conexão entre duas cidades era 12. Aí, com o advento dos equipamentos de rádio, essa capacidade foi aumentando. Ainda me lembro que em 1974, quando eu trabalhei o primeiro ano no Rio de Janeiro, eu fui fazer um curso no Rio de Janeiro – até interessante, foi fazer um cursos no Rio de Janeiro de DQ-12, esse equipamento de 12 pessoas. Foi o Clélio Simeone, que hoje é advogado – ele mexe com câmbio de dólar aqui em Uberlândia, é advogado e piloto de avião, foi criado dentro da CTBC desde pequenininho, não trabalha mais no grupo –, e o Fuyo Matoba, que foi o engenheiro que foi gerente da CTBC de Ituiutaba, São Joaquim da Barra e Pará de Minas, que também hoje aposentou, e foram fazer esse curso de DQ-12 no Rio de Janeiro. E fomos o Neilton fazer o curso de equipamentos ERE-300/24, equipamento de rádio-enlace, 300 megahertz, 24 canais. Ou seja, então nessa época já tinha os equipamentos de 24 canais...
P/1 – Você está falando de que ano?
R – Isso foi em 1974. Aí... quando você falou até do meu primeiro ano na coisa, isso está muito ligado ao meu primeiro ano. Esse curso eu fui fazer no Rio de Janeiro porque quando eu trabalhava no Departamento de Transmissão, aconteceu um fato curioso: a CTBC tinha comprado uma rota de rádio ERE 300/24, de Uberlândia e Patos de Minas, onde existiam cinco repetidores, era Uberlândia, Indianópolis, Pedrinópolis, Nova Ponte, Patrocínio e Patos de Minas. Então a Standard Electric veio montar esse equipamento de rádio aqui em Uberlândia e eu lembro que eram dois engenheiros da Standard Electric. Foi o primeiro fato que aconteceu comigo na minha vida na CTBC que marcou muito, um dos motivos da minha mudança para Itumbiara. O fabricante não conseguia instalar esse rádio, colocar esse rádio para funcionar, porque o trecho daqui para Patos de Minas é meio condenado à propagação técnica. E nós tínhamos um técnico nosso chamado Daison Pimenta, que na área de transmissão ele era um semideus. Ele conseguia fazer milagre e botar as coisas para funcionar e ele que botou essa rádio para funcionar e manteve ela durante quase toda a vida dela. Ele que cuidava dos equipamentos particulares de telefonia do doutor Luiz. Ele era a carta da manga dos jogos técnicos do doutor Luiz. O Daison resolvia esses problemas todos.
P/1 – Ele é vivo ainda?
R – É vivo, trabalha aí e tem um tanto de história engraçada para contar da vida dele que você ri. Então eu fui designado para trabalhar com ele na rota de Patos de Minas-Uberlândia.
P/1 – O que quer dizer “trecho condenado”?
R – É o seguinte: quando você vai fazer uma transmissão de rádio, quando você está andando de carro na rodovia, quando você pega uma zona baixa, o que acontece no rádio FM seu? Some. Então cada tipo de rádio tem um estado bom, ótimo de propagação. Então daqui para Patos de Minas o perfil do terreno, para aquele tipo de frequência, era muito irregular. E o fabricante não conseguia botar aquele rádio... Os recursos técnicos para você fazer um teste de propagação eram ruins, não tinha muito. Então era na base da tentativa. Eu lembro que o Daison Pimenta soltava foguete lá para o lado de Indianópolis para o sujeito descobrir mais ou menos a direção onde ele estava. Então ele mandou eu subir numa torre, e eu era engenheiro recém-formado e eu não tinha experiência. E eu subi mais ou menos uns vinte metros nessa torre sem olhar para baixo. Quando eu olhei para baixo eu travei nas quatro rodas. Eu abracei na torre assim: “Ninguém me tira daqui”. E eu não subia, não descia e ninguém me tirava lá de cima e eu com um medão danado e os dois lá embaixo da torre. Tiveram que subir com cinta e me descer. Quando eu olhei para baixo, aí que eu descobri que eu tinha medo de altura. Mas foi terrível! Essa foi uma das razões que eu quis, depois, ir para Itumbiara, porque eu não dava para altura. Mas então quando surgiram os equipamentos de rádio essa capacidade de transmissão simultânea foi aumentando. Já existia a transmissão de 24 canais, 60 canais, 120 canais, até que depois que eu fui para Itumbiara, vieram aqui para Uberlândia uns engenheiros da Philips, até um deles se formou comigo em Santa Rita de Sapucaí, o engenheiro Domingos, e montou uma rota de equipamento MO-700: MO é microondas; 700, que é para 960 canais, ou seja, 960 pessoas conversando simultaneamente. Então a coisa foi evoluindo na área de rádio. Então essa pergunta que você fez: “Como havia interligação entre duas localidades?”. Era através de rotas de rádio. Então evoluiu desses equipamentos carrier, os equipamentos carrier tiveram três modelos na CTBC que foram o K-32, o ZAF, o SE-32 e o DQ-12. Todos eles eram de baixa capacidade. O maior é de 12 capacidades. Isso na linha de transmissão. Naquela época, em 1969, quando eu fui fazer um estágio na Companhia Estadual de Telefones da Guanabara (CETEL), era um general do Exército que era o gerente da empresa, chamava general Dulcelino, um militar que tomava conta.
P/1 – É uma área de segurança!
R – É área de segurança. Eu fui fazer um estágio na CETEL do Rio de Janeiro pela escola. Naquela época já existia PCM, que é uma tecnologia que está hoje em vigor aqui. Naquela época já tinha instrumento de PCM vindo da Holanda, parece, que funcionava no estado do Rio de Janeiro.
P/1 – PCM quer dizer o que?
R – Pulse Code Modulation, sistema de transmissão digital até para 32 canais. Então para aquela época já existia o PCM, eu pude ver o PCM funcionando lá no Rio de Janeiro. Então, na área de comutação aí veio a segunda geração de equipamentos da linha Ericsson. Acabou a AGF aí entrou os que existem até hoje, são os chamados equipamentos ARF-102-MFC. ARF é uma linha de equipamentos da Ericsson. O 102 é porque existia o 101. O 101 eram equipamentos que o protocolo deles não era MFC – era DC, era de corrente contínua. Aí depois é que surgiu o equipamento ARF-102-MFC. MFC quer dizer multi-frequência-compelida, ou seja, eu ponho uma informação na linha e fico mandando. Enquanto você não me mandar uma informação confirmando que recebeu, eu não paro de mandar aquela que eu estava enviando. Isso é o compelido. E existe o propelido. O propelido é o que põe a frequência na frente: deixo um determinado tempo e aí em seguida eu ponho o troço, eu não fico esperando retorno. É por isso que o equipamento chama equipamento ARF/MFC, multi-frequência-compelida. Então isso é o protocolo dele, as duas centrais conversam entre si. Você já viu quando estava conversando no telefone analógico, não nesses telefones já teclados de hoje, de vez em quando tinha um canal que estava com defeito assim de cruzamento, você escutava: “(imita o barulho)”. Aquela era a troca de protocolo MFC, entendeu? Era um canal que estava dando cruzamento, o camarada estava completando uma chamada, você estava falando e você escutava.
P/1 – Ou quando a ligação às vezes não completava e a gente batia no gancho assim e chamava...
R – Porque o negócio é o seguinte, o fato de você bater o dedo no gancho você conseguia antigamente discar só batendo o dedo. É porque os telefones antigamente à disco... O disco nada mais é do que interruptores de loop, interruptores de linha. Então, vamos supor, você disca zero ele abre onze vezes, você disca um ele abre uma vez, dois duas vezes, três, três vezes... O dez é onze vezes, entendeu? Então é abertura de loop, só que tem que ter uma sequência, um intervalo inter-digital de pulso muito preciso do dedo, que você consegue discar. Por exemplo, quem sabe código Morse não conseguiria discar. Mas então o equipamento MFC, o ARF-102, ele começou... as primeiras centrais telefônicas que foram implantadas na CTBC, ARF, foi implantado na cidade de Patos de Minas, que foi uma das primeiras cidades a fazer parte da expansão da CTBC. Foi Patos, Franca, Uberaba e daquelas da Alta Mogiana eu não sei de cor, pela sequência eu não sei. Mas são as centrais mais antigas da CTBC que funcionam até hoje.
P/1 – Do ponto de vista do serviço foi um salto o que até então...
R – Ah, bom. Aí, o que aconteceu? A central AGF com ARF elas se tornavam mais ágeis e menos defeito, a instalação já era mais rápida. Antigamente, para instalar 500 linhas levava seis meses. A central ARF já foi ficando mais compacta, a central telefônica já foi permitindo uma série mais de recursos. Até então não existia o sistema nacional de telecomunicações, então as centrais da AGF, para você completar um serviço interurbano, você dependia exclusivamente da telefonista da mesa do 101. Você fazia ligação com espera porque os circuitos interurbanos eram pequenos. Você pedia para ela completar uma chamada e a telefonista pedia duas, três horas de espera. Pedia chamada com aprazamento, você marcava hora para você chamar e ela chamava lá na sua casa, chamava com aprazamento, porque não tinha tempo. Eu lembro que no eixo Rio-São Paulo tinha uma chamada que demorava três dias para você fazer uma chamada. Então a AGF naquela época era tudo manual. Quando entrou o equipamento ARF foi porque a Embratel... Porque na evolução das telecomunicações as concessões eram municipais, eram administradas pelas prefeituras... Aí, quando criaram o sistema Telebrás em 1969, à medida que as concessões municipais iam encerrando, elas iam sendo passadas para a responsabilidade do Governo Federal, lá do Ministério das Comunicações. Então foi quando criaram a Embratel. A Embratel era aquela empresa que tinha a responsabilidade de fazer a conexão de longa distância de todas as operadoras do país. Então os equipamentos ARF foram, vamos dizer assim, essa tecnologia, esse setor, esse passo, esse tempo da tecnologia foi o que permitia você fazer conexão dessas localidades no sistema nacional. E em seguida veio a discagem direta à distância, o DDD. Por exemplo: aquela cidade vai entrar com DDD sainte a partir de tanto. E só tinha o DDD sainte, não tinha o entrante – o entrante ainda era manual. O sainte entrava, eu lembro, nós tínhamos uma lista da Embratel com as cidades com DDD sainte, tinha aquela lista de cidades, né? Então à medida que as cidades iam se automatizando, as cidades iam entrando no DDD. Primeiro entrava no DDI. Tinha casos de cidades que entravam no DDD mas não tinha DDI ainda, o DDI ainda era utopia. Aí entrava a cidade no DDD. A Embratel se encarregava de fazer a conexão à longa distância e nós fomos ativando as centrais ARF à medida que ia entrando na rede de DDD. Primeiro entrava o DDD sainte, depois entrava o DDD entrante e mais tarde a cidade entrava no DDI. Então quando a pessoa fazia uma chamada internacional era uma coisa de louco! Era igual hoje você falar essas coisas modernas aí que não tem nem jeito de explicar, né? Então falar DDD era um sonho, o prefeito se sentia o Deus para poder falar, ele queria falar com a autoridade mais importante do país...
P/1 – Mas depois de tanto tempo de espera...
R – Então, o que acontece? A central AGF não permitia isso, essa geração. Ela veio a permitir depois. Eu lembro que houve uma fase da história técnica da CTBC em que teve uma pessoa, um técnico da TeleGoiás um produto chamado Abidi – por que chama Abidi eu não sei –, que era um identificador de número de A, ou seja, a central AGF não conseguia mandar para a frente o número do assinante que discou a chamada para que ela pudesse ser bilhetada num sistema nacional, para haver o acerto mútuo de troca telefônico. Então ele inventou um equipamento chamado Abidi, depois um técnico nosso chamado Jaime de Oliveira Araújo veio e adaptou nas centrais AGF da CTBC e que permitiu às centrais AGF, através de uma carona via central ORF, fazer chamada para o sistema nacional mandando a identidade do número de A. Foi essa invenção que permitiu que a central AGF-234 de Uberlândia, a central 262 de Ituiutaba pudessem ficar na planta até a data deste ano, quer dizer, olha quanto tempo a central pôde operar! Mas até então elas não permitiam, quer dizer, foi uma coisa inventada na TeleGoiás e repassada para nós e que permitiu manter essa continuidade do equipamento AGF na planta.
P/1 – Número de A é número de assinante?
R – É número de assinante que chama. É a identidade para poder bilhetar a chamada. Então o equipamento ARF ou o chamado também crossbar. Por quê? Porque os registradores dela são barras cruzadas. É equipamento eletromecânico com registradores de barras cruzadas que permitiu então você implantar as localidades do sistema nacional de telecomunicações através da rede DDD e DDI. Eles existem até hoje. Aí foi se implantando isso no país inteiro a ponto do país inteiro passar a ter DDD. Aquelas centrais obsoletas foram sendo substituídas.
P/1 – Centrais grandes, mastodontes?
R – Grandes, exatamente. Então as ARF cobriam a linha de equipamentos que iam na faixa de 800 terminais até 10 mil linhas, mas ainda ficava uma lacuna. O Brasil tem em torno de 10 mil municípios mais ou menos, né?
P/1 – 5500 municípios.
R – É, eu lembro uma coisa assim.
P/1 – Um monte de localidades.
R – Então o que acontece? Os municípios brasileiros são pequenininhos. Tem muito município pequenininho.
P/1 – A esmagadora maioria.
R – A esmagadora maioria. Então o Brasil sempre ficou carente de uma linha de equipamentos de pequena capacidade que pudesse ter acesso à rede nacional. Os que existiam naquela época eram equipamentos PAX. Existe PAX, PBX e PABX. O PBX é manual, tudo através de telefonista. O PAX que é particular automatic exchange, que é comunicação automática interna mas ele não é conectável à rede pública. E existe o PABX, que é conexão de ramais automáticos particulares, mas que pode ser ligado à rede pública mediante você discar o zero. Então existia uma linha de equipamentos desse que nós adaptamos ela para se funcionar como central pública. São os chamados AKD-1860 que funcionaram muito tempo na planta da CTBC, foi um dos equipamentos que foi objeto daquele trabalho que ganhou prêmio de 1993, mas eles podiam chegar teoricamente até 600 terminais. E lá na cidade de Pará de Minas eu consegui montar um para funcionar com 600 terminais – eu e a equipe que ganhou prêmio conseguimos botar ele para funcionar com 600 terminais, né? Mas eram uns equipamentos que não permitiam fazer bilhetagem automática. Então, dentro daquela lei da multimedição interurbana eles não podiam continuar na planta. Então existia uma lacuna, uma carência no país para localidades com menos de mil terminais. Por volta de 1974, por aí, a Siemens lançou a linha de equipamentos crosspoint. A Siemens tinha um equipamento B-64 e ela passou do elevação e giro, que era B-64, pulou a fase do eletromecânico e foi direto para o eletroeletrônico. Ou seja, a Ericsson não, a Ericsson não queimou etapa nenhuma. Ela começou com o rotativo, que era o AGF, saiu do AGF e entrou no crossbar eletromecânico, saiu do crossbar eletromecânico e entrou na linha de equipamentos com processamento armazenado que eu vou falar depois. Porém a Ericsson saiu do manual, que é aquela mesa de pega, passou pelo equipamento rotativo, que é a central passo a passo (que é o AGF) e entrou no equipamento eletromecânico, que é o ARF e aí entrou para as centrais por processamento armazenado. Isso é o passo da Ericsson. A Siemens começou com equipamento de elevação e giro que são as chamadas centrais B-64, pulou a etapa do eletromecânico, ela não teve eletromecânico, já entrou direto no eletro-eletrônico, que é um passo na frente do eletromecânico. Ela criou a linha dos equipamentos chamados crosspoint, que são os equipamentos da série SK. SK são uns módulos pequenininhos assim, que tem uns micro-relé desse tamanhinho. Imagina uma matriz de entrada e saída onde os pontos de conexão são pontos, um relé que opera e fecha um micro contato, um micro-contatinho muito sensível à poeira. Por ser pequenininho até poeira pode isolar ele. Então a Siemens lançou essa linha de equipamento onde ela dividiu equipamento de alta capacidade e de baixa capacidade.
P/1 – Passou a abrir possibilidade de atender essas demandas menores.
R – Menores. Então dentro da linha dos equipamentos de demanda pequena, a primeira central da Siemens que surgiu do crosspoint foi a chamada central CP-24, Cross Point 24. Na verdade, as primeiras centrais CP-24 eram importadas da Alemanha. Aí implantou as primeiras. A CP-24 teve seu tempo, inclusive nós temos hoje centrais dessas funcionando em seis cidades da CTBC. Nós temos em Altinópolis, Brodósqui, Miguelópolis, Cajuru, Guará e Pitangui. Nós temos essas seis centrais ainda. Aí essa central podia começar por exemplo com 400 terminais e, de 200 em 200 terminais, ela poderia chegar em até três mil linhas. Aí implantou essas centrais, mas como elas eram importadas resolveram desenvolver uma central telefônica nacional. Aí inventaram a central CPR. A Siemens começou desenvolvendo a central CPR e CPR-15, uma central em que a modularidade delas é de 50 em 50 terminais, podendo começar com 50 e ela chegaria até 150 terminais. Aí criaram a CPR-15 e mudaram o nome dela para CPR Expandida 15, que passou a chamar CPRE-30, que podia chegar a até 300 terminais. Aí criaram uma outra linha de central que era a CPR Básica 30 e se você expandia ela, ela mudava de nome e chamava CPR-60, que ela podia chegar até 600 terminais. E nós temos umas 15 dessas ainda implantadas na planta da CTBC. Aí a Ericsson veio e criou uma central de pequeno porte já atrasada chamada ORF-P1. É a ORF-102, MFC grandona, mais compacta para atender localidade de menor quantidade. Criou ORF-P1. Aí a Siemens foi obrigada a lançar a central CPR-100, que é uma central que vai com modularidade de 200 terminais até quatro mil linhas, mais ou menos.
P/1 – Um espectro grande de demanda de mercado.
R – É, exato. E hoje está pronta na CTBC, nós temos ainda diversas delas implantadas na CTBC, como em Buriti Alegre, Itapagipe, Planura, Lagoa Formosa etc.
P/1 – E são equipamentos que não têm nenhuma incompatibilidade entre si...
R – Não, falam com qualquer tipo de equipamento.
P/1 – Nós estamos falando ainda em equipamentos analógicos?
R – Estou falando só de analógico por enquanto. Aí, o que aconteceu? Lançou então essa linha para atender essa gama de produtos desses cinco mil municípios brasileiros aí, que permitia que a cidade pequena entrasse na rede de DDD e DDI. E da linha de equipamentos de grande porte a Siemens lançou três modelos de central SK. Ela lançou a central SK com comando 402 que ia até seis mil linhas, lançou a central SK com modelo 501 que podia ir até 20 mil e poucas linhas, e lançou o modelo 801, que vendeu muito pouco no Brasil, que podia ir até 80 mil linhas. Uma central desta, a primeira que foi instalada desse tamanho, a maior do Brasil, foi instalada lá na Central Jesuíno, em Curitiba, uma central que ficou famosa no Brasil quando um caminhão explodiu com dinamite perto do prédio. Estremeceu o prédio no centro de Curitiba. E foi instalado em Recife e em algumas capitais do nordeste. Mas da CTBC não instalou não. É essa que tem funcionando aqui hoje, a central de prefixo 232. Hoje essa central na CTBC nós temos uma em Pará de Minas com 5400 terminais, temos essa central de prefixo 232 que está instalada com 11 mil linhas, temos instalada uma em Itumbiara com cinco mil linhas e uma em Jardinópolis com três mil linhas.
P/1 – E são as de maior porte?
R – Das analógicas sim, ela podia chegar até dez mil linhas. A maior de todas que chegou aqui na CTBC foi a 232, que tem 11 mil linhas. Bom, até esse ponto aí morreu a fase tecnológica das analógicas. Aí quando foi, eu acho, por volta de 1980 e poucos, quase chegando a 90, eu não lembro direito, montaram a primeira central CPA da CTBC. Aí foi montada a central 236 de Uberlândia, que é essa que está funcionando hoje, só que essa central 236 de Uberlândia, que é uma central de processamento armazenado central, parte comum dela, os órgãos comuns dela são digital, mas o estágio de assinante, a parte que tem conexão com o assinante ainda era analógica. São os chamados relé-reed, os relézinhos que são usados em alarme contra ladrão: é uma ampola fininha que você põe um imã perto dele aí cola. Já foi uma evolução violenta, porque quando você entra numa central analógica o barulhão que tem dentro da central é violento, muito violento. Nossa, você entra numa central analógica e numa digital e vê a diferença. Uma central B-64, para você ter uma noção, tinham pessoas que chegavam a querer recorrer na hora de aposentar por insalubridade pelo fato de dar quase 90 decibéis de barulho, então era ensurdecedor. Você imagina uma metralhadora... parecia uma metralhadora. Depois eu posso fazer um adendo de uma experiência que eu tive em Itumbiara à respeito de centrais AGF e da minha vida durante um ano e meio morando dentro da telefônica. Os meus filhos foram criados no colo das telefonistas de Itumbiara um ano.
P/1 – Bom, essas centrais mistas já foram um avanço frente àquelas analógicas puras.
R – Só que essa central CPA aí, na verdade, eu consideraria ela digital porque ela não fica nada a desejar não. Só quem sabe que fisicamente ela ainda faz barulho, ela tem um micro-relé. Tanto é que elas estão sendo retiradas da CTBC, o estágio analógico dela, novembro de 1999. Tem gente da Ericsson lá montando os novos bastidores. O grau de compactação chega a ser alguma coisa da ordem de quase 70%. E tem um sistema que eu não sei tecnicamente explicar como eles estão fazendo. Vai montar daqui, vão ativar. Aí vai pegar os bastidores grandões, analógicos, vão retirar fora, de tal maneira que esse aqui vai chegar no lugar. Uma coisa mais ou menos assim. Então ela vai ficar 100% digital. Então essa foi a primeira central telefônica, que ela foi montada eu acho que no segundo quinquênio, 1985 a 1990. Aí a central AXE, que hoje tem 10240 terminais. Aí foi implantando as outras centrais telefônicas, só que as outras já foram totalmente digitais, ou seja, o estágio de assinante não era analógico, era digital. Naquela época existia o predomínio das centrais Ericsson na planta da CTBC, das centrais CPA Ericsson. E quando foi mais ou menos nesse segundo quinquênio, eu acho que na década de 1990, que começaram a entrar as primeiras centrais da Siemens, CPA. Aí entrou as chamadas centrais EWSD, que são as chamadas centrais CPA da Siemens. Hoje a proporção dos terminais telefônicos entre Ericsson e Siemens na CTBC deve dar alguma coisa assim da ordem de 65% Ericsson e 35% Siemens. Então entraram as centrais EWSD, que são as centrais CPA da Siemens que são o que tem hoje de tecnologia de ponta no mundo. Ou seja, a central é EWSD, versão 12. Então todas as centrais que estão implantadas na planta CTBC, da Siemens, as de grande porte são EWSD versão 12, é o que existe de última versão no mundo de central CPA.
P/1 – E proporcionalmente é uma central de grande porte dessa analógica numa redução de 70%?
R – Olha o tamanho dela. Para você ter uma noção, essa central 236, que é a primeira central AXE que implantou na CTBC e que é modelo AXE, que é CPA da Ericsson, segunda informação que eu tenho, é a segunda maior central do Brasil. Ela vai estar com 109 mil terminais telefônicos. É a segunda maior central telefônica do Brasil. E nós temos a maior central EWSD da CTBC. As EWSD devem ter um máximo de 15 mil linhas, 16 mil linhas. Mas elas permitem chegar a esse valor também, mas nós temos central aí de mais e menos importância na hierarquia, na topologia da CTBC. A central quando o estágio de assinante dela é analógico a gente chama de CPA-E, central de processamento armazenado e espacial. Por que é espacial? Porque o relé, para fechar tem que ocupar espaço. E já digital não, temporal, é por divisão de tempo, é equipamento eletrônico – você não tem ocupação no espaço, você não tem ocupação no tempo. Por isso que ela chama de temporal. Então a evolução vem (vamos falar da linha da Ericsson): mesa manual; centrais passo a passo, que é o AGF; centrais eletromecânicas, que é ORF; central CPA-E espacial, que foi a primeira implantada e CEPEL CPA-P, que são as atuais totalmente digitais. Essa foi a evolução, esses foram os quatro passos. E a Siemens a única diferença é que ela queimou um espaço. A Siemens também tinha mesa semi-automática, mesa manual, só que ela queimou um passo, o passo da eletromecânica ela não teve. Em compensação a Ericsson também não teve o eletro-eletrônico. Todas as duas queimaram um passo. O eletro-eletrônico foi queimado na Ericsson e o eletromecânico foi queimado na Siemens.
P/1 – Eu queria um testemunho seu, antes de voltar à nossa história de Itumbiara, que diz respeito ao seguinte, o senhor sempre esteve lá na linha de frente montando, botando as centrais para funcionar...
R – Não em termos de botar a mão na massa, assim, mas eu era aquele camarada... vamos supor, se vocês me mandarem atrás de um bastidor e descobrir um defeito, apertar um parafuso, eu sou um desastre, eu não sei. Mas, por exemplo, se nós começarmos a conversar do sistema telefônico, sistemicamente eu sei o que se passa.
P/1 – Quando esses novos equipamentos entravam em operação, de que modo o senhor sentia a reação das pessoas que utilizavam desse serviço?
R – Essa foto aqui foi tirada em 1978, no ano que foi inaugurada a central telefônica de Itumbiara. Essa foto aqui, para você ter uma noção da importância dela, esse camarada aqui é o presidente da Associação Comercial de Itumbiara, o Moisés; esse é um empresário atuante do grupo Maeda, que morreu num acidente de avião no Paraná, chama Celso Maeda, ele tinha umas 23 fazendas de algodão. Eles estavam aqui presentes. Esse aqui é outro político da região, eu não lembro mais, é vereador... esses aqui estavam exatamente no dia da inauguração. Aqui a Companhia Telefônica de Itumbiara, na época que foi inaugurada. Ela não é mais assim não, já foi modernizado o prédio. Então inclusive tem histórias curiosas a respeito desse local. Esse lugar aqui, eu quase morri nesse lugar aqui. Numa enchente que entrou lá uma barra de madeira... aqui tinha um fórum. E a barra de madeira foi na minha direção, eu estava com um saco de areia nas costas para não deixar água na telefônica e um colega meu estava para o lado de dentro da grade. Ali ainda tem grade lá. Quando a barra de madeira veio para bater nas minhas costas ele gritou. quando ele gritou eu joguei o saco de areia por cima da grade e pulei. O toco pegou onde eu estava. Se pegasse nas minhas costas me matava. Aqui nesse canto aqui eu rodei numa enchente e agarrei num poste no dia da enchente. Aí a imprensa de Goiânia telefonando, querendo informação que a cidade estava isolada, e jornal e televisão querendo informação e a telefônica entrando na água e o pessoal arrancando água de dentro da telefônica com motor de Volkswagen, desse prédio aqui. Mas você vê a importância de ativação do DDD. Isso foi um marco aqui, o meu escritório era aqui atrás. Esse aqui é um deputado. Esse deputado estava fazendo uma ligação, eu não lembro se era para o governador do Estado, no dia da inauguração.
P/1 – Que ano nós estamos falando?
R – Isso aqui nós estamos falando de 1978. E eu estava tão nervoso que se você olhar aqui, olha aqui a minha camisa. Até suado! Esse aqui é presidente da Associação Comercial, esse aqui é presidente do CDL não sei o que lá de Itumbiara, né? Então naquela época a grande novidade eram os KS, tá vendo?
P/1 – Isso é usado até hoje? Até hoje você encontra por aí?
R – Ainda encontra alguns ainda, ainda existe isso aí ainda. Aqui tinha um fórum, a enchente acabou demolindo esse trem aqui. Essa aqui foi uma foto que eu tirei num almoxarifado da Siemens em Curitiba, quando eu fui fazer o curso. Morei seis meses em Curitiba fazendo curso, tive que mandar minha mulher para a casa da mãe dela e eu fiquei fazendo curso em Curitiba seis meses. E aqui nós temos três engenheiros da CTBC que trabalham, estão aqui até hoje na CTBC: o Zenon, eu - novinho, bonito aqui - e o João Roberto, que hoje tem uma empresa de telecomunicações aqui em Uberlândia e que trabalhava comigo. O resto é só conhecido do pessoal do sistema Telebrás.
P/1 – Sobre essas fotos o senhor vai falar com o Luziano numa hora que ele for pegar esse material para que a gente digitalize. O que eu gostaria...
R – Da alegria das pessoas.
P/1 – É, de retomar um pouco isso. Isso significava muito para o cotidiano das pessoas, uma mudança de qualidade no cotidiano das pessoas.
R – É tão importante a alegria das pessoas que tinham... Eu vou citar um exemplo e isso é um fato, eu não sei se ainda tem lá hoje. A cidade de Buriti Alegre não tinha central telefônica. E quando eu era gerente de Itumbiara eu fui implantar uma central telefônica na cidade de Buriti Alegre, Goiás. O prefeito ficou tão satisfeito que no dia da inauguração... tem uma placa de bronze no centro do jardim de Buriti Alegre, hoje não deve existir mais, nem sei. Tem lá: “Nesse dia tal foi inaugurado o sistema telefônico de Buriti Alegre com a presença do doutor João Batista Coura”. (risos) Está lá. Em Buriti Alegre tem isso. Para você ver, para o cara botar uma placa de bronze no centro da praça... Não era em frente à telefônica não, era no centro da praça. Com jantar, com Rotary, Lions, tudo... Isso é muito importante. O outro fato foi exatamente a necessidade que o povo tinha de telefone, foi o caso que aconteceu de Almerindonópolis, que 20 anos depois o abaixo-assinado ainda existia, demorou quase 20 anos para sair o sistema telefônico de lá. Deixa eu ver outro fato interessante. Ah, lembrei de um caso. Nós fomos implantar uma central telefônica na cidade de Iguatama, e estávamos eu, o engenheiro Carlos Alberto Batista, engenheiro civil e tinha mais umas outras pessoas comigo. Eram seis pessoas da CTBC e nós fomos na cidade de Iguatama para poder testar a central telefônica de Iguatama. Nós fomos lá ver a central telefônica de Iguatama e fomos testar a central telefônica. E nós estamos trabalhando dentro da telefônica e de repente entrou na porta da CTBC dois garçons. Os garçons com prato de salgadinho entraram e foram botando lá na cozinha. Eu falei: “Gente, será que vai ter festa aqui hoje?” Estranhamos aquilo, né? Daí a pouquinho chegaram o prefeito, os vereadores, tudo... e nós lá dentro da telefônica. Aí que nós viemos a descobrir que eles estavam fazendo aquela festa para nós que estávamos lá, engenheiros da CTBC. E estavam vindo com cerveja, uísque, vinho... E foram colocando dentro da telefônica. Aí o prefeito serviu um coquetel para gente dentro da telefônica. Depois que acabou o coquetel ele pegou todos os engenheiros e levou para o restaurante de Iguatama e fomos almoçar. Ou seja, era a alegria que ele tinha do fato de estar inaugurando uma central CPE na cidade de Iguatama e que ainda funciona até hoje. Essa central lá de Iguatama hoje está com 800 telefones. Na época ela começou com menos, devia ser uns 300, 400... Quando ela estava entrando com DDD. Era uma mudança muito significativa. Eu diria o seguinte, porque normalmente você tem ano eleitoral. Então os candidatos a prefeito pegavam muita carona ou então caíam muito em cima da gente. Isso é rotina. Todo ano que tem ano eleitoral eles caem matando em cima. O serviço telefônico e de infra-estrutura, ou seja, escola, segurança, telecomunicações, asfalto, isso é muito importante para você ganhar uma eleição. Então eles ficavam muito em cima. Então, o que acontece? Nessas épocas eles pegavam carona nessas coisas para fazer propaganda em cima. Às vezes a gente via até certas propagandas que eram absurdas, que não tinha nada a ver o prefeito com aquela história.
P/1 – Dizendo que ele tinha implantado e tal.
R – É. E tem situações engraçadas. Por exemplo, tem determinadas regiões que são esquecidas em termos políticos. Não tem político naquela região de jeito nenhum. Para você ter um exemplo, na região de Iturama. Na região de Iturama quando tem campanha eleitoral lá o povo não vota no candidato de Minas não, eles ficam sabendo propaganda de São Paulo, porque lá não tinha emissora de televisão, o povo só conhecia os candidatos de São Paulo, então tem determinadas cidades que o padre da cidade é que resolve as questões da cidade. Tem lugar que o prefeito não apita nada, mas o padre é o barra pesada. Na cidade de Rio Paranaíba tem um padre lá que eu vou contar para você, pode juntar dez prefeitos perto dele que não fazem o que o padre faz. E tem cidade que o prefeito nem sabe que existe telefone. Quer dizer, é um esquecimento total. E tem cidade que tem um poder político violento, onde o camarada fala e é a voz de Deus que está falando. Quando aquele camarada reclamava do telefone dele ele punha todo mundo para correr. Ele tinha um poder de argumentação tão forte... e ele era igual uma tromba d’água, assim. Onde ele passava ele ia carregando tudo, quer dizer, tinha de resolver os problemas dele. Papagaio tinha um comércio de ardósia violento. Então existe uma série de situações em que a pessoa é pró-ativa para o desenvolvimento da sua cidade. Tem lugares que a pessoa precisa ser pró-ativa no desenvolvimento da cidade, tem as incumbências da sua função e não fazem; e tem umas que são pessoas que não têm nada a ver com a situação e carregam toda uma cidade nas costas. O exemplo típico que nós tivemos... e esse não podia ser diferente, o caso do governador de Minas lá de Pitangui, por exemplo, Brumado. Lá, por causa do Newton Cardoso, a cidade sempre não levava, né? Mas nós tivemos o caso desse deputado de Campina Verde, desse padre em rio Paranaíba... Então, vamos dizer assim, é muito importante. Agora, importante é a alegria das pessoas. De vez em quando, quando eu ia ativar uma central telefônica de uma cidade, eu discava para uma determinada pessoa para saber a satisfação dela com o sistema telefônico. As pessoas ficavam alegres, tinham pessoas que se emocionavam em falar que podiam falar: “Pô, hoje conversei com a minha filha no lugar tal!”. Mas o fato mais notório que eu pude observar é que toda cidade em que o sistema de telecomunicações entra, muda para melhor o progresso da cidade e muda inclusive o comportamento das pessoas. Isso eu falo mais da experiência da minha Delfim Moreira, da minha Marmelópolis, mas isso pode ser constatado também aqui, na região.
P/1 – Vamos detalhar um pouco melhor isso.
R – Quando começou a implantar a telefonia rural na CTBC, eu lembro que eu tive a oportunidade de participar de um Seminário Internacional de Telefonia Rural, que foi realizado em Goiânia, onde o Ciro Henrique, que hoje é assessor de receita aqui da CTBC, fez uma palestra e nós fomos, eu, o Ciro Henrique e o Makoto Tanimoto, nós participamos desse Seminário Internacional, onde o Brasil tinha 1% somente das propriedades rurais atendidas por telefone rural. A meta do governo era chegar a dois porcento, parece. Dois ou três porcento. E o Estado mais bem atendido em telefonia rural do país era o Estado do Paraná. Porque o Estado do Paraná tem um sistema de cooperativismo muito grande e a Telepar sempre foi uma empresa que primou pela qualidade do sistema telefônico. Nós tínhamos em torno de acho que quase dois mil telefones rurais na CTBC, mas os primeiros começaram nessa época, em 1978. Esse ano de 1978 foi um ano muito marcante, 1978 a 1980, que eu ainda estava em Itumbiara fazendo as longínquas de Itumbiara. Eu lembro do seu Shimohira, eu lembro do Flausino, do seu Elias Mamere, onde foram instalar telefones rurais nas fazendas dele. Quando chegava no dia da inauguração da telefonia rural, ele convidava o povo da região, porque os telefones rurais dele não só serviam para ele mas para a comunidade da região. E eles davam aqueles churrascos e matavam um boi e faziam churrasco para a gente exatamente para comemorar o dia da ativação do sistema de telefonia celular, que era tão longe! Quer dizer, pessoas que moravam há 80, 100 quilômetros... 80 quilômetros, como era o caso do seu Elias Mamere, que tinha lá em Lancelândia, longe de Itumbiara, um lugar sem recurso, tinha que ligar um telefone rural lá. Então isso era muito importante. E houve também um projeto da CTBC com o DAEE... a CTBC acho que andou implantando uns 80 ou 100 postos de serviço do DAEE em localidades que não tinha sistema telefônico que passaram a gozar desse benefício, que não dava para você mensurar. Porque quando você era gerente de operação, gerente regional, você tem mais contato com o público, você está mais na ponta. Depois que você é recolhido para o escritório, você não consegue participar dessa alegria, porque a empresa cresceu muito, você não consegue mais presenciar a alegria das pessoas. O que eu acho que ainda é uma lacuna, uma falha que existe na nossa empresa é dessa intimidade. Eu compararia o sistema de telecomunicações como uma obra de caridade: uma coisa é eu ter de posse desse alimento que tá aqui, desse remédio, e ir de encontro com você e te entregar o remédio, te entregar o alimento. Eu te entrego, viro as coisas e vou embora. Isso é pontual. É você de frente para mim, houve o encontro e acabou. A outra coisa é você vir e ficar do lado. Entrego o alimento e participo dos seus problemas. Não que você vá viver do lado do camarada, mas essa intimidade. A CTBC fez isso há pouco tempo atrás através de uma pesquisa, e foi buscar a opinião das pessoas, o que elas pensavam dos nossos problemas. Quer dizer, isso aí na verdade foi uma maneira de você não de ficar tête-à-tête, mas ficar do lado. Então infelizmente isso não existe mais. Por exemplo, antigamente existiam os contratos de manutenção entre o grande assinante do PABX e a CTBC. Quando terceirizou, você vai perdendo o contato com o usuário, você vai perdendo o contato com ele. Então, o transparecer dessa alegria, o transparecer dessa satisfação vai ficando ali. A não ser se você pudesse no ato do evento, buscar depoimento.
P/1 – Eu compreendo a sua posição, mas também a gente vive a realidade de uma outra escala. O desafio passa a ser prestar um serviço de qualidade de modo a gerar um mínimo de reclamação possível.
R – Gerar o mínimo de reclamação, exatamente. Porque o negócio é o seguinte, o Brasil é um país muito fraco de estatística. Eu estou fazendo esse curso de pós-graduação na UFU e estava vendo um professor que é um glossário de dados falando a respeito da Revolução Industrial e ele falando do volume de pesquisa que existe no Estados Unidos – aquelas pesquisas mais idiotas, que você imagina que ninguém poderia imaginar que tivesse, lá tem. Quer dizer, então porque nós também não podemos pecar por essas pesquisas idiotas e criar ponto de controle disso aí? E hoje em dia se você quiser ter a excelência do assinante é saber ouvi-lo. O Dale Carnegie, no livro dele “Como fazer amigos e influenciar pessoas”, fala que você, para ter um bom amigo, basta ser um bom ouvinte. Se isso se aplica à pessoa física, pode aplicar da pessoa jurídica com a física, porque a pessoa física quer ver os seus problemas resolvidos.
P/1 –Como o senhor vê o futuro da CTBC?
R – No ambiente de concorrência se explora pontos fracos do concorrente e a gente tem que buscar os nossos pontos fortes para poder tentar criar o ambiente propício nesse ambiente de concorrência. A CTBC prima pela tradição, prima pela familiaridade, prima pelo pioneirismo, prima pelo conhecimento que é a empresa da terra. Agora, é necessário que essa intenção, que essa postura, que esse sentimento seja de mão dupla. Não adianta eu falar que sou de tradição se o outro lá na ponta não se sente assim. É o valor percebido dessa tradição. Então eu penso assim, que se o pai não dá atenção para o filho, o filho descamba para a droga, descamba para outras coisas. Então eu acho que num ambiente de competição, tem que ser feita uma verificação se essa mão dupla de compreensão, de valor percebido e de tradição realmente existe ou se é um sentimento interesseiro meu, meu como empresa. Então eu entendo que, massificado ou não, é necessário que, seja a área de marketing, seja a área operacional, que se atenda o indivíduo não com palavras e demagogia, mas com qualidade de prestação de serviço para que você possa incrementar esse sentimento de tradição. Porque se você não incrementar esse sentimento de tradição que nós estamos falando, o outro vai e rouba, ou vai lá e prova: “Olha, o fulano tá mentindo para você”. E outra coisa: mentira tem perna curta. Então você tem qualidades em prestação de serviço, faz o que eu digo, não faz o que eu faço, ou seja, qualidade você tem que prestar com ação e não com gogó. Não adianta. Então esse é o sentimento que eu tenho. Se é o ponto forte a nossa tradição, nós temos que incrementar essa mão dupla das vantagens da tradição.
P/1 – Que é um valor intangível difícil de ser constituído.
R – Tem que ser na base da sinceridade e do saber ouvir. Então, na medida em que a empresa cresce, torna-se mais difícil este contato. É necessário que a qualidade talvez tenha que crescer mais ainda, já que a comunicação tête-à-tête, pessoal, não existe. Então você tem que crescer mais na qualidade porque essa comunicação vai se tornando cada vez mais difícil.
P/1 – Mais frequente mas ao mesmo tempo mais distante.
R – Você para compensar a perda da possibilidade de comunicação frente a frente você tem que compensar com o valor percebido de qualidade maior – para manter a veracidade da tradição.
P/1 – E esse é um diferencial que faz da CTBC uma empresa especial?
R – É.
P/1 – Eu gostaria que o senhor lembrasse dessa história da sala das telefonistas lá de Itumbiara.
R – Ah, de Itumbiara. É o seguinte, quando eu fui para Itumbiara, isso foi no mês de setembro de 1975, o Paulo Fernando, que foi inclusive candidato a deputado estadual pelo estado de Goiás, ele era advogado, eu iria ficar no apartamento em que ele morava, que era um apartamento da CTBC, e esse apartamento dele dá de fundo com um colégio estadual. E eu arrumei minha mudança e fui para Itumbiara para morar lá. Quando eu cheguei lá ele não tinha desocupado o apartamento. Eu falei: “E agora? Eu estou com a minha mudança aqui e vim para assumir a gerência e ele não desocupou o apartamento. Como é que eu fico nessa história?” Aí falaram para eu ocupar o apartamento que tinha no fundo da sala de tráfego telefônico da CTBC, que era o cômodo de descanso das telefonistas. Era um apartamento que tinha três quartos. Então eu assumi o apartamento, fiquei para mim com dois quartos e deixei um quarto para continuar como sala de repouso das telefonistas. Então o apartamento era no fundo e, na frente, era a mesa telefônica, onde as telefonistas completam o interurbano. Então eu tinha o Marcos, que tinha três anos de idade, o meu filho mais novo, e a minha filha Cristiane, que tinha nascido em Uberlândia, em setembro. E em junho de 1975 eu fui para lá, então a minha filha estava com cinco, seis meses. Eu fiquei um ano, então ela ficou de cinco meses a um ano e meio de idade... Estava começando a andar, dois anos, eu acho que ela estava começando a andar. Então, que acontece? Eu morava no segundo andar, eu ia trabalhar e a minha mulher ficava lá dentro de casa trabalhando e as crianças ficavam brincando então no apartamento no fundo. E o lugar delas brincarem era a sala de tráfego. Então era muito comum, eu chegava para trabalhar estava a telefonista sentada com as minhas crianças no colo, trabalhando com a pega telefônica e a criança no colo. E ainda chacoalhando os meninos quando estavam chorando, e ela atendendo as crianças. Isso aí foi durante um ano, até que desocupou o apartamento. E a central telefônica AGF era na sala do fundo. A central AGF ela é assim: quando você disca um número, o seletor gira; quando você disca outro número, um braço com uma peça dentada entra lá no corpo para poder fazer a conexão. E essa máquina, por ser eletromecânica, de vez em quando ela agarra; e quando ela agarra, quando está desajustada, ela começa a bater. Imagina uma matraca de Semana Santa!? “Tá, tá, tá, tá, tá, tá...”. Ela fazia um barulhão tão grande que acordava eu e as crianças. Aí eu tinha que levantar e ir lá para desligar a máquina. Então eu estava dormindo de pijama ou de cueca mesmo, eu levantava e ia lá na central telefônica, apertava o botão assim, puxava a máquina, encaixava outra vez e voltava para dormir. Isso aí aconteceu muitas vezes.
P/1 – Então o senhor não mudou para o outro apartamento?
R – Aí, depois de um ano, um ano e pouquinho, aí eu mudei para o apartamento. Aí eu deitei e rolei, né? Mas tem muitas histórias... Nós estamos falando assim, do aspecto tecnológico, só. Existem os lados engraçados aqui na CTBC. Se você for pegar pessoas como o Weber, o Luiz Márcio, o Oswaldo Firmino, o Tadashi, Miushi..., as pessoas mais antigas, o Ismael, Tarcísio de Melo Garcia e uma série de outros aí, tem fatos pitorescos e engraçados de contar que já foram objeto até de exposição numa tela lá na Fazenda Canadá, de fatos históricos e engraçados. O Divino Sebastião, superintendente da Algar, o José César Pereira, a pessoa que toureou o boi numa fazenda, caiu na cabeça do boi, e outros fatos que são folclóricos, fazem parte da vida engraçada da CTBC. Teve um ano que nós nos reunimos ali numa chácara e sentamos em volta de uma mesa e começamos a tomar cerveja e fomos conversando a respeito das coisas. Nós ficamos durante umas três horas contando fatos ocorridos, um após outro das coisas engraçadas que aconteceram com a gente, de acidentes, de coisas engraçadas, de lances ocorridos com o seu Alexandrino, dos medos que as pessoas tinham do seu Alexandrino, dos flagras que ele pegava as pessoas, das visitas dele nas construções, de pedreiro fazendo coisa errada e o seu Alexandrino pegava o erro na obra. Nossa, é muito engraçado! Dava para escrever um livro. Sem brincadeira, dava para escrever um livro.
P/1 – E o futuro? O que em pela frente nessa sua expertise? Temos uma tecnologia digital, estamos no limiar de uma economia digital que vai mudar radicalmente o modo de ser e de agir e de trabalhar das pessoas.
R – Para mim, a vida da CTBC está se dividindo em três momentos. Existiu o momento até Alexandrino Garcia, que foi um momento que partiu-se do nada e veio do pioneirismo e ficou no Alexandrino Garcia. A CTBC sempre primou pelo pioneirismo, ela quis sempre ser original naquilo, ou seja, quando uma coisa não existia no Brasil e precisava implantar, o doutor Luiz e o seu Alexandrino diziam: “Não, vai lá e implanta na CTBC que a gente quer ver”. A primeira fibra ótica no interior do Brasil foi nossa, a primeira central SPX implantada no interior do Brasil foi nossa, a primeira central DRX implantada no interior do Brasil foi nossa... E existem outras coisas que agora eu não estou lembrando no momento que sempre foram nossas. Sempre a parte diferente foi nossa, de produtos novos lançados no mercado foi nossa. Dá para enumerar umas quinze coisas dessas, só lembro dessas no momento. Isso é aí, vamos dizer assim, é a genética do seu Alexandrino que sempre circulou no sangue da CTBC – de ser pioneiro e original nas coisas. Então eu acho que para mim houve um momento Alexandrino Garcia, que foi desde o zero até a sua morte. Depois veio o momento que culminou com a nossa renovação da nossa concessão, onde teve aquele grupo de Brasília por tanto tempo, até o processo da desregulamentação, que veio praticamente culminar com esse ano de 1999. Até então, não querendo menosprezar o esforço do seu Alexandrino, os problemas eram de cunho interno, eram de cunho nacional, era de um ambiente de proteção, de área de mercado fechado, onde, ou bem ou mal, a gente convivia com o governo federal, com a Telebrás, com as empresas do sistema, e os nossos problemas eram quase que única e exclusivamente de ordem técnico-administrativa, possível, facilzinho de ser resolvido. Mas, com a desregulamentação, não foram só as telecomunicações que passaram agora a sofrer de uma periculosidade, vamos dizer assim, mas o país inteiro, com uma política totalmente privatizadora na área da siderurgia, da eletricidade, sistema bancário, química, mineração, provavelmente deve acontecer na área da Petrobrás... E abriu um mundo às maiores empresas de telecomunicação do mundo. Então, o que acontece? Quando nós falamos de um Brasil que nós temos empresas que têm faturamento aí de um bilhão de dólares, são muito poucas. Nós pegamos um Martins, de Uberlândia, que é o maior atacadista da América Latina, tem um bilhão e 200 milhões de dólares de faturamento. Nós temos aí uma CTBC com 350 milhões de dólares de faturamento. Recentemente eu estava assistindo uma palestra do curso de pós-graduação da UFU, dando conta de que nos Estados Unidos, empresas com faturamento acima de um bilhão de dólares tem três, quatro mil empresas. E aqui no Brasil não tem isso, sendo que aqui na cidade de Uberlândia a CTBC – que é considerada por aquelas revistas que fazem o ranking das maiores empresas do Brasil em 23ª e 26ª – com o faturamento de 350 milhões! O Martins que é o maior atacadista da América Latina faturou um bilhão de dólares. Imagina nos Estados Unidos com três mil empresas com mais de um bilhão de dólares de faturamento! Então, o que acontece? Nós passamos a estar nadando perto de tubarão, de baleias, né? Coisas grandes! Então, do mesmo tamanho e da proporção dos concorrentes são os nossos perigos, são os nossos inimigos, são os guerreiros que nós temos que enfrentar. Hoje estamos numa batalha. Antigamente se lavava roupa interna, dentro de casa, e agora a briga é maior. Se a briga é maior, o público é o mesmo. Se o público é o mesmo, ganha o público aquele que melhor atender.
P/1 – Esse é o pulo do gato?
R – Exatamente. Aquele que melhor atender, atender de maneira mais econômica, mais barata, mais rápida e com maior qualidade. E que foi mais vivo, porque, infelizmente, no campo da concorrência não existe muita ética. E nós já tivemos experiência disso aí até em pedido de desculpa via televisão, né? Então quando você está numa guerra você não vai falar: “Com licença, eu vou te matar”. Não tem! Nós estamos num campo de batalha. Então, ou nós melhoramos ou nós melhoramos! Essa é a realidade. A mudança é uma condição sine qua non na vida das pessoas. O homem nasceu para ser santo, ele está numa escala de santidade, ou seja, a própria natureza intrínseca e espiritual do homem já é de mudança. Como o homem é um ser holístico, ele tem que mudar em todas as áreas, seja na sociabilidade, seja na sua auto-afirmação, seja no seu comportamento, na sua alimentação, na sua espiritualidade e também no seu ambiente de trabalho – que está ligado à sua sociabilidade, à sua auto-afirmação e ao retorno que você tem que dar para a sociedade. Existe uma variável que eu não lembro qual o nome dela, onde você mede o grau de contribuição que sua empresa dá para a coletividade. Se ela não dá contribuição para a coletividade essa empresa não tem razão de existir.
P/1 – Uma cidadania empresarial?
R – Exatamente. Então eu acho que uma empresa hoje se torna mais importante quanto mais contribuição ela pode oferecer para o meio no qual se insere e naquilo que ela se propõe a fazer. E ela tem que conseguir isso com agilidade, com preço, com velocidade, com tecnologia de ponta e com tecnologia apropriada para aquele público. Não adianta você querer oferecer coisas que aquele público não quer. Tem que saber o que o povo quer, que nós viemos de uma época em que nós empurrávamos na goela do povo aquilo que tinha. O povo agora quer filé mignon, tá certo? É o filé mignon da história. Então não adianta você querer empurrar arroz com feijão sendo que arroz e feijão ele não quer mais. Já está na fase de fazer regime, agora ele quer cuidar da beleza do povo. Essa é a realidade nossa.
P/1 – São as armas do bom combate.
R – Nós estamos no meio de um campo de batalha. Ou nós nos armamos com armas de primeira geração, com colete à prova de bala e treinamos bem os soldados que vão fazer o uso dessa arma, e passamos a ter objetivos bem definidos, ou então nós vamos morrer em campo de batalha. É essa a realidade. Eu acho que a guerra agora ou vai ou racha. Assim como hoje é inadmissível você pensar em qualquer setor de trabalho, em qualquer área de atuação, que não possa existir concorrência. Nós estamos vendo o exemplo das vans, dos ônibus aí de Uberlândia. Não adianta você querer proteger, gente! Hoje ganha aquele que produzir melhor e acabou! Não adianta você querer proteger. Tudo que você tenta ficar protegendo... até filho se você proteger demais vira parasita. Então nós não podemos ser parasitas nos campos das telecomunicações não. Ou nós crescemos ou alguém vem cá e come a gente.
P/1 – O senhor acredita que o fato de a empresa essa inserção que tem nas comunidades é um diferencial importante?
R – Sim, porque nós não tivemos o trauma que as outras empresas tiveram. As outras simplesmente, vamos dizer assim, foram extintas. Se nós não fôssemos essa empresa privada que sempre fomos, provavelmente talvez nós estivéssemos no rol das que foram extintas. Vamos pegar um exemplo: nós temos o caso da Ceterp. É uma empresa que está totalmente despreparada, se ela quisesse sobreviver não teria como. Ali ainda existe proteção, é superproteção! Uma superproteção. Isso já era! Esse negócio de proteger incompetência não adianta. Não adianta você querer proteger incompetência. Então não dá. Toda vez que você protege alguém demais, estraga. Infelizmente tem mesmo o que nós chamamos de muletismo. Muletismo é você sempre querer encostar em alguém e ficar encostado. Na hora que aquele cara sai, você cai com a cara no chão. Tem que aprender a se virar sozinho. Foi o exemplo que eu contei do meu pai, que até os três anos de casado eu dependia dele. Depois eu mudei para Ipatinga e nunca mais eu fiquei perto do meu pai. É eu e a minha esposa sozinhos aqui, quatro filhos e dois netos sozinhos. O filho se forma e vem, fica perto do pai, ele vai viver guardando ele. Aliás é o que está acontecendo. Numa palestra que eu vi da Maria Conceição Tavares, ex-deputada do Rio de Janeiro, fez uma apresentação na Assembléia Legislativa, que está se criando uma geração onde as casas de família hoje praticamente estão se transformando em cortiço. Por quê? Os filhos não conseguem entrar no mercado de trabalho, vão voltando para a casa do pai e criando casinhas e casinhas. Então isso aí está virando um problema sério. O país com uma taxa crescente de população de 2,5% ao ano, dá quase quatro milhões de jovens entrando no mercado de trabalho, o mercado de trabalho está fechado, a qualidade da educação está caindo e nós ainda sofremos a consequência das gerações de 1960 e 1970, que foi a geração da época hippie, onde houve uma deturpação total, criou uma deformação, sei lá, de caráter, de personalidade e de cultura. Então nós estamos enfrentando este problema hoje e nós sabemos como está o problema da educação. Vocês viram ontem a reportagem da Rede Globo mostrando a estatística do vestibular da UFU, que teve o recorde de candidatos com 16 mil candidatos, 142 candidatos por vaga de medicina e 32, o mínimo, para vaga de administração de empresas? Quer dizer, tem um público aí carente e necessitado de entrar no mercado e o mercado saturado de educação e não abre o campo de trabalho. Dentista aí trabalhando de caixa e desempregado porque uma cidade como Uberlândia tem, no máximo, um dentista para cada 350 habitantes... Tudo tem que mudar. Tem que mudar educação, tem que mudar as regras de governo, não pode existir protecionismo, tem que melhorar a qualidade. A sociedade tem que perceber que existe esse potencial de recurso que nas empresas que se propõem a trabalhar, porque ela está ocupando espaço de alguém. Se ela não foi boa tem uma outra que pode cumprir aquilo.
P/1 – Nesses tempos em que vivemos nada disso pode ser pensado sem o suporte das telecomunicações.
R – Saúde, educação, vestimenta, transporte, telecomunicação e segurança. Sem isso não dá, você fica capenga. Transporte é uma necessidade intrínseca do ser humano. Antigamente transporte poderia ser considerado alguma coisa, até porque as pessoas se reuniam em volta de uma área pequena, não tinha comunicação. Mas à medida que você comunica, as distâncias do mundo vão... é o que chamam de... como chama, quando você reúne o mundo numa parte pequenininha só. O mundo virou um...
P/1 – Um microcosmo.
R – Virou um microcosmo. Não existe mais distância. Hoje, com a Internet, você conversa com alguém no Japão. Eu tenho um colega da minha filha que mora no Japão. Toda madrugada o telefone toca lá... é o fuso-horário. Atende o telefone eu só escuto aquela voz com ela: “Seu João, aqui é o Eric”. Quando ele fala isso eu já corro lá na cama, cutuco a minha filha e falo: “É o Eric”. É um estudante brasileiro que por força das circunstâncias teve que morar no Japão. Faz dois anos que ele está lá e ele não tem ninguém com quem conversar. E ele telefona de lá para cá e vem conversar com ela de madrugada, que é amigo dela com quem ele desabafa! Quantas vezes ele chora no telefone conversando com ela. Quer dizer, o telefone está sendo a sobrevivência desse indivíduo lá no Japão. Conversa com ela de madrugada, chega a ficar 40 minutos no telefone. Acho que ele gasta o salário dele quase tudo, porque de lá para cá é mais barata a chamada. Ou seja, o telefone é a balsa de salvação desse indivíduo. Imagina você no Japão, sozinho, você não ter com quem conversar. Sozinho no Japão. Faz dois anos que ele faz isso e conversa com ela e ela conversa até dormindo.
P/1 –O telefone e toda a infra-estrutura de telecomunicações...
R – Um exemplo mais típico disso: eu tenho um filho em São Paulo. O meu filho esses dias estava na porta do banco, precisava comprar um remédio. Ele mora em Moema e a conta dele é no centro da cidade, e ele precisava comprar um remédio, o remédio tinha acabado e ele não podia voltar lá para o bairro sem comprar o remédio porque depois ele tinha que vir no banco para tirar o dinheiro para poder comprar o remédio. E ele telefonou para a mãe dele e falou: “Mãe, eu preciso comprar aquele remédio meu que acabou e eu preciso de 55 reais, porque dinheiro eu não tenho”. Meu filho de 19 anos. A mãe dele telefonou para mim, e o que é que eu fiz? Eu entrei na Internet aqui na CTBC e em cinco minutos – foi o tempo, porque eu sou meio lento datilografando – em cinco minutos o dinheiro estava na conta dele lá em São Paulo. Eu pergunto: Isso aí é luxo? Não, virou uma necessidade. Então, sem telecomunicações não tem Internet.
P/1 –De onde vem esse seu sobrenome, Coura?
R – Coura é um nome árabe. “Couraque” quer dizer filho de padre. Isso eram nômades que tinham no deserto que tinham nome de Couraque. Não sei se eram padres, o que era... e esses árabes, com a migração deles – historicamente eu não sei – com a invasão deles lá na Europa eles foram para a Espanha.
P/1 – Sim, passaram seis séculos lá.
R – Exatamente. E da Espanha, automaticamente vizinho ali, Portugal, foram aportuguesando o negócio. De Couraque virou para Coura. Aí os meus parentes que eram portugueses vieram para Guaratinguetá, de onde surgiu lá a família do Rodrigues Alves e acabou virando Coura.
P/1 – Os seus avós?
R – Não, os meus bisavós vieram para Guaratinguetá, onde acabou aportuguesando e saiu Coura. A família Coura tem bastante em Belo Horizonte, tem até um desembargador que é Coura. Diz que na vida a gente sempre procura os parentes importantes, né? Mas aconteceu comigo um caso contrário. Um dia eu estava assistindo televisão na Rede Globo e de repente falaram dos assassinos do torniquete. Não sei se você lembra que em Belo Horizonte que apareceram uns assassinos matando gente enforcado com torniquete. Aí eles prenderam a quadrilha de assassinos e começaram a ler o nome das pessoas e tinha lá um motorista de táxi que era não sei o quê Coura. Eu falei: “Nossa Senhora! Esse não é parente meu, não”. Foi essa a explicação do meu sobrenome.
P/1 – Como o senhor descreveria o seu dia-a-dia? Como é um dia típico de João Batista Coura?
R – Olha, atualmente o meu dia-a-dia anda meio apreensivo. Eu vou explicar o que eu sinto dando uma definição. A definição de angústia é quando você está diante de um processo e você não tem controle sobre ele. Isso é angústia. Medo é uma coisa que eu falo para você: “Um cara vai te matar ali fora”. Então você sabe a causa, então você tem medo. Ansiedade é quando alguma coisa está te provocando mal-estar e você não sabe o que é. A angústia é quando você está diante de um processo mas você não tem controle sobre ele. E atualmente, hoje, nós estamos vivendo diante de um processo em que... o que você me perguntou deve ser o aspecto profissional?
P/1 – Sim.
R – No aspecto profissional eu diria que existe um pouco de angústia diante de um processo que, quando o processo é só meu, seria uma angústia pessoal minha. Mas hoje eu me vejo diante de uma angústia sob um aspecto de cunho nacional. Não só na área de telecomunicações, mas na área nacional. Eu não sei, esse curso de pós-graduação que eu estou fazendo trouxe tanta informação econômica que a televisão não divulga, ou que a televisão muitas vezes divulga de uma maneira muito popular e que não reflete a verdade, e que é muito manipulado, infelizmente, mas eu pude ver um pouco da visão científica começando dentro da Revolução Industrial lá da Inglaterra até agora, e vendo a realidade da América Latina, até que foi objeto de um trabalho que nós fizemos, vendo aí uma América Latina praticamente quebrada, como é o caso da Argentina, países declarando moratória, países com uma queda no PIB violenta, onde nossos grandes compradores dos nossos produtos são países da América Latina e do Mercosul, e a gente está vendo que o Mercosul está um desastre, vendo praticamente o Brasil quase leiloado, vamos dizer assim, e vendo a globalização da economia... Eu não sei se é um pouco apocalíptico, vendo a aproximação do novo milênio. Então, de uma ordem geral provoca um pouco de angústia, ou seja, uma falta de controle sobre o processo existente. Mas, por outro lado, não é à toa que eu carrego esse pau no meio peito que me faz diariamente estar presente na Igreja. Eu falei que eu era católico praticante e isso aí instaura em mim uma força que transcende as virtudes naturais, mas que me insere no mundo das virtudes sobrenaturais, dos dons que Deus concede para a gente. Então tem dias que eu estou mais forte, tem dias que estou mais fraco, que é o próprio ciclo do ser humano. Mas eu acredito que a maior parte dos problemas – Dale Carnegie diz isso no livro Como Evitar Preocupações e Viver Bem –, 90% dos problemas que eu imagino que existem, só 1% deve acontecer. O resto tudo é fruto da minha imaginação. Então eu acredito que a cabeça da gente precisa ser trabalhada e quando os limites da gente acabam, a gente tem que ser humilde para compreender que quando acabam os meus limites é que começam exatamente as virtudes sobrenaturais daquilo que eu acredito. Então um homem sem fé, sem religião, pode ser que ele entre em parafuso. E isso que eu acredito muito em mim, faz parte do caráter que o meu pai me disse um dia, que eu não esqueço nunca. Ele disse: “Meu filho, esse mundo é um campo de batalha. Tente lutar com as suas próprias mãos e você busque a ajuda dos outros, mas se ela não existir, não se preocupe, não. Você tem que ser um guerreiro”. E eu fui um guerreiro. Eu posso garantir para você que o meu pai foi um guerreiro tão grande que ele, do cabo de uma enxada e de 200 litros de leite por dia das quatro mamicas de uma vaca, ele fez cinco engenheiros, um médico e duas professoras, ao ponto de ser louvado numa reunião do Rotary em Cruzeiro. E que esse homem, hoje, se você fosse enumerar todos os benefícios que ele fez para a sociedade e esses oito filhos, é uma coisa assim, astronômica. Então o exemplo desse homem eu procuro acreditar nele, porque a partir do momento que eu deixar de acreditar naquele homem, então eu estou ferrado. Eu acredito nele. Foi esse o caráter que ele me imprimiu, eu acredito nisso. “Eu não tenho tudo o que amo mas amo tudo o que tenho”. É essa a realidade que eu acredito.
P/1 – Tem alguma coisa que o senhor gostaria de ter dito e não disse?
R – Eu tenho duas famílias. Eu tenho a família que eu gerei no sangue e tenho a família que eu amo muito e se eu falasse que eu não a amasse, eu não estaria completando as minhas bodas de prata com ela – que é a CTBC. E eu tenho bodas de prata com a CTBC, eu gosto da minha empresa. Até hoje eu nunca fiz nada, metade da minha vida foi feito nela. E nessa família CTBC eu lembro sempre do meu pai Alexandrino e dos colegas que labutam comigo uns há mais tempo, outros há menos tempo. Eu acredito, eu confio nela e eu vivo com ela há 26 anos. E nela, nessa empresa, eu tenho a agradecer porque ela já me deu um dentista, uma filha no terceiro ano de administração de empresas, uma outra filha vestibulanda e o outro que é vestibulando também, que passou na faculdade de artes e moda, e que me manteve vivendo com dignidade e respeito até hoje, apesar de tantos momentos de dificuldades que a gente teve, mas graças a Deus eu vou em frente.
P/1 – Gostou da entrevista?
R – Adorei.
P/1 – Que bom. Muitíssimo obrigado. Não foi só uma entrevista, foi uma aula também.
Fim da entrevista
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