Meu nome é Antônio Carlos Spis. Nasci na cidade de Campinas, Estado de São Paulo, em 3 de agosto de 1950.
FAMÍLIA
Meu pai é Antônio Spis, e minha mãe, Maria Micucci Spis, os dois já falecidos. O meu avô paterno é José Spis... Não estou lembrado agora, não. O meu avô tinha um sítio na cidade de Campinas, foi neste sítio que eu nasci, ele mexia com flores. A minha avó era, como se chamava, “do lar”. E os meus avós maternos eu não sei o que faziam. Os demais avós são italianos. O meu pai era motorista de caminhão da Brahma, Cervejaria Brahma, em Campinas, Schimutz S.A., e a minha mãe era também “do lar”. Como se dizia, “do lar”, na época.
MIGRAÇÃO
O sobrenome Spis já é naturalizado brasileiro. Ele é de procedência austríaca. O meu avô fugiu do Hitler, passou pelo norte da Itália e veio para o Brasil. Naquela época havia uma estratégia brasileira de subjugar os imigrantes que vinham para cá, e ele foi abrigado a se naturalizar brasileiro, e modificaram um pouco o sobrenome. O sobrenome original é Spitz. Eu tenho dois tios mais velhos que têm esse sobrenome, mas o meu, o do meu pai, já virou Spis, e ficou esse o da família.
INFÂNCIA
A minha infância foi nesse sítio do meu avô, que cultivava flores. Em vista disso a família gosta muito de plantas, de flores, eu também gosto muito. E foi até os meus 9 anos nesse sítio, quando meu pai morreu de câncer na laringe. Aí houve um certo conflito, porque em sítio muitas pessoas moram juntas. Eram duas ou três famílias, e a minha mãe acabou saindo desse sítio e indo morar no porão da casa de um irmão dela no outro lado da cidade. Então foi uma infância meio tumultuada, porque eu tive que mudar de amigos de infância com 9 anos de idade. Então todos os finais de semana, em vez de eu ficar com meus amigos do local novo, eu voltava para o sítio para brincar com as crianças lá desse sítio. E foi indo assim até...
Continuar leituraMeu nome é Antônio Carlos Spis. Nasci na cidade de Campinas, Estado de São Paulo, em 3 de agosto de 1950.
FAMÍLIA
Meu pai é Antônio Spis, e minha mãe, Maria Micucci Spis, os dois já falecidos. O meu avô paterno é José Spis... Não estou lembrado agora, não. O meu avô tinha um sítio na cidade de Campinas, foi neste sítio que eu nasci, ele mexia com flores. A minha avó era, como se chamava, “do lar”. E os meus avós maternos eu não sei o que faziam. Os demais avós são italianos. O meu pai era motorista de caminhão da Brahma, Cervejaria Brahma, em Campinas, Schimutz S.A., e a minha mãe era também “do lar”. Como se dizia, “do lar”, na época.
MIGRAÇÃO
O sobrenome Spis já é naturalizado brasileiro. Ele é de procedência austríaca. O meu avô fugiu do Hitler, passou pelo norte da Itália e veio para o Brasil. Naquela época havia uma estratégia brasileira de subjugar os imigrantes que vinham para cá, e ele foi abrigado a se naturalizar brasileiro, e modificaram um pouco o sobrenome. O sobrenome original é Spitz. Eu tenho dois tios mais velhos que têm esse sobrenome, mas o meu, o do meu pai, já virou Spis, e ficou esse o da família.
INFÂNCIA
A minha infância foi nesse sítio do meu avô, que cultivava flores. Em vista disso a família gosta muito de plantas, de flores, eu também gosto muito. E foi até os meus 9 anos nesse sítio, quando meu pai morreu de câncer na laringe. Aí houve um certo conflito, porque em sítio muitas pessoas moram juntas. Eram duas ou três famílias, e a minha mãe acabou saindo desse sítio e indo morar no porão da casa de um irmão dela no outro lado da cidade. Então foi uma infância meio tumultuada, porque eu tive que mudar de amigos de infância com 9 anos de idade. Então todos os finais de semana, em vez de eu ficar com meus amigos do local novo, eu voltava para o sítio para brincar com as crianças lá desse sítio. E foi indo assim até que minha irmã - eu tenho uma irmã dois anos mais velha do que eu - começou a trabalhar nessa distribuidora de bebidas em Campinas também. E aí nós fomos crescendo, e eu fui para uma empresa.
TRABALHO
Com 16 anos eu comecei a trabalhar.
EDUCAÇÃO
É, eu fiz, naquele tempo era o primário. Tinha um pré-primário naquele tempo também, numa escola de um bairro em Campinas chamado Cambuí. Esse meu avô me levava a pé e ia buscar.
INFÃNCIA
E a infância era jogando bola. Ali em Campinas são muito fortes os times de futebol Guarani e Ponte Preta - eu sou Ponte Preta. Então as crianças jogam bola em campinhos. Eu me lembro que meu pai comprava muitos terrenos, ele investia em terrenos, e o terreno em que a gente jogava bola, o time Ipiranguinha, era num terreno do meu pai. Eu sempre dizia: “Me deixem jogar, senão meu pai tira vocês daqui!” Então, eu jogava bem, eu jogava no juvenil da Ponte Preta. Eu não cheguei no juvenil, eram as categorias menores ali. Eu era muito baixinho na época, não tinha muito porte físico, mas eu cheguei a jogar lá na Ponte Preta. Então era muito jogar bola, ir para escola até essa idade aí que eu vivi no bairro do bosque lá em Campinas. Este bosque é ativo até hoje, é uma área verde preservada em Campinas, ainda muita gente faz passeios nos finais de semana dentro deste bosque. A minha infância foi ali perto, nessa região. E depois que eu precisei ir embora, com 9 anos, começou uma outra vida, num outro bairro mais populoso. Perto do sítio tinha mais natureza, tinha mais áreas verdes.
TRABALHO
PRIMEIRO EMPREGO
Esse outro bairro em que eu fui morar já era uma área mais forte de movimento, de mais gente correndo, essas coisas todas. Então foi por ali, até que eu precisei também começar a trabalhar. Então eu fui fazendo a parte infantil da escolaridade. A minha mãe ficou viúva, e nós tínhamos que logo trabalhar para ajudar em casa. Meu primeiro emprego foi já numa empresa chamada Duratex S.A. Moinho São Paulo, como office-boy interno. É uma pessoa que leva papéis internamente, não faz serviços de rua. Foi um serviço de escritório para levar mensagens internas, e chamava-se office-boy interno naquela época. Eu substituía também o externo, que ia pagar contas na cidade, quando ele faltava, saía de férias, essas coisas todas, e eu comecei a ter essa prática. Substituía também a telefonista quando ela ia no banheiro. Aprendi também o PABX, que chamava na época lá, receber as ligações e transferir as ligações internamente. Até que chegou um ponto em que eu fui promovido para um serviço específico na própria empresa, não era mais o boy, externo ou interno, mas eu era o responsável por receber os caminhões que chegavam com mercadoria, porque era uma empresa que produzia farinha de trigo. Tinha uma granja experimental, fazia rações na Anhanguera também, era uma empresa, assim. Então chegavam mercadorias em caminhões, tinha uma balança, e eu conferia a nota fiscal, quando eu fui promovido internamente para essa empresa. Trabalhei de 1966 até, eu acho que 1970, por aí, nessa empresa.
EDUCAÇÃO
Paralelamente ao trabalho eu estava fazendo o ginásio, e fazendo o colégio. Eu fiz no Colégio Culto à Ciência, que é um colégio muito conceituado em Campinas. Tenho orgulho de terem passado por lá grandes nomes como Santos Dumont. É um colégio, assim, secular, que conta muita história na região de Campinas, é muito conceituado, era muito conceituado na época. Lá eu fiz o que na época se chamava de científico. Fiz o ginásio e fiz o científico e depois prestei vestibular na PUC de Campinas, para processamento de dados, que era o curso da época. Acabei não passando e entrando para matemática. Então eu fiz matemática da PUC em Campinas, mas não me formei, acabei desistindo no meio, porque não bem aquilo que eu queria - eu queria processamento de dados, e acabei não fechando. Na época era chamado de DPs, as matérias que iam ficando para trás. Mas aí eu já estava na Petrobras.
ADOLESCÊNCIA
Um jovem em Campinas, cidade interiorana, que perde o pai com 9 anos, e aí a mãe sai e vai morar num outro bairro e precisa trabalhar para sustentar os filhos menores, não tem grande vida fora da própria residência. Era muito caseira a vida. Quando eu comecei a chegar mais para a adolescência e sair para algumas coisas, eu nunca dormia fora de casa, pelo fato de ter a mãe sem o pai e também a irmã, então eu procurei sempre ter uma vida mais preocupada e nunca dormia fora de casa, para garantir a volta para casa, mesmo que fosse mais tarde. A minha mãe sempre sabia que eu estava voltando.
FAMÍLIA
Depois que nós conseguimos sair desse porão, digamos assim, na casa do meu tio –como eu também falei anteriormente, meu pai também comprava alguns terrenos. Meu pai morreu de câncer na laringe, e ele vendeu uns dez terrenos para se tratar, tudo particular, no Penido Burnier, que é um grande hospital de Campinas também, com fama internacional. Ele trouxe um médico de São Paulo, especialista, na época, mas em 1958, por aí, não tinha muitos avanços para combater o câncer. Então ele era uma figura impressionante na minha cabeça, com muitas marcas de injeção no ombro, um buraco praticamente, que tinha que ser tratado, e que um japonês em casa - um médico permanente, contratado por ele, para tratar dele. Então foi um ano, um ano e meio com muitas operações, com muito investimento financeiro, e vendendo os terrenos que ele tinha. Aí a minha mãe ficando na mão, com dois filhos pequenos, para sustentar a família. Então, foi uma vida que não tem muita atividade cultural, não tem muita atividade.
ADOLESCÊNCIA
Na verdade era o Colégio Culto à Ciência que tinha também as atividades de jogar bola, essas coisas, muito mais nesse aspecto, e voltado para a família, que tinha que ser reorganizada. Não tem muita coisa, tem pequenas viagens, tem essas coisas assim que os jovens faziam, mais por atividade do próprio colégio.
CASA
Os amigos não se enraizavam muito, porque a gente, depois do porão, a minha mãe conseguiu com que o juiz de Campinas autorizasse vender um terreno para construir uma casinha no outro, no bairro de periferia chamado Jardim Leonor, lá em Campinas. Como eu era menor e a minha irmã era menor também e nós tínhamos direto à herança, nós fomos emancipados. O dinheiro da venda de um terreno na mão do juiz, e ele ia liberando o dinheiro para comprar o material de construção para construir a casa. Na verdade ficou na mão dele para garantir o direito dos herdeiros, depois houve uma divisão, divisão da casa em partes e mais um terreno. Meu pai morreu, e sobraram três terrenos do que ele tinha. O juiz autorizou a vender um, construir uma pequena casa nesse outro, e sobrou um outro. Então a casa e o terreno foram divididos entre a minha mãe e os dois filhos, eu e a minha irmã, para garantir os direitos de herança. Aí a gente muda para esse local, com uma casinha também improvisada, e vai todo o sacrifício de trabalhar e investir para melhorar a casa, comprar algumas coisas.
INFÂNCIA
Foi uma infância difícil, de pobreza, e que teve também esse fato de a gente perder o pai com pouca idade. A minha mãe por ser “do lar”... Estou ratificando bastante esse “do lar” porque fui fazer uma palestra ontem na cidade de Assis sobre a reforma da Previdência, e na reforma da Previdência a mulher tem dupla tarefa, no mínimo, e não é reconhecida. Então fiz uma exemplificação dessa coisa “do lar”, que eu me lembro de ter visto nos documentos da minha mãe. Então foi assim uma infância difícil. Eu jogava muita bola, corria, estudava, e o resto era casa. A minha mãe começou a trabalhar e cuidar de doentes, ela chegou a trabalhar num consultório médico para anotar consultas. No mínimo meio período, ela conseguia um empreguinho lá para garantir um pouco de grana. Minha irmã começou a trabalhar lá na empresa distribuidora de bebidas, depois ela foi para esse outro emprego e me levou; quando ela soube que tinha uma vaga, me levou como office-boy interno. Então, até os 9 anos, você dentro de uma chácara com pés de manga, com áreas livres, realmente uma área grande para correr. Dá para a gente resgatar na cabeça os nomes dos cachorros, essas coisas todas; um sítio traz a oportunidade de você fazer um canteiro, mexer com plantas, aprender a fazer enxerto, essas coisas todas. Mas sempre muito caseiro ali, a família sempre cercando de perto. E dos 9 até os 15, por aí, fui estudar até entrar no primeiro emprego, que foi na Duratex.
TRABALHO
Da Duratex, que eu trabalhei de 1966, eu acho até 1968, eu saí, fui mandado embora porque eu faltei num Carnaval, fui mandado embora, e depois eu fui trabalhar numa companhia chamada Companhia Curtidora Campineira, que era uma empresa de curtume num outro bairro da cidade.
INGRESSO NA PETROBRAS
Na Companhia Curtidora Campineira, que já era na década de 70. A Petrobras começou a construir o canteiro de obras em Paulínia, para construir a refinaria de Paulínia. Em 1971, 1972, por aí, ela começou a construir o canteiro de obras para fazer a maior refinaria do país, a maior refinaria em capacidade de refino, que é a Refinaria de Paulínia. Aí eu vi no jornal, foi por notícias de jornal, comecei a me preparar para fazer o processo seletivo. Fiquei sabendo pela imprensa.
TRABALHO
E desde que eu tinha saído da Duratex, que a Duratex é uma empresa que tem uma certa estrutura, então a gente já percebia que uma empresa que tem uma certa estrutura te dá condução para levar e trazer, entende, essa coisa toda. E eu fui para a Companhia Curtidora Campineira e lá não tinha essa estrutura, então eu tinha que ir para a minha casa de ônibus, voltar, levar marmita, essas coisas. Então eu falei: “Espera aí, eu preciso arrumar um emprego que tenha mais estrutura!” Já com essa visão de crescer e tudo. E a Petrobras apareceu assim: eu fiz o processo seletivo e fui passando nas fases do processo seletivo, nessas fases do processo seletivo, fui passando e entrei em 1º de junho de 1973, na Petrobras. Depois que eu saí da Companhia Curtidora Campineira eu tentei montar uma empresa, eu e outras pessoas, uma empresa de comercialização; chamava SBF. SBF era Spis e Bueno Ferreira, eu e meu sócio, um amigo meu. A gente tinha se formado no Culto à Ciência e a gente estava novamente desempregada, porque a Companhia Curtidora mandou embora, porque tinha as fases de produção e ela mandou embora. Nós juntamos um dinheiro um tempo, compramos uma Kombi e tentamos vender produtos, representar produtos. E entramos num mercado muito difícil, porque tinha uma competição muito grande, esses representantes mais antigos não dão espaço, as empresas também não dão para quem não tem experiência, então você acabava caindo para ser trabalhador do representante, então você era subempregado para vender produto Nestlé, produto sei lá o quê. Aí era superexplorado, não ganhava nada. Não deu nada essa empresa, durou menos de um ano. Mas abrimos firma, com registro em cartório e tudo bonitinho. Conseguimos juntar dinheiro um período e abrir firma para comercializar produtos. Viajávamos para o sul de Minas, vendíamos bijuteria, fizemos um monte de coisa. Tivemos um monte de calote, tivemos que viajar para lá só para ir na Justiça para recuperar parte de dinheiros que nos pagaram com cheques sem fundos. Foi um período de tentativa de encontrar uma maneira de se inserir na produção, de ganhar uma grana.
IMAGENS DA PETROBRAS
Ouvi falar pela imprensa. Bom, a Petrobras eu ouvia falar havia muito tempo, desde os cursos, desde o ginásio e do colégio, como referência de empresa nacional, essas coisas todas, a luta do petróleo. Isso daí está inserido nas grades curriculares das escolas brasileiras.
INGRESSO NA PETROBRAS
Mas falar e prestar atenção do ponto-de-vista de trabalhar foi em 1972, 1973, por aí. Deve ter sido no primeiro semestre de 1973, porque eu entrei em 1º de junho de 1973. Eu sei que foi demorado para entrar, porque tem diversas fases do processo, daí você fica em cadastro. A prova de português e matemática era um final de semana, a outra era no outro final de semana. Tinha entrevistas, aí tinha os exames médicos; o processo para entrar é demorado, pelo menos naquela época foi demorado. Então eu acredito que no primeiro semestre de 1973 é que eu pensei do ponto-de-vista de entrar na empresa. A primeira expectativa era trabalhar numa empresa que desse transporte. Porque eu comecei a pensar e falei: “Poxa, eu estava lá na Duratex, eu tinha ônibus para vir almoçar, para voltar depois para trabalhar e para voltar, aí eu vou para outra empresa, eu tenho que pagar do bolso. E ficava o tempo mais espremido, essas coisas todas, e dificultava para estudar.” Eu falei: “Eu tenho que entrar numa empresa de maior porte!” A primeira expectativa é essa. Depois que você entra, muda totalmente a visão da empresa.
IMAGENS DA PETROBRAS
A impressão de estar entrando num monstro, às vezes numa bomba atômica. Porque aquele Parque Industrial de Paulínia era enorme, e as pessoas te mostram o Parque Industrial, e tem um curso de integração social, que eles chamavam na época, em que mostram a empresa, contam a história da empresa, e tem o resgate histórico da luta toda para a constituição dessa maior empresa brasileira. Então a gente acaba se envolvendo na importância da empresa e incorporando. Eu digo muito que, não só por eu ter ido para o sindicato, porque para ir para o sindicato eu demorei 9 anos para entrar no sindicato, e desde o início eu falava que a gente vira meio um pouco defensor da empresa, um certo professorzinho de Petrobras, porque vai aprendendo lá, pelas discussões internas, a fazer os comparativos de produção, os comparativos de reserva de petróleo, essas coisas todas.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
Eu não era nem da área operacional, eu entrei na área de recursos humanos, entrei no setor de pessoal, fui para a seção de transportes, e no último período que eu trabalhei foi na área de recursos humanos mesmo, setor de seleção e treinamento de pessoal.
SINDICATO
SINDICATO CAMPINAS E PAULÍNIA
ELEIÇÃO DIRETORIA
Isso foi no ano de 1982. O sindicato estava fazendo uma chapa, e eu me lembro que eu era meio questionador, era meio rebelde, assim, de questionar as coisas, não gostava muito de chefia, já tinha um certo ranço meu, assim, de separação. Tinha festa que a gente era convidado e eu não tinha vontade de ir. Não sei, eu gostava de ficar mais com o pessoal mesmo, que a gente chamava de base. Aí, na fase de construção da chapa de 1982, eu estava entrando no prédio interno lá, e aí estava saindo o Jacó Bittar e uma diretora chamada Vanda Conte, que foi diretora, da diretoria cassada de 1983, e o Jacó falou para ela assim: “Já convidou o Spis para entrar na chapa?” Eu falei: “Que chapa?” Não sabia nem que chapa, nem sabia que estava sendo montada a chapa. Aí ela falou: “Estamos lá discutindo para fazer uma nova chapa do sindicato. Você não quer ir lá?” Falei: “Não, tudo bem, eu vou.” Comecei a ir e aí não saí mais, porque aí a gente começa a se posicionar e vai criando a condição de participar, porque nessas fases iniciais muita gente é convidada, então convidam 50 pessoas, 100 pessoas, depois para constituir a chapa mesmo são 24 pessoas. E nessa época estava havendo uma oposição ao sindicato, eu fui procurado pela oposição. Fui procurado pela oposição para entrar nessa chapa contra o Jacó Bittar. O Jacó Bittar já estava fazia um tempo lá. Quando eu entrei, o Jacó Bittar estava começando a fazer o sindicato, em 1973, mas eu não sei por que cargas d’água eu acabei não entrando, apesar de participar das mobilizações. As mobilizações eram meio tímidas, pelo fato da ditadura estar muito forte. Eram meio tímidas, eram abaixo-assinados, tinha movimento de protesto, esquecer o crachá para dar problema para empresa, fazer uma greve de fome. Era muito mais um movimento de autoflagelo, do que impor um desgaste à direção da empresa. Você se autopunia. Tudo bem, mas é uma fase construtiva da mobilização. Uma refinaria nova, estava chegando, então tem um povo de Campinas que entra, das cidades da região, e tem gente antiga que vem para ajudar na construção, trazendo a experiência, essas coisas todas. O Jacó foi um desses - veio lá de Cubatão com acúmulo de experiência. Aí eu acabei entrando só nessa fase de 1982. Eu já estava na empresa havia 9 anos.
NAMORO
Na universidade eu só namorei. Inclusive, um problema de eu não concluir o curso foi por uma namorada. Porque quando eu entrei em 1973, que estava tendo concurso, eu já estava estudando e escrevi na lousa: “Concurso na Petrobrás e não sei o quê.” Ah não, foi depois, já estava estudando e teve um outro concurso e escrevi na lousa, e entrou muita gente, entrou muita gente. E eu namorei uma menina que era secretária da divisão financeira, que o chefe era o Chacon, marido da Celi Campelo, que agora voltou o nome dele à imprensa porque ela morreu agora, a Celi Campelo. Foi com ele que ela casou e largou a carreira artística, o Chacon, chefe da divisão financeira, Divif. Acho que é Divif. É porque a Petrobras muda tanto o nome das siglas. Aí a Conceição era secretária dele, e eu comecei a namorar a Conceição, e ela tanto trabalhava junto como estudava junto matemática. E muita gente passou a divulgar, porque eu divulguei, então tinha um turma de petroleiros que também era da turma da matemática. Só que ela acabou tendo uma doença muito grave, teve hanseníase, que é o nome científico da lepra. E começamos a namorar, namorar, de repente ela passa a se internar num hospital de Bauru chamado Lauro de Sousa Lima, que só tinha visitas aos domingos, e eu ia todo domingo. Aí eu tinha durante o serviço uma enormidade de trabalhadores que me perguntavam da Conceição, e eu ia para a aula à noite, e uma enormidade de pessoas que perguntavam da Conceição. Aí eu comecei a relaxar um pouco a parte noturna. Falei: “Vou largar um pouco porque não estou agüentando tanta coisa buzinar na minha orelha.” E aí acabei relaxando, relaxando. Ela acabou se formando até, mesmo com o afastamento. Ela acabou se afastando. Nesta fase eu tive que brigar muito com o médico da companhia, doutor Eudes Pacheco, que primeiro não queria dar licença, por entender que era algum problema de pele, mas a gente passou por diversos especialistas e provou que era hanseníase. Aí, por uma manobra da Petrobras, e com esse médico por trás dessa manobra, eles aposentaram essa menina, eu acho que ela tinha 20 anos. Uma menina muito bonita, loira, de olho azul, aposentada com 20 anos por invalidez. Eu queria morrer. Já estava no sindicato, peitei o mais que deu, não deu, não teve condição. E aí, como ela se tratou muito direitinho, a gente acabou construindo realmente diversas possibilidades de tratamento, e ela provou que estava curada. Só que esse médico não queria aceitá-la de volta, dizendo que essa doença não tinha cura. Aí nós fomos juntos ao Rio, no chefe desse médico, e garantimos a volta, ela voltou para a Petrobras, voltou para a empresa, para a Replan, e aí acabou sendo aposentada de novo, aí por tempo de serviço. Mas aí a gente, quando voltou a uma certa normalidade, acabou não se entendendo muito bem, acabamos nos separando, não deu certo a vida sentimental. Mas eu acho que esse fato é que desmotivou um pouco da matemática. Mesmo que eu não gostava muito, eu queria fazer processamento de dados, segundo, que depois do namoro com a Conceição começou a ter essa cobrança, e eu não agüentava. Eu chegava de segunda-feira para trabalhar, então diversas secretárias - ela era secretária de divisão - perguntavam: “E aí, como é que está?” E eu tinha que explicar, explicar. Aí chegava de noite, eu tinha que explicar. “Melhorou? “Piorou?” E essa coisa é cíclica, então foram anos e anos de tratamento, foi uma coisa pesada. Na verdade essa doença não tem cura. Na verdade ela não é hereditária, prova-se que ela não é hereditária, mas sempre alguém na família tem. Eu fiz diversos testes, biópsias, lá em Bauru, que era um médico que na época, não sei nem se ele está vivo, mas que na época era muito respeitado, chamava doutor Diltor. Ele pesquisava até vacinas. Você monitora a doença com remédio, e como tem algumas cortisonas pelo meio, às vezes dá reação, às vezes não dá, troca remédio. Você monitora a vida inteira e não sei, não cura. Acho que não cura, não sei. Não sei direito com detalhes, mas eu acho que é uma doença a ser monitorada. Hoje muito melhor monitorada do que naquela época. Mas a Conceição está curada, deve monitorar com remédios até hoje. A gente conversa raramente hoje. Mas houve esse episódio que acabou me afastando da matemática. Da matemática, do inglês, eu fazia algumas coisas assim, e nessa época já estava o sindicato namorando comigo ali.
SINDICATO
SINDICATO CAMPINAS E PAULÍNiA
ELEIÇÕES DIRETORIA
Aí eu me enfronhei no sindicato nesse ano de 1982, para participar da convenção para a constituição da chapa. E a posição das pessoas mais antigas - tinha esse Jacó, Caravante, Demétrio, essa Vanda, também achavam que eu tinha que ser um diretor liberado -, eles acharam que eu devia ser secretário geral. O sindicato tem três pessoas que a Petrobras liberava naquela época integralmente do trabalho e pagava o salário. O presidente, secretário geral e tesoureiro. Três pessoas de 24 diretores. Eles queriam que eu fosse secretário geral liberado. Eu falei: “Não, mas eu não tenho experiência, eu estou chegando agora, me deixa um mandato de diretor de base.” Porque os outros são diretores de base, trabalham o dia inteiro e depois cumprem suas tarefas sindicais. “Eu estou parando de estudar, vou me dedicar ao sindicato, mas me deixa pegar experiência, e no outro mandato talvez eu seja uma pessoa liberada.” Aí não deu tempo, porque isso foi em outubro de 1982, a eleição, e nós fomos cassados em julho de 1983. Então deu uns 9 meses, uns 9 meses de mandato, então não deu nem para eu praticar.
GREVE (1983)
Quem nos cassou em 1983 foi o Figueiredo, o ditador Figueiredo. Porque a ditadura brasileira, que começou em 1964, assinava algumas cartas de intenções com o FMI para receber aporte financeiro, e havia condicionantes, como existem hoje. Um dos condicionantes que nós descobrimos - porque as cartas eram guardadas a sete chaves. Um diretor nosso chamado Caravante conseguiu pegar uma dessas cartas de intenção com o FMI de algum canto, eu não sei como ele pegou, e nós olhando a carta de intenção e analisando no sindicato, fazia parte de um dos condicionantes uma redução de custeio nas empresas públicas, bancos públicos e serviços públicos. Nós achamos: “Isso aqui vai ter redução de investimento para pessoal, vai ter demissão!” E começamos a debater com a Petrobras, e a Petrobras não conhecia nada, e chegamos à conclusão: “Vai ter redução de custeio, vai demitir gente!” Então vamos fazer uma greve política no mês de julho, fora da data-base, a data-base é setembro. Quer dizer, não era uma greve para reivindicar salário, para exigir que o governo garantisse que não ia ter demissão na Petrobrás, era uma greve política. Aí houve uma discussão nacional com todos os sindicatos do país na época, acho que existiam 16 sindicatos no país, petroleiros, e houve um certo consenso de deflagrar a greve, pelo menos da maioria. Aí vamos nós lá de Paulínia, construímos a greve, fizemos a greve. Na véspera de deflagrar a greve, que foi no dia 5 de julho de 1983 - Jacó deve ter contado isso daqui para vocês -, os metalúrgicos estavam em congresso em Piracicaba, e na volta para São Bernardo pararam nos petroleiros de Paulínia para dar um apoio à greve, e eu estava pintando faixa no chão. Aí o Lula me perguntou: “Sabe quantos anos de cadeia dá para quem faz greve?” Eu falei: “Não estou fazendo greve, estou fazendo faixa!” Brincando conosco lá. Fez um discurso combativo, que tem que enfrentar a ditadura mesmo, não sei o quê, aquilo que a gente está muito acostumado. E fizemos a greve. Foi um episódio importante daquela mobilização. Mas foi uma greve política contra a ditadura do Figueiredo, que foi o último ditador, para exigir que ele se posicionasse de que não haveria, nessa redução de custeio, demissão de pessoal. Não conseguimos, a greve durou sete dias. E aí fomos, parou a greve. Voltamos a trabalhar.
SINDICATO
INTERVENÇÃO
A ditadura julgou que só nós fizemos greve. Só nós não, nós paramos a refinaria de Paulínia, e parou também a refinaria de Mataripe, na Bahia. Duas refinarias pararam. As duas diretorias foram cassadas, afastadas do trabalho; a empresa abriu processo para apuração de falta grave; processos na Polícia Federal, aqueles processos todos da ditadura contra quem os enfrenta, e nós tivemos 152 demissões em Paulínia e 200 em Mataripe, em virtude dessa greve. Os trabalhadores foram obrigados a voltar no dia seguinte em filas, não sei o quê, humilharam os trabalhadores. Nós tivemos intervenção no sindicato, foi indicado um interventor do Ministério do Trabalho, chamado Wilson, para assumir no lugar do Jacó Bittar. Veio lá com a PM para assumir. Foi nessa oportunidade também que eu conheci o Luiz Eduardo Greenhalgh, que hoje é nosso deputado federal - na época, era o advogado do nosso sindicato. Ele foi confundido com o interventor, a categoria queria bater nele, porque quando nós ficamos sabendo, na greve, que ia ter intervenção, nós saímos num teatro de arena, que tinha no centro de Campinas, e fomos para o sindicato, numa demonstração de proteção ao sindicato. E invadimos o sindicato e ficamos todos lá esperando chegar a intervenção. Chega o nosso advogado, bonitinho, de terno, nós achávamos que era ele o interventor. Aí o conheci, nessa oportunidade, e somos amigos hoje. E quando o interventor chegou, nós fomos para cima dele, para bater. Aí o Jacó falou: “Não, não, esse é o nosso advogado!” Então, o Luiz Eduardo Greenhalgh, inclusive, tem alguns processos meus, particulares, com ele hoje, eu tenho liberdade para ligar para ele e fazer um café da manhã às seis e meia da manhã para trocar uma idéia, porque acabamos ficando amigos, a partir dessa época aí, e há uma respeitabilidade mútua.
GREVE de 1983
Essa greve acabou de maneira dramática, foi uma greve dramática. Porque houve aliciamento de trabalhadores através de grupos de trabalhadores que eles conseguiram dominar. A pressão era muito grande, eles começaram a demitir paulatinamente, a lista dos demitidos aparecia na imprensa da cidade de Campinas, uma pressão muito grande. Telefonemas para ameaçar mães, para ameaçar esposas de trabalhadores. Eles mandavam viaturas da Petrobras, com vigilante na viatura, para ir buscar as pessoas. Era uma pressão muito grande em cima das famílias, era um trabalho muito sujo do presidente da Petrobras na época, que se chamava Shigeaki Ueki, e da ditadura brasileira. Na verdade a Inteligência do Exército tomou conta da refinaria, tirou das mãos da gerência da empresa e começou a administrar um conflito, não como um conflito relação capital-trabalho, que você tem que sentar e negociar, mas como se fosse uma guerra. Então foi dramática essa mobilização, foram seis dias, e não tivemos como resistir depois do sexto dia. Então nós concluímos a greve em assembléia, liberando a categoria para voltar. A direção não se esfacelou. Nós dormíamos cada dia num lugar para evitar prisão, evitar as coisas que a ditadura pudesse nos fazer, e acabamos retomando, voltando de cabeça erguida, mas sem nenhuma conquista. E na assembléia do retorno nós decidimos que nós teríamos como ponto de honra do sindicato retornar com os demitidos. A diretoria cassada e os demitidos, num total de 152 pessoas.
TRAJETÓRIA SINDICAL
O sindicalista tem um vínculo interpessoal, que a gente chama de companheirismo, que é muito forte, é mais forte do que parentesco, é mais forte do que muita coisa que a gente sente de amizade, essas coisas aí. Realmente são compromissos políticos para se ir até o fim. E a gente tinha isso naquela diretoria. Então nós nos unimos bastante, impedimos a desagregação. E na assembléia final, além de decidir que seria ponto de honra do sindicato retomar com todo mundo, nós decidimos que nós não iríamos sair do sindicato, não íamos largar para a ditadura, para o interventor, mas que a gente iria constituir um fundo de greve para garantir a sustentabilidade política, financeira, jurídica, até retorno ao trabalho. Passou a ser ponto de honra a reintegração dos petroleiros de Paulínia. E acabamos montando um grupo de pessoas para trabalhar. Nessa oportunidade, se você tem inúmeros pais de famílias e mães de famílias desempregados, e se você tem o nome deles na imprensa. Tinha uma lista negra, negra é ruim falar. Uma lista preta, uma lista ruim na imprensa, que impedia que essas pessoas arrumassem outro emprego. Além de ter esse impedimento, por ter uma manobra para impedir isso, divulgar isso, que você era grevista da Petrobrás, grevista contra a ditadura, muitas das funções da Petrobras não existem no mercado mesmo. Você não tem um operador de refino de petróleo, operador de utilidades de petróleo, e que tenha outra empresa para você trabalhar. Então algumas pessoas nossas conseguiram fazer, conseguiram empregos em áreas administrativas, foram para outro Estado. Alguns companheiros conseguiram emprego em conhecimento que o Jacó já tinha na época do PT, aquelas coisas todas.
CENTRAL SINDICAL
CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES (CUT)
Nós também já tínhamos a CUT organizada, nós entendemos que a greve dos petroleiros de Paulínia e de Mataripe ajudou na constituição da Central Única dos Trabalhadores. Porque o movimento sindical brasileiro estava no marasmo, estava tentando montar uma central sindical e não conseguia. No ano de 1983 nós tivemos seis diretorias cassadas no país. Na greve dos petroleiros de Paulínia foram os Petroleiros de Paulínia, Petroleiros de Mataripe e Metalúrgicos do ABC. Porque na passagem do Lula pelo Sindicato, na véspera da greve, o pessoal firmou um compromisso de fazer uma greve solidária, e fizeram a greve de solidariedade, e em vista disso foram cassados também. Depois nós fundamos a CUT. Quer dizer, esse movimento de cassação, essa agressão a esse conjunto de sindicalistas propiciou uma reorganização, me parece que houve uma indignação. E nós fomos ao Vera Cruz em São Bernardo e fundamos a CUT. E a CUT chama logo uma greve geral. E outras três diretorias são cassadas. São cassados os Bancários de São Paulo, Metroviários de São Paulo e Bancários do Rio Grande do Sul. Então nós éramos seis diretorias cassadas, três antes da fundação da CUT e três posteriores à fundação da CUT. Foi um ano onde a ditadura cassou seis diretorias sindicais. Mas não foi nessa ocasião que o Lula foi preso, porque aí a cassação deles não foi uma cassação tão forte quanto a nossa. A cassação dos Metalúrgicos do ABC foi um afastamento do direito à ação sindical. Não perderam emprego, não perderam salário. A nossa foi mais dramática, porque pegaram tudo, tentaram degringolar nossas famílias mesmo, com essa ação. Mas nós aprendemos também que aí o sindicato não poderia se ater somente a uma arrecadação financeira de sindicalizados, mas que deveria constituir fundos de greve com nomes diferentes do sindicato, com direção de base, com arrecadação própria. Porque na hora que fizesse a intervenção nós teríamos um instrumento para continuar mantendo a greve, mantendo a luta, essas coisas todas. E aprendemos aí a constituir. Eu fui o segundo presidente desse instrumento que nós criamos. O que a gente fez depois da greve que tinha essas diretorias cassadas? A gente reunia as diretorias cassadas.
ENTIDADES SINDICAIS(?)
ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE E CULTURAL DOS PETROLEIROS – ABCP
Se chama até hoje, ABCP, Associação Beneficente e Cultural dos Petroleiros. Porque o pessoal do ABC já tinha trabalhado o estatuto do que eles chamavam de ABC, Associação Beneficente e Cultural, que era o fundo de greve dos Metalúrgicos do ABC. Eu fui lá, peguei o estatuto, e a gente trabalhou em Campinas uma adequação, nós botamos o P no fim, que ficou dos Petroleiros, e constituímos um estatuto dessa ABCP que não fala nenhuma vez a palavra luta, como se fosse um instrumento de políticas sociais, culturais, essa coisa toda. E que tem direção de base. Para quê? A nossa arrecadação, eu não sei quanto o sindicato cobrava do sindicalizado na época, mas que se fosse 1, 5% do salário-base, 1,25% ia para o sindicato e 0,25% por mês ia caindo no fundo. Nós temos um fundo permanente na categoria assim. Existe também, por lei, a contribuição sindical, que nós fomos contra. Petroleiro é contra imposto sindical. Toda compulsória nós somos contra, trabalhamos só com a sindicalização. Nós não abolimos, porque é a Justiça que manda, então em alguns sindicatos de petroleiros do país não se desconta mais, porque o ideal é não descontar do contra-cheque em março; nos Petroleiros de Mauá não desconta. Mas às vezes você vai na Justiça para não descontar e você perde, porque a federação, a confederação tem muita força, a Caixa Econômica tem muita força, para ela interessa esse dinheiro, porque do dinheiro descontado só vem 60% para o sindicato, 40% fica para eles. Então nós somos terminantemente contra. Então o que a gente fez? Da arrecadação sindical, que é a taxa de sindicalização, que é a pessoa que a gente conquista, e que sai do sindicato quando ele quiser, não tem nada obrigatório, uma parcela pequena mensalmente vai caindo na tal de ABCP. Para quê? Para formar um fundo que na hora da cassação, por exemplo, desses 152 cassados nós tivemos quatro ou cinco trabalhando na ABCP. E conseguimos dinheiro da categoria para a ABCP. Que nem, quem voltou da greve, voltou com um compromisso de garantir um fundo para sustentar a volta dos demitidos, certo, que era a ABCP. Então vinha uma arrecadação desse pessoal da base, nós gerenciávamos como sindicato, soltávamos um boletim chamado 6 de Julho, que é a data do início da greve, que era a voz do sindicato, feito por nós da ABCP. E o cara da intervenção, o tal do Wilson, a gente acompanhava a vida dele. Nós fomos para dentro do sindicato, nós não saímos do sindicato, nós fiscalizávamos o interventor. Porque o interventor é obrigado a seguir várias regras: não pode demitir ninguém, não pode admitir ninguém, não pode fazer despesa. Então a gente vivia dentro do sindicato, pressionando esse Wilson e não deixando ele fazer nada. E numa sala a gente organizava a luta da volta, organizava a categoria, construía uma chapa para derrubar o cara. Nós não saímos do sindicato. Como eu era solteiro e morava em casa própria, nessa casinha que a minha mãe fez num terreno vendendo outro, eu fiquei todo tempo. Aí ficou uma companheira chamada Estela Yamakawa, ficou a Vanda Conte, ficou o Celso Seregati. Nós ficamos num grupo de cinco, seis recebendo um salário mínimo desse dinheiro que vinha da base, para ficar ali trabalhando, organizando os processos jurídicos para retornar, organizando os advogados, fazendo assembléias com as famílias, essa coisa toda, e pressionando. Quando acabou a ditadura, e veio o Tancredo Neves para competir no Colégio Eleitoral, pressionando o Tancredo para mostrar a ele que nós fizemos uma greve em defesa da empresa e que a gente tinha o direito a voltar. Então comecei a viajar para Brasília, viajar para o Rio, para garantir a pressão política, e o entendimento para quem estava mandando no país na época, que nós tínhamos direito para voltar para trabalhar.
ENTIDADES SINDICAIS
CENTRO DE FORMAÇÃO E ESTUDOS SINDICAIS – CEFES
Tivemos três ou quatro demitidos trabalhando num Centro de Estudos que nós criamos em Campinas, no começo de 1984, chamado Cefes, Centro de Formação e Estudos Sindicais, que eu fui o primeiro presidente, que organizava trabalhador rural. Então o Jacó foi para a Europa e conseguiu um dinheiro da Igreja Protestante da Holanda para esses Cefes, para a gente organizar trabalhador rural. Eu era presidente do Cefes.
SINDICATO
SINDICATO DE CAMPINAS E PAULÍNEA
INTERVENÇÃO
A intervenção durou de julho de 1983 até abril de 1984. Em abril de 1984 nós já elegemos uma outra diretoria, encabeçada pelo Salvador Betteon, um companheiro da base. Porque mesmo o grevista que voltou tinha medo de colocar a cara numa outra chapa, ou de ser demitido. Então havia uma perseguição muito grande. Havia perseguição dentro da empresa para que ninguém desse dinheiro para a ABCP, entende, pressionava mesmo: “Vocês vão dar dinheiro para esse pessoal? Esse pessoal vai levar vocês à loucura! Perdeu emprego, perdeu família, não sei o quê!” Então essa ABCP tinha que acudir companheiros que estavam sendo despejados porque não tinham dinheiro para pagar aluguel. A gente comprava saco de batata, saco de arroz, chamava os demitidos e dividia. A gente criava um instrumento de integração e daí fazia articulações políticas, articulações com a empresa, processos jurídicos. Tem uma gama, montamos como se fosse um escritório de ação política para gerenciar essas coisas todas, e eu era o presidente. Começou essa ABCP com um companheiro chamado Eduardo Paulielo Machado de Sousa, mas que não era tão politizado e acabou largando, e eu fui indicado pelos demitidos para assumir a presidência da ABCP e fiquei presidente da ABCP e presidente do Centro de Estudos, Cefes, que organizou dois sindicatos rurais no país. Com o dinheiro que veio da Holanda nós pudemos contratar gente. Contratamos cinco nossos mesmos, certo, de diretores cassados e demitidos, que pudessem dar cursos e orientar trabalhadores rurais. Aí organizamos trabalhadores rurais de Sumaré, uma cidade perto de Campinas, que existe até hoje, é filiado à CUT, e os trabalhadores rurais de Cosmópolis, também filiados à CUT. E fundamos dois sindicatos, com palestras, discussões, acordando de madrugada, vivendo uma vida sindical totalmente diferente do que os petroleiros viviam, para mostrar solidariedade, essas coisas todas, e que também tem instrumento de fazer um trabalho político-sindical e garantir emprego para as pessoas. Então, 5 aqui, 5 ali, já eram 10 dos 152 que estavam ali permanecendo na luta e garantindo uma certa sustentabilidade. Outros arrumaram emprego, foram para outro Estado, pegaram o dinheiro da indenização e montaram negócio próprio. Porque quem não recebeu indenização foi a diretoria cassada, que fica tudo bloqueado até apurar o inquérito administrativo. Que cancelamos 2 anos atrás, depois de 18 anos. Você hoje em qualquer ONG no país, qualquer empresa no país pode fazer um projeto político e conseguir captar recursos para garantir a sustentabilidade dele. O nosso trabalho sindical era nesse campo de organização de trabalhadores. Nós montamos uma estratégia para organizar trabalhadores rurais, que era uma política não só de compromisso político mas de tentar arrecadar um dinheiro. O Jacó Bittar tinha um certo conhecimento já, através da construção da CUT. Ele chegou a ser secretário de Relações Internacionais da CUT. O Jacó Bittar conseguiu contatos internacionais mostrando a importância da nossa luta e que era preciso investir nesses petroleiros punidos pela ditadura. Então conseguimos, ele foi à Europa. Na verdade não foi ele, foi o Caravante. Francisco de Paula Garcia Caravante foi para a Europa, um companheiro nosso que na época era secretário geral do sindicato, e voltou garantindo esse aporte financeiro. Eu era o presidente do Cefes, e a Estela Yamakawa, eu acho, era a tesoureira. Nós recebemos esse recurso e a gente administrava no investimento e pagamento da infra-estrutura, uma casa alugada na rua Regente Feijó. Eu só sei que alugamos duas casas, eu ficava meio dia em um e meio dia no outro, ou um dia em um e um dia no outro, eu não agüentava mais.
REINTEGRAÇÃO DOS DEMITIDOS
Até que eu falei: “Não, a prioridade é a reintegração dos demitidos, e eu vou botar outro presidente no Cefes.” Então elegemos outro presidente no Cefes. Então elegemos outro presidente para o centro de estudos, e eu fiquei só priorizando a luta pela reintegração dos demitidos, dentro da ABCP. Aí a gente ia avançando dentro dos processos jurídicos e avançando nos contatos em Brasília, até que o Tancredo, em uma das reuniões comigo, falou assim: “Olha, tudo bem, estou convencido, em maio de 1985 vocês vão subir a rampa do Planalto e nós vamos reintegrar todo mundo na Petrobras.” Eram 300 e poucas pessoas, 152 de Paulínia e 200 de Mataripe. Falei: “Está bom!” Aí eu volto para cá. Cada vez que eu volto de viagem o sindicato lotava de gente, porque eram 152 pessoas e as famílias das pessoas. Então a gente marca reuniões aos sábados. Cada vez que ia para o Rio negociar e voltava, tinha aquelas assembléias grandes. Aí eu dei essa notícia: “Olha, nós vamos voltar tudo para Petrobras!” Aí não sei quem falou assim: “E se ele morrer?” Eu falei: “Poxa, só falta morrer!” Aí vai e o homem morre mesmo! Aí morreu o Tancredo, e o que aconteceu? Como se fosse uma ducha de água fria em todo mundo, porque havia o compromisso gravado, documentado, ele dizendo. A gente tinha conseguido convencer o futuro presidente da República que a Petrobrás foi defendida por nós naquela greve e não o que a ditadura dizia - que a gente estava destruindo a empresa. Aí nós tivemos que fazer contatos com o ministro de Minas e Energia dele, que era o Aureliano Chaves. E começamos a pressão no Aureliano. Então ia sempre a comitiva da Bahia e a comitiva paulista, que tinha os demitidos da Bahia e daqui. Eu acabei liderando todo esse processo, liderava dentro da Petrobras também. O Aureliano chegou um momento que ligou para o Beltrão, que era o presidente da Petrobras, e falou assim: “Olha, não agüento mais esses petroleiros aqui, monta uma comissão com esse pessoal para analisar a possibilidade desse pessoal voltar a trabalhar.” Que era diferente do que o Tancredo tinha dito, que ia voltar todo mundo. Mas não tinha jeito, não tinha muita saída, a gente tinha perdido essa parte importante que foi um convencimento político do presidente da República, a palavra dele não voltar atrás. Aí continuamos a negociar, fomos para o Rio, aí a Petrobras vai e monta uma comissão paritária, que eram três petroleiros que ela indicou, e nós indicaríamos três. Da nossa turma daqui era eu, Jacó Bittar e um companheiro da Bahia, que fazia parte dessa comissão tripartite; e da empresa eram três, o Walter Vilela Vieira e outras duas pessoas lá de que eu não me lembro o nome agora. Aí negociamos, negociamos, até que em julho de 1985 voltou a primeira leva, quase 90% do pessoal voltaria. Só que a empresa fez três listas. Fez uma lista de conjunto de pessoas que podiam voltar para a Replan, que podia voltar para Mataripe, porque não tinham problema com a gerência local. Montou uma outra lista menor, de pessoas que podiam voltar a trabalhar na Petrobras, mas não podiam voltar nem para a Replan nem para Mataripe. E montou uma lista de 36 baianos e 22 paulistas que não podiam voltar mais. Tinha que aceitar ficar fora. Aí foi a nossa grande dúvida, a grande dúvida: “O que fazer?” “Bom, para mim não tem dúvida, cata as listas e vamos para a assembléia.” O primeiro nome da lista de quem tinha ficado de fora era o meu. Depois da greve eu cresci muito em respeitabilidade à categoria porque eu me dediquei integralmente à questão da reintegração. Não fui trabalhar, eu sobrevivia com o dinheiro que recebia do rateio dessa arrecadação da base, e ela presidia a ABCP, então passei a ser uma referência. O que o Jacó foi até a greve eu passei a ser depois da greve, porque o Jacó foi cuidar da CUT, do PT. Ele fazia também a questão da reintegração, atuava nos momentos fundamentais, mas não ficava no dia-a-dia. O dia-a-dia éramos nós ali, aquela turminha que eu citei agora há pouco, da ABCP, carregando o piano e fazendo as investidas políticas. Então foi um drama para a assembléia fazer a aceitação com o meu nome e de outras pessoas ficando fora. Mas nós sabíamos que abria a porteira, como a gente dizia na época: “Abre a porteira, volta a maior parte agora, a gente não tem mais como sustentar essa situação, é muita gente perseguida ainda.” Estava no fim da ditadura só, não tinha regularizado nada direito, nem o país, nem a democracia no país ainda estava regularizada. E aí aprovamos com muito choro, talvez tenha sido a assembléia mais emocionante de que eu participei na vida, de deliberar, ler a lista das pessoas que iam ficar, que iam ser transferidas para outros lugares, e as que iam ficar fora. E eu era a liderança que a Petrobras respeitava e que também tinha autorização para ir negociar na Bahia - ela me pagava às vezes até passagem para a Bahia - para fazer as discussões pelo país inteiro. Porque a ditadura e a Petrobras fez tanto a nossa caveira durante a greve que mesmo essas pessoas... Quem voltava para a Replan e para Mataripe não tinha tanto problema, estava voltando para onde fez a greve, mas as pessoas, mais ou menos uns 40 da Replan, que tinha que colocar em outras áreas do país, e elas podiam escolher, mas eu tinha que negociar com o superintendente, eu tinha que ir para Caxias, tinha que ir par São Sebastião, para Cubatão. Eu tinha que ir para lugares onde não tinha tido a greve para ver se aceitavam mecânico, se aceitavam eletricista, esse pessoal que podia voltar. A Petrobras tinha que ajudar, só que aí eu chegava, eu grevista, que estava ficando fora porque era perigoso, teoricamente o mais perigoso, eu tenho que convencer o superintendente a receber um outro grevista? Então às vezes a gente ia junto com a Petrobras. E na verdade isso acabou dando certo, distensionou muito essa coisa quando começaram a voltar as pessoas. E aí nós concretizamos essa primeira fase com muito sacrifício. A maioria queria voltar para a plataforma marítima, o pessoal de Campinas queria plataforma marítima: “Aí eu vou trabalhar 14 dias, folgo 21 e não preciso mudar!” Porque o problema era mudar também. “Ah, não vou mudar com a minha família!” E para colocar, às vezes não tinha nenhuma função lá na plataforma. Mas acabou indo, acabamos administrando bastante isso. E esses 22 que ficaram fora, eu vi que a Petrobras ia ter essa coisa de não ter aceito a volta como uma coisa firme, não ia querer deixar voltar mais mesmo, eu montei uma estratégia em 1985 que foi combinada com o sindicato, mas que o Jacó acabou ficando meio bravo. Que era o seguinte, o Jacó estava na lista dos fora também, estava na lista dos fora. A Petrobras pega e oferece o triplo da indenização para quem ficou fora. Eu falei: “Eu não aceito, é ponto de honra meu voltar a trabalhar!” A Petrobras já tinha me proposto voltar para Manaus, porque, como eu era muito organizado, eu ia com as listas de todos os demitidos, quem ia fazer isso, quem ia fazer aquilo, debatia com a empresa todas as situações, ela estava precisando de uma pessoa assim em Manaus e queria me botar na refinaria. Só que ela propôs, e eu combinei com uma outra namorada de Campinas, que a gente até poderia ir para Manaus e depois de um tempo voltar para a Replan, ela não aceitou, não sei o quê, e a coisa acabou estragando um namoro, como a outra garota. Essa garota trabalhou na Petrobras depois que a gente tinha terminado, a Maria Helena. E ela voltou atrás de maneira surpreendente. Ela falou: “Não, você não vai mais para Manaus!” Falei: “Está bom!” Que era um trunfo. Se você está fora e se compromete a voltar onde ela queria pôr e volta atrás, uma hora eu ia servir como um trunfo ali. Só que a coisa começou a demorar muito, o que eu fiz? No acordo coletivo de setembro de 1985 nós conquistamos a figura do delegado sindical de base. Aí eu falei para esse Salvador Betteon, que era o presidente: “Salvador, eu vou entrar de candidato, vou entrar de candidato a delegado sindical de base - porque a eleição ia ser de base - vou ganhar a eleição, porque hoje eu sou muito respeitado aqui e eu vou barganhar com a Petrobras. Se eles não querem que eu fique numa refinaria, eu vou ganhar uma eleição e vou barganhar para que eles abram uma negociação de quem está fora.” O Jacó não gostou, veio para o sindicato e disse: “Não, eu quero ser indicado!” “Mas que indicado, vamos para a eleição!” Mas se ele fosse para eleição ele perdia de mim na base, com certeza perdia. Aí criou uma certa crise. Aí eu banquei na diretoria do sindicato, passou que eu deveria sair candidato. Eu saí candidato, o Wagner Luiz Constantino de Lima, e saiu candidato o tal de Bregué, que eu não sei o nome do Bregué. Tem apelidos que são fortes. Aí fomos para a eleição. Quando eu lanço a candidatura, o Rio de Janeiro, um assessor do Beltrão, na verdade o consultor da presidência, chamado comandante Baltazar, me liga na ABCP de Campinas: “Que negócio é esse? Se você sair candidato nós vamos demitir quem já voltou!” Falei: “Duvido que vocês tenham peito de demitir quem já voltou! O que eu posso conversar com você é o seguinte: eu nem fui eleito ainda, e se eu perder a eleição, não posso concorrer? Eu sou funcionário da refinaria de Paulínia sub judice!” Estavam os processos lá contra mim. Aí ficou aquela crise, a ameaça deles. Aí eu saí candidato, ganhei em primeiro, o Wagner em segundo, o Bregué em terceiro. E o sindicato, por influência do Jacó, porque o Salvador era da influência do Jacó, não indicava o meu nome. Aí tive que voltar para a diretoria, dar cacete na diretoria para indicar o meu nome, porque eu quero a indicação para ser trunfo para ir para o Rio e discutir a minha volta para Paulínia. E se eles mantiverem que eu não volto, eu quero fazer um debate político. Posso até não voltar. Eu faço uma assembléia explicando que eu não volto, mas eu quero abrir a discussão dos 58 que estão fora. Aí o comandante Baltazar veio para cima mesmo, depois da eleição: “Você está dando uma garrinchada!” Que era a palavra que ele usava aqui no Rio, que é dar um drible. Falei: “Garrinchada, o que é isso?” “Você está querendo dar uma volta em mim, está querendo dar um drible!” Eu falei: “Não, não tenho culpa se a base me elegeu! Mas vamos discutir!” Eu condicionei na convenção para sair candidato, que se desse problema com a reintegração eu avaliaria. Eu fiz um condicionante, deixei uma coisa atrás para avaliar. Falei: “Está bom, eu vou para o Rio, vamos conversar!” Aí foi para o Rio o Jacó, eu e o Salvador. O Jacó não queria que eu ficasse em Campinas, por quê? Porque tinha uma disputa que começa a crescer e uma liderança crescendo. O Salvador também não queria, por influência do próprio Jacó. Salvador eu acho que nem tinha nada contra mim, mas eu sentia uma preocupação. Tem um rapaz aposentado em Paulínia, chamado Muzambinho, que tem o apelido Muzambinho, que falou assim: “Spis, nem vai, você já saiu perdendo de 2 a 1 aqui. Toda a Petrobras é contra você voltar para cá, e esses dois são contra você ficar aqui!” Falei: “Não, eu vou, eu vou, que eu quero fazer a polêmica!” Aí subimos lá no elevador e fomos lá no sétimo andar da Petrobras, e o chefe do serviço de pessoal - chamava Heitor Chagas de Oliveira. Parece que este cara está voltando agora com o José Eduardo Dutra. Heitor Chagas de Oliveira. É um sujeito que veio da iniciativa privada - nós questionamos bastante na década de 80 - e parece que agora ele volta no setor de Recursos Humanos no lugar do Lima, não sei bem.
SINDICATO
SINDICATOS RURAIS DE SUMARÉ E COSMÓPLIS
CAMPANHA DE SOLIDARIEDADE
É, esses sindicatos foram fundados num momento muito difícil de organização rural no Brasil. Rural é sempre mais difícil organizar. Primeiro pelos horários que eles praticam; segundo pelo trabalho escravo que existe na maioria do trabalhador rural brasileiro; e uma grande parte deles não sabem ler. Então não tem um panfleto que você entrega, um documento educativo. Você precisa acordar de madrugada e disputar os momentos em que eles se organizam ali perto dos caminhões e dos ônibus rurais com o gato, que é o capataz da fazenda e que anda sempre armado. Tem muita tensão no campo brasileiro e nós passamos por momentos difíceis nessa organização. Nós trazíamos alguns aos Cefes para fazer alguns cursos aos finais de semana, mas também é difícil, porque eles têm pouco tempo livre, os trabalhadores. Nós conseguimos organizar o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Sumaré e o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Cosmópolis. Os dois hoje são filiados à CUT e os dois são atuantes ainda.
SINDICATO
SINDICATO DOS PETROLEIROS DE SÃO PAULO, SÃO CAETANO,BARUERI, GUARULHOS, GUARAREMA E SUZANO
FUNDAÇÃO
E eu fundei, na minha volta da Petrobras para São Paulo, o décimo-sétimo Sindicato dos Petroleiros do país, o Sindicato dos Petroleiros de São Paulo, São Caetano, Barueri, Guarulhos, Guararema e Suzano. Sindicato que na época tinha mais ou menos 2.000 trabalhadores, que estavam desorganizados e que a gente conseguiu constituir. O sindicato existe também até hoje, está se fundindo com Campinas e Mauá, para constituir um único Sindicato entre estas três entidades.
REINTEGRAÇÃO DOS DEMITIDOS
Tem mais um pedacinho que ficou para trás, que é de quando nós conseguimos reabrir a discussão de renegociação dos 58 petroleiros que ficaram fora, daquela vez que ficou fora. Eu saí candidato a delegado sindical de base e ganhei a eleição, e quando nós fomos ao Rio para garantir a minha volta à empresa, a empresa bancou pesado que eu não deveria voltar, que a empresa estava digerindo a reintegração, e que se eu voltasse ela teria uma congestão e mandaria o pessoal embora. Eu falei: “Eu deixei condicionado na convenção para tirar o nome para delegado que se tivesse algum problema a gente negociaria. Qual é a proposta então?” “A proposta de que você não fique!” “Está bom, eu faço uma assembléia de base, esclareço à base que eu não vou ficar, assumem o Wagner e o Bregué, os dois outros candidatos, e a gente abre a negociação de quem ficou fora e que vocês não querem voltar mais.” A empresa concordou. Aí ficou pendente o seguinte: eu ir para Campinas e fazer a assembléia. Só que, descendo o elevador, saindo do sétimo andar, em que foi a negociação, descendo o elevador, eu, o Jacó e o Salvador, eu falei: “Eu vou voltar lá e abrir mão agora, e eu faço assembléia para explicar por que eu abri mão, mas eu vou exigir a retomada da negociação agora, porque esse é um grande trunfo para nós.” “Muito bem!” E me aplaudiram. E essa posição era não ficar mais em Paulínia. Aí voltamos para a sala, peguei o pessoal ainda reunido e falei: “Olha, eu vou voltar para Paulínia e fazer a assembléia, porque eu não fico. Agora, eu quero marcar já, eu quero ficar no Rio já para começar a negociação do pessoal que ficou fora.” Por que já não eram mais 58. Porque quando eles tinham oferecido um valor de indenização, uma parte tinha pego. Então rapidamente eu fiquei no Rio, e nós começamos a negociar a volta, e a condição para esse pessoal voltar era a seguinte: não era nem de voltar para as bases grevistas e nem de escolher para onde queria ir. A empresa escolheria onde eles podiam ir. E fizeram uma outra proposta de indenização. Eu falei: “Enfia onde vocês quiserem, que eu vou voltar nessa empresa e mostrar que a gente tinha razão!” E aí as pessoas voltaram mesmo. Alguns eu tive que fazer um cálculo de salário. Por exemplo, o Demétrio Vilagra, que voltou comigo, era operador de refinaria em Paulínia; não era mais aceito em refinaria. Eu peguei o salário bruto dele e trabalhei com o administrativo mais 30%, porque o administrativo não tem turno, não tem os adicionais de periculosidade, não tem os adicionais agressivos ao relógio biológico, mas tem a periculosidade, então administramos o salário para dar mais ou menos o mesmo líqüido. E duas ou três pessoas voltaram comigo, assim, para o prédio da Petrobras em São Paulo, na época chamava Espal, hoje chama Edisp, sendo transferidos de áreas operacionais para administrativas. Então foi uma alternativa que nós conseguimos. E só não voltou para a Petrobras quem não quis, daquela greve; só quem não quis, porque em diversos momentos houve essas estratégias de garantir na negociação a prioridade e o direito ao trabalho. E eu acabei voltando para São Paulo em 1986. Eu garanti o direito de retorno em outubro de 1985, mas como eu é que negociava a volta de todo mundo, eu ganhava salário sem voltar. Então eu ia para o Rio, para a Bahia, fazia reuniões com esses outros órgãos para receber as pessoas. Eu praticamente era um agente da Petrobras, além de ser o grevista, da comissão da greve, que eu passei a ser muito respeitado, e administrava a volta também. Então voltei a trabalhar efetivamente no setor de recursos humanos da Petrobras em São Paulo em março de 1986, e recebi salário sem trabalhar de outubro de 1985 a fevereiro de 1986, fazendo essas viagens. Eu fui o último que voltei, depois que estava resolvida a situação de todo mundo da greve de 1983.
CENTRAL SINDICAL
CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES - CUT
Naquele período foi a retomada da democracia mesmo. Não só do que se dizia de anistia ampla geral e irrestrita - que nós recebemos de volta muitas pessoas punidas pela ditadura, diversos setores culturais, políticos, sindicais, muitos setores -, mas retomamos a democracia na relação capital-trabalho. A constituição da CUT propiciou muito isso, e passou a haver mais respeito ao trabalhador e à trabalhadora nos processos negociais. A CUT foi fundamental, porque passou a existir no país uma central sindical questionadora, que vinha já com uma vitoriosa luta contra a ditadura Figueiredo. A CUT foi constituída durante a ditadura Figueiredo, fazendo diversas campanhas pela anistia. Aí ela vem vindo nesse passo democrático, crescendo cada vez mais, se constituindo como a quinta central sindical do mundo, e sempre questionadora e intransigentemente na defesa do direito dos trabalhadores e trabalhadoras. Foi fundamental para a democracia e para a relação capital-trabalho. Todo mundo cresceu mais ou menos junto nesse período, porque havia uma unidade muito grande contra um inimigo comum, que era a ditadura. Depois da ditadura, o crescimento da CUT e do próprio PT, eles foram crescimentos um pouco disformes. Porque se nós passamos a não ter mais o inimigo comum, nós passamos muito a ter muitos conflitos de disputas internas. Muitas correntes políticas, muitas disputas internas que acabam nos minando internamente. Tem muitas eleições sindicais com duas, três chapas da CUT. Chegamos ao cúmulo de ter seis chapas da CUT numa única eleição. Então há uma diversidade muito grande, por respeito ao conjunto das idéias, mas que acaba nos minando internamente por algumas disputas às vezes fratricidas. Havia uma ânsia de fazer política, então o pessoal veio com muita vontade. Aí muitos setores se consolidaram, muitas forças políticas acabaram credenciando a sua organização dentro do campo cutista, dentro do campo petista. Essas pessoas se misturavam muito, porque você tem um partido fundado em 1981 e a CUT fundada em 1983. As pessoas hoje ainda são as mesmas, com poucas variações, vivendo as duas situações. Então se mistura muito a questão partidária com a questão sindical no Brasil.
SINDICATO
CONQUISTAS TRABALHISTAS
As conquistas sindicais e trabalhistas se consolidaram na Constituição de 1988, que nós tivemos ratificado em lei que a jornada de trabalho por turno ininterrupto de revezamento deve ser de seis horas por dia. Aí tivemos um problema grande, porque nós só temos essa jornada aí na área de Manguinhos, que é uma refinaria privada, no Rio de Janeiro, e parte da refinaria de Cubatão. E os petroleiros não quiseram as seis horas - apesar de ser uma luta histórica, eles preferiram oito horas, aumentando mais um turno, mais uma turma, o que dá um período de folga maior. Mas onde a lei diz que você tem que trabalhar seis horas e você trabalhar oito, você faz duas horas extras por dia. Então não tem mais folga, tem acúmulo de hora extra para depois compensar. Mas mesmo assim nós perdemos as assembléias, fomos perdendo e foi muito ruim para nós. Mas a maioria das conquistas pelas quais que lutávamos mais, estão incluídas lá na Constituição de 1988, e elas só não são praticadas para quem abriu mão delas, ou para quem não as buscou. Então, do ponto de vista da conquista foi por aí. Nós tivemos muitos avanços com o crescimento da CUT, a CUT cresceu demais e garantiu realmente diversos momentos importantes. Agora, tivemos um refluxo também de 1994 até 1999, com a chegada do Fernando Henrique, que em 1994 já era ministro do Itamar. Com o relativo controle inflacionário que eles conquistaram com um projeto de política econômica embasado na moeda Real, e que trouxe um recrudescimento das greves. Isto é verdadeiro. Eles criaram as URVs, Unidades de Referência de Valor, em 1994, transformaram na moeda Real; congelaram os salários no piso e os preços no pico, para beneficiar os empresários e os banqueiros; trabalharam com altas taxas de juros. E nós tivemos grandes problemas. O recrudescimento de greves trouxe acordos coletivos que só mantiveram o direito ao trabalho e não tiveram nenhuma conquista no que se refere à reposição, e passamos a ter a maior exclusão social e desemprego da história do país, chegando ao ponto hoje de ter 22 milhões de pessoas na miséria absoluta, abaixo da linha da pobreza, que são as pessoas a que o Lula quer dar comida, quer ter a alternativa de alimentação para essas pessoas. Então foi um projeto excludente, que de 1999 para cá começou a se desgastar ao ponto de que não só o desgaste, mas o crescimento do companheiro Lula, propiciou a nossa vitória histórica em 2002.
CENTRAL SINDICAL
FORÇA SINDICAL
Mas foi um período difícil pelo qual a CUT passou, também esse período, devido a esse relativo controle inflacionário, mas também ao crescimento da Força Sindical, uma central sindical de direita, aliada do governo de direita e que aceitava redução de jornada, redução de salário, demissão temporária, aquelas tais de lei off, e outras coisas mais que trouxeram muitos problemas para a classe trabalhadora.
SINDICATO
CONQUISTAS SINDICAIS
Talvez nós tenhamos a melhor cláusula de garantia no emprego do país, do acordo coletivo petroleiro, talvez, porque ela é baseada na convenção158 da OIT, e que o Fernando Henrique retirou a assinatura do Brasil. Era uma convenção ratificada pelo governo brasileiro, que não permitia a demissão imotivada, e que daí o Fernando Henrique deixou de manter essa medida, e nós conseguimos inserir no acordo coletivo petroleiro. Na Petrobras hoje nenhum sindicalista, nenhum trabalhador tem a surpresa de ser demitido. Quem chegar para trabalhar amanhã não tem demissão. A chefia precisa demonstrar a intenção de demitir, monta uma comissão que em 48 horas se posiciona, e o sindicato participa, o advogado participa. E uma categoria mobilizada como a nossa, se for atingir um companheiro que realmente vai ser agredido por uma demissão injusta, e se ele tiver algum respaldo de base, ele contata o sindicato nesse período, a gente mobiliza a base e às vezes consegue segurar a demissão, às vezes não consegue segurar a demissão. Mas eu participei de diversos processos de truculência de chefia que a gente foi em cima, impediu a demissão. Às vezes até nem ficou na mesma base operacional, foi mudado de base, mas foi transferido mas não foi demitido da empresa. Então é um dispositivo inserido no acordo que permite que o sindicato se mobilize antes de se concretizar a demissão. E se o sindicato for bom, tiver ação sindical, ele segura. Agora, no Brasil não existe dispositivo de garantia no emprego, é uma bandalheira a lei do fundo de garantia. Você chega para trabalhar e falam: “Olha, você está demitido, passa lá no caixa, pega o seu direito ao salário e está aqui a guia para tirar o fundo de garantia.” O fundo de garantia é o depósito mensal da tua demissão. Antes nós tínhamos uma lei de estabilidade no emprego depois de dez anos, era uma lei que respeitava o trabalhador que se mantinha no trabalho durante um período. Hoje não existe, depende muito da força sindical e de como essa força sindical insere no acordo coletivo dispositivos de garantia de emprego, que na maioria são renovadas de ano a ano. E ano a ano você pode ter um direito bom, e ele cai no outro ano dependendo da tua força. Então, do ponto de vista da segurança no local de trabalho, nós também temos a melhor cláusula do país, que é a cláusula de direito de recusa em situação insegura. O petroleiro chega para trabalhar, pressente que vai ter algum perigo lá para a vida dele, pode chamar a Cipa; se não tiver, chama o delegado de polícia, chama o sindicato. Isso é lei, é acordo coletivo petroleiro. Mesmo assim morrem dois petroleiros por mês. Lei de 1998. Então não depende só do dispositivo.
SEGURANÇA DO TRABALHO
No Brasil inteiro. Nossa média é macabra, e não pára. Infelizmente ela é um grande desafio para o novo presidente da empresa, José Eduardo Dutra, para tentar corrigir isso. Porque eu acho que não depende só de investimento, de contratação de boas empresas, tem que rediscutir os princípios de segurança na empresa, num parque industrial como a gente vive, e que de 1995 para cá está sendo sucateado para, anteriormente, ser colocado na linha da privatização. Hoje se reprioriza isso e pensa-se numa empresa mais pública, com visão mais social, com responsabilidade social. Mas infelizmente muitos petroleiros foram mortos. Ficaram mais famosas as mortes da P36, a maior plataforma do mundo, que afundou, mas de 1998 para cá a gente resgata este nosso índice - é muito ruim, mesmo com boas cláusulas do acordo coletivo. Então, segurança no emprego, segurança para entrar para trabalhar e sair com vida, existem muitas cláusulas, nós temos boas cláusulas. O problema é que há realmente uma ação sindical necessária e uma cobrança da ação sindical às empresas para que realmente invistam com seriedade na segurança.
Não é só falta de investimento, a Petrobras investe muito dinheiro, é falta de rediscutir os princípios de segurança. Alguma coisa está errada para dar tantos acidentes, tantas mortes assim na Petrobras. Em todas as áreas operacionais acontecem acidentes - plataforma, terminais de distribuição de derivados, plantas de prospecção, refinaria, transporte. Porque às vezes o acidente nem ceifa uma vida, mas danifica o meio ambiente. A Petrobras, se puxar pela história, tem muitos acidentes gravíssimos que aconteceram e que ela paga indenizações pesadas às cidades, aos Estados e às viúvas. A Petrobras é pródiga em pagar indenização para viúva. Na verdade não tem lei que pague indenização. E agora que está saindo a indenização da P36, depois de dois anos. Então é sempre muito morosa, ninguém paga uma vida. Não sei nem quanto é, pode ser o valor que for, não paga. Agora, pegar o direito à indenização, legal, é necessário também, porque tem toda uma situação que envolve a família, filhos, direito a estudos, essas coisas todas, que a pessoa tem que pegar. Não significa que a pessoa possa ficar contente. Agora, radicalizar e não pegar, isso daí vai a vala comum, não vai para ninguém, isso daí vai acabar ficando e talvez ser devolvido à empresa, não sei.
CENTRAL SINDICAL
FEDERAÇÃO ÚNICA DOS PETROLEIROS - FUP
A FUP surgiu em 1993 por uma necessidade de organização mais nacional da categoria, e que tivesse uma organicidade, e que tivesse uma dinâmica de negociação mais no dia-a-dia com a Petrobrás. Porque antes da FUP nós tínhamos comandos de greve, que se reuniam nas épocas de negociação. Eram eleitos em congresso. Por exemplo, geralmente o congresso em julho elege um comando, entrega uma pauta para a empresa e negocia. Este comando eleito lá no congresso negociava a campanha salarial; depois ele se dissolvia. E nós elegíamos outro comando no outro congresso do ano subsequente, e outra pauta. Nós achamos que isso era ruim. Tinha que ter uma federação que tivesse vida orgânica e no dia-a-dia fizesse os embates com a empresa e fosse limpando. Por que esperar lá setembro para negociar segurança, negociar saúde, por que a gente não poderia ter uma comissão que negociasse no dia-a-dia? Havia um problema de que havia uma federação pelega, chamada Federação Nacional dos Petroleiros, constituída por um tal de Maia, de Minas Gerais, uns pelegos da categoria que fizeram essa federação à revelia. Por quê? Para pegar o imposto sindical, a taxa compulsória descontada. Porque 40%, parte dela vai para a federação. Nós éramos contra, mas eles constituíram legalmente isso, e acabou vingando. Então nós construímos em 1993, no congresso nacional da categoria, em Cubatão, a Federação Única dos Petroleiros. Eu fui escolhido para ser o primeiro coordenador da categoria, e que tinha que construir essa federação, e que tinha que enfrentar a federação pelega. Como eu fui escolhido, tentei negociar com a minha companheira para mudar para o Rio de Janeiro, porque escolheram que a federação ia ser no Rio. Estava em dúvida se era no Rio ou se era em Brasília. Ela me diz: “Se for em Brasília eu mudo, se for no Rio eu não mudo!” Aí foi para o Rio. Aí eu ficava viajando que nem maluco, às vezes uma vez só por mês. E aí fomos construindo a federação e trouxemos todos os 19 sindicatos para a Federação Única dos Petroleiros. Alguns não eram da CUT, cinco não eram cutistas, e nesse trabalho todos viraram cutistas. Nós fizemos um trabalho de filiar na CUT. Só não é cutista hoje um sindicato, Sindicato dos Petroleiros de Rio Grande, uma cidade chamada Rio Grande, no Rio Grande do Sul, que só tem a refinaria da Ipiranga, com 200 trabalhadores. No Rio Grande do Sul nós temos um grande sindicato lá, que é o sindicato da Refap, da Refinaria Alberto Pasqualini. E para enfrentar a federação pelega, que era só uma federação de cartório e tinha uma sede no Rio, eu pensei no Rio de Janeiro, com o companheiro Davi, que era um companheiro da direção da Bahia, e falei: “Davi, vamos mudar para dentro da sede da Fenap - que era a Federação Nacional dos Petroleiros, em Brasília - e quebrar a placa da porta e escrever FUP e acabou, a gente toma conta e depois vamos no legal para dissolver.” “Ah, mas não vai dar certo!” Falei: “Ah, vai ter que dar certo!” Numa das vezes em que a gente foi para Brasília, para fazer uma negociação com parlamentar, eu fui de mala e cuia e fui lá e peguei uma quarto lá dessa federação. Era uma casa com dois andares, com saída para duas ruas. Entrei lá, um tal Mike falou: “O que você está fazendo aqui?” “Não, eu vou me instalar aqui, eu vim fazer algumas discussões aqui em Brasília dos petroleiros.” E nos instalamos, começou a haver reunião, o pessoal foi, que eu era o coordenador. Aí foi lá o Davi e falou: “Onde que é a reunião?” “A reunião é em Brasília, vem para cá!” Aí em Brasília ficou aquele pessoal nosso. A outra não tinha vida orgânica, não tinha representatividade. Eu quebrei mesmo a placa da porta, botamos outra placa. Proibi as funcionárias de falar que era Fenap, tinha que falar que era FUP. Aí começou um terrorismo, que o pessoal da antiga federação falava: “A CUT vai tomar conta e vai mandar vocês embora!” “A gente não vai mandar ninguém embora!” E fomos para cima, e virou mesmo, virou assim. E depois na Justiça a gente começou a reverter. Como eles começaram a ficar com receio da gente, porque a gente invadiu, o tesoureiro chegou a deixar os cheques todos assinados comigo, lá da tal Federação Nacional dos Petroleiros. E eu fiz ele assinar alguns papéis em branco. Num destes papéis em branco eu convoquei um congresso nacional para dissolver a Fenap, um congresso nacional para dissolver. E o pessoal veio. Veio, e fomos lá e dissolvemos em congresso. Legitimamente a gente dissolveu e encaminhou a papelada para legalmente também dissolver. Sei que recentemente aí o pessoal da FUP até pegou esse dinheiro retido do imposto sindical. Parece que acabou mesmo tudo. Mas foi na marra sim, porque era absurdo. Que nem, você ia para Brasília fazer um debate e chamava: “Eu sou o coordenador da Federação Única dos Petroleiros!” Aparecia um palhaço lá com um cartãozinho da Federação Nacional dos Petroleiros. Parecia que a Federação Nacional era mais forte do que a minha: “Ah, está louco, isso não vai poder acontecer aqui não!” Aí fiquei, me emputeci, fomos para dentro e quebramos mesmo, e na marra. Foi assim. Legalmente ela tramitou também, tanto por esse congresso que nós chamamos para fechar, tanto no processo jurídico legal. Que nem, hoje não existe mais esse ranço, essa história feia da categoria, esse pessoal todo está no ostracismo, não representa mais nada na vida petroleira. E existe a Federação Única dos Petroleiros, respeitada pela sua luta, pela sua história, hoje coordenada pelo companheiro Carrara. Foi assim. Eu mudando para o Rio, nós alugamos um apartamento no Flamengo, eu peguei o quarto da empregada, porque eu fiquei fixo. Aonde eu vou eu me dedico integralmente. E também tinha já o banheirinho conjugado ali. E todo o pessoal do Brasil que ia para lá pegava os outros quartos, ficava numa certa rotatividade, mas eu tinha lá o meu guarda-roupinha com as minhas roupas e não sei o quê. Eu sou muito organizado, eu tinha uma lista das coisas que eu tinha, coisas pessoais, que eu tinha no Rio e em Brasília. Cada vez que eu ia em Brasília eu olhava a lista e: “Opa, o que eu tenho lá, quantas coisas eu tenho em Brasília? Ah, eu tenho três cuecas, tenho quatro camisas, cinco camisetas.” Então não precisava levar. Aí: “Ó, eu vou para o Rio. Que eu tenho no Rio?” Eu tinha meus controles de coisas pessoais para viajar e coordenar a categoria. A greve de 1995 nós resolvemos coordenar de Brasília, apesar de não ter petroleiros lá. Mas nós temos um escritório pequenininho, que é um escritório burocrático, umas 40 pessoas, não tem impacto nenhum na conjuntura nacional de fazer uma greve. Mas nós levamos a greve para lá, porque nesse período de 1994, em que o Fernando Henrique já era ministro do Itamar, ele rompeu com o movimento sindical e não cumpriu nem acordo assinado. Os Correios assinaram acordo com o Itamar, saiu no Diário Oficial e não foi cumprido. Eu assinei acordo com o Itamar Franco em Juiz de Fora, para suspender uma greve, com o presidente da República, assinei acordo com o ministro das Minas e Energia. Tinha o companheiro Rosemberg, que era da diretoria, assinou acordo com o Lima, no Rio de Janeiro, nenhum dos três foram cumpridos. O desrespeito era total com o movimento sindical. Tanto é que houve uma grande indignação nossa, e fizemos a greve de 1995, a maior greve da história petroleira do país. Em maio de 1995, no momento em que o Fernando Henrique já era o presidente, eleito em primeiro turno contra o Lula, tendo eleito a maioria dos governadores e constituído uma verdadeira quadrilha política com PTB, PFL, PMDB, com o ACM sendo o chefe dessa quadrilha, e parecia que ninguém podia enfrentar esse governo. Aí vão lá os petroleiros e botam uma greve de 32 dias, obrigam a cair a máscara democrática do Fernando Henrique, que fazia apologia internacional de democracia e o cacete, e vem para cima. Eu rotulo que esse primeiro desgaste no início do mandato foi construindo a corrosão do governo, que acabou caindo com o Lula aqui no fim. Porque de enfrentamento aí do movimento sindical só tem nós e o MST. Tem uma grande greve dos servidores também no meio, que não teve o mesmo impacto que tem petroleiro, que consegue controlar a energia do país e outras coisas mais. Tem outras mobilizações também: teve a greve da Ford em defesa das demissões, outros fatos importantes do movimento sindical. Mas enfrentamento ao governo, ostensivo contra o governo, que na imprensa aparecia um braço de ferro entre mim e o Fernando Henrique, foi na greve dos petroleiros que foi convocada pela CUT, e que criou essa marca na história sindical brasileira como um grande movimento que precedeu um pouco o MST. O MST foi no segundo semestre de 1995, que foi o início das mobilizações mais permanentes deles, que permanecem até hoje. Hoje são 19 sindicatos. Bom, foi um momento muito fértil da categoria, não só na Federação Única dos Petroleiros a gente tinha uma direção muito coesa, muito respeitada, mas havia uma indignação da categoria pelos três acordos assinados e não cumpridos, por exemplo. Na época de negociação petroleira começa a aparecer muita gente jogando farpa. Na época lá aparecia assim: “Petroleiro tem assistência médica para madrasta! Isto é absurdo!” Começam a aparecer coisas assim para trabalhar na sociedade uma mobilização contra a possível greve dos petroleiros, que sempre acontece, sempre se mobiliza a categoria. Então, eu assino um acordo com o Itamar Franco, não é cumprido; assino outro com o ministro Delcídio Gomes, que hoje é senador, não é cumprido; e o companheiro Rosemberg, que era diretor, estava negociando no TST, ele foi para o Rio acertar o acordo, assina outro com o Lima, que era Recursos Humanos, e não é cumprido. Então a gente fala: “Puxa, nós vamos contar com quem? Assina três acordos com as figuras mais proeminentes do país ligadas ao setor petróleo e ao acionista majoritário, e não é cumprido, então não vale mais nada!” Havia um achincalhe contra a classe trabalhadora. “Não, os petroleiros não aceitam isso!” Então nós fomos para dentro da CUT, pegamos os ferroviários, que não tinham acordo; pessoal dos servidores federais, que não tinham acordo; telecomunicações; Correios; construímos uma greve convocada pela CUT, em que acabaram se sobressaindo os petroleiros, para maio. Veja, nós seguramos o segundo semestre de 1994 para construir esse grande momento. E quando nós entramos em greve, a gente sabia tudo que ia acontecer e sabia tudo que ia fazer. Quando o Fernando Henrique manda bloquear as contas do sindicato, nós mandamos a orientação seguinte: “Façam uma assembléia urgente, reduzam a mensalidade sindical para um centavo de real, 0,01.” Para não caracterizar fraude à execução da sentença lá. A diferença vem para as ABCPs. Quer dizer, nesse momento todos os sindicatos do país já tinham as ABCPs, com estatuto próprio, com direção própria, para ter sustentabilidade através da arrecadação sindical, e continua a luta da categoria. Aí vieram as demissões. “Tudo bem!” Aí saiu no “Jornal Nacional”: “Começaram as demissões na Petrobras!” É o Spis e mais 24, era 25. No dia seguinte eles davam os nomes e eles tinham a seguinte estratégia para dissolver a greve: davam o número e o nome. Só na primeira vez que anunciaram, é o Spis e mais 24. No dia seguinte vinha a imprensa com o nome dos 24. E falava: “Olha, tem mais 35!” E no dia seguinte vinham os 35. Falei: “Ah, é assim?” Fizemos uma assembléia rapidinho na FUP e decidimos lançar as demissões, como é que chama? Esqueci o nome, vou lembrar daqui a pouco. Ia falar demissão temporária, mas não é. Na verdade a categoria começou a assinar a carta de demissão, demissão voluntária. Eu falei: “Vai mandar embora 53? Vai ter que mandar embora os 40 mil!” E orientamos para todo mundo assinar a carta de demissão, e as cartas ficaram na mão da FUP. Dezessete mil petroleiros assinaram carta de demissão, demissão voluntária. Falei: “Olha, se vocês mandarem embora os 52, vamos paralisar a companhia, e quero ver formar petroleiro rapidamente para vir funcionar.” Parou, porque o Raimundo Brito que mandava botar o número e o nome. Só teve duas mensagens na televisão de número e nome, número e nome. Parou. Quando eu fui para a coletiva do dia seguinte: “É demissão voluntária, começa a assinar a carta de demissão e deixa na mão da FUP!” E 17 mil estavam na nossa mão. Aí a gente trocou o ministro: “Vai continuar? Está aqui, a categoria está autorizando fechar a companhia!” E fechava. Então parou. Aí eles foram com a estratégia de convocar trabalhadores do Secra, que é Setor de Craqueamento Catalítico das refinarias, teoricamente porque a gente não estava produzindo gás de cozinha, que é no Secra que produz gás de cozinha. Por quê? Numa aliança deles com as distribuidoras privadas de gás, a gente produzia o gás, porque a gente não parava de produzir o gás, todas as refinarias produziram em respeito às donas de casa, e quando ia para a distribuidora eles seguravam o produto, obrigavam a ter as filas. Porque todo mundo que foi para as filas ficou o dia inteiro, mas comprou o gás, porque quem produz somos nós, e tiveram que pagar ágio. Então começaram a trabalhar um sentimento na sociedade de que nós não estávamos produzindo gás, que era mentira. Até navios, que a Petrobras comprou no mercado spot, nós autorizamos descarregar. Gás de cozinha, outro produto nós não produzíamos mesmo. Mesmo para ter força na greve. Só que aí conseguiram criar essa confusão na sociedade de que nós talvez não estivéssemos produzindo gás. E aí o trabalhador da refinaria de Paulínia, de Mataripe, ou do Rio Grande do Sul, que não ia, eles mandavam uma cartinha de demissão para a casa dele. Então nós tivemos um conjunto grande de trabalhadores do Secra que não aceitaram voltar, porque ninguém voltou, ameaçados por demissão. Nós cancelamos tudo depois também. Na verdade, depois de tanta ameaça de demissão nós tivemos 85 demitidos na greve de 1995, e que já voltaram perto de 35 a 40, e os demais vão voltar agora por uma nova negociação. Inclusive eu já acertei minha vida e me aposentei no meio do ano passado. Não fui mais aceito de novo para voltar a trabalhar. O meu acordo tinha uma cláusula que não permitia a minha volta. Mas eu tinha tempo para me aposentar e acabei aposentando.
GREVE (1995)
Eu me afastei, nesse último afastamento durante a greve de 1995, eu fui afastado para apuração de falta grave, fui o primeiro demitido, não voltei mais até hoje. Hoje, nos nossos fundos de greve, além de garantia política, jurídica e negocial, sustentam os que eles entendem como demitidos políticos. Então eu fui sustentado nesses sete anos pelo fundo de greve dos petroleiros de São Paulo. Assim como os baianos foram pela Bahia, do Rio Grande do Norte, pelo Rio Grande do Norte, de São José dos Campos, por São José dos Campos. Nos nossos fundos, eles fazem assembléias para verificar quem é o punido político, se a pessoa deve continuar na luta ou não. Se a prioridade for continuar na luta, como eu continuei, inclusive na CUT, me sustentou todo esse tempo com salário.
Engraçado, quando nós terminamos a greve de 1995, eu já não tinha mais muita paciência para entrevista, porque foram 32 dias pesados com a imprensa, e coletivas todos os dias, além de um monte de entrevistas, e aí nós decidimos uma orientação nacional para voltar a trabalhar. No dia em que a gente decidiu que a categoria devia voltar ao trabalho, a imprensa começou a vir de uma maneira muito volumosa na federação, nós fechamos as portas. Por quê? Quando você dá uma orientação nacional, é preciso que as pessoas avaliem e devolvam para você, porque nós não temos poder de mando, temos poder de orientação política. Então a orientação era: “A greve não tem mais condição de ser sustentada, é um momento estratégico para nós petroleiros, e nós na Federação Única dos Petroleiros chegamos a um consenso de que é o momento de suspender a greve, depois de 32 dias.” Vai para todas as bases do país, eles têm que fazer assembléia e devolver se aceitam ou não. Porque se a categoria falar: “Não, não aceitamos, tem que continuar!” Nós temos que cumprir. Nesse ínterim demora um dia, dois dias, às vezes. Então é melhor você não falar com a imprensa, porque a imprensa começa a perguntar de sentimentos. Se um dia eu for lá e falar assim: “Eu acho que vai suspender!” Você está influenciando as assembléias, eles têm que estar isentos para decidir, até para questionar a direção. Então nesse momento, o Maurício França Rubem - que já fez entrevista aqui, que hoje está na diretoria da Petros, ele era diretor comigo e ficou no meu lugar quando eu saí da Federação Única dos Petroleiros e fui para a CUT nacional -, ele assumiu a coordenadoria da Federação Única dos Petroleiros. Ele atendia o telefone, com as portas fechadas, e dizia que ele era o vigia Rubem. “Aqui é o vigia Rubem.” “Cadê o Spis?” “Ah, o Spis não está aqui não, já viajou para São Paulo.” Ele dava uma desculpa que eu não estava e avisava dessa coisa do término da greve. Eu saía muito pouco, eu era muito ameaçado, eu tinha receio de andar na rua, eu andava com segurança, no último tempo com o segurança do MST. Mas as pessoas, a imprensa começou a colocar uma certa preocupação na sociedade e em mim também. Às vezes eu estava andando na rua e eu percebia que a pessoa estava me conhecendo e vinha, assim, de cara, e eu não sabia o que ia acontecer. Às vezes eu tinha o receio que podia ser agredido, e a pessoa esticava a mão e me cumprimentava: “Parabéns pela resistência!” Alguma coisa assim. E uma vez, almoçando em Brasília, o cara bateu na mesa, assim, do almoço, com os pratos todos em cima e falou assim: “Na tua casa não está faltando gás. Falei: “Nem no restaurante aqui. Nós estamos almoçando num restaurante que faz comida a gás!” Mas o fato engraçado é que tem uma mulher que se apaixonou por mim, por essa figura que foi lá resistir contra o Fernando Henrique. Numa dessas saídas à noite, o pessoal saía à noite para jantar, e eu às vezes não saía, ficava lá assistindo coisas na televisão, saía pouco, pedia para eles trazerem comida para mim, só saía com mais gente. E uma moça conheceu o pessoal da federação e me mandou um bilhete, apaixonada. Mas eu nunca conheci essa pessoa. E me trouxeram o bilhete, assim, que deve ter motivado alguma coisa em outras pessoas. As pessoas hoje ainda me reconhecem, às vezes, que eu viajo para fora do Estado ou no interior paulista, e lembram de fatos importantes daquela época. Aquela época realmente marcou uma pauta permanente para o movimento sindical e para as pessoas politizadas do país. Que nem, ela assistia televisão todo dia para ver o que tinha acontecido na greve dos petroleiros. E a gente tinha a coletiva bonitinha montada, nós tínhamos uma excelente assessora de imprensa chamada Leila. É uma garota que praticamente entrou durante a greve, mas ela foi muito bem na greve, do ponto de vista de imprensa. Hoje ela está na Califórnia. Casou com um norte-americano e mudou para a Califórnia. Mas eu mando e-mail para ela hoje ainda, trocamos idéias ainda. Porque ela é carioca, ela vem sempre para cá visitar a família dela. Então há alguns fatos aqui que aconteceram durante a greve. Mas eu fiquei os 32 dias da greve no Rio, só saí um dia, que a Petrobras tinha um gerente de recursos humanos chamado Clotário, e que era o negociador. Ele me manda um documento em Brasília, da importância de a gente suspender a greve e negociar. Eu dei uma de bobão, peguei o Suplicy e falei: “Suplicy, nós precisamos ir para o Rio, mas não pode aparecer nosso nome nem na lista do avião. Eu quero pegar aqui quatro ou cinco pessoas, ir junto com você. A gente vai para a Petrobras, eu vou com esse documento da Petrobras na mão, sobe no vigésimo-quarto andar para falar com o Rennó e nós vamos para o Recursos Humanos. E eu vou levar junto um assessor político chamado Pachalsky e vou levar junto uma jornalista chamada Cristiane Lucchesi, da “Folha de S.Paulo”. E eu vou montar uma espécie de negociação para desmoralizar a empresa. Eu vou para dentro do Recursos Humanos para falar com o Clotário, você vai para o Rennó, arma essa discussão. Chegando juntos na Petrobras, eles não vão impedir que a gente vá para o Recursos Humanos. Vou fazer um circo, você volta, a gente cria um fato e isso deve ir para a “Folha de S.Paulo”. E o braço-de-ferro era o seguinte, o Fernando Henrique dizia o seguinte: “Se não voltar a trabalhar não tem negociação!” E eu falava assim: “Só volto com negociação!” Então eu queria caracterizar que tinha havido uma negociação para atropelar a posição do governo. E deu certíssimo. Vai lá o companheiro Suplicy falar com o Rennó, a gente vai para o sétimo andar e fica com o Clotário. Comecei a dar um monte de idéias para o Recursos Humanos da empresa, para sair dessa greve, e a Cristiane Lucchesi anotando tudo. E no dia seguinte sai na primeira página da “Folha” que houve a negociação. Houve a negociação, o Raimundo Brito, o ministro, vem para o Rio, enquadra o Clotário, que era safenado. O Clotário morreu. Não é nenhum fato engraçado da campanha, é um fato trágico da campanha. Na volta, quando eu voltei para o Rio, eu estou no aeroporto e ligo para a FUP me pegar, esse Davi, que era diretor da Bahia, falou assim: “Spis, Clotário morreu!” Falei: “Não é possível, eu estava com ele ontem negociando!” “Morreu! Não agüentou a pressão.” O Raimundo Brito foi para o Rio porque caracterizou realmente um golpe, uma “garrinchada”. Uma garrinchada minha nesse processo todo de negociação durante a greve. E acabou criando realmente uma situação meio inusitada dentro do processo grevista. Depois avaliamos lá na FUP se eu devia ir no enterro ou não, o pessoal avaliou que eu não devia ir. Não fui.
O resultado da greve de 1995. A Petrobras se fechou, o governo se fechou. O governo Fernando Henrique entendia que se por acaso tivesse algum processo de conquista dos petroleiros, abriria uma brecha muito grande para todas as outras categorias irem para cima do governo. Começou a ser construída no governo uma estratégia de dar uma punição exemplar na categoria, para que nenhuma outra se levantasse. Eu acredito que a estratégia de tentar dar uma punição exemplar extrapolou muito a medida, porque deu um desgaste muito maior no governo do que na organização petroleira. A organização petroleira não foi abalada porque tinha todas essas estratégias, sabia o que fazer se entrava... O Exército entrou em quatro refinarias. Qual foi a orientação da federação: “Conversem com os responsáveis. Se eles forem para alguma área que não é permitido, abandonem, deixem explodir a refinaria!” Porque nós tínhamos mantido alguns trabalhadores para circular produtos, que é para manter os equipamentos, impedir algum vazamento. “Se o Exército vem e começa a se impor, larga e deixa a responsabilidade para eles.” O Exército em refinaria é um marketing. Não operacionaliza nada, não põe para funcionar nada, é só um marketing do governo para falar: “Botamos lá o Exército!” Vai produzir um grama de combustível? Não vai, não sabem fazer. Se botar a mão estraga. Até engenheiros da Petrobras, aposentados da Petrobras, quando se metem a operar em greve, acabam dando vazamento, danificam o equipamento e não produzem nada. Só produz na refinaria quem é do próprio local, quem está com experiência no local, quem tem a vivência do trabalho. Então, eles criaram uma situação de muita pressão. Quer dizer, as multas foram astronômicas, o corte dos salários, as demissões. Eu esperava dez mil demissões. Eu falei: “A hora que eles vierem demitir, eles vão dar uma cacetada aqui e os nossos ABCPs não vão conseguir segurar.” Mas em 1985 a gente pagava com os pés nas costas. Então quando falaram assim: “É o Spis e mais 24!” Eu falei: “Só isso, assim a greve fica mais um mês!” Aí no dia seguinte mais 35. Aí falei: “Bom, está crescendo, vamos dar um jeito de parar com as demissões!” Aí parou, começaram aquelas outras demissões. O que aconteceu? Não tivemos conquistas na greve. Conseguimos sim, através do companheiro Suplicy, um documento do Congresso Nacional. A estratégia de ir para Brasília era para responsabilizar o Congresso Nacional, que como instrumento público, olhasse para empresa pública Petrobras e garantisse a negociação em cima do governo, que é o acionista majoritário. Mas infelizmente o governo foi extremamente autoritário e não quis negociar. Então tivemos um instrumento que ajudou a negociação posterior à greve. Na verdade voltou a greve para um processo negocial, mas que não surtiu grandes efeitos. Dos 85 demitidos nós estamos num processo de retorno sem muitos problemas. Quem está na Justiça, está na Justiça, estamos negociando. As multas não pagamos nenhum tostão. E seqüelas na categoria, eu acho que não tem, porque todas as direções foram renovadas por eleições da própria categoria quando venceram o seu mandato. Eu mesmo fui renovado na FUP, e companheiros foram renovados nos sindicatos, nesse processo todo. A greve de 1995 foi um grande exemplo para a classe trabalhadora, de como enfrentar o TST. O TST, do ponto de vista da relação capital-trabalho tem um poder, chamado poder normativo, que é o único país do mundo que tem esse poder. Você faz uma greve, chega o tribunal, intervém na greve, solta uma sentença normativa, vira lei na hora, te obriga a voltar a trabalhar. Se você não voltar tem multa. Então é um negócio absurdo, é uma excrescência jurídica, não existe, tem que acabar. Não o TST como instância trabalhista de terceiro grau, mas um instrumento na relação capital-trabalho, que se chama poder normativo da Justiça trabalhista, isto é um absurdo. Categorias que têm peso, como a nossa, enfrentam, desmoralizam, como desmoralizamos, e não pagamos a multa. E o TST, o Judiciário sofreu um grande desgaste naquele processo. Por quê? Eu estava com um acordo coletivo assinado com o presidente da República, aí o tribunal julga a fala assim: “O acordo assinado pela FUP não foi assinado por representante legal!” Era o presidente da República. Quem é o representante legal de uma empresa em que o acionista majoritário é o governo? Aí, no segundo julgamento: “Ah, o acordo é legal, mas não tem característica de acordo coletivo!” É uma desmoralização que o Pazzianoto fez, um circo lá em que ele foi o relator. Então na verdade havia uma intenção política declarada de não reconhecer a mobilização, não negociar e tentar dar uma punição exemplar para as outras categorias não crescerem. Que havia já, desde 1989 com o Collor, um processo de privatização, que é arrecadação para fortalecer o caixa do governo, e seguramente fortalecia também muito partido de direita, em campanhas eleitorais, que nós passávamos a ser uma referência contra a privatização. Apesar de que depois da greve acabaram os monopólios do setor petróleo, telecomunicações e setor elétrico. E as privatizações continuaram num ciclo aí dentro do Programa Nacional de Desestatização, representavam também esse referencial de enfrentamento. A categoria não esmoreceu, continuou fazendo mobilizações. Não fez ainda mobilizações ainda do porte daquela, mas muitas greves de 48 horas já foram feitas e muitos enfrentamentos em campanhas salariais. A categoria não perdeu nenhum acordo coletivo, o acordo coletivo continua muito bom. Não perdeu na representatividade. E tem frustrações. Recebi uma cartinha outro dia, de um companheiro de Jacareí, questionando a greve: “Eu sou grevista, estou questionando, meu sindicato não me socorreu.” Estou mandando outra de volta: “Me diga qual é o seu sindicato, porque para mim isso não existe.” Eu argumento muito com as pessoas ainda sobre a greve, não só com os próprios grevistas, mas virou tese de muita universidade. Recebo muita gente de graduação, pós-graduação, para contar a história da mobilização. Foi um grande referencial. Eu fiz uma palestra, inclusive na Universidade de Sevilha: “A greve dos petroleiros e os direitos humanos.” Na Espanha, a convite da universidade. Então na verdade motivou o mundo, aquela greve tem muita gente que acompanhou de diversas partes do mundo, como referencial. É presente no meu dia-a-dia esse momento histórico.
SINDICATO
PRINCIPAIS CONQUISTAS/CAMPANHA REINTEGRAÇÃO DOS DEMITIDOS
Acho que a categoria petroleira tem sempre um ponto, que é um ponto de honra nas negociações com a empresa, que é a reintegração de companheiros punidos. Nós temos sempre muitos companheiros punidos. É uma categoria que enfrenta muito, ela não deixa passar. E ela enfrenta muito no coletivo. Não é uma reintegração de demitidos porque aquele demitido tomou uma ação intempestiva. Ele foi pinçado num conjunto de mobilização e punido. Por que o meu nome aparece no “Jornal Nacional” como o primeiro demitido? Depois um estrategista me contou. Se você tem uma boiada caminhando, sempre tem um líder que conduz a boiada para lá e para cá. Eles me pinçaram naquela greve, como líder, e falaram: “Vamos pegar o cabeça da greve!” Para ver se dispersava a mobilização. Não atingiu ninguém, não me abalei nem um minuto. A categoria vive já essa situação de punição há muito tempo. Então, a empresa para mim sempre tem, deixa para trás, quer dizer, nunca resolve toda a questão da punição. Ela usa isso como um instrumento emocional. E a resolução de casos de punição significa uma resolução econômica, porque os nossos fundos de greve ajudam. Então ameniza, porque em momentos mais graves, como a coisa é pesada, a gente aumenta a taxa de sindicalização para ter mais sustentabilidade no fundo de greve. E hoje se você paga, por exemplo, o meu caso, o Sindicato dos Petroleiros de São Paulo pagava o salário do Spis, não paga mais, entende? Então a resolução de um caso de punição, a Petrobras passou a perceber isso. Se você fazia uma boa greve e reintegrava 15, arrumava mais 5 da outra que você fazia naquela campanha, e que no futuro você resolveria. Eu acredito que na categoria hoje o sindicato precisa superar isso, tentar limpar e realmente não ter companheiros punidos. É inadmissível que você faça uma greve de 40 mil trabalhadores e trabalhadoras e tenha 85 demitidos. Por quê? Porque ela não pode mandar embora os 40 mil, porque se mandar fecha a empresa. O patrão sabe disso, o governo sabe disso. Por que manter um conjunto pequeno? Eles não foram responsáveis. E da direção da FUP só eu fui demitido, o resto não foi. Então, essa caracterização de imputar a algumas pessoas a responsabilidade por ações coletivas precisava acabar na categoria. Outra coisa que nós precisamos crescer, apesar de ter uma boa organização, porque não é fácil para uma direção dar uma orientação para fazer uma greve, para inúmeros companheiros que estão a 120 quilômetros dentro do mar e sem nenhum sindicalista lá na plataforma, e ela faz. Mandava orientação para dentro de Urucu, que eu nunca visitei, porque a Petrobras não permitiu, porque o aeroporto é dela, o avião é dela, e não tem nenhum dirigente lá, e o petroleiro faz. Significa que é uma categoria esclarecida e politizada, sintonizada com a federação nacional, com a direção nacional, e aceita uma indicação por ter respaldo de direção. Então, de 1995 para cá a empresa começou a disputar esses espaços, ideologicamente, dentro da base, tentando corromper companheiros mais combativos oferecendo promoção, fazendo disputa ideológica no local de trabalho. Então eu acho que é um grande desafio nosso, da Federação Única dos Petroleiros, reconstruir a nossa unidade de base para garantir boas mobilizações e bem representativas. E mudar esse enfoque de empresa que disputa mercado, que disputa a distribuição de derivados de petróleo com a Shell, Texaco, Atlantic, e a BR prova que é a maior e a melhor. E que tem finalidade social. Vai para o interior da Paraíba, interior de Goiás, e você não vê essas outras empresas por lá, só vê aqui no Sul e Sudeste, que dá mais lucro. E fazer com que a direção da empresa e o petroleiro incorporem que nós somos representantes do povo brasileiro dentro da empresa pública, a maior empresa do Brasil, que está dando dez bilhões de reais de lucro em 3 anos seguidos, e que isso não deve servir só a distribuição de lucros para dividendos, deve ir para o bolso do petroleiro, que hoje não passa de 33 mil. Mas que tem que ter um compromisso social com o Brasil e realmente ter uma linha direta com o Fome Zero, com políticas sociais, com saneamento básico, para um conjunto de população carente. Não é possível ter uma empresa de primeira linha, extremamente rentável, que é um exemplo mundial, num país de miseráveis onde tem esse contingente passando fome, onde a maioria não tem saneamento básico. Tem uma parcela da sociedade esgarçada já, que não recupera mais. Não é nossa visão de empresa pública, de empresa social. É preciso ter, e isso foi se perdendo por esse processo todo de quebra do monopólio, privatização e competição de mercado. É uma visão realmente de empresa com responsabilidade social, e que nesse novo período eu acredito que nós vamos reconstruir e garantir que essa grande parcela desse retorno dessa grande empresa pública fique para a população como um todo, e não só para uma meia dúzia de privilegiados.
CASAMENTO
É, eu sempre namorei muito lá, naquela fase em que eu contei no começo. Aí quando eu vim para São Paulo, em 1985, comecei a trabalhar efetivamente em 1986, conheci a Ana Paula de Araújo, que era uma petroleira num terminal de São Caetano do Sul, mas que trabalhava no prédio que eu vim. Ela ficou pouco tempo e prestou um concurso e foi trabalhar no Banespa. Porque banco trabalhava seis horas, e na Petrobras ela trabalhava oito por dia. Nós começamos a sair, começamos a namorar. Nós fomos morar juntos em 1989. Nós moramos no Brás, em São Paulo. Tivemos um filho em 1991, que infelizmente morreu em 1992, ele teve um problema no parto, por incompetência lá de quem fez o parto, ficou vegetativo durante um mês e faleceu. Nós não tivemos outro filho. Acabamos nos casando no cartório, porque ela quis casar no cartório, porque acabou dando um problema com uma homônima dela lá em São Paulo, que deu uns calotes lá no comércio, e aí tivemos que casar para ela incorporar Spis no nome dela para diferenciar. Vivemos muito bem até hoje, devemos ter mais filhos, mas estamos nos recuperando um pouco daquele grande problema.
SONHO
O meu maior sonho hoje em dia é realmente ver um Brasil melhor. Depois de muita luta, de muita construção, nós chegamos nesse momento histórico de garantir a vitória do Lula. Todo mundo um pouco mais consciente no país. E quem viveu o sindicalismo, como eu vivi, nesse período, participou muito desse processo.
CENTRAL SINDICAL
CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES – CUT/SP
Tive a oportunidade de conhecer o Lula lá em 1983, ele passando e me vendo fazer uma faixa no chão. Tive muitos momentos com ele depois, em momentos sindicais e também na campanha eleitoral. Acho que eu estando à frente da Central Única dos Trabalhadores do Estado de São Paulo, nós construímos uma estratégia de comícios nas periferias e de Primeiro de Maio nas periferias, para levar o nome da CUT e do PT aonde as pessoas simplesmente não sabem o que é isso aqui, C - U - T. E são dominadas pelo narcotráfico. Em muitos comícios na periferia em São Paulo, nós tivemos que negociar com a bandidagem para poder fazer o comício. E orientei todas as 17 subsedes da CUT no interior a fazer comícios nas periferias também, para desmistificar os institutos de pesquisa. Então nós criamos uma condição de alastrar um pouco mais a sensibilização sobre as propostas petistas e as propostas da CUT na campanha eleitoral de 2002. Isso é reconhecido pelo Lula, que a CUT não só hoje é um bom cabo eleitoral, como interferiu no processo eleitoral. Pelo Genoino e pelo Marinho também, no Estado de São Paulo. Essa estratégia foi montada por nós na Central Única dos Trabalhadores do Estado de São Paulo. Nós fizemos sete atos descentralizados e diversos comícios descentralizados para a periferia, e muitos no Estado todo. Então esse reconhecimento ia dar um novo patamar de relação entre a central e o partido. Nós nos sentimos responsáveis pela vitória do projeto político, mas nós não somos governo. Nós continuamos questionadores, apresentando a nossa pauta, exigindo a reposição salarial, terra, moradia. E vamos fazer greve também no governo Lula. Com todo o respeito, sem querer derrubar governo. Como a gente faz com a Marta também, sem querer derrubar a companheira Marta, mas não abrindo mão do nosso papel de representação classista dos trabalhadores brasileiros.
ENTREVISTA
Eu é que agradeço. Eu acho que foi uma iniciativa fundamental. Infelizmente os petroleiros não têm essa cultura de registrar a memória. Eu sempre me remoía muito com isso, depois dessas grandes mobilizações não ter registros em livros. Algumas coisas a gente tem de uma maneira muito incipiente, muito pouco registro. Eu acho que esse Projeto Memória vai conseguir resgatar não só do ponto de vista da importância dos trabalhadores e trabalhadoras que passaram pela empresa, que nunca fizeram movimento, mas também têm sua importância na empresa. Mas resgatar também esse outro lado de uma empresa pública que garantiu não só para o país essa inserção internacional. Eu acho que se não tivesse tido essa ditadura nós já estaríamos auto-suficientes de petróleo, do ponto de vista de garantir os derivados de petróleo à sociedade brasileira. Mas agora, com esse novo momento, eu tenho certeza de que a gente vai chegar lá. Então, esses registros todos acabam somando um pouco de cada história e vão construir a verdadeira história brasileira da Petrobras.
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