Minha mãe é de Esmeraldas, uma cidade ao lado de Contagem, e o meu pai também. Minha família toda é de Minas, não tem ninguém de fora. Eu sei que eu surgi e meus pais se casaram. O casamento deles tem fotos e tudo. Minha mãe com o barrigão, então eu participei do casamento. Minha casa de infância era uma casa grande, num quarteirão, um quintal grande. Tinha um monte de cachorro, dava filhote, ficava aquele monte de cachorro espalhado. Meu pai tinha uma oficina, ele era mecânico, e a oficina era misturada com a casa.
Minha mãe sempre foi doméstica ou trabalhou em casa de família. Hoje em dia ela trabalha em escola, a mesma que eu trabalhava antes de estar aqui. Depois a minha mãe separou do meu pai, e eu fui morar com a minha avó. Minha mãe saía pra trabalhar e eu ficava com a minha avó, então eu passei grande parte da minha infância e adolescência atrás dela. Eu sempre gostei muito de estudar, de ser disciplinadinha. Minhas coisas eram todas coloridas, até mais velha os cadernos eram todos coloridos, igual de criança. E brincava muito na rua, de queimada, de amarelinha, essas coisas que hoje em dia a gente quase não vê. Eu adorava brincar de boneca. Minha avó falava que eu ficava dançando com as bonecas. Eu chamava ela pra dançar junto, dançava com comercial de televisão. Eu sempre gostei de imitar comercial de televisão, fazia propaganda sozinha. Eu imitava paquita. Colocava toalha na cabeça, meu cabelo era curto, pra fazer que o cabelo era grande e imitar. Nunca fiz curso de nada, as minhas danças são todas no sentimento. De me puxar pra dançar e eu ir pegando. Um tempo atrás eu fiz uma aula de forró, quando o forró começou, que ninguém sabia dançar. E acaba que o forró é uma base pra muita coisa. Mas foi só, o resto, samba, essas coisas todas na prática vai pegando.
Eu ia em festa, quando tinha em casa de alguém, mas em boate, não. Era muito raro. E dançava funk e muito axé, aquelas de dançar todo mundo...
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Minha mãe é de Esmeraldas, uma cidade ao lado de Contagem, e o meu pai também. Minha família toda é de Minas, não tem ninguém de fora. Eu sei que eu surgi e meus pais se casaram. O casamento deles tem fotos e tudo. Minha mãe com o barrigão, então eu participei do casamento. Minha casa de infância era uma casa grande, num quarteirão, um quintal grande. Tinha um monte de cachorro, dava filhote, ficava aquele monte de cachorro espalhado. Meu pai tinha uma oficina, ele era mecânico, e a oficina era misturada com a casa.
Minha mãe sempre foi doméstica ou trabalhou em casa de família. Hoje em dia ela trabalha em escola, a mesma que eu trabalhava antes de estar aqui. Depois a minha mãe separou do meu pai, e eu fui morar com a minha avó. Minha mãe saía pra trabalhar e eu ficava com a minha avó, então eu passei grande parte da minha infância e adolescência atrás dela. Eu sempre gostei muito de estudar, de ser disciplinadinha. Minhas coisas eram todas coloridas, até mais velha os cadernos eram todos coloridos, igual de criança. E brincava muito na rua, de queimada, de amarelinha, essas coisas que hoje em dia a gente quase não vê. Eu adorava brincar de boneca. Minha avó falava que eu ficava dançando com as bonecas. Eu chamava ela pra dançar junto, dançava com comercial de televisão. Eu sempre gostei de imitar comercial de televisão, fazia propaganda sozinha. Eu imitava paquita. Colocava toalha na cabeça, meu cabelo era curto, pra fazer que o cabelo era grande e imitar. Nunca fiz curso de nada, as minhas danças são todas no sentimento. De me puxar pra dançar e eu ir pegando. Um tempo atrás eu fiz uma aula de forró, quando o forró começou, que ninguém sabia dançar. E acaba que o forró é uma base pra muita coisa. Mas foi só, o resto, samba, essas coisas todas na prática vai pegando.
Eu ia em festa, quando tinha em casa de alguém, mas em boate, não. Era muito raro. E dançava funk e muito axé, aquelas de dançar todo mundo igual, de passinho. Eu sabia as coreografias todas. Eu ficava na frente, todo mundo copiava. Sempre gostei de funk. Eu trabalhei como secretária ou recepcionista, sempre nessa área. Com o passar do tempo, comecei a fazer desfile. Apesar de ser baixinha eu fazia uma coisinha aqui, outra ali, sempre com o sonho de televisão, mas nunca imaginava tão real. Com uns 15 anos eu fui atrás, querer saber como é. Eu comecei a participar de concursos de cidade, garota isso, garota aquilo e fui. E ganhei alguns. O primeiro foi Garota Contagem. Era uma coisa meio difícil por ser negra, não era fácil, mas às vezes a pessoa falava que tinha chance. Eu sempre senti que o fator da cor dava uma atrapalhada. Senti muito isso na infância, que eu sofria muito com coisa de cabelo. Eu ia pra casa chorando de falar do cabelo, de puxar: “Cabelo ruim, cabelo feio, cabelo não sei o que”. Eu tinha o maior complexo. Se fosse hoje em dia ia falar que era bullying, naquela época ainda não tinha isso. Hoje em dia ainda é assim, mas acho que naquela época era pior, meio sem controle. Eu desfilava na passarela. Tinha roupa, maiô, essas performances que tira a canga. Tinha eliminatória, eu passei, fui passando e ganhei. Chorei horrores, porque a pessoa está ali cheia de sonhos, e acha que aquilo vai transformar a vida. Minha família toda foi porque era um dos primeiros. Foi um dos primeiros concursos que o meu pai viu, e das poucas vezes também que ele teve chance de ver. Saiu foto no jornal, e ele ficava todo orgulhoso, rodando o bairro e mostrando a fotinho pra todo mundo. Logo depois ele faleceu. No Rio de Janeiro tinha vindo uma vez. Vim com a vontade de conhecer um baile funk carioca e queria conhecer o Projac.
Chegou aqui procurei no Google, fiz mapinha pra saber o caminho do Projac. Eu nem entrei. Cheguei toda, toda, arrumei pra tirar foto, e quando chegou na porta o segurança: “Não pode tirar foto aqui!”. Eu fui embora tão derrotada, tão triste! E a coisa de baile funk. Era um negócio do Furacão 2000. E eu tava lá na plateia dançando, e a mulher me chamou e mais um monte de carioca. Eu dancei no palco e na hora o povo gritou mais pra mim. A mulher veio falar: “Você é de onde?”, “Sou de Minas”, aí ficou todo mundo assim... Essa época eu trabalhava em escritório de advogados, depois fui trabalhar numa loja, desfilava, vestia roupa pros clientes. E depois disso fui trabalhar na escola que eu estava trabalhando até hoje. Em Contagem. E eu já nem tava correndo atrás de desfile, concurso. Eu já tava achando que não era pra ser. As pessoas me mandavam e-mail com indicação de alguma coisa e eu já nem abria mais.
Um dia eu tava deletando tudo e resolvi abrir um de uma menina que sempre me manda: “Precisa-se de negras da idade entre 18 e 24 anos pra uma campanha publicitária. ”Só uma foto, não custa nada. Mandei, mas nem fazia ideia do que era. Aí o rapaz me ligou e falou pra mim: “Olha, o pessoal gostou da sua foto, você pode ir na Praça da Liberdade, tal dia, tal hora?” E nem tava dentro da faixa etária porque tava com 26 e era 18 a 24. Fui pro teste, super informal, com uma camerazinha, perguntou meu nome, o que eu fazia, se eu gostava de funk... Aí fui embora. Depois que eu tinha conversado ele desligou e falou assim: “O projeto é uma série da Globo.”. No teste eu dançava e tremia, dançando e tremendo. Eu voltei pro meu serviço e não tava conseguindo concentrar. Comecei a emagrecer. Quase um mês me ligou: “queria te informar que você é a nova protagonista da minissérie da Globo.” Não sei nem explicar. Eu tava na escola, saí da sala da diretora, tava no meio do recreio, quando eu olho pra minha mãe: “Mãe, eu passei no teste”. E aí nós duas abraçadas no meio do pátio, uma choradeira. E muita coincidência da história da Conceição, da personagem, com a minha vida. Da história de baile funk, de concurso, e meu sonho é pisar na Sapucaí, e ela vira rainha de bateria. Eu leio a história chorando. Um monte de coisa acontecendo igual a minha vida. Ela fala que quer namorar, noivar, casar, pra depois ter filho, e é justamente o jeito que eu penso. Meu sonho é casar de branco na igreja. A mistura da minha vida com a vida da personagem.
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