P/1 – Paulo, você pode falar o seu nome completo, local e data de nascimento?
R – Sim, meu nome é Paulo Sandro Verlings da Silva, eu nasci do dia 24 de setembro de 1985, em São João de Meriti, que é um município do Rio de Janeiro.
P/1 – Seus pais são de São João de Meriti?
R – Não, meus pais são de uma cidadezinha do interior do Rio chamada Santo Eduardo, meu pai chama Generoso José da Silva e minha mãe Maria José Verlings da Silva.
P/1 – E porque eles foram dessa cidade e foram pra São João do Meriti, você sabe?
R – Ah, por oportunidade mesmo de trabalho e de melhoria de vida.
P/1 – Seus avós maternos e paternos são dessa cidade dos seus pais?
R – Também são de lá.
P/1 – Você sabe o que seus avós maternos faziam e os seus avós paternos, conhece um pouco essa história?
R – Pelo o que chegou até a mim de histórias na verdade acho que eles trabalhavam na lavoura em canavial, eu sei muito pouco, eu não conheci nenhum dos meus avôs homens e avó eu conheci duas, as duas, a mãe do meu pai e a mãe da minha mãe.
P/1 – E a sua mãe e o seu pai, o que eles faziam nessa cidade?
R – Em Santo Eduardo eles eram muito novos meu pai também chegou a trabalhar na usina de cana, a minha mãe não chegou a trabalhar lá não, quando eles vieram pra cá o meu pai virou motorista de uma transportadora e minha mãe dona de casa.
P/1 – E por que eles escolheram São João do Meriti, que oportunidade de trabalho?
R – Não, na verdade a questão de São João do Meriti foi que uma parte da família já tinha vindo pra Nova Iguaçu e São João do Meriti foi o lugar onde o meu pai resolveu comprar uma casa mesmo por ver uma oportunidade de compra, não teve nenhum motivo específico não.
P/1 – E aí você nasceu nessa casa já?
R – Nasci lá, os meus irmãos todos.
P/1 – Quantos irmãos você tem?
R – Eu tenho quatro, duas mulheres e dois homens.
P/1 – E você é o que nessa escadinha?
R – Eu sou o caçula.
P/1 – Você é o caçula.
R – O mais novo.
P/1 – Como é o nome dos seus irmãos?
R – O mais velho chama Paulo Sérgio, depois Sandra Maria, Selma Helena e Paulo César e eu, Paulo Sandro.
P/1 – Paulo Sandro, Paulo, fala uma coisa, como é que era essa casa sua de infância?
R – A minha casa era muito movimentada era muito movimentada, era engraçado porque minha mãe fazia muito café pro dia inteiro e as pessoas iam chegando, tomando café e o tempo todo nessa movimentação, em dia de domingo então era uma loucura, que os filhos todos iam pra lá, os irmãos e era muito movimentado, até o meu pai adoecer, na verdade que eu tinha oito anos de idade, eu lembro disso claramente, meu pai teve derrame com trombose, acidente cardiovascular, ele paralisou o lado esquerdo todo e ele é deficiente físico até hoje, tem 20 anos, depois deu uma diminuída da movimentação da casa.
P/1 – E como é que era essa casa, assim, fisicamente, como é que ela era?
R – É, a gente, na verdade o meu pai comprou essa casa com o meu tio, na verdade era um quintal na frente e o dos fundos, o da gente era o dos fundos e tinha que passar pelo quintal do meu tio, descer uma escada e chegar e tinha a casa da minha irmã que era do lado e a minha que era em frente, era uma casa azul, bem clarinha, tinha um varanda na porta e aí tinha a cozinha, o quarto da minha avó, o quarto dos meus pais, onde eu dormia com eles e o banheiro.
P/1 – Você dormia junto com os seus pais?
R – Sim.
P/1 – Com o seu pai e com a sua mãe?
R – Sim, eu era o mais novo o meu irmão acima de mim, ele tem uma diferença de 14 anos e aí quando eu nasci já tava muito, muito, já tava tudo muito estruturado porque na verdade eu sou adotado, por isso que eu tenho essa diferença de idade muito grande assim.
P/1 – Por que a sua mãe te adotou, resolveu te adotar? Ela já tinha três filhos.
R – É uma história complexa, tinha quatro, né.
P/1 – Quatro.
R – Na verdade eu sou filho biológico da irmã dela, que na verdade é minha tia, mas biologicamente é minha mãe, então é uma confusão meio maluca e eu tinha três meses de idade, na verdade eu nasci, com três meses de idade a minha mãe me adotou porque essa minha tia não tava conseguindo lidar com essa história de ter mais um filho, ela já tinha tido dois e aí na verdade ela queria me entregar na porta do meu pai biológico e aí a minha mãe e o meu pai decidiram: “Não, eu vou criar a criança” e aí eles me criaram a partir dos três meses de idade, então eu não lembrava, não sabia de nada, eu só descobri com 12 anos, que a minha avó numa loucura de discussão, de briga de família, me contou e a minha mãe morreu eu tinha 15 anos, ela morreu sem saber que eu sabia que ela era adotada.
P/1 – Sua mãe, sua tia.
R – A minha mãe, é, que é a minha mãe biológica, que não é minha mãe biológica, que me criou.
P/1 – E como é que eram as suas brincadeiras de infância, você lembra, na sua casa?
R – Lembro, lembro, na verdade a gente ficava muito solto porque a gente, eu cresci em favela então acho que a gente fica muito solto então era bola de gude, pião, pipa, pipa era das que eu menos gostava na verdade, tudo na época tinha, a gente brincava muito de chumbinho de polícia e ladrão, chegava todo roxo em casa de chumbinho que batia na pela, pique esconde, pique-bandeira, queimado, isso tudo a gente brincava muito, assim, e era muito, o dia inteiro e a gente ia pra piscina, que tinha um clube que alugava a piscina, a gente pagava dois reais, entrava na piscina, ficava o dia inteiro na piscina, ia escondido porque as mães a maioria das vezes não deixavam porque a gente era muito pequeno, tinham medo da gente morrer afogado , tinha, mas era divertido, assim, nossa, era bem divertido, eu tive uma infância muito, muito divertida, sofrível porque infância de favela e tudo mais, aquela coisa, mas...
P/1 – Era na favela que você morava?
R – Sim, em São João do Meriti.
P/1 – Como é que era essa configuração lá?
R – Era bom, foi muito bom, assim, eu tenho alguns amigos que sucumbiram a história que não conseguiram lidar com a coisa, porque é tudo muito, é tudo muito aberto favela é muito isso acho que essa coisa, essa geração agora que vem com essa coisa da pacificação das favelas no Rio de Janeiro talvez pegue um pouco menos porque também não é essa coisa bonitinha hoje também então, mas na minha época, na minha infância era tudo muito aberto, o tráfico, até hoje também em algumas favelas, não são todas que são pacificadas, era tudo muito e aí você vê os seus amigos entrando pro tráfico, entendeu, você vê, as coisas são muito claras ali.
P/1 – Com quantos anos você começou a entender que tinha tráfico?
R – Ah, desde sempre, desde sempre, desde sempre, desde sempre você vê os caras armados, desde sempre você vê os viciados subindo a favela, desde sempre você vê os bailes da favela, desde sempre desde que você se entende por gente, desde os oito anos de idade.
P/1 – Você tinha amigos que eram do tráfico quando você era pequeno?
R – Tive muitos, tive muitos.
P/1 – Você lembra quem eram eles?
R – Claramente, que cresceram comigo, jogavam bola comigo, bola de gude comigo, rodavam pião comigo e foram pra esse lugar é uma coisa muito tentadora pra quem ta lá porque acaba que é um universo muito sofrível mesmo eu não sou muito da lamúria não, sabe assim, eu acho que a vida não me deve nada não, que eu to aqui, eu trabalho, eu sou um cidadão digno, então eu acho que tive a oportunidade de estudar, então eu acho que a vida não me deve nada não, mas quando você vê o todo você realmente vê que é um universo muito sofrível um universo muito árduo porque as mães são muito batalhadoras, elas trabalham fora e o filho tem que ficar.
P/1 – A sua mãe era dona de casa?
R – Sim, a minha mãe era dona de casa e eu tive uma relação familiar muito forte e muitos desses também que entraram pro tráfico também tinham uma relação familiar muito forte, então isso não é muita justificativa na verdade, é muito a opção que você faz, né.
P/1 – Você alguma vez foi abordado pra entrar?
R – Muitas vezes.
P/1 – Conta uma que te marcou.
R – Muitas vezes, muitas vezes, porque na verdade o que acontece? Quando você vê um diferencial, que eu estudava, então era uma criança inteligente, diferente dos outros que largavam a escola, então já fui chamado até pra ser contador do tráfico, entendeu, uma coisa.
P/1 – Como te chamaram?
R – Porque as pessoas cresciam com você então te convidavam, te chamavam, entendeu, mas também chega um momento que te respeitam, porque se você não cede não tem porque também ficar na insistência, né.
P/1 – Mas como é que você foi abordado?
R – A era muito tranquilo se eu sou teu amigo de infância eu não tenho dedos pra falar com você eu chego pra você e te convido: “Vem cá, vamos, vem trabalhar comigo, com a gente aqui, vem cá, tem um esqueminha pra você aqui”, entendeu, não é, não tem muito dedo, muita formalidade.
P/1 – Com quantos anos você entrou na escola?
R – Com sete, sete anos.
P/1 – Onde é que era a sua escola?
R – Eu comecei primeiro numa escola que era uma creche que tinha, que eu tinha uma professora diabólica que era a Ieda, professora muito má, muito bizarra e depois eu fui pra Escola Municipal Nilton Rodrigues Pereira lá em São João.
P/1 – Por que ela era má, o que ela fazia?
R – Ah, ela batia nos alunos, tacava apagador na cabeça dos outros, era uma coisa meio bizarra, isso não tem muito tempo, eu tenho 27 anos, são 20 anos atrás isso não é muito, mas era engraçado e essa realidade comportava esse tipo de comportamento, ela cedia, as mães não tomavam muito partido dentro disso.
P/1 – Do que você gostava na escola?
R – Que eu lembre assim, cara, eu gostava muito do ambiente, assim, sabe, eu lembro muito e tenho amigos que eu tenho até hoje de lá de São João, que eu não mora mais lá e eu lembro, o ambiente todo o ambiente da escola, dessa escola, do Nilton Rodrigues Pereira que era uma escola que não era uma escola muito grande, mas era uma ambiente muito agradável, assim, os diretores, as professoras, era muito o ambiente todo, as quadrilhas de julho que a gente dançava.
P/1 – Você lembra de festa junina?
R – Lembro claramente, claramente.
P/1 – Como é que era, descreve?
R – Era muito legal porque a gente ensaiava muito então tinha toda uma preparação de figurino e a festa em si e a gente, quando eu fui pra lá eu já tinha onze anos de idade, então era, você já tava entrando numa pré-adolescência, então tinha toda uma relação interessante com a escola, com os amigos, com o que acontecia ali mesmo, né.
P/1 – Na sua casa você teve algum tipo de formação religiosa?
R – Sim, sim, mas muito por minha conta, muito por minha conta, eu tinha 13 anos de idade, eu cheguei a frequentar a Assembleia de Deus dos 13 aos 14 e aí depois com 14 anos eu decidi ir pra Igreja Católica na verdade e eu já tinha feito primeira comunhão e aí depois dos 14 até os 17 eu fiquei congregando na Igreja Católica, eu fiz curso de ministro da palavra, eu fui catequista na Igreja Católica, cheguei a formar uma turma, que era primeira comunhão, dois anos e meio que a criança fica se preparando todos os sábados e eu cheguei a ser catequista dessas crianças com 17 anos e aí era, eu cheguei, eu ministrava a celebração na igreja era muito engraçado você lembrar disso hoje.
P/1 – Você ministrava a celebração?
R – Sim.
P/1 – O quê?
R – Quando o padre não ia eu fazia a celebração, eu cheguei a fazer o curso de ministro da palavra.
P/1 – Mas o que, a sua mãe, o seu pai, como é que era na sua casa que te levou a essa motivação?
R – Nunca teve não, na verdade eu fui o precursor, a minha mãe, ela gostava muito do candomblé, mas ela também não era praticante, não, ela não congregava no candomblé, mas ela gostava muito dessa, da religião e da energia da religião e eu decidi primeiro ir pra Assembleia e depois ir pra Igreja Católica, eu fiquei um tempo mais, eu fui coordenador de grupo jovem, participava de encontros da juventude, tinha um encontro que eram as paróquias que organizavam, que era o encontro que foi muito famoso que chamava Deus é Dez, na praia de Copacabana e era engraçado e hoje eu não tenho religião, não congrego em nenhuma religião na verdade, mas eu tenho uma formação religiosa toda católica, muito católica, cheguei a iniciar um curso de Teologia pago pela igreja mesmo, porque eu queria ser missionário, mas não cheguei a finalizar o curso, não cheguei a ter a celebração de formação de missionário.
P/1 – Quem que exercia, como que era a vida familiar na sua casa, que exercia a autoridade, o seu pai ou a sua mãe?
R – A minha mãe, a minha mãe era completamente a chefe da casa e aí isso também deu uma desestruturada na família muito forte porque ela morreu eu tinha 15 anos, então isso deu uma degringolada muito forte, o meu pai já era deficiente físico e a minha mãe, a mãe dela, a minha avó morava com a gente, então durante muito tempo a família era eu, a minha mãe, a minha avó e o meu pai, meu pai ficou três anos internado e depois, três anos depois ele voltou pra casa e aí com 15 anos, quando eu tinha 15 anos, no ano 2000 a minha mãe morreu, veio a falecer, isso deu uma degringolada muito forte na família, nos meus irmãos e na casa, né. E aí a gente ficou um tempo morando eu, o meu pai e a minha avó sozinhos, mas eu fui crescendo e eu já trabalhava, com 15 anos, então era uma coisa...
P/1 – Quando foi o seu primeiro trabalho?
R – Com 13 anos, eu trabalhava com 13 anos.
P/1 – Você foi trabalhar do quê?
R – Eu vendia rosas parafinadas de papel crepom, que a gente na verdade terceirizava essas rosas e eu vendi com o meu primo, que na verdade era o meu irmão biológico a gente saía junto e vendia, a gente passava por Bom Sucesso, Ramos, Penha, Olaria, Pavuna, numa noite inteira, né.
P/1 – A pé vocês iam vendendo?
R – A gente pegava o ônibus até a Penha, passava por Bom Sucesso, Ramos, Olaria, vinha vendendo e depois passava na Pavuna e vinha embora.
P/1 – Vendendo pelas ruas?
R – Pelos bares, sempre bares, sempre nos bares e era engraçado porque era uma rosa que eles faziam de papel crepom e parafinavam, né e a gente jogava essência, era uma coisa, era bem bonitinha, bem cafona, rosinha bem cafona , uma coisa bem, mas era bonitinha na época, eu tinha 13 anos e a gente trabalhava toda sexta e todo sábado e conseguia fazer uma grana legal, assim, eu fazia feira pra dentro de casa, fazia compras, ajudava dentro de casa, era bem legal.
P/1 – E a sua avó te contou isso quando você tinha quantos anos?
R – Tinha 12 anos.
P/1 – Doze?
R – Doze anos, tava com o pé quebrado.
P/1 – E a sua mãe não ficou sabendo que você sabia porque ela morreu?
R – Não, na verdade a questão foi a seguinte, o meu pai tinha vindo pra casa, já tava a pouco tempo e a gente ainda tava numa fase de adaptação de como é que você tem um deficiente físico dentro de casa, como é que você cuida, como é que, era uma fase muito de adaptação, então tinha sempre muita briga por conta disso, assim, a gente não sabia lidar com a história e eu era muito novo, 12 anos de idade, não tinha muito essa noção e sempre tinha muita briga e o meu pai e a minha avó nunca se deram muito bem, então, assim, o meu pai doente agora e a minha avó já mais debilitada por conta da idade, sempre teve muita briga e tava tendo uma briga por minha causa, eu nem lembro o que que era, eu fiquei muito atordoado e a minha avó me pegou pelo braço e disse: “Ó, você não é filho nem do teu pai nem da tua mãe”, eu fiquei meio assim, eu tava com o pé quebrado, tava com o pá esquerdo quebrado e aí ficou meio, eu fiquei meio desnorteado, sabe, criança, você não tem muita noção. Aí eu fui pra escola, fui pra escola e aí não sabia como lidar muito com aquilo e aí quando eu voltei da escola ela me pegou e me levou pra trás da casa que tinha um pé de carambola, tinha bananeira, pé de manga, tinha muita coisa e ela me contou toda a história, disse que eu era filho da minha tia, filho biológico da minha tia, que era filha dela também e tudo mais e aí explicou toda a história, mas até hoje eu não sei quem é o meu pai biológico, não me interessa saber também, que eu tive essa, eu tive família então eu sou muito bem resolvido com essa coisa, assim, essa minha tia era muito porra louca, que é a minha mãe biológica, na juventude então acho que se ela fez uma coisa de bom pra mim foi ter me dado essa oportunidade de ter tido uma família pô, eu tive uma família, eu tive uma mãe, eu tive uma criação, eu tive um pai, eu tenho quatro irmãos.
P/1 – Você encontra com ela hoje?
R – O tempo todo, a gente tem uma relação incrível, a gente tem uma relação incrível, eu sinto hoje que ela tem uma, um arrependimento muito forte de não poder lidar comigo como filho com essa questão do orgulho, com essa questão que a gente veio de uma família muito pobre então essa coisa de eu estar na televisão agora, isso é uma coisa que pega muito as pessoas tem uma referência muito forte, então eu decidi ser ator quando eu tinha 15 anos de idade, eu comecei a fazer teatro com 13, mas eu decidi ser ator com 15, então eu vim de uma realidade que eu preciso trabalhar pra comer então isso é muito forte, então as pessoas, elas acham que a gente tem que trabalhar e que ser ator não é um trabalho e você com 15 anos de idade você não tem discernimento, então você vai entendendo o que que acontece, né. Então eu tenho uma relação com ela muito, eu sempre tive uma relação com ela muito próxima antes de saber e depois não mudei em nada porque eu acho que ela fez uma coisa de bom, eu não teria tido uma família, sabe assim, se eu tivesse ficado com ela, ela sempre mudou muito de marido, sempre teve muita, uma vida muito movimentada assim de, e não, eu tive uma família, eu tive uma mãe, eu tive um pai, eu tenho irmãos, eu tenho uma irmã que é minha segunda mãe, que é a Selma, que a gente tem uma relação que é, nossa, eu devo muita coisa da minha vida a Selma, a minha irmã que batalhou por mim, então eu tenho essa referência familiar muito forte, assim.
P/1 – Você, depois desse trabalho com as flores de parafina qual foi o teu outro trabalho?
R – Aí com 15 anos, eu parei com 15 anos de vender flores, de vender rosas, eu trabalhei numa loja de informática em São João do Meriti, eu trabalhei em padaria também.
P/1 – O que você fazia nessa loja de informática?
R – Eu era balconista, eu era balconista, fiquei um tempo lá, eu fiquei um tempo lá e aí depois eu saí de lá e fui trabalhar numa padaria, fiquei um ano nessa loja de informática e aí trabalhei nessa padaria, eu trabalhei na, minha irmã tinha uma locadora também, que eu trabalhei com ela também durante muito tempo como balconista.
P/1 – Você fazia o quê, balconista?
R – Também balconista e depois trabalhei também como ajudante de padeiro, quando a minha mãe era viva ainda eu trabalhei nisso, é, eu trabalhei numa padaria quando a minha mãe era viva e eu trabalhava à noite como ajudante de padeiro.
P/1 – Ia na escola de manhã?
R – Ia na escola à tarde, estudava à tarde e trabalhava à noite, não podia trabalhar à noite, tinha 14 pra 15 anos, mas tinha que trabalhar não tinha jeito, mas era bacana, era legal, sabe?
P/1 – E na sua juventude como é que você se divertia?
R – Ah, muito a gente sempre tinha muitas festas de rua, nessa pré-adolescência porque até os meus 18 anos, foi quando realmente resolvi me profissionalizar como ator e fazer escola, antes disso eu, inaugurou uma casa de show em São João do Meriti que chama Via Show que eu passei a minha adolescência inteira lá a gente ia toda a semana, eu lembro muito disso e tinha muitas festas de rua na localidade, eu fui muito a baile de favela também saí de São João, ia pra baile na Providência, na Vila Ideal, que eram favelas vizinhas e sempre tinha muito baile, a gente sempre frequentou muito esses bailes, isso era muito legal.
P/1 – E você, qual foi a primeira vez que você se apaixonou, começou a gostar de alguém?
R – Engraçado, ah, desde sempre desde os 11 anos você já tem essa, favela tem essa coisa muito precoce também as coisas acontecem muito rápido porque você fica muito na rua, então você não fica no controle dos pais, você não fica no controle, então tem isso, eu lembro do meu primeiro beijo, eu tinha 11 anos de idade, eu lembro claramente.
P/1 – Quem foi?
R – Chamava Liliana, que era uma vizinha que morava mais pra cima eu morava um pouco mais pra baixo do morro, ela morava mais pra cima, Liliana, eu lembro disso muito bem e aí depois, ah, na escola, no Nilton, eu sempre tive muitas namoradas, era engraçado, essa relação também era muito frívola da pré-adolescência entrando, essa coisa dos namoros, das meninas, isso era muito legal.
P/1 – Que música que tocava nesses bailes, que tipo de som?
R – Pô, to tendo mó nostalgia na série porque eu cheguei a pegar muito “Tcho Tcho Meri” e essas coisas tocavam muito tocava muito funk muito funk, muito, tava começando a entrar, MC Marcinho tocava muito, mas eu nunca fui muito adepto do funk não, assim, na verdade, eu sempre gostei de músicas mais, eu sempre gostei de MPB, essa coisa, só que eu não tinha muito recurso pra poder chegar nessa músicas, assim, mas o funk nunca me, foi uma coisa que eu ouvia em casa, não.
P/1 – Como assim recurso pra chegar?
R – A minha mãe ouvia muito Martinho da Vila, por exemplo, sabe, assim, e hoje eu sou mega fã da Martinalia, um barato, adoro, que também vem dessa referência que ela já tocava com ele, era muito engraçado, mas recursos mesmo, assim, na verdade você tinha, eu não tinha rádio em, eu tinha rádio em casa, mas não tinha som, tinha um radinho que a minha mãe ouvia a noite inteira, mas a FM pegava, era um merda, não pegava nada direito, assim, era uma coisa muito, só pegava AM, pegava bem, nossa, eu lembro claramente dos programas, o meu pai escuta até hoje, a gente dormia e acordava com o Antônio Carlos, entendeu, Jussara, que era, que tinha as musiquinhas que ela, que era uma fofoqueira que entrava, acordava de manhã, ficava ouvindo na cama as fofocas do dia, sabe assim, que ela contava, Pedro Augusto, depois tinha todo um ritual lá em casa de rádio, era bem um ritual, era bem ritualística, começava com Antônio Carlos, depois desligava e aí ligava de novo no Pedro Augusto pra oração da Nossa Senhora Aparecida, era uma coisa muito, tinha toda essa relação aí. Mas quando eu falo que eu não tinha recurso pra chegar, sabe assim, não tinha como comprar disco, depois não tinha como comprar um CD não era, não tinha esse, que era quase um privilégio você não tinha, tinha que trabalhar pra comer não tinha muito jeito, quando o meu pai ficou doente a gente passou um perrengue muito forte financeiro porque o meu pai tinha uma estrutura na verdade, ele era o provedor da casa então, assim, ele adoeceu, ele tinha um salário na carteira e tinha um salário por fora de produtividade, então era uma loucura, então o salário dele na carteira era muito pequeno, então quando ele adoeceu ele foi aposentado por invalidez, nossa, isso desestruturou tudo, assim, foi uma loucura, porque a gente sempre foi pobre, mas sempre teve um dignidade bem, de comer e de poder fazer as coisas, entendeu, e aí quando o meu pai adoeceu foi seis meses de perrengue total, assim, foi uma loucura. Nossa, eu lembro claramente de tudo, a gente comia canjiquinha com broto de abóbora que catava na casa do vizinho, porque foi bem puxado, foi um período bem louco até sair a aposentadoria, os retroativos e tudo, até conseguir organizar de novo e depois a gente conviveu também, o meu pai ganhava um salário mínimo de aposentadoria pra sustentar eu, minha mãe e minha avó, os quatro na casa, por isso que eu tive que começar a trabalhar cedo também, pra poder ajudar em casa.
P/1 – E você, assim, quando foi crescendo você tinha alguma coisa assim: “Quando eu crescer eu vou ser tal coisa”, tinha algum desejo?
R – Engraçado, porque com 13 anos de idade, que foi que eu fui a primeira vez ao teatro em São João, num projeto escola, que fui assistir Os Três Porquinhos e eu queria ta ali.
P/1 – Quantos anos você tinha?
R – Eu tinha 13, eu tinha 11 anos, eu tinha 11 anos e eu falei: “Não, eu quero”, eu queria ata ali, sabe, eu vi os atores se movimentando, eu vi aquela, aquela loucura, no SESC São João do Meriti e eu queria ta ali, eu falei: “Que engraçado, eu queria ta ali”, eu fiquei com aquele desejo, eu comecei a fazer teatro na igreja, fazer Via Sacra e tudo mais e aí com, dos 13 aos 15 e com 15 anos de idade eu fui fazer um curso de teatro, meu primeiro curso no centro cultural de São João e aí eu fiz esse curso, trabalhava nessa loja de informática e aí depois fui trabalhar numa padaria com 16 anos, eu já tava no segundo grau e fui fazer um curso no centro da cidade, na Rua do Resende, na Turma OK e aí eu fiquei dos 16 aos 18 anos lá, eu fiz um curso semi-intensivo de teatro e a gente começou, a gente fazia várias montagens lá do espetáculo e isso, eu já tinha essa coisa do teatro muito forte presente na minha vida, assim, eu já queria muito ser ator eu nunca quis muito, eu nunca almejei: “Ah, eu quero ser um advogado, um engenheiro, médico”, eu nunca tive essa coisa, eu sempre tive esse foco, assim, desde sempre.
P/1 – E teve alguém na sua casa, alguma influência pra isso?
R – Não, nenhuma, imagina.
P/1 – Como eles reagiram?
R – Nossa, na verdade a minha mãe, quando eu fui fazer um curso de teatro, eu tinha 14 anos, ela super me incentivou nesse sentido, ela foi na escola, ela assinou uma autorização pra que eu estudasse à noite pra poder fazer o curso de dia, então acho que eu tive essa, eu tive essa força, assim, eu lembro disso, minha mãe, ela me deu um aval, assim, já, e logo depois ela morreu mas eu tive esse aval dela assim: “Então, tudo bem, você quer, vai”, ela, minha mãe nunca me podou muito, assim, do que eu queria, sabe assim, do que eu desejava fazer isso era muito legal. E aí com 18 anos eu entrei na Escola de Teatro Martins Pena, lá no Rio, que é uma escola de teatro, a escola de teatro mais antiga da América Latina.
P/1 – Por que você escolheu lá?
R – Porque eu já trabalhava como ator, tinha uma companhia chamada Esperança Severina, que era um pessoal que tinha saído do Tá na Rua, do Amir Haddad e eu entrei pra trabalhar com eles e eles falavam muito da escola e eu fiquei muito curioso e eu fui conhecer a escola, eu falei: “Não, eu quero estudar aqui” e aí com 18 anos eu prestei vestibular pra lá e passei, era pública e ali estudei.
P/1 – Qual foi a primeira vez que você atuou?
R – A primeira vez? Quando eu tinha 16 anos a gente, eu tinha um amigo, o Hudson, um amigo já que era da, a gente estudava juntos no segundo grau e tudo, ele que descobriu esse curso, então ele que me falou, a gente participou muito do festival de esquetes então a gente fazia muitas esquetes, que são cenas curtas de dez a 15 minutos e eu lembro a primeira vez que eu subi no palco foi na Casa de Cultura em São João de Meriti e depois, logo depois, em seguida em subi no palco do SESC, que foi aonde eu tive esse primeiro insight, assim, que eu vi o meu primeiro espetáculo lá, eu tinha uns 15 pra 16 anos, por aí.
P/1 – Quando que você, como é que foi essa história dessa companhia que você entrou?
R – Não, o Esperança Severina eu entrei com 16 anos o Hudson foi pra lá também e ele me levou pra trabalhar com eles.
P/1 – Como é o nome?
R – Desse meu amigo?
P/1 – Não, da companhia.
R – Esperança Severina.
P/1 – Esperança Severina.
R – Esperança Severina.
P/1 – Tem alguma razão especial esse nome?
R – Não, tinha com o texto Esperança Severina, que foi a primeira montagem do grupo, que eu não fiz, mas tinha com o texto e eles adquiriram o nome.
P/1 – Onde vocês ensaiavam?
R – A gente ensaiava em Duque de Caxias, a sede da companhia era em Duque de Caxias, na UERJ, que tem ali perto da 25 de Agosto, a gente ensaiava lá, eu fiquei pouco tempo lá eu fiquei dois anos com eles e a companhia hoje encerrou os trabalhos, encerraram as atividades, o Herculano, que era o diretor, voltou pro Tá na Rua e é engraçado porque da companhia o único que ficou no mercado fui eu eles não ficaram, o Herculano que trabalha até hoje com o Amir Haddad lá, então uma surpresa porque eu era o mais novo e isso é engraçado porque é um mercado muito cruel também é um mercado bem cruel e eu com 18 eu fui pra Martins Pena, me formei e tenho a minha companhia que chama Teatro Independente, que a gente se formou lá e a gente tem, a gente trabalha junto até hoje, já há seis anos.
P/1 – Vamos voltar um pouquinho, como é que era essa escola, o Martins Pena, quais eram as disciplinas que vocês tinham?
R – Sim, era bem intensivo era de segunda a sábado e a gente tinha História do Teatro Brasileiro, Literatura Dramática, Interpretação, Cenografia, Produção, Figurino, era uma coisa bem abrangente, assim, que tinham muitas disciplinas, muitas matérias, era bem puxado e com 18 anos eu trabalhava numa madeireira, então eu trabalhava de sete e meia da manhã às cinco e meia da tarde, estudava na Martins Pena de seis e vinte às 11 da noite, morava em São João de Meriti, então, assim, foi uma época bem junkie da minha vida porque eu dormia quatro horas por dia no máximo, não dormia mais porque eu tinha que acordar às cinco e meia da manhã, chagava em casa à uma, até sair da Martins Pena 11 horas da noite, pra pegar ônibus na central, até chegar em São João do Meriti, tomar um banho, dormir, acordava às cinco e meia e começava no mesmo dia novamente, era uma loucura, loucura, eu tinha 18 anos então eu aguentei bem, foi tranquilo. E aí com 19 eu tive que optar, ou eu continuava no trabalho ou eu continuava na Martins Pena porque ia ficando muito integral porque você tinha que ensaiar as provas, você tinha que ensaiar espetáculos, entendeu, então era uma coisa muito louca e aí eu optei por sair do trabalho, sair da madeireira e aí começou a loucura que você tem que entender como é que você vive disso que eu tava me formando, já tava no segundo período da Martins Pena e aí fui tentando entender como é que isso se dava na vida, aí comecei a animar festa, comecei a fazer projeto escola, comecei a fazer teatro empresa e aí eu já vim morar pro Rio de Janeiro, fui dividir apartamento com os amigos.
P/1 – Aonde?
R – O primeiro lugar que eu dividi apartamento foi na Rua da Lapa, ali entre a Lapa e a Glória, tem uma ruazinha ali que chama Rua da Lapa, que eu dividia um conjugado com duas pessoas, um amigo e uma amiga, aí era uma loucura, você dividir um conjugado que era pequenininho, mas era muito necessário, assim, eu podia ir a pé pra Martins Pena, voltava a pé, então era...
P/1 – Você lembra de professores que você teve na Martins Pena?
R – Muito, lembro demais.
P/1 – Quais que te marcaram?
R – Professores muito importantes que a gente teve lá, que chama Marcos Henrique Rêgo, Flávio Souza, tinha um professor também, todos os dois de interpretação, o Marquinhos, ele teve um lugar muito de mestre, assim, sabe, eu acho que a Martins Pena nesse ponto, isso eu devo muito ao Marquinhos, devo ao Flávio também, que o Flávio hoje é meu amigo pessoal, a gente trabalha junto e a gente frequenta a casa um do outro, isso é um barato, assim, a gente se liga, toma café junto, sai junto, uma relação de amigos mesmo. E eu tive com o Marquinhos uma coisa muito legal, assim, porque a Martins Pena, ela me fez um cidadão melhor, assim, sabe, isso foi muito, eu devo muito isso, claro que eu devo muito à minha força de vontade também de querer aprender, de querer ta, mas eu acho que a Martins Pena me fez um cidadão melhor e isso o Marquinhos teve muito, eu lembro do primeiro dia de aula que eu tive com ele na Martins Pena em 2004, que ele falou assim, que a gente foi contando, cada um foi contando a sua história de onde você era, porque você veio parar ali e aí ele virou pra mim e falou assim: “Olha, quem nasce em São João de Meriti não tem direito de ser ator não, hein”, eu fiquei, eu falei: “Como assim?”, eu falei: “Como assim, do que ele ta falando?”, eu fiquei puto da vida, eu falei: “Porra, no primeiro dia de aula o cara já me faz uma merda dessa, por que por quê?” e aí a gente foi e foi e foi indo e aí depois eu descobri que ele era de São João de Meriti, que ele era de Coelho da Rocha, eu sou de Vilar dos Teles e ele de Coelho da Rocha, bairros vizinhos e aí a ficha caí e aí depois eu fui entendendo a vida do cara, ele estudou na UNIRIO, então ele só, ele começou escondido dos pais, então ele, os pais não sabiam que ele estudava, que ele fazia Licenciatura no Teatro e ele só tinha dinheiro pra uma passagem, que era de São João de Meriti pra central, então ele andava da central até a Urca todos os dias pra poder estudar na UNIRIO, então essa frase ficou muito na minha cabeça, assim. É engraçado, eu reformulo ela hoje você tem até o direito, mas, porra, é tanto perrengue que você pode de repente, se tu não conseguir tu fica, pelo amor de Deus, mas se conseguir sai fora, porque é puxado demais, é bem puxado e eu lembro, eu tenho um professor que, o Zeca Silveira, e é muito legal você hoje ver você ta no mercado de trabalho hoje e encontrar com esses professores hoje eles são parceiros de trabalho isso é muito legal, na minha companhia a gente chama professores pra trabalharem com a gente, o Flávio, ele fez programação visual pra gente, então hoje a gente emprega os professores, isso é muito legal, os papéis se invertem isso é muito, muito legal.
P/1 – Quando que você criou a sua companhia?
R – Eu comecei a trabalhar com o Vinicius Arneiro, que é o diretor da gente, a gente era da mesma turma, a gente se conheceu, todos nos conhecemos na Martins Pena, então é, tem o Jô Bilac, que é um dramaturgo hoje que é considerado uns dos maiores dramaturgos hoje do Brasil de teatro, que é da minha companhia também e ele tem uma abertura muito grande hoje, ele é muito montado, muito requisitado, então é o Vinicius Arneiro, a Carolina Pismel, que é minha mulher, a gente é casado e a Júlia Marini, que também era da Martins Pena, então a gente se conheceu na Martins Pena em 2004, comecei a trabalhar com o Vinicius, a gente durante, nesse processo de tentar entender como é que eu ia sobreviver nessa loucura, depois de ter saído da madeireira, eu me juntei com o Vinicius, a gente fez uma prova na Martins Pena no primeiro período, chamava “Deus Danado”, que era uma cena de 15 minutos, que a gente participou durante dois anos de muitos festivais de esquetes, então a gente ganhava os festivais, a gente ganhava essa grana, você ia pra um festival, você ganhava cinco mil no festival, a gente dividia, ia pra outro festival, a gente sempre, nesses dois anos, a gente sempre ganhou alguma coisa, como sempre foi remunerado a gente ficou durante dois anos vivendo disso, né.
P/1 – Desses prêmios?
R – Desses prêmios, entendeu, a gente pensa hoje, acho que não teve, a gente pensa, que merda, a gente botava as nossas fichas nisso, mas era um festival, você podia não ganhar, por sorte de Deus a gente ganhava sempre alguma coisa, entendeu, ou era um prêmio de melhor ator ou um prêmio de melhor direção, um prêmio de melhor esquete, então sempre tinha, o melhor ator ganhava dois mil, às vezes a gente ganhava melhor ator e melhor esquete, ganhava cinco mil, seis mil e a gente ia dividindo, só era os dois então a gente ia dividindo durante dois anos, então a gente era e a parceria começou daí, aí em 2006 a gente fez um esquete também, que era, chamava Cachorro, que a gente participou de um festival Mercadão Cultural e um festival de Cabo Frio, que foi onde eu conheci a Carolina, em 2005 e aí a gente resolveu: “Ah, vamos comemorar um ano de namoro, vamos fazer um trabalho, vamos levar pro festival”, já tava na Martins Pena, a gente fez esse esquete, a gente apresentou no Mercadão Cultural, que era um festival que teve nacional no Rio de Janeiro, que veio trabalhos de tudo quanto é lugar e fomos pra Cabo Frio comemorar o namoro e o Vinicius tava junto com a gente e aí a gente ganhou melhor esquete e melhor direção nos dois festivais, a gente ganhou um total de quase 20 mil reais de prêmios nesses dois festivais, falou: “Pô, vamos montar uma peça, vamos fazer um espetáculo, né”, aí vamos fazer, a gente gastou o dinheiro inteiro, dividiu o dinheiro, aí deixou, a gente fez uma venda da estreia pro SESC e aí a gente ganhou mais 12 mil reais e montamos o espetáculo que a gente ta em cartaz até hoje, a gente ta em cartaz até hoje e aí foi que começou a companhia, em 2006.
P/1 – Desde aquela época vocês estão em cartaz?
R – Desde aquela época, desde aquela época, a gente faz muita peça, muito, muito, muito, a gente foi indicado...
P/1 – Ta em cartaz é a companhia?
R – A companhia e o espetáculo também, a gente apresenta até hoje.
P/1 – Aquele espetáculo?
R – É, o “Cachorro”.
P/1 – “Cachorro” até hoje.
R – É, a gente estreou em 2007 no SESC de Copacabana e aí a gente foi indicado ao Prêmio Shell de melhor direção lá, aqui no Rio to em Paquetá, fora do Rio, a gente foi indicado aqui e a companhia, a gente começou a realmente se profissionalizar, o “Cachorro” de fato foi o meu primeiro trabalho profissional como ator, assim, mesmo e nossa, eu devo muito a esse espetáculo, eu devo a minha vida a ele, minha sobrevivência e aí foi onde a gente começou a entender melhor profissionalmente, assim, e aí a companhia começou a se estruturar, a gente viajou o Brasil inteiro, aí depois a gente montou o espetáculo Rebu, que tem três anos que a gente ta em cartaz, o “Cachorro” a gente ta há seis, o Rebu a gente ta há três, a gente fez um projeto com a companhia, que é um projeto do SESC, que é um projeto de curadoria desse professor da gente, do Marcos Henrique Rêgo, que é um projeto nacional, isso é muito legal acho isso uma coisa muito, é um barato porque ele foi nosso professor e hoje ele é o nosso parceiro de trabalho e a gente viajou os 27 Estados do Brasil fazendo os trabalhos, a gente se meteu em cada buraco que é tipo incrível, a gente apresentou em aldeia indígena.
P/1 – É, como é que foi?
R – Uma experiência surreal imagina você apresentar em aldeia indígena, é muito louco, o cenário chegando de barco, entendeu, é uma coisa que você fala, que viagem incrível, a gente passou o dia com eles lá e tudo, a gente apresentou numa ilha também chamada Ilha do Maçangano, que é em Petrolina, uma coisa fantástica, assim, sabe assim, chegar de barco e tem todo um ambiente, sabe assim, nossa, experiências absurdas, assim, pisei em lugares do Brasil que eu jamais pisaria.
P/1 – Qual foi o lugar que mais te marcou?
R – Engraçado essa Ilha do Massangano é um lugar muito que me marcou, assim, mas o Estado que me marcou muito foi Fortaleza, Fortaleza é uma coisa muito e o Cariri, a gente vai todo ano pro Cariri, Cariri foi acho que o lugar mais incrível, assim, que eu já fui, assim, é uma coisa muito louca, tem um festival, Mostra SESC Cariri, que a gente vai todo ano, que a gente fez uma parceria com a gerente de cultura do SESC Ceará, que é amiga da gente, a Dani de Jade e a gente vai sempre pra lá. E a primeira vez que a gente foi foi em 2008, que a gente foi com o “Cachorro” e aí tem umas coisas lá que é como se fosse uma folia de reis que eles chamam de reisada, então é uma rua, sabe assim, inteira, que as pessoas vão cantando e dançando o dia inteiro e eu tava sozinho lá porque o pessoal ficou indo e vindo porque tava na faculdade, tava na loucura e eu fiquei 20 dias no Cariri e aí pelo festival e eu fui nessa reisada sozinho, então eu cheguei na rua, eles estavam brincando, os palhaços e elas cantando e cantando e aquela coisa bem regional e aí teve uma senhorinha que me pegou pelo braço e falou assim: “Vem conhecer minha casa” e aí eu fui que era a casa da reisada e aí ela tinha uma panela do chão até aqui assim, que ela fez o mungunzá, que é com todos os miúdos do porco fígado, rins, eu já conhecia e aí tinha um latão enorme com suco de manga e ela pegou o mungunzá, deu na minha mãe, pegou um copo de suco de manga, me deu e eu achei aquilo incrível, assim, a mulher nunca me viu na vida, sabe assim, me pegou pela mão, me levou pra dentro de casa, me deu comida, me deu bebida, incrível assim, sabe assim, a relação que o povo tem e aí isso faz sentido, sabe assim, faz sentido a arte, sabe assim, você ser artista, porque aí você vê sentido nisso você vês as pessoas saindo da lavoura, sabe assim. A gente se apresentou numa cidade chamada Nova Olinda que tem uma, um lugar que chama Casa Grande, que é uma das coisa mais incríveis, assim, que eu já pude ver, que é uma casa comandada por crianças, tem uma pessoa que é responsável pela casa, mas as crianças são responsáveis pela casa, tem uma pessoa que é responsável pelo projeto e então, assim, as crianças passam o dia inteiro, as crianças da cidade, então você chega, uma criança de pega pela mão, ela te leva pra cidade, ela é seu guia, sabe assim, é incrível a relação que as crianças têm com a cidade, sabe assim, o respeito que as pessoas têm pelas crianças da cidade, assim, então os responsáveis pela técnica do teatro são as crianças, entendeu, elas que sabem tudo, mexem com a mesa de luz e tudo, então é uma coisa, é genial, assim, tem uma gibiteca, tem um lugar de cinema, sabe assim, tem a rádio que é comandada pelas crianças, então, assim, a gente foi dar uma entrevista na rádio de Nova Olinda entrevistado pelas crianças, assim, é incrível, o Cariri acho que foi um dos lugares mais incríveis, assim, que eu, que a gente já pôde, é muito marcante e a gente vai direto, a gente vai todo ano desde 2008 pra essa mostra.
P/1 – E você já tinha feito TV?
R – Tinha feito coisas pequenas assim.
P/1 – Qual foi o seu primeiro trabalho na TV?
R – Na TV? Ah, eu considero o meu primeiro trabalho foi o Força Tarefa mesmo, a segunda temporada que eu fiz, que foi muito legal, assim, que era um programa que tinha com o Murilo Benício, com a direção do Alvarenga, eu fiz a segunda temporada, foi muito bacana.
P/1 – Qual que era o seu papel?
R – Era Sidney, eu fiz, era um menino que entrava pra escola de polícia, só que era de um, era mancomunado com o tráfico então o chefe do tráfico que colocava junto com a banda podre da polícia que era mancomunado, eles ganhavam, tinha uns sargentos da polícia que ganhavam dinheiro com a entrada desses meninos na escola de polícia e aí eu fazia um meninos desses que na verdade, que quando era pego entregava todo o esquema dessa trama, era, foi muito bacana.
P/1 – Como foi o convite pra você fazer?
R – Não, eu fiz um teste, porque tem isso você vai, eu fiz um processo muito específico, assim, eu venho fazendo um processo muito específico de carreira, o meu foco é o teatro mesmo então eu tenho minha companhia, eu trabalho, então a gente fica em cartaz, então as pessoas vão ver os espetáculos, os espetáculos têm tido uma repercussão da companhia, e a gente trabalha fora também, em outras produções, eu to em cartaz agora com um espetáculo em São Paulo, de sexta a domingo, que é o Dorotéia, que a Aline Moraes faz também, que é contratada da casa, então as pessoas vão conhecendo o teu trabalho vão te vendo e vão te chamando, vão te convidando pra teste, vão te convidando pra abranger trabalhos pra fazer parte de trabalhos e aí eu fui indicado por um produtor da casa, o Jairo Macedo, ele me indicou pra Juliana Silveira pra fazer o teste, eu fiz o teste e passei e aí o Alvarenga me chamou pra fazer, aí foi um barato, foi uma experiência bem legal e agora eu to aqui, né.
P/1 – Como é que você foi convidado pra isso?
R – Pro subúrbio? Eu fiz um espetáculo em abril que chamava Rebelde Sobre a Raiva, no SESC de Copacabana, no teatro de arena e o Carnevalli, o Antônio Carnevalli, que é o preparador de elenco da série, fazia o espetáculo junto comigo, ele me fazia 20 anos depois e aí a gente tava num processo, a gente já tava em cartaz e aí o Carnevalli tava lendo eu tava botando o figurino, o Carnevalli tava lendo, eu falei: “Cara, tu ta lendo o que, bicho, vamos entrar em cena, você ta louco, você vai desbaratinar, vai ficar maluco”, ele falou: “Não, cara, to pegando um trabalho agora que eu acho que vai ser, vai me tomar muito tempo, então eu tenho que estudar, eu tenho que ver isso aqui”, aí eu falei: “Que trabalho que você pegou?”, ele falou: “Pô, eu acho que vou preparar o elenco da próxima série do Luís Fernando”, aí eu falei: “Porra, que legal, cara, que bacana”, aí a gente começou a conversar sobre o trabalho do Luís, sobre a trajetória de trabalho das séries e tudo mais, aí ele virou e falou assim: “Pô, você tem interesse em trabalhar com o Luís?”, eu falei: “Porra, qualquer ator que você perguntar do país vai ter interesse de trabalhar com o Luís Fernando porque, pela trajetória do cara pela obra que ele tem, é uma coisa muito”, ele falou: “Pô, eu vou te indicar então pra série”, eu falei: “Pô, bacana, beleza”, aí acabou a temporada, enfim, ele começou na loucura, ele já tava enlouquecido de trabalho e tudo mais, aí depois ele me ligou um dia e falou: “Paulinho, começou os testes lá, não sei o quê, pererê, quero indicar você, me deixa um material aqui pra eu mostrar pro Luís”, aí eu deixei um DVD que era uma compilação com os trabalhos que eu já tinha feito no teatro, televisão e aí o Nelsinho Fonseca me ligou pedindo pra eu ta lá no Projac e aí eu fui, fiz um teste, fiz três testes e aí to aqui.
P/1 – Como que foi o seu teste?
R – O primeiro na verdade foi só com o Carnevalli mesmo, que era um teste com um texto que nem era do meu personagem, que era do Lorival, que é o Artur que faz, aí era só pra câmera mesmo o teste e aí depois eu fiz com atrizes que estavam fazendo teste pra fazer a personagem que é a minha mulher na série e aí era uma vivência mais trabalhada, aí foi com o Carnevalli e com o Nelsinho, que era uma coisa mesmo de relação de casal e de, e relação desses personagens já que já começam a série casados então é, foi bem interessante, assim, foi mais uma vivência, né.
P/1 – Aí você passou e deram seu personagem?
R – Isso, eu já tava fazendo pra esse personagem.
P/1 – O seu personagem é o ....?
R – Que é o Lila.
P/1 – É o Lila.
R – Lila.
P/1 – Aí você já tava fazendo teste pro Lila?
R – Pro Lila, aí já era específico, esse primeiro teste que eu fiz no Projac foi um teste mais abrangente, acho que era que eles queriam ver mais o perfil, ver a relação com a palavra, ver essa coisa e aí depois foi direcionado pro personagem.
P/1 – E quais são as características do Lila?
R – O Lila? Engraçado o Lila é meio agregado o Lila faz parte do núcleo da família, que ele é casado com a Amelinha e ele é um agregado ele e a Bete, eles são os únicos brancos na casa isso é muito legal, é incrível, ele é meio malandro só que ele é um malandro ingênuo e aí tem essa relação, ele na verdade ele é responsável na trama ele faz toda a negociação do Conceição com o empresário do baile funk, com o presidente da escola de samba, então ele ta sempre ali mas ele também defende ela quando a coisa começa a complicar pro lado dela, ele quer dar porrada no Clayton, porque ele também e ele percebe as coisas. Tem uma cena muito forte que acontece que os dois entram dentro de casa, ela entra rasgada, uma coisa meio e o Lila percebe que foi o, que o Clayton ta metido na história e ele quer dar porrada no Clayton, tem uma coisa meio, diferente do Moacir, diferente dos outros homens que querem se aproveitar da Conceição o Lila não tem essa característica não, ele gosta dela mesmo, ele gosta dela como pessoa, como cunhada isso é legal, mas ele é meio ingênuo ele se mete numas coisas que ele não sabe muito, tipo, ele se mete com o cara do baile funk, entendeu, com o empresário do baile funk que é um picaretão, entendeu, e aí ele começa a ver meio uma coisa meio deslumbrada que ele também, ele sabe que ele vai se dar bem, a Conceição entra no baile, ele entra de graça, então tem todo, tem esse lado e depois se mete com presidente de escola de samba.
P/1 – Você tem alguma identificação, assim, o que você acha, o que tem de você no personagem?
R – Cara, tem muito acho que de mim nem tanto, mas da minha realidade, da realidade que eu vivi, essa série é um presente enorme, assim, é muito legal e aí tem uma realidade que é incrível que a série discute, a série discute amor isso é muito legal, essa família é muito amorosa, essa família, a série discute agregação tipo é o poder que isso tem então eu acho que o Lila, ele tem essa malandragem que é muito o que eu tive que ter porque é isso, cara, o Lila é esse cara, o Lila conhece o cara do baile, o Lila conhece o Tutuca, que é o traficante, mas também ta, você quando nasce e cresce em favela é muito isso, cara, o cara cresceu contigo, tu conhece o cara, tem uma relação muito, muito e aí, peraí, você sabe quem é quem, entendeu, é ilusão a galera achar que, o cara mora em favela, o cara ta ali. Na verdade o morador de favela é o cara menos privilegiado porque, sabe, assim, a polícia, sobe, esculhamba o cara, entendeu, a polícia desce os bandidos tão lá, você sabe quem é quem, mas você não, entendeu, você ta vivendo aquela realidade, entendeu, todo mundo sabe quem é quem, isso é mentira, entendeu, é mentira, a polícia, que não ta lá todo dia, sabe quem é quem, entendeu, os moradores não vão saber quem é quem, sabe assim, e aí você, é muito louco, então acho que o Lila tem essa coisa assim, sabe, esse jeitinho brasileiro que é de lidar com as coisas, assim, de estar nos lugares, saber quem é quem, mas também ta de fora, entendeu, ele não se envolve com os caras, isso é legal, mas ele tem essa, tem uma fala dele que tem uma discussão de família que ele fala que com ele ninguém tira onda, entendeu, que ele conhece todo mundo , tem essa relação, assim, ele é meio malandro, mas é um malandro ingênuo, é um malandro ingênuo.
P/1 – E você acha que o cenário, quer dizer, o contexto te remete a sua história de vida?
R – Completamente, imagina, os bailes funk, eu tenho muita cena de baile tem muito conflito em baile funk e, pô, frequentei muito baile funk, ia escondido a baile funk da minha mãe então é um barato, assim, você ver as músicas que são muito da época, isso é legal e o contexto familiar muita bagunça, muita comida, muito, muita gritaria, muito… algazarra, mas todo mundo se ama, todo mundo se ajeita, entendeu, essa coisa é muito subúrbio essa coisa é subúrbio demais acho que isso é o maior barato da série, assim, é discutir amor, sabe assim, é agregar uma menina que vem do nada, que chega do nada, mas é amor, sabe assim, é o poder que eu acho que os subúrbios têm demais gente humilde tem isso demais, que é essa história que eu te contei da senhorinha que me pegou pelo braço e me levou pra dentro de casa, entendeu, nunca me viu na vida, sabe assim. Óbvio que isso também é de um caráter muito lírico é muito poético, tu não vai botar qualquer um na tua casa, acho que não é muito por aí mas essa capacidade que você tem de, que a série tem de discutir isso, assim, é muito legal, assim, a série não cai nessa coisa, nessa coisa piegas, entendeu, mas também não cai no fatídico abrange esse entorno assim, sabe, isso é muito legal, a série ta ficando linda demais, ta ficando muito bonita.
P/1 – Tem alguma pergunta, Juliana?
P/2 – Tenho, eu fiquei curiosa, o que é o “Cachorro”, qual é a história da peça?
R – Ah, o “Cachorro”, o “Cachorro” é inspirado no universo do Nelson Rodrigues na verdade, é um texto original do Jô, que na verdade a gente abrangeu uma pesquisa sobre todo o universo do Nelson, mais específico as tragédias cariocas e “A Vida Como Ela É” e aí na verdade o “Cachorro” é a história de um triângulo amoroso que é uma mulher que traí o marido com o melhor amigo, é uma coisa bem clichêzona e aí é interessante que é como a gente conta a história, isso é interessante e aí o Jô, na verdade ele se apropriou do universo do Nelson e criou um texto original, então todos os termos do Nelson que a gente foi estudando, batata, carambolas, o Jô foi criando os termos dele isso é muito legal, assim, um ponto de vista muito interessante. E aí é isso, na verdade quem faz o “Cachorro” sou eu, a Carolina Pismel, que é a minha mulher e o Felipe Abib, que era da companhia, que saiu depois, hoje quem faz é o Vinicius, que é o diretor da gente e a gente ta em cartaz aí com o “Cachorro” até hoje e é interessante porque o “Cachorro” a gente, a gente utilizou na verdade todos os clichês do Nelson, assim, essa história que é a mulher que traí o marido com o melhor amigo, a gente resolveu utilizar o tango, que não é uma coisa nada nova quando se remete a Nelson Rodrigues, mas acho que é interessante a forma que a gente conta, na verdade por isso que o espetáculo é tão bem vivo, assim, a forma com que a gente opta por contar a história. E o “Cachorro” foi um divisor de águas muito forte, assim, na carreira de todo mundo, da companhia inteira, do Jô como dramaturgo, da gente como atores, do Vinicius como diretor e quando a gente estreou o “Cachorro” eu tinha 22 anos, então isso pro mercado de trabalho do Rio de Janeiro foi muito legal, assim, porque a gente foi recebido muito bem, assim, a companhia tem uma carreira em São Paulo também muito legal, assim, a gente ficou em cartaz com o “Cachorro” em São Paulo duas vezes, no SESC da Avenida Paulista, depois na Caixa Cultural, o Rebu a gente foi também pro SESC Consolação, então São Paulo também tem uma abrangência muito forte, assim, e lá eles dão muito mais valor ao trabalho de grupo aqui no Rio de Janeiro a gente é literalmente uma exceção, assim, porque se batalha muito, as companhias aqui no Rio tem que batalhar muito pra conseguir espaço, porque o mercado também é maior tem a coisa da televisão, tem a coisa que é muito mais abrangente, em São Paulo eles tiveram que entender alei da sobrevivência através do teatro de grupo então, assim, São Paulo tem uma coisa que no Rio não tem, que é a Lei do Fomento, que é lei, todo ano tem que ter seis milhões de reais pra poder bancar e custear os teatros de grupo, entendeu, então no Rio de Janeiro a gente tem edital, edital não é lei se o prefeito disser que não vai ter esse ano não vai ter, então, assim, é muito isso.
P/1 – Paulo, olhando a sua trajetória de vida, se você pudesse mudar alguma coisa você mudaria?
R – Não, não mudaria nada não, ta tudo no lugar, ta tudo certo, não mudaria nada.
P/1 – Você tem sonhos, quais são seus maiores sonhos?
R – Engraçado porque eu aprendi muito a viver o presente ah, eu tenho vontade de viajar, de conhecer lugares, tenho vontade ir a Austrália, por exemplo, mas nada muito, quando eu olho pra minha vida hoje eu acho que ta tudo certo, cara, até a minha casa, sabe assim, eu tenho minha família hoje, a minha mulher, eu tenho as minhas coisas, eu trabalho, eu me sustento, eu ajudo o meu pai, eu acho que ta tudo certo, sabe assim.
P/1 – Onde que a sua casa?
R – Na Tijuca.
P/1 – E o seu pai continua lá em São João do Meriti?
R – Continua lá em São João.
P/1 – Na mesma casa?
R – Não, não, ele mora com a minha irmã numa outra casa, fora da, já fora da favela, mora mais pra baixo, eu tenho um irmão e a minha tia, ainda moram lá, ainda moram lá, moram na favela, eu sempre vou lá, sempre que eu posso eu to lá, os amigos, sempre movimenta coisas, tenho amigos, ele vêm ver os meus espetáculos, isso é um barato, é um barato e quando você apareceu na televisão pela primeira vez é aquela maluquice, o povo, porque é muito distante é uma realidade muito distante, porque diferente dos meninos do Nós do Morro, por exemplo, que eles conseguiram trazer a realidade pra dentro, entendeu, então, assim, é tudo muito próximo, é tudo muito ali ta todo mundo ali, vivendo ali, os meninos moram ali, é tudo, isso é muito legal do projeto Nós do Morro, que eles conseguiram romper com uma realidade a realidade é aqui, isso é muito legal. Lá em São João do Meriti não a realidade é lá, é muito distante, isso é legal também e é legal também porque eu sempre encarei, sempre encarei televisão muito como consequência de trabalho a televisão não é o supremo, entendeu, não, eu trabalho e me sustento com o teatro desde os 19 anos de idade, entendeu, a televisão é consequência isso é legal, assim, eu sempre implantei muito isso na cabeça da minha família, só que tem uma coisa que você não tem como controlar que é as pessoas, é a euforia ta dentro da casa, você liga é aqui ta na mão, isso é muito louco do veículo é bem louco, ta na mão, você entra sem pedir licença na casa das pessoas e isso pra família é muito louco tipo, como assim, pá, ligou, ta ali, eu to ali, to com eles, entendeu, isso é muito, é muito, é muito louco .
P/1 – Paulo, o que você achou da experiência de dar esse depoimento pro Museu da Pessoa?
R – Pô, interessante.
P/1 – Contar a sua história de vida.
R – É interessante, é meio nostálgico também um pouco que você vai buscando coisas pô, falar da escola, falar da Ieda, minha primeira professora, não falo dela não sei nem quantos anos, não sei nem a última vez quando eu falei dela, é nostálgico e é legal nostalgia é uma coisa boa, eu acho bom, você ficar lembrando, remoendo, legal, é bacana, às vezes na correria da vida você nem, não vem trazendo mais a história é legal você vir trazendo a história às vezes saber de onde você veio é bacana, é bom, é bonito, é um projeto interessante de trazer, é bacana, fiquei feliz, fiquei feliz.
P/1 – Quem bom, a sua história é ótima.
R – Fiquei feliz.
P/1 – Nossa, da um filme.
R – Tem muita coisa aí é uma loucura.
P/1 – Tem alguma coisa que te ocorreu agora que você queira deixar registrado? Deve ter milhares de coisas que eu nem toquei, nem passei perto.
R – Ah, não sei, pô, a gente falou tanta coisa falou de muita coisa, acho que falou de muita coisa.
P/1 – De uma vez só.
R – É, foi emendando não sei não sei, acho que talvez a gente tenha falado pouco da série, não sei, a gente falou da trajetória toda, mas eu to muito feliz de poder ta com o Luís aqui.
P/1 – Como é que a sua atuação com os outros atores, com atores mais experientes ou com outras pessoas que não tinha atuado ainda?
R – Pô, é um barato, o Fabrício Boliveira, que faz o Cleiton, que é o protagonista da série, a gente é amigo há um tempo, a gente nunca tinha trabalhado junto, o Cleidemar, eu conheço, o Cleidemar da Martins Pena também, eu conheci o Cleidemar da Martins Pena, a gente se conhece há dez anos, a gente nunca tinha trabalhado junto e, pô, a gente ta tendo a oportunidade de trabalhar agora, o Cleidemar é da mesma cidade que eu, também batalhador, sabe assim, ta aí na vida já há tempos, ta aí primeiro do que eu até ta na vida há tempo e agora ta num trabalho bacana, sabe assim, isso é muito legal, assim, isso é legal também, é a mesma coisa que a série discute, agregação a gente vai se agregando, a Dani Onellas, a Rosinha, a Rosa Maria, o Haroldo Costa, pô, um cara que ta aí há muito tempo já muito tempo. E é maior barato você poder trocar com essas pessoas e ta junto e é um barato ta com a Érica, por exemplo, que é uma menina que não era atriz, que é incrível, você vê, o texto saí da boca da menina de um jeito que você fica assim: “De onde saí?”, sabe assim, ta nela ta nela, é um barato, assim, você poder ta, eu to muito feliz de ta com o Luís também que é um diretor muito incrível, assim, muito, eu tenho vários amigos que são atores que já tinham trabalhado com ele e que já me falavam do processo dele tem uma amigona minha, a Mariana Neiva, que trabalhou muito com ele, ela fez umas três ou quatro séries com ele.
P/1 – Como que é o processo dele?
R – É um processo muito diferente, assim, de televisão, é muito diferente de televisão, de uma novela, por exemplo, a gente ficou quase dois meses de preparação lá no Rio de Janeiro, ficou quase dois meses, todos os dias, a gente teve aula de funk, a gente teve aula de jongo, a gente teve uma preparação muito forte com o Carnevalli de ensaiar as cenas, a gente teve aula de corpo com a Lucinha, Lucinha Cordeiro e muito intenso, assim, muito intenso, pancadaria, sabe assim, mesmo, trabalho, a gente ensaiava cena, pô, a gente ensaiou cena, sabe assim, viveu cena, viveu coisas, trabalhou esse personagem, eu fui entendendo esse universo e é muito intenso, assim, sabe assim. Porque na hora também ele é muito rápido também, ele é, ele vai, vai, sabe assim, te da as coordenadas e tu vai assim e é um processo muito incrível porque é ator solto e câmera na mão, entendeu, tipo, isso é incrível, sabe assim, você se sente parte da coisa, sabe, você não é um, você não é um boneco, sabe assim, é o cara falando: “Pô, me ajuda aí”, sabe assim, você fala: “Pô, o Luiz Fernando Carvalho, cara, o cara”, sabe assim, eu lembro, eu era pequeno, eu lembro dos “Irmãos Coragem” que ele dirigiu, sabe assim, “Rei do Gado”, “Hoje é Dia de Maria”, sabe assim, pô, “Os Maias”, assim, que eu vi lá, eu vi, a gente usou muito “Os Maias” de referência no “Rebu”, sabe assim, que a gente usou o Eça de Queiroz, pô, “Os Maias” é uma série fantástica, assim, sabe assim. É bacana porque a pegada que ele ta tendo na série é uma pegada muito documental então quanto mais solto você tiver melhor, quanto mais aqui você tiver, quanto mais você tiver vivendo a história, é muito legal porque é muito incrível, assim, o que a gente ta vivendo, sabe assim, a gente veio gravar o primeiro dia em Paquetá, a gente não conhecia a casa da família então a gente chegou pra gravar numa segunda-feira, aí o que que ele fez? Ele falou: “Ó, vou cancelar o dia inteiro de gravação, não vai ter gravação hoje, vocês vão ficar o dia inteiro na casa, vocês vão entrar e vão viver lá dentro, vão ficar lá”, incrível, sabe assim, a gente entrou na casa, foto da gente espalhada pela casa, não tinha visto, começou a passar café, fritar ovo, começou a fazer, viver ali aquela família, entendeu, porra, uma experiência tipo, é fantástico, assim, você ta vivendo e fazer parte disso, assim, sabe, é um cara que entra, que te deixa, sabe assim, te deixa solto, tipo: “Vive aí, bicho, tu sabe o texto, sabe o que tem que fazer e, vem cá, eu quero isso aqui assim”, pá pá pá, ele faz uma coisa que te direciona, aí tu faz uma coisa, ele cria um plano que não existia, sabe assim: “Não, vou pegar teu plano aqui agora”, mas, pô, não existia o plano, então vai, vamos repetir, entendeu. É incrível, assim, a sensibilidade que o cara tem de condução, sabe assim, aconteceram coisas fantásticas na série, o Fabrício tava gravando uma cena que ele volta, que ele meio que ressuscita e a mãe ta dando comida pra ele, na boca dele e aí do nada surge um gato na cena e aí o gato foi pro colo do Fabrício, sabe assim, o Fabrício começou a pegar comida com o dedo e dar na boca do gato e a mãe dando comida na boca do Fabrício, o Fabrício dando comida na boca do gato, isso não existi, o gato chegou ali do nada, entendeu, e ele pegou a coisa assim. Tava gravando uma cena de funk com os meninos, entrou um cachorro na cena e do nada saiu um cachorro, ele pegou o cachorro, ficou acompanhando o cachorro, sabe assim, uma coisa, ele tem uma sensibilidade que é muito doida, que é muito doida, eu to muito feliz de ta com ele assim, por tudo, assim, pelo conjunto, assim, de ta tendo essa oportunidade, sabe assim, de ta vivendo essa história intensa, de ta vivendo televisão dessa forma, é, to muito feliz, muito feliz mesmo.
P/1 – Obrigada.
R – Imagina.
P/1 – Muito lindo.
R – Obrigada você.
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