IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Ricardo Juiniti Bernardo. Nasci em São Paulo, em 21 de fevereiro de 1961. FAMÍLIA O nome do meu pai é Antonio Bernardo. Ele nasceu em 1932, trabalhou como desenhista e projetista até o ano passado, em 2003, quando se aposentou. O nome da minha mãe é Sizuko Bernardo. Ela nasceu em São Paulo, é descendente de japoneses, é nissei. Os meus avós, pais da minha mãe, são imigrantes japoneses. Chegaram ao Brasil em 1933, para trabalhar na lavoura. Chegaram ao Porto de Santos depois de 45 dias em um navio e foram para o interior de São Paulo. Trabalharam no interior durante alguns anos e vieram para a Capital. O nome do meu avô era Junichi Tasaka, por isso que o meu sobrenome ficou Juiniti. Na verdade, quando minha mãe nasceu, o nome dela foi grafado errado e meu nome ficou igual, Juiniti. O nome da minha avó era Shizuio Tasaka. Os dois já faleceram. O que eu lembro deles eram algumas histórias que eles contavam dessa época da imigração. Chegaram ao Porto de Santos, pegaram um trem para o interior de São Paulo, receberam um lanche de pão com salsicha e, como não sabiam o que era aquilo, jogaram a salsicha fora e comeram o pão. E, como os outros imigrantes japoneses, sofreram bastante com essa mudança cultural. Os pais do meu pai eu não conheci, ambos já tinham falecido quando nasci, mas o nome do meu avô era Humberto Bernardo. Ele era alfaiate e nasceu em São Paulo. Era filho de italianos, que vieram para o Brasil no início do século, por volta de 1900, alguma coisa assim. E a minha avó, o nome dela era Adelina Lázaro Bernardo, também não a conheci. Meu pai era muito novo quando a minha avó faleceu. Minha avó era italiana também; o meu avô era napolitano e a minha avó era calabresa ou alguma coisa do tipo. Minha avó faleceu quando o meu pai era muito novo ainda, tinha oito anos de idade, e meu avô faleceu quando ele tinha 18 anos. Então, a memória foi se perdendo um pouquinho,...
Continuar leituraIDENTIFICAÇÃO Meu nome é Ricardo Juiniti Bernardo. Nasci em São Paulo, em 21 de fevereiro de 1961. FAMÍLIA O nome do meu pai é Antonio Bernardo. Ele nasceu em 1932, trabalhou como desenhista e projetista até o ano passado, em 2003, quando se aposentou. O nome da minha mãe é Sizuko Bernardo. Ela nasceu em São Paulo, é descendente de japoneses, é nissei. Os meus avós, pais da minha mãe, são imigrantes japoneses. Chegaram ao Brasil em 1933, para trabalhar na lavoura. Chegaram ao Porto de Santos depois de 45 dias em um navio e foram para o interior de São Paulo. Trabalharam no interior durante alguns anos e vieram para a Capital. O nome do meu avô era Junichi Tasaka, por isso que o meu sobrenome ficou Juiniti. Na verdade, quando minha mãe nasceu, o nome dela foi grafado errado e meu nome ficou igual, Juiniti. O nome da minha avó era Shizuio Tasaka. Os dois já faleceram. O que eu lembro deles eram algumas histórias que eles contavam dessa época da imigração. Chegaram ao Porto de Santos, pegaram um trem para o interior de São Paulo, receberam um lanche de pão com salsicha e, como não sabiam o que era aquilo, jogaram a salsicha fora e comeram o pão. E, como os outros imigrantes japoneses, sofreram bastante com essa mudança cultural. Os pais do meu pai eu não conheci, ambos já tinham falecido quando nasci, mas o nome do meu avô era Humberto Bernardo. Ele era alfaiate e nasceu em São Paulo. Era filho de italianos, que vieram para o Brasil no início do século, por volta de 1900, alguma coisa assim. E a minha avó, o nome dela era Adelina Lázaro Bernardo, também não a conheci. Meu pai era muito novo quando a minha avó faleceu. Minha avó era italiana também; o meu avô era napolitano e a minha avó era calabresa ou alguma coisa do tipo. Minha avó faleceu quando o meu pai era muito novo ainda, tinha oito anos de idade, e meu avô faleceu quando ele tinha 18 anos. Então, a memória foi se perdendo um pouquinho, aquelas histórias foram se perdendo. FAMÍLIA Tem essas histórias de chegar ao Brasil, pegar um trem em Santos e ir para o interior de São Paulo, passar um tempo no interior trabalhando na lavoura, depois vir para a cidade de São Paulo. O meu avô – o pai da minha mãe – depois virou tintureiro em São Paulo. Tinha essas histórias de choques culturais. O meu pai, por exemplo, é o sétimo de uma família de oito irmãos e a minha mãe é a quinta de uma família de seis. Então, são famílias grandes, eu tenho muitos primos. Os meus pais eram os mais novos da família, eu sou também um dos mais novos da família. Tenho primos mais velhos e poucos primos mais novos. Histórias dos meus avós, por parte de mãe, eu não conheço muitas. Eles viveram sempre na Mooca, um bairro típico italiano, mas não tinham muitas histórias para contar. Eles se conheceram em São Paulo, em um baile qualquer da vida, não sei exatamente onde. Lembro da história dessa época do meu pai e da minha mãe, das dificuldades quando eles começaram a namorar, aquele choque cultural. Japonês casava com japonês, então foi uma briga tremenda na família até os dois poderem se casar. Eles se conheceram por volta de 1955 ou 1956 e se casaram em 1960. Eles contam dessas brigas familiares antes de casar. Hoje é muito comum, naquela época era dificílimo, era complicado. Eu tenho um irmão só. Ele é três anos mais novo do que eu. O nome dele é Cláudio. É engenheiro também, trabalha em São Paulo. INFÂNCIA A minha infância foi em Guarulhos, onde nasci e sempre morei. O motivo principal é que o meu pai trabalhava em Guarulhos. O meu pai entrou numa empresa em 1955, chamada Asea Elétrica, hoje é ABB. Ele trabalhou a vida toda, praticamente, nessa empresa, até o ano retrasado. E, por isso, eu sempre morei em Guarulhos. Guarulhos é até hoje uma cidade industrial. Eu lembro que, até os oito anos, morei numa casa num bairro chamado Vila Augusta. Era uma rua sem saída, onde tinha umas 20 e poucas casas. Cresci ali. Depois mudamos para um outro bairro, também em Guarulhos. Fiquei minha vida toda lá até entrar na Petrobras e ir para Salvador. CASA Tenho algumas lembranças. Era um sobrado nessa rua sem saída. Tinha uma garagem embaixo, um lance de escadas, o térreo, depois tinha mais um andar. Depois nós mudamos para um outro sobrado em outro bairro de Guarulhos, mais próximo ao centro. BRINCADEIRAS DE INFÂNCIA Brincava muito na rua, jogava bola, andava de bicicleta. As lembranças de infância passam por ganhar a primeira bicicleta. Andava muito de bicicleta na rua, jogava bola. Era muito bom. A turma era grande e divertida. FAMÍLIA O meu pai sempre trabalhou; minha mãe nunca trabalhou fora de casa. Às vezes, o meu pai trabalhava até um pouco mais tarde, fazia hora extra, esse tipo de coisa. Então, o que eu lembro muito dessa época era isso. Desde que me conheço por gente, queria ter um irmão de todo jeito. Vivia pedindo um irmão. Até pegar criança na rua e convidar para morar lá em casa como irmão eu já tinha feito. Minha mãe quase me matou, ela sempre conta essas histórias. Eu queria ter um irmão. Eu e meu irmão fomos muito companheiros na época de adolescência, mas o meu irmão é muito introvertido, muito quieto. Então, hoje ele tem a vida profissional dele, eu tenho a minha. Ele mora em São Paulo, eu moro em Macaé. O contato não é mais tão freqüente. Fiquei muito feliz com o nascimento. Minha mãe conta que eu fui à maternidade buscá-lo. Obviamente, eu fiquei com alguma tia, aquela história toda. Eu fui ao berçário e queria escolher: “O seu irmão tá ali.” “Eu quero aquele.” “Mas aquele é loirinho.” “Não, eu quero aquele.” Mas não era ele, era um outro moreno, com cabelo preto como eu. Era quase um brinquedo. LAZER Tem outras passagens que eu lembro de infância. O meu pai trabalhava na Asea, que era uma empresa sueca. Então, o meu pai tinha alguns amigos que viajavam muito para o exterior. E, naquela época, eu tinha uns quatro anos, mais que isso, cinco, e o meu pai decidiu começar uma coleção de moedas para mim. Logo os amigos trouxeram várias moedas para dar inicio à minha coleção, isso no primeiro dia. No segundo dia, eu estava distribuindo as moedas pela rua. O meu pai quase me matou, porque saí distribuindo as moedas para todo mundo. A coleção que seria para mim eu saí distribuindo. São essas as pequenas passagens de infância, a lembrança de brinquedos ou de situações. Esse tipo de coisa. E foi bom. RELIGIÃO Eu fiz a primeira comunhão com sete ou oito anos de idade. Mas nós nunca fomos de freqüentar a igreja regularmente, de ir à missa todo domingo. Fiz primeira comunhão, fiz crisma com 12 para 13 anos, casei na Igreja Católica. Até hoje eu vou à Igreja, eventualmente. Eu não sou de ir à missa todo domingo. FAMÍLIA / PAIS O meu pai trabalhava o dia todo, então quem exercia autoridade dentro da minha casa era a minha mãe. O meu pai só entrava naquelas bolas divididas. Eu aprontava muito quando era pequeno. Tinha pontos que quando o meu pai entrava na discussão, já entrava para valer. Mas toda a autoridade e educação em casa, tudo era a minha mãe mesmo que fazia. Meu pai só entrava para acertar as coisas quando eu aprontava demais. ENSINO FUNDAMENTAL Quando era pequeno, com quase cinco anos de idade, queria porque queria ir para escola. Então, minha mãe me matriculou no jardim da infância. O primeiro dia foi uma alegria, comprando lancheira, lanche, indo de perua para escola. Foi uma verdadeira maravilha. No segundo dia, já não queria ir mais, foi uma briga e fui arrastado. Fiquei uns quatro ou cinco meses no Externato São Judas Tadeu, em Guarulhos. Era um jardim da jnfância. Depois eu fui para uma escola no primeiro ano primário, uma escola particular também em Guarulhos, o Externato São Roque. Estudei dois anos lá, depois completei o ensino primário num colégio de padres chamado Colégio Corintiano, em Guarulhos. Eu lembro que, quando terminei o primário, não tinha idade suficiente para fazer o ginásio. Então, fiz um ano de cursinho de admissão para ir para o ginásio. O ginásio eu fiz em uma escola chamada Escola Estadual de Primeiro Grau Vila Progresso, em Guarulhos. Passei os quatro anos lá. Essa fase da minha vida me traz boas recordações, porque eu lembro de tudo. Aos 10 ou 11 anos de idade, todo mundo se achava o máximo por estar no ginásio. Nós tínhamos uma diretora na escola que era linha dura, terrível. No primeiro dia, foi aquela bagunça, no segundo dia todo mundo fazendo fila para entrar na sala de aula. Aquilo foi um choque muito grande. “Pôxa, eu estou no ginásio, porque eu tenho que fazer fila para entrar na sala de aula? Isso é coisa de primário.” Mas foi um período de muita disciplina. Eu acho que isso contribuiu bastante para a minha formação e para formação dos meus amigos que estudaram lá. Então, da quinta à oitava série, aos 14 anos de idade, entrava na sala de aula em fila. Era terrível. ENSINO MÉDIO - CURSO TÉCNICO EM MECÂNICA Depois do ginásio, eu fui fazer o curso de mecânica na Escola Técnica Roberto Simonsen, do Senai. A idéia desse curso técnico foi por influência do meu pai. O meu pai sempre teve uma preocupação muito grande de não poder educar os filhos e sustentar a família. Ele falava: “Ó, é o seguinte: se você pretende ser engenheiro um dia, faça um curso técnico porque, eventualmente, se eu faltar e não puder te ajudar, você tem um curso técnico e vai poder trabalhar e se sustentar.” Então, fiz o curso técnico no Senai. Foram três anos. Era o dia inteiro em aula, foi muito bom. Tinha as disciplinas de segundo grau, disciplinas técnicas e a parte de oficina, esse tipo de coisa ligado à mecânica. A Escola Roberto Simonsen é uma escola muito tradicional do Senai em São Paulo. Fica no Brás, então eu ia todo dia de ônibus de Guarulhos ao Brás e voltava sem problema nenhum. ENSINO SUPERIOR - FACULDADE DE ENGENHARIA Quando eu terminei a escola técnica, eu já tinha a intenção de fazer uma faculdade, de fazer curso de Engenharia. Durante o terceiro ano do colégio, eu estudava o dia todo e fazia cursinho à noite, nos últimos seis meses, justamente para o vestibular. Acabei entrando na faculdade logo em seguida do colégio. E, durante a faculdade, então, eu fiz o estágio obrigatório para ter o diploma do curso técnico. Eu acho que a influência do meu pai foi justamente na escolha de fazer o curso técnico, não exatamente no que eu iria fazer depois. Eu acho que desde os 12 ou 13 anos falava que queria ser engenheiro. O meu sonho era carro, eu adorava carro, desde pequeno. Se queria me ver feliz, era só me botar dentro de um carro. O meu sonho de moleque era trabalhar numa indústria automobilística, construir carro. Então, a Engenharia veio daí mesmo. A história do curso técnico veio justamente como uma orientação para dizer o seguinte: “Já que você quer ser engenheiro um dia, quer ser engenheiro mecânico, faça um curso técnico para estar mais bem preparado.” AMIZADES É um grupo pequeno de amigos que tenho contato até hoje. São amizades que perduraram dessa época de adolescência até agora. Infelizmente, não nos encontramos com muita freqüência porque eu estou em Macaé e estão todos em São Paulo. Mas são amizades sinceras e são amigos pra valer. E mesmo quando ficam alguns anos sem se encontrar, quando se encontram fazem aquela festa. Nós nos encontramos eventualmente em São Paulo porque, apesar de eu morar em Macaé, eu passo Natal ou Ano Novo em São Paulo. É essa oportunidade que eu tenho para encontrar os amigos. Tenho boas recordações dessa época dos 16, 17, 18 anos. LAZER Freqüentava muito a ACM [Associação Cristã de Moços] em Guarulhos. Era um clube que tinha em Guarulhos e lá nós nos encontrávamos com muita freqüência. Fazíamos alguns acampamentos, jogávamos todo domingo. A ACM tinha uma Sede em Atibaia, que é próxima a São Paulo, uma região em que dava para fazer acampamentos. Então, nós íamos para esses acampamentos. Só que nós éramos maiores que os outros, tínhamos 17 ou 18 anos. Nós íamos mais para acompanhar a gurizada de 10, 11 anos. Dividíamos as tarefas de cozinha, fazíamos comida para esse pessoal todo. Sempre ia um ou dois professores da ACM e nós ajudávamos nessas tarefas. A gurizada montava as barracas e passava lá três, quatro dias no meio do mato. Meio do mato entre aspas, porque não era nenhuma coisa deserta. Tinha casa, tinha tudo próximo para dar o suporte necessário. Nessa época, jogava basquete, jogava vôlei. Nunca fui de jogar futebol. AMIZADES Eu e meu irmão tínhamos grupos diferentes de amigos. Então, eu tinha os meus amigos, ele tinha os amigos dele, cada um freqüentava a sua roda. Meu irmão também cresceu em Guarulhos, os amigos dele são de lá. Ele não fez o curso técnico, estudou num colégio particular e também é engenheiro. JUVENTUDE Eu lembro muito da ACM, a gente se encontrava muito lá. Tinha as festas, os bailinhos. Eu tenho um grupo de amigos que organizava umas festas em Guarulhos, bailes, nas casas dos nossos colegas, dos nossos amigos. Uma vez por ano fazia um grande baile ali. Então, juntava todo mundo. Guarulhos, naquela época, era bom de morar. Era uma cidade grande, porém menor do que é hoje, e as pessoas quase que todas se conheciam de uma forma ou de outra. Todo mundo estudava em alguns colégios próximos ao centro da cidade e todo mundo se conhecia pelo menos de vista. Hoje eu acho que já não é assim. OPÇÃO PROFISSIONAL: ENGENHARIA Eu acho que não havia expectativa para eu ser engenheiro. Existe muito aquela história de ter um filho médico, mas isso nunca ocorre em casa. Meu pai sempre nos deixou muito à vontade com a profissão. Então, desde pequeno eu queria ser engenheiro mecânico, isso aos 11, 12 anos. E aí segui. O meu sonho como engenheiro era poder trabalhar com automóveis, construir carros, trabalhar na indústria automobilística. Por isso que eu acho que fiz Engenharia Mecânica e segui assim. Cheguei a trabalhar na Volkswagen como professor contratado, justamente para complementar o curso técnico naquele estágio obrigatório, junto com a faculdade já. ENSINO SUPERIOR - INSTITUTO DE ENGENHARIA PAULISTA Terminei o curso técnico e fui direto fazer faculdade. Era uma faculdade paga, Instituto de Ensino de Engenharia Paulista, que hoje faz parte da Universidade Paulista, que é aquela universidade do Colégio Objetivo em São Paulo. Durante a faculdade, eu dava aulas na Volkswagen para ajudar um pouco nas minhas despesas e também para fazer o estágio obrigatório do curso técnico. Então, a minha expectativa, quando formado, era poder trabalhar na indústria automobilística. Eu entrei na faculdade em 1979 e terminei em 1983. No ano que terminei a faculdade, eu lembro que existia um grande problema com relação a empregos. A atividade industrial no país estava decrescente, havia um grande número de pessoas se formando sem achar emprego. No último ano de faculdade, mandava currículo para inúmeras empresas, para a Petrobras inclusive. E estava procurando realmente um emprego. Tinha tido oportunidade de fazer estágio na Volkswagen, mas não fiz, preferi fazer estágio na Eletropaulo, em São Paulo. Depois é que veio a Petrobras. Então, não tinha um sonho, não era algo que anteriormente estivesse procurando fazer: “Ah, vou trabalhar na Petrobras.” Não era uma expectativa de trabalhar na Petrobras como era trabalhar em qualquer outra grande empresa, sei lá, como o Grupo Votorantin, uma Volkswagen, uma Ford. Na época, foi uma coisa diferente porque a Faculdade de Engenharia Paulista estava na sua terceira turma, estava começando. Então, muitos professores que davam aula na USP também davam aula lá. Eu esperava algo mais, esperava estudar como se fosse numa USP, aquela história de campus, de gramados, e lá era um prédio na Vila Mariana, com estilo de cursinho mesmo. Tinha aula de manhã, aula de tarde, aula o dia todo. Isso talvez tenha me frustrado um pouquinho, porque eu imaginava ser uma universidade onde você pode ficar o dia todo com restaurantes, gramados, esse tipo de coisa. Mas, em relação ao curso, eu acho que atendeu perfeitamente àquilo que esperava de um curso de Engenharia Mecânica. Foi muito bom. Alguns amigos entraram para a Petrobras também. Teve um amigo de turma que entrou na Petrobras junto comigo e trabalha até hoje na Empresa. Mas cada um foi para um canto. Nós tivemos, no ano passado, nosso encontro de 20 anos de formatura, que não pude participar. Aí, infelizmente, você acaba perdendo os contatos todos. JUVENTUDE / NAMOROS Eu não fui muito namorador. Tinha algumas namoradas, mas nada assim de ser aquele galã do pedaço, namorador. As poucas namoradas que tive foram por períodos grandes, meses pelo menos. Hoje em dia se fica, naquela época se namorava, eram períodos maiores. Eu nunca fui daquele namoro de uma semana com uma, outra semana com outra. Eu sempre fui mais, se não tímido, pelo menos sossegado. Tenho uns amigos que eram terríveis. PRIMEIRO EMPREGO Eu comecei como professor autônomo, dava aulas individuais, dava aulas de inglês. Mas o primeiro trabalho mesmo na Petrobras. Comecei na Petrobras em 1984 e estou aqui até hoje, são 20 anos de Empresa. INGRESSO NA PETROBRAS O ano que eu entrei na Petrobras não teve concurso. Foi o único ano que não teve o concurso. A Petrobras, naquele ano, tinha alguns problemas com relação à admissão de funcionários, não podia fazer concurso e precisava de Engenheiros de Petróleo. Então, a Petrobras fez uma seleção baseada em currículos de algumas faculdades no Brasil e eu fui selecionado na minha faculdade, junto com alguns profissionais da Unicamp e da Federal de São Carlos. Da USP acabou não indo ninguém, porque estava em greve e não pôde indicar ninguém. Foram também alguns do ITA e do IME. A Petrobras chamou dois de cada faculdade, aqueles que haviam selecionado. Aí eu fui indicado pela minha faculdade e fui para Petrobras, lá em São Paulo. “Olha, você foi selecionado para trabalhar aqui conosco. Você vai fazer um curso de Engenharia do Petróleo em Salvador.” E aí começou todo o processo de seleção, exames médicos, psicotécnicos, psicológicos, esse tipo de coisa. Mas a minha turma foi a única, até hoje, que não fez concurso na Petrobras. Na verdade, depois dessa seleção inicial, nós entramos já como empregados. Nós não éramos bolsistas. E fomos para Salvador fazer o curso. Quando eu estive na Petrobras, para minha seleção, tinha meu currículo lá na gaveta. “Tá aqui seu currículo. Ótimo.” Nós fomos contratados e fomos todos para Salvador; era uma turma pequena, acho que só 45 engenheiros. Quando nós chegamos a Salvador, colocaram todo mundo na sala de aula e disseram o seguinte: “Olha, temos 10 vagas para Engenheiros de Perfuração e 35 ou 40 vagas para Engenheiro de Produção. Vocês querem fazer o quê? O que faz cada um? É isso e isso. Isso aqui faz isso, isso aqui faz aquilo.” O pessoal se dividiu. Então, Engenheiros de Perfuração era um grupo só de 10 pessoas e todo o resto foi para a Área de Produção. Na minha turma de Produção tinham várias mulheres. Eu escolhi Produção. Na época, o curso de Perfuração durava dois anos. Você ficava três meses em Salvador, fazia um estágio de nove meses e voltava para mais um ano de curso. Já o curso de Produção tinha um formato diferente, era um ano de curso e você saía para o estágio e já era designado para trabalhar em alguma região depois. Eu tive uma vontade muito grande de trabalhar na Área de Perfuração. Era fácil entender o que era perfuração e difícil entender o que era produção. Na época, a produção juntava várias atividades. Tudo o que não era perfuração era produção e acabei caindo na produção pensando assim: “É um ano só em Salvador, então fico um ano, saio e vou para onde tiver que ir.” Eu não quis ficar nesse esquema de fazer três meses de curso, fazer estágio, voltar para Salvador. CURSO DE ENGENHARIA DE PETROLÉO – PRODUÇÃO A Petrobras tinha um Centro de Treinamento em Salvador já há muitos anos, então todos os cursos de Engenharia do Petróleo são feitos em Salvador até hoje. Os cursos de Engenharia de Processamento, para quem vai trabalhar nas refinarias, são feitos no Rio de Janeiro. Então, a Petrobras tinha dois setores de ensino, na época. Tinha o Setor de Ensino da Bahia, que chamava SENBA, e tinha o SENRIO, que era o Setor de Ensino do Rio. E essa estrutura permanece até hoje. Os focos são diferentes, então Gerente de Petróleo, Químico de Petróleo, Geólogos, é tudo em Salvador. Primeiro, Salvador foi uma surpresa muito grande, uma alegria muito grande, não só minha como do meu pai, da minha mãe, pelo fato de eu ter entrado na Petrobras. Eu estava sendo contratado para fazer um curso de Engenharia de Produção ou de Perfuração. Eu não entendia muito bem o que era Engenharia de Produção. Eu pensava que pudesse trabalhar em alguma refinaria. Eu falei: “Escuta, eu vou trabalhar em uma refinaria?” “Não, você não vai trabalhar em refinaria, você vai trabalhar com poços de petróleo.” O que será isso? Era um mundo distante. Eu conhecia usinas nucleares, tinha feito palestras lá no Nuclep, imaginava o que era. Mas eu nunca tinha tido idéia do que era um poço de petróleo, o que era trabalhar na Petrobras sem ser na área de refinaria. A refinaria para mim era uma coisa mais visível e palpável. Poço de petróleo e produção de petróleo era uma coisa que eu não sabia o que era. Só tinha certeza que a Petrobras era uma grande empresa, como é até hoje. Era um emprego seguro, não pagava muito bem, mas era uma empresa grande, uma estatal, aquela coisa maravilhosa de falar: “Puxa vida, que emprego é esse?” Trabalhar numa empresa como a Petrobras era algo espetacular. Então, os meus pais ficaram muito felizes, como eu. CIDADE DE SALVADOR A ida para Salvador foi até um pouco traumática, porque eu não queria sair de casa, da cidade. No primeiro dia, Salvador foi um terror. “Que coisa, o que eu tô fazendo aqui?” Passei um ou dois dias não muito bem em Salvador. Felizmente, eu morava com alguns amigos em uma república e a coisa foi mais fácil. Acabei passando o ano muito bem. Morava com outras pessoas que estavam fazendo o curso. Um deles, o Francisco Henrique, trabalha na Petrobras até hoje e fez faculdade comigo. Eu sou padrinho de casamento dele, ele é meu padrinho de casamento, eu sou padrinho do filho dele. Nós fizemos a faculdade juntos e fomos para a Petrobras juntos. Aí fomos os quatro morar numa república. Um deles também trabalha na Petrobras até hoje, é Engenheiro de Perfuração, o outro já saiu da Petrobras há alguns anos. Então, morávamos os quatro num apartamento de dois dormitórios, na Pituba. Nós não tínhamos carro, íamos para o curso da Petrobras a pé. Era perto, uns dois quilômetros, e tínhamos uma empregada em casa que preparava o jantar. Nós almoçávamos na Petrobras. Tínhamos alguns rituais. Todos os sábados, eu tinha que ir ao supermercado fazer compras, esse tipo de coisa. Antes tinha minha mãe, meu pai, tudo organizado. Tive que me virar sozinho. Não foi tão ruim, porque nós tínhamos as rotinas: levar e buscar roupa na lavanderia, supermercado, a empregada que preparava o jantar. No domingo, sempre saíamos para almoçar fora e nós formamos um grupo de amigos muito bom em Salvador, porque era uma turma pequena, de 45 pessoas no total. Então, o grupo se uniu muito, todo mundo freqüentava a casa de todo mundo. Fazíamos, eventualmente, uma festa aqui, uma festa ali, e saía todo mundo junto, passeios para Itaparica, foi bom. Depois desse começo traumático, de estar fora de casa, de ir para um lugar novo, a coisa foi bem. CURSO DE ENGENHARIA DE PETROLÉO – PRODUÇÃO O curso exigia muito, tinha que estudar demais. Eu procurava me dedicar, como todo mundo. Eu lembro que, durante o curso alguns colegas saíram da Petrobras por opção própria. Aquilo não era o que eles imaginavam, saíram para trabalhar em siderúrgicas ou outros lugares. Algumas pessoas perderam o curso por não ter tido um bom aproveitamento. Isso acontece, você tem avaliações freqüentes, tem uma nota mínima para atingir. Não atingindo a sua nota mínima, você é jubilado do curso, perde o emprego. Apesar de ter na turma os melhores alunos de cada faculdade, o ritmo do curso e o fato de a maioria estar fora de casa, tudo isso afeta um pouco as pessoas. Então, algumas pessoas não foram tão bem, outras foram melhor. Eu lembro de alguns terem perdido o emprego no começo. É um curso de treinamento e funciona também como um período em que você é avaliado e se não desempenhar bem não continua na Empresa. Por que a questão do curso? Não existia, na época, um curso de Engenharia de Petróleo. Então, a Petrobras sempre contratou engenheiros, eu não lembro qual era a modalidade de Engenharia que podia entrar lá, mas eram engenheiros eletrônicos, elétricos, mecânicos, civis. E esses engenheiros recebiam o treinamento em Engenharia de Petróleo. Por isso o curso de um ano ou dois anos lá em Salvador. Hoje no Brasil nós já temos algumas instituições que fazem a graduação em Engenharia de Petróleo. É recente, coisa de uns três ou quatro anos que já temos essa graduação no país. Mas a Petrobras até hoje continua treinando os seus próprios engenheiros na área de Engenharia de Petróleo. Quem entra, faz o curso, porque a Petrobras até hoje não faz concurso só para engenheiros de petróleo. Quando ela faz um concurso para engenheiro de petróleo, abre também para o engenheiro civil, para eletro-eletricista, eletrônico. E vem um grupo de engenheiros que foram aprovados e tem que treinar. Um talvez já tem algum treinamento anterior, como é o caso do engenheiro de petróleo, mas outros têm que ser todos treinados. A última turma de Salvador, eles fizeram quatro meses de curso, quatro meses de estágio inicial, voltaram para mais quatro meses de curso. Então, dependendo do ano, muda um pouco a metodologia, o tipo do treinamento. Às vezes, um ano direto, às vezes seis meses, quatro meses, depende muito da necessidade da Empresa. ATIVIDADES DA ÁREA DE PRODUÇÂO – AVALIAÇÃO DE FORMAÇÕES Na área de Produção, entrava a parte de reservatórios, a parte de completação de poços, a parte de elevação artificial de poços, a parte de avaliação de formações, parte de óleo e gás. Na avaliação de formações, primeiro se joga uma peia nas acumulações que podem ter petróleo. Para realmente achar petróleo, você precisa furar um poço. É por isso que, às vezes, furamos um poço e dizemos que temos um poço seco, porque não achamos nada. Mas, eventualmente, quando você fura e acha alguma presença de hidrocarboneto, você precisa testar esse poço para saber o quanto ele vai produzir e saber se aquela descoberta é comercial ou sub-comercial. É aí que entra os Engenheiros de Avaliação das Formações. É uma disciplina da Petrobras que faz justamente isso, testa os poços e faz todas as interpretações para saber o tamanho daquela reserva, daquela descoberta, saber se aquilo é comercial ou não. Um reservatório pode ter petróleo, mas pode ser pequeno, não produzir muito. Ele pode ter depressão, ou seja, a pressão cai muito rápido e não tem como produzir. Então, essa disciplina de Avaliação das Formações ensina isso. Na época que eu terminei o curso, existia uma Divisão de Avaliação de Formações, da mesma forma que existia uma Divisão de Óleo, uma Divisão de Gás, uma Divisão de Reservatórios, uma Divisão de Completação e Restauração. Ao longo dos anos, com algumas reestruturações, essa Divisão de Avaliação de Formações deixou de existir. Ela foi dividida em duas áreas. Parte dela foi para Divisão de Reservatórios e parte para Divisão de Contratação. Mas é uma das disciplinas do curso. Então, tudo ligado a petróleo que não era perfuração caía no outro lado da produção. DISTRIBUIÇÃO DE VAGAS POR SETOR Na verdade, naquela época, você terminava o curso de Engenharia de Produção e era alocado nas várias divisões das várias regiões do país. Chegando a determinada região: “Temos vagas para Engenheiros de Reservatório, duas vagas, temos três vagas para a Área de Avaliação e quatro vagas para a Área de Completação. Vamos dividir. Você e você aqui, você para cá, você para lá, e pronto.” Algumas vezes você tinha a chance de escolher, dependendo da região que você fosse alocado para trabalhar. Se você fosse para uma região que só tinha vagas para Engenheiro de Reservatório, todo mundo ia virar Engenheiro de Reservatório. Mas uma coisa muito boa que eu digo até hoje é que a Petrobras é uma empresa muito grande, então tudo se ajeita. Eventualmente, se você hoje é um engenheiro, foi designado para trabalhar no Reservatório e aquilo não é o que você queria, você gosta de outra coisa, em pouco tempo você consegue se realocar em uma outra área em que se adapte melhor. É interesse da Empresa. Então, isso é sempre possível, mas nem sempre acontece quando a pessoa quer. Mas as coisas se ajeitam, justamente por essa vantagem de ser uma empresa muito grande. Quando terminei o curso em Salvador, a minha turma tinha 33 alunos e eu fui o vigésimo colocado. Uns dois ou três ao longo do curso foram eliminados e uns três ou quatro pediram demissão. Existia o pessoal de quartil, do primeiro quartil, segundo quartil, terceiro quartil e quarto quartil. E ali a ordem de classificação era extremamente importante. A colocação no curso possibilitava você escolher o local que gostaria de trabalhar. “Primeiro colocado. Márcio vem cá, você quer trabalhar aonde? Tem vagas no Cenpes, no Rio, em Macaé, em Aracajú e na Bahia.” “Ah, eu quero ir para Bahia.” “Eloísio, você é o último, sobrou essa vaga aqui lá em Manaus. É sua.” Então, era assim. Começava a suar e ficava desesperado, para onde ele iria? E na minha turma foi diferente. Foi muito divertido, porque eles não levaram em conta só a colocação. Primeiro, porque um dia antes da divisão da turma foram lá: “Temos vagas nos seguintes locais, Macaé, São Mateus, Bahia, Aracajú e Natal. Rio de Janeiro, Cenpes não vai ninguém. Então, só esses locais.” E, obviamente, a grande maioria queria vir para Macaé. Nós tínhamos mulheres na turma, tínhamos pessoas já casadas, alguns poucos colegas que eram do Piauí e outros acho que do Ceará. E, na hora de dividir, um dia antes de dividir a turma, vieram com as vagas: “Tem tantas vagas aqui, tantas aqui, tantas aqui.” Eu lembro que Macaé precisava de 15 ou 16 pessoas, Bahia quatro, Aracajú três, Natal seis, São Mateus três ou quatro. E entre nós, naquela noite, todos nós já sabíamos o que cada um queria. Então, um amigo nosso namorava uma colega do curso, ele do Rio e ela de Maceió, se conheceram e namoravam lá no curso. Eles queriam ficar na Bahia e na Bahia só tinha quatro vagas. “Bom, então eram duas vagas a menos na Bahia.” “Aquela outra aqui de Santa Catarina quer ficar na Bahia, então são três.” Então, um dia antes da divisão da turma, todos nós sabíamos mais ou menos o que ia acontecer. Na Bahia tinha quatro vagas e quatro candidatos, Aracajú três vagas e três candidatos, Macaé tinha acho que 15 ou 16 vagas e 20 e poucos candidatos, Natal seis vagas e dois candidatos, São Mateus três vagas e nenhum candidato. E agora? Aí foi a briga e teve o ritual da escolha dos locais. Foi muito divertido porque, no dia seguinte, nós tivemos palestras com os vários superintendentes das regiões. Então, primeiro botaram todas as pessoas num palco, numa sala de aula, e foram apresentando: “Este é o Doutor João Nilton, representante e Superintendente de Produção da RPSE, Região de Produção do Sudeste, esse é o Doutor não sei o que. Esse é o Engenheiro Rafael Frazão do COPAN.“ Começaram as palestras. Falou o cara de Macaé, falou o cara de São Mateus, o Costamilan. Tivemos um intervalo e na hora do cafezinho: “Escuta, professor, o que é COPAN?” “É a Coordenadoria de Produção da Área Norte.””Onde fica isso? Fica na Bahia?“ “Não, fica em Belém.” “Belém? O que esse cara tá fazendo aqui?” “Tem duas vagas para Belém.” Olha, foi uma confusão. Ninguém sabia de vaga para Belém. ”Que história é essa? Que vaga para Belém é essa? Ontem vocês falaram que não tinha.” “Não, mas apareceu hoje. Dois irão para Belém.“ E aí foi aquela briga. Ninguém queria voltar para aula ou para a Divisão. A turma se sentiu traída. Ninguém queria ir para Belém. “Ontem não havia essa vaga, hoje aparece e ninguém avisa? No meio do café que vocês falam que tem vaga para Belém?” Aí veio o Rafael apresentar Manaus e Belém – foto de barcos, gente andando nos igarapés, hotel em barcos – e contou como era a atividade no Amazonas. O único atrativo na época era o seguinte: “Temos cinco Engenheiros de Produção, contando com o chefe. Então, aqueles que forem para lá provavelmente vão subir logo na Empresa porque só tem cinco pessoas.” E aí mostrou as fotos, mostrou os filmes. Foi muito honesto mostrando exatamente como era o trabalho. Depois, veio a segunda parte, mais divertida, onde cada um iria fazer suas opções para trabalhar em algum lugar. Qual foi a opção número um da maioria? Macaé. Qual foi a última opção de todo mundo? Belém. E nós tivemos uma entrevista com esse Superintendente, baseada nas opções e nas notas. Eles entrevistaram todo mundo rapidamente e, no dia seguinte, nos chamaram para dizer para onde nós íamos. Então, eles chamaram de quatro em quatro, na ordem alfabética. Primeiro da turma: “Antonio, quem é?” “Sou eu.” “Belém.” “Mas eu não vou; vou pedir demissão.” Foi lá pedir demissão, disse que não ia para Belém de jeito nenhum. E assim foi, mas acabou não pedindo demissão. Na última turma, éramos cinco para dividir. Sobrava uma vaga para Belém, duas para Macaé, uma não sei para onde e eu fui agraciado para ir para Belém. Disse também que não iria. Fiquei brigando uma hora, não queria ir para Belém, não queria, não queria ir. “Não tem jeito. É você mesmo e acabou,” “Tá bom.” “Peço demissão, não peço demissão, faço o que?” Faltava um mês para terminar o curso. Terminado o curso, vim até Macaé procurar o Superintendente e dizer o seguinte: “Olha, estou indo para Belém. Quero saber se dá para trocar com alguém.” “Não tem ninguém que eu saiba que queira ir para Belém.” “Puxa vida, não tem jeito.” Tirei um mês de férias. Quando termina o curso, todo mundo tira férias de um mês. Durante as minhas férias, me ligaram: “Olha, você não está mais em Belém, você foi transferido para Natal.” “Poxa, já está mais perto” Voltei para Macaé. “Agora tô em Natal. Tem alguém para trocar?” “Talvez na Área de Completação alguém esteja interessado em ir para Natal.” Fui conhecer o chefe da Divisão da Completação, fui conhecer o chefe da Divisão de Avaliações e Formações, da Divisão de Óleo. Conheci vários gerentes em Macaé e fui trabalhar em Natal. Não tinha nada em São Paulo. E Macaé, para mim, representava a proximidade com São Paulo. Eu ainda não tinha idéia da magnitude da Bacia de Campos. ACIDENTE NA PLATAFORMA DE ENCHOVA Eu lembro que, no final do meu curso, em 1984, nós tivemos o primeiro acidente de Enchova, um blowout em que morreram várias pessoas na queda da Baleeira, o primeiro acidente de chuva. O blowout é um fluxo descontrolado de óleo ou gás através de um poço. Então, durante a perfuração de um poço na plataforma fixa de Enchova, nós tivemos um blowout. Isso causou um princípio de incêndio e decidiram evacuar a plataforma. O fogo se extinguiu rapidamente, mas, durante a evacuação da plataforma de noite, na baleeira que desce com as pessoas, houve uma operação indevida e soltaram de um lado só. Existe um gato que prende a baleeira. Soltaram de um lado e não soltaram do outro, entraram na baleeira. Na hora que liberaram os freios, ela pendulou. Ela pendulou, arrebentou o cabo e a baleeira caiu. Morreram acho que 12 ou 17 pessoas nesse acidente e eu estava em Salvador. BACIA DE CAMPOS Eu não sabia exatamente o que era a Bacia de Campos, não sabia a magnitude de Bacia de Campos, não tinha idéia de quanto havia de descoberta lá. Basicamente, a primeira opção para Macaé foi devido à proximidade geográfica: “Vou voltar para o sul, vou estar perto de São Paulo.” A idéia de estar perto de São Paulo era, se por acaso a Petrobras não fosse aquilo que eu imaginava, ter a oportunidade de procurar uma outra opção no mercado. Em Belém, não ia ter essa chance; ou ficava na Petrobras ou não tinha jeito. Eu acabei nem indo para Belém. Nunca fui a Belém, nunca fui a Manaus. Depois de estar 20 anos na Empresa, não sei nem como é. Eu fui para Natal, onde trabalhei um ano. Quando cheguei tinha duas opções: Engenheiro de Completação ou Engenheiro de Avaliação. Não tinha reservatório, não tinha óleo, não tinha gás. Eu optei pela Área de Completação, porque sabia que teria gente em Macaé dessa área interessada em ir para Natal. Então peguei aquela que me agradava de alguma forma e me dava a chance de vir para Macaé. Aí acabei indo trabalhar na Área de Completação em Natal durante nove meses e, no final desses nove meses, eu fiz uma permuta com um colega pernambucano, que trabalhava em Macaé e que queria de todo jeito trabalhar em Natal. A Petrobras aceitou a permuta sem problema nenhum. TRABALHO EMBARCADO Em Natal, eu trabalhava embarcado. Sempre trabalhei no mar. Nunca fui a nenhum campo de produção em terra. Quer dizer, estive em Mossoró uma vez, mas a minha atividade não era na terra, era no mar. A grande necessidade da Empresa, na época, era no mar, porque a Petrobras estava desenvolvendo um campo chamado Ubarana. Então, fiz três períodos de embarque acompanhado por algum outro engenheiro. Já no quarto embarque, eu comecei a trabalhar sozinho, obviamente com os outros capatazes, como eram chamados. Hoje são chamados de Técnicos de Produção ou Técnicos de Operação. Eu trabalhava com um capataz nas plataformas do Campo de Ubarana. CAMPO DE UBARANA / COTIDIANO DE TRABALHO As plataformas do Campo de Ubarana eram em água rasa, de lâmina d’água de 16 a 20 metros. Eram plataformas fixas. Em Natal, tinha umas plataformas de concreto, que existem até hoje, eram a PUB-2 e PUB-3 e a PAG-2, plataforma de Agulha. A plataforma de concreto é apoiada no fundo do mar. São só 16 metros de lâmina d’água. Fora essas plataformas grandes de concreto, existiam as plataformas de aço menores, espalhadas em seis poços. Aí seguia PUB-4, PUB-5, PUB-6. Eu lembro de ter trabalhado na plataforma grande, a Ubarana PUB-2, e nas plataformas menores. Nessas plataformas menores, nós tínhamos dois tipos de trabalho. Um quando você fazia a completação do poço. Completar um poço significa equipar o poço para produção após a perfuração. Existiam plataformas de perfuração que encostavam do lado das plataformas fixas de produção e se perfurava o poço. Nós chamávamos isso de Plataforma Tender. Era uma jaqueta, uma jack-up, uma plataforma que apóia no fundo do mar. Encostava bem do lado da plataforma fixa, apoiava no fundo do mar, suspendia e a sonda, a torre de perfuração se movia e de lá perfurava o poço. Então, após a perfuração do poço, nós fazíamos a completação do poço; isso era um dos trabalhos. O trabalho era parecido com o que era usado em terra. Trabalhar numa plataforma fixa não tem nada de muito diferente do trabalho de terra, só o fato de você estar no mar, o fato de você passar 15 dias lá, sem telefone, porque na época não tinha telefone para ligar para casa como tem hoje. Na primeira experiência embarcado, eu peguei um ônibus em Natal. Duas horas de ônibus até uma cidade chamada Guamaré. Era uma vila. Hoje parece que Guamaré é muito grande, tem uma unidade da Petrobras, mas era uma vilinha. Tinha um porto muito pequenininho e de lá saíam os helicópteros para a plataforma. Esse foi o meu primeiro contato com o interior do Estado do Rio Grande do Norte. Era época de chuvas e rios cheios, foi muito interessante. Eu não precisei descer para empurrar o ônibus. Teve gente que embarcou uma semana antes que teve que descer para ajudar a empurrar o ônibus que atolou, mas eu não cheguei a passar por isso. Na plataforma PUB-2, que era a maior, tinha sala de jogos, tinha totó, tinha um refeitório em divisão. É curioso, porque as Plataformas Tender eram maiores. Então, você tinha algumas regalias a mais, tinha até sorvete. Mas não tinha telefone nas plataformas menores, que são chamadas de Sondas de Produção Marítimas, para você fazer intervenção em poços montadas eram sondas nessas plataformas fixas. Essas sondas eram montadas em balanço: colocava a torre de um lado, o tanque do outro, coisa de um lado, coisa do outro. Aquilo ficava em cima e em balanço na plataforma. Nessas plataformas menores, o refeitório era um container pendurado embaixo do heliponto. O curioso é que, por exemplo, não tinha refrigerante nessas plataformas, só em dia de domingo. Por quê? Porque era em garrafa de vidro e o espaço era pequeno, não tinha como guardar. Não existia máquina de coca-cola. Então, você passava a semana tomando suco ou água. E só no domingo se tinha direito a uma garrafa de refrigerante. Não tinha telefone, até o contato com a Petrobras era feito via rádio. Era um mundo extremamente isolado. A plataforma não balança, mas esse refeitório ficava justamente pendurado embaixo do heliponto, literalmente pendurado. Às vezes, aquilo balançava um pouquinho com o vento, mas não era esse balanço que nós imaginamos de uma plataforma flutuante. Foi um período de grande aprendizado em Natal, porque eu trabalhava com pessoas muito experientes na área de poço. Eu embarcava 15 dias, folgava 15. Passei um período em terra também, fazendo estágio de um mês. Trabalhava com pessoas com muita experiência de campo, os capatazes da Petrobras ou os encarregados de sondas contratadas. Existiam empresas que prestavam esse serviço a Petrobras em Natal. Eram pessoas com muitos anos de experiência de campo e eu pude aprender bastante com eles. Eu acho que serviu de base para entender o que é um poço de petróleo. Foram nove meses muito proveitosos. Natal é uma cidade muito bonita. Nós tínhamos lá uma república também, mas o sonho era voltar para o sul. Natal era só para passear. COTIDIANO DE TRABALHO / ALOJAMENTO NA PLATAFORMA PUB-2 Em Natal, as plataformas eram pequenas. Da mesma forma que existia esse refeitório pendurado debaixo desse heliponto, existia um container que era o escritório e dormitório. Então, de um lado desse container ficava o encarregado da sonda contratada, tinha um banheiro no meio e do outro lado um triliche para o pessoal da Petrobras. Em uma outra plataforma, eu lembro que eram dois triliches num container. E duas pessoas não podiam cruzar no corredor. Se um quisesse passar, o outro teria que deitar. Não passavam dois ali. Havia um armariozinho entre as camas. Os triliches tinham cortininha e uma porta do outro lado. Então, ou entrava ou saía, mas a condição era rude. Mas para nós, na época, aquilo era bom. “Puxa vida, estou num triliche com banheiro privativo para mim.” Na verdade, o resto do pessoal fica em alojamentos com um banheiro coletivo. Nessas plataformas menores, ficavam umas 30, 32 pessoas. Na PUB-2, que era maior, nós já tínhamos um pouco mais de conforto, tinha a suíte dos engenheiros da Petrobras. Era um quarto com quatro camas e um banheiro separado e uma sala de rádio. Essa plataforma tinha uma televisão que até funcionava bem, tinha telefone mais fácil, era uma plataforma central. A coisa ali era um pouquinho melhor. Tinha um refeitório maior, tinha mais opções. PLATAFORMA DE ENCHOVA Quando vim para Macaé nessa permuta com esse colega, fiz um embarque na plataforma de Enchova, na Sonda Modulada de Enchova, a SME. Quando cheguei a SME, achei uma maravilha, um luxo, um quarto grande com quatro camas e um banheiro, dava até para andar dentro do quarto Tinha televisão, tinha telefone. Tinha até algumas suítes na sonda. A plataforma de Enchova é um monstro, enorme. E aquilo era uma maravilha. Enchova e Namorado eram as duas maiores plataformas que nós tínhamos na Bacia de Campos. Os colegas que tinham vindo para Macaé reclamavam, diziam que aquilo era um absurdo, que quando eles trabalhavam nas unidades flutuantes era muito mais confortável e Enchova era um lixo. “Vocês não sabem de nada. O lixo tá lá, isso aqui é uma maravilha”. Então, foi uma mudança muito grande. CIDADE DE MACAÉ Quando cheguei a Macaé, em 1986, a Petrobras já tinha instalado as plataformas fixas. Tinha Enchova, Namorado, Cherne, Pampo e Garoupa. Nessa época, a Petrobras estava desenvolvendo esses campos. E o modo de desenvolver esses campos era perfurar e completar os poços. Perfurava e completava um a um. Nós trabalhávamos todas as quinzenas, nessas plataformas fixas: Enchova, Pampo, Namorado, Cherne. Passei um ano e pouco trabalhando aí e, depois, passei a trabalhar nas sondas flutuantes. Aí comecei a trabalhar com completação submarina. BACIA DE CAMPOS A Bacia de Campos, naquela época, estava desenvolvendo os campos das plataformas de Namorado, Garoupa, Enchova e Pampo. Eram plataformas fixas, as grandes plataformas. Tinham vários sistemas de produção antecipados, outros campos menores que eram os que produziam para plataformas semi-submersíveis adaptadas para produção, que era Linguado e Anequim. Em 1986, a Petrobras produzia alguns poços submarinos, não lembro quantos. Mas já estava numa atividade exploratória em lâmina d’água profunda. O meu grande choque quando cheguei na Bacia de Campos, em termos profissionais, foi imaginar que eu trabalhava numa plataforma de Namorado a 160 metros de lâmina d’água, diferente de Ubarana, que eram 16 metros. Então foi um salto em termos de trabalho, uma mudança grande. Apesar das plataformas serem fixas, existiam outros requisitos. As coisas eram feitas em Macaé de uma maneira diferente daquelas que eram feitas em Natal. A Empresa era a única com procedimentos diferentes, com diferenças operacionais, modo de fazer certas coisas. Aqui se fazia de um jeito, lá se fazia de outro. Então foi um período de adaptação aos requisitos daqui. Na verdade, como a Petrobras é muito grande, você vai se deparar com alguns regionalismos. As pessoas usam o que elas aprenderam na sua região ou aquilo que simplesmente dá certo. Se uma coisa der errado aqui eu paro de usar. Se essa coisa não deu errada lá, eles continuam usando. Então teve sempre essa independência das regiões. O esquema de trabalho era o mesmo, fora às facilidades maiores aqui na Bacia de Campos. Existia aqui, um apoio já muito maior da área de rebocadores, helicópteros, coisas que em Natal tinha pouco. Aqui os recursos eram muitos maiores. Em Natal eu lembro que nós embarcávamos na Base Aérea de Eduardo Gomes. Chegava todo mundo: “Você vai para onde? Seu nome esta aqui? Ó chama o piloto lá que esse vôo esta lotado. Lotou vai embora.” Então entravam no helicóptero quatro passageiros normalmente e nós íamos embora. Bacia de Campos já tinha uma estrutura melhor de aeroporto, você fazia check-in uma hora antes. Os recursos eram maiores, os helicópteros maiores, para 23 passageiros. As coisas eram diferentes. PETRÓLEO NA BACIA DE CAMPOS / PRODUÇÃO EM ÁGUAS PROFUNDAS Estava crescendo muito, de um investimento maior. O que aconteceu? Isso eu fui saber depois. Em determinada fase da minha vida profissional, eu fui buscar um pouco da história da Petrobras e um pouco da história da Bacia de Campos. Mas o que aconteceu? No final de 1984, a Petrobras já produzia a 200 metros da lâmina d’água, era um recorde mundial na época. E já começou a explorar em lâminas d’água acima de 400 metros. E, no final de 1984, se descobriu Albacora, depois se descobriu Marlim em 1985. Marlim era uma coisa intangível, não se concebia produzir um poço a 800 metros da lâmina d’água. Foi descoberto, mas não tinha tecnologia para produção, para produzir. Após Marlim, foram feitas sucessivas descobertas em lâmina d’água profunda. Marlim Sul em 1987, Barracuda em 1989. E foram seguindo essas inúmeras descobertas. Para mim, naquela época, isso era um mundo distante. Não tinha noção do que era aquilo. Hoje tenho, muito bem, a noção do que foi aquele momento áureo da Bacia de Campos, com grandes descobertas e investimentos pesados, e a produção aumentando. Se não me engano, foi por volta de 1984 que a Petrobras atingiu os 500 mil barris de óleo por dia, graças à entrada em produção dessas plataformas fixas de Namorado, Cherne, Pampo, Enchova. Então, estava abrindo um horizonte enorme na Bacia de Campos. Passou a ser, realmente, o grande foco de investimento da Companhia. A diferença do meu trabalho em Natal para a Bacia de Campos é que isso aqui era uma monstruosidade. A coisa estava crescendo assustadoramente. Eu passei a trabalhar em algumas plataformas fixas e depois comecei a trabalhar com as sondas flutuantes. COTIDIANO DE TRABALHO Você trabalha embarcado também numa sonda. O que acontece? Numa plataforma, você tem o processamento e a parte dos poços tudo junto. Nas sondas flutuantes, você tem seus poços submarinos que produzem para alguma plataforma, em algum lugar que não está em cima desse poço, necessariamente. Então, você produz para uma plataforma de produção que pode ser fixa ou pode ser uma outra plataforma flutuante., pode ser um navio, uma plataforma de produção. A sonda é o equipamento usado para dar acesso a esses poços que ficam ao redor dessas plataformas de produção. Normalmente, trabalham em torno de 100 pessoas numa sonda de perfuração ou completação. Trabalham no mesmo esquema de todos: 15 por 21. Antes era 15 por 15. A única diferença é que a sonda flutua. A sonda é uma plataforma de 80 por 80 metros, 90 por 90 metros, tem geração de energia independente, produção de água, refeitório, tem tudo que uma plataforma grande tem, só que ela flutua. Pode ser também um navio de perfuração, um navio com uma torre de perfuração. As plataformas que eu falei dão acesso a esses poços satélites. O que muda no trabalho? O que muda é que essa plataforma se mexe, na plataforma fixa está tudo parado. E nesse caso particular o sistema está flutuando. Então, sua referência muda, sua referência deixa de ser aqui em cima e passa a ser lá embaixo, no fundo do mar. O que está fixo é o fundo do mar. Você tem equipamentos próprios para perfuração de poços a partir de sistemas flutuantes e tem equipamentos próprios para esses procedimentos e metodologias para colocar um poço submarino de produção são diferentes de uma plataforma fixa. Então você passa a trabalhar com a referência do fundo do mar. Por exemplo, BOP, que é o preventor de irrupções, do inglês Blowout Preventer, numa plataforma fixa ele fica lá em cima, numa flutuante fica no fundo do mar. A árvore de natal, numa plataforma fixa, fica em cima, vai lá para baixo também. Isso muda bastante, tem outros equipamentos, em termos de procedimento. Agora, daí para baixo, poço de petróleo é poço de petróleo, é tudo igual, não muda nada. A filosofia é a mesma, os investimentos, a produção. O que muda são os equipamentos de sub-superfície. PRODUÇÃO PETROLÍFERA NA BACIA DE CAMPOS / ÁGUAS PROFUNDAS Quando cheguei a Macaé, em 1986, Marlim já tinha sido descoberto, Albacora já tinha sido descoberto. Já tinha um grupo de pessoas estudando como colocar isso em produção e para nós isso era um sonho distante. Olha só, por exemplo, quando Marlim foi descoberto, ninguém no mundo produzia nessa lâmina d’água. A Petrobras tinha uma experiência muito grande na área de completações submarinas, era líder mundial já na época. O primeiro poço a entrar em atividade na Bacia de Campos com árvore de natal molhada foi em 1979. A primeira árvore de natal molhada foi instalada pela Petrobras em 1979, e tinha um grupo de pessoas que foi se especializando nesse tipo de atividade, nesse tipo de equipamento. Então, para nós, que trabalhávamos na linha de frente aquilo era um sonho distante, era quase impossível. Em 1986, a Petrobras criou o PROCAP, o Programa de Capacitação em Águas Profundas, justamente para desenvolver tecnologia para produzir esse sistema em águas profundas. O foco era Marlim, que só foi entrar em produção em 1991. A Petrobras precisou de uns cinco anos para desenvolver essa tecnologia na área de poços, na área de ancoragem das plataformas de produção, na parte de linhas flexíveis e risers para lâmina d’água profunda, e eu cheguei a trabalhar no campo de Albacora, a 400 metros da lâmina d’água. Trabalhávamos com plataformas flutuantes, mas ancoradas. Foi quando entrou em operação no campo de Albacora, o PP Morais, que tinha trabalhado em Garoupa, foi para Albacora nessa época, um sistema antecipado de produção. SISTEMA DE PRODUÇÃO ANTECIPADO O sistema antecipado de produção pode ser duas coisas. Pode ser uma plataforma flutuante que produz um único poço, como pode ser um sistema que você produz alguns poços justamente para colocar aquele campo em produção, enquanto você constrói as suas instalações definitivas. A Petrobras tem feito isso há muito tempo e hoje muitas outras operadoras seguem esse modelo da nossa Companhia. Qual é a vantagem de um sistema antecipado de produção? Isso não foi criado pela Petrobras, já existia alguma coisa no Mar do Norte. Mas foi a Petrobras que trouxe isso, incorporou e passou a fazer parte do dia-a-dia. A vantagem do sistema antecipado de produção é a produção do óleo antecipada. Isso significa dinheiro para investir. A segunda coisa muito importante é o conhecimento do seu campo de petróleo, seu reservatório. Naquele teste de formação, você faz uma estimativa do tamanho da reserva, do volume, do que vai poder recuperar. Com um sistema antecipado você consegue produzir os poços durante um tempo maior e ver se o que imaginou é aquilo mesmo, se as coisas não são diferentes. Então você conhece melhor o óleo, conhece como produzir, se há uma dificuldade de escoamento, e tem a oportunidade de acompanhar melhor como é que se comporta a pressão do reservatório, esse tipo de coisa. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Eu trabalhei embarcado em Albacora, na área de completação de poços. Depois, eu trabalhei no sul do Brasil, nos campos de Caravela e Coral que a Petrobras tem em Itajaí. E eu trabalhei também em offshore, no piloto de Marlim. A Petrobras começou com um sistema chamado pré-piloto de Marlim. Foram dois poços colocados em produção em 1991. Nesses dois poços, eu trabalhava em terra, não estava embarcado. Mas, a partir daí, a Petrobras colocou o piloto de Marlim em uma linha de produção e foram 10 poços em lâmina d’água de 700 metros. Então, eu trabalhei na completação desses poços. PRODUÇÃO PETROLÍFERA / PESQUISAS A produção em águas profundas era um desafio. Cada metro a mais na sua lâmina d’água que a Petrobras conseguia colocar um poço em produção era um desafio, era um orgulho muito grande não só para aqueles que trabalhavam, como para toda a Companhia. Nós tivemos muitas pessoas que se dedicaram a essa atividade de produção em águas profundas na Petrobras. Isso eu vejo hoje como um tributo a esses que trabalharam tanto. Hoje a Petrobras produz a 1890 metros de lâmina d’água. Nós não somos mais recordistas mundiais. Hoje temos empresas no Golfo do México produzindo a 2200 metros, mas durante muitos anos a Petrobras foi líder nesse mercado, reconhecida internacionalmente nesse mercado de lâmina d’água profunda. Os outros operadores viam na Petrobras um modelo a ser seguido, pela ousadia, pela disposição de testar novas tecnologias, pelo empreendedorismo. Então nesse mercado de produção em lâmina d’água profunda, a Petrobras foi líder durante muito tempo. Hoje é reconhecida internacionalmente. LINHA FLEXÍVEIS Nós tivemos algumas experiências no campo de Marlim na área de conexão de linhas flexíveis. A questão fundamental da lâmina d’água para produção não estava na perfuração. A perfuração sempre esteve adiante da produção, que é mais ou menos lógico. Você perfura para depois produzir. Você perfurar o poço em lâmina d’água profunda não é o problema. Teoricamente, descer uma árvore de natal molhada não era o problema também. O problema tava na conexão da linha. Como é que você vai conectar uma linha de produção numa árvore de natal molhada lá embaixo, a 700 metros de lâmina d’água. O mergulho comercial vai até 300 metros. Na verdade, até 300 metros de lâmina d’água, a conexão das linhas de produção com a árvore de natal era feita por mergulhadores. A partir daí, tornou-se impossível fazer. Voltando um pouquinho mais, a Petrobras buscou, desde o início dos anos 80, um sistema de conexão remota de linhas flexíveis. Eu conectava as linhas flexíveis à árvore de natal molhada sem o auxílio de mergulhadores. Isso já nos primórdios dos anos 80, e esse sistema deu muitos problemas. E aí passaram a usar os mergulhadores regularmente para fazer essas conexões de linha. Até 300 metros podia mergulhar, então use o mergulhador logo e pare de ficar buscando coisas que dão problema. Mas com as descobertas acima de 300 metros de lâmina d’água, a Petrobras foi obrigada a desenvolver esses sistemas. Graças à sua experiência anterior, quando ela usava sem precisar e que não funcionava, ela adquiriu conhecimento suficiente para poder desenvolver coisas novas, acima dos 300 metros de lâmina d’água. Então, já nos campos acho que de Marimbá e depois Albacora, a Petrobras começou a testar sistemas de conexão de linhas diferentes. Uma coisa muito importante foi desenvolvida pela Petrobras foi um sistema de interligação de linha chamado lay-away. Então isso foi um método desenvolvido na Petrobras, em que as linhas de produção são descidas junto com a árvore. Você monta a linha de produção na árvore de natal aqui na superfície e desce tudo junto. Então fica uma sonda de completação e um barco de lançamento de linha trabalhando juntos, e isso a Petrobras foi pioneira. A Petrobras foi a primeira a instalar esse sistema, em 1987 ou 1988. Em 1989, já havia em Albacora. Eu lembro que, quando Marlim entrou em produção, nós já usávamos esse método chamado de lay-away. E introduziram modificações, passaram a fazer métodos que nós chamávamos de conexão vertical, onde as linhas eram depositadas no fundo do mar pelo barco, depois a sonda de produção ia lá, tirava essas linhas e instalava na árvore. Eu lembro de ter trabalhado com tudo isso. A partir daí, foram evoluções naturais desse sistema, que foi a grande jogada, a grande sacada. Alguns colegas nossos bolaram esse método e iniciaram a sua utilização, e foi o que permitiu realmente a Petrobras seguir esse desenvolvimento de lâmina d’água profunda. Depois nós trabalhamos num poço em Marlim Sul a 1700 metros de lâmina d’água. Foi recorde mundial. Depois foi Roncador já a 1800 metros, que é um campo gigante, o último campo gigante, descoberto em 1996, e que está em produção desde 1999. Mas o maior campo em produção hoje é Marlim, como reserva. Eu lembro ter trabalhado num poço em 1994, a 1027 metros de lâmina d’água, foi recorde mundial também da Petrobras. Esse poço tem uma passagem interessante na minha vida profissional porque esse poço é o três, Marlim 4. É no Campo de Marlim Sul, mas o nome do poço é Marlim. A Petrobras quis fazer um sistema antecipado de produção justamente para conhecer um pouco mais o reservatório de Marlim Sul, e decidiu colocar esse poço em produção para uma plataforma de Marlim. Se não me engano, era a Petrobras-20 ou Petrobras-18, que ficava a quase que a 20 quilômetros de distância do poço. Então, para Petrobras foi um teste para saber como é que poderia trabalhar com uma distância maior. Queria testar justamente o escoamento, se era possível numa distância daquela, trabalhar com as linhas flexíveis, como eram usadas na época. Em termos de lâmina d’água foi recorde mundial. Esse poço ficou pronto em 1994 no mês de abril, um mês antes do Offshore Technology Conference, o mesmo prêmio que a Petrobras havia ganho em 1992. E em 1994 a ganhadora do prêmio foi a Shell. Existia aquela competição natural entre a Shell e a Petrobras. A Shell estava se desenvolvendo no Golfo do México e a Petrobras aqui. Era uma competição saudável para saber quem produzia mais fundo. E a Petrobras bateu os mil metros antes da Shell, então com a colocação desse poço de 1027 metros em produção, que foi um feito muito grande. Eu lembro que o poço estava pronto para produzir, mas não produzia: estava ligado e não produzia. Então toda a delegação da Petrobras foi para os Estados Unidos, para o OTC – Offshore Tecnology Conference. E o que a Petrobras queria fazer na verdade? Era chegar a OTC e dizer: “Olha, está produzindo”, e liquidarmos a Shell. Foi um sufoco muito grande e eu estava embarcado no local onde trabalhava e fui justamente até esse poço para ver o que estava acontecendo. Nós conseguimos colocar o poço em produção numa sexta feira à noite, por volta das 11 horas. O poço entrou em produção. Então aquela semana foi terrível em termos de cobranças. Vamos fazer isso, vamos fazer aquilo, está acontecendo isso. Bom, na sexta feira à noite, o poço entrou em produção. No sábado, quando a delegação da Petrobras viajou para OTC, já sabiam que o poço estava produzindo. Nós deixamos aquele poço produzindo naquele final de semana todinho. No domingo, quando as pessoas chegaram a OTC, um dia antes do prêmio ser conferido a Shell, todo mundo já sabia que a Petrobras estava produzindo a 1027 metros. Então o prêmio foi dado a Shell, mas o grande foco das atenções foi a Petrobras. O prêmio já estava dado e tudo, mas foi aquele gostinho especial e podemos dizer: “Olha, eu superei essa barreira dos mil metros.” PROBLEMAS DE HIDRATO Nesse poço de Marlim 4, em particular, nós tivemos um problema de hidrato. Hidrato é quando você tem água em contato com o gás em baixa a temperatura, formando um bloco de gelo. Ele congela e isso não deixa o poço produzir. A árvore de natal estava na coluna de produção e parte das linhas estava congelada e aí o poço não produzia. Então, nós tivemos que trabalhar para dissociar esse hidrato para permitir o fluxo do poço para a plataforma de produção. Então o poço pronto não produz. O que eu faço? Volto com a sonda em cima do poço. Com essa intervenção, tentamos esquentar, mas a 1027 metros isso é difícil, é complicado. Você deve justamente evitar o contato da água com o gás. Se formar o hidrato, você vai ter que dissociar o hidrato, aliviando, diminuindo a pressão. Só que, para nós, naquela época, isso não era uma coisa muito comum. Todo mundo falava de hidrato. “Você não tem problema de hidrato?” “Não, nunca tivemos. Isso deve ser com os outros, com a gente não. País tropical, quem somos nós?” E teve o problema de hidrato nesse poço de Marlim 4. E nós, na época, fizemos isso. Até água quente nós bombeamos no poço para esquentar, ela chegava gelada, mas pelo menos nós tentamos. Foi divertido e curioso porque, como o prazo estava acabando, o pessoal do Cenpes ajudou muito. O pessoal do Cenpes, o pessoal do Edise. E eles decidiram, na época, fazer um SGN – Sistema Gerador de Nitrogênio – que se tornou uma patente da Petrobras. Foi patenteado pelo Cenpes. SGN é uma mistura de dois produtos. Esses dois produtos geram calor e nitrogênio. Então o pessoal falou assim: “Ó, vamos fazer um SGN no poço para esquentar e quebrar esse hidrato”. Nós estamos prontos para fazer esse SGN, quando tivemos vazamento, e reparar esse vazamento, fizemos alguns testes. E durante esses testes nós conseguimos abrir o poço. Então fizemos SGN e o poço começou a produzir. E foi uma alegria, uma satisfação para todo mundo que estava lá e também um alívio muito grande ao ver o poço produzindo. Depois nós trabalhamos em Marlim Sul, 1703 metros de lâmina d’água, foi outro recorde mundial na época; depois Roncador. Assim, a minha vida profissional na Petrobras a maior parte do tempo foi embarcado. Eu relutava a trabalhar em terra. Trabalhei ligado à parte de completação e intervenção em poços ou workovers. Então a minha vida profissional foi essa. INTERVENÇÃO EM POÇOS - WORKOVERS Imagina um poço de petróleo que já está produzindo e que depois de algum tempo para de produzir ou você tem que fazer um trabalho qualquer nesse poço para aumentar a produção ou corrigir algum problema. É a parte mais difícil, chamada de intervenção ou workover. Isso acontece em poços de plataformas fixas ou em poços submarinos. Por exemplo, você pode ter um poço que, ao longo da sua vida produtiva, comece depois de um tempo a produzir água. Então você tem que fazer uma intervenção nesse poço para diminuir a produção de água de tal modo que ele produza só óleo. Você pode fazer uma intervenção num poço para abandonar determinada zona produtora e colocar uma outra zona produtora em operação. Você pode fazer uma intervenção num poço, porque você tem um vazamento, por exemplo, na sua coluna de produção, ou nos poços equipados com bombeiros centrífugos submersos a bomba para de funcionar. Então você tem que fazer uma intervenção para trocar a bomba. É preciso fazer manutenção da produção ao longo da vida produtiva de um poço. Um poço de petróleo produz, dependendo do campo, entre 20 a 25 anos. Durante essa vida produtiva, ele tem falhas. Tem uma falha na árvore de natal molhada por exemplo, você tem que ir lá reparar. Têm poços em Garoupa, os primeiros a entrar em produção na Bacia de Campos, que estão produzindo até hoje. E aí, tem o binômio produtividade e rentabilidade. Então, por exemplo, um poço de uma plataforma fixa, que já produziu durante 20 anos, como um poço na Bahia que produz pouco, produz água, mas que tem toda uma infraestrutura montada; então vale a pena manter produzindo. Se você for num poço submarino em lâmina d’água profunda em que uma intervenção custa caro porque o recurso sonda custa caro, o recurso barco custa caro, talvez não seja economicamente atraente colocar esse poço em produção, aí você abandonaria esse poço antes. Então depende muito do campo, depende muito do poço, depende da produção de água, depende de sua infraestrutura, enfim, depende vários fatores. Se você olhar um poço satélite, um poço submarino, você tem um problema de escoamento também. Será que um poço com muita água produz na sua plataforma de produção sem problema? Você tem um alicerce entre o poço e a plataforma de produção. Então isso talvez gere problemas de fluxo; então talvez você tenha que abandonar aquele poço antes. Não existe uma regra definida não, depende de uma série de fatores. TRABALHO EMBARCADO Alguns colegas brincavam comigo porque eu fugia do trabalho interno de todo jeito, queria trabalhar embarcado. Sempre gostei de trabalhar embarcado. A vida de embarcado é especialíssima, obviamente, a família tem que se adaptar. Aqueles que são casados e com filhos, precisam de uma esposa em casa que consiga se virar sozinha durante aqueles 15 dias. Minha esposa sempre foi muito independente, sempre teve o trabalho dela, sempre se virou muito bem. Nós não temos filhos, então na parte familiar não há problema nenhum. Então tem essas dificuldades. Para quem tem filhos em idade escolar então a história é um pouco mais complicada. Mas a vida no mar é uma vida muito boa, e eu sempre gostei de trabalhar embarcado. Fui obrigado a trabalhar em terra durante um período e estou lá até hoje. PROGRAMA DE SEGURANÇA PARA SONDAS DE POSICIONAMENTO DINÂMICO Eu já tinha trabalhado em terra, trabalhei desde 1988 em rodízios. Passava três meses em terra, seis meses, voltava a embarcar. Eu sempre gostei muito de embarcar, e morar em São Paulo, porque não? E aí eu fui chamado a trabalhar em terra num programa chamado Programa de Segurança para Sondas de Posicionamento Dinâmico. Foi um programa criado na Petrobras, inicialmente, com um time da perfuração, que depois agregou o pessoal da completação. Qual era a motivação desse programa? Desde 1984 a Petrobras começou a usar sondas de posicionamento dinâmico para a perfuração de poços. Uma sonda de posicionamento dinâmico não tem âncora, ela fica num lugar com sistema de hélices e propulsores e computadores, que a mantêm no lugar. A Petrobras como estava indo para lâmina d’água profunda, foi contratando todos esses recursos no mundo. Durante um período, a Petrobras foi a operadora que mais possuía sondas de posicionamento dinâmico no mundo. E obviamente nós tivemos alguns incidentes nesse caminho todo. Em função desses incidentes a Petrobras decidiu criar esse programa de segurança. Incidentes de perdas de posição, por exemplo: você tem uma falha da geração, os geradores desligam, você perde energia, perde seus propulsores, seus thrusters, suas hélices, e você vai ao sabor do vento, das ondas, da correnteza. Aí você vai até dar um jeito de segurar até você conseguir estabelecer energia para poder parar sozinho, mas você pode ir longe. Então o que a Petrobras fez? Criou uma série de procedimentos operacionais para evitar que essas coisas acontecessem. E esse trabalho foi montado pelo antigo Departamento de Perfuração – DEPER. Quando esse trabalho ficou pronto, nós tínhamos procedimentos operacionais para perfuração de poços usando sondas de posicionamento dinâmico, procedimentos de testes, auditorias nessas unidades, treinamento do pessoal, estabelecemos alguns limites para parar a operação antes de chegar num estado crítico que já não tivesse mais volta. A idéia era parar antes, parar com segurança, para não chegar ao limite extremo tendo a situação complica e prejuízos maiores depois. Quando esse programa estava pronto, nós da completação entramos para justamente pegar aquilo que era interessante da Área de Perfuração e trazer para as atividades de completação. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Por causa desse Programa de Segurança para Sondas de Posicionamento Dinâmico, eu passei dois anos em terra em Macaé. Depois voltei a embarcar durante um ano em Roncador e então retornei para terra já como gerente das atividades que faço atualmente. Hoje, trabalho na Área de Intervenção em poços no ativo de produção Marlim. Durante esse período entre 1997 e 1998, eu fui obrigado, literalmente, a ir para Macaé. Fomos, e hoje se me perguntarem se eu quero sair de Macaé, a resposta é não. São Paulo seria uma outra opção, eu iria considerar com mais cuidado, mas dizem que o bicho homem se adapta no começo. E nós nos adaptamos em Macaé e estamos bem. A minha mulher também é de São Paulo, mas está bem em Macaé, está bem adaptada, está satisfeita em Macaé, estamos bem. TRABALHO EMBARCADO Às vezes, sinto falta de um pouco de trabalho embarcado, mas já me adaptei ao trabalho em terra também. Mas se eu tiver que voltar a trabalhar embarcado, vou sem problema algum. Algumas pessoas não gostam do trabalho embarcado, elas têm medo de voar no helicóptero, isto ou aquilo. Eu não tenho esse tipo de problema, apesar de não ter passado nenhum susto grande em helicóptero até hoje. Se for designado a trabalhar no mar de novo, vou sem problema nenhum. Eu acho que não é um sofrimento, é uma vida boa de muito trabalho, de muita realização, é muito bom. PARTICIPAÇÃO EM PALESTRAS / SOCIETY OF PETROLEUM ENGINEERS Existe uma sociedade chamada SPE – Society of Petroleum Engineers – uma associação americana que tem seções no mundo todo. E existe uma seção Brasil, em Macaé e também em Salvador. Na época, o pessoal da seção Macaé me indicou para esse programa do SPE chamado Distinguished Lecturers. Esse programa foi criado em 1961. Começaram com três palestrantes viajando nas seções para dar determinadas palestras. O pessoal gostou tanto que estenderam o programa e foram aumentando o número de palestrantes. Em 1997, eu fui indicado pela seção Brasil, a seção Macaé, para fazer parte desse programa, falando sobre completações submarinas. Eu fui aceito no programa. Eu fui, na verdade, o primeiro brasileiro a ser aceito nesse programa do SPE. Outros colegas também foram indicados comigo e não foram aceitos. O motivo principal é que o título da palestra que eu estava propondo era algo que o pessoal da SPE queria ouvir. Então falei sobre completações submarinas. E como funciona? As seções, a cada ano, dizem assim para SPE: “Olha, eu gostaria que vocês mandassem um cara para cá para falar de reservatórios ou de completações, ou de fraturamento”. E aí eles pegam aquelas indicações feitas pelas seções e procuram: “Olha, esse cara aqui é o bam-bam-bam na contenção de areia”, as seções querem ouvir sobre contenção de areia, convidam essa pessoa para fazer uma palestra. Então eu fui o primeiro brasileiro, depois alguns outros colegas também foram indicados pela Petrobras. Nesse programa, eu fiz palestras na Austrália, Nova Zelândia, Papua - Nova Guiné. Então eu fui a Perth, Adelaide, Melbourne, Sidney, e à Nova Zelândia; voltei para Austrália em Brisbane e ainda fui à Papua Nova Guiné. Eu nunca pude imaginar um dia ir parar na Papua Nova Guiné, primeiro que Papua-Nova Guiné produzia muito pouco petróleo e só em terra. Porque um cara vai fazer uma palestra sobre completações submarinas na Papua-Nova Guiné? O motivo é simples, eu já estava na Austrália, dali para Papua são duas horas de vôo, então aproveita e vai visitar a seção e vai fazer uma palestra que, se não servir diretamente paras pessoas de lá, serve para conhecimento geral. Então essa foi uma rodada de 15 dias. Voltei para o Brasil, depois fui ao México. Fiz o México em cinco dias, cinco cidades do sul ao norte do México. E numa terceira jornada, eu fui para Indonésia, Jacarta, Malásia em Kuala Lumpur e numa outra cidade na Ilha de Sarawak chamada Miri. Fui a Singapura e foram mais quatro palestras, algumas no Peru, em Buenos Aires. Foi uma experiência profissional muito boa. Para organizar essa palestra eu tive que fazer muita pesquisa, não só do que a Petrobras fazia, mas do que as outras operadoras faziam no mundo em termos de completações submarinas. Consegui buscar um pouco da história do desenvolvimento da completação submarina no mundo: lá no Golfo do México, no Mar do Norte, as primeiras árvores de natal molhadas... E tive contato com outros operadores. Muito curioso. Na Malásia eu estive em contato com o pessoal da Petronas, que é a Petrobras local, eles falaram assim: “Escuta, quantas árvores de natal molhadas vocês têm na Petrobras?” Nós tínhamos mais de 400. “Absurdo, aqui nós temos duas.” “Como só duas?” “É que nós descemos duas em 1979, usamos as duas primeiras, e tivemos tanto problema que nós desistimos de usar árvore de natal molhada. Nós podemos fazer com plataformas fixas e fomos para as plataformas fixas.” Eu disse: “Pois é, a Petrobras colocou a primeira em 1979, não tinha opção. A coisa funcionou e nós só fizemos árvore de natal molhada até agora, por isso nós temos 400.” A Petrobras se tornou líder nesse mercado, porque foi trabalhar em água profunda antes dos outros operadores. Se nós tivéssemos em Macaé, na Bacia de Campos, a lâmina d’água de Ubarana, nós não estaríamos falando em completações submarinas e recordes da Petrobras hoje, teríamos plataformas fixas. Felizmente, a Petrobras sempre teve um passo adiante dos outros operadores devido às condições da Bacia de Campos. A primeira descoberta foi a 125 metros da lâmina d’água, o primeiro poço produtor foi a 189, e daí foi seguindo cada vez mais profundo. Esse programa do SPE - Society of Petroleum Engineers - foi bastante interessante. Na verdade nesse programa, não existe comercialismo, mas é obvio que esse sistema foi utilizado pela Petrobras no Brasil. Então as pessoas tinham um interesse muito grande em saber como é que as coisas são feitas aqui. Eu preparei uma apresentação com mais de 100 slides; você tem que dosar a apresentação de acordo com o número de pessoas e com o tempo disponível. Isso nós fazemos no Brasil também, nós recebemos aqui vários palestrantes de fora. A cada ano vem dois ou três para o Rio, Macaé ou Salvador fazer a palestra. VIAGENS A coisa que mais chamou a atenção foi o fato de viajar sozinho. Saí do Brasil e fui parar na Papua Nova Guiné, sozinho. Viajar sozinho durante 15 ou 18 dias é uma experiência terrível, que começa na logística: quantas malas eu levo? Só tenho duas mãos, não dá para levar mais mala. Você chega ao aeroporto, não sabe se tem carrinho, se tem carregador, e a coisa é complicada. Na Malásia, eu fui para Ilha de Sarawak, desci: “Olha, o hotel fica a duas horas de viagem do aeroporto, o resort aqui”. “Mas como eu faço para chegar?” “Não tem problema, você pega um táxi, dá o nome do hotel para o motorista que ele te leva”. “Ta bom”. Primeiro, para ir para Ilha de Sarawak você precisa ter um visto especial. Na Malásia tem muito militar nos aeroportos, caras armados até os dentes. Então, você vai à esteira de bagagem, pega a sua malinha. Todo mundo te olhando porque você tem um físico diferente dos demais. Aí vai para o ponto de táxi, avisa o motorista - que não fala inglês - para onde você quer ir. Ele fala que sim, você bota as malas no carro e passa duas horas, passando por um monte de estradinhas. “Meu Deus, onde é que eu to indo?” Sem celular; na época não tinha celular assim. Chega ao hotel de noite: é um hotel lindo, maravilhoso. Toma banho, janta, vai dormir, acorda no dia seguinte, faz a palestra, junta suas malas no final da tarde e vai para o próximo lugar. É uma correria. VIAGENS Foi interessante ter parado em Port Moresby, capital da Papua-Nova Guiné. Quando eu falei para alguns amigos australianos que estava indo para lá eles me disseram: “Cuidado que lá eles comem gente, viu? Lá é um perigo”. Cheguei à Papua Nova Guiné, uma malinha pequenininha, deixei minhas malas na Austrália. O pessoal da Austrália dizia: “Não saia do aeroporto sem o seu guia, viu? Não saia de jeito algum.” Tá bom. Saí no aeroporto, a primeira coisa: visto de entrada. Não tinha. “É o seguinte, o visto é aqui mesmo que você pega. deixa sua mala aqui, vai lá fora, troca dinheiro e volta para pagar o visto”. Largo a minha mala lá, o aeroporto vazio, deserto. Vou à casa de câmbio, troco o dinheiro, volto, pago o visto. O cidadão da imigração botou o visto no passaporte assinou, liberou a bagagem e saiu. Eu do lado de dentro do aeroporto, esperando o meu guia, vi um monte de gente do lado de fora do aeroporto. Meia hora, uma hora, nada. Tento ligar não consigo; a pessoa que ia me receber era um americano da Chevron, operador lá na Papua-Nova Guiné. Fiquei uma hora lá dentro. Vi um carro da Chevron: “Agora não tem jeito, eu vou sair, tenho que sair”. Eu saí, e o cara da Chevron: “Poxa, eu tô há uma hora te esperando”. E eu: “Também estou há uma hora te esperando, e como que é?” “É que nós não podemos entrar no aeroporto. Aqui só entra no aeroporto quem tem a passagem aérea, nós somos obrigados a ficar do lado de fora.” “Ta bom.” Fui para o hotel. Então, essas questões culturais foram marcantes na viagem. Na Malásia, o garçom do hotel olhava para mim meio torto, uns dois ou três dias. “Eu tô enrolado aqui;” No terceiro dia ele falou assim: “Você é muçulmano”? Eu: “Não, sou brasileiro.” “Brasil, Pelé, futebol.” Aí virou meu amigo. Deu para ver então que o brasileiro é um povo bem quisto no exterior. Não temos problema com país nenhum do mundo. E, profissionalmente, esse contato com as outras pessoas, outros operadores foi muito bom. Queriam saber como é que era o nosso trabalho: “Puxa, que maravilha. Olha, nós temos problemas aqui, vocês são tão adiantados”. Foi uma experiência muito boa. No México também fui muito bem recebido, em Singapura também. Em todos os paises que eu visitei, eu fui muito bem recebido. As pessoas têm um respeito muito grande pela Petrobras; isso ficou muito marcado em termos pessoais e profissionais, esse respeito que os outros operadores têm pela Petrobras. Então, como brasileiros, nós devemos ter orgulho de termos no país uma empresa como a Petrobras, que é reconhecida no exterior como líder nesse mercado. Foi uma experiência muito boa. E&P - EXPLORAÇÂO E PRODUÇÂO / COOPERAÇÃO TÉCNICA A Petrobras, em 2001, reestruturou o segmento do E&P em toda a Companhia. Nós fomos divididos em ativos de produção, unidades de negócios e ativos de produção. Hoje, eu acho que, quando nós temos algum interesse de contato ou relacionamento com outros órgãos, a coisa é muito fácil e direta, não tem mais intermediário. Atualmente se eu precisar de alguma coisa do Centro de Pesquisa da Petrobras, eu vou diretamente até lá e consigo aquilo que eu preciso. CAMPO DE MARLIM No campo de Marlim, onde trabalho atualmente, apesar de não ser o recordista em termos de lâmina d’água, é até hoje o recordista de produção. Então, o Campo de Marlim é o que mais produz petróleo no Brasil. Só o Campo de Marlim produz hoje perto de 480 mil barris de óleo por dia, 30 e poucos por cento da produção nacional. Isso é o mais importante. Então, a Companhia sabe da importância disso e se mobiliza para resolver esses problemas. Isso também está muito claro para o nosso Diretor de Exploração e Produção, que diz assim: “Marlim, com Marlim Sul e Marlim Leste, é a coisa mais importante que nós temos e é nela que nós temos que investir todos os nossos recursos para poder manter a produção em níveis elevados.” E isso, de certa forma, facilita muito quando você tem o contato com os outros órgãos, quando você precisa de algo. Existe essa mobilização da Companhia em relação à Marlim, que é até hoje o xodó da Petrobras. Hoje, o que nós fazemos em Marlim Sul ou Marlim Leste, Roncador ou Roncador Leste, nós aprendemos com Marlim. Marlim foi um aprendizado muito grande para a Companhia nessa área de poços, aprendemos a superar os problemas. Marlim tem 130 poços de petróleo, é uma coisa monstruosa. Começou a se desenvolver em 1991, em 1992 veio o piloto e, em 1994, a primeira plataforma do sistema definitivo. A última plataforma do sistema definitivo entrou em 2000. Hoje, em Marlim, nós temos poços produzindo desde 1991. Em março de 2005, vamos completar 14 anos de produção em Marlim, 14 anos de poços submarinos, produzindo numa lâmina d’água de 700 metros. Foi um aprendizado: os problemas de poços, as intervenções e outros problemas. Marlim realmente está à frente dos outros campos e nós dizemos o seguinte: “Nós estamos passando hoje o que os outros campos da Companhia vão passar daqui a um tempo”. Então continua servindo de aprendizado para o desenvolvimento dos outros campos, como Barracuda, Marlim Sul, Albacora Leste, Marlim Leste; Roncador, um pouco menos, porque a lamina d’água é mais profunda. Lá os projetos são um pouco diferentes. Assim, os problemas que enfrentamos em Marlim certamente os outros ativos de produção vão enfrentar no futuro. Então, servirá de exemplo para todo mundo. BACIA DE CAMPOS - PRODUÇÃO A Bacia de Campos é líder na produção nacional. Eu acho que 80% da produção nacional sai da Bacia de Campos. É algo extremamente importante para o país. O povo brasileiro não tem noção dessa grandiosidade toda; só aqueles que estão envolvidos mais diretamente sabem o que é a Bacia de Campos. É um lugar onde a Petrobras certamente vai continuar investindo por muito tempo. Felizmente hoje as nossas descobertas não estão concentradas na Bacia de Campos, estamos com novas descobertas na Bacia de Santos, ao sul e ao norte. O nosso leque de oportunidades está aumentando. Mas, em função da infraestrutura já instalada na Bacia de Campos, obviamente será mais rápido e mais fácil colocar um campo descoberto em produção na Bacia de Campos do que na Bacia de Santos. Infraestrutura é fundamental nesse negócio, vide experiência que a Petrobras está tendo no Golfo do México. A Petrobras como sócia de outros operadores fez descobertas importantíssimas na lâmina d’água ultraprofunda no Golfo do México. Estamos falando de 2500, 2800 metros da lâmina d’água. Só que fizeram essas descobertas numa área completamente isolada que não tem infraestrutura nenhuma. Então como é que eu vou colocar isso em produção? Eu tenho que lançar oleoduto novo, gasoduto novo, onde é que eu vou ligar? Se tivesse uma lâmina d’água mais rasa, com a infraestrutura mais montada, seria muito mais fácil colocar em produção, como acontece aqui na Bacia de Campos. Na Bacia de Campos, existem projetos de aumento de produção dos campos já existentes. Vários projetos novos estão sendo implementados. A P-43 entrou em produção agora em dezembro, a P-48 estará também entrando esse ano no Campo de Caratinga, bem como a P-50 no Campo de Albacora Leste. Teremos ainda a P-51 e P-52 em Marlim Sul e Roncador, que foram licitadas a pouco tempo e estão em construção. Estamos licitando a P-53 para Marlim Leste, estão falando em P-54, P-55, P-56, todas na Bacia de Campos. Então, eu acho que se a Bacia de Campos hoje produz 1,3 milhões de barris, vai chegar em 2007, em 2008 possivelmente a 1,7 milhões, a 1,8 milhões de barris. A Bacia de Campos tem um papel fundamental no planejamento estratégico da Petrobras. Então, descoberta em 1974, está há 27 anos em produção. E hoje ainda tem exploração na Bacia de Campos e ao mesmo tempo tem tido descobertas. A exploração não para. A Bacia de Campos não está ainda saturada em termos de exploração, e temos vários projetos em desenvolvimento. E isso é de extrema importância para o povo brasileiro e para o país, como um todo. Esperamos a auto-suficiência para 2005 ou 2006. O planejamento estratégico aponta para o ano de 2006, e esse é um grande marco para o país. PETROBRAS / PRODUÇÂO DE PETRÓLEO No planejamento estratégico da Petrobras, a auto-suficiência está prevista para 2006. Algumas pessoas acham que talvez seja possível em 2005, particularmente acho difícil. Isso para o Brasil é muito bom. Se você lembrar a primeira crise do Petróleo em 1973, foi um baque muito grande. Eu lembro porque fiz história, eu não tinha nascido nessa época Mas foi terrível. O segundo choque do petróleo não foi tão ruim, porque a Petrobras já produzia e isso aliviou bastante. Hoje a Petrobras exporta muito óleo, muito petróleo do Campo de Marlim, e importa menos. A Petrobras é a maior exportadora do país, ela exporta mais que do que a Vale do Rio Doce, principalmente porque exporta petróleo e alguns derivados também, mas o grosso da exportação é o petróleo. A Petrobras, pelo que eu vi, em termos brutos financeiros, o foi a maior exportadora em 2004, a segunda foi a Vale, depois a Embraer e as outras empresas. No Campo de Marlim, os navios encostam-se às plataformas, abastecem e saem direto. Não vem para a terra, o óleo do Campo de Marlim vai direto para fora. Existem acordos com a Receita Federal. O fiscal da Receita embarca, atesta, libera a carga no mar, que vai embora, vai direto para Europa e tudo mais. A Petrobras exporta petróleo bruto, que vai ser refinado por lá. GASOLINA PODIUM A Petrobras produz aquela gasolina podium, uma gasolina especialíssima, de alta octanagem. A grande sacada da gasolina podium é o baixo teor de enxofre. Para 2005, 2006, a legislação da Europa estará controlando os índices de enxofre na gasolina e o o petróleo brasileiro será fundamental para eles. Obviamente que o petróleo leve é fundamental para nós. Então, a Petrobras está lidando muito bem com isso em termos de comercialização do petróleo. Foi vencida uma barreira muito grande, conseguir exportar diretamente sem trazer o petróleo para terra. PRODUÇÃO PETROLÍFERA / PRODUÇÃO E PESQUISA NA BACIA DE CAMPOS A Bacia de Campos começa o platô na plataforma continental e vai até uns 200 ou 300 metros. Depois vem o talude continental que vai até uns 1800. Depois vai para o platô de São Paulo e chega em torno de três mil. O platô de São Paulo tem uns mapeamentos onde você vê muito bem a topografia do fundo do mar. A Petrobras perfurou alguns poços de 2700, 2800 metros, e esses poços nos geraram grandes descobertas. Então, hoje o foco da lâmina d’água está entre 1500 e 2500 metros, fazendo algumas descobertas. Eu não sei quando se pretende voltar para lâmina d’água mais profunda, pois quanto maior a lâmina d’água, mais cara fica a produção e, ainda, o investimento em infraestrutura é muito maior. Enfim, os desafios são enormes e os recursos são limitados. Então, hoje a Petrobras tem um plano de desenvolvimento muito claro: Roncador, Marlim Sul módulo dois, Albacora Leste. A Companhia está investindo dinheiro nisso, mesmo que apareça uma descoberta, uma lâmina mais modesta. A Petrobras está focando em outras descobertas importantes: o campo de Mexilhão, em Santos, gás e petróleo no campo de Golfinho, no Espírito Santo, onde tem óleo leve a 1200, 1300 metros da lâmina d’água; isso é extremamente importante. Então, os focos são diferentes. As descobertas da Petrobras em lâmina d’água ultraprofunda estão ligadas ao óleo pesado. O conceito de “águas profundas” foi mudando ao longo do tempo. Hoje, rasa está mais ou menos definida até 400 ou 500 metros. De 400 ou 500 a 1500 é profunda e acima de 1500 é ultraprofunda. Os indícios foram mudando ao longo do tempo: 700 metros era água ultraprofunda. Então, as coisas têm mudado. As descobertas em águas ultraprofundas são ligadas a óleo pesado. Óleo pesado é mais difícil de produzir, mais caro para produzir, mais difícil de processar. Então o foco da Companhia vai de acordo com suas descobertas. GERENCIA DE INTERVENÇÃO EM POÇOS DO ATIVO DE PRODUÇÃO DE MARLIM Eu sou Gerente de Intervenção em Poços do Ativo de Produção de Marlim. Trabalho em terra. O nosso grupo, nós somos em 22 pessoas: 20 engenheiros e duas pessoas de nível médio. Nós somos responsáveis pela completação e intervenção dos poços nos campos de Marlim e Voador, que é um campo próximo a Marlim, que faz parte do ativo de produção Marlim. Nós estamos falando de 140 poços de petróleo, estamos falando em torno de 90 poços produtores e 50 e poucos poços de injetores de água. A nossa responsabilidade é perfurar, completar e restaurar esses poços do campo de Marlim. O desenvolvimento original desse campo já terminou e hoje nós estamos à procura de novas oportunidades de produção. Então aquele plano inicial de Marlim já acabou. Agora estamos furando em torno de quatro poços novos por ano para substituir poços antigos. Além desses poços, estamos buscando novas áreas de reservatório não drenadas. Na verdade estamos substituindo poços antigos por poços novos. Por exemplo, um determinado poço numa área do campo está produzindo com água muito elevada; com muita água. Não está sendo mais economicamente atrativo produzir esse poço. Então nós estamos abandonando certos poços e furamos outros próximos àquele. Agora estamos trabalhando com poços horizontais, porque é a moda sim. Pelo menos, em Marlim é a moda. POÇOS HORIZONTAIS - MARLIM Existem esses poços novos exatamente para drenar novas áreas do reservatório. Os poços horizontais começaram a ser furados na Rússia em 1950, em terra. Os russos já furavam dessa forma, eles tinham uma tecnologia muito avançada na área de perfuração de poços para a época, mas eles viviam isolados; eles eram os vermelhos e nós os azuis. Então, a gente tinha pouco intercâmbio técnico. Portanto, os russos já perfuravam poços horizontais em 1950 e trouxeram essa tecnologia para o mar. A Petrobras furou o primeiro poço horizontal em 1990, no Campo de Bonito, era lâmina d’água rasa, e em calcário. Quando Marlim começou em 1991, nós trabalhávamos com os poços verticais e direcionais, que são os tradicionais. Ao longo do desenvolvimento de Marlim, a tecnologia de perfuração e completação dos poços foi melhorando. E nós passamos a adotar os poços horizontais em Marlim. A utilização de poços horizontais permite uma produtividade maior, porque você consegue desenvolver um campo com um número menor de poços. Imagina um poço vertical: o reservatório está em baixo e você o atravessa perpendicularmente. Um poço horizontal, o reservatório continua aqui em baixo, você entra no reservatório, paralelamente entre o topo e base do reservatório, acompanhando o seu comprimento. Então, você consegue drenar a área dos reservatórios, consegue perfurar a intervalos maiores, produzir mais e drenar melhor com um número menor de poços. Então hoje nós temos poços em Marlim com até mil metros de sessão horizontal. Não é nenhum recorde mundial, tem poços no oceano de até cinco quilômetros de extensão horizontal. Então, em Marlim, como nós começamos lá atrás em 1991, nós temos uma mistura de tudo, os poços verticais, os direcionais e os horizontais. Se nós fôssemos desenvolver mais um hoje, nós só faríamos com poços horizontais, tal qual estamos fazendo em Marlim Sul, em Albacora Leste e Marlim Leste. Foi uma tecnologia que surgiu durante o desenvolvimento de Marlim. Por isso que eu falo da escola que foi Marlim. Hoje estamos substituindo alguns poços antigos por novos poços horizontais, estamos buscando novas oportunidades de drenar áreas do campo que não foram drenadas adequadamente. Nós chamamos de poços de borda de reservatório. Portanto, continuamos com esse processo de perfuração e completação dos poços de Marlim. Tem sido um desafio crescente, apesar de estarmos produzindo desde 1991. Cada novo poço perfurado surge outros problemas, outros desafios, outros aprendizados, mas tem sido uma experiência gratificante. O TRABALHO NA PETROBRAS Se perguntar se estou satisfeito de trabalhar na Petrobras, digo que estou e muito. Se você perguntar se algum dia eu já pensei em sair da Petrobras, também já pensei, no começo da minha vida profissional, quando eu tinha três ou quatro anos de Empresa, mas hoje não me arrependo de ter ficado. Tive uma oportunidade de trabalhar em São Paulo em 1995, 1996, e quase fui. A minha esposa falou: “Não vem não que você não vai gostar. O seu negócio não é esse aqui de escritório de São Paulo, de compras, fica porque você vai se dar melhor onde está.” Eu disse: “Olha, eu vou ter que morar em Macaé, é inevitável”. “Bom, se isso for inevitável, mas se for o melhor para sua vida profissional, eu vou para Macaé. Agora não vem para São Paulo, porque você vai ficar maluco aqui. Não é isso que você gosta de fazer”. Então, tive essa oportunidade e não quis ir, felizmente não quis ir. Hoje estou completamente realizado com o que eu faço, satisfeito e feliz. Se hoje, me propuserem ir para São Paulo, vou até pensar de novo, mas acho que não vou não. CIDADE DE MACAÉ A vida em Macaé tem vantagens e desvantagens. É uma cidade pequena, entre aspas, tem lá suas desvantagens. Digo que Macaé tem as desvantagens da cidade grande e da cidade pequena. A desvantagem da cidade pequena é que você não tem muitas alternativas, por exemplo, de lazer. O lazer é a praia. Não tem teatro. Hoje felizmente já tem mais supermercados e mais lojas. Então você encontra as mesmas coisas do Rio de Janeiro. Tem ainda umas desvantagens por causa da violência. Macaé teve um foco muito grande na mídia nesses últimos anos. Então as pessoas estão achando que Macaé é uma cidade maravilhosa, de gente milionária, muito rica. Isso infelizmente acaba atraindo um público indesejável e tem gerado alguma violência. Eu sei que Macaé tem problemas de drogas muito grande, mas outras cidades também têm. O bom de Macaé é que por enquanto essa violência parece que não está onde a maioria das pessoas vive. A violência está na periferia da cidade. É como se aqui, no Rio de Janeiro, nós tivéssemos problemas de violência só na Grande Rio e não na Cidade do Rio de Janeiro. Hoje a violência já está aqui no Rio de Janeiro, em cada esquina, no Flamengo, em Botafogo. Em Macaé, aparentemente, a violência está ainda afastada, mas já está presente. Então, é uma desvantagem, a mídia centrou muito o foco em cima de Macaé. Muitas pessoas vão à Macaé para procurar emprego, achando que aquilo é uma cidade maravilhosa. Eu entrei em São Paulo em uma loja para comprar um presente para minha esposa: “De onde o senhor é”? “De Macaé”. “Ah, aquela cidade que todo mundo ganha muito dinheiro”? “Não, não é essa cidade. Não é a mesma coisa”. Mas as pessoas acham que todo mundo ganha muito dinheiro, que tem muitos estrangeiros e tudo é em dólar. Então tem esse foco e esse mito em cima de Macaé. Mas, estamos bem. LAZER Eu não tenho feito nada hoje em dia nas minhas horas de lazer. O ideal seria poder fazer alguma coisa, ter uma atividade física, um hobby. E eu não tenho mais. Eu andava muito na praia em Macaé. Hoje nem isso tenho feito, preciso retomar. Parei por parar, você vai se acomodando, vai ficando relaxado. Eu tenho que retomar essas atividades. Em Macaé, nós temos dois ou três cinemas no shopping. Minha esposa não gosta de cinema, então nós não vamos. Nós vamos a teatro quando temos a oportunidade de vir ao Rio e quando vai alguma peça em Macaé. Eventualmente Chico Anysio vai para lá passar o final de semana, Irene Ravache foi no final de semana, então aproveitamos essas oportunidades locais. A nossa grande atividade em Macaé é estar com os amigos, estar na praia, esse tipo de coisa. Ir aos restaurantes na praia, nos bares da praia e encontrar os amigos. Nesse ponto é muito bom, você encontra os seus amigos com muito mais freqüência do que numa cidade como o Rio ou São Paulo. Eu, em São Paulo, encontrava menos os meus amigos, apesar de morar na mesma cidade. Hoje, em Macaé, encontro os meus amigos com muito mais freqüência, mantenho o contato. AMIZADES Eu tenho amigos de muitos anos em Macaé. Tenho amigos não só da Petrobras, amigos de fora da Companhia. O relacionamento, a vida social em Macaé é muito boa. IMAGEM DA PETROBRAS Para terminar, quero destacar o orgulho de estar na Petrobras, o orgulho de ter feito parte dessa história de conquistas. Eu acho que uma Empresa não se faz com uma ou duas pessoas, se faz com um time de pessoas, cada um na sua atividade. Nós tivemos pessoas que trabalharam em grandes projetos, tivemos pessoas que tiveram grandes decisões e fizeram investimentos na Petrobras. Eu tive diretores que decidiram ações como: “Vamos investir na Bacia de Campos.” Convivi com grandes gerentes que tomaram decisões importantes. Além disso, tem o meu lado, porque estive a maior parte do tempo lá na frente de trabalho. E é muito bom ter feito parte dessa corrente. Estou muito satisfeito com a Empresa que trabalho, que oferece grandes oportunidades. Hoje, faço o que eu quero, o que eu gosto, e isso me dá muita realização pessoal. Eu vou trabalhar feliz da vida, volto para casa feliz, porque realmente gosto do que faço. Dizem que uma vez que o petróleo entra nas suas veias, ele não sai mais. É a pura verdade. Olhando para trás, quando vejo que pensei em sair... Hoje o petróleo está na veia, não tem jeito, não busco outras alternativas, porque é isso que eu gosto de fazer. Essa mensagem fica para os novos: essa é uma grande Empresa, tem um futuro ainda grandioso pela frente e ela precisa de sangue novo. E que as pessoas novas tenham o mesmo entusiasmo que os mais antigos tiveram, tenham a capacidade de decidir, de ir adiante, de ousar, de buscar novas tecnologias, para continuar fazendo da Petrobras uma grande empresa. As pessoas novas estão vindo com uma formação diferente de nós, de quando entramos na Petrobras, quando a grande maioria era de recém-formados. Hoje nós temos mestres e doutores entrando na Petrobras, além de engenheiros novos. Que essas pessoas fiquem e permaneçam, porque vale a pena E quanto às eventuais dificuldades em nível pessoal, como: “não gosto de trabalhar aqui, gostaria de ir para lá”, tenha calma que isso se resolve. Digo por experiência própria, isso resolve. Pode não ser na hora, mas acaba resolvendo. Então, não se desesperem por não estar trabalhando naquilo, naquele local, naquela cidade que gostariam, porque com o tempo tudo se resolve. PROJETOS FUTUROS Eu não tenho grandes projetos de vida. O meu projeto de vida talvez seja seguir o exemplo do meu pai que, com 71 anos, estava trabalhando. O trabalho, para mim, é uma grande realização. Então, eu espero poder ainda trabalhar. Obviamente, não tenho idade para parar, mas também não penso em dizer que vou chegar à idade e vou me aposentar. Quero continuar trabalhando, eu acho que tenho muito a contribuir. Quero chegar a um dia como as pessoas que você entrevistou, como o Iwao, por exemplo, que tem 35 anos de trabalho, com uma disposição para trabalhar e para ensinar as pessoas. Esse é um grande projeto. DESAFIOS FUTUROS Eu acho que, em termos de desafios de Empresa, já conquistamos muito. Eu não vejo nenhuma coisa mais grandiosa do que nós estamos fazendo. Nada do outro mundo, nenhuma coisa fantástica. Eu gostaria de poder ver a Petrobras atuando no mundo como uma grande operadora, uma operadora internacional, como uma Shell, por exemplo, que atua no mundo todo. Hoje a Petrobras tem um foco na América Latina, no oeste da África e no Golfo do México. Eu quero ver a Petrobras produzindo nesses países. Quero ainda ver a Petrobras trabalhando na Austrália, crescendo mundialmente. Eu acho que a quebra do monopólio foi um fator decisivo para a Empresa. Se a Petrobras focasse só no Brasil, ela estaria fadada a fechar. Ela tem que se tornar uma empresa internacional, com um enfoque estratégico. Hoje, o foco está na América do Sul, América Latina, oeste da África e Golfo do México. Vamos continuar por aí, e vamos expandir no futuro, para a Petrobras atuar no mundo todo. Vai ser um orgulho muito grande. PROJETO MEMÓRIA PETROBRAS Foi ótimo Eu agradeço a oportunidade e espero ter contribuído um pouquinho com esse projeto.
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