P/1 – Então, nós começamos sempre com o nome completo, o local e a data de nascimento. R – Paulo Marcelino de Seixas, moro em Barra Mansa, Estado do Rio de Janeiro, e nasci no dia primeiro de agosto de 1926. P/1 – Qual era o nome dos seus pais? R – Sebastião Rodrigues de Seixas e Maria Madalena de Seixas. P/1 – E onde eles nasceram? R – Como? P/1 – Onde eles nasceram? R – Bom Jardim de Minas. P/1 – Qual era a atividade dos seus pais? R – Mestre de linha da Rede Ferroviária Federal, hoje é outro nome, né? Até esqueci no momento. Antigamente, era Rede Mineira de Viação. Ele foi Mestre de linha durante 34 anos lá na Rede. E morreu ainda em trabalho, não é, não chegou a aposentar. P/1 – E a sua mãe? R – A minha mãe era doméstica. Porque nasceram lá em casa 11, não é, 11 filhos. Dois morreram ainda pequenos, né, e ficaram nove, que ainda duraram até pouco tempo. Agora que nós só temos quatro. Cinco já foram, né... Então não tinha tempo, ela tinha que tomar conta da casa. P/1 – Onde o senhor morava na infância? R – Onde eu morava? P/1 – Isso. R – Eu morei; eu nasci entre Bom Jardim e Arantina. Porque não era bem Bom Jardim, era na roça. Nasci na roça! Fui pra Arantina com cinco anos de idade. Lá eu fiquei até os 20. Vinte anos, eu vim pra Barra Mansa e trabalhei do dia 21 de janeiro na Companhia Metalúrgica Barbará, um dia apenas. Não agüentei o serviço. Depois fui pra Siderúrgica Barra Mansa, dia 27 de janeiro de 47, e fiquei até agora 95. P/1 – Conta um pouquinho, voltando um pouco. Como era o cotidiano da tua casa na infância? R – Lá em Minas, não? P/1 – Lá em Minas. R – Em Minas eu, eu, eu trabalhava sempre; Lá em Minas tem um ditado até hoje eles usam lá na roça: A seco e molhado. “Cê” sabe o que “que” é a seco e molhado? P/1 – Não. R –...
Continuar leituraP/1 – Então, nós começamos sempre com o nome completo, o local e a data de nascimento. R – Paulo Marcelino de Seixas, moro em Barra Mansa, Estado do Rio de Janeiro, e nasci no dia primeiro de agosto de 1926. P/1 – Qual era o nome dos seus pais? R – Sebastião Rodrigues de Seixas e Maria Madalena de Seixas. P/1 – E onde eles nasceram? R – Como? P/1 – Onde eles nasceram? R – Bom Jardim de Minas. P/1 – Qual era a atividade dos seus pais? R – Mestre de linha da Rede Ferroviária Federal, hoje é outro nome, né? Até esqueci no momento. Antigamente, era Rede Mineira de Viação. Ele foi Mestre de linha durante 34 anos lá na Rede. E morreu ainda em trabalho, não é, não chegou a aposentar. P/1 – E a sua mãe? R – A minha mãe era doméstica. Porque nasceram lá em casa 11, não é, 11 filhos. Dois morreram ainda pequenos, né, e ficaram nove, que ainda duraram até pouco tempo. Agora que nós só temos quatro. Cinco já foram, né... Então não tinha tempo, ela tinha que tomar conta da casa. P/1 – Onde o senhor morava na infância? R – Onde eu morava? P/1 – Isso. R – Eu morei; eu nasci entre Bom Jardim e Arantina. Porque não era bem Bom Jardim, era na roça. Nasci na roça! Fui pra Arantina com cinco anos de idade. Lá eu fiquei até os 20. Vinte anos, eu vim pra Barra Mansa e trabalhei do dia 21 de janeiro na Companhia Metalúrgica Barbará, um dia apenas. Não agüentei o serviço. Depois fui pra Siderúrgica Barra Mansa, dia 27 de janeiro de 47, e fiquei até agora 95. P/1 – Conta um pouquinho, voltando um pouco. Como era o cotidiano da tua casa na infância? R – Lá em Minas, não? P/1 – Lá em Minas. R – Em Minas eu, eu, eu trabalhava sempre; Lá em Minas tem um ditado até hoje eles usam lá na roça: A seco e molhado. “Cê” sabe o que “que” é a seco e molhado? P/1 – Não. R – A seco é quando você come na sua casa. A molhado é quando você come na casa do patrão. E eu sempre trabalhei lá na padaria, trabalhei na cerâmica, trabalhei num hotel, lá em São Vicente de Minas. E sempre comia na casa do patrão. Então, eu não, não tinha assim; não pagava pensão, mas também não comia na minha casa. Que meu pai morava em outro lugar, né... Então eu, eu trabalhava comia no, no, no serviço. Esse foi o início, né. Depois eu, quando eu vim pra Barra Mansa, aí comecei a pagar pensão, né; aí comecei a me acostumar a viver em pensão, não é? As pensões lá era tudo garantido pela companhia. Quer dizer, tinha uma meia dúzia de pensões lá que ia os empregado, pegava valezinho pra poder comer na, na, nas pensões, né... E a gente comia numa dessas pensões. Até tem uma coisinha engraçada uma certa época acontece: um funcionário nosso que hoje mora em Volta Redonda, ele foi jogador de futebol. Foi um dos bons jogadores que o Esporte Clube Siderantim teve. Ele trabalhava na folha de pagamento e controlava os vales dessas pensões. E tem uma dona lá, dona Maria na época, né, ela tinha quase 70 anos. E ele comia lá na pensão dela que era pertinho lá da portaria. E veio um colega dele lá de Volta Redonda e ele levou pra almoçar lá. Chegou, de longe ele gritou: “O, dona Maria trouxe um amigo aqui pra comer a sua gororoba hoje.” Ela falou: “O quê?” Falou: “Comer a sua gororoba!!” Ela falou: “Sai daqui, porque eu não vou dar! O meu aqui não é gororoba, não! Aqui é almoço de primeira qualidade!!”. E brigou com ele, e não deixou o cara almoçar e nem ele. E no entanto ele pagava pensão lá e ele que controlava os “vale”. Quer dizer, praticamente ela devia obrigação pra ele. Na época ele poderia até se quisesse, que não era o caso, na época lá não tinha esse negócio, mas se ele quisesse podia prejudicá-la, né, por causa disso. Mas ela, ela não deixou ninguém almoçar (risos). Ela não concordou com a gororoba (risos). P/1 – Conta um pouco como era a cidade, o bairro. R – A cidade era uma cidade tranqüila, não é? E eu, por exemplo, me lembro que, eu vou citar assim, porque vocês não conhecem: Eu namorei uma menina, logo no início, num bairro chamado Boa Sorte. Para Boa Sorte a gente ia pela linha, passava dentro da cidade e ia até Saudade de pé. Então eles brincavam lá que a gente ia contando dormente pela linha. Então chegava em casa, naquele tempo ônibus pra Saudade, que é o bairro que eu morava que é onde é a siderúrgica, naquele tempo o ônibus só tinha até dez horas da noite. Não, e eu não ia pra casa dez horas da noite. Então ficava namorando até mais tarde, depois eu ia de pé do bairro Boa Sorte, que hoje deve demorar seguramente, uma hora de pé, hoje. Então naquele tempo demorava talvez mais ainda. E meia noite, uma hora, duas horas da madrugada eu ia de pé. Eu ia de pé até Saudade. Nunca aconteceu nada comigo, graças a Deus. Hoje a gente não pode fazer isso, não é? É como dizia Doutor Antônio, ele sempre comentava; Antônio Ermírio ele vinha naquele trem da madrugada que chamava Trem Baiano. Então ele chegava em Barra Mansa de trem às quatro da manhã. E ele ia de pé pra Saudade. Então ele sempre falava nos nossos “jantar” de confraternização de fim de ano lá, que a gente sempre fazia, né. E eu era um dos comandantes, ou seja, o principal comandante dessa programação toda, né? Então ele sempre dizia pra gente: “Pois é, eu sempre vim no Trem Baiano, quatro horas da madrugada e hoje quem sou eu pra fazer isso? Eu gostaria, mas não posso e nem devo!” E realmente não pode. Então naquele tempo a cidade era uma cidade tranqüila. Saudade então era uma maravilha! Um bairro muito bom. Não cresceu tanto como os demais bairros da cidade. Mas é um bairro bom, principalmente por causa da siderúrgica. Que a siderúrgica que comanda tudo aquilo ali. Sempre comandou, entendeu? Mas sempre foi uma, uma, uma, um bairro tranqüilo e a cidade também P/1 – Certo. O senhor foi casado por muitos anos, né? R – Quase 48 anos. P/1 – Qual é o nome da tua esposa? R – Teonila Cipriano Seixas, ela é lá de Castelo, no Espírito Santo. Então de vez em quando a pessoa perguntava: “Por que você é lá de Bom Jardim e ela é lá de Castelo e vocês conseguiram se casar?” Porque a família dela, que tinha um irmão, tinha uma loja em Volta Redonda que era muito conhecida, como Casa Popular de Vladimir e Valdemar. Vladimir era o irmão dela. Então eles mudaram pra Barra Mansa. Aí começou o namoro e não teve outro jeito: saiu o casamento (risos). P/2 – O senhor tem filhos, né? R – Tenho dois: Paulo Henrique e Luis Eduardo. P/2 – Qual a atividade deles? R – O Paulo Henrique trabalha, mais ou menos há 29, 28, 29 anos na Siderúrgica Barra Mansa. Hoje ele é Técnico de Segurança do Trabalho, que está hoje me acompanhando aqui. E o Luis Eduardo trabalhou bastante tempo na siderúrgica, depois saiu da siderúrgica a pedido e entrou numa empreiteira lá dentro da siderúrgica mesmo, está até hoje, há oito ou nove anos. Trabalha no almoxarifado lá dessa empresa que presta serviço pra… pra Siderúrgica Barra Mansa. – Eu não sei – se hoje eu posso falar Siderúrgica Barra Mansa, porque hoje é Votorantim metade, né? Naquele tempo a gente chamava Siderúrgica Barra Mansa e Usina de Saudade que era conhecido. Hoje é Votorantim metade, né, mas se eu falar siderúrgica é a mesma coisa, né? Não tem problema, né… Acredito eu… (risos). P/1 – Com certeza! Quando o senhor se mudou pra Barra Mansa? R – Olha, eu vim pra Barra Mansa porque naquele tempo, eu me recordo, os meus 18, 19 anos, eu arranjei a minha primeira namorada. E assim, a minha mãe me chamou com três ou quatro dias de namoro, ela me chamou e disse que não era, que a moça não era pra mim, não sei o quê, pá-pá-pá. E eu desisti. Mas eu notei já naquela ocasião que se eu gostasse da moça… E ela é viva até hoje, né, ainda há um mês e meio, dois meses atrás ela ligou pra mim. Ela mora lá em Minas, né, ligou pra mim. Mas tudo bem. Então eu notei naquela ocasião que se porventura eu gostasse dessa ou de outra moça qualquer pra mim casar ia ser difícil. Porque a gente trabalhava no comércio. E o comércio pagava muito pouco. E principalmente, abria a gaveta, tirava o dinheiro e dava o salário pra gente. Isso não, não é vida, não é? E eu já estava com meus 18, 19 anos. Então eu tinha que procurar um lugar mais, é, firme, mais adequado com, com a minha vivência, né? Pra eu poder chegar a um ponto que eu cheguei hoje. Graças a Deus, né! Então eu me vi na situação de ir embora. Falei com meus pais que eu iria pra Barra Mansa. Encontrei um grande amigo, que já morreu também, que trabalhava na Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), e ele falou comigo: “Eu te levo pra lá, você vai trabalhar comigo lá.” E meus pais não queria de jeito nenhum! E eu saí praticamente fugido. A verdade é essa! Eu saí, passei no trenzinho mineiro que eles falam lá, fiz um bilhetinho e joguei lá pra ele, né?. “Estou indo pra Barra Mansa, tentar a minha vida.” E assim eu fiz. P/1 – Em que ano foi? R – 1947. Eu vim pra Barra Mansa, dia 20 de janeiro de 1947. E lá é aniversário, como é no Rio de Janeiro, né, dia de São Sebastião. Então eu não sabia, cheguei naquela festa, 20 de janeiro. E 21 de janeiro eu entrei na Barbará. Porque naquele tempo também não tinha essa exigência que tem hoje, que é natural, precisa ser assim. Mas naquele tempo a gente chegava e: “Oh, pode entrar pra trabalhar, depois eu faço sua ficha.” E assim como Doutor Francisco; Eu fiz a ficha do Doutor Francisco, praticamente três, quatro dias depois que ele estava dentro da empresa, o que é muito arriscado. Hoje não se pode fazer isso, nem o ministério permite. Mas então, no dia seguinte eu fui por volta de seis e meia esperar uma pessoa que era meu conterrâneo lá na Barbará. E ele falou: “Vamo embora, vamo entrar aí?” E eu entrei e já comecei a trabalhar. Só que eu dei um duro danado, me deram um serviço muito pesado. E eu não agüentei, e larguei, fui embora pra siderúrgica e aconteceu a mesma coisa. Quando eu cheguei lá encontrei outro conterrâneo, ele falou: “Pode entrar.” “Vem trabalhar.” E eu comecei a trabalhar e fiquei lá 48 anos, quase isso, né? Graças a Deus. P/1 – Vamos voltar um pouco, falar da tua formação educacional. Como e quando o senhor iniciou os seus estudos? R – Eu iniciei meus estudos logo que eu cheguei em Arantina, com meus cinco anos, né? Que eu vim da roça, entre Bom Jardim e Arantina e nós mudamos pra lá; meu pai, por questão do trabalho dele, que era na rede, ele mudou-se pra Arantina. E eu já nos meus cinco anos eu comecei a estudar, entendeu? E lá só tinha dois professores, ou seja, um professor e uma professora. E eu estudei com um professor que era uma pessoa deficiente, entendeu. Mas muito bom, muito bravo, tinha naquela época era as vara de marmelo, não sei, se vocês conhece. Aquilo quando faz assim... ela até assoviava. E ele... eu nunca apanhei, mas ele bateu em muita gente. Naquele tempo não tinha o que tem, hoje não pode bater, né? Mas naquele tempo... E eu, graças a Deus, meu, meu, meus pais ensinou a gente uma coisa que a gente tem até hoje: como pra gente não dizer vergonha a gente fala assim: calor. Eu tenho calor na cara, meus irmãos todos eles, só tem um que é um pouquinho diferente, meio mentiroso, né? Padrinho dele (risos). Meio mentiroso, mas é gente direita também, leva o negócio muito a sério. Então a gente acostumou com esse tipo de vivência dos meus pais. P/2 – Conta um pouco de como era a escola? R – A escola era naquele tempo muito difícil, né? É uma escolinha difícil pra comprar material, aquela coisa toda. Que a gente não tinha dinheiro, não é? Mas eu sempre fui assim uma espécie de um líder dentro da sala. Porque o professor saía e me deixava tomando conta dos alunos. Não tinha a liderança que tem hoje talvez. Mas eu tomava conta. E tomava conta direitinho! Que eu, já naquele tempo, com meus seis, sete, oito anos talvez, sei lá. Eu já era meio bravo, né? Se fizesse as coisa errado eu entuchava, né? Igual os meus filhos até hoje, até hoje eu falo com eles, né? Quando eu acho uma coisa errado eu falo. Então na escola era naquele tempo a mesma coisa, a gente levava o negócio muito a sério. E muitos colegas meus apanharam naquela, com aquela vara de marmelo, ou com a régua. Aí vai. Eu nunca apanhei desse professor. Nunca. Mesmo porque ele tinha uma certa confiança em mim, tanto que ele saía e deixava a sala por minha conta. E eu tomava conta “direitinho”, não deixava cair a peteca, não! (RISOS) P/2 – O senhor lembra de alguma história marcante dessa época? R – Dessa época, sinceramente – eu não estou – me recordando, viu? Não estou me recordando. Porque a coisa era mais ou menos normal. Eu morava perto da escola também. Às vezes saía, ia lá em casa tomar água e voltava. Quer dizer, não tem uma coisa assim específica não, não tem. P/2 – Durante o seu período de estudos o senhor tinha uma expectativa de uma carreira? R – Sim. P/2 – Como foi isso? Essa experiência? R – Bom, eu sempre pensei em ser alguém na vida. Infelizmente, o estudo não me ajudou. Porque como eu disse, naquela época a cidade era muito pequenininha e só tinha dois professores. E não tinha segundo grau. Não tinha... Então eu estudei até o quinto ano primário, que hoje parece que é o primeiro ginasial, não é isso? Parece, não sei. Então estudei até o quinto ano primário. E não consegui estudar mais. Porque naquele tempo as pessoas que tinham mais condições ia pra Andrelândia, que era a primeira cidade depois da minha ali e tinha colégio interno, como tem até hoje. Então aquelas pessoas que tinha mais condições ia pra Andrelândia e ficava lá interno. E a gente não tinha condições de fazer isso. Então eu cheguei no ponto máximo e parei. Parei porque não dava mais. Eu não tinha condição, não é? Mas a gente; como dizia meu pai: “O que a gente não aprende em casa, aprende na rua.” Às vezes bom e às vezes o ruim. E eu graças a Deus, eu tenho que eu aprendi o lado bom. Então eu... Tanto que eu entrei na siderúrgica e durante esse tempo... Já dei a minha ficha aí, né? Vocês já notaram, né? Eu tive a oportunidade de ser chefe de alguns departamentos que hoje nem de longe a gente pode pensar nisso, né? Porque hoje tem que ter o canudinho debaixo do braço, se não tiver não entra. E eu entrei e chefiei com certeza. Porque quando eu saí do departamento pessoal, a meu pedido, porque a empresa foi crescendo. Quando eu entrei tinha 300 empregados. Depois nós chegamos a três mil. Hoje deve estar lá com cerca de mil e quinhentos, mais ou menos, não sei. Mas é na, na... naquela ocasião a gente, a gente já, já levava o negócio bastante a sério. E como eu tava no departamento pessoal, tinha audiência quase todos os dias, ou até o dia inteiro. Então a gente ia, saía de uma audiência, entrava na outra, saía de uma, entrava... E eu cheguei num ponto que, eu mesmo notei, que com a situação que eu tinha, eu não teria mais condições dentro de certo tempo pra poder comandar o Departamento Pessoal. Aí pedi o Diretor que saiu, ele não me deixou. Inclusive começou com o Doutor Figueirôa. E eu pedi ao Doutor Figueirôa que saiu de lá em 1955, que ele foi transferido lá pra Companhia Brasileira de Alumínio (CBA) em São Paulo. Eu pedi pra ele: “Coloca outro, que tenha maior condição.” Ele falou: “Não, tô bem! Tô satisfeito com você.” E eu fui ficando. Depois pedi ao Doutor Francisco. Aí um belo dia ele me chamou e disse: “Paulo, você pediu e eu vou te atender: eu tenho uma vaga na seção de Transportes.” Aí ele começou dizer: “Lá já trabalhou fulano, fulano, fulano, fulano. E inclusive um engenheiro que o Doutor Figueirôa trouxe lá de Ouro Preto pra trabalhar no transporte. E que foi mandado embora também.” Então eu falei com ele: “Doutor Francisco, agora eu fico muito preocupado, porque o transporte o senhor disse que é o único...” E ele falou pra mim que um dos únicos departamentos que ainda não funcionava a contento era o transporte, o resto tava tudo bem. Eu peguei e falei: “Pois é, e amanhã não dá certo o senhor me manda embora e como é que eu fico?” Ele falou: “Não senhor, o senhor vai pra lá experimentar, se não der certo o senhor volta que eu dou o lugar pro senhor aqui no escritório outra vez.” Aí eu fui com a corda toda. E com três ou quatro meses de trabalho, me lembro muito bem. O transporte até hoje lá tem uma praça muito grande. Porque é onde estacionavam os caminhões. E ele foi lá junto com o Doutor Antônio, o Doutor Antônio pegou na minha mão e falou: “Paulo Seixas, é desse jeito que a siderúrgica precisa!” O Doutor Reis, é chamado de Doutor Reis, deve chamar até hoje. “O Doutor reis vai te dar toda a cobertura e continue do jeito que você está.” E eu fiquei 32 anos lá. Só saí agora, na terceirização, o meu departamento foi praticamente o terceiro departamento a ser terceirizado. Então aí tinha que sair, dar o lugar pro outro. Mesmo porque, já estava na hora de descansar um pouco. P/2 – Vamos voltar um pouquinho, eu queria saber, o senhor começou a trabalhar muito cedo, né? R – Aos 12 anos. Doze anos comecei a trabalhar. P/2 – Aos 12 anos começou a trabalhar no... R – Na cerâmica. Numa cerâmica. É. Fazendo tijolo. P/2 – Conta um pouquinho como era. R – Fazendo telha e uma porção de coisa. Sim? P/2 – Conta um pouquinho como era esse trabalho. R – A cerâmica pra mim era difícil porque eu sempre fui meio raquítico, né? Então a gente ia lá, pega no pesado daqui, dali, tocar carrinho de, de telha e de tijolo e botar massa de tijolo e não sei o quê. Então, quer dizer, então era meio pesado pra mim. Mas logo eu dei muita sorte, porque logo logo me deram um trabalho. O diretor lá da época e depois veio aqui pra Austin, aqui perto do Rio de Janeiro, parece-me que ele morreu agora há pouco tempo em Austin. Então ele gostava muito da minha família. Meu pai que era o nome da família, todo mundo gostava muito dele. Então ele dizia assim: “Por causa do seu pai eu vou botar num serviço bom.” Então, talvez vocês nem conheça mas a telha francesa ela, ela, quando faz a telha ela sai redonda, a cabeça dela. Então tem que bater aquilo pra poder casar. Porque se for ela, ela, ela fica assim redonda, se põe aqui ela vaza água. No casamento daquela telha, vaza água. Então a gente ia com uma tabuinha, né, uma tabuinha, um caixotinho de pó, e molhava o pó e batia. Batia a telha. Então ele me botou: batedor de telha. Então fiquei muitos anos na, na, na cerâmica. Três ou quatro anos, não sei, saí e depois voltei. Porque eu fui pra uma empresa lá em São Vicente de Minas, onde eu fui trabalhar como, como no hotel como garçom, no hotel lá em São Vicente. E depois eu voltei por causa dos familiares que ficaram em Arantina. Aí o chefe da cerâmica me chamou: “Não, você tá morando longe porque? Seus pais estão aqui. Volta aqui!” Aí eu voltei. Então eu trabalhei duas vezes na cerâmica lá de Arantina. E o serviço era bem pesado no início. Depois bater telha era muito mais fácil. P/2 – O senhor lembra do primeiro dia de trabalho? R – Primeiro dia de trabalho? P/2 – Na cerâmica. R – Lembro-me. Lembro-me. P/2 – Conta essa história. R – Eu cheguei assim com aquele entusiasmo de ter o meu dinheirinho. Porque meu pai era ferroviário, ganhava pouco naquela ocasião, né? Depois é que ele melhorou, que ele passou a Mestre de linha e a coisa melhorou. Mas no início ele era um trabalhador braçal que eles falavam, né? Então diz o meu irmão que era, era, era, até me esqueci agora, até me esqueci agora o que ele ia falar, né… Mas meu, meu pai ganhava pouco. Então com 11 filhos naquela ocasião era muito difícil. Então minha mãe tinha o cuidado de partir os pedacinhos de pão pra botar na mesa pra gente tomar o café. Então eu tinha aquela fé tremenda que um dia eu ia ter o meu dinheirinho. Então quando eu comecei a trabalhar na cerâmica, que eu recebi o meu primeiro pagamento foi assim uma coisa de muito entusiasmo. Então no primeiro dia eu já entrei com força total. Querendo trabalhar. Viesse o que viesse eu ia topar tudo e topei. E fiquei lá bastante tempo, graças a Deus. E lá que eu aprendi muita coisa porque esse diretor que era muito amigo do meu pai ele não deixava a gente sozinho, não. De vez em quando ele tava: “Oh, se você andar errado eu conto pro seu pai! Eu conto pro seu pai.” Então a gente levava o negócio a sério, né? E hoje, por exemplo, eu tenho um orgulho muito grande de ter começado aos 12 anos. Porque ainda há poucos dias, ou meses, não sei, eu estava lá na siderúrgica; Eu vou muito lá, eles me convidam eu vou, tô sempre lá. Então eu estava aí tinha um cidadão do lado que eu não conhecia, pedindo pra, pra recepcionista lá pedir um táxi, que ele vinha pra cidade pra viajar pra São Paulo. Aí eu falei com ele: “O senhor vai pra Barra Mansa?” ele disse: “Vou.” “Se o senhor quiser, se confiar, eu tô de carro aqui, eu levo o senhor.” “Ah não, eu aceito sim.” E na viagem de Saudade à Barra Mansa ele me contou que ele começou a trabalhar aos 12 anos fazendo carvão no mato com o pai dele. E hoje ele é chefe do setor agrícola da Votorantim. Que toma conta lá de Capão Bonito, Passa Quatro, Lídice, Bananal e etc. Quer dizer, então hoje, por exemplo, às vezes, tem gente que ainda fala: “Serviço pesado!” “Serviço braçal é isso, é aquilo.” Não! A gente começar cedo é muito bom. Porque a gente aprende uma porção de coisa, viu? Igual esse cidadão, que hoje é “chefão” lá, porque não? E começou a trabalhar no carvão, tirando carvão lá com o pai dele, não é? P/1 – O senhor disse que tinha uma boa relação com seu chefe. E os colegas de trabalho? R – Olha, eu, eu até hoje de tanto… Porque esse, esse era o princípio, sempre foi o princípio do Doutor Antônio. E principalmente com os diretores que eu trabalhei, que foi o Doutor Figueroa, principalmente o Doutor Francisco que eu fechei há... em 95 lá com ele, né? Então o pensamento deles é sempre tá perto da pessoa, dando assistência, ajudando, convidando a pessoa pra melhorar e aí... Então eu tive assim, parece que eu me enquadrei com eles. Então hoje, por exemplo, quando eu saí da siderúrgica nós tínhamos 66 motoristas. Porque o total de gente, de pessoas na minha seção eram 92. Então nós tínhamos 66 motoristas. Hoje tá todo mundo empregado nas empresas de Barra Mansa, nas diversas empresas que tem lá. Eles quase que bate com o ônibus quando me vê. E eu de vez em quando entro, tenho minha carteirinha, né? Como diz um rapaz lá em Guarapari: minha “carteirada”. Eu mostro a “carteirada”, entro no ônibus e vou passear com eles. Ando pra tudo quanto é lado com eles. Então, eu acho que, graças a Deus, eu me dou bem com eles. Ainda domingo, eu almocei com um deles, com um deles que nós fomos lá num sítio, que é dum cidadão em Barra Mansa muito conhecido, foi candidato a prefeito. E vai ser candidato outra vez, com certeza, que chama-se Guto Nader. Então nós fomos lá no sítio, que as crianças foram jogar lá, e eu fui junto. E lá deu aquele almoço, que eu não sabia, era aniversário dele. Então eu tive com um desses “colega” de trabalho que almoçou comigo. Lá sentado na minha mesa. Então eles ficam assim, numa alegria tremenda, e eu fico muito mais! Porque a gente vê que a gente fez alguma coisa que valeu a pena, né? Certo? P/1 – Qual foi o dia mesmo que o senhor entrou na Votorantim? R – Vinte e sete de janeiro de 1947. P/1 – O senhor já conhecia a Votorantim nessa época? R – Não! Não, eu nunca tinha vindo em Barra Mansa. Quando eu vim de lá Minas pra cá, nem Barra Mansa eu conhecia. Eu vim pela primeira vez, entendeu? P/1 – E nunca tinha ouvido falar do grupo Votorantim também? R – Também não. Também não. Fiquei sabendo em Barra Mansa. Porque na época, quando eu cheguei em Barra Mansa tinha um conterrâneo meu lá na Barbará e que era de lá também. Aí ele me levou pra Barbará. Só que não deu certo, porque eu trabalhei um dia só, o serviço muito pesado não agüentei. Tinha um outro conterrâneo que também estava na Siderúrgica Barra Mansa, que ele foi da Barbará pra lá. Aí eu procurei ele, porque todo mundo: “Ah, procura o João Alves!”; “O João Alves lá na Siderúrgica Barra Mansa.” E eu fui, procurei, me dei bem e lá eu fiquei durante esses 48 anos quase, graças a Deus. P/1 – Qual foi a primeira impressão que o senhor teve ao entrar na Votorantim? R – Olha... P/1 – Sobre a Votorantim... R – A impressão que eu tive foi a mesma quando eu comecei aos meus 12 anos. Porque eu sempre levei o negócio muito a sério, né? Sempre gostei do trabalho, queria trabalhar, queria vencer na vida. Então o meu primeiro dia foi uma coisa, como é… um pouco preocupante. Porque quando eu cheguei e eu entrei no Almoxarifado, no balcão entregando peças, não é? Lá como ajudante. E o rapaz que me ensinou inclusive a trabalhar lá no balcão, embora já tenha trabalhado pouco tempo, ele tinha uma cara muito feia. Parecendo ser um cara bravo! Então a gente que é novato fica meio preocupado, não é? Então eu entrei preocupado, mas com muita vontade de vencer. E depois, com poucos dias que eu estava no balcão, a gente já fazia uma coisa que era errado. Como é errado até hoje! Ele ia descansar e eu ficava no balcão. Qualquer coisa eu chamava ele, porque ele que era o mais antigo, ele que sabia, né? Eu, por exemplo, a pessoa chegava: “Eu queria um parafuso de cinco oitavos por quatro.” Eu sei lá o que quê é isso? Aí eu tinha que chamar e perguntar: “Onde que é isso?” “Ali naquela prateleira.” Eu pegava. Então eu ficava no balcão e ele ficava descansando. Dormindo, a verdade é essa! Depois ele vinha e eu ia descansar. Descansar nada porque eu não tava cansado. Mas é a mania. A mania de dormir no serviço, entendeu? Então a gente fazia isso naquela ocasião. E certa época, eu estava deitado atrás do, da, da prateleira e o diretor; é o gerente não é o diretor, o gerente; Tinha um gerente lá que a gente conhecia por Doutor North. Doutor Adolpho North e ele entrou lá no almoxarifado e me viu deitado lá. E ele me chamou: “E, e, ei, vamo trabalhar?!!” Falou: “Vamo, vamo!!” Levantei. Quer dizer, não fez nada comigo, não é? Poderia até ter me mandado embora. Mas não mandou. Então naquela época a siderúrgica; E eu tenho um orgulho muito grande; o Doutor Francisco normalmente, quando se fala na siderúrgica, ele chega a sair lágrima do olho. Eu, às vezes, acontece comigo. Sonhar, aí eu sonho todo dia com a siderúrgica. Toda noite aliás. Toda noite eu sonho com a siderúrgica. Cada ora eu estou fazendo uma coisa lá dentro. Brigando ou falando, recebendo ordem, e não sei o quê. Isso é coisa que acontece sempre com a gente. E, justamente, uma das coisas é exatamente isso, porque o próprio gerente me viu dormir e não me mandou embora. E muitos outros perderam o emprego e eu não perdi. E mais, eu, eu entrei no almoxarifado, menos de seis meses eu já assumi o comando do almoxarifado porque o nosso diretor foi mandado embora; foi transferido, nosso chefe aliás, foi transferido pra, pra fazenda Passa Quatro; que daqui a pouquinho eu vou falar sobre Passa Quatro, que é o Doutor Antônio que entra na jogada. Então ele foi pra Passa Quatro e eu tomei conta do almoxarifado, sem conhecer quase nada. Mas assumi e venci. Fiquei lá uns quatro ou cinco meses comandando o almoxarifado. Então eu sempre tive, e com esse, com esses poucos meses que eu tive no almoxarifado um dos nossos diretores viajou de férias pra Bahia e deixou escrito: “Transferir o senhor Paulo Seixas para a Folha de Pagamento.” E o meu chefe não queria, que é o que voltou de Passa Quatro. Ele não queria que eu saísse de lá. Então foi uma briga, uma briga tremenda. E o chefe do Departamento Pessoal falou: “Oh, tá aqui, você cumpre se você quiser. Se você não quiser...” “Só que ele chegando eu vou mostrar pra ele que você não quis aceitar.” Aí ele concordou e eu fui pra Folha de Pagamento. Mas... P/2 – Foi em que ano que o senhor foi pra Folha de Pagamento? R – Isso foi em 1949. Um ano e pouquinho depois que eu fui pra Folha de Pagamento, né? E eu falava sobre o chefe que foi transferido pra Passa Quatro. Foi engraçado que lá na fazenda de Passa Quatro que meu irmão, o mais velho, foi, foi administrador lá durante 14 anos, lá em Passa Quatro. Ela tem 14 quilômetros além de Passa Quatro, sobe uma serra enorme. E naquela época tinha um administrador lá que chamava Edgar Campinhos. E esse Edgar Campinhos fez lá uma sujeira na fazenda eu não me lembro o que quê é, mas eu sei que não deu certo. E o Doutor Antônio telefonou pra siderúrgica pra ir alguém lá e demitir o cara. Só que ele ficou sabendo e disse: “Quem entrar aqui na fazenda eu mato!” Aí todo mundo ficou com medo. Todo mundo ficou; aí ninguém ia lá demitir o homem. Aí avisaram o Doutor Antônio. Custaram pra avisar. E ele cobrando: “Põe o homem pra fora, põe o homem pra fora!!!” Mas ninguém ia. Aí um belo dia avisaram pra ele: “Doutor, o negócio é o seguinte: o homem disse que mata e ninguém vai lá.” Aí ele chamou: “Vocês são uns...” Né? “Pode deixar que eu vou lá demitir o homem.” E aí nós ficamos preocupados, todo mundo lá na siderúrgica rezando: “Aí se o Doutor Antônio entra lá ele mata o Doutor Antônio.” E não sei o quê e tal. E ele foi lá, demitiu o homem e telefonou lá pra siderúrgica: “Ponha outro no lugar aqui.” “O homem já está demitido.” Então, quer dizer, ele é de uma coragem tremenda, né? Porque ninguém teve coragem e ele foi lá sozinho e demitiu o homem (risos). P/2 – Continua relatando sobre as funções. Aí depois o senhor vai... R – Sobre as funções: eu fui pra Folha de Pagamento. Chegando na Folha de Pagamento tinha três funcionários e o supervisor. Eu entrei como quarto funcionário. Só que eu entre e eu não sabia, naquela ocasião, quando eu entrei já era pra demitir um deles. Eu ia substituí-lo e eu não sabia. E comecei a trabalhar. A primeira, na primeira folha de pagamento que a gente fazia, que naquele tempo era tudo à mão, usava aquele lápis de cópia duro que hoje não existe mais. A gente tinha calo no dedo de tanto fazer lá a folha na mão, né? Então quando eu notei uma coisa e falei: “Nossa senhora, tem um gato e grande aqui.” E comuniquei o meu colega, falei: “O meu amigo, olha aqui.” “Chiu, fica quieto rapaz, fica quieto!” Então que quê eles faziam naquela ocasião: você trabalhava 240 horas, que era o normal naquela ocasião. 240. E eu botava mais 200 horas na folha de pagamento sua e você me dava 100 em dinheiro, e ele ficava com 100. E eu descobri isso. Aí o cara que era o meu colega falou: “Fica quieto, fica quieto.” E eu acabei ficando. Depois dois ou três dias depois uma das pessoas da Laminação, naquela ocasião, que depois eu fiquei sabendo que era meu conterrâneo, era lá de Bom Jardim, mas eu não conhecia ele na época. Então ele me cercou na rua e falou: “Oh, cê tá se metendo naquele negócio lá?? Oh, fecha sua boca, hein? Fecha sua boca, senão amanhã você vai amanhecer comendo formiga aí!”; aí eu falei: “Meu Deus do céu.” Eu que era o novato ali, um ano e pouquinho, já com uma ameaça dessa, né? Eu fiquei com bastante medo. Mas Deus ajuda muito a gente e ajudou a empresa também, sem, sem a menor dúvida. Na época eles, o diretor pediu pra trazer todas as fichas, que naquela época devia ser de 120 a 130. A Laminação sempre foi um dos maiores departamentos que teve lá na siderúrgica. “Traz as fichas todas da Laminação que nós vamos demitir 20. Redução de pessoal. Então não quero saber quem é. Cada um tira uma ficha aí.” Ah! Onde é que você acha que eu fui? Exatamente naquela ficha que me ameaçou. Porque ele disse que eu ia amanhecer comendo formiga. Então comer formiga vai ele comer, eu não! Então tirei a ficha e ele foi demitido. Nunca mais o vi, graças a Deus. E eu continuei na Folha de Pagamento. Só que aí foi demitido o primeiro. Logo em seguida com aqueles gatos que eu fui corrigindo, eu passei com menos de seis meses a chefiar a Folha de Pagamento. E aqueles foram todos demitidos. Inclusive um deles que, que morreu agora há pouco tempo lá em Barra Mansa. E era médico. Até um médico muito bom, muito caridoso. Tinha dinheiro, consultava. Não tinha, consultava assim mesmo, não é? Mas ele foi pra São Paulo e ele fazia questão de dizer: “Eu roubava a siderúrgica. Eu roubava porque eles pagavam muito pouco, então tinha que roubar pra inteirar o meu salário. Não é?” E ele falava isso rasgado. Mas só que eu, na época ele não ficou muito satisfeito comigo. Porque eu descobri a maçada. E o que eu descobria eu ia em cima. E por isso é que o Doutor Antônio sempre, sempre comentava lá, né? Que ele, ele tem horror de ladrão, né? Roubar dele, ele fica uma fera. Então eu, graças a Deus, nunca roubei. Nunca tirei um, um prego da empresa. Ao contrário, eu sempre descobria coisas que eu procurava corrigir. Então essa foi uma das coisas que eu corrigi na folha de pagamento. Então eu levava o negócio muito a sério, graças a Deus, né? Por isso eu era bem quisto. Apenas um desses diretores que passou lá, por volta de 56, 55, foi quando o Doutor Figueirôa foi pra CBA, ele entrou no lugar. Veio da CSN, pra lá. Era um cara horroroso, ninguém gostava dele lá. E ele não gostava muito de mim, nem eu dele. Tanto que ele não demorou muito, foi embora, graças a Deus. Os demais eu me dei muito bem com eles. Inclusive com o Doutor Francisco, que eu trabalhei muito tempo com ele, não é? E ele, até hoje nós somos amigos, nos encontramos de vez em quando, jantamos juntos no Rotary Club de vez em quando. Ele vai pra Barra Mansa e eu janto com ele, entendeu? Visito ele de vez em quando, graças a Deus. Me dei muito bem. Sem nenhuma puxação de saco. Apenas cumprindo o meu dever. Então eu sempre dizia dentro da siderúrgica: “Eu não devo nada pro Doutor Francisco, que é o meu diretor. Eu não devo nada pro Doutor Antônio.” Porque eu devo é pra Deus. E pra Deus eu tenho que fazer a coisa certa. E fazer o certo é o que o Doutor Antônio quer, né? E eu fazia, graças a Deus. P/2 – Qual foi o último cargo que o senhor ocupa? R – O último cargo? P/2 – Isso. R – Chefe de Transportes Interno da Siderúrgica Barra Mansa. Trinta e dois anos de Transportes. P/2 – Conta um pouco aí como era o cotidiano de trabalho. R – O meu trabalho era muito bom. Porque eu gostava demais do trabalho. Tanto que eu falei agora pouquinho que eu sonho quase toda noite com trabalho, né? Então eu gostava muito. O trabalho era árduo. Quando eu fui pra lá o Doutor Francisco falou que um dos departamentos que não funcionava era aquele. E comigo funcionou 32 anos, graças a Deus. Mas eu gostava muito do trabalho. Então eu tinha hora pra entrar. Eu sempre desafiava os meus colegas, algumas outras pessoas que, às vezes, comentava, eu dizia: “Eu que trabalhei 48 anos nunca cheguei atrasado.” Nunca” Agora à tarde, eu não tinha hora pra ir embora. Se tivesse trabalho eu ia ficando, ia ficando… Tinha gente: “O Paulo, vai embora!”; “Passou da hora, pô...”. Então eu, eu gostava, então eu ficava lá. Domingo, feriado, eu sempre ia lá dentro. E mesmo que fosse só pra dar uma voltinha, pra ver como é que tava a situação, mas eu ia lá. Eu ia porque responsabilidade, é responsabilidade, não é? Então a gente não pode deixar a peteca cair. Então, eu sempre gostei do meu trabalho. Todos os trabalhos que eu fiz, eu gostei muito mais do transporte. Porque a turma parece que ela participava mais com a gente. Então a gente gostava muito de lá. E eu gosto até hoje. Quando me convidam, né? Por exemplo, há poucos dias vai ser inaugurado um salão lá. E eu já tô de olho, porque se eles não me convidarem… eu vou ficar muito zangado! (risos). P/2 – O senhor chegou a morar dentro da Siderúrgica Barra Mansa? R – Morei dentro da siderúrgica. P/2 – Conta um pouco. R – Quando eu entrei na siderúrgica tinha dois alojamentos. Um alojamento de madeira e outro alojamento de tijolo, né? Vamos assim dizer. Então eu morei primeiro no de madeira. E lá no de madeira, a gente acordava lá uma hora, duas horas da madrugada, aquela coceira no pescoço, acendia a luz era percevejo, era pulga, era isso, era aquilo. Ai meu Deus do céu, que sofrimento!... aí eu pedi lá prá pessoa que me transferisse daquele alojamento, porque tava muito ruim. Aí ele falou: “Não, não, vou passar você pro outro.” Passou pro outro. Então era eu e mais três colegas que dormíamos lá num quarto, quarto grande que dava pra quatro. Mas também não fiquei muito tempo ali, não. Que eu já tava me saindo bem na Folha de Pagamento. Aí me botaram dentro da usina. Porque dentro da usina tinha, tinha lá um salão que depois ficou, para a seção técnica, seção de desenho. Então lá no salão morava, mais ou menos, dez, 12 pessoas. E tinha quatro quartos no corredor. Um era meu, outro era do Doutor Francisco, outro era do Anton Primorac, que era o chefe do alto-forno, e um quarto lá que eu não me lembro nem quem é que morava lá. Então a gente morava dentro da siderúrgica. E a siderúrgica me ajudou de… me ajudou tanto que um belo dia eu estava na rua, e a gente que é jovem, tinha 20 e poucos anos naquela ocasião. Eu me alterei na bebida. Coisa que nunca fui de beber muito. Mas bebi. Juntei com os companheiros lá e tal e bebi um pouquinho. Quando foi no dia seguinte eu acordei de manhã, meu Deus, eu olhei: tava com a roupa de ontem! Aí eu pensei falei: “Meu Deus do céu, eu desrespeitei a siderúrgica. Não pode entrar bêbado dentro da siderúrgica!!” Então o que quê eu fiz? Nunca mais botei bebida na boca. Então aquilo me ajudou. Mas eu morava dentro da usina, entrava e saía a hora que eu queria, não tinha problema, né? P/1 – A gente vai dar uma “paradinha”. P/2 - Pode continuar. P/1 – Tem cinco minutos? R – Pois não. P/1 – Conta um pouco a relação com seus colegas de trabalho nessa época. R - Eu, eu, eu sempre tive muito bom relacionamento com os colegas. Há lá um ou outro, que tinha, era, às vezes, diferente um pouco, né? Por exemplo, uma ocasião teve um dos colegas nosso, é; no nosso pátio, eu falei o pátio é grande onde estacionava caminhões, e deu lá um pequeno incêndio na bomba de gasolina que era no centro da praça. E eu da minha sala eu fiquei olhando. Todo mundo correu pra lá, que era o ensinamento que a gente fazia. Todo mundo tem que fazer uma mão só pra resolver o problema. E um deles fez isso assim, e ficou dando risada dos outros . Aí eu ia lá, mas não fui. Fiquei dentro da minha sala olhando, falei: “Não é possível, pô. O cara fazer um negócio desses… Tá todo mundo lá e esse cara não vai.” Aí quando terminou aquele corre-corre, eu falei com ele: “Vem cá. Toma aqui o seu cartão. Marca seu ponto, pode ir embora”; “Ah, o senhor me dá uma colher de chá?!”; “Não dou. Não dou por duas razões: primeiro você errou e segundo, eu tenho que dar um exemplo em cima de você. Você vai embora, porque eu não vou deixar você ficar mais aqui.” Agora de um modo geral; é o que eu tô dizendo, hoje a turma quase que bate com o ônibus quando me vê. Então todos eles me tratam maravilhosamente bem. Eu fico até meio: será que eu era tão bom assim? Eu acho que não. Eu só cumpria com meu dever. Eu só fazia aquilo que tava, é… de acordo com a siderúrgica. Mas tratava bem, porque esse era o pensamento do diretor. Ele tratava, porque é que eu não ia tratar bem? Então eu era muito bem relacionado com a turma, graças a Deus. E, de um modo geral, pra você ter uma idéia, nos últimos tempos lá foi feito o refeitório, que tá lá pra todo mundo ver hoje, uma beleza. E na época o Doutor Francisco falou: “Paulo, nós vamos construir o refeitório e você faz o seguinte: você deixa lá o seu departamento e vai lá pro, pro restaurante. Porque você tem contato com todas as pessoas dentro da usina. Então, por exemplo, precisa de um pedreiro, não é agora, é ontem que tem que mandar. Precisa de um eletricista, não é agora, é ontem que tem que mandar.” “Então você tem esse contato com o pessoal.” E eu fui, acompanhei do primeiro até o último tijolo lá do restaurante. E quando terminou, veio uma pessoa de São Paulo, que era da empresa, que entrou lá depois fornecendo as refeições, ele pediu pra despedir do Doutor Francisco e falou: “Olha, parabéns pro senhor, que o senhor tem uma pessoa espetacular”; “E uma pessoa que se dá com Deus e todo mundo”. “Porque tudo que a gente quis era na hora.” Entendeu? Então a gente tinha condição. Segundo algumas pessoas, diziam o seguinte: “É porque ele é meio ligado com o homem aí, então a gente tem que, ó!” Mas não é bem isso, não. É porque a gente tinha relacionamento mesmo. Eu só tive uma pessoa, uma ocasião, que a gente conversou logo depois do almoço, né, tinha aquele bate-papo normal, né, ali. E ele foi, foi, foi, até que ele disse pra mim assim: “Eu não sei fazer o papel que você faz.” Aí eu falei: “Meu Deus do céu…. Que quê ele quer falar comigo? Mas eu tenho que saber o que é que ele quer” Aí perguntei: “Mas eu não entendi… O que que você quer falar?”; “Não, eu não sou puxa-saco igual você.” Eu peguei e falei: “Olha meu amigo, você...” Até o Doutor Francisco falou: “Pô, você teve coragem de falar isso com ele?” “Tive.” “Tive e falei, tinha que falar.” Eu falei com ele: “Oh, eu sou duma religião, você é de outra”; “Mas você é religioso”; “Você é um religioso. Então você sabe que na Bíblia tem um pedacinho muito pequenininho que diz: muitos são os chamados, porém poucos os escolhidos”; “Você é chamado, quando tem um jantar de confraternização, você senta na mesa lá e tudo vai lá na mesa pra você.”; “Eu não. Eu ajudo servir. Eu ajudo olhar se você tá precisando, ou não. Quer dizer, então eu sou chamado e também escolhido. Tô dentro da Bíblia. E você não está!” Aí ele, como diz na gíria: “Botou a viola no saco e sumiu.” Ele era um engenheiro lá dentro até de bastante categoria lá dentro e tal. Aí eu contei pro Doutor Francisco, tinha que contar, né? Ele falou: “Mas você teve coragem de falar isso com ele?” Falei: “Falei e falo. Porque eu não sou puxa-saco, eu sou cumpridor do meu dever.” Por exemplo, o Doutor Antônio, toda vez que ele vinha em Barra Mansa, ele me cumprimentava, brincava muito comigo, porque ele dizia assim: “Você não fica velho?” “Que que você faz? Me ensina?” Não sei o quê e tal. Quer dizer, então esse era o relacionamento que a gente tinha com todos eles lá dentro da empresa. E até hoje eu tenho, com todos meus ex-colegas de trabalho. E os demais também. Eu vou muito na rua. Moro no centro da cidade. Então toda hora eu tô na rua. Encontro com um aqui, ali, ali. Por exemplo, tenho que fazer minha caminhada, como eu vou na rádio de quatro às seis, não tem tempo de caminhar. Então tem que caminhar à tarde. E tem que caminhar pra um lugar que não seja o centro da cidade. Senão cada esquina eu paro com um, com outro, com outro, com outro. Até hoje, graças a Deus. P/2 – Legal, vamos dar uma “paradinha” agora pra virar a fita. R – Muito bem. P/1 – Eu tinha visto dois minutos, eram cinco. Então, o senhor foi chefe do departamento de Transportes por mais de 30 anos, né? R – Trinta e dois. Trinta e dois anos. P/1 – O senhor deve ter presenciado assim uma linha de mudanças, né? R – Sim, perfeito. P/1 – Conta pra gente como foram as grandes mudanças? R – As… as grandes mudanças que eu notei lá, principalmente, foi exatamente a última. Que foi quando começou, não é, a, a, aperfeiçoar uma série de coisas. Que hoje, por exemplo, eles só fazem as coisas lá de primeira qualidade, não é? No nosso tempo não era, no nosso tempo olhava a qualidade primeiro. Primeiro o dinheiro, não é? E o Doutor Francisco ele é mais do que um economista, então ele segurava mesmo, né? Tanto que tem uma piada em Barra Mansa que todo mundo conhece é que tinha duas pessoas em Barra Mansa, um chamado Francisco Reis, outro chamado Marcello Drable que foi prefeito três vezes em Barra Mansa; ele já morreu também. Então essas duas pessoas pra se comprar um rolo de papel higiênico tem que passar “na mão dele”. É verdade. Tinha que passar na mão dele, ninguém fazia nada sem comunicá-lo. Igual ele, hoje, por exemplo, ele fala comigo: “Tudo o que eu fazia eu falava com o Doutor Antônio.” Então é um esquema que vinha do Doutor Antônio e que a gente cumpria rigorosamente, entendeu? Então essa é a situação que a gente tinha lá dentro. Situação de dificuldade, entendeu? Lá se precisava um caminhão é preferível ficar parado aí dois ou três dias, se os outros estão dando conta do recado. Pra esperar ganhar o dinheiro pra depois comprar peça, né? Então a gente tinha lá bastante caminhões, né? Aqueles Alfa-Romeo pesadão. Então as pessoas diziam lá: “Quem trabalhou na Siderúrgica Barra Mansa dirigindo aqueles caminhões pesados do jeito que era, caixa seca do jeito que era né?”. “Enfim, saiu de lá tinha emprego em qualquer lugar.” E realmente quando terceirizou o nosso departamento, foi assim rápido 60 e tantos motoristas arranjaram emprego nas empresa. Porque quando chega lá, olhou a carteira, é Siderúrgica Barra Mansa? Pode entrar. Pode entrar porque é gente boa realmente. E o sistema de trabalho, porque a gente sempre educava o pessoal, de modo que uma loja em Barra Mansa que já fechou há pouco tempo. Que a turma já morreu a maioria deles, né? Então uma ocasião eles comentaram comigo: “Quando chega alguém aqui pra comprar fiado se é Siderúrgica Barra Mansa, SBM, pode vender porque paga mesmo. Paga no fim do mês, vem aqui trazer a prestação. E as outras empresas eles compra e ó vai embora e não volta mais”; Então esse era o sistema que a gente fazia lá dentro, se a gente soubesse que alguém estava dando prejuízo pra alguém a gente chamava: “Vem cá. Você não recebe seu salário no fim do mês? Então porque você vai fintar a padaria, o açougue, o armazém? Tem que pagar, tem que pagar.” Então a gente fazia isso, entendeu? Então a gente levava o negócio muito a sério. E que, eu acredito até hoje, esse sempre foi o pensamento do Doutor Antônio. E a gente procurava seguir o ritmo, né, seguir o ritmo dele. Então a gente tinha lá um trabalho árduo, mas era muito gostoso, muito bom. E a gente nos domingos e feriados a gente saía, às vezes, de bicicleta, às vezes, de carro e parava aqui e parava ali e tomava um cafezinho com um, um cafezinho com outro. Então a gente batia papo, a gente tinha aquele entrosamento. Porque dizia o Doutor Francisco, porque algumas pessoas lá que não tinha esse mesmo sistema não durava muito tempo na empresa. E mais ele comentava, é desculpe mais ele falava assim: “Não fica com o bundão na cadeira lá e esquece do seu subordinado, não pode. É preciso tá junto com eles.” E ele sempre diz o seguinte: “A pessoa, às vezes, estuda, né, faz faculdade, aprende lá dentro da sala. Mas aqui na prática a gente tem que tirar de quem sabe.” “E quem sabe?” “É o trabalhador que faz a obra.” “Então a gente tem que ouvi-lo e depois traduzir o que ele falou na parte técnica pra poder achar o defeito onde é que tá.” Esse era o pensamento, principalmente, do Doutor Francisco, que é a pessoa que eu trabalhei mais chegado a ele, né? P/1 – Muito legal isso. O senhor pode falar um pouco dos maiores desafios do trabalho? R – Olha, o maior desafio que a gente tinha lá, era justamente aqueles carro velho que a gente tinha. E eu tirei e o Paulo Henrique encaminhou. Eu não sei qual a pessoa que recebeu, mas tá lá em São Paulo. Ah, é ela que recebeu? Então tem aquele depoimento meu que eu fiz. Que eu dei sorte de ter feito aquilo. Quando juntou aqueles caminhões velhos, aqueles calhambeques que a gente falava, né? Calhambeque, tinha lá. Só basculante tinha 14. Quatorze basculantes, e a gente fazia o trabalho com quatro, dez ficava encostado. Então a gente ia trocando, quebrava um a gente trocava, botava o outro. Então, eu tive a sorte, de fazer uma gravação naquilo, em cada caminhão. Eu fiz em cada caminhão. E fiz um depoimentozinho, né? Que ela deve ter ouvido. Tá lá, né? Tá gravado lá. Eu fiz aquilo assim com muito pesar, entendeu? Mas sabendo que tudo aquilo ali ia mudar, como mudou. Hoje só tem carro novo lá. E eu tenho um papel, que cujo papel, não foi encaminhado, mas tá lá em casa guardadinho, já tá quase apagando. Que eu fiz uma relação uma ocasião para o Doutor Bento que era o diretor, e é o diretor administrativo lá em São Paulo. E eu mandei uma relação pra ele dizendo: “Se ele me manda quatro basculantes...” E nós temos 14. Eu dou os 14, ele me dá quatro novos. Pra mecânica nós tínhamos quatro, ele me dá duas pra mecânica. Tá lá escrito, bonitinho. Então ele falou comigo assim: “Manda tudo pra cá que eu mando pra você.” “Mas manda tudo pra cá não, uai.” “Nós vamos parar a empresa?” “Não pode.” “O senhor tem que mandar primeiro pra depois eu te entregar os outros.” E justamente hoje, pode ir lá dentro da empresa; E eu saí em 1995. Faz o quê? Doze anos, né? Hoje é exatamente aquilo que eu fiz é que tem lá dentro da empresa. Então eu tava certo na opinião que eu dei a ele. Então o desafio que nós tínhamos lá era isso. A maior dificuldade em trabalhar com aqueles carro velho, aquelas máquina caindo aos pedaço. Mas a gente, como dizia o nosso chefe da garagem que é o León Pod Werneck, que era o chefe perto da garagem. Então, a gente falava: “Pô aí tem que dar um jeito de trocar essa frota.” “Eh, rapaz.” “Não, porque tá dando emprego pro pessoal.” Esse era o pensamento então. E a gente ficou lá durante esse tempo todo. Com esse pensamento, que talvez, seria o Doutor Antônio, não sei. Porque numa ocasião uma festinha que nós tivemos dentro da empresa, e eu falei, eu falei lá, soube do trabalho de véspera que a gente tinha feito lá. E falei que eu gostaria, e eu estava vendo aquilo chegar, né? Que ia haver uma mudança na empresa e que o Doutor Antônio, certa época disse pra mim que ele queria entrar dentro da empresa que é dele, com o friso bonitinho, com o sapato engraxadinho. Mas hoje nós não podemos fazer. Ainda, ainda não podemos fazer isso. Mas nós vamos chegar lá. Aí o Doutor Antônio Filho, virou pra mim assim: “Mas ele falou isso pra você?” Digo, falou: “Ah, papai não sabe nem se vestir direito. E eu achei aquele negócio meio, sabe? Desculpe mas foi a verdad. Foi o que ele me falou na ocasião. E eu fiquei até meio chateado. Porque eu sinceramente, hoje, hà 12 anos que eu não sou mais empregado dele, não to puxando o saco, nem quero, nem nunca fui puxa-saco. Apesar do nosso amigo lá ter dito que eu era puxa-saco. Mas eu gosto muito do Doutor Antônio. Gosto tanto dele, que quando eu saí da empresa, em 95, eu avisei o Doutor Francisco. “Diga ao Doutor Antônio que em qualquer lugar que ele tiver, eu furo qualquer bloqueio pra dar um abraço nele. E aconteceu isso há pouco tempo. Ele deu uma entrevista lá em Volta Redonda, uma palestra, ele deu uma palestra lá em Volta Redonda. E eu pedi dois convites, pra mim e pra outro amigo lá que queria conhecê-lo de perto. Não cumprimentá-lo porque não dava, entende? Tanto que não deu. Mas ele queria conhecê-lo de perto Então eu pedi dois convites. E o meu filho telefonou dizendo: “Pai, os convites tão aqui. Pode vir buscar.” E um dos engenheiros nossos, que hoje não tá lá mais, é o Edmundo. Eu fui buscar os convites com ele. Quando eu cheguei lá a recepcionista falou comigo assim: “ Ah, o seu convite tá com o Edmundo. Vou ligar pra ele”. Ligou pra ele, ele veio trazer o convite pra mim, na portaria. E eu tava de bermuda, porque é o que eu gosto de fazer: Andar de bermuda, de sandália, à vontade, andar na rua e tal. Então o Edmundo disse assim: “ O Doutor Antônio vai passar aqui agora.” Porque tinha uma reunião que era lá embaixo. E ele ia subir a escada, ia passar pra sala do diretor. Aí eu falei assim: “Se ele passar aqui eu vou invadir.” A o outro falou assim: “Pelo amor de Deus seu Paulo, o senhor tá de sandália, tá de bermuda.” “O senhor me põe na rua.” E nisso ele passou, aí eu não abri; abri a porta e entrei. Fui lá, abracei ele, cumprimentei. Falei: “Doutor Antônio, primeiro dá um alô pra moça lá, porque a moça tá com medo de perder o emprego”. Ele falou: “Não, não fique tranqüilo, que esse aqui é gente de casa”. Então quer dizer eu fiquei muito feliz, né? Porque eu falei que fazia e fiz e foi a primeira e última, porque eu não encontrei mais com ele. Mas eu gosto muito dele, eu adoro ele, porque ele é um homem super educado, trata a gente muito bem. E eu, por exemplo, trabalhei pra ele quando ele foi candidato a governador de São Paulo, em 1986. A gente trabalhou pra ele de Queluz. Vocês conhecem bem Queluz, né? De Queluz a Bananal, quer dizer, invés de entrar pela Rio-São Paulo, entrava lá e saía em Bananal, Estado de São Paulo. E na época lá eu falei pra muita gente: “Gente vamos votar no Doutor Antônio.” “Doutor Antônio é homem. Porque hoje o Brasil não precisa de político.” Igual hoje depois de tanto tempo, 86 até hoje o Brasil tá nessa situação. No meu entender. Não precisa de político, precisa de administrador. E o Doutor Antônio é um administrador que eu conheço, desde quando entrei na empresa dele. De modo que eu gosto muito dele, porque ele é um cara muito sério, ele é uma pessoa que ele não brinca em serviço, né? E trata a gente muito bem, né? E eu não vou falar uma outra coisa, depois eu falo em segredo pra vocês que aconteceu uma ocasião comigo na empresa. Porque senão fica meio ruim, isso aí vai pro arquivo lá (risos). Mas depois eu conto pra vocês o que aconteceu. Que ele poderia ter me botado na rua e ele não botou. Ele me chamou num canto, me deu uma puxada e falou: “Fica aí, fica aí”. Quer dizer, então eu acho que na época eu já não era tão ruim empregado, porque senão ele me botava na rua e ele não me botou. Não foi desonestidade, não foi nada, foi outra coisa muito diferente (risos). Mas eu gosto muito dele até hoje. Graças a Deus, né. Pois não? P/1 – E o que senhor acha que mais mudou na Votorantim nesse anos de trabalho? R – A Votorantim no meu entender, desde quando eu passei a conhecer a SBM, a Siderúrgica Barra Mansa, que é até hoje a Votorantim, propriamente dito. Eu acho que não mudou nada, porque a idéia do Doutor Antônio Ermírio como era a do Doutor José Ermírio de Moraes, né. Que eu conto na minha historinha lá, né? Nas minhas historinhas. O pensamento dele foi sempre crescer. Crescer, dá emprego, que hoje nós estamos precisando tanto. Quantas pessoas tão aí desempregadas, necessitando? E eles então, o pensamento deles foi sempre progredir crescendo. E evidentemente a empresa, mas também dando emprego pra quem, pra quem necessita. Então, eu acho, que não teve diferença na Votorantim, não. Eu conheci, por exemplo, a CBA, na ocasião quando o Doutor Figueirôa foi pra lá, nós levamos um time em 1962 pra jogar lá na CBA, eu era presidente do time na ocasião do Esporte Clube Siderantim, né? Nós fomos lá e eu visitei a CBA. E notei que realmente o sistema era o mesmo. Ou seja, sistema de administrar bem para crescer. Crescer, cresce o trabalhador também, porque eu, por exemplo, entrei lá ganhando na época 500 cruzeiros, me lembro bem. Quinhentos cruzeiros por mês e dava pra mim viver e eu fui melhorando, melhorando a situação e fiquei lá 48 anos. Por que? Porque a situação não tava tão ruim. Se não eu teria saído, né (risos). P/1 – O senhor mencionou agora o Clube Siderantim. O senhor foi um dos fundadores do clube? R – Do clube, fui. P/1 – Em 51. R – E o Doutor Francisco também. Porque o Doutor Francisco, nós participamos da primeira reunião de fundação que foi numa casa ainda em construção lá na chamada Vila Paraíba. E ele entrou naquela época como segundo secretário do time. Ele nunca exerceu era só o nome, mas é o segundo secretário (risos). P/1 – Isso foi em 1951? R – Cinqüenta e um. Quatro de agosto de 1951, foi fundado o Esporte Clube Siderantim. P/1 – Conta pra gente um pouco como foi essa idéia de fundar um clube? Dentro da siderúrgica. R – Fundar o clube, eu não sei tecnicamente, porque naquela época eles comentavam que isso aí pode tirar no Imposto de Renda e que não sei o quê. Quer dizer, era um meio da siderúrgica descartar um pouquinho do Imposto de Renda. – Acredito eu. Mas, é principalmente porque lá em Saudade é um bairro muito pobre, até hoje é, até hoje é muito pobre. Então não tinha lazer nenhum. Então o Siderantim seria assim um meio da pessoa se distrair um pouquinho, ir lá no campo, ter um filho jogador. Por que não, né? Então, foi criado com esta finalidade. De levar o pessoal para o campo. Pra distração. Como depois em 1957, foi criada a Banda Musical Siderúrgica Barra Mansa. Também com a finalidade, por exemplo, nós temos lá Vila Paraíba, Vila Bananal, 28 de Setembro, Parque Infantil, todos, tudo isso é vila de operários. Então ficou criado a banda musical pra cada sábado ir tocar numa das vilas. Pra chamar o pessoal, né? Só que depois entra aquele falado dinheiro, a turma só quer ganhar dinheiro pra poder trabalhar, então mudou o sistema como mudou no Siderantim. No Siderantim a gente dava o emprego. Por exemplo, se chegava, chegava um jogador lá, ia lá no treino, treinava. “É bom?”; “É”. Então tem lugar dentro da siderúrgica. O próprio Doutor Francisco que foi diretor durante muito tempo lá, ele dizia: “Ah, mais um menos um, põe pra dentro aí...”; “Põe lá. Põe, pra distração do pessoal, então põe.” Entendeu? O que hoje já mudou. Hoje até nem o time existe mais, acabou, né? Mas naquela época foi fundado o Siderantim e a banda musical com essa finalidade, de dar lazer pro pessoal. Que lá não tinha como não tem até hoje, né? Hoje é ruim, lá só existe a siderúrgica. E olhe lá, não é? P/1 – O senhor tem dois filhos que trabalham hoje na siderúrgica? R – Dois filhos. Exato. P/1 – Têm mais pessoas da família que trabalharam na Votorantim? R – Eu tenho. Eu tenho um neto que está lutando pra entrar lá outra vez. Porque ele trabalhou duas vezes já na empreiteira. Porque agora não entra mais direto na siderúrgica, é muito difícil. A não ser que seja um profissional realmente de primeira que a siderúrgica precise. Senão não entra. Entra na empreiteira, pra depois entrar pra siderúrgica. E ele entrou lá num setor que trabalha o pai dele, que é o meu segundo filho. No Almoxarifado. Eu comecei em 1947 no almoxarifado. Então o almoxarifado, o que é que tem no almoxarifado? Entregar peça daqui, dali, né. Um parafuso, um lato de óleo, sei lá o quê “que” é. E a mãe dele que não é do nosso time, tanto que já largou há muito tempo, há muito tempo que ele não vive com ela, né? Mas o time dela é diferente. Então ela achou ele como ajudante de mecânico que estava na mesma empresa que o meu filho está há oito anos, depois que ele saiu da siderúrgica, ela tirou ele porque disse que ele “tava” em serviço pesado. Serviço de escravo, de escravidão. E lá na siderúrgica, eu acredito, que nunca existiu trabalho escravo na siderúrgica. Tem serviço pesado lá? Tem. O Doutor Francisco, por exemplo, quando entrou lá em 1950, ele entrou como chefe do departamento de Refratários. O que quê faz o refratário? O refratário quando quebra um forno daquele, eles põem ventilador, tamanho grande, pra resfriar aquilo rapidamente. Depois entra um homem, cinco minutos sai, entra outro sai. E isso é até hoje. Então, se é que existe um trabalho escravo, esse é um trabalho escravo. Mas só que nunca ninguém morreu, nunca ninguém perdeu o emprego por causa daquilo, entendeu? Então, por que é que o meu neto, que hoje tá um bruta dum homem, com 21 anos, ele está com serviço escravo? Eu não concordo! Como nunca concordei, zanguei com ela, fiquei bravo. E hoje ele tá lutando pra entrar na siderúrgica outra vez. Então, mas de qualquer maneira, por enquanto eu tenho dois filhos lá. O Paulo Henrique, que já está há quase 29 anos e o Lu que está, trabalhou oito anos, ou nove, não sei, na siderúrgica. Depois saiu e foi pra Nestlé, trabalhou uns tempos na Nestlé e voltou pra empreiteira. Que essa empreiteira dele chama-se EPC, parece-me. EPC é a empresa que contrata as demais empreiteiras, quer dizer, então ela é a chave lá dentro da siderúrgica. E ele está como chefe do Almoxarifado lá há oito anos. P/1 – O senhor tem alguns casos pitorescos pra contar? Da sua trajetória de trabalho? Algumas histórias? R – Pitorescos... Desse trabalho? P/1 – Histórias, fatos curiosos, engraçados... R – Eu tenho. De vitória, eu tenho, eu tenho um, né. Tenho um que é uma casa muito boa, embora antiga, mas grande, tem 11 cômodos a casa, um terreno lá todo murado, com 600 metros, né, de extensão. E esse eu comprei em 1990 de um, do meu concunhado que era um francês que aposentou na Barbará. E ele casou-se, a segunda vez com a minha cunhada. E eles mudaram lá pra Vitória no Espírito Santo, tanto que ele morreu lá, ela morreu também lá. Então na época eu comprei a casa dele. E me custou naquela época 240 mil cruzeiros. Duzentos e 40 mil cruzeiros. E isso foi numa sexta-feira, eu fui lá em Quatis que é uma cidade perto, dá 15 minutos de Barra Mansa, comprei a casa acertei tudo com ele, ele ia se mudar dentro de 40 dias. Mas só que quando eu comprei, eu tinha o dinheiro pra comprar. Tanto que eu comprei porque tinha o dinheiro, não é? Mas quando chegou na segunda-feira de manhã, por volta de oito e meia o telefone tocou, eu atendi era o Doutor Francisco: “Eu queria que o senhor desse uma passadinha na minha sala, eu quero falar com o senhor.” Caminhei pra lá. Cheguei lá ele abriu a gaveta, assim puxou e tirou um envelope daquele comercial desse tamanho e falou: “Tá aqui o seu Papai Noel.” Que a siderúrgica dava um Papai Noel para os mensalistas, principalmente para os supervisores. E dava para os horistas sete dias de trabalho, que correspondia a 56 horas, logicamente, né. Então eu recebi aquele envelope, falei: “Ah não, não é possível!” Pensei comigo: caiu do céu! Aí quando eu fui assinar o recibo: 235 mil cruzeiros. Então eu comprei a casa por cinco. E se hoje me botarem 150 mil reais na mão eu não entrego a casa. Porque a casa é velha, mas é uma casa muito boa, muito grande. Então esse é um caso que eu tenho da siderúrgica que ela me ajudou tanto tempo, né? A começar da minha entrada lá, que eu morava num alojamento e passei a morar dentro da empresa. O que foi coisa pra poucos lá dentro da empresa. Mas esses poucos eu tô incluído. Então tem uma série de coisas boas que a siderúrgica fez pra mim, né? Por exemplo, eu nunca paguei aluguel. Quando eu saí do alojamento eu morava dentro da companhia. E aí o Doutor Figueroa, no tempo dele ainda, ele precisou da área que nós morávamos: eu, o Doutor Francisco e outros. Ele precisou pra fazer a parte técnica, a seção técnica, a seção de desenho, lá nesse setor. Chamou a gente, falou: “Oh, todo mundo fora daí! Arranja uma casa que a companhia paga!” E nós arranjamos uma casa pra quatro. Era eu e mais três. Eu, o chefe da Folha de Pagamento, na época eu já não tava mais lá, né? Na Folha de Pagamento. Era ele, um de São Paulo. E dois desenhistas. Então nós saímos, fomos pra uma casa lá. Que eu nunca fiquei sabendo quanto pagava de aluguel. Porque era recebido direto na siderúrgica. E quando eu me preparei pra casar, eu morava ainda na república, quando eu me preparei pra casar. Casei em 1954. Aí o Doutor Figueirôa me chamou e falou: “Você já tá arrumando casa pra você?” Eu digo: “Não tô esperando a empresa me dar uma casa.” Falou: “Não, a empresa não tem casa pra te dar, não!” “Arranja uma casa aí que a companhia paga.” E eu arranjei outra. Então, quer dizer, eu fui comprando os móveis, colocando nesta casa que a companhia alugou para mim, e eu ainda morava na outra. Então isso foi em uns 30, 40 dias, mais ou menos. Então eu sempre tive casa da empresa. Quando entrou um dos diretores que foi um dos que ninguém gostava dele, nem eu, quando veio da CSN, tal de Carlos Vale. Esse Carlos Vale intimou todo mundo de sair: “Nós não vamos mais pagar aluguel. Todo mundo vem pra casa da companhia.” E eu entrei numa casa da companhia. Não tem problema. Mas ele ameaçou na certeza que a gente ia recusar pra poder mandar a gente embora. Eu acredito. Isso na ocasião, né? Mas passei pra casa da companhia como eles não me cobravam aluguel. Nunca paguei o aluguel. Tinha água, tinha luz, tinha telefone, tinha tudo. Tanto que quando eu me preparei, quando eu vi; senti, melhor dizendo. Quando eu senti a mudança da siderúrgica como está lá hoje, eu comecei a me preparar pra minha casa própria. Porque a empresa é muito boa, dá a gente uma cobertura muito grande, mas a gente não pode bobear. E se amanhã eu saio daqui e vou morar embaixo da ponte? Não dá! Então comecei a me preparar pra minha casa própria. E quando eu preparei a casa, comprei no outro bairro, atravessa a ponte dá lá no bairro Vila Nova. A casa já estava pronta e eu só me mudei o dia que eu pude anotar o número do meu telefone que eu tinha comprado pra lá, pra dar ao Doutor Francisco. Porque toda hora ele me chamava e eu morava perto da empresa. Toda hora chamava: “Dá uma chegadinha aqui!”. Ou pelo telefone, ele falava comigo, tal. Então eu falei: “eu mudo, fico longe, não dá”. Então, eu acho, que o diretor tem o dever, né, de com que a gente fique pertinho da empresa. E a gente; todo supervisor é ali pertinho. E eu era um deles. Então, quando eu me mudei eu dei o número do telefone pra ele, dei endereço, dei tudo, não é? E ele me chamava e eu ia. Só que lá de casa era seis minutos, lá na minha casa à usina. Então era pertinho. Qualquer coisinha, rapidamente, a gente já tava lá, né… Certo? P/1 – Solidez, empreendedorismo, responsabilidade, ética e união são valores do Grupo Votorantim? R – Sem dúvida! Sem dúvida que é! P/1 – O senhor identificava esses valores? R – Ah sim, perfeitamente. Eu nunca… Eu sempre falo até hoje com meus filhos, com meus netos, brigo muito com eles, a gente não pode querer fazer o que a gente quer, de jeito nenhum! Eu sempre falava com meus companheiros de trabalha o seguinte: “Não comparando, o empregado é cachorro na corrente!” O cachorro você puxa, ele não vem, você ó. O empregado você puxa, ele não vem, você põe outro no lugar. Porque hoje não é o que era na época, um ou dois querer o seu lugar, é dezenas, centenas de pessoas para ocupar o seu lugar. Então: “Ó, abre o olho porque tem que fazer tudo aquilo que o patrão quer.” Tem muita coisa que está errado? Está. Mas ele precisa. Então se o patrão precisa, nós temos que fazer. E nós vamos fazer. Esse sempre foi o meu pensamento. Então sempre me identifiquei. O Doutor Francisco, por exemplo, ele não gostava, ele ficava bravo, quando ele dizia assim: “Ó, tira essa cadeira, põe ali”; “Ah, doutor, mas não dá a cadeira é meio pesada...”; “Já experimentou?”;“Não?” “Então, faça o favor de experimentar primeiro. E Depois você fala que não dá!” E esse aí é o sistema dele, né, como era dos outros. E eu sempre me identifiquei com isso. Eu quando precisa de uma coisa, eu sou o primeiro a correr atrás. Não tem conversa, né? E eu sempre fiz lá. Quantas vezes eu fiquei lá dentro da empresa 48, 50 horas? Porque pegava fogo no carvão, é um tal de pegar fogo no carvão lá que eu nunca vi. Então era um corre-corre danado. E agente ficava dia e noite: corre pra cá, corre pra lá, corre pra lá, corre pra cá. E eu ficava lá. Nem café eu procurava tomar. Ficava sem comer, sem nada lá dentro da empresa. Porque os outros faziam, por que é que eu não vou fazer? Então, o que os outros vão fazer eu também sei fazer. Então eu vou fazer. Isso foi o que eu sempre procurei. E sempre implantei isso na cabeça das pessoas que trabalhavam comigo. Tanto que essa pessoa que eu falei que eu mandei embora, agora há pouco, né? Que eu comentei. Ele não se identificava com a turma. Porque se tá todo mundo lá correndo, porque tem um incêndio, é uma coisa que não é pra depois é pra agora. E ele fica dando risada, de braço cruzado, rindo dos colegas ele. O que é que é isso? Não dá! Essa não é a mentalidade da Votorantim. E até hoje a mentalidade é essa. Porque eu sei, que os meus filhos trabalham lá dentro eles me contam, né. Eu sei da situação como é que acontece lá dentro. E todo patrão é assim: patrão é patrão. Você tem que obedecer, senão já viu o que é que acontece, né? E ainda mais Votorantim, que o próprio Doutor Antônio, que sempre comentou com a gente, sempre conversou com a gente, ele nunca foi homem assim de chegar e pisar na gente. Não! Ele não fazia isso. Tanto que na época da política, lá em Bananal mesmo teve uma moça que me falou: “Que nada, votar em Antônio Ermírio nada! Antônio Ermírio é aproveitador do trabalhador!” Eu digo: “Você tá enganada minha filha. Você não conhece o Antônio Ermírio, não. Cê não conhece! E outra coisa que eu vou te dizer: se vocês não votarem em Antônio Ermírio vocês vão ficar aí desempregado o tempo todo.” Porque tem muita gente de Bananal que até hoje trabalha na siderúrgica. Então trabalha lá e vai embora. Trabalha, vem de manhã, vai à tarde. “Então se ele entra, ele põe uma empresa aqui. Pronto, acabou! Não precisa vocês ir trabalhar lá.” Mas ela não concordou, e é um direito que assiste a ela. Ela não queria, problema dela, né? Cada um tem um pensamento, não é? P/1 – O senhor conhece as ações da Votorantim junto à comunidade? Alguma ação? R – Olha, a gente conhece muitas. Porque a Votorantim; o Doutor Francisco falou aí o negócio do parque infantil. Parque infantil até hoje existe lá, só que eu vou discordar um pouquinho dele. Porque ele falou que é a mãe do Doutor Antônio e não é. É a esposa do Doutor Antônio. Maria Regina Costa de Moraes é o nome lá do Parque Infantil. E que eu participei da inauguração desse parque infantil. Então tem lá talvez umas sete… não me lembro mais quantas têm, mas na época tinha umas 15 professoras. Então é um parque lotado de criança, que começa aos três, quatro anos já estão lá dentro com toda a despesa paga pela siderúrgica. Entra lá não tem despesa nenhuma. A siderúrgica sempre deu essa cobertura. Por exemplo, uma das coisas: meus filhos, esse Paulo Henrique que está comigo, ele tem hoje cerca de 29 anos de serviço na empresa. Ele entrou com 14 anos. Então lá, depois dos 14; agora o ministério não deixa, só quer depois dos 18, o que eu acho um absurdo! Mas, aos 14 anos já poderia entrar na empresa. Então 14 anos a gente já recebia na porta as crianças: “Aqui ó. A minha certidão de nascimento aqui.”; “Ó meu retrato”; “Pra mim entrar na usina”; “Não, não entra, não. Você vai fazer a fichinha e esperar o chamado.” Então, entrava lá no Refratário, carregando caminhão de tijolo, descarregando caminhão de tijolo. Então, tinha lá na época, cerca de 100 a 150 crianças de 14 a 20 anos. Então dali quando precisava, por exemplo, uma pessoa, uma criança na mecânica, que já era pra partir pra um lado profissional, a gente tirava lá do Refratário. E botava outro novo, lá no lugar dele. E o adulto também era a mesma coisa. Na época nós tínhamos, por exemplo, o Salário Mínimo era dois e 50. Dois cruzeiros na época. Dois cruzeiros e 50 centavos era o Salário Mínimo na ocasião. Na Laminação era quatro e 20. Então, o que é que a gente fazia? Tirava um do alto-forno que ganhava dois e 50, que é serviço pesado, ruim, botava pra Laminação. E botava um novato pra ganhar dois e 50. Pra depois chegar o ponto dele chegar aos quatro e 20 na Laminação. Então esse era o pensamento, sempre foi da siderúrgica. Dava cobertura, tinha casa. Nós tínhamos na ocasião cerca de 400 casas. E que tem o sítio Boa Esperança, que hoje até foi construído um alto-forno lá, né. As casas lá no sítio era muito ruins. Faltava água, faltava luz, no meio do mato, e que não sei o quê. Então a gente tirava um lá do sítio Boa Esperança, botava na Vila Paraíba que já tava no centro, na rua principal. E pegava um novato e botava lá no sítio Boa Esperança. Então a pessoa tinha que seguir aquela, aquele ritmo. No tempo do Doutor Figueirôa, por exemplo, construiu diversas casas lá, né, e as casas novas ele fazia assim em sorteio. No Natal, por exemplo, entregava brinquedo pra criançada e roupas para as mulheres, calça brim para os homens. Dava um presentinho pra cada um. E ele então fazia o sorteio: “Ó eu tenho aqui, casa número tal que eu vou sortear.” E sorteava. A pessoa ficava numa alegria tremenda. Então o negócio era tudo feito desse modo, de modo a agradar o trabalhador, né? Naquele tempo era muito bacana isso: a esposa do diretor, como a dona Madalene, que é a esposa do Doutor Figueirôa, a dona Suzana que é do doutor Francisco eles, elas participavam com a gente naquela escolha, na separação dos brinquedos que iam ser entregue. Só que o trabalhador; é claro que eu tô dizendo o trabalhador, mas não são todos. Evidentemente, nem poderia ser. Mas uma maioria vende a roupa que ganhou! Vende o calçado que ganhou! Naquele tempo, e até pouco tempo eles vendiam ferro pra pessoa, chamado de ferro de segunda, que é aqueles bagulho que quebrava, né? A gente vendia aquilo mais barato pro pessoal. O pessoal vendia pros outros lá fora, pegava o dinheiro deles e pagava à prestação na siderúrgica. Então era uma das coisas boas também que a siderúrgica fazia. Porque a ponta de ferro que é conhecida até hoje lá. A ponta é só o construtor que não gosta, que se pega um ferro de dez, de dez metros e já coloca ele no lugar certinho pra poder botar o cimento. O vergalhão picado você tem que emendar ele. Então dá um trabalhinho daqui. E o construtor não gosta, o pedreiro não gosta de perder tempo. Mas naquele tempo vendia muito mais barato pro trabalhador. E inclusive nós fizemos um convênio também com a Votorantim de Volta Redonda, que é do cimento, fábrica de cimento, pra vender também o cimento. Então se fosse um ofício nosso dizendo que ele é trabalhador e que tá construindo em tal lugar assim, assim a Votorantim Cimento, vendia pra ele à prestação também. Ou vendia à dinheiro a siderúrgica pagando e descontando na conta do trabalhador. Então é uma série de coisas que a siderúrgica fazia, naquela ocasião chegou até a fazer empréstimo pra pessoa comprar terreno, pra comprar casa, depois pagava à siderúrgica à prestação. Mas depois é o que eu disse, cada um vai fazendo a coisa diferente daquilo que foi programado então começaram cortar tudo, né? Hoje, praticamente, não tem nada mais disso. Quem tem a sua casa tem, quem não tem que se vire pra fazer. Porque a siderúrgica não é obrigada a fazer isso, né? E as casas, por exemplo, que ela dava para o trabalhador. A gente, nos últimos tempos, a gente só dava pra um profissional. Por exemplo, tem um mecânico lá na Barbará que a gente precisa dele. Vai lá, convida ele. E a primeira coisa que a gente faz: “Te dou uma casa pra você morar.” Então, quer dizer, já ajudava a pessoa. Não tem casa pra morar? A siderúrgica já dava. Depois foi aquele, aquela mudança, mudança e hoje as empresas, não é só a siderúrgica todas as empresas fazem isso, porque não se arrisca a dar uma casa pra um trabalhador. Porque fica muito caro. Nós temos, por exemplo, um alojamento que ainda existe até hoje lá que foi construído pelo Doutor Figueirôa. Só que não mora mais ninguém, já tá fechado lá. Mas 492 quartos. Quatrocentos e 92 quartos. Que ele construiu pra poder atrair o trabalhador pra entrar na siderúrgica. Então já entra, já tem o quarto. Tem uma pessoa que cuida, né, limpa o quarto todo dia, troca a roupa de cama e aquela coisa toda, né? Hoje já não tem mais; as empresas não são mais... não é questão de obrigação, mas é que não tem necessidade mais. Hoje a oferta de emprego é muito diferente. Naquele tempo eu ia… quantas vezes eu fui no cais do porto do Rio de Janeiro com um papelzinho e um lápis, esperando: “E, ei, quer trabalhar?”; “O, fica aqui.”; “Ei, quer trabalhar?” e eu levava 15, 20 de uma vez lá pra dentro da empresa. Entrava hoje, amanhã ia embora todo mundo, porque o serviço era muito pesado, não queria; vinha lá do Norte, não sei onde, não tava acostumado a trabalhar. E eu fui inúmera vezes. E pra Minas Gerais eu fui diversas vezes também, convidar o pessoal. Até é muito engraçado porque na época o pessoal criticava, mas era o meio que a gente tinha. Por exemplo, pra mim contratar o trabalhador durante o dia, onde é que eu encontro ele? Não encontro. Ou ele tá trabalhando, ou ele está dormindo. Sei lá. Então a noite a gente ia pra aqueles lugares não muito recomendados, mas é ali que a gente encontrava a turma. E ali que eu contratava o pessoal. Quantas vezes eu fiz isso... Depois a companhia contratou um cidadão que tinha apelido de Zé Madrugada. O Zé Madrugada na ocasião 150 cruzeiros por cada homem que ele botava lá dentro. Aí ficou pra ele. Mas eu fui em diversos lugares buscar gente. Por que? Porque lá as pessoas, principalmente, aqueles chefes mais maldosos eles botavam na folha de produção lá: “Parado forno três...”. Aciaria tinha quatro fornos naquela ocasião. “Parado forno três por falta de gente.” “Parado o forno um por falta de gente.” E o diretor vinha em cima de mim: “O Paulo, como é que é?”; “O, cadê?”; “Tá faltando homem aí.” Então eu saía pra buscar. Entendeu? P/1 – Então o senhor falava aí da falta de pessoal pra trabalhar nos fornos... R – Isso. P/1 – Continua? R – Continua? Pois é. Naquela ocasião tinha muita, muita dificuldade com pessoal, o serviço era muito pesado. Por exemplo, chegava muita gente na portaria e dizia: “Tem uma boca aí pra mim?”. E a gente brincava: “Tem boca, mas é boca de forno!”. Né? “Que boca que você quer?”; “Não sei que boca que você tá entendendo, né?” Então o pessoal falava muito isso nessa ocasião. Mas o serviço realmente era bastante pesado. Principalmente a Aciaria. Aciaria SM, a Smart, que era chamado, né? Então o serviço era muito pesado. E o pessoal procurava, às vezes, a fazer sacanagem com os novatos. Por exemplo, uma das coisas que eu sempre reclamava quando eu estava no departamento pessoal: fichava a pessoa pra lá, e ia lá apresentar a pessoa, voltava: “Não, vai pegar de zero hora.” Por que é que um novato vai pegar de zero hora? Entra agora de manhã pra treinar primeiro, acostumar, ver o trabalho como que é, pra depois na semana seguinte botarem ele à noite. Mas, infelizmente, parece que eles faziam de sacanagem. Só pra ter o prazer de botar no boletim: falta de homens, falta de homens. E eu que pagava o pato, né? Então uma das coisas também que aconteceu uma ocasião. Tem um cidadão que hoje tá velhinho coitado, eu tive há pouco tempo lá na casa dele em São José dos Campos, e ele nem me conheceu, não é? Tá velhinho mesmo. E ele era o encarregado-geral lá da Aciaria. E eu fui lá observar pra ver porque eu comuniquei no tempo do Doutor Figueroa ainda. Olha quanto tempo faz, né? A turma dizia que o novato que chegava, que ele ia carregar da mão, né? Que a pessoa pegava da pá aqui, saía correndo lá jogar dentro do forno. Vinha outro; Então eles cruzavam naquela caminhada que ia pra lá e pra cá. E o novato o que é que eles faziam? Carregava a pá e dava trombada nele, derrubava o cara. O cara caía ali, pegava a pá, jogava lá e ó: ia embora. Ele falava: “Deus me livre, trabalhar num serviço desse”. Um serviço pesado, calor de fogo e ainda receber trombada de todo mundo aqui. Aí me comunicaram; Um deles teve coragem, porque a pessoa só ia embora. Ia embora, menos um, menos um, menos um. E eu correndo atrás. Vinha aqui no Rio, ia em Minas, ia aqui, ia ali buscando gente. E não parava. Aí, um belo dia um deles passou lá: “Seu Paulo, vou falar um negócio com o senhor, hein?;” “Que negócio?”; “Sabe por que que não pára ninguém lá? Porque acontece isso, isso, e isso.” Eu falei: “Ó, não comenta nada com ninguém que eu vou ver isso.” Aí, um belo dia despistei, fui lá pra Aciaria, porque tavam carregando lá o forno um, por exemplo, eu tava lá no forno quatro de olho. E realmente aconteceu isso. Aí eu fui lá e falei com o Doutor Figueroa. Falei: “Por isso que não consegue.” Porque cada um vai defender o seu lado, eu também vou defender o meu agora. Quer dizer, fica só me culpando, me culpando que não tem gente. E agora o que é que eles estão fazendo aí? O que que é? Contei pra ele e: “Chama lá o Zé.” Conhecido como “Cachimbinho” Ele fumava um “bruta” dum cachimbo na ocasião. “Chama o Cachimbinho lá que eu quero falar com ele.” Aí o “Cachimbinho” foi, levantou da mesa dele, falou: “Ó, eu tenho conhecimento que na aciaria tá acontecendo isso, isso, isso e isso, ó. Os primeiros que o Paulo Seixas botar lá pra dentro que acontecer isso aí, você tá na rua, perdeu seu emprego.” Ele assustou. Nunca mais aconteceu isso. Aí a gente começava a botar, tinha gente pedindo pra entrar pra aciaria. Porque a Aciaria além do salário, tinha um prêmio de produção. Então o cara queria ganhar o prêmio de produção. Por exemplo, uma ocasião apareceu um garotinho, né, pequenininho lá na porta e queria trabalhar. Aí o nosso rapaz que fazia o fichamento, falou: “Seu Paulo, tô numa sinuca danada.” Digo: “O que aconteceu?”;“Tem um menino ali fora, mas ele é muito pequenininho, ele não vai agüentar o serviço lá. E nós só temos vaga na Aciaria.” Quer dizer, chegou nesse ponto, só tinha vaga lá. As outras estavam com tudo cheio, né? Aí eu falei: “Eu vou lá ver.” Aí fui lá olhei. Realmente, o menino era pequeno demais, né? Aí eu expliquei pra ele: “Meu filho, não vai dar porque você não vai agüentar, o serviço é isso.” Ele estufou assim e falou comigo assim: “Tem homem que trabalha lá?” Falei: “Tem uns 300”; “Então pode me por lá que eu vou agüentar.” Aí eu não tinha outro jeito, tinha que botar. Aí fui lá, conversei com o “Cachimbinho” expliquei pra ele a situação e falei: “Eu vou botar o rapaz, se não servir amanhã manda embora, não tenha dúvida.” Aí ele falou: “Seu Paulo, daqui a três meses...” Que é o primeiro contrato que a gente fazia. Três meses depois um outro contrato de seis. Pra depois então fichar. E fichava com a data da entrada. Porque esse negócio tem muita empresa aí que depois manda embora e não paga o atrasado. Lá na siderúrgica nunca fez isso. Ela fichava três, depois seis, depois fichava com a data que ele entrou. Aí ele três meses depois ele cumpriu a promessa. Quando ele foi assinar o segundo contrato ele falou: “Seu Paulo, o senhor lembra de mim?” Eu digo: “Lembro, lembro de você sim.” “Pois é seu Paulo eu queria dizer pro senhor que eu tô ó firme aqui. Tudo que os outros tão fazendo eu faço também.” Então a gente não pode olhar tamanho da pessoa. Tem que olhar a boa vontade, a coragem que a pessoa tem. Então a gente tinha essa dificuldade na ocasião da gente querer faze o bem. E os outros querendo fazer mal pra atrapalhar. E querer ganhar nome nas costas dos outros. Só botar no boletim que tá faltando homem. Forno parado. Ah, pelo amor de Deus, né? P/1 – E sobre as ações relativas à preservação do meio ambiente? R – Olha, naquele tempo a gente não pensava muito nessa... Hoje é que tem tanta exigência, naquele tempo a gente não pensava muito nisso, não. Não tinha essa exigência de meio ambiente, não. Tanto que a gente… ali onde é hoje a aciaria elétrica, pra quem conhece aciaria elétrica, aquilo tinha uma; o rio, rio Bananal, vinha lá de perto da Rio-São Paulo e ele ia fazendo isso assim ó, tá? Uma série de volta pra quando chegar até na linha da central que está praticamente dentro da siderúrgica. Então naquela ocasião nós fomos aterrando com aquela escória, que nós chamamos lá. Que a gente ia aterrando, aterrando e nós conseguimos botar o rio na linha reta. Tanto que tem uma ocasião lá uma; hoje é deputada estadual, ela foi prefeita de Barra Mansa e queria que a gente pagasse multa lá, não sei, o que quê ela arrumou com a siderúrgica. Comigo falei: “Não tinha nada disso naquela ocasião.” Mas que o rio tá cheio de escória está. Porque a gente ia empurrando. Pra poder fazer o bem-estar da siderúrgica. Então naquela época a aciaria elétrica não seria construída naquele local onde está se a gente não tivesse feito aquele trabalho que a gente fez sem saber que um dia ia precisar, entendeu? Então não havia essa necessidade, não. A gente dava lá; Gente que tinha terreno na beira do rio comprava escória da companhia, barato. O caminhão da companhia levava lá, despejava no terreno dele. Ele pagava uma mixaria lá, só pra não dizer que deu. E que a gente ia mandar o caminhão. Então tinha que pagar pelo menos a gasolina, né? O cara aterrava não tinha essa exigência. Eu não me lembro… negócio de meio ambiente, eu não me lembro nunca de ter tido qualquer tipo de problema com meio ambiente. Nunca. P/1 – E na sua opinião, qual é a importância da Siderúrgica Barra Mansa pra história da indústria brasileira? R – Ah! Isso, isso pra mim é tudo. É tudo porque a siderúrgica é o que eu já disse: eu entrei lá com 300 empregados. Chegamos a três mil empregados, e hoje deve ter mais de mil. E contando os empreiteiros talvez tenha quase três. Ou não estará longe de chegar nisso. Então a siderúrgica tem uma importância muito grande lá pra nossa região. Por exemplo, todo mundo ali tem um crescimento enorme. Vocês que talvez não conheçam, nós temos um bairro, chama Vista Alegre. Vista Alegre de dez pessoas, nove são mineiros e trabalham na Siderúrgica Barra Mansa. Têm a sua casinha, tem a sua televisão à cores, tem a bicicleta, tem o carro, tem tudo. Tudo que é feito lá dentro da siderúrgica. Em Saudade é que não cresceu muito porque em Saudade tinha uns dois ou três meio do dinheiro. E eles não vendia, não dava, não emprestava. Então Saudade não cresceu. Mas tem Vista Alegre, tem Vila Maria. Vila Maria que tinha lá meia dúzia de casa. Hoje tem casa que não acaba mais. Como diz um ex-colega nosso: “Tem casa pra encardir ali na Vila Maria.” Então Vila Maria, Vista Alegre, Vila Nova. Cresceu assustadoramente. Tudo porque a Siderúrgica Barra Mansa existe. Porque o cara trabalhou lá, ali ele arranjou o dinheirinho pra comprar a sua casa, o seu carro. Então eu acho que a importância da siderúrgica é muito grande. Por exemplo, a Bárbara. A Bárbara, desde quando eu conheci a Bárbara tá ali naquele lugarzinho com aquele mesmo tamanho que tinha da época que eu... E a siderúrgica hoje tá até tendo dificuldade em crescimento, entendeu? Ela precisa crescer, está crescendo e não tem lugar. A coisa é que eles estão fazendo agora em Resende. Por que Resende, se não poderia ser em Barra Mansa? Porque não tem lugar. Dum lado é o Rio Paraíba, do outro lado é o Rio Bananal, no meio é a central. Então fica difícil. Então, eu acho que a siderúrgica é assim um marco importante na nossa região ali. E por que não dizer no Brasil? Eu sei, por exemplo, uma ocasião nós estávamos lá no Hotel Bela Vista, num jantar de confraternização de fim de ano que todo ano a siderúrgica fazia. E com a presença do Doutor Antônio, ele nunca faltou. Nunca faltou nesses jantares. E um dos nossos amigos que trabalhava na contabilidade, hoje acho que ele mora em Juiz de Fora, não sei se até existe, não me lembro bem. Ele trabalhava, era a segunda pessoa na contabilidade lá. E ele aproveitou um pouquinho da bebida e lá uma certa hora ele falou comigo: “Ó, posso usar o microfone?” Eu falei: “Pode.” Falei com o Doutor Francisco: “Ah, dá o microfone pra ele. Deixa ele falar, né? Deixa ele falar.” Aí ele pegou o microfone e dentre as palavras que ele falou, ele disse assim: “Eu espero que em bem pouco tempo, bem pouco tempo, a Siderúrgica Barra Mansa seja uma siderúrgica nacional.” Então hoje, por exemplo, eu penso nas palavras dele e fico comigo mesmo: eu que vou sempre lá que conheço, vejo o crescimento dela. A siderúrgica pode não ser hoje, o que é a Siderúrgica Nacional, que a Siderúrgica Nacional em tamanho ela é muito maior do que a Barra Mansa. Mas a Barra Mansa em qualidade, em produção, em organização ela está melhor do que a siderúrgica. Tanto que naquele tempo, do meu tempo lá que tem já 12 anos, né? Mas naquele tempo, raramente, entrava uma pessoa da CSN lá. Por que? Porque o serviço era maneirado. Maior parte naquela época era coisa política, botava os caras lá dentro. Porque era do partido não sei o quê, era do candidato não sei o quê, né? E ganhavam muito. Agora hoje tá cheio de gente da CSN lá dentro da Siderúrgica Barra Mansa. Por que? Porque a siderúrgica é melhor que a CSN, senão eles não iriam, entendeu? Então, eu me lembro das palavras desse nosso colega lá que disse que dentro de pouco tempo a SBM, será igual a Siderúrgica Nacional. E já é. E já é com muito orgulho, com muito prazer. E eu, por exemplo, do meu prédio eu olho na janela e vejo a fumacinha lá na siderúrgica, às vezes, o apito, escuto o apito. E aquilo dói, sabe? Dói no bom sentido. Que eu gostaria de tá lá dentro ainda até hoje, por que não? Então eu acho uma coisa muito importante lá na siderúrgica, sabe? P/1 – E quais foram os principais aprendizados durante sua carreira? R – Na minha carreira? Na minha carreira eu aprendia uma das coisas, por exemplo, na SBM que eu aprendi é ser um pensamento de Antônio Ermírio de Moraes, de Doutor Francisco Reis, Doutor Figueirôa que era muito rígido, mas era um cara, um cara direito gostava das coisas tudo nos seus devidos lugares. Então isso foi uma das coisas que eu aprendi e que hoje eu posso passar pros meus filhos, pros meus netos, né? Então é uma das coisas boas que eu aprendi lá dentro. Eu sempre digo, igual falei agora há pouquinho, eu sempre pensei comigo, não devo nada pra Antônio Ermírio, não devo pra Doutor Francisco, não devo nada pra ninguém. Eu devo é pra Deus. E pra minha; A minha obrigação, o meu pensamento que é o pensamento de andar certo. Então eu aprendi isso. Porque tem muita gente que, às vezes, quer fazer tudo errado e não dá. A coisa errada não vai. Mas até hoje a siderúrgica; até hoje a siderúrgica tem aquele mesmo pensamento, desde o início, de botar a pessoa nos seus devidos lugares. Ou seja, na linha, andar na linha, porque quem não anda na linha perde, né? Tem um ditado que a mulher não pode andar na linha senão o trem pega, mas não é bem assim. A gente; eu tô falando num outro sentido, senão andar na linha perde o emprego. Então, quer dizer, a linha da siderúrgica sempre foi essa e com certeza vai continuar. Porque a criação de Doutor José Ermírio de Moraes, que era o verdadeiro dono da empresa, ele foi talvez umas duas ou três vezes só lá, mas era um homem que tinha uma moral que eu nunca vi. Igual ele era difícil. E o Doutor Antônio herdou dele tudo isso que ele era. O Doutor Antônio herdou e leva o negócio a sério. Então a gente aprende muita coisa ali, a siderúrgica é uma empresa muito séria, viu? Muito séria. É o meu pensamento. P/1 – Então, no próximo ano a Votorantim completa 90 anos de existência. Qual o segredo para esse sucesso todo? R – Não é 90, não. É? É 90 anos? P/1 – A Votorantim. R – Ah, a Votorantim. Ah tá. Eu tô, eu tô na siderúrgica (risos). P/1 – O Grupo Votorantim. R – O Grupo Votorantim. P/1 – Exato. R – Pois é, a Votorantim tá até comprando empresa fora do país agora. Olha, mas que beleza! Que maravilha! Que crescimento enorme! Eu sempre penso: um homem igual o Doutor Antônio Ermírio de Moraes, ele poderia pegar esse dinheiro que ele tem, botar no Banco do Brasil lá numa aplicação e viver a vida tranqüila aqui ou fora do Brasil. No entanto ele não pensa essas coisas. Ele sempre dizia, e a gente de vez em quando vê ele na televisão, ele falando a mesma coisa: que ele sempre trabalhou 16 horas por dia. E até hoje ele está vivo! Ele é dois anos só mais novo do que eu, né? Ele tá já, como dizia meu pai, dobrando a serra da Mantiqueira. Mas com, sempre com aquela seriedade, não é? Então, quer dizer, ele poderia guardar o dinheiro e viver a vida dele. E ele não faz isso. Então, talvez ele se sacrifique em alguma coisa pra dar condição pros outros trabalharem. O quanto a maior parte das empresas não faz isso. Ou pelo menos, nunca fizeram. E a Votorantim sempre teve esse pensamento. Ela compra uma empresa aqui, compra uma empresa ali e vai dando emprego e vai sobrevivendo e vai crescendo assustadoramente com a administração desses Ermírio de Moraes que é uma tradição no nosso país. P/1 – O ano que vem faz 90 anos e daqui a dez anos vai fazer 100 anos? Como o senhor imagina o Grupo Votorantim quando fizer 100 anos? R – Eu imagino um crescimento assustador, entendeu? E torço pra isso. Eu torço, por exemplo, quando meus filhos chegarem lá em casa e conta uma novidade lá da siderúrgica eu fico feliz demais. Então eu pensando em siderúrgica que é onde eu vivi e convivi durante 48 anos, eu penso em Votorantim. Votorantim crescendo é uma alegria pra mim, uma alegria muito grande, entendeu? E quando eu vejo ele na televisão eu paro qualquer coisa que eu estiver fazendo pra ouvi-lo. Não que eu seja como disse o nosso amigo lá na ocasião, um puxa-saco. Eu não sou um puxa-saco. Eu não sou puxa-saco, nunca fui. Mas eu sou um admirador muito grande dele. E gostaria sempre que pudesse encontrá-lo, por que não? Bater um papo com ele, que ele sempre foi muito educado com a gente. Sempre me tratou muito bem. Nunca deixou de brincar comigo dizendo que eu tô muito jovem, o que é que eu faço, pra ensinar pra ele. Quer dizer, isso a gente fica muito feliz de conversar com um homem igual ele, que quase não tem tempo pra nada. Porque ele trabalha 16 horas por dia. Ele sempre falou isso. E por que não a gente trabalhar 16 horas por dia? Não, não sente nada. Ao contrário, o trabalho dignifica o homem. E ele dá esse exemplo pra gente. Então eu desejo, sinceramente, não só a SBM, onde eu trabalhei durante tanto tempo, né, e meus filhos trabalham lá também até hoje, mas a Votorantim de um modo geral. Meus filhos levam aqueles boletins; que hoje tem muito boletim lá que sai uma coisa daqui, uma coisa dali, eles levam pra mim ler, eu fico tão feliz de ler aquilo que cês não queiram saber. O quanto eu fico feliz com isso, de ver o crescimento da empresa. E pensar nos meus, nos meus netos, né? Os filhos já estão lá, mas pensar nos meus netos que amanhã vão precisar trabalhar lá, né? P/1 – Qual é a importância do Projeto Memória Votorantim na sua opinião? R – Eu acho excelente! Um modo de não só as pessoas lá de dentro, mas também os de fora, como o meu caso, participar dessas coisa aí que é tão bom, tão bacana, né? Dá assim uma lembrança tão bonita, né? E a gente fica feliz com isso, da oportunidade... Eu, por exemplo, um dia desses foi sexta-feira, eu fui à missa da paróquia de santa Cruz na Vila Nova e estava comentando com um grupinho de amigos que a gente tem lá, inclusive tinha uma sobrinha junto, ela falou: “Uai, mas esse projeto é nas escolas.” Digo: “Não, não é só nas escolas, não.” “Pois eu não tô na escola e eu participei. Por que que é só nas escolas?” Ela começou a rir: “Ah, eu pensei que fosse só nas escolas.” Não é. Então, quer dizer, isso é muito bom. Dá um meio de o pessoal participar, né? Por exemplo, na minha época não tinha visita lá dentro, hoje tem visita. Hoje é só lá marcar que eles deixam os ex-empregados, os parentes, tudo, participar lá dentro. Quando tem lá, por exemplo, uma promoção, qualquer tipo de promoção que eles autorizam o pessoal entrar. Dá prêmio, dá camisa, dá boné, dá isso, dá aquilo, quer dizer, isso é um modo do pessoal lá de fora participar. O que eu sempre pensei como, por exemplo, eu chego em casa, comigo nunca aconteceu, graças a Deus, eu sempre vivi e convivi muito bem com a minha mulher, mas tem pessoas que chegam: “Que que é?”, “Que que foi?”,“Cê demorou...”, “Que que aconteceu?”. Não sabe o que aconteceu com a gente lá dentro. Então por que não, a esposa da gente, os filhos, irem lá conhecer o trabalho que a gente tem lá dentro? Que de repente, você tá conversando: “E, já parou tudo”; “Ah, desculpe eu tive que ir ali ver um negócio”; “Não porque lá foi mais urgente.” Então a família, às vezes, não sabe disso. Então isso é muito bom, esse projeto que a siderúrgica tá abrindo mão pra participação do povo em geral, né? P/1 – De que maneira o senhor acha que esse Projeto Memória pode interagir na Siderúrgica Barra Mansa? Alguma sugestão? R – Olha. Sinceramente, eu não tenho uma idéia própria sobre isso. Mas a gente vai acompanhando e a gente vai chegando lá, né? A gente vai vendo o crescimento, né, e a gente vai acompanhando. Acompanhar a gente acompanha até o meu último dia de vida, se Deus quiser (risos). P/1 – O senhor podia deixar uma mensagem pros 70 anos da Barra Mansa? R – A mensagem que eu deixo é exatamente o que eu, modéstia à parte, procurei fazer lá dentro. É trabalhar com honestidade, lutar em prol dos menos favorecidos, não é? Para que a siderúrgica não só possa crescer em si, mas também deixar o pessoal crescer também. Porque hoje tá tão difícil, né? Cada um que entra lá é pior que o outro, né? Imagina o governo atual dá 3,3% de aumento para o aposentado, é uma brincadeira. Quer matar os aposentados. Então que o crescimento das empresas ajude os nossos governantes a fazer coisas melhores, né? Lá, por exemplo, a siderúrgica; uma coisa que eu esqueci de falar que era o pensamento do Doutor Francisco e normalmente era do Doutor Antônio, com certeza. É que, por exemplo, você tem um genro que está desempregado, pra onde ele vai? Pra sua casa com a sua filha e tudo, não é? Então é mais uma despesa. Então vamos botar ele aqui dentro. Então eles me recomendavam, eu que tava naquela época na divisão pessoal e fora eles conversavam muito comigo, falavam: “Quando você souber que tem alguém que está desempregado convida ele pra vir trabalhar aqui.” “Que é menos uma boca que vai na casa do pai pra comer.” Ó, isso será que hoje tem algum empresário que pensa isso? Eu acho que não. E isso é exatamente pensamento do Doutor Antônio Ermírio de Moraes, que ele passava pros seus diretores, né? Que mais um, menos um não vai alterar nada dentro da empresa. Então é preferível tirar a despesa que ele está tendo na casa do sogro, do que ficar com menos um aqui na siderúrgica. Então entra. “Vamo, vamo trabalhar”. Se é trabalhador, põe pra dentro. Então eu acho que isso aí, a siderúrgica crescendo; quanto mais ela crescer, mais emprego ela vai dar. Se Deus quiser. Isso que eu passo pra turma, principalmente aqueles que a gente gosta, tem interesse que eles sigam o caminho que a gente seguiu, né? Tá certo? P/1 – O que o senhor achou de dar o depoimento? R – Como? P/1 – O que o senhor achou de dar esse depoimento? R – Eu fiquei feliz, quando eu fiquei sabendo que iam me convocar. Porque o ano passado eu fiz o mesmo papel que eu fiz esse ano, mas o meu filho deu uma bobeada lá e não deu entrada. Acho que atrasou, não sei o quê, não deu entrada no papel. Então esse ano ele me avisou com antecedência. “Pai, vai ter a mesma coisa que teve o ano passado.” “Ih, então segura lá.” “Segura que eu vou fazer outro.” E fiz. E depois que eu fui chamado então, olha, não queira saber a alegria que eu tive, que o Paulo Henrique perguntou: “Ah, perguntaram pai, se o senhor vai em São Paulo? Se o senhor vai no Rio?”; “Eu vou onde eles mandarem. Vou onde eles mandarem”, “Não tem problema nenhum, né?”. Lá dentro da siderúrgica, em São Paulo, no Rio, em qualquer lugar. Porque só em falar da siderúrgica, já me enche a boca, enche a boca de vontade de querer falar mais, sobre a SBM. Sem nenhum puxa-saquismo. Conforme eu já repeti diversas vezes. Eu tô há 12 anos fora de lá. não dependo, graças a Deus, de nada lá. A não ser os meus filhos, os meus netos que eu quero que coloquem lá, né? Mas eu pessoalmente, não tem nada. Mas o que eu tenho hoje, eu sempre digo, eu tenho pouco, mas o pouco quem me deu foi a SBM. Inclusive essa casa. Eu não tenho só essa, eu tenho outras. Tenho outras que, graças a Deus, eu consegui com o dinheiro que eu ganhei lá dentro da siderúrgica, né? Então eu fico muito feliz. Muito feliz mesmo quando eu posso conversar com alguém de dentro da SBM. Hoje, por exemplo, tem tanta gente lá que eu não conheço, entendeu? Às vezes, o meu filho chega, fala: “Ah, o fulano de tal foi mandado embora. E entrou fulano de tal.” E eu não sei nem quem saiu, nem quem entrou. Eu fico chateado, porque eu gostaria de saber. Então, na época eu conhecia Deus e todo mundo lá dentro. Porque todo mundo me procurava, pra emprego, pra transferência, pra troca de casa, pra não sei o quê. Tudo era comigo primeiro, porque conforme eu disse, muita gente lá tinha medo do Doutor Francisco, por causa desse modo dele agir. Ele é um cara fora de série. Mas o pessoal não achava desse jeito. Então falava: “Fala com o Paulo Seixas, o Paulo Seixas vai.” Então a pessoa me procurava e eu ia. falava e muitas vezes eu consegui; Nós tivemos, por exemplo, um caso lá específico que foi uma pessoa até que já morreu, deve ter uns quatro a cinco anos que ele morreu, mas ele tinha uma filha com problema sério, entendeu? E ele morava na casa da empresa e depois ele se mudou, porque achou que a casa estava fazendo mal pra filha dele. Aí ele mudou. Mas depois a coisa apertou e ele voltou pra querer a casa outra vez. E como ele não era muito bem quisto dentro da empresa, eu fui falar com o Doutor Francisco: “Ah, Paulo não, que o senhor veio me trazer um problema aqui.” “Que ele não merece.” “Não, pera aí. Pera aí, doutor. Mas não é ele, é a filha dele. A siderúrgica não tem um pensamento de ajudar as famílias? Então vamos ajudar essa menina. Ajudar essa menina que tá precisando.” Aí resultado: eles fizeram tanta besteira, ele deu a casa, ele deu. O cidadão voltou, ficou morando lá durante muito tempo. E aconteceu um fato exatamente que a gente estava prevendo. Ele deixou; Eles não queriam mas veio outra menina pra tirar o sangue dela pra dar pra primeira. Só que a primeira morreu. Logo que a segunda nasceu ela morreu. Quer dizer, não esperou o sangue da segunda. Então são coisas que; Pelo menos a siderúrgica fez o lado dela. Porque deu a casa pra ele pra diminuir a despesa dele. Então a gente tinha lá diversos casos desse. Tem um outro caso, por exemplo, da Laminação, uma ocasião tinha uma menina que estava dos pés à cabeça engessada porque tinha um problema sério. E Barra Mansa já não tinha mais onde tratar dessa moça. E um cidadão em conversa, na hora do almoço, sentado na mesa ele me contou a história dela. Eu não falei nada com ele não, fiquei quieto. Eu não vou falar nada, né? Aí acabei o almoço e já fui direto na sala do Doutor Francisco, e contei: “Tem um cara da Laminação assim, assim, assim.” Ele falou: “Manda chamar, manda chamar que eu quero falar com ele.” Chamou e determinou e nós mandamos ela aqui pro Rio de Janeiro, talvez, umas dez ou 15 vezes a ambulância vinha, trazia ela, levava, né? E hoje ela tá uma moça lá pra ninguém botar defeito. E o pai dela quando encontra com a gente fica numa felicidade que só vendo. Quer dizer, coisa que a siderúrgica se não salvou a vida dela, pelo menos ajudou. Ajudou porque ela tava assim vamos dizer, a pão e laranja, né? E a siderúrgica ajudou. Então são coisas que a gente fazia lá dentro em nome da siderúrgica. Hoje eu passo pelo pessoal: “Ah, você foi ta-na-na.” Eu não fui nada. Quem foi é a siderúrgica. Eu em nome dela é que eu fazia isso, né? E a gente fazia tudo aquilo que ele concordava, tanto que nós somos amigos até hoje. Então eu fico feliz com isso, viu? Quando a siderúrgica me convida pra qualquer coisa eu fico muito feliz mesmo. Não choro, porque eu não sou muito de chorar. Mas quando eu tô no meu quartinho fechado lá, eu fico, quase que a lágrima desce (risos). P/1 – Em um minutinho o senhor poderia falar um pouco do seu trabalho hoje? R – Hoje? P/1 – Isso, bem rapidinho. R – Hoje, o meu trabalho é o seguinte: meus filhos me pergunta: “pai o que que o senhor tem pra fazer amanhã?” E eu sei lá o que é que eu tenho pra fazer amanhã. Aposentado não tem nada o que fazer. Mas eu vou me comprometer com eles? Então eu não sei o que é que eu vou fazer amanhã? Então eu sou hoje um aposentado toda ora. Quem quiser me encontrar, não vai lá em casa, não. Porque não me vê. Eu tô na rua. Eu moro no centro da cidade e toda hora tô na rua. Passeando, batendo um papo na esquina, com um, com outro. E agora então que eu comecei a trabalhar numa rádio. Então, nossa senhora! Como tem gente, há poucos dias mesmo eu tava num supermercado e quando cheguei no caixa, tô conversando com a moça, uma dona lá dos seus 60 e qualquer coisa, bateu no meu ombro: “O senhor que é o seu Paulo Seixas?”; “A senhora me conhece?”; “Ah, eu conheci pela voz.” Então, quer dizer, esse é o meu trabalho hoje. É conversar, é bater papo, é trocar idéias, né? E eu hoje, por exemplo, trouxe um punhado de abraços pro Doutor Francisco, pessoas que a gente conhece na rua, né? É isso, esse é o que eu gosto de fazer e estou fazendo, porque não tem outra coisa pra fazer agora. E cuidar dos netos. Porque aí essa turma vai até pra baile. Sábado foi, deixou duas meninas comigo. Até quatro horas da madrugada. Oita. É brincadeira, né? Mas tudo bem (risos). P/1 – Em nome do Museu da Pessoa e do Projeto Memória Votorantim, nós agradecemos a sua entrevista. R – Muito obrigado. Eu que agradeço a vocês. E sempre que quiserem eu estou a disposição. Não sei se eu falei o que vocês queriam, mas falei o que eu gostaria de falar, tá? P/1 – Falou e disse! R – Muito obrigado a vocês. Uma boa tarde e até uma outra oportunidade se deus quiser. E Deus quer. P/1 – Obrigada. R – Brigado, hein? Muito obrigado. P/2 – Cuidado que o senhor passou no microfone. R – Tá. Eu tô de olho nele aqui. Obrigado, hein?
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