P1 - Para começar eu queria que você me desse o seu nome, onde você nasceu, o nome de seus pais.
R - Rubens José Paulella, nasci em São Paulo, em 13 de maio de 1943. Nome do pai, Nicola Paulella, nome da mãe, Antonia Pascalle Paulella.
P1 - Você podia falar, pelo nome, um pouquinho da origem de seus pais e o que eles faziam?
R - Meu pai, por parte de meu pai, são italianos, imigrantes...
P1 - Ele era imigrante?
R Meu pai, não. Meu pai nasceu aqui e meu avô chegou ao Brasil em 1898, 99, pequeno, se casou aqui, teve filhos. Minha avó também veio mais ou menos nessa época, no começo do século. Os dois originários do sul da Itália. Meu avô, próximo da região de Nápoles, uma cidade, Accerra, fica a uns 20 km próximo a Nápoles, no Sul da Itália. Minha avó também do sul da Itália, da Calábria. Eles se casaram aqui, tiveram três filhos e meu pai nasceu em 1917. A origem é 100% italiana por parte de pai.
P1 - E eles vieram, você sabe o motivo?
R - Vieram porque, eu tive oportunidade de ver, há alguns anos, de onde eles vieram, fui lá ver. Ainda hoje não mudou muito. Era uma região muito pobre, eles eram agricultores, deviam ser fruticultores, porque até hoje tem muita fruticultura nessa região. Como a vida era difícil, a ideia da América despertava os imigrantes naquela época, e eles vieram para tentar fazer a vida num país novo, como a maioria dos imigrantes. Não vieram, assim, contratados pelos "gatos" da época para ir pro interior, não. Vieram com algum dinheiro que eles tinham e acabaram vindo pra cá, alguns amigos que eles tinham aqui na época. Eu realmente não sei detalhes.
P1 - Eles vieram para São Paulo?
R - Vieram para São Paulo mesmo. Se instalaram na região onde é o Conjunto Nacional hoje. Atrás do Conjunto Nacional tinha chácaras, lá. Hoje eu acho que eles não deviam ter vendido nada daquilo, porque se tivesse até hoje, seria muito bom. Uns quarteirões atrás do Conjunto Nacional...
Continuar leituraP1 - Para começar eu queria que você me desse o seu nome, onde você nasceu, o nome de seus pais.
R - Rubens José Paulella, nasci em São Paulo, em 13 de maio de 1943. Nome do pai, Nicola Paulella, nome da mãe, Antonia Pascalle Paulella.
P1 - Você podia falar, pelo nome, um pouquinho da origem de seus pais e o que eles faziam?
R - Meu pai, por parte de meu pai, são italianos, imigrantes...
P1 - Ele era imigrante?
R Meu pai, não. Meu pai nasceu aqui e meu avô chegou ao Brasil em 1898, 99, pequeno, se casou aqui, teve filhos. Minha avó também veio mais ou menos nessa época, no começo do século. Os dois originários do sul da Itália. Meu avô, próximo da região de Nápoles, uma cidade, Accerra, fica a uns 20 km próximo a Nápoles, no Sul da Itália. Minha avó também do sul da Itália, da Calábria. Eles se casaram aqui, tiveram três filhos e meu pai nasceu em 1917. A origem é 100% italiana por parte de pai.
P1 - E eles vieram, você sabe o motivo?
R - Vieram porque, eu tive oportunidade de ver, há alguns anos, de onde eles vieram, fui lá ver. Ainda hoje não mudou muito. Era uma região muito pobre, eles eram agricultores, deviam ser fruticultores, porque até hoje tem muita fruticultura nessa região. Como a vida era difícil, a ideia da América despertava os imigrantes naquela época, e eles vieram para tentar fazer a vida num país novo, como a maioria dos imigrantes. Não vieram, assim, contratados pelos "gatos" da época para ir pro interior, não. Vieram com algum dinheiro que eles tinham e acabaram vindo pra cá, alguns amigos que eles tinham aqui na época. Eu realmente não sei detalhes.
P1 - Eles vieram para São Paulo?
R - Vieram para São Paulo mesmo. Se instalaram na região onde é o Conjunto Nacional hoje. Atrás do Conjunto Nacional tinha chácaras, lá. Hoje eu acho que eles não deviam ter vendido nada daquilo, porque se tivesse até hoje, seria muito bom. Uns quarteirões atrás do Conjunto Nacional não seria mal, hoje.
P1 - Pois é! [risos]
R - Mas não foi o que eles fizeram. Então, eles vieram e começaram a fazer realmente o que eles sabiam fazer na Itália. Com algum dinheiro, eles compraram um terreno e eram chacareiros, né? Produziam flores, verduras, e tal, e começaram a trabalhar com isso nessa região.
P1 - Isso seu avô?
R - Meu avô.
P1 - Mas a sua avó ele conheceu aqui?
R - Minha avó ele conheceu aqui. Porque na região, ali, os italianos se reuniam, tal, na missa, no fim de semana, e acabaram se conhecendo. Então, meu pai nasceu aqui, mas, infelizmente, eles não se deram muito bem e meu pai teve uma situação muito complicada, porque os pais, depois, se separaram, ele acabou ficando meio sozinho e tal. Meu pai teve uma vida muito atribulada, não estudou muito, ele tinha instrução primária, começou a trabalhar desde garoto.
P1 - Ele trabalhou com os pais?
R - Não, não. No fim, ele não ficava nem com o pai, nem com a mãe, era meio jogado pra lá e pra cá, teve uma vida muito complicada. E começou a ter profissão: encanador, mecânico, coisas desse tipo, como ele não estudou, não tinha recursos. E assim foi até conhecer minha mãe. Se casou em 1940, 1941, e ele, realmente, apesar de não ter instrução, era ambicioso, queria ser comerciante, industrial, uma série de coisas. Realmente chegou a ter comércio, a ter indústria. Então, a gente teve uma vida, até um certo tempo, boa, depois que ele conseguiu alavancar.
P1 - Ele fez só o primário?
R - Ele fez o primário, os pais eram separados, ele viveu jogado. Minha avó ficou sozinha e meu avô arrumou uma outra mulher. Aí, sabe como é, filho mais velho, não ficava nem na casa do pai, porque tinha a madrasta, não ficava na casa da mãe, porque tinha outro padrasto também, ele ficou meio jogado. As histórias que ele contava, realmente passou meio mal, não tinha suporte nenhum, não pôde estudar e tal. Mas era um cara muito esforçado, queria mostrar que podia evoluir, apesar dessa dificuldade toda. Chegou a ter comércio, uma indústria, logo depois da guerra, uma indústria mecânica de parafuso. Infelizmente, ele faleceu muito moço, com 38 anos de idade. Um troço meio absurdo, uma operação simples e ele acabou falecendo com 38, em 56. Neste período, casou com minha mãe em 40 e pouco, eu e meu irmão tivemos uma vida razoável nesse período, apesar de que teve uma situação muito humilde como comerciante ,a gente acabou tendo condições de estudar e de evoluir, até ele morrer, até 56.
P1 - E a sua mãe?
R - A minha mãe nasceu na Itália, veio com dois anos de idade.
P1 - Ela chamava?
R - Antonia. Tem uma tia que chama Antonia também. Italiano tem esse negócio de______ Ela nasceu, é a quarta ou quinta filha, e eles vieram em 1925. É um pouco diferente, eles vieram porque o meu avô, pai dela, participou dos quatro anos da Primeira Guerra Mundial, sofreu um bocado, ficou meio atrapalhado durante vários anos por causa dos bombardeios. A Primeira Guerra foi um negócio muito pior que a Segunda, porque eles viviam em trincheiras, um negócio bastante difícil. Ele ficou os quatro anos na guerra. A guerra terminou em 18, de 18 a 25 começaram aqueles movimentos na Europa, o filho mais velho era homem, depois ele tinha duas meninas e a terceira acho que era minha mãe. Ele, com a preocupação que poderia vir outra guerra e que o filho poderia ir pra guerra, eles resolveram imigrar. Tinha algumas pessoas que já estavam aqui no Brasil, tinham vindo antes.
P1 - Parentes?
R - Não, mas na região onde eles moravam eram conhecidos. Quer dizer, pra você ter uma ideia, o Matarazzo veio dessa região, os Dicunto vieram dessa região. Essa região, ao sul de Salerno, Santa Maria de _______, fica a uns 50 km ao sul de Salerno. Muitas pessoas, muitos italianos imigraram nessa época pra cá. Então tinha muitos conhecidos, nem tanto parentes, ou meio parentes.
(Interrupção na fita)
R - Com receio de uma nova guerra ele resolveu vir pra cá. Ele veio antes, acho que em 22, 23, pra conhecer, ver a região, ver as pessoas que estavam aqui. Ficou uns meses, voltou pra Itália, e veio com a família toda. Minha mãe era a última que tinha nascido.
P1 - Lá ele fazia o quê?
R Lá eles eram, também, eles moravam numa região... Eles eram agricultores também, eu acho. Não tanto quanto os outros, do outro lado, mas a região é árida, muito complicada. Acho que eles viviam com o pai, ele vivia com o pai, porque ele era o mais velho, aquela ideia de italiano, que o primogênito tem que estar sempre com o pai, aquele negócio todo. Eles moravam com os pais e tinham um terreno relativamente grande, e eu acho que na época eles viviam da agricultura também. Eles produziam oliva, azeite... Fui lá ver a casa, uma casa de pedra, muito bonita. Alguns parentes dele ficaram lá. Na realidade, ele veio, que era o irmão mais velho, deixou os pais lá porque acho que a guerra deve ter influenciado muito ele. Então, também eram agricultores, e a atividade dele, quando ele chegou, passou a ser o que muitos italianos ali naquela região da Vila Clementino, Vila Mariana, faziam; porque tinha um Matadouro Municipal, não sei se vocês conhecem, perto de onde é hoje a Senna Madureira, onde tem aquela pracinha.
P1 - Cinemateca...
R - Não sei o que é hoje lá. O pessoal reformou tudo aquilo, é o antigo matadouro. Então, esse pessoal que veio, fazer o quê, vinham os bois do interior, tinha o matadouro, e eles tinham a carroça com o cavalinho deles. Compravam ali os miúdos e saíam pela região vendendo. Durante vários anos ele fez isso. Ele tinha...
P1 - Ele era distribuidor.
R - Um cavalo pequenininho, tinha uma cocheira, tinha uma carroça especial, que era refrigerada na base do gelo, né, não tinha nada nem de gás, querosene, para congelar. E ele vendia para uma freguesia de uma determinada região, eles dividiam o mercado entre eles e ele vendia miúdos de boi: coração, fígado, pela região. Saía cedinho e passava no matadouro, ou saía um dia antes e passava no matadouro, e tinha aquelas geladeiras em que você botava aquelas pedras de gelo enormes, e no dia seguinte de manhã ele saía vendendo e logo depois do almoço ele voltava. E com isso ele viveu e custeou a família dele, por parte da minha mãe. E teve mais três filhos no Brasil.
P1 - Então, são...
R - Ao todo são cinco do lado da minha mãe, e do outro lado eram três, meu pai e duas irmãs. E o outro avô, do lado do meu pai, eles começaram com chácaras, e não sei porque razão não deu certo e depois eles mudaram e ele foi pro lado do Bairro do Limão, e ele também passou a fazer o transporte com carroça; esse negócio devia ser importante na época. Ele tinha ponto no Largo do Arouche, vinha do Bairro do Limão até o Arouche. Era um tipo de carro de aluguel, caminhão de aluguel, só que era com cavalinho. Ele fazia transportes, mudança, tal, com a carroça. Depois de um certo tempo ele passou a ter uma camionete, evoluiu bastante. [risos]. Viveu sempre disso, se aposentou com isso. A origem é bem de imigrantes, os dois bem simples. Eu até aproveito com meus filhos, com meus netos, agora, dizer como é que a gente, a evolução natural que o Brasil permite. O exemplo: duas famílias, imigrantes, humildes, os pais mais ou menos, minha mãe também não chegou a ter instrução secundária, foi trabalhar na fábrica também, em 1930, quando começou a industrialização. Foi trabalhar numa tecelagem durante algum tempo. Você vê, a terceira geração, a maioria os filhos já conseguiu estudar, evoluir. Então, tem uma mobilidade social enorme aqui no Brasil, ao contrário da Europa. Lá, talvez, eles estariam ainda como agricultores, como muitos que estão lá fazendo isso. O Brasil, o que permitia muito para os imigrantes, pra maioria deles, é essa mobilidade de em duas ou três gerações... Na Europa, quem ficou lá não conseguiu. Quem tem parentes lá e vai ver, melhoraram de vida, evidentemente, não é como no século passado a dificuldade, mas não têm uma mobilidade social tão grande como alguns que evoluíram muito no aspecto econômico-financeiro, ficaram milionários e ricos, outros nem tanto, mas evoluíram na bagagem cultural, no conhecimento. Quer dizer, tem um progresso enorme, e a história da maioria dos imigrantes é essa.
P1 - Eles se conheceram como? Você sabe a história?
R Meu pai, na época - são as histórias que eu ouvia -, era encanador, tinha oficina na região da Vila Mariana, próximo ao Largo Ana Rosa, por ali. E minha mãe trabalhava numa fábrica ali por perto. Minha mãe era muito novinha, acho que 16, 17 anos, porque ela casou jovem.
P1 - Ela trabalhava na fábrica?
R - Trabalhava numa fábrica, numa tecelagem, uma operária. Pelo que eu sei, ela passava ali todo o dia e tal, e quem trabalhava junto com meu pai, e acabou sendo o meu padrinho de crisma, mais tarde, conhecia alguma coisa da família do meu avô, e, por alguma coisa, se apresentaram ou forçaram o contato; e foi indo, foi indo e casaram. E se foi de passar na frente da oficina que ele tinha e ela ia pra fábrica. Se conheceram e casaram.
P1 - E você tem dois irmãos?
R - Um só. Eu sou o mais velho.
P1 - E você tem lembrança desse período da sua infância, onde vocês foram morar...
R - É, foi complicado também. No começo foi bem, meu pai casou, tinha uma condição, depois da oficina de encanador ele montou uma fábrica próxima ao Matadouro, não sei se você conhece, existe o prédio, é um prédio muito antigo quase ao lado da Senna Madureira. Ele montou uma fabriqueta metalúrgica. Acho que existe ainda esse prédio.
P2 - Esse prédio tá lá, sim.
R - A gente morava ali perto, do outro lado, onde é a Senna Madureira, tinha um córrego ali embaixo. Na rua... não me lembro o nome agora, mas é ali perto. Então, durante esse período, a gente teve uma vida relativamente boa, tanto eu como meu irmão fomos pra escola, na época, uma classe média-média. Depois veio a guerra, essa parte de metalúrgica, por causa da importação, teve muito problema, não deu certo, fechou. Primeiro transferiu aqui para Santo Amaro, abandonou lá e fez uma aqui, muito maior. Começou a produzir peças, isso um pouco antes da abertura das importações, logo depois da guerra. Quando o governo Dutra abriu as importações e os preços caíram, a indústria nacional foi à falência. Perdeu tudo. A gente pensa :"Puxa vida, hoje podia ser diferente", mas a vida é assim. Aí ele passou mal uns tempos, teve dívida e tal, mas ele resolveu, ele, um tio meu, irmão mais velho da minha mãe, eles eram sócios. Um cara bem diferente, meu pai era agressivo, comerciante, e o outro controlador, contador, mais quieto. Mas foram à falência, deu problema, tinham que acertar as dívidas. Passou um pouco mal, morava aqui em Santo Amaro, nessa época. Passava boiada aqui perto da João Dias. Eu lembro que pequenininho a gente ia pra escola, aquele colégio Jesus Maria José, que tem na Adolfo Pinheiro, ali do lado, duas vezes por semana, quando a gente saía da escola, passava boiada. Isso em 1949, 50. Tinha peões que passavam tocando boi, devia ter algum matadouro aqui por perto. Eu lembro porque a gente saía da escola e tinha que esperar passar a boiada pra ir pra casa.
P1 - Isso era escola pública?
R - Não, era de padres ou freiras. Ainda tem essa escola.
P1 - Eram religiosos na sua casa?
R - Não, não era muito, mas sempre botaram em escola de padre. Nunca me convenceram muito, mas uma boa parte do estudo foi... Depois fui pro Santo Agostinho, não sei porque razão. Mas meu pai virou espírita, depois de um tempo, não era nem católico, é um pouco confuso esse negócio. Então, morava aqui em Santo Amaro e aí foi o fim da guerra, faliu, fechou a fábrica e tal. E ele montou um comércio de - ele era bem oportunista - eletrodomésticos na Vila Mariana. Então, começou a aparecer liquidificador novo, coisa que era importada, liquidificador Wallita, Arno também, começou a aparecer, eu lembro, tinha uns 8, 10 anos, tinha aqueles discos de acetato, velhos, começou a aparecer o Long-Play em 52, 53. Então, tudo que era novidade trazia, e começou a vender bem, e deu uma recuperada. Até 56, que foi o ano em que ele faleceu, ele tinha esse comércio e a gente teve uma vida razoável, depois mudou bastante. Em 56 ele teve que fazer uma operação banal, de hérnia umbilical, e complicou, deu problema acho, mas hoje eu acho que foi barbeiragem de médico na época, porque depois o médico alegou infarto do miocárdio. Ele era diabético e operaram, quer dizer, hoje a gente acha que foi um pouco complicado. Mas, enfim, ele foi operado, era uma hérnia umbilical muito grande, tinha que operar mesmo, não resistiu e veio a falecer. Eu tinha 13 e meu irmão tinha 10 anos. E a gente ficou meio perdido, porque minha mãe era dona de casa, não tocava nada, não conhecia nada e não tinha habilidade para conhecer e tocar o negócio, que já não estava indo tão bem naquele momento. A gente acabou passando aquilo para frente e ficando meio na base de morar na casa de parente, casa de tio, tia, porque a gente não tinha um seguro, nada.
P1 - Vocês ficaram sem dinheiro e sem nenhuma renda?
R - De repente, você tinha uma vida legal e puf, esvaziou tudo. Eu estudava no colégio Santo Agostinho, tanto eu como meu irmão, não sei porque razão, no colégio dos padres. Pago, na época. Ele faleceu e nós fomos morar na casa de uma tia minha, eu e minha mãe. Meu irmão acabou não ficando conosco, foi morar em Santos, com uma madrinha dele que insistiu muito que ele fosse pra lá. Minha mãe concordou, não sei como foi esse processo, deve ter sido meio difícil, doloroso, mas acabou indo pra lá. Minha mãe foi trabalhar na Pro Mater Paulista, na área de farmácia da Pro Mater, ficou vários anos trabalhando lá, até se aposentar. Eu tinha 13 anos, e não dava pra trabalhar ainda, nós negociamos no Santo Agostinho uma bolsa de estudo, porque não podíamos pagar. Na época eu era meio caxias, era um bom aluno, então os padres acharam: "Não, bom, você é um bom aluno, você continua, a gente dá a bolsa". Então eu continuei estudando lá meio na faixa. E com 15 anos eu comecei a trabalhar e deixei o Santo Agostinho, fui estudar à noite no Colégio Paulistano. Comecei a trabalhar com escrituração fiscal, em boteco...
P1 - Trabalhar onde?
R - Escrituração fiscal. Antigamente existia um contador que fazia a escrituração fiscal em farmácia, padaria, tinha livros fiscais. Eu estudava à noite e durante o dia eu trabalhava num negócio desses.
P1 - Você fazia contas?
R - Fazia conta, escrituração, era um auxiliar. Tinha um escritório que prestava serviço em diversas firmas e eu ia nas firmas, era funcionário do escritório. Acho que uns dois anos, mais ou menos. Depois, com 17, 18 anos, fui trabalhar na Wallita, acabei o curso da noite e fui trabalhar na Wallita, em 1960.
P1 - Isso tudo morando na casa da sua tia? Vocês ficaram sem casa?
R - Sem nada, com uma mão na frente e outra atrás. Minha mãe era uma pessoa muito mais dependente, ficou meio atrapalhada, ela não tinha iniciativa pra tocar o negócio do meu pai. Então essa minha tia, tia e tio, a gente foi morar com eles, e na época, não é que eu pagava, mas eu me sentia na obrigação de fazer alguma coisa, e eu gostava muito de desenho, e meu tio era empreiteiro de obra e eu fazia os desenhos para ele, as plantas, como uma forma de ajudar, de contribuir. E minha mãe já tinha começado a trabalhar também. Então, nós ficamos de 56 até 61, 62, por aí. Comecei a trabalhar em 60, quando achei que dava para a gente mudar, morar sozinho, a gente alugou um apartamento, eu e minha mãe, e fomos morar juntos, eu e ela. Aí deixamos meus tios, que ajudaram muito a gente nessa época.
P1 - E o seu irmão, lá em Santos?
R - Meu irmão continuou. Meu irmão ficou lá, para ele ficou complicado também, porque era pequeno, com 10 anos, mas não tinha como ficar. Até hoje tem umas mágoas com relação a essa mudança. Eu entendo porque minha mãe fez isso, ele talvez não entenda porque ele passou maus bocados, ficou sem a mãe, ficou fora, então tem uns problemas de relacionamento. Ele ficou lá e, por sorte dele, estudou lá, o padrinho era despachante aduaneiro, tinha uma empresa de despacho em Santos, ele evoluiu, ficou com isso, tá muito bem, é dono da empresa de despacho, tem uma família, tá muito bem. Para ele foi bom, mas ele passou também um tempinho meio ruim em função dessa mudança. Eu comecei a trabalhar e fui morar sozinho, minha mãe trabalhava, eu trabalhava e fomos tocando a vida.
P1 - Você tinha uns 18 anos?
R - Tinha uns 17, por aí. Fui trabalhar com 15, mas ainda estava na casa da minha tia, fiz dois anos de escrituração fiscal.
P1 - Foi quando você entrou na Wallita, que deu um...
R Pois é, na Wallita, já trabalhando o dia todo, com um salário melhorzinho, já dava pra pagar um apartamento, aí nós... Porque era complicado também, na casa da minha tia, eles tinham filho também, era apertado. Quando deu para a gente sair de lá e não incomodar mais, a gente saiu. Começamos... Eu trabalhei....
P1 - E você ficou muito triste depois da morte do seu pai, assim...
R - Foi duro, né? Imagina, quem com 13 anos perde o pai, é quando você mais precisa de um pai. A gente tem que se colocar um pouco nos anos 56 e não anos 90. É quando você mais precisa, para ter orientação, ter abertura para conversar com o pai, eu não tive, estava só eu, tinha que me virar sozinho. Dos parentes você tem ajuda, mas nunca é como você ter o pai e a mãe. Minha mãe também era muito, não tinha instrução superior. Então, foi um período difícil, complicado. Mas aí, como tinha as histórias do meu pai, que também tinha problemas quando pequeno, o que dava como impulso era: "Puxa, eu tenho que reverter esse negócio, eu tenho que ser alguém, tenho que estudar, sei lá".
P1 - Isso ficava na sua cabeça?
R - Ficava. Tenho que fazer alguma coisa porque, mesmo na casa de parentes, não é a mesma coisa, sempre tem seu filho, sempre, a situação é... Acho que isso, tanto pra mim quanto pro meu irmão, foi um motivador, um estimulador: "Precisamos alavancar, precisamos fazer alguma coisa diferente na vida, não podemos ficar nessa situação".
P1 - A sua mãe cobrava isso de vocês?
R - Não, ela não cobrava, mas uma coisa importante é que ela nunca mediu esforço nenhum para ajudar a gente, que tinha que estudar, que tinha que pagar, ela sempre se esforçou, nunca fez nenhuma restrição, o fato de _________ era um investimento que ia fazer na educação. Ela não cobrava, mas ela ajudava. Quando precisava alguma coisa que queria fazer mas não tinha, então, tinha o apoio dela, ou financeiro, ou moral. Mas cobrança, não. Foi um período difícil, mas foi de buscar lá dentro o que tinha que fazer.
P1 - E a entrada na Wallita foi por quê?
R - A Wallita foi porque um primo meu, que nós morávamos juntos, também trabalhava na Wallita e surgiu uma oportunidade da área de tesouraria, e ele comentou em casa: "tem uma vaga, você não quer tentar?" "Vamos, vamos tentar, vamos fazer e tal". Começou assim, eu fui fazer um teste, entrevistas e tal, e acabei entrando. Ele trabalhava lá, também, e acabei entrando lá.
P1 - Mas você tinha sempre essa aproximação, na sua ideia, essa coisa de ser alguma coisa relativa à economia, ser economista...
R - Não, eu tinha, quando menor, eu tinha intenção de fazer medicina. Felizmente não fiz, porque seria um péssimo médico. Eu gostava de biologia na escola, estudava, mas depois que meu pai faleceu a cabeça mudou: "Eu não vou conseguir. Para sobreviver tem que morar com os outros. Tinha que trabalhar. Jamais vou fazer um curso de medicina, primeiro porque não tem como pagar, segundo não tenho como sobreviver, ninguém vai me financiar". Os parentes também não tinham condições de financiar. Então, saiu da cabeça: "não, não vou fazer, mas vou estudar alguma coisa e ver lá na frente o que é que dá". Economia e administração surgiu com o pessoal da Wallita, porque quando eu entrei, eu trabalhei um ano na tesouraria, dia 5, dia 10 e dia 30 batia cheque que nem um desesperado na máquina. Sou um ótimo datilógrafo, até hoje. Batia cheque que nem um desesperado, nesses dias que eram de pagamento, de vencimento. Fiquei mais ou menos um ano nessa área de tesouraria e surgiu na Wallita, naquele momento, na área de análise de custos, na área de valor, auditoria de contas, tal, tinha uma turminha boa na Wallita ___________________- surgiu uma oportunidade e eu me candidatei: "Puxa, vamos evoluir!" Tinha uns testes para fazer e tal e eu saí da área em que eu estava, que era financeira, tesouraria, para essa área de análise de custo, de valor, orçamentária, que era uma área bem valorizada, porque o diretor financeiro era um camarada que tinha vindo da Faculdade de Economia da USP, tinha vários economistas saídos da USP, tinha uma mafiazinha, lá, do pessoal da USP. Eu entrei nesse meio, então surgiu um pouco por aí o interesse de fazer economia, administração: "O meu caminho tá por aqui, porque dá para estudar à noite, dá para fazer". Então, economia saiu por aí, o pessoal também me estimulou um pouco para fazer, e na época foi um pulo importante, porque eu saí de um lugar para o outro, evoluiu bastante o salário, mudou de patamar e tal. Eu fiquei nessa área uns 4 anos, mais ou menos, e aprendi muita coisa, aprendi análise de valor, análise de custo, estudo de tempo na fábrica. Passava na fábrica para ver a montagem dos equipamentos. Foi um período em que eu trabalhava, mas é como se fosse um tremendo de um estágio, um treinamento, muito importante para conhecer um monte de coisa. Foi muito importante, aproveitei muito bem esse tempo. Eles me estimularam a fazer administração e economia. Daí que surgiu e eu fiz economia.
P1 - Aí você conseguiu entrar na universidade?
R - Aí entrou um problema, porque o pessoal me colocou numa gelada: eu tinha que ir pra USP, de qualquer maneira, a máfia era USP, e eu fiz os exames e por azar fui reprovado em história, da famosa professora Canabrava; na época, faltou meio ponto para eu passar e eu não passei. Eu tinha feito em outras faculdades, na Mackenzie, na São Luís também, passei. Fiz na segunda chamada, fiz na USP, não deu, fiz na segunda chamada, passei. Aí eu falei: "Não vou perder o ano, vou fazer outra faculdade, depois eu volto". "Ah, não pode, que essa faculdade não é boa", não sei o quê... Mas eu acabei fazendo a outra mesmo, porque eu não queria perder um ano, eu queria ganhar. Aí, ficou um pouco (fim do lado A)
________ e tal, tanto que depois não me valorizaram, quando me formei tive que cair fora ________ não servia, a formação era outra. Acabei saindo de lá por causa disso. Mas eu entrei e fiz economia na São Luís e depois fiz administração no Mackenzie.
P1 - Na Mackenzie foi pós?
R - Não, no Mackenzie fiz ciências contábeis, um ano. Então, eu fiz economia, administração e ciências contábeis. Fechei o ciclo e vamos ver o que dá para fazer com isso. Não, São Luís eu fiz economia e depois administração, e fiz contábeis no Mackenzie. E depois fiz algumas cadeiras específicas na GV. Aí foi o seguinte, o que aconteceu na faculdade: como a gente tinha alugado apartamento, a São Luís era paga e não dava pra pagar. Aí negociei com o Diretor Financeiro da Wallita: "Olha, se eu passar entre os três primeiros, você me paga metade do curso". O cara topou. Aí fui falar com o diretor da escola: "Se eu passar entre os três primeiros, você me paga a metade do curso". E o cara topou. Então, eu paguei o primeiro ano assim. Mas tinha que dar um duro danado, porque as notas, tinha que rachar para ficar entre os três primeiros, mas não paguei o curso. Fiz o curso assim, desse jeito. Não dava mesmo, tinha que pagar aluguel, minha mãe ganhava pouco.
P1 - E sobrava tempo para fazer outra coisa, nessa época?
R - Não, sobrava muito pouco tempo.
P1 - Passear, ir ao cinema...
R - Não, mas isso deve ser, talvez, uma das razões por que eu acabei casando moço. Na Wallita eu conheci a Marilene, minha esposa, ela entrou acho que no ano que eu entrei, ou um ano depois de eu ter entrado, e a gente acabou se conhecendo. Namoramos anos, levou um tempão até a gente se casar, não dava de jeito nenhum para casar. E a gente acabou fazendo um pouco de divertimento, eu saía um pouco, mas era estudar, trabalhar e namorar um pouco, nada mais do que isso. Não tinha dinheiro para fazer outras coisas, não tinha tempo, e foi a vida que a gente levou durante 4, 5 anos. Nesse período de Wallita e ______ Autopeças, depois. Eram duas empresas do mesmo dono, e a Wallita construiu aqui em Santo Amaro e a _______ Autopeças, que era a linha elétrica de dínamo, ________ de partida. Eu trabalhei 4, 5 anos na Wallita, depois saí e passei na __________, fiquei um ano, mais ou menos, depois saí de lá. Foi um período de estudo, trabalho, certamente meus filhos tiveram uma juventude muito melhor do que a minha, claro. Foi em 60 a 64 que eu fiquei na Wallita, e de 64 a 65 na _________ Autopeças, que foi quando eu me formei.
P1 - Na São Luís?
R - Na São Luís. Aí, apesar do pessoal ter me pago curso e tal, eu queria ter uma oportunidade melhor na Wallita, mas daí: "Santo de casa não faz milagre, é o garotinho que entrou pequenininho e começou batendo cheque, tal..." Aí eu saí. Saí em outubro, em novembro fui pra Aços Villares pra trabalhar em importação, compra.
P1 - Nessa época era fácil trocar de emprego, arrumar emprego?
R - Era e ficou por alguns anos, na época do milagre... Não tem nada a ver com a época de hoje. Meu filho, hoje, pasta para conseguir um emprego, tem que fazer MBA lá fora pra conseguir. Naquele tempo nem precisava se formar e arrumava emprego fácil, quer dizer, entrava em grandes corporações. Então, em setembro, outubro, eu queria ter uma oportunidade na _____________ Autopeças, em que eu estava, uma oportunidade melhor. Não tinha, o pessoal achou que não podia, aí abriu uma oportunidade na Villares, tinha um colega de faculdade que trabalhava lá e queria sair. Ele era chefe da importação e queria alguém pra ocupar o lugar dele. Fui para a Villares. Fui considerado como um mal agradecido na empresa, e eu achava que eles que não tinham reconhecido que eu... Ficou assim, tchau. Aí eu fui para a Villares e fiquei três meses só, porque tinha esse colega meu, da faculdade, que tava na Villares, mas ia sair da Villares, porque ia fazer outra coisa. O interessante é que, é assim mesmo o papo? Eu estou contando um monte de coisas que eu nem sei, é isso mesmo?
P1 - É. Eu falei...
R - Um livro aberto, começa a falar... [risos] Sei lá o que vocês vão fazer com isso depois, mas tudo bem. Esse colega é interessante porque Klaus era alemão, não era muito estudioso, e eu consegui a condução pra voltar da faculdade. Ele desviava e me deixava na porta de casa, quando chegava era meia-noite, meia-noite e meia. Me deixava na porta de casa, porque o compromisso era assim: a maioria das provas que ele não sabia, não conhecia, eu fazia a minha e fazia a dele. Não era colar, não, era trocar a folha e tal, e não sei o quê. Klaus __________, era uma peça. Ele trabalhava na Villares e me convidou para trabalhar lá. "O que você quer que eu faça lá, a mesma coisa que eu faço nas provas?" "Não, é que eu vou ter que sair, vou para outro lugar". Então fui pra Villares, Aços Villares, lá em São Caetano. Eu trabalhava lá e fiquei três meses só. Era um negócio interessante, mas era um negócio burocrático, não era o que eu imaginava. E aí, nesse meio tempo, numa época assim, em 24 de dezembro, era véspera de Natal, saiu um anúncio da Rhodia. Eu falei: "Klaus, tem um anúncio aqui. Você não quer me levar? É em São Caetano, Santo André". Era um colega, eu mostrei pra ele. Ele: "Mas você vai embora? " Falei: "Vou." Ele me levou, fui fazer entrevista, na véspera do Natal. O pessoal estava trabalhando. Lá em Santo André, em 24 de dezembro, o pessoal trabalhava.
P1 - Foi fazer entrevista no dia 24 de dezembro? No dia que você viu o anúncio?
R - Não, eu tinha visto num domingo e tinha marcado, e foi no dia 24 que marcaram; eu fui lá e ele me levou. Eu não me lembro bem como é que era, mas eu fiz no dia 24, depois voltei, acho que na outra semana fazer mais alguns testes, e decidi: eu ia casar no dia 8 de janeiro, casei no dia 8 de janeiro. Então, acabei entrando na Rhodia no dia 20, 21, quando a gente voltou da viagem de lua-de-mel.
P1 - 66, né?
R - 66. Por isso que eu brinco com a turma: "Casei com minha esposa, casei com a Rhodia e faz mais de 30 anos que estamos juntos".
P1 - Todos os três.
R Todos os três. [risos] Mas foi assim, fiquei esse pouco tempo lá, saí, e aí entrei na Rhodia e realmente gostei.
P1 - Entrou na Rhodia na área...
R - Entrei na Rhodia na área têxtil de Santo André. Era meio complicado na época. Na realidade, tinha o pessoal da área administrativa e financeira da Rhodia ________, era, na época, Rhodia ____________ Rhodia Têxtil, tinha um pessoal na área administrativo-financeira e o Jean Avril, que era o diretor técnico da área sintética, que era nova, precisava de alguém pra auxiliá-lo na área de custo técnico da fábrica, tal. Então, eu comecei pela área de custo. Mas era uma situação, sempre tem que ter esse negócio de conflito, tem que ser meio __________ porque o pessoal administrativo-financeiro era de uma linha, a linha antiga, que era o acetato, e o do outro lado tinha o nylon e o poliéster que estavam surgindo e se digladiavam. Tinha dois diretores, um do lado de lá e um do lado de cá, chegaram a pôr um muro no meio da fábrica, para dividir. Então, eu entrei do lado de lá, mas quem me entrevistou foram os caras do lado de cá. Era um negócio meio... "Não, o que você sabe fazer, o que você não sabe, tal". Na realidade, o pessoal pensava que eu estava me cooptando para trabalhar lá, para ajudar o cara daqui. Quer dizer, um troço já meio complicado. Era o Jean Avril na época, e eu entrei. Depois a gente começou a ver que não era bem assim. Tinha um conflito muito grande, mas eu era pequenininho, lá embaixo, e eram os homens lá em cima que brigavam. Então, eu era responsável pela área de custo técnico da produção de nylon e poliéster.
P1 - O anúncio no jornal era para esse cargo?
R - Era para esse cargo. E eu não fui entrevistado pelo Avril, que era o diretor técnico, que estava indo pra França, fui entrevistado pelo pessoal do outro lado, e eu acho que eles acharam que eu ia fazer o que eles queriam e acabaram aprovando, e depois, quando o Avril voltou da França, que eu comecei a conversar. E o Avril foi uma pessoa excepcional, que me ajudou muito na Rhodia, porque a gente tem uma boa afinidade, tudo foi muito, ____________ trabalhava, nesse ponto me ajudou bastante. A gente, fiquei quatro anos com ele e ele me ajudou muito depois na carreira que a gente acabou fazendo na Rhodia. Então, na Rhodia foi assim, quer dizer, da Villares, surgiu um anúncio... E foi interessante, porque eu ganhava, na época - precisava alavancar, porque eu estava casando -, eu ganhava, não sei se era cruzeiro, o que era, eu alavanquei assim: eu saí da Wallita com 200... 200... 200 unidades monetárias, não sei se era ____, alguma coisa, na época, fui para a Villares com 400, em outubro, e passei pra Rhodia, que pagava muito bem, para 700. Quer dizer, foram três meses, assim, começando bem, me formei, tá razoável.
P1 - O que era esses 700? O que seria isso hoje?
R - Isso seria, deixa eu ver, seria mais ou menos uns 15 salários mínimos, talvez. É difícil, agora, 15 salários mínimos, 66, não sei quanto era o salário mínimo na época, que era muito melhor do que o de agora, mas devia ser alguma coisa como entre 10 e 15 salários mínimos da época. Correspondente hoje, talvez, a uns 20, 20 e poucos salários mínimos. Entre dois e quatro mil, por aí, uma coisa desse tipo.
P1 - Você entrou ganhando isso, já?
R - Entrei ganhando isso. Depois, a Rhodia tem um sistema, naquele tempo a Rhodia ganhava dinheiro à beça. Pagava bem à beça o pessoal. Rapidamente a gente foi alavancando, porque eu entrei não como o que a Rhodia chamava de pessoal superior, não sei se alguém já falou nisso.
P1 - Falou.
R - Eu não era pessoal superior, acho que eu devia ser pessoal inferior ainda, quando eu entrei, porque não era classificado. Ppessoal superior, geralmente, era engenheiro. Então, eu entrei em janeiro, trabalhei o ano todo, já tinha tido aumento, porque tinha inflação e a Rhodia tinha um sistema interessante para quem era o superior: no final do ano eles faziam correção de toda a inflação e te pagavam, em dezembro, a correção da inflação toda ________________ para dar o salário do ano seguinte. Essa inflação era de 100%, você ganhava o dobro do que ganhou o ano inteiro num pacote no fim do ano. Era bom à beça. Acabou logo esse negócio. Aí foi isso, foi em 66, eu estava trabalhando junto com o Avril, nessa parte de custo técnico, tal. Mas eu vi que o negócio lá não era pessoal superior, tinha os engenheiros e os outros na Rhodia, nessa época, até pouco tempo ainda tinha o negócio dos engenheiros. Na Farma não tanto, porque era mais pessoal médico, mas na Química e na Têxtil era uma diferença enorme entre os engenheiros e os outros. Então, achei que estava bem, mas procurei alguma coisa para alavancar. Então, em maio de 67, eu achei outro emprego, numa associação da GE (General Eletric) com, acho que hoje é Inepar, na época eu não me lembro como chamava. O pessoal construía torres de transmissão de energia elétrica. Era a GE com uns italianos, tinha uma fábrica aqui na Casa Verde. Era para ser uma área administrativa e eu fiz os testes, fui aprovado, e dava para alavancar bem, era para ganhar mais do que o dobro que eu ganhava. Aí eu cheguei pro Avril, que era meu chefe nessa época: “Eu gosto muito da Rhodia, é muito legal, mas eu vou embora. Por favor, me dispensa, porque eu vou ganhar três vezes mais do que aqui. Me mande embora”. E o Avril falou: “Não, você não vai embora”. “Vou embora, sim”. E ficou vai, não vai: “Semana que vem você me dá a resposta”. Nessa época o diretor geral da Rhodia era o Romano, que era o _____________ da época, e toda semana ele passava lá em Santo André para fazer reunião com o diretor técnico e ________________. Eu falei: “Vê bem, porque eu já confirmei lá que eu vou”. E ficou aquele negócio, e na semana seguinte veio o homem, com aquele charutão dele: “Por que você vai embora?” “Vou embora por isso, por isso, por isso”. “Nós não queremos que você vá embora”. E ficou aquele vai, não vai, eu falei: “O que vocês vão fazer comigo para eu não ir embora?” Aí, realmente, começou a minha carreira na Rhodia, né? Ele falou: “Tem um grupo de jovens, aqui, em que a gente quer investir, não sei o quê, pé, pé, pé...” Eu falei: “Só que os superiores são os outros, eu não”.
P1 - Não chegou aqui essa...
R - “O negócio aqui é só engenheiro, eu não sou engenheiro”. Ele era muito brincalhão: "Não, olha, não sei o quê, tal...” Em suma: cobriram o que eu ia ganhar lá, passei a ser superior, superior nessa época tinha...
P1 - O que quer dizer ser superior?
R - Superior tinha, vamos dizer, hoje o cara ser superior é ser executivo. Na época significava o seguinte: você tinha direito a ...
P1 - Mas chamava assim, pessoal superior?
R - Pessoal superior, é um absurdo, mas chamava pessoal superior. [risos] Pessoal superior, quer dizer, tem os superiores e tem os inferiores. É absurdo, mas era. (todos falam ao mesmo tempo)
P2 - Não era ______________________ você tem nível superior...
R - Não, era pessoal superior, não era aquele pessoal de nível superior. Porque depois mudou para pessoal de nível executivo, passou pra PNE. Esse troço me incomodava, eu via tanto engenheiro babaca, e eu lá. Mas aí...
P2 - Tinha direito a carro, né?
R - Tinha direito a financiamento de carro, tinha direito a ajuda de aluguel, uma porcentagem do salário, como se fosse para ajuda de aluguel, tinha essa gratificação no final de ano, que o pessoal inferior não tinha. Então, tinha uma diferença significativa de salário. Aí foi um dilema, porque eu já tinha acertado, ia embora mesmo, tinha negociado em casa, porque eu e a Marlene, a gente sempre decidiu junto.
P1 - Ela trabalhava nessa época?
R - Não, ela trabalhava na Wallita até ficar grávida e depois ela saiu. Nessa época ela não trabalhava, porque foi em maio de 67, já tinha nascido a primeira menina minha, em abril, a Débora. A gente sempre decidiu junto: “Vamos fazer, não vamos fazer, se der certo deu, se não deu...” E eu tinha acertado com o outro, também, o problema era explicar porque eu não ia. O cara ia dizer: “Pô, mas o cara dobrou seu salário agora, você acredita nisso, só quando você falou que ia embora”. Mas enfim, decidimos e eu entrei num esquema de plano de carreira, tudo.
P1 - Aí você decidiu ficar.
R - Decidi ficar: “Agora vamos ficar aqui e ver o que vai dar”. Aí começou um plano de carreira na Rhodia mesmo.
P1 - Vocês moravam em São Paulo?
R - Sempre em São Paulo. Eu ia para Santo André e voltava todo dia. No começo ia de trem, depois de uns 6 meses deu pra comprar um carrinho. Era duro, saía às cinco da manhã para pegar um ônibus para descer na estação do norte e pegar o trem para Santo André, e depois andava quase um quilômetro pra chegar na fábrica, era...
P1 - Você mora onde?
R - Eu morava na rua Madre Cabrini, na Vila Mariana. Pegava o Penha não sei o quê, que me deixava em frente à estação do Brás, ali na estação do norte, que chama ... estação do Brás?
P1 - Bresser, né?
R - Estação do norte, que chama. Pegava o Santos-Jundiaí, descia em Santo André, e daí andava quase um quilômetro, porque eu trabalhava no fim da fábrica. Tinha que chegar às 7H30, batia cartão. É bom aprender essas coisas, a gente valoriza depois.
P1 - Você tinha o que, nessa época?
R - 67, eu tinha 24 anos. 24. Tinha casado com 22, 23.
P1 - Sua mãe ficou morando com vocês?
R - Não, minha mãe ficou morando sozinha. Aí, foi também outra...
P1 - Foi um drama?
R - Foi um drama. Até hoje, hoje não, a coitada já está esclerosada, mas durante vários anos ela nunca aceitou. Mas eram gênios totalmente incompatíveis, se ela estivesse junto eu tinha terminado meu casamento. Eu tinha que fazer uma opção: ou uma coisa, ou outra. Aí tive que ser frio, o filho que não reconhece a mãe, aquele negócio de italiano. “É melhor criar porco do que filho, porque você mata e come”. [risos] É mesmo, era por aí. Então, tive que fazer uma opção e ela ficou sozinha, e eu fiquei, sempre que podia, ajudando. Ela continuou trabalhando e tal. Mas sempre ficou aquele resquiciozinho: “Meu filho...”
P2 - Com seu outro irmão não tinha possibilidade dela morar, ainda?
R - Tinha, mas ele ficou em Santos, sempre morou em Santos; também, do lado dele, não sei se ele tinha o mesmo sentimento que eu tinha, ele podia dizer: “Pô, já que me largaram aqui, agora que se danem”. Então foi difícil, também, nessa época, e sempre houve um certo sogra e nora meio... Então, foi isso.
P1 - Então quando você casou já saiu?
R - Já saí, e foi um tempo difícil de relação, e tal, mas tinha que ser. Ela acabou aprendendo, acabou se virando.
P1 - Depois ela se ligou nos netos, ficou mais...
R - Se ligou, mas não muito, porque ela sempre ficou com uma certa... Minha mãe sempre foi não tão emotiva, mais fria. Meu pai era mais emotivo, minha mãe era sempre mais fria. Ela era mais chegada com crianças estranhas do que com os nossos, não sei se porque também entre sogra e nora tinha negócio com filho, aí ficou meio, não tão próxima, não foi muito legal.
P1 - Aí, voltando, você tinha 24 anos, estava na Rhodia...
R - Então, aí fiquei pessoal superior na Rhodia Têxtil, o Avril foi um cara excepcional, que me ajudou bastante.
P1 - Nós estamos falando em 67, e a Rhodia...
R - 67. Excepcional, foi alguém que me ajudou bastante.
P1 - E a Rhodia Têxtil já era grande?
R - A Rhodia, nessa época, era a 12a, 13a empresa no Brasil. Você vê que cresceu bastante, nesse tempo todo. Era uma grande empresa, o pessoal que morava em Santo André tinha prestígio pelo fato de trabalhar na Rhodia, crédito na praça, no comércio, um negócio muito valorizado, mesmo. E foi um período muito bom na Rhodia. De 67 até meados de 70, 70 e pouco; a Rhodia cresceu muito nessa época.
P1 - Em que áreas?
R - Tanto têxtil como química.
P1 - A Farma era uma coisa mais...
R - A Farma e a Veterinária eram as ovelhinhas negras do negócio.
P1 - Ninguém prestava atenção.
P2 - A grande estrela mesmo era a...
R - Era a Têxtil. A Química por uma integração com a Têxtil. Eu também tive um pouco de sorte, porque junto com o Avril, o Avril era o diretor industrial da Têxtil, e nessa época a gente fazia uma fábrica por ano. Expansão da Têxtil. Uma fábrica por ano.
P1 - Em vários lugares do Brasil?
R - Não, lá mesmo. Construiu também no nordeste. A Rhodia Nordeste, de 67 a 69. Então, era uma unidade de produção nova, como se fosse uma fábrica. Em 67 foi a de poliéster, depois 68 foi fio __________, 67, 68, 69 a fábrica do nordeste.
P1 - Voltado para o mercado interno ou externo?
R - Interno. Sempre mercado interno, mercado fechado. Então, nessa época, tinha muito incentivo fiscal. Tinha todos os dossiês para apresentar para o governo, eu acabei ficando um pouco o economista. Eu deixei a parte de custo depois, porque eu vi que era um negócio que podia ser feito por outra área. Eu saí e fiquei como assessor econômico do Avril e passei a ser o economista, o que equivale ao economista da época, porque todos os incentivos fiscais, projetos ao nível de um CDI (Certificado de depósito interbancário , por exemplo, para conseguir os incentivos, a gente tinha que fazer. Então, uma vez por ano, tinha um dossiê enorme de fábrica, integração com o pessoal de engenharia, de produção, e os dossiês para gente conseguir os incentivos fiscais. A outra era o controle de preços, a negociação com o CIP, a negociação com o governo para manter a rentabilidade.
P2 - Como era o controle de preços na área Têxtil ?
R - Era uma praga. Você tinha que apresentar mapa de custo e pedir a bênção para o pessoal lá do... Tinha a CONEP (Comissão Nacional de Estímulo à Estabilização de Preços), depois teve o CIP (Conselho Interministerial de Preços), no tempo do Delfin, e aí tinha que fazer os mapas de custo, juntar documentação, fazer reuniões com o pessoal pra aprovar os aumentos. A Rhodia era líder de mercado, então era muito visada. Vivia constantemente indo pra São Paulo e Rio para fazer todos esses dossiês, produto a produto. Tinha que zelar pelo preço de venda, que era um negócio que todo mundo olhava e era importante, tinha os dossiês de incentivos fiscais, toda a parte de planejamento estratégico. Isso deu uma, como é que se pode dizer, se mostrar um pouco, estar exposto ao nível de direção. Ajudou, de pessoal inferior passou a pessoal superior, passou a fazer coisas que interessam para a companhia, para a direção. Como começou a aparecer um pouco mais meu trabalho. O Avril me ajudou muito nisso.
P1 - Ele era francês?
R - Francês.
P1 - Todos os chefes eram?
R - Nessa época muitos. Tinha alguns brasileiros, mas tinha muitos franceses também. Ele ficou no Brasil, era um francês, mas que acabou... Até hoje ele vai nas festas nossas de fim de ano. Continua trabalhando até hoje, tem quase 80 anos e se aposentou na Rhodia, mas até hoje trabalha. Mas tinha muito francês.
P1 - Tinha alguma coisa culturalmente muito explícita nessa época, por ser uma multinacional francesa, que te chocou?
R - Não, eu sempre fui, não fui tão francófilo, mas eu sempre gostei do francês, eu sempre na escola tinha facilidade para o francês. Eu acabei indo pra França em 69 fazer um primeiro estágio. O sistema era relativamente paternalista também, mas o Romano, que foi o anterior do Musa, tinha uma visão, a empresa crescia muito e ele tinha uma visão: “Puxa, temos que criar equipes que vão fazer essa empresa no futuro.” E eles tinham programas de trainee que... O único problema é que admitiram engenheiros demais, faltou misturar um pouco, só tem dois que não eram engenheiros, eu e o Cirilo, que está na Rhodia _____________; o resto era tudo engenheiro.
P1 - Inclusive na área têxtil ?
R - Na Têxtil, na Química, em todo lugar.
P1 - Na Farma, também?
R - Na Farma não. Na Farma não conheci bem nessa época. Faz seis anos que eu conheço a Farma, a Farma não era... Teve um convite, eu não aceitei um convite na hora certa, para ir para a Farma, para a Veterinária, quando eu saí de uma outra área.
P2 - Você recebeu um convite pra ir pra...
R - Recebi, mas antes desse último. Esse último, quando eu vim pra cá, eu vim porque eu não tinha outra saída, eu tinha que vir mesmo, mas o anterior eu tinha condição de escolher. Então, o Romano, nessa época, dizia: “Nós temos que criar o futuro dessa empresa.” Então se admitiam vários trainee: 10, 15, 20 por ano, que ele espalhava pela área têxtil, química, e esse pessoal começava como trainee e ia evoluindo, fazendo carreira. O Musa começou assim também, ele entrou em 64 como trainee. Eles acompanhavam, não tinha nenhum processo formal, eles acompanhavam um pouco, o Avril, o Romano, mais um outro francês. O pessoal trabalhava, tal, mas era um negócio um pouco ______________________ o pessoal ia acompanhando.
P1 - Eles recebiam? Ganhavam dinheiro? Tinham um salário de trainee?
R - Sim, era empregado. Você começava como trainee no primeiro ano, tinha um centro de treinamento, e depois assumia a função. Eu não entrei como trainee, entrei como empregado mesmo. Quer dizer, não era trainee, já era um pessoal superior e eu entrei como... Ficava um ano em treinamento, circulando, tendo informação, e depois tinha um posto ou na área de engenharia, de produção, de manutenção, assumia um posto e ia fazendo carreira. Estava num local, ia pra outro, o pessoal ia movimentando as pessoas, mas não tinha nada muito formal. Eram uns três, quatro que resolviam e iam mexendo com as pessoas e iam tocando um pouco na relação mais direta. O Romano, o Avril, o da área de acetato, Dubois, na parte administrativa tinha alguém também. Era um pouco... Tinha o Hunger, que não era francês, na área de planejamento estratégico. Eles zelavam e iam acompanhando esse pessoal. Eu fiquei com o Avril de 66 até 72, em 69 ele me mandou para a França pra fazer um estágio, que a gente ia implantar um sistema de gestão de orçamento. Foi a primeira vez que eu fui para França, fiquei três, quatro semanas. Voltei e começamos a implantar isso. Quando chegou em 71, 72, eles me tiraram de lá e me passaram para trabalhar; realmente o Hunger, que trabalhava junto com o Romano na área de planejamento estratégico da Rhodia como um todo, nessa época, como corporação, precisava de alguém para trabalhar na área de planejamento da Têxtil, mas não da Têxtil com ele, no Corporate. Conversaram com o Avril, me convidaram e me passaram para lá. Então, eu deixei a Têxtil, eu fiquei seis anos lá, e fui pra área...
P1 - Química?
R - Não era bem Química, era Corporate, o Hunger, que trabalhava com o Romano, só que o Hunger fazia o planejamento estratégico do quê, da Têxtil, da Farma, tinha alguns assessores. Era uma área, também, de passagem de treinamentos.
P1 - O que era fazer o planejamento estratégico nessa época, assim?
R - Era, fundamentalmente, como se fazia na Têxtil e na Química, uma fábrica por ano, era fazer as projeções de mercado, fazia as avaliações de oportunidades de mercado, manter a oferta para cobrir a demanda, para você, primeiro, não dar chance para outro entrar e manter sua participação. Então, eram projeções de três a cinco anos, ligação com o pessoal da comercial, com as diversas áreas que faziam as projeções, e a gente fazia uma análise disso, do macro-ambiente, macroeconomia, e saía no final um plano tipo resultado-investimento para se manter uma posição. E o Hunger controlava isso junto com o Romano na corporação. Eu estava na Têxtil, tinha um colega que estava na Química, um outro que tava área da saúde.
P1 - Era uma pessoa por área?
R - Era uma pessoa por área. E o Hunger, na realidade, o Hunger foi, na Rhodia toda, foi talvez a única pessoa com quem realmente eu aprendi. Nas outras áreas eu sempre fui meio autodidata. A gente começa a fazer as coisas, não tinha um chefe que estava te ensinando. O Hunger não. O Hunger vinha uma vez por semana só em Santo André, ele ficava em São Paulo e ia para Santo André.
P1 - Ele não era francês?
R – Não.
P1 - Nem alemão?
R - Não. Brasileiro judeu. Muito inteligente, muito competente, com um monte de inimigos também por causa disso. Mas ele era, um negócio de que eu gostava, ele era instigador, e eu também, para aprender, eu era instigador. Então, eu fazia as coisas, mandava para ele, e começava a discutir o que tá certo, o que tá errado. Brigava à beça, e o processo de aprendizado era meio caótico, mas eu aprendi um monte de coisa com ele. Nessa parte de planejamento estratégico, porque que as coisas podiam ser melhor feitas, as teorias que havia, e ele, realmente, como era muito professoral, os quatro anos que eu passei lá foi o período de maior aprendizado na Rhodia como um todo, porque nas outras eu aprendi sozinho. Com ele, não. Foi realmente um processo de... E como ele tinha a Química, tinha a Saúde (Fim da fita 1 – lado B), foi uma visão global da companhia. Nessa época, o que o Romano fazia, é que as pessoas que passavam por essa área eram pessoas meio eleitas para treinamento, para depois assumir posições operacionais. Então, eu fiquei lá de 72 a 76, e nessa época o Romano passava lá para falar com as pessoas: “Bom, homem, já faz tempo que você tá aqui, acho que tá na hora de sair, o que você quer fazer?”
P1 - Ah, era assim? E essa era a perspectiva, quando você estava lá já sabia?
R - Não, tinha a chance de e a gente esperava. Porque outros tinham passado pela área e tinham saído também. Então, isso foi em 76, ele passou e perguntou, com aquele jeitão dele: “O que você quer fazer?” Eu falei: “Tudo, menos Têxtil .” Eu estava na Têxtil e já via que a Têxtil, naquela época, já ia...
P1 - Você tinha, pelo planejamento...
R - Pelo planejamento, pelas projeções, a gente já via que ia haver abertura de mercado, concorrência, tal. “Ah, tá bom, vamos ver”. Aí que me ofereceram, não era a Farma, era uma parte da área da Saúde, que era a Veterinária. Nessa época eu conhecia um pouco da área porque a gente tinha o restaurante do pessoal superior, em Santo André, que era muito bom, por sinal, era bom mesmo, não sei se alguém falou disso ou não.
P1 - Falou.
R - Falou? Você vê que o negócio grava. Tinha comida boa, você podia tomar vinho, cerveja, imagina como é que o pessoal trabalhava à tarde, depois. Vol-au-vent de camarão, era sofisticado, bom mesmo.
P1 - O pessoal da produção comenta bastante que era diferente.
R - Tinha uma diferença incrível.
P2 - O pessoal inferior ___________________ era pra lá de inferior. Sub-inferior. [risos]
R - E nessa época era interessante, eu almoçava no restaurante e tinha uma mesa que sentava, lembra do, acho que ele teve aqui na semana passada, o Carvalho?
P1 - João de Carvalho.
R - João de Carvalho. Ele sentava na mesa, ele ia duas vezes por semana a Santo André, e sentava nessa mesa. Tinha um outro que era o chefe de produção da Farma, tinha um que era da Química, eu que era da Têxtil e depois do planejamento estratégico, e tinha um que de vez em quando vinha ____________. Então, eu sabia das coisas da Farma e da Veterinária por esse bate-papo no almoço. A gente decidia os destinos da Rhodia. E era muito gostoso.
P1 - O João de Carvalho conta que antes, quando ele ingressou na categoria de pessoal superior, todo mundo olhava: ‘Ih, que metido, agora ficou pessoal superior” E quando entrava no restaurante _________________ vulgaridade. [risos]
R - É um troço incrível, como as coisas mudam, né? Então, nessa época eu conheci um pouco como estava o ambiente, a situação econômica, tal. Então, quando ele me falou, eu falei: “Não, acho que não”, dei uma desculpa. Porque eu sabia que o negócio era meio, tinha muita política.
P1 - Na Farma?
R - Não, na Veterinária. Era tudo junto né, tinha a __________ Saúde, tinha um pessoal que não era muito legal, acabou saindo, tinha muita mutreta, muita complicação. Então eu achei que não era... Você tem que estar no lugar certo no momento certo pra evoluir. Eu falei: “Não me interessa, eu prefiro esperar aqui mais tempo”. Aí apareceu a Química, porque eu tive a oportunidade, um colega que tinha passado por essa área do _______________, que tinha ido ser assessor econômico-financeiro na divisão Química em Santo André, e que tava saindo para ser o gerente da fábrica de Santo André. Então, abriu o lugar dele e me convidaram para ir pra Química. Na Química, era pra ser assessor do gerente, a vantagem era essa, estar sempre junto com o pessoal SS, superior superior, o que ajudava como exposição. Eu fui para lá e tinha um trabalho bastante extenso, tinha quatro funções específicas e incompatíveis até, depois é que mudou. Tinha uma área de informática, sistemas, tinha uma área de estudos econômicos, CDI, preços, CIP. Não tinha uma área de estudos de projetos, CDI, projetos da Química, tinha uma área de controle de preços e incentivos fiscais, na época do incentivo do álcool, uma série de contatos com o governo, CNP (Conselho Nacional de Petróleo), tal, e tinha uma área de recursos humanos. Cada área dessas tinha três ou quatro pessoas trabalhando e eu fui chefiar, fui tocando isso. Daí, também, ninguém me ensinou nada, eu que fui tocando, porque...
P1 - Chefiar aí era uma espécie de uma...
R - Era responsável por essas quatro áreas e cada uma delas tinha um responsável com um, dois, três subordinados.
P1 - Quem era o coordenador geral da Química, nessa época?
R - Era um francês. O primeiro nome que não me lembro, acho que era (Jean Jacques Sabanon?), um cara centralizador à beça, cercava tudo, pegava as pastas, perdia um tempo desgraçado. Era duro trabalhar com ele, porque ele era realmente... E tinha um outro, que era o segundo dele, que era um cara mais aberto, que apoiava mais a área de recursos humanos. Então, aí também foi um período, o que eu conhecia foi bom porque era fácil, o negócio de preço era tranqüilo, acompanhar os preços da Química, eu tinha experiência da Têxtil. A parte de projetos, CDI, também não tinha nenhum problema, a parte de informática, sistemas, foi um aprendizado novo, tive que me meter nesse negócio para aprender, e a parte de recursos humanos foi bastante rica também, porque foi onde eu aprendi um pouco mais de sensibilidade, um pouco mais de tratar com as pessoas. Por isso eu dizia que eram incompatíveis, e depois de algum tempo estar com a parte econômica e a de recursos humanos, as prioridades você dava era para o preço, para o projeto, e nunca para as pessoas. Era muito complicado.
P1 - E conflitavam essas áreas?
R - Não, era um problema de prioridade, tem que atender uma coisa ou outra, e sempre a prioridade que vinha era: “Bom, é mais importante você aumentar o preço do que resolver o problema dos engenheiros de Paulínia, ou da fábrica não sei das quantas.” Tanto que depois de dois anos eu falei: “Ou fica com uma, ou fica com outra, vamos separar isso, porque não dá.” Aí, durante dois anos, dois anos e meio, eu fiquei na área de recursos humanos, e a gente começou a implantar uma série de coisas: avaliação de desempenho, _______- de carreira. Eu ia uma vez por semana para Paulínia, porque a parte maior da Química era Paulínia. Engraçado que eu fazia um pouco o confessionário, fazia um pouco o padre. Eu passava pelas diversas áreas, chefes de departamentos da fábricas, eu ia bater papo com as pessoas, só. Ficava escutando, ouvia as pessoas no que as pessoas tinham que dizer. Então, tinha um monte de informação que vinha, filtrava as coisas, e depois eu alimentava ou o gerente da fábrica, ou o diretor da Química: “Escuta, o ambiente está assim, vamos fazer isso, fazer aquilo”. É um pouco de confessionário, tinha um monte de coisas que precisava eliminar, porque era um tal de um meter o pau no outro, falar um monte de besteiras, tal, mas surgia coisa importante. Então, durante dois anos, mais ou menos, uma vez por semana eu ia para Paulínia, passava o dia inteiro lá, chegava de manhã, ficava até a tardinha, e ia conversar com as pessoas, ver, acompanhar como iam as coisas, qual era a imagem disso, como é que tava... E, em paralelo, todos os programas de avaliação, formação das pessoas.
P1 - Nessa época, os recursos humanos, acho que depois cresceu, principalmente na Rhodia, mas já era assim...
R - Não, era muito incipiente, existia muito a mentalidade de RI (Relação com investidores), controladora, e não desenvolvimento de pessoas, programas de desenvolvimento, mas começou nessa época. Definição de funções claras, precisas, não existia esse negócio. Eu tinha duas pessoas que conheciam muito bem isso e a gente começou a fazer um trabalho muito bom.
P1 - Então, você teve uma participação grande na área de recursos humanos?
R - Na Química, sim. E foi um momento em que eu fui aprender.
P1 - Mas dessa forma mais caótica, mesmo.
R - É. Nos livros, o que eu vi na escola sobre isso, consultar o (Infor?), não tinha ninguém para orientar. Era gostoso esse trabalho, eu gostava disso, mas entra a prioridade; ao mesmo tempo que eu tinha que ir para Paulínia, eu tinha que ir para Brasília para discutir com os generais do CNP para conseguir o incentivo do álcool, que era uns pares de milhões nessa época, tinha que ir para o Rio para discutir o aumento de preços dos produtos A, B e C. Não dava para dar a atenção que eu gostaria de dar para a área de recursos humanos e pra área econômica. Então, eu mesmo sugeri: “Divide isso daqui, porque não dá pra tocar as duas coisas”. Aí eu fiquei mais na prioridade, que era a área econômica. Então vamos pra área econômica, que é aquela que dá mais exposição e tal.
P1 - Você tinha essa ideia na cabeça: eu quero, eu vou?
R - Achar as oportunidades.
P1 - Tinha uma meta clara na sua cabeça? Eu quero subir...
R - Eu tinha duas coisas: uma era - que depois eu abandonei por algum tempo - tentar fazer alguma coisa como empresário; mas por falta de capital é difícil, não tinha jeito, abandonei e deixei pra quando me aposentar, daí eu vou tentar. A outra era: “Bom, então tenho que fazer a carreira numa empresa, ou nessa ou em outra qualquer.” Batia quatro anos numa mesma função eu começava a encher o saco do meu chefe: “Escuta, já deu, não tenho nada para aprender, não tenho nada para fazer, vamos fazer outra coisa.” E procurando sempre as oportunidades que tinha, para não cair num buraco negro e me perder. Então, eu sempre tive essa...
P1 - Preocupação.
R - Desde a Wallita, estava na tesouraria, fui procurar o outro, sempre tive essa ideia de... E na Rhodia foi sempre assim, batia quatro anos... E como o Romano também nessa época falou aquilo, eles me deram essa chance, quer dizer, a gente sempre tinha, eu e outros que fizeram carreira na Rhodia, que é um pouco a velha guarda, a turma de 64 a 68, que agora está saindo, e veio fazendo a carreira desse jeito. Então, tinha sempre a expectativa de... Eu estava na área econômica e a área comercial da Química eu criticava muito, achava que era, mas não o (Chabanon?), mas o segundo dele, que era o _______, que era outro francês, também que era engenheiro técnico, ele instigava. Eu falava: “Não tenho nada contra as pessoas que estão em São Paulo, na área Química, mas eu acho que eles fazem um monte de besteira. Podia ser muito melhor, tal.”
P1 - Mas tipo na área de...
R - Onde eu estava, na área comercial, vendas. Já tinha feito custo, tinha feito projeto, fábrica não era o meu negócio, era para engenheiro, eu também não gostava, então tinha que ir pra área comercial e marketing.
P2 - Você assumiu todo o departamento de Marketing da...
R - Não, depois, né? Primeiro eu comecei a dizer o que achava. Aí eu fiquei de 76 até 80, e o pessoal falou: “Tá bom, já que você acha isso, vamos mandar você pra França”. Fui fazer estágio na área comercial da Química. Nesse momento, estava trocando de chefia, o (Chamanon?) tinha ido embora pra França, havia um brasileiro, que era o (Sommers?), que veio da Têxtil e veio para o lugar dele na Química. Foi na época que o Musa subiu e começou a montar a turminha que veio da Têxtil. Teve uma época em que, na direção da Rhodia, ficou todo o pessoal que veio da Têxtil, nessa época em que era pessoal inferior, que os superiores estavam colocando lá, e que chegaram na direção da Rhodia. Isso foi em 1980.
P1 - E já tinha a junção do grupo empresarial?
R - Entre Química e Têxtil?
P1 - É que aí a holding foi lá pro Centro Empresarial...
R - Sim, o Centro Empresarial, nós viemos para cá em 77. A junção entre Química e Têxtil veio em 1965. Quando eu entrei já tinha, porque antes tinha Companhia Química Rhodia Brasileira, que era toda a parte que, Farma, Saúde e tal. E tinha a Companhia Rhodiaceta, que era a parte Têxtil. As duas em Santo André, só que uma fábrica de um lado e outra do outro. Em 65, o Romano juntou as duas e criou a Rhodia Indústrias Químicas e Têxteis. Então, fundiram a Têxtil e Química nessa época, e também foi um processo complicado, porque os bons da Química e os bons da Têxtil, começou aquela coisa. E quando eu estava entrando estava um pouco nesse período, 66 estava uma ebulição. Uma das razões é que tinha o imposto de IVC (Imposto sobre vendas e consignações) nessa época, e a Rhodia perdia uma fábula entre produzir matéria-prima em Paulínia, faturava, emitia nota fiscal, pagava imposto, depois entrava na Têxtil para transformar, era uma perda enorme. Foi uma motivação maior de economia de impostos, e eles juntaram as empresas e criaram a Rhodia Indústrias Químicas e Têxteis, tudo numa direção só, e o Romano passou a ser o superintendente. Aí tinha os diretores da Química, os da Têxtil, tal. Foi nessa época. E o pessoal ficava na Líbero Badaró, em São Paulo, no centro, e em 77 mudou pro Centro Empresarial. O pessoal da Líbero Badaró saiu, o pessoal que estava em Santo André também veio.
P1 - Aí juntou a Farma e a Veterinária, não teve um momento em que isso...
R - Teve esse momento, foi, no caso, o que chamavam direção saúde. O pessoal mais antigo deve ter falado melhor do que eu, mas tinha direção saúde. Teve um cara, que eu não sei se era francês, o Ritcher, um picareta, roubou dinheiro da Rhodia à beça. Não sei porque razão o Romano conhecia, sei lá, não conheço bem a história, mas ele foi alguns anos chefe dessa área da saúde e depois ele saiu, e quando o Musa começou a ser preparado para ser o superintendente, porque o Romano já tava pra se aposentar, era o Avril que estava assumindo, veio o Belloti, que também era da Têxtil, porque aí a Têxtil dominou toda a direção da Rhodia. O Musa já tinha preparado, o (Bruel?) estava indo pra França. O _____________ veio da Têxtil e foi ser o chefe da Química, foi meu chefe, na época. O (Chamanon?) voltou pra França, o Ritcher tinha feito um monte de mutreta, despacharam ele. Veio o Belloti pra ficar no lugar dele. Só que o Belloti tinha passado antes como assessor do Hunger, na área de planejamento estratégico, passou um tempo lá, para depois assumir a Saúde. A Têxtil era a Têxtil mesmo, acho que era o Musa. A financeira acho que era uma pessoa da área mesmo. As três áreas tradicionais, Têxtil, Química e Saúde, ficaram com as pessoas que vieram da Têxtil, que eram pessoas que tinham trabalhado com o Musa e com o (Bruel?), e que assumiram o poder da Rhodia nessa época. Isso foi entre os anos 80, 83, por aí. E eu estava na Química, tinha vindo para São Paulo, comecei a trabalhar com o (Sommers?). O (Chamanon?) saiu em 79, 80, o (Sommers?) assumiu, e eu comecei a trabalhar com o (Sommers?), e fiquei um ano como ainda assessor de estudos econômicos, mas já tinha combinado com o (Chamanon?) que eu ia passar um ano na França para ser formado, e quando o (Sommers?) veio, já estava amarrado. Então, em 80, 81, eu fui para a França com a família e fiz mais ou menos 8 meses de estágio na Química de Base e três meses no CPA - (centre de _________________?) -, que era um curso em regime intensivo, três meses, um tipo de terceiro nível com franceses e estrangeiros; na época era em francês o curso, era uma reciclagem, era um curso de desenvolvimento de negócios. Também não dei sorte, a ida pra França foi complicada porque a ________________---- estava em tumulto, também.
P1 - Lá?
R - Lá. Nós saímos daqui em agosto...
P1 - Aí você foi com a família?
R - A família toda. Aqui a gente dá uma colher de chá para a francesada enorme, o pessoal chega aqui, e tal, vai buscar. Eu parti com a família inteira, não tinha um gaiato para esperar no aeroporto, não tinha achado para onde eu ia, não tinha apartamento, não tinha nada. Descemos no aeroporto e já briguei com o motorista, porque na França você não põe mais do que quatro pessoas num carro, ainda mais que está cheio de malas. O motorista não queria levar a família. Briguei com o homem lá, com três crianças, mulher, foi um rolo, um escândalo, tive que pegar dois táxis, não teve jeito. Eu não sabia para onde ir, porque não tinha a chave do apartamento, não tinha dinheiro, não tinha ninguém me esperando. Aí eu liguei para o escritório: ”Escuta, estou aqui. E agora?” “Ah, mas é que esqueceram, a mulher não foi , não sei o quê ...” Alguém tinha que me esperar, mas não foi. Me deram o endereço e foram me levar a chave do apartamento onde eu ia ficar. Começou assim a chegada na França. Aqui, quando os caras vêm, precisa ir buscar, precisa um motorista que fale a língua do cara, dá vontade de..., a gente lembra dessas coisas. A chegada foi assim. Mas isso não foi o grave, o grave foi que, nessa época, em setembro, outubro de 80, a _______________- estava se desfazendo de um monte de coisa. A ____________________- tinha quatro divisões: a Petroquímica, Polímeros, uma área de Adubos e tinha o setor Têxtil. E toda a parte Petroquímica e a de Polímeros, ela estava vendendo, se desfazendo. Eu ia fazer estágio bem nessa área: Química de Base, Polímeros, Petroquímica. Então, chego lá na segunda-feira, vou me apresentar. “Quem é você?” “Sou Fulano de Tal, está aqui o papel, vim do Brasil, tenho um estágio para fazer aqui”. E o cara, simplesmente: “Escuta, eu estou indo para _____________ - que era a outra empresa que tinha comprado - a partir de tal dia - no meio da semana -, eu estou indo embora”. Como: “Te vira, né?”. Aí fui procurar, tudo assim: a área não existe mais, a área mudou, tudo que tinha sido mandado escrito não serviu para nada. Fiquei uma semana sem saber o que fazer, andava para lá, para cá, batia cabeça para todo canto. Por sorte encontrei uma pessoa (Daniellle Lofeur?), que era uma pessoa da área de estudo de mercado da Química, fui falar com ela, expliquei, chorei as mágoas: “Um dia eu tinha que passar com você aqui, não sei quando, você está aqui ou vai embora também?”. Ela falou: “Não, tá complicado”. “Me dá o nome das pessoas, os diretores que vão ficar, como está a organização." Eu peguei o nome dos diversos diretores da divisões que iam ficar, preparei uma proposta de estágio...
P1 - Tudo lá?
R - Tudo lá. Preparei uma proposta de estágio, fui na secretária - você vê como era esse troço, se o cara não se vira ... - fui na secretária de cada um deles com um cartãozinho do tempo que eu era assessor econômico-financeiro aqui do Brasil: “Eu sou Fulano de Tal, você me marca um rendez-vous com o chefe”. Fui com cada um deles, tinha o diretor de marketing, o de produção, o de finanças, e eu chegava com a maior cara-de-pau, me apresentava: “Sou Fulano de Tal, vim do Brasil, você conhece o (Sommers?), o meu diretor lá, tal. Essa mudança aqui, eu vim pra fazer um estágio, mas Fulano não está mais, eu tenho uma proposta, quer dar uma lida para ver se aprova esse estágio, o que você acha, não sei o quê... ” E o estágio foi feito assim. Eu fiz a proposta de estágio pra Fulano, Sicrano, Beltrano, os caras olharam, toparam e marcaram. Quinze dias foi assim, para ajustar meu estágio na França.
P2 - E em que setor acabou sendo, especificamente?
R - Aí tinha, eu fiz de tudo, mas tinha o que eu queria, o que eu tinha que aprender, porque na realidade eu ia para lá para voltar como responsável pelo comercial aqui na Química. O negócio de implantar o comercial, eu ia voltar e assumir. Então, eu fiz um tempo na área comercial, na área de marketing, os vários setores de ácidos, produtos químicos, especialidades, tinha uma série. Então, tinha os chefes de produto. Fui marcando vários locais. Estudo de mercado, estratégico, as diversas áreas que tinha, fui visitar as fábricas, e assim, quando o negócio foi aprovado, eu passava uma semana, 15 dias numa determinada área, depois tinha uma seqüência. Eu passei pelas diversas áreas da Química de Base. Foi assim 7, 8 meses.
P1 - Mas deu pra explorar melhor essa parte comercial?
R - Deu. Eu fui visitar cliente junto com o pessoal, fui ver a assistência técnica, como funcionava...
P1 - E a diferença entre a França e o Brasil nesse momento era muito grande? As coisas se aplicavam diretamente? Que tipo de transposição te apareceu na época?
R - Era diferente, né? Na realidade, bom, era um outro estágio, a gente tinha um mercado muito fechado aqui. A gente praticamente não tinha marketing nenhum, as empresas compravam da Rhodia, a Rhodia não vendia, não fazia marketing, quer dizer, era quase que um monopólio de uma série de produtos. A ação comercial era uma ação muito de aceitar pedido, fixar preço, mandar, entregar, logística. Na França era um pouco diferente, tinha concorrência, várias empresas participando do mercado, tinha necessidade de serviços pra clientela. Tudo isso foi coisa que deu pra ver lá. Mas como era commodities também, como era a Química de Base, não era um negócio tão desenvolvido. Mas eu aproveitei para - depois serviu bastante -, como tinha brecha de fazer o que eu queria, eu fui também na outra divisão, que era Especialidade Química, que não tinha nada a ver com Química de Base; tinha plástico, silicone, látex, e falei para os caras: “Olha, estou aqui, não dá para conhecer?” Então, eu fui uma semana em Lyon para conhecer a área de plástico, fui uma semana numa outra cidade ver a parte de silicone, que não tinha nada a ver com a Química de Base. E essa parte era realmente especialidade, tinha um marketing muito mais avançado, tinha desenvolvimento e homologação de produtos, laboratório de aplicação, coisa que na Química de Base não tinha. Vedefenol, é Vedefenol. Não tem muita ação mercadológica. Fiquei oito meses nisso, e depois fui fazer o curso no CPA, fiquei três meses no CPA, lá perto de Paris, a semana toda, curso super-intensivo. Éramos 18, tinha 14 franceses e 4 estrangeiros, um brasileiro, um sueco, um _______________ e um português. E aí, realmente, era complicado. Primeiro que o francês fala prolixo à beça, ____________________, os estrangeiros sofriam, porque a gente tinha três, quatro estudos de caso por dia. Tinha que ler tudo isso e fazer uma análise individual, uma em pequeno grupo e depois uma análise em plenária. Três, quatro casos por dia era dose. Às vezes tinha um calhamaço para você ler em francês ou em inglês e sem conhecer o intertexto, era complicado. E os franceses falam demais, falam batatada. A gente como estrangeiro tinha dificuldade de participar efetivamente, porque... Tanto que nas provas escritas a gente conseguia sempre muito melhores notas e avaliações do que os franceses, que ficavam loucos para saber como a gente conseguia. Tinha um problema de síntese e análise complicada entre os franceses e outras nacionalidades. Mas foi um curso muito bom, deu para aprender muito dos 14 franceses que estavam lá, o que tinha de bom e de ruim, e era bem global. Uma série de estudos de casos da globalização da economia européia e mundial. Isso foi bastante positivo. Mas era duro, era de segunda, das oito da manhã até sábado às seis da tarde, regime integral. A família ficou sozinha, mesmo. Foi a época em que eu fiquei mais esbelto, porque ...
P1 - Não comia? Logo na França?
R - Comer, eu comia, mas estava magrinho, era bastante duro, três meses bastante puxados. Mas valeu, foi um aprendizado bom. Aí eu voltei pra cá e nesse meio tempo a turma estava reformando tudo aqui. A organização era outra, os caras que ficaram aqui mexeram tudo, puxaram o tapete para lá, para cá.
P1 - Nós estamos falando de...
R - 81. Eu fiquei de agosto a agosto, de 80 a 81. Foi a época em que o Miterrand ganhou as eleições. Agora, fazendo um parênteses. Para a família, foi a melhor coisa que nós tivemos, quer dizer, como coesão da família. As crianças tinham, Débora tinha 14, Simone tinha 12, e o Rubinho tinha 10. Foram todos para escola francesa, não foram para escola internacional. Eles estudavam no Liceu Pasteur brasileiro, e nós dissemos que se eles conseguissem fazer a escola francesa e passar, porque foi no mesmo ano, saíram no meio do ano com as notas, entraram no ano seguinte lá; se tivessem passado, eles voltariam para cá e não perderiam um ano. Negociamos com o (Cassabi?) aqui, que era o diretor do Pasteur. Foram para escola francesa e tinham que passar lá para não perder o ano aqui. Sofreram bastante também. As meninas, que entraram já no ginásio, segundo, terceiro ginásio, estudavam física, química, matemática em francês. Foi feito um curso de francês aqui, mas sem conhecer profundamente a língua, os primeiros três meses foi... E o menino, que estava no quarto ano primário, foi uma catástrofe, porque ele chegou no começo, e os caras estudavam matemática e aritmética, fazer conta em base dez, base dois, base cinco, base quatro, um troço que aqui você vê na faculdade - e não serve pra nada - de vez em quando. Fundia a cuca: “Como é que eu faço isso, pai?” E fundia a minha também. Eu também não sabia como era, tinha que estudar pra ajudar. Então, os primeiros dois, três meses, chegava à noite chorando em casa. As meninas também, mas depois foram levando.
P1 - Todo mundo odiando.
R - Mas depois de três meses começaram a engrenar. Os três passaram, foi bem, aprenderam a língua e tal. E para a gente foi muito bom porque, é engraçado, ou a família entra numa coesão perfeita, ou dispersa. Depende de como a coisa se passa. Na época fomos em três: eu estava em Paris, o Frank, que está em Paulínia, foi pra Nancy, porque estava fazendo um curso da Universidade de Nancy, de Química, e o Odilon foi para _____, que é no norte da França, com a esposa. É interessante, porque tanto com o Frank como conosco, houve uma coesão muito forte da família, porque lá você tinha o mundo contra você. Ou você se junta para se defender do mundo exterior, que é totalmente contrário, diferente, ou você se dispersa. Com o Odilon foi o contrário. Ele teve problema porque, primeiro, a esposa era de Recife, estava acostumada a 300 dias de sol por ano, em _______- você vê dez dias de sol por ano, o resto é uma névoa, uma bruma só. Eles tiveram problemas opostos, não deu certo, brigaram, se separaram. Então, foi muito positivo o fato da família estar junto, coesa, e até hoje eles lembram muito disso, foi um período em que a gente viajou muito também. Para eles foi um aprendizado enorme, culturalmente foi excepcional. Eu e a Marlene gostávamos muito de dirigir, viajávamos muito fim de semana e tal. Foi positivo. Foi muito mais importante do lado familiar do que do profissional. O curso foi bom, na __________________ não tinha tanta coisa pra ver, e quando eu voltei para cá os caras tinham mudado tudo. Quando eu cheguei: “Você viu Química de Base, tal, mas nós pensamos bem, nós vamos colocar você na Especialidade Química.” Não tem nada a ver. Eram duas divisões diferentes. “Mas nós organizamos aqui, mudamos, na área de marketing é melhor que na área de Química”. E eu fui. Por sorte eu tinha ido ver, aquela semana em que eu vi o plástico, que eu vi... E eu tinha um pouco de intuição, que ajudava. (fim do lado A fita 2) Aí, nós montamos a Especialidade Química e se criaram duas divisões: Química de Base e Especialidade Química. Criamos a Especialidade Química com plástico, silicone, solventes, e não tinha nada. Criamos a área comercial, a de marketing, a de assistência técnica, vendas, começamos a criar, e o pouco que eu vi lá serviu, e o outro pouco foi da gente trabalhando aqui. Então, foi de 81 a 85, mais ou menos, a área comercial, Especialidade Química, com quatro setores importantes, e acho que a gente inovou um pouco, não tinha nada, a gente construiu esse negócio. Não tinha na Química, começamos a desenvolver uma área de marketing, e foram quatro anos, mais ou menos. É sempre quatro, cinco anos, não mais que isso. Em 85, a Rhodia estava começando a criar a ideia das unidades de negócio, atividades, porque tinha muito problema de criar _____________ de produto, dominar o marketing e as vendas da fábrica, estava naquele processo de abrir um pouco a organização. Aí, na própria Química começaram a se criar as atividades, e se quebrou aquela ideia de gerente comercial, gerente industrial. Funções para se criar as atividades hierárquicas ou funcionais integradas nas unidades de negócio. Então, em 85, a gente dividiu tudo que era especialidade, e eu acabei ficando na unidade de negócio do plástico. Plástico Engenharia. E tinha a Plástico Engenharia, tinha látex, tinha silicone. Aí era uma unidade de negócio onde você tinha o marketing, as vendas...
P1 - E a produção, também ?
R - A produção, em alguns casos, era direta, e em outros era negociada, era funcional. Aí tinha as necessidades, as habilidades necessárias para fazer a fábrica. Porque a fábrica era de várias unidades, e tinha aquele pessoal ligado ao plástico, ao silicone, etc.. E ligado, hierarquicamente, a essa unidade. E a Rhodia começou a criar isso, a Látex, Silicone, _________________, várias unidades de negócio com responsáveis. Na época eu fiquei com o plástico. Porque o plástico, também, me deram uma chance de escolher, e o plástico, nessa época, era o que mais tinha chance de crescer, de evoluir, tinha uma fábrica nova que a gente tinha que fazer em São José dos Campos. Estava crescendo bastante o consumo de plástico, o plástico técnico: nylon, poliéster, para automóvel, eletro-eletrônico.
P1 - Esse tipo de material era uma inovação aqui no mercado?
R - Não, já existia há mais tempo, mas era um negócio que estava começando a crescer, depois que cresceu a indústria automobilística no Brasil. Então, ficamos de 85, 86, até 91 nessa atividade. E foi uma experiência rica, porque como a gente tinha um projeto grande em São José dos Campos, fazer uma nova fábrica de plástico para fornecer para o mercado brasileiro, uma expansão muito grande, a gente criou uma equipe, começamos a preparar uma equipe para aquela grande unidade que ia acontecer. Começamos a admitir várias pessoas, tanto na área de produção, como na área de assistência técnica, desenvolvimento. Não é que inchamos, começamos a montar um time visando a essa fábrica que viria. Várias pessoas estão espalhadas pela Rhodia, foi um time realmente bacana que saiu desse... Um está aqui na Farma, outros no Plástico, outros em outros locais, na França. Foi uma experiência da gente criar alguma coisa, já existia o plástico, foi uma forma de criar e fazer evoluir uma unidade de negócio, na época. De uma certa maneira isso se frustrou por causa do governo Collor e da crise que veio, e a fábrica a gente acabou não fazendo em São José dos Campos. Mas também foi um negócio completamente diferente, entrar na indústria automobilística, entrar na indústria eletrônica. Não tem nada a ver mais com o comercial da Silicone ou Latex. Foi um período muito bom, que a gente começou também a trabalhar muito com o Proex (Programa de Financiamento às Exportações) da Rhodia, foi em 84, 85 que começou, e uma das unidades que mais absorveu o Proex, os conceitos de qualidade, foi a do Plástico.
P1 - E o Proex foi um programa que veio...
R - O Proex foi um programa que veio, o Musa que implantou esse Proex, começou em 84, 85, o Musa convocou algumas pessoas pra circular pelo mundo para ver o que havia, qual era o up-date em termos de management, já prevendo que o Brasil ia abrir o mercado um dia. Nós tínhamos que nos preparar pra ser mais competitivos. Aí, na Rhodia, como um todo, se criou a ideia do Proex, o (Waltman?) era o - não sei se você conheceu o (Waltman?) -, o (Waltman?) era o guru desse negócio, tinha um grupo da APDG (Assessoria de pesquisa e desenvolvimento gerencial) que trabalhava e começou a desenvolver as diversas atividades, os diversos setores de aprendizado, informação, e as equipes foram passando como multiplicadores, para ter programa de qualidade. Esse negócio umas áreas aceitaram mais, outras menos, muitos alavancaram, outros não, e no Plástico a gente tinha uma turminha que realmente abraçou isso e conseguiu resultados excepcionais, porque todo mundo se engajou nisso, gostou do espírito e tal. E um dos que ajudaram muito foi o Humberto, que está aqui com a gente ainda, o Humberto Campos. Isso serviu para a gente valorizar a turma do Plástico, porque, claro, tinha a ideia do Musa de implantar isso, o Musa era o campeão da causa, era a filosofia da Rhodia de management, de evoluir, e a gente era uma das atividades, entre outras, havia outras, também, que tinha evoluído bem isso. Isso só se frustrou porque, com a crise, a gente acabou não fazendo o projeto da fábrica, porque acabou ficando super-dimensionada, não havia dinheiro para investir. Aí foi um problema, porque teve que começar a desmontar essa equipe, mas eu acabei acompanhando mais de fora, eu saí desse negócio, e a frustração foi maior, porque a gente viu que, como o negócio não evoluiu, as pessoas que tinham sido colocadas para evoluir nesse negócio acabaram algumas saindo, outras não tendo oportunidade, foi um processo meio doloroso de acompanhar sem estar presente, porque eu saí, veio outro...
P1 - Saiu pra vir para a Farma?
R - Saí para vir para a Farma. Só agora nós chegamos na Farma. (riso) Tudo bem, tudo bem. Eu vim pra Farma em fim de 91. Fui anunciado em fim de 91, cheguei aqui em fevereiro de 92. Tinha feito um bom trabalho no Plástico, essa ideia do Proex ajudou bastante, porque tinha o negócio de qualidade, tudo.
P1 - Eram programas de excelência?
R - Programas de excelência da Rhodia como um todo, do grupo. Nós tínhamos feito um trabalho enorme na fábrica do plástico, tínhamos feito progressos de produtividade sem investir, melhoria de qualidade, progressos de quantidade, envolvendo os operários, todo um processo. A gente usou toda a teoria na prática, em programas específicos do plástico, e conseguiu fazer e isso valorizou um pouco a equipe. Em 91, no fim do ano, nessa época, é sempre nessa época. O Belloti era nosso chefe, porque isso começou na época das atividades, tinha o (Sommers? ), tinha um francês, não lembro o nome dele agora, um francês que chefiou essa área um tempo e depois saiu, e veio o Luciano, que é um diretor da Rhodia que faleceu em 90, 91. Houve um acidente. E depois veio o Belloti, que era o antigo da Saúde, que passou para chefiar essa área de fibras, polímeros, porque, na realidade, o que o Musa pensava era que o Luciano ia ficar com essa parte, e o Belloti ia ficar com a outra parte. Com o falecimento do Luciano ele acabou mexendo um pouco, e o Belloti, que era da área da Saúde, acabou vindo para a área de polímeros e acabou sendo meu chefe. O Belloti é um cara muito inteligente, mas também muito indeciso, mas muito perfeccionista, e as coisas não aconteciam porque tinham que ser sempre melhores. Então não saia, e me irritava porque a gente brigava muito. Constantemente a gente fazia as coisas e tinha que tomar uma decisão, mas não tomava: “Vamos ver mais isso, vamos ver mais aquilo”. Na Têxtil a gente já tinha tido unidades de negócio pequenos entreveros, mas ele já era superior nessa época, acabou sendo meu chefe durante um certo tempo. Então, numa época dessa, o Belloti e o Musa me chamam lá no escritório: “Legal, acho que é o bônus do fim do ano, vão anunciar, tal”. Quando eu chego lá tá o Belloti com aquele sorrizinho sarcástico dele, eu pensei: “Dancei”. Aí o Musa começou com um discurso: “Você está no Plástico, você não fica muito tempo, tal, não sei o que, nós achamos que você precisa sair de lá e nós vamos mandar você para a Farma.” Eu caí das nuvens: “Para onde? Para a Farma ?” “É, tem um problema na Farma, precisamos de você lá, e tal”. E eu vendo o outro lá, sarcástico, tá a fim de me queimar mesmo, né? “Por que na Farma ?” Isso aqui estava numa miséria de fazer dó. Os antigos devem ter falado, não sei com quem vocês falaram, de 89 a 91, depois do Farid, isso aqui esteve numa desgraça. Teve um francês aqui que foi, não conheci muito o francês, mas foi uma derrocada violenta. Estava um caos, se perdia dinheiro, tinha tido um recall. “Você quer que eu vá para lá fazer o quê? Não sou farmacêutico, não sou médico, não entendo nada disso, no passado já fugi disso, o que eu vou fazer lá?” “Não, precisamos de você lá, porque o negócio é mais administrativo, é um ambiente ruim e você tem que ir para lá”. “Pô, Musa, não dá pra pensar?” “Não dá para pensar, ou vai ou não vai.” Quer dizer, e o que é o não vai? Ou vai, ou dança. E o outro, lá. Eu falei: “Vocês não estão a fim de me queimar?” Pô, aquilo tava numa, desculpe, merda de fazer dó. “Eu estou numa boa no Plástico, tranquilo, pensando que agora que está rodando bem, vou sair daqui para ir para lá, para cair no meio de um negócio...” E tinha vazado esse negócio, não sei porque, e alguém tinha me perguntado unidades de negócio dias antes, e eu falei: “Você está louco. Como é que eu vou para a Farma ?” Tinha vazado a informação, e eu estava como o maior salvador da pátria: "Tem o Paulella, aqui, não sei o quê." “Não tem tempo para pensar e mais: tem um cara aí fora que é o cara que vai para o seu lugar, no Plástico”. Assim mesmo.
P1 - Mas você sabia a posição que você vinha assumir aqui na Farma?
R - Eu vinha pra cá para assumir o lugar do francês que tinha ido embora, o Musa tinha despachado ele em outubro, novembro.
P1 - O que substituiu o Farid?
R - É. Acho que ele ficou dois anos aqui, mais ou menos. Isso era em dezembro, eu disse: “Não tem escolha, tá bom, vamos partir para o sacrifício, fazer o que, não tem escolha”. Eu saí em dezembro, disse: “Vou tirar férias em janeiro, em fevereiro vou pra lá.” E nesse meio tempo tinha o Musa, tinha o (Truci?), que era o segundo do Musa, como superintendente, que tinha vindo para cá porque despacharam o (Benier?) em outubro e isso aqui estava ruim, ele veio pra cá para assumir a coisa, porque estava muito mal. O pessoal se matava, era um negócio terrível aqui. Aí em fevereiro eu vim pra cá, o (Truci?) ficou aqui durante seis meses, mais ou menos, e foi outro período terrível, porque você vem para assumir, mas tem outro cara junto, que não era quem tinha te convidado, não confia. Trabalhar junto seis meses ficou naquele faz, não faz e tal. Comecei em fevereiro de 92 aqui e aí, realmente, acho que foi a única vez que eu tive um pouco de medo, eu não me senti tão confiante, porque o negócio estava muito difícil, eu não conhecia, tudo novo.
P1 - Você foi a primeira pessoa a assumir a empresa que não tinha formação farmacêutica?
R - Não, o Farid também é economista. Engraçado, não sei se o Farid contou, mas quando eu estava na Têxtil, em 67, o Farid se candidatou a um cargo na Têxtil e eu entrevistei o Farid. Até hoje eu brinco com ele. E quem me indicou para vir para cá foi o Farid.
P1 - Ele conta, sim.
R - E na época eu disse: “Pô, Farid, você é muito bom para vir pra cá, não quero você aqui porque você é melhor do que eu. Não vem pra cá, vai para outro lugar da Rhodia.”
P1 - Aí ele veio pra cá?
R - Não, ele entrou na Farma em Santo André e fez carreira na Farma, ele tava se formando também, ele é um pouco mais velho que eu, só.
P1 - Os economistas que levaram o Paschoal Rosseti?
R - É, ele começou a trabalhar com o Rosseti, não área de pesquisa de mercado, depois o Rosseti saiu, fez a carreira dele fora, e ele foi evoluindo, ele fez a carreira dele na Farma. Eu não o admiti e disse: “Você tem que vir para a Rhodia, mas para outro lugar, porque você é muito melhor do que o cargo que a gente tá querendo aqui”. E depois, na volta, na gozação, ele disse: “Eu te devolvi, eu sugeri para o Musa para você ir para lá”. Foi um pouco na brincadeira, mas foi assim. Então, ele não era farmacêutico também, e foi o chefe durante vários anos aqui. O pessoal adorava o Farid. Então, tinha o Farid, que tinha sido um tremendo líder, o francês, que tinha botado isso pra afundar, o pessoal que me conhecia do Plástico, e fazia propaganda, dizia: “Chegou o salvador da pátria”. O salvador da pátria não conhecia nada, não sabia de nada e estava apavorado: “Como é que eu vou tocar esse negócio aqui?” Foi um negócio meio complicado, o (Truci?) fez uma convenção no Guarujá para me apresentar, falar e tal, e eu tive que bolar um discurso para chamar o pessoal para começar a trabalhar. Realmente, foi o único momento em que eu tive um pouco de medo de não conseguir tocar. Nas outra vezes, não. Sempre eu achava que dava. Foi um período que eu achava que o pessoal tinha muita expectativa e eu não ia ter resposta para aquilo.
P1 - Você tinha uma espécie de meta de transformação administrativa, a parte comercial...
R - Não, uma coisa que depois o Musa: “Escuta, não tem melhor momento para você - para me convencer - não tem melhor momento, aquilo está tão ruim que pior do que está não fica. Você tem toda a chance de fazer aquilo melhorar.”
P1 - Os preços estavam todos congelados?
R - Tudo congelado. Tinha 15 milhões de dólares de prejuízo, na fábrica ninguém se entendia, tinha uma guerra de um lado para o outro, mistura de produtos na fábrica com recall; o negócio era preto, mesmo. Vendia o que não tinha, produzia o que não vendia, o negócio todo...
P1 - Nessa época a Upjohn também já tinha...
R -Nas primeiras semanas em que eu estava aqui teve uma reunião que foi catastrófica. A Upjohn xingava a Rhodia, chutava a Rhodia, porque o _____________ brigava com o patrão. E veio o Fernando Leal, que era um brasileiro, que estava na Upjohn e voltou dos EUA numa posição importante, e veio brigando, largando o pau, xingando. Então, tinha um ambiente terrível com a Upjhon, não tinha relação. E a gente tinha licença deles, porque tinha tido uma guerrilha, quer dizer, o pessoal, ainda tinha o pessoal da Upjohn, o pessoal da Rhodia, isso já seis anos depois da compra. Ainda tinha os grupos. Então, tinha uma relação muito difícil com a Upjhon que eu tive que reconstruir também. Então, foram cinco ou seis meses junto com o (Truci?), em que eu era o chefe, mas não era o chefe, a gente convivia, até uma hora que a gente chegou para ele disse: “Escuta, ou fico eu ou fica você, porque não dá pra gente tocar esse negócio”. E pouco a pouco começamos a trabalhar. Tinha vindo o (Danienzo?) do (Bidin?) em setembro, outubro do ano anterior, tinha vindo o Barella da Agro-Química, que estava na fábrica, como chefe da fábrica; o (Danienzo?) estava embaixo dele, eu tinha vindo. Quer dizer, todo mundo que não tinha nada com a Farma, para tentar mudar um pouco o gerenciamento, o management, para a gente construir a Farma. A Rhodia Farma não era da __________________________________, era a ovelha negra, tinha ficado fora do _______________________- porque diminuiu o valor da ______________, Então era a única que ficou fora.
P1 - O que era a Rhodia Farma?
R - Porque a ________________ e _____________ foi a fusão como agora. E a Rhodia Farma, que devia ter entrado, ficou fora, porque como ela era negativa, diminuía o peso da ____________________. Então, ficou fora. Ficou ligada à Rhodia Brasil e a ___________ França. Então, a turma da __________________, “a Rhodia Farma não é nossa, portanto...” E a reação nos EUA foi: “Pô, o Musa mandou um cara lá que não tem nada a ver com farmacêutica, nunca trabalhou em farmácia, não entende nada”. Então, já lá teve uma reação, todo mundo com um pé atrás.
P1 - E nessa época já respondia aos EUA?
R - Não, respondia ao Brasil, aqui. Nem à França. Nós éramos uma filial da Rhodia Brasil, também não existia mais a _____________________ na França, porque existia a __________________________. Então, nós ficamos como se fosse um licenciado da ________________. E com muita desconfiança, porque o pessoal não confiava, achava que a Rhodia não administrava bem isso daqui, porque o (Benier?) era alguém que tinha vindo da (Hore?) e o Musa despachou ele; mas ele fez um monte de besteira, por isso que o Musa despachou. Mas ele também não foi hábil o suficiente pra fazer o contato de diplomacia em relação à Rhodia e em relação à ______________. Quer dizer, ele quebrou a cara, fez um monte de besteira, e já tinha um processo conflituoso entre a _____________- e a Rhodia. Então, também na matriz, que não era chefe nossa, mas que o pessoal imaginava que um dia iria comprar, porque a indústria farmacêutica o cara tem que ser representante, supervisor, gerente distrital, gerente regional, para chegar a ser o gerente geral.
P1 - A carreira era essa?
R - 99% da indústria farmacêutica ainda pensa assim. Eu acho uma tremenda besteira, mas eles pensam; para mim acho que ainda é uma das mais atrasadas em termos de management. Os paradigmas bem... Não passa isso para o resto da indústria farmacêutica. (Riso)
P1 - Você quer tomar uma água, parar um instantinho?
R - Se quiserem parar, podem parar, depende de vocês.
P1 - Eu quero entrar um pouquinho na Farma, mas quero saber o quanto você está cansado.
R - Vamos em frente.
P1 - Eu queria perguntar o seguinte: nesse momento, o que havia na área comercial e na área de produção, o que você vê que foi se transformando? Porque a Farma hoje em dia não é mais esse horror. Houve várias transformações. Então...
R - Primeira coisa: na área comercial havia problema, mas não era tão grave, porque o Plínio ainda estava aqui, você conhece o Plínio? Ele era o responsável de marketing, e tinha sido uma pessoa que não queria mais ficar na Farma por causa do (Bernier?). Era a pessoa que controlava, que dominava, mas ele e o (Bernier?) também não... Quer dizer, o (Bernier?) não conseguia gerenciar ninguém, não se dava com ninguém. O Plínio conhecia o marketing, quer dizer, não era tão grave a problemática na área comercial. O problema era a fábrica. O grande problema era a fábrica.
P1 - O prejuízo era, basicamente, pelo controle de preço?
R - O prejuízo era pelo controle de preços, mas também era porque vendia o que não tinha e produzia o que não vendia, quer dizer, era uma bagunça total. Os custos de produção eram elevados, tinha ______________, produtos que faltavam de monte, tinha estoque sobrando de monte. Era uma bagunça. A anticlasse mundial era o que havia na época. Mas o problema principal era a fábrica, porque tinha um problema de recall sério, mistura de produto, não tinha controle.
P1 - Não tinha um trabalho de qualidade?
R - Nenhum.
P1 - Mas no mercado, nesse momento, a Rhodia Farma, digamos, ela gozava de um nome...
R - A Rhodia Farma, até pelo passado dela, sempre teve um prestígio importante. O nome Rhodia tinha um certo peso, quer dizer, isso não traspassava tanto para fora. A indústria como um todo tinha problemas sérios, principalmente de preço e rentabilidade. Muitas estavam indo embora. A (Afa?) foi embora porque não tinha rentabilidade. Mas uma coisa era não ter rentabilidade só por controle de preço e outra coisa é não ter rentabilidade por controle de preço, custos elevados, não ter o produto certo, não lançar o produto, enfim, uma série de riscos e recall. Dois recalls aconteceram, de mistura de produto. E riscos de sabotagem também, porque você tinha pessoas que ainda eram pessoas, vamos dizer, do time da Upjohn, do time da Rhodia, que se digladiavam.
P1 - Um jogava veneno no remédio do outro.
R - E outra: também tinha alguns gerentes industriais que no passado tinha um pouco de protecionismo, tinha um problema com as meninas. Então tinha proteção, porque eles saíam com as meninas. Era um negócio cabeludo, aí dentro. Um pouco da cultura da (Afa?), ainda. Então, o grande problema, o foco principal, era a fábrica. Reorganizar a fábrica. Aí estava chegando o ____________, estava chegando o Barella, chegaram dois, três meses antes que eu. Então, se começou todo um trabalho de reconstrução da fábrica.
P1 - Gente que não veio de dentro da Farma?
R - De jeito nenhum, não tinha ninguém da Farma. Tanto o (Daniezo?) quanto o Barella vieram de fora. E algumas pessoas que estavam aqui. O Donaldo, que vocês entrevistaram, tinha sido massacrado, quer dizer, o (Bernier?), quando eu vim para cá, ele era pra ter sido demitido pelo (Bernier?). Não foi porque ele foi falar com o Musa, uma cara que tinha 20, 30 anos de farmacêutico-responsável, o (Bernier?) queria demitir o Donaldo. O Donaldo acabou não indo, porque ele foi falar com o Musa uns meses antes e ele acabou ficando aqui. Então, tinha aquilo: “Por que o Donaldo ia ser demitido? O que aconteceu?” Porque o pessoal fazia um monte de besteira, acabaram responsabilizando o Donaldo por coisa que ele não tinha responsabilidade nessa época. Então, tinha que reconstruir também a pessoa do Donaldo como o farmacêutico-responsável, o técnico que conhecia as coisas. Foi uma coisa que a gente teve que fazer logo no início também. Voltar a dar motivação para o Donaldo, porque ele estava também, não sei se ele contou isso ou não, mas estava pra ir embora. Eu lembro que a gente fez um simbolismo. Quando a gente inaugurou a ... Tinha o auditório, sabe aquele auditório lá da história da medicina? A gente fez um simbolismo, a gente fez, aqueles quadros estavam perdidos num canto, e a primeira vez que eu visitei a Farma, em 1900 e não sei das quantas, eu vi aqueles quadros e eu gostei deles. Porque foi uma época em que a gente começou a fazer um curso de francês, do qual eu e o Donaldo participávamos e mais algumas pessoas e era não Farma. Então, a primeira vez que eu fui na Farma, para assistir aula de francês, eu vi esses quadros no corredor, muito bonitos. Quando eu cheguei aqui, eu perguntei: “Ah, está num canto.” Então, eu fui ver e estava jogando num canto. Aí eu pedi: “Vamos refazer esses quadros, tal. Vamos botar aqui na sala.” Aí, refizemos, fizemos a inauguração, e aí eu fiz o Donaldo vir, puxar, abrir o negócio dos quadros, porque era um negócio antigo da Farma. O povão todo podia dizer: “Pô, estamos reconstruindo a imagem do Donaldo.” Esse negócio era importante para dar sinais exteriores de valorização das pessoas, de recuperação. Foi um capítulo importante, tivemos que recuperar a imagem do Donaldo, porque era um cara importante pra fábrica. E na produção, o Barella também começou o mesmo processo e tal. Aí, começamos a falar: “Escuta, vamos trabalhar com qualidade, como é que a gente faz?” Aí, eu lembro que eu falei com o Barella: “No Plástico, tem um cara que fez um trabalho excepcional para a gente, o cara que chegou lá não valoriza isso, tá fácil tirá-lo de lá e trazer pra cá, e pode te ajudar bastante. Você toca e a gente monta um programa de qualidade aqui na fábrica.” Aí nós trouxemos o Humberto Campos. Não sei se vocês conhecem?P1 - A gente não entrevistou ainda, mas sabemos quem é.
R - O Humberto veio para cá em 92, 93. Aí, eu falei: “Humberto, olha, é mais um que vai tomar um desafio. Você não entende nada disso também, mas não tem problema. Vamos lá e vamos ver como é que a gente faz na Farma.” O Humberto veio e começou a trabalhar com o Barella, que tinha uma visão muito clara de qualidade total, de programas e tudo que foi feito na fábrica, saiu de alguém que achava que devia fazer e dava um certo suporte, do Barella, que valorizou isso, e o Humberto, junto com o Barella, que fizeram todo um programa que levou dois, três anos e continua até hoje. Começamos a reconstruir, realmente começamos a tirar do barco quem a gente achava que não acreditava nas coisas que a gente falava em termos de qualidade, ________________, os programas diferentes. Pessoas que a gente achava que podiam ser reconvertidas a gente reconvertia. Pessoas que não acreditavam, a gente dizia: “Bom, tem que sair fora do barco.” E depois é um processo de doutrinação importante, de cursos, formação, desenvolvimento.
P1 - Isso foi muito forte? Muito discurso para ser...
R - Foi. Foi. O Barella deu um apoio muito grande, o Danienzo, que era o chefe de produção abaixo do Barella, também acompanhou quando o Barella saiu e foi pra França __________. O Dani continuou com o programa, a gente já tinha formado mais três, quatro pessoas como multiplicadores na fábrica. E tudo isso veio evoluindo.
P1 - E o programa de qualidade foi centrado mais na produção?
R - Começou na produção. Fundamentalmente na produção.
P1 - E basicamente no que implicava esse programa de qualidade?
R - Primeiro, dar foco: “Por que existe a produção, qual é a missão da produção, qual é a visão, quais são os valores, o que nós temos que fazer? Nós temos que ter qualidade, temos que ter custo, temos que atender os clientes.” Os clientes eram o business, a partir daí o pessoal começou a detalhar esse negócio e a envolver as diversas áreas pra ver como faz isso. Com todas as... Você pega o diagrama de (Shikawa?), começa a fazer os diversos itens possíveis. Nós pegamos um pouco toda a teoria do Proex que a gente tinha tocado e começamos a aplicar aqui. Começamos a aplicar a (Cinquest?), TPM (Manutenção produtiva total), enfim, a cada momento a gente fazia um tipo. E aí, a grande vantagem que o Humberto tem ninguém na Rhodia como ele consegue fazer isso bem, é a facilidade - ele é engenheiro -, a facilidade de diálogo com o operário. Ele consegue se colocar lado a lado com o operário, se sentindo totalmente à vontade. Ele tinha feito isso no Plástico e fizemos isso aqui também. Na realidade, é aquele negócio, a gente diz: “É admitir que o operário tem cérebro, não só braço. E que o engenheiro também tem braço, e não só cérebro.” E os dois têm que trabalhar juntos, com o coração. Você joga esse negócio e consegue mudar a cabeça dos operários. Então, começaram os programas de melhoria das diversas áreas, com a participação efetiva deles. Quer dizer, isso tem quatro, cinco anos de trabalho de modificação da fábrica. Claro que a gente fez alguns investimentos, modificações que tinha que fazer. Uma planta nova na Injetáveis, mudamos o ___________ da Rhodia Nordeste para cá, mas no gerenciamento da equipe, na liderança, que a gente sempre jogou essa ideia de valores, princípios, qualidade, melhoria constante.
P1 - Isso era uma coisa que não existia?
R - Aqui, não. Quer dizer, existia um pouco no tempo do Farid, não tão forte, existia muito mais do lado comercial, que o Plínio tentou implantar. Então, quando veio o (Bernier?), esse negócio acabou. Porque francês não acredita muito em programa de qualidade, participação. Na França não tem esse negócio. Isso é uma experiência muito do Brasil.
P1 - Do Brasil ou americana?
R - Do Brasil. Nos EUA é meio complicado. Com a (Hover?) também não foi tão simples. É mais fácil fazer com os EUA, mas (fim do lado B – fita 2) tem um enfoque um pouco diferente do que a gente tinha aqui. Se esse programa de qualidade é importante, vale a pena vocês baterem um papo com o Humberto, ele conta a história, como ele vê, como ele se sentiu. A cada ano a gente reformulava o programa, começamos com as primeiras ideias de custo, de qualidade, com a participação sempre dos operários, da liderança dos operários. A cada ano a gente refazia o programa. Hoje você deve ter visto no restaurante: Farma 2000. Evoluiu para um programa Farma 2000, que são todos os programas de melhoria de qualidade, melhoria de processos que a gente quer para os próximos anos. Duas vezes por ano a gente faz a reunião do painel de melhorias. Os operários vêm, apresentam o que eles fizeram, apresentam transparências, com quadros. O ano que vem vale a pena vocês verem, porque é impressionante você ver a simplicidade, a humildade dos operários, e a satisfação com que eles vêm aqui. Eles vêm do nível mais baixo, na época alguns não tinham nem o curso secundário, a gente acabou dando pra eles, aqui, falar com emoção e satisfação do trabalho que eles fizeram. Porque são eles que conhecem, em detalhe, uma pequena coisa que está na máquina e que o engenheiro, o farmacêutico, o técnico, não conhecem. Ele muda, melhora, sem investir nada. E ele fala aquilo com uma satisfação de ter contribuído, porque ele foi treinado para aquilo e ele faz aceitando naturalmente. Vários casos foram feitos, centenas de casos. Então, tem sempre melhorias e a gente faz eles apresentarem, têm o reconhecimento, às vezes eles fazem até de uma forma um pouco teatral. Eles apresentam do jeito que eles querem e o Humberto está sempre acompanhando. Depois teve a Benê, que infelizmente saiu agora, que acompanhava os operários para tocar isso. Então, durante quatro, cinco anos, foi focado nos operários todos esses programas. E hoje, quem vem de fora e visita a fábrica nossa, dentro da (Planejamento de Recursos Empresariais) tem 50 fábricas, e em termos de management, esta fábrica é a melhor dentro das 50. Não é a melhor em equipamentos, porque nós deixamos de investir muita coisa, não temos o update de investimentos que tem nos EUA ou que tem na França, mas em matéria de gerenciamento e de participação dos operários é a melhor fábrica que tem. Espero que com a ____________ a gente consiga passar isso.
P1 - Isso é uma coisa que é considerada. O pessoal sabe?
R - Todo o pessoal que vem de fora reconhece, todos. O (Board?) da ____________ esteve aqui em 96, visitaram a fábrica. O _______- veio, o _______________ veio, toda a direção visitou nossa fábrica, teve uma apresentação aqui. Conheceram, elogiaram bastante. E a Rhodia usa no Brasil o exemplo da nossa fábrica como um exemplo concreto da utilização das ferramentas do Proex, de management da Rhodia, como um case de sucesso. E tem outra coisa: esse case - posso te dar uma cópia -, foi feito um case dessa recuperação da fábrica, que o Humberto e mais dois colegas da GV apresentaram um case, publicado na Revista de Administração e foi apresentado, acho, no Canadá e na Suíça. Me lembra de te passar isso aí. E conta a história do negócio todo em detalhe, como começou, como foi. Conta realmente o recall, a fábrica estava numa situação muito difícil, e com o processo veio sendo recuperada. Faz uns dois anos, mais ou menos. O Humberto foi um dos autores e apresentaram lá fora também. E a Rhodia usa isso como um case. Agora, o principal disso é ter as pessoas certas e ter constância de propósitos. Você tem que estar sempre... Faz cinco anos, seis anos que a gente bate nesse negócio: a qualidade, a melhoria, a evolução.
P1 - Você avaliou na hora da entrada que tinha que focar nessa questão?
P1 - A forma de, tinha que recuperar a empresa. O grande problema era qualidade, era custo, mas ninguém acreditava mais na empresa. Era a motivação das pessoas. Você não podia demitir todo mundo e colocar gente nova. Tinha que demitir aqueles que eram mais céticos e converter aqueles que podiam acreditar. Felizmente, o Barella acreditava, que estava aqui, o Danienzo acreditava, porque eles tinham visto isso nas outras áreas. O Humberto veio uns meses depois e foi um catalisador fundamental nesse negócio. Demos toda a condição para o Humberto estar trabalhando nisso. Isso acabou se disseminando. A constância de propósito, faz seis anos que a gente continua falando que isso é importante. Os campeões da causa são o Paulella, era o Barella, agora é o Danienzo. Você não pode, porque se com a ___________________ a gente parar seis meses esse negócio e mudar a direção, leva cinco anos para construir, e em seis meses você perde tudo.
P1 - Posso pedir um segundinho para trocar a fita e daí a gente faz um intervalinho?
R - Estou falando demais? (pausa)
P1 - A gente tava na recuperação da fábrica, programa de qualidade.
R - É, eu acho que tem muito detalhe, que havendo interesse em ter depoimento sobre isso, eu acho que Humberto Campos ou Dario Roberto Danienzo, que é o atual diretor da fábrica, têm muita participação nisso e podem falar com mais detalhes.
P1 - Isso foi uma transformação...
R - Isso foi uma transformação da fábrica com uma recuperação importante de... de...
P1 - Autoestima?
R - Não, é, o pessoal passou a acreditar um pouco mais, quer dizer, se começou a dar também formação ao pessoal, a gente montou uma escola aqui, para melhorar o nível educacional das pessoas. Enfim, todo um processo de envolvimento dos operários importante, e que minimizou todos os riscos de problemas de qualidade, de produção. Culmina isso com a fábrica nossa sendo escolhida esse ano como a fábrica que a ___________- chama global, ou seja, tem um processo de redução de 50 fábricas, acho que para 15 fábricas no mundo nos próximos anos. Dessas 15, oito vão ser globais. Global significa fábrica que pode produzir para o mundo todo. Nossa fábrica foi escolhida. É a única, não vamos dizer do terceiro mundo, mas países emergentes [risos], que está no hemisfério sul, que foi escolhida, porque as outras são uma nos EUA, acho que tem duas na França, duas na Inglaterra, uma na Irlanda, a nossa, oito, sete, e provavelmente vai ter uma na China. Então, no hemisfério sul a única é a nossa, que hoje fornece para América do Sul, países do Mercosul, para América Latina, e a intenção é converter essa fábrica em uma fábrica global. Então, quer dizer, de uma fábrica que era uma ovelha negra, tinha dois recalls, o que era um absurdo, hoje foi escolhida como uma fábrica, reconhecimento do grupo mundial, como uma fábrica que poderá fornecer para os diversos países do mundo, salvo os EUA. Se a gente conseguir a aprovação do FDE (Resultados Fora da Especificação), até pros EUA a gente poderia vir a fornecer os nossos produtos. Então, esses seis anos, para o pessoal, é uma vitória enorme, um reconhecimento muito importante, porque o pessoal conseguiu fazer e construir em termos de fábrica. Do lado do business tem bastante coisa também, nos preocupamos com o programa de qualidade com o Humberto, porque se concentrou na fábrica, e a gente começou a trabalhar na comercial de dois anos para cá. O comercial é mais difícil, é mais complicado. Na fábrica é o operário, é o físico, é mais fácil de você ordenar. No comercial tem muitos paradigmas ainda, da indústria farmacêutica. Então, a intenção nossa é fazer com que os representantes, os gerentes distritais, os supervisores, passem também a trabalhar de uma maneira mais aberta, não tão fechada, não tão dirigida, mas que possam pensar, dar sugestões e ter programas de melhoria.
P1 - Na relação com a empresa ou com os médicos?
R - Ambas. Na relação com a empresa, o paradigma da indústria farmacêutica é o seguinte: você tem o pessoal do marketing que define uma peça promocional, define as coisas que devem ser ditas para o médico, e o representante repete como um papagaio aquilo pra maioria dos médicos.
P1 - É uma coisa que não se consegue mudar, né?
R - Esse é o paradigma da indústria. A gente quer fazer um pouco diferente. A gente quer que o representante pense, não precisa ser um papagaio repetindo coisas por médico, que ele tenha habilidade e conhecimento suficientes para ser flexível e fazer a adaptação válida na relação dele com o médico, até com uma certa habilidade psicológica de entender como o médico reage e possa reagir, e não um negocinho fechado. Então, isso a gente está tentando fazer no sentido de que melhore a performance dele, melhore a eficiência dele. Por outro lado, programas de melhoria na relação dele com o que tem no campo, trazer pessoas do marketing e integrar isso de uma maneira bastante positiva, e não (silo?), não compartimento estanque. O marketing, as vendas, os caras são assim: aqui é o cérebro, aqui fazem; e não se entendem, um critica o outro. Tentar fazer esse negócio de uma maneira integrada. Também estamos tentando criar o que a gente chama de business team, quer dizer, a gente quer um gerente de produto, que está no marketing, que deve ser responsável por aquele produto, por aquele grupo de produtos, por aquela franquia. É como se fosse um mini-gerente do negócio, que ele tem que ter habilidade suficiente para ver todas as pessoas da companhia que vão trabalhar para aquele produto dele. Então, precisa ter habilidade para conhecer o produto, para envolver as pessoas, para fazer as pessoas participarem daquilo. No sentido de evitar também os compartimentos estanques: vendas tem que estar presente, marketing tem que estar presente, gestão, fábrica.
P1 - É quase uma unidade de negócio para cada produto?
R - Isso. Ou grupo de produtos, ou franquias, ou áreas terapêuticas específicas.
P1 - Isso está acontecendo já?
R - Sim, nós temos. O Plexane, por exemplo, que é um produto importante, a gente conseguiu fazer isso. Aí depende muito de pessoa a pessoa, esse negócio não é matemático. Não dá pra fazer... Numa área a gente conseguiu um sucesso bastante grande, as pessoas estão bem integradas. Em outras áreas, não tanto, mas temos dois ou três grupos que trabalham. Nós temos um produto que chama (Ebastel?), nós temos o Ebastine, por exemplo. Então, tem a Cristina, que é gerente de produto, que está coordenando, trabalhando com pessoas não ligadas hierarquicamente a ela, no sentido de...
P1 - Qual é o produto?
R - Ebastel. Não, o outro é Clexane.
P2 - Qual é o perfil desse gerente de produto? Ele tem que ter uma formação específica, tipo farmacêutico...
R - Não, depende. Quer dizer, a tendência é, se a gente tem produtos, mais para produtos técnico-científicos, digamos - Clexane é um produto que vai para a cardiologia, para trombose renal profunda -, tem que ter um conhecimento científico, médico, marketing, importante. Na oncologia a mesma coisa, nós temos que ter um gerente de produto que consiga entender um pouco da oncologia. Pode até vir a ser um médico. No caso do Clexane, a responsável é uma médica. A Sandra é médica e é responsável, gerente de produto do Clexane. Mas, independente disso, precisa ter habilidade gerencial também. Precisa conhecer o proudto, evidentemente, mas tem que fazer o médico trabalhar para o produto, o vendedor trabalhar para o produto, o gerente, o próprio chefe dela, o gerente de marketing, dar o suporte. Se precisar do Paulella numa reunião, convoca, quer dizer, tem que gerenciar a coisa. Então tem que ter uma habilidade gerencial para fazer o produto, que a companhia pense naquele produto. Claro que nos produtos estratégicos foco não é pra todos os produtos. Então, uma inovação é essa: tentar criar grupos, tentar evitar os compartimentos estanques, e criar realmente um time trabalhando junto nas diversas unidades. Isso está em andamento, é o trabalho que a gente está fazendo. Quando a gente veio para cá, também, não havia a mentalidade de planejamento mercadológico. Tinha se perdido. Eu acho que no tempo do Farid esse negócio devia existir, mas nos outros dois anos foi meio perdido. Então, quando a gente viu isso daqui, com toda aquela confusão que tinha, a gente disse: “Bom, vendas é vendas, tem o problema de preço, tal, mas como é que a gente vai promover os produtos, como vai ser o marketing?” A gente tinha um negócio meio disperso, meio perdido. E nós tínhamos um francês que trabalhou conosco, Alexandre Carvalho - apesar desse nome é francês -, que tinha vindo pela RPR para trabalhar na área de marketing, e que também foi um problema, porque havia uma aversão muito grande a ele, como ele tinha vindo da RPR. Ele chegou aqui uns meses antes de eu chegar. Ele tinha vindo da RPR, então era como se fosse um espião dentro da Farma, que não era da _________________ era o responsável de marketing. Então, tinha que fazer um trabalho, mas não tinha apoio. E era uma pessoa muito inteligente, muito competente, porém francês, às vezes meio duro, fazia as afirmações bastante racionais, esquecendo um pouco a parte mais sentimental, e isso parecia que agredia um pouco as pessoas. Foi um processo complicado e eu tive que dar um apoio muito grande para o Alexandre, para que a gente pudesse converter um pouco, criar um pouco uma mentalidade de marketing mais com definições corretas de grupos de produtos, posição. Porque, na maioria dos laboratórios, mesmo os americanos, as coisas vêm prontas dos EUA. O pessoal traduz aqui, faz uma pequena adaptação ao mercado brasileiro e sai fazendo. Na Rhodia não tinha isso e quase nunca teve. Quer dizer, mesmo antes de _____________________, no tempo do Farid, nos tempos passados, teve uma abertura, uma possibilidade muito grande do pessoal fazer o marketing próprio, desenvolver as coisas. Tanto que foram feitas coisas no Brasil que não foram feitas em outros locais. Isso é bom e é ruim. É bom porque te dá a oportunidade de criatividade e de fazer, e é ruim porque às vezes você não tem o suporte que deveria ter pra fazer o approach de marketing. Então, com o Alexandre, eu tive que dar um apoio muito grande pra ele, com todas as dificuldades de organização, de pessoas, e várias pessoas do marketing saíram, aquelas pessoas mais antigas, do tempo da Upjohn. Nos primeiros dois anos foi muito difícil a gente fazer o Alexandre se afirmar e trazer uma contribuição positiva, porque era a pessoa que talvez mais conhecia o marketing farmacêutico naquele momento. O Plínio tinha ido para a Rhodia, ele ficou como responsável do marketing. Aí tinha um problema sério entre o marketing e vendas, como tinha uma aversão a ele pelo fato de ser francês, da RPR, foi um período difícil de gerenciar. Ele ficou conosco de 91 a 96. Então, foi um período de a gente tentar, com ele, criar a mentalidade de planejamento de marketing, desenvolvimento e gerência de produto, lançamento de produtos. Teve uma participação muito grande dele, se bem que ainda hoje tem pessoas que não gostam dele, porque ele era duro, achavam que ele tomou a posição de algumas pessoas. Mas foi uma pessoa que teve uma contribuição bastante positiva no marketing. Tivemos que mexer, também, na área de vendas, porque tínhamos paradigmas antigos, pessoas antigas que tinham sido promovidas acima do seu limite de competência. Pessoas de que eu gostava muito, e tinha que tomar atitude e dizer: “Bom, eu gosto muito de você, nos conhecemos de outras áreas, de outros momentos, mas você está na posição errada”. Então, teve algumas decisões, também, difíceis de serem tomadas. O Sílvio Rondinelli é uma delas, não sei se ele tem mágoa ou não da empresa, mas ele levou um processo de quase dois anos de saída dele, tal. Porque ele era o responsável de vendas quando tinha o Alexandre, responsável de marketing, eles não se bicavam muito e o Sílvio tinha uma série de paradigmas e não tava no enfoque que eu achava que tinha que ter, na nova forma da gente trabalhar vendas farmacêuticas. Porque tinha um problema de gerenciamento da equipe de campo, aceitação pela equipe de campo, admitir a liderança. Ele tinha aceitação sob o aspecto estritamente pessoal, sob o aspecto profissional tinha dificuldade. Porque promoveram o Sílvio no passado, antes de eu estar aqui, sem levar em conta isso, colocaram ele numa posição que na hora de ver a realidade, ele ficou um pouco em cheque. Então, a gente foi buscar o Waldemyr, que eu não sei se está na lista ou não, que estava na Veterinária.
P1 - O Waldemyr estava na Veterinária?
R - Estava na Veterinária. Foi da Farma, no passado, da Farma ele foi pra Veterinária, e da Veterinária ele voltou pra Farma. O Waldemyr é uma pessoa que tem uma aceitação muito grande pela equipe de campo, tem uma liderança. E com ele a gente conseguiu dar uma estabilizada na motivação da equipe.
P2 - Mas teve uma mudança nesse processo de seleção de propagandista?
R - Teve. Tem um negócio que eu pulei, que em 94, 95, nós tivemos, por imposição da França, apesar de não ser a dona da gente ainda, nós tínhamos um chefe que era colombiano, que nos obrigou a criar uma segunda força de vendas. Tinha o lançamento de um produto, o pessoal achava que dobrando a força de vendas a gente ia vender mais, eu era contra, porque achava que precisava ter produto pra dobrar a força de vendas. Não compensava ter um custo muito maior sem ter resultado, porque não tinha produtos que vinham da pesquisa importantes. Em suma, o pessoal bateu firme: “Tem que ter, tem que ter, porque vai vir um produto novo”. Então, de 94 pra 95 nós tivemos todo um processo de seleção para dobrar a força de vendas. Nós admitimos quase 200 funcionários. O Tosta participou muito disso. Aí a gente aproveitou pra dizer: “Bom, já que a gente tem que admitir, vamos pegar um pessoal de enfoque mais técnico, um pessoal de nível superior, já começar um processo de melhorar o perfil da equipe”. A gente era contra, mas foi imposto, já que tem que fazer vamos fazer o melhor. Aí, em dois, três meses, a gente conseguiu botar 200 pessoas na equipe de campo. Pessoas que não tinham experiência nenhuma, às vezes, mas que tinham curso superior e um bom perfil. Eu lembro que em abril de 95, 94, 95, a gente fez uma reunião no Hilton com todo o pessoal, tinha quase 400 representantes, tal, lançamos a segunda força. Isso virou uma catástrofe, porque não tinha produto.
P1 - Mas o pessoal era para vender os mesmos produtos?
R - Não, a gente ia lançar um produto, um antibiótico que deveria vir, a gente tinha que aprovar naquele ano, no ano seguinte. Então, tinha que preparar o pessoal para vender esse antibiótico. Só que esse antibiótico não funcionou, porque era um produto para infecção respiratória, mas era um produto de licença japonesa e tinha fotossensibilidade. Lançaram na França, algumas pessoas foram fazer esqui, tomaram sol, e tiveram problemas sérios de queimadura na pele pela fotossensibilidade do produto. Você imagina num país tropical, você lançar um produto, 400 caras falando do produto, e o cara em vez de ficar no hospital, vai para praia, imagina o que vai acontecer. [risos]. Foi um pouco... Mas aí mesmo ao nível mundial o pessoal suspendeu, alguns países lançaram, mas enfim, o produto hoje não tem mais porque não deu certo. Acontece na indústria farmacêutica. Mas a gente já não queria fazer porque achava que era arriscado, fizemos e aconteceu que nós tínhamos uma batata quente, nós tínhamos duas forças de venda, tinha a turma azul e a turma branca, porque uma era elite e a outra era... Aí veio o superior e o inferior transportado para os anos 90. Quer dizer, tinha a turma de elite, a turma branca e a azul...
P1 - A elite era o pessoal de formação superior?
R - É.
P1 - E essa divisão ela veio, ou foram vocês que...
R - Não, nós criamos uma segunda e aí nós tínhamos que dividir as turmas, porque nós tínhamos um número grande e fizemos duas turmas diferentes. Aí a gente procurou tentar ver como fazia essa evolução, só que como não tinha os produtos, ficou complicado. Era um período ________________ na área comercial muito complicado, além de que na cabeça tinha dúvidas, tinha o marketing de uma lado, que era favorável, e as vendas, que não concordaram. Em cima já tinha briga, embaixo tinha ______________. A gente teve que fazer, não só com turn-over, mas começar a reduzir essa força, não tinha produto. Voltamos a reduzir para ajustar a equipe. Aí, realmente, ficar com aqueles que a gente achávamos que eram o perfil que queríamos.
P1 - Na realidade, foi quase como uma renovação? Porque funcionou para o representante ter formação superior, foi bom em que sentido? Foi bom?
R - Foi bom. Primeiro, porque nós temos uma parte chamada linha hospitalar, que são os produtos hospitalares e oncológicos, mais sofisticados. Os representantes têm que entender o ensaio clínico que foi feito, um abstract que foi publicado num congresso de oncologia, de cardiologia, ele precisa ler, entender, conhecer aquilo. Não é que ele vai ensinar para o médico, mas questões que o médico possa fazer, se ele não tem uma formação superior e não está a participar de treinamentos, treinamentos, está pensando só em vender, não se adapta a isso. Para esses produtos foi altamente positivo porque são produtos de sucesso, mas depender da força de vendas com conhecimento. Para outros produtos não é tão importante, mas a ideia é que a gente pudesse ter um processo de evolução: um representante mais comercial, que vai evoluindo, e chega ao nível oncologia-hospitalar. Mesmo na open care, produtos tipo respiratório, alergia, sempre tem essa necessidade de conhecimento técnico, desenvolvimento. Como a gente não faz mais venda, faz promoção médica, a venda é feita pelo distribuidor. Tem meia dúzia que faz o contato com o distribuidor e todo o resto, a gente queria tirar o negócio de vendas da cabeça do representante. Tem que fazer promoção médica, porque se gerou uma receita, vai vender na farmácia. Não precisa vender. Aquele que é mais comerciante pensa na venda, não pensa em aprender o produto para ir no médico e fazer a promoção correta. Então, isso foi um processo em que ainda hoje a gente está evoluindo. Quando tinha o paradigma antigo, do Sílvio, do representante antigo, era muito mais essa colocação tipicamente comercial, e não tão técnica. Foi um processo de mudança que a gente fez nessa época, também. Está em andamento, isso não pára.
P1 - Isso já teve algum reflexo, algum resultado objetivo? O que muda na relação com o médico, aumentou?
R - Muda a confiabilidade que o médico tem, ele recebe representante de todo o tipo, desde o que vai entregar amostra grátis, ao representante que vai despertar um certo interesse. O médico se interessa em receber informação de um medicamento novo, ou antigo que tenha coisa nova que ele não teve oportunidade de ver, de conhecer. A presença do representante está levando coisa nova pra ele. Se ele só vai levar amostra grátis, e muitas vezes é o que ele faz, ele põe cinco ou seis na sala, fala, fala dois minutos, entregou o remédio, jogou no lixo. Tem isso. Então, o fato de você ter um representante mais capacitado, é claro se você promove produtos que têm o que falar também, porque se você tem coisa que não tem o que falar, fica na base da relação pessoal entre os dois. É uma imagem melhor, para alguns produtos é detectar, o problema que tem é classificar muito bem o médico A, (Bernier?) e C. Você tem um médico que realmente prescreve produto seu, é o A, o B pode prescrever ou não, e o C é uma massa enorme com que você está só gastando dinheiro. Cada visita custa tantos dólares, se ele vai lá todo mês e não tem prescrição, é jogar dinheiro fora. Ele tem que ter habilidade de captar, de perceber, de conhecer se o médico está prescrevendo o produto que ele promove, ou não. Aquele que é comercial está muito mais porque o médico é amigo, tem um churrasquinho de sábado, pode não prescrever nada, mas é amigão dele. Imagina o cara lá em Rondônia, Belém do Pará, é amigão dele, tal, faz a visita, cumpre o ritual, só que não prescreve nada. Esse é o que está na ótica antiga do comerciante, não está preocupado se teve receita ou não. A mudança é essa, e o que a gente está fazendo também, é que tinha antes uma avaliação geral, tem cotas, tem prêmio no fim do mês, que vai de 20 a 25% da remuneração dele, fechamento de cota por prescrição. Isso era global antes. Estamos montando um esquema pra ter a prescrição individual. O Brasil dividido em bricks, que a gente chama, pequena zonas, a gente vai ter o potencial daquela região, o representante da região, medir por informações diversas de sistemas informáticos o potencial e o que teve de prescrição na região, para medir o trabalho dele. Supondo que o marketing nosso é correto e tem um potencial, o trabalho dele é que vai fazer a prescrição ser maior ou menor, comparado com os concorrentes que estão fazendo o mesmo trabalho naquela região. Se o nosso marketing é ruim, em todas as regiões vai ser ruim a venda. Se o nosso marketing é bom, vai ter região boa, região má, isso vai ser um pouco a performance dele.
P1 - Isso é uma meta? Está começando a acontecer?
R - Está. Tem um objetivo e começa a ser avaliado por isso, não vai mais ser um prêmio global, vai ser individual; o que fez, fez, o que não fez, não ganha.
P1 - O prêmio, até agora, _________________ os representantes ganham?
R - Era global. Fechou a cota Brasil, por exemplo, a cota da região tal, todos representantes ganham; tem o cara que resolveu ir para o cinema, à tarde, ao invés de fazer o trabalho, e tem o que trabalhou até tarde da noite, e os dois ganham a mesma coisa. Quer dizer, é injusto. A gente está achando as maneiras de dividir. Só que o pessoal antigo não aceitava de maneira nenhuma isso. E o pessoal novo diz: “Se eu faço o meu trabalho, eu quero ser recompensado, remunerado, pelo trabalho que eu faço”. Claro que se a região toda fizer, ótimo, porque a gente tem prêmios de superação, tem outros prêmios, mas muda bastante essa relação. É uma mudança de perfil. Aí entra um pouco o Humberto, no trabalho de qualidade comercial, nas relações, nas reuniões que ele participa entre o gerente regional, os gerentes distritais, e como o pessoal pode descer isso até os representantes. É todo um processo de performance e melhoria que a gente passa na cabeça desse pessoal. Então, a gente tem a fábrica, está evoluindo ao nível do business em si, amarrado ao problema de foco da empresa, (fim do lado A – fita 3) quer dizer, nós temos também que nos dispersar, o pessoal antigo, (Buzina) olha um corintiano aí [risos]. E vamos nos focar nos produtos estratégicos em que a gente tem vantagem competitiva. Esse direcionamento o pessoal aceita mais facilmente e não: “Por que eu não vou vender o Gardenal, que é um produto mais antigo, vou vender esse, que é mais difícil”. O foco faz com que a gente tenha um percentual de vendas nos produtos mais estratégicos, que é o normal na indústria farmacêutica. Você tem produtos novos, que vão compensando os antigos, que vão ficando e a visibilidade que se tem é muito maior. Se a gente quer ser uma empresa classe mundial, temos que produzir bem, temos que vender bem, temos que ter o máximo de rentabilidade. O pessoal começa a entender a problemática da rentabilidade, do retorno de prescrição, a gente começa a dar uma abertura maior de informação, os gerentes de contas, que são os comerciantes, realmente, junto com os distribuidores, têm que ter uma relação com a direção dos distribuidores. Uma visão mais global do negócio, não só buscar o pedido, toda uma mudança de mentalidade, pouco a pouco a gente está fazendo.
P1 - Você está descrevendo toda uma série de transformações, feitas localmente. Como isso foi resolvido em relação à matriz?
R - A gente tem liberdade para isso. Por outro lado, você viu que tem um (speechizinho?) que a Vera estava passando lá, que eu fiz um relatório desse ano. Na festa, sexta-feira passada, eu fiz um discurso e eu citei que não tem coisa mais constante que mudança na Rhodia Farma. Seis anos que eu estou aqui, tive cinco chefes. Chefe direto. Ou aqui, ou na França. Cada ano houve mudança ou de chefe, ou de zona geográfica, quer dizer, nunca tivemos continuidade de uma chefia só. Então, tem muito daquilo que a gente fez aqui, independente do que teve lá. Você imaginou se a cada chefe a gente fosse se adaptar, a gente estava perdido. Quer dizer, ia pirar. Então, a gente faz as coisas, mostra, aceita ou não, mas a gente está fazendo.
P1 - Então não existe esse tipo de controle, aprovações para grandes mudanças?
R - Não. Houve nessa época que a gente teve que formar a segunda força de vendas. Houve imposição. Mas agora, muitas das coisas que estamos fazendo, o pessoal nos EUA: “Tá bom, faz, faz.” Mas nunca, quer dizer, vêm aqui, vê, bonito, mas ninguém pensa em fazer isso lá ou acha que dá para fazer lá. É um negócio próprio do Brasil. Isso não vale só pra Farma, vale pra Química, pra Têxtil, se alguém...
P1 - O que caracteriza _______________ do Brasil?
R - Vamos imaginar, tomar a fábrica. Se você imaginar que um operário, na França, possa participar, como ele participa aqui de programas de melhoria e discuta com a liderança, jamais. (Quadrante 1?) puro, na França, o operário está lá para fazer o que mandarem e fim de papo. Essa abertura, essa valorização que a gente tem das pessoas, acreditar, quer dizer, nós tivemos exemplo de francês que trabalhou aqui na fábrica e vivenciou esse processo e voltou pra França, quis começar a fazer isso lá e depois de três meses tomou uma porrada do chefe dele. Falou: “Ou você muda, ou vai embora, porque isso aqui não funciona”. Na cabeça do francês, isso é coisa da cabeça do brasileiro, que inventou, não passa fácil.
P1 - Carnaval, lança-perfume, aqui, que não deu certo...
R - Não passa. Quando o pessoal vem e vê os resultados obtidos, acha legal, ótimo, mas tenta transpor lá, não funciona. Por exemplo: o Alexandre Carvalho, que eu falei, ele tá em Abidjan agora. Tá na Costa do Marfim, responsável dos países da África francesa. Ele me telefonou hoje. Tem uma Farma lá, e o responsável é um francês politécnico. Ele é francês também, viveu seis anos aqui, está querendo fazer alguma coisa. Não conseguiu convencer o cara lá que o que a gente fez aqui é válido, falei: “Manda o cara vir aqui para ver”. O pessoal acha que isso é bobagem, não funciona, não vai a fundo estudar, analisar, para ver as vantagens. É muito nosso. As mudanças da área comercial é coisa que a gente tá fazendo. Depois a gente mostra. É claro, tem programas de treinamento, de produto, o orçamento anual a gente apresenta para a França, a gente discute, mas a forma de fazer, a gente tem muito de nosso. Às vezes dá certo, ou quebra a cara, volta para trás, faz de novo, mas não tem tanta imposição.
P1 - Mesmo quando era ligado aos EUA? Quando passou dos EUA pra França você estava aqui?
R - Faz um ano.
P1 - Não, quando passou da França por EUA?
R - Estava aqui também. A cada ano. Não teve um ano sem mudança. Primeiro ano estava o (Truci?), de que eu falei.
P1 - Isso é da França, direto?
R - Não, estava aqui, no Brasil.
P1 - Eu sei, mas vocês estavam direto...
R - A França era funcional, só. Não tinha ligação hierárquica, seguir as estratégias, mas era ainda o Brasil, tem que fazer o que a gente manda, mas sempre com um pé atrás. Não éramos filial da RPR, era o (Truci?), e depois passamos para França, e teve o (Richard Forest?), que é escocês, e acho que falava português, espanhol, italiano, trabalhou em vários países. Era o chefe do ___________________________________, que era a França que controlava os diversos países fora da França. Depois dele tivemos o raio do colombiano que era o Muñoz. O infeliz da segunda força de venda.
P1 - O colombiano ficava na França?
R - Na França. Depois dele passamos para os EUA, e tivemos um chefe que a gente chama (O Breve? ), porque era o (Scodari?), ficou seis meses, deixou a RPR e foi embora. Depois veio o (Conary?) americano, o segundo dele que assumiu. Ficamos um ano e meio com os EUA, só. E no final do ano passado despacharam o (Scodary?) e voltamos pra França, é um francês, agora, o (Bernard Riculout?); a cada ano tem que mostrar, explicar, eles desconfiam: “Esse cara tem umas ideias loucas, Brasil, tal”. Cada ano. Esse ano, no primeiro quadrimestre, o cara não acreditava em nada. Os americanos saíram meio, ________________________ ia compra no ano passado as ações da ____________ americanas, ia assumir a França 100% da ________________. Sempre houve, entre os franceses e os americanos, a ideia de que agora, como foi pros EUA, como era a _____________, uma presença forte dos americanos, tinha a cotação em bolsa, a legislação americana, tinha um certo equilíbrio. Quando eles começaram a perceber que a coisa ia diminuir, os franceses voltaram com uma certa represália, uma certa... Então, como 97 foi um pouco ruim, por uma série de razões, nos EUA foi ruim, no Brasil também, os franceses aproveitaram para... Quando criaram a ____ América, muitos franceses não concordaram, acharam que era besteira. Quando foi ruim e voltaram a eliminar a _____________ América, os franceses voltaram e foi aquilo: “Fizeram besteira, foi ruim por causa dos americanos”. Foi ruim por uma série de coisas. Houve todo esse processo. No final do ano passado despacharam o (Colnery?), toda a estrutura da Zona América, acabaram com ela, nos EUA ficou uma filial e o resto voltou pra França. Só a gente que era Brasil, estávamos ligados direto nos EUA, e não com vice-presidente de Zona, ficamos com a França também. Mas aí, esses caras trabalharam com os americanos, o ano passado foi ruim, foi um questionamento enorme. E no final do ano passado eu tomei uma decisão, botando a cabeça a prêmio, certo de que o (Colnery?) concordava, mas não tinha nada escrito, ele estava saindo, uma decisão difícil, que era diminuir as vendas em novembro e dezembro para ajustar a produção e venda à demanda de mercado. Porque a gente tinha um estoque muito grande na distribuição há 70 dias, e a gente ficava na dependência do distribuidor no final do mês comprar o que quer, quer mais desconto, mais prazo. Então, nós decidimos reduzir, abaixar o estoque para 30 dias, mudar essa relação de força, e fizemos isso. 97 foi ruim, também porque deixamos de vender um mês. Esse ano se revelou positivo, isso porque a gente começou a mexer em desconto, prazo, mudamos com os distribuidores que não acreditavam no começo, e a gente mudou um pouco. Só que isso, os franceses falaram: “Como é que um cara no Brasil decide vender um mês a menos? Quem é esse cara?” Eu soube que quase cortaram a minha cabeça e de mais alguém aqui, porque... E nessa época estava mudando, saindo da Zona Americana para a francesa. O (Colnery?) tinha médico dando apoio, por sorte tinha alguns fax trocados, porque senão, não tinha documento nenhum. O cara vai embora... E foi muito acertada a decisão, em alguns países o pessoal fez ao contrário. Porque o paradigma é: precisa fechar a cota do mês para fechar o orçamento com a matriz, porque tem a cotação na bolsa. O pessoal chega e vende no fim do trimestre, no fim do ano, entocha o distribuidor de estoque. Ou aquilo volta depois, ou nos meses seguintes você não vende. Não tem milagre, você vende o que sair na farmácia. Se o teu negócio é prescrição, não tem malho, sai o que a farmácia vender, o que tiver receita médica ou automedicação. Se não, você entocha o distribuidor, aumenta o estoque e o produto não sai, fica dois meses sem vender. A indústria faz muito isso. Então, houve, quando o francês chegou, porque fizeram, porque não fizeram, isso é um questionamento violento, e passamos três, quatro meses para provar que a gente era honesto, que era sério, trabalhava bem. Infelizmente, esse ano, nos outros países da América do Sul, Latina, não aconteceu isso. O pessoal fez um monte de coisa, cortou , reduziu, cortaram o pessoal da Argentina, da Colômbia, uma parte do México. Essa mudança foi meio... Depois de algum tempo eu cheguei para o ___________________ : “Escuta, você cortou todo mundo, médico, avisa se vai cortar para eu saber”. Então, foi um período inicial de provar que não era bem isso, tal, mas levou um tempo. E a cada ano você tem um pouco disso, porque, como muda, é complicado. E como a gente tem uma certa independência de fazer essas coisas, e as pessoas nem sempre acreditam, cada vez tem que estar provando que é certo. Faz parte. Vai começar de novo. Vai juntar a _____________ com a _______________ e começar tudo de novo. Eles têm uma cultura, nós outra, eles vão dizer que estão certos, nós também.
P1 - Mas como você avalia esse processo de integração com a (Hoescht?)? Você acha que vai se dar o que, o que deveria, digamos, o que pode ser vantajoso ou não?
R - Primeiro, o (domran?), que é o presidente da Hoechst , e o (fortu?), os dois estão em cheque, porque os acionistas estão dizendo: “Vocês precisam ganhar mais dinheiro, vocês não são competentes, as duas empresas não tão legal”. A Hoescht já fez isso no passado, a Hoescht___________________ e ________________. Parece que o (Dorman?) e o (Rike?) não conseguiram fazer essa fusão nos últimos três anos. Era fundir as três, fazer uma nova, rentável. Os acionistas estão achando que não, então, em várias publicações, apareceu a cabeça do (Dorman?) a prêmio. Do lado da _______________, a mesma coisa. (Fortu?) pagou 5 bilhões de francos, quase um bilhão de dólares para comprar as ações da __________ para fazer a RPR ser 100% da ______________ francesa. E a rentabilidade, os acionistas não estão achando satisfatória, e realmente é menor que a dos top 10 da indústria farmacêutica. Então, tem que fazer alguma coisa. Corri o risco de sofrer o take-over de alguma outra empresa comprar uma dessas empresas. Aí é agressivo, complicado. Então, tanto a Hoescht, como a ____________ tinham que fazer uma aliança, uma junção, uma fusão. Os mais críticos disseram que se juntou um aleijado com um cego. Um francês escreveu isso. São duas empresas que têm problemas, que estão achando que, juntando as suas forças, vão conseguir alavancar, fazer sinergias importantes, e criar uma empresa importante ______________________. Então, começa assim, a _______________ tem as suas forças, a gente também tem, eu acho que e ______________ tá mais pronta no sentido de estratégia mercadológica, de foco de produtos. Porque se você for em qualquer país do mundo e falar com qualquer responsável de filial da __________________ ele vai falar quais são os três principais produtos que tem que trabalhar, o que tem que fazer, qual é a estratégia na empresa. Se você faz isso com a HMR (Health Market Research), em cada país você vai ouvir uma coisa diferente. O que mostra que eles não conseguiram fundir, ainda, o que era Hoescht, o que era Merrel, o que era ______________, e qual é focalização pra evoluir. Tem um produto importante, que eles lançaram há dois anos, que é o _____________, é um anti-histamínico, que é a única coisa nova nos últimos anos e que está indo mais ou menos, mas no resto, cada país do mundo tem uma coisa diferente. Então, nós temos uma fase anterior à de que a ______ teve há três anos. Então, acho que tanto o (Dorman?) quanto o (Fortu?) disseram: “Vamos juntar, vai ser a oportunidade de chacoalhar essas duas empresas e criar uma nova”. O único problema é como isso vai ser feito. Vai ser honesto, no sentido de que vamos somar as competências, ou vai haver política, pressão. A junção é metade-metade. Se você imaginar que a Hoeschst, em termos de venda, é o dobro – Hoescht global, né - da _________________, como é que o negócio ficou? Na hora em que você projeta os resultados, tem resultados piores que a _________________, e o acordo foi fifty-fifty, porque não faz pelo faturamento, faz pelo que a empresa vai gerar no futuro. Então, a ideia é juntar as duas empresas numa nova, metade-metade. É difícil dizer. Acho que depende do que essa nova direção pretende como perfil dessa nova empresa, que esforço, suporte vai dar, como vai abordar o marketing, depende muito. Começa agora, janeiro, fevereiro, depende muito. Porque o responsável da Farma, por exemplo, o (Ricky Martin?), é um cara que trabalhou 20 anos na MercK, conhece de farmacêutica e é bastante agressivo. O problema é que eu não sei se conseguiram fazer a fusão das três empresas e a ________________ tem um processo das 50 fábricas para converter em 15, tem muita coisa a ser feita e talvez seja o momento pra acelerar para fazer. Eu acho que as culturas são muito diferentes, a gente está mais focado... Entre os outros países, nós temos uma grande diferença, não tem nada do que a gente está falando. A gente sabe que as pessoas do campo estão preocupadas com como vai ser esse negócio. Depende de ver qual filosofia vinga, porque eles são muito maiores do que a gente. Mais que o dobro. Então, depende de como vai ser esse processo de.. Vai ser um responsável da (Hoescht?), um da RPR? |Não sei se eu fico. Pode ser que o pessoal escolha o responsável da _____________. E tem o problema, como é que fica a cultura. Se for alguém que não acredita em nada disso, corre o risco de perder muito do que a gente fez. Mas pode ser alguém que acredite e queria aproveitar para levar para a Hoescht. Então, istoo é, do nosso ponto de vista, positivo. Precisa ver o lado deles, dependendo do que vai se passar. Eu acho que a experiência nossa, que é positiva, se levada para um -________________ maior, vai alavancar o resultado. Aí vai melhorar bastante. Imagine a estrutura nossa com a deles, é incrível. Nós temos uma estrutura mais enxuta, eles têm estruturas hierárquicas enormes, um efetivo grande demais, vai ser difícil de integrar. Acho que a empresa tem, independente do que o pessoal coloca no board, na direção da fábrica, a gente quer uma empresa dinâmica, empreendedora, pesquisa, prescrição e modernidade de gerenciamento. Abandonar os paradigmas de lado a lado e criar uma empresa líder, porque vai ter que entrar no mercado americano e não é fácil. Se isso é bem escolhido e as pessoas escolhidas se afinam com isso, tem toda a chance de criar uma empresa dinâmica, forte ____________, tal. Na ideia é isso, quando se juntaram: “Bom, é a chance que tem de mexer, chacoalhar e fazer”. Mas na hora que começa a descer, não é evidente que essas coisas aconteçam, como aconteceu com a _________________ nesses dois anos. Por outro lado, o (Dorman?) deve ter passado pela experiência de que tem que aprender com o erro, vamos fazer diferente agora para ver se funciona. O pessoal aqui está muito preocupado com esse negócio, eu acho que lá também estão. Em tese, metade fica, metade vai embora, dos dois lados.
P2 - 50% de chance de ficar e 50% de chance de perder o seu cargo.
R - É. Em todas as funções. É uma perspectiva, para quem fica, positiva. Vai ser a primeira empresa brasileira na farmacêutica. Também não adianta ser grande. Precisa ser grande e melhor. Nós dizíamos: “Não queremos ser os primeiros, mas os melhores”. Precisa ver se quem fica continua pensando assim e faz o esforço para isso, porque não é fácil. Mudar as coisas, as cabeças, é complicado.
P1 - Eu queria entender isso. Você me descreveu uma série de mudanças, basicamente comportamentais, de gerenciamento ou marketing, e principalmente na produção. Como foi - você provavelmente conhece isso em relação ao resto da indústria farmacêutica, no Brasil? Como você posicionaria essas transformações em relação às outras indústrias? Esse é um processo que aconteceu também nas outras?
R - Aconteceu, mas aconteceu menos. Eu acho que...
P1 - Você acha que isto é da Rhodia Farma?
R – Dá a impressão de que a gente está falando demais da gente e jogando muito confete, mas o Danienzo diz muito isso: na gestão da fábrica, nossa, comecei reuniões de diretores industriais, tal, o pessoal sabe e reconhece, tem um sistema de gerenciamento diferente aqui. Algumas indústrias têm sistemas parecidos, mas a nossa industrial é uma referência em termos de gerenciamento.
P1 - E esses programas de qualidade, dentro da produção?
R - Mas o que muda o gerenciamento é esse enfoque participativo, de treinamento. Tem muitas empresas fazendo, mas tem muitas que fazem ou um programa de Simquest ou de qualidade numa área, ou de TPM na manutenção. O que falta é a área integrada toda, quer dizer, sistêmico, um conjunto. Por exemplo: todos os operários sabem qual é a missão e a visão da fábrica. Todos. No nível mais baixo, sabe, porque a liderança passa. Em outros laboratórios o cara está lá para produzir o xaropinho que ele faz. Algumas têm o programa Simquest, empresa padrão, tal. Outras têm outra coisa. Mas eu não conheço, pode ser que eu me engane, mas não conheço nenhuma que tenha um programa tão completo como o nosso, na industrial. A comercial é diferente, tem gente fazendo coisa melhor do que a gente, que não tem o aspecto de qualidade, tem uma visão de mercado diferente, tem o pessoal que está mais próximo da área de consumo e tem programas de consumo. Mas, na industrial, eu acho que a gente é referência.
P1 - Na área de marketing, você acha que já fizeram alguma transformação significativa em relação... Conseguiram transformar esse paradigma ou ainda não?
R - Não, acho que tem muita coisa para fazer ainda. A área comercial tem muito para caminhar. Não somos o melhor marketing da indústria farmacêutica, com certeza.
P1 - Você tem ideia de quem seja um bom marketing? Ah, aquela indústria está indo no caminho certo...
R - Acho que a Pfizer tem um marketing bastante agressivo, a (Merck também. Agora, o problema é um pouco marketing agressivo no estilo americano, por pacotes, como vem, adapta ao Brasil e faz.
P1 - Isso é uma forma, as multinacionais...
R - As americanas. As européias, não, mas as americanas, a maior parte trabalha assim. Um pouco como era a Upjohn aqui. Vinha o pacote certinho, você não podia sair muito, você só tinha que adaptar alguma coisa ao mercado brasileiro. Os americanos são muito assim.
P1 - O americano controla mais?
R - Controla. Tem a legislação mais rigorosa, tal. Os europeus são mais independentes, dão uma abertura maior. Agora, eu acho que, em termos de planejamento, de integração entre marketing e vendas, a gente está evoluindo bastante, porque marketing e vendas conflitante, ______ a indústria toda, e não é só na farmacêutica, em vários locais são conflitivos. Assim como produção e manutenção são conflitivos numa fábrica. Mas eu acho que essa ideia de criar, por exemplo, times por franquia, não existe totalmente como a gente tá fazendo. Talvez em outro laboratório tenha, mas não nessa visão mais global, como a gente quer. A gente quer que as pessoas se sintam realmente em um time participante, recebendo um nível de informação bastante grande. Quer dizer, um conhecimento bastante profundo e se sintam realmente participantes. O que a Vera estava fazendo, o relatório que eu fiz, nós estamos passando pra 50, 60 pessoas, com todas as informações, tudo que fizemos em um ano, tudo que foi bom, que não foi bom, o que a gente quer fazer no ano que vem. Vai para 50, 60 pessoas, que por sua vez passam. Então, tem um nível de conhecimento bastante grande. Não é muito comum isso não, na indústria farmacêutica. Nos outros setores, certamente é, mas eu acho que em buscar maneiras mais modernas a indústria farmacêutica é muito atrasada, os paradigmas ainda de muitos anos atrás.
P1 - No nível da hierarquia, por exemplo, aqui tinha o pessoal superior...
R - Mas isso já morreu faz tempo.
P1 - ... Os vários restaurantes, etc., mas aqui a gente repara que tem uma relação bastante aberta, hierarquicamente. Todo mundo come no mesmo lugar, coisa assim. Quando isso mudou, foi contigo, foi antes? Quando você entrou havia uma diferença? Como eram as relações?
R - Eram mais hierarquizadas. O (Bernier?) só recebia o pessoal na sala dele, não andava por aí, era um negócio todo fechado. Mas aí era um pouco o meu estilo, o estilo do Barella, em outras áreas a gente já tinha sido assim, mais aberto, mais participativo. A gente foi dando sinais exteriores de mudança de ambiente. Conversar com qualquer um, no restaurante, fazer a coisa igual para todo mundo, não ter grandes diferenças. Você vai em vários laboratórios, tem. Aqui, se você quiser fazer um almoço mais sofisticado, precisa ir fora, porque vai no bandejão, todo mundo, vem visita de fora, vai junto com a gente. Para o europeu, isso passa bem, porque ele é bem socializado, não vê tanta... O brasileiro é que é um pouco, quer dizer, o europeu não vê nenhum problema em ir no bandejão junto com a gente para comer. Não tem porquê. Quando você precisa fazer um negócio mais sofisticado, fechado, você isola, faz fora.
P1 - Quando é europeu vai no bandejão, quando é brasileiro... [risos]
R - Então, houve reuniões em que a gente participava mais igualitariamente, houve muita mudança de... Não tem tanto essa ideia de hierarquia. Para você ter uma ideia, eu faço um café da manhã com pessoas de áreas diferentes. Então, uma ou duas vezes por mês, numa sexta-feira de manhã, o pessoal toma café na minha sala. Café, tal, chega uma pessoa de cada área, a gente fala de tudo, menos de serviço, apresenta fotografia, apresento a minha família, deixo o pessoal falar da sua família. O pessoal sente isso muito bem para me conhecer e se conhecer entre eles, porque acontece que mesmo a pessoa que está na fábrica não conhece quem está aqui. Vários feedbacks que eu recebi de pessoas que vieram de outras empresas, isso também existe em outras empresas. Mas a diferença é, uma das pessoas que veio de outra empresa, uma farmacêutica grande, o presidente faz isso, também. Só que, primeiro, as pessoas têm medo de ir lá, porque ele senta, as pessoas preocupadas: "Bom, vamos começar por ele. Você, o que tem que falar?" É um negócio obrigatório, formal, só pra dizer que tem, essa pessoa dizia: "As pessoas não querem ir, vão porque são convocadas e têm que ir, mas se sentem mal". Então, tem coisas que outros fazem igual, mas depende do enfoque que você faz, a maneira que faz. Aqui eu sei que o pessoal vai e gosta, porque eu não cobro nada, não falo nada, trocamos ideia, um monte de coisa. Duas horas, o pessoal fica à vontade e eu abro: "Vocês têm que trazer o que acham que tem coisa para melhorar o que não tá legal". Uns trazem, outros não. Tem programas idênticos em vários locais, depende da forma como você trata as pessoas, como você confia nelas. Então, a gente faz diferente. Uma grande força nossa é a mudança de ambiente que a gente fez. Tem um tripé: (fim do lado B – fita 3) tem o racional, os conceitos, tem o ambiente, que é o emocional, e a gente tem outra parte, que são as ferramentas de trabalho, como é que a gente faz a evolução. Esse negócio tem que ter um bom equilíbrio: um bom ambiente, um racional importante em termos de conceitos, doutrina e tal, e um ferramental para que possa medir, acompanhar, trabalhar. Então, se a gente consegue equilíbrio nesse tripé, a coisa vai bem. Às vezes uma ______ tem mais, outra tem menos, tem que procurar equilibrar. A razão do sucesso nosso é essa. Eu acho que, no passado, que a Farmacêutica era uma empresa excepcional, o pessoal fazia tudo isso sem esse formalismo, essa doutrina que a gente criou com o negócio da qualidade, porque o pessoal fazia isso, tinha um bom ambiente, era participativo, não tinha os silos, sem essa formalidade, e funcionava bem. O Farid era um tremendo dum líder, antes dele o Carvalho foi um excelente líder. O que eu digo é a gente teve um buraco, num período, tivemos grandes líderes no passado, desde o Simões. Tem que retomar esse negócio e fazer retomar o que foi um passado importante da Farma, que foi muito mais importante do que ela é hoje. Teve pessoas imbuídas do trabalho, que vestiram a camisa, muitos deram a vida inteira para esse negócio e falam com satisfação, com orgulho. E o pessoal tinha perdido isso. Acho que o pessoal mais jovem, que vocês vão conversar, devem estar retomando isso. Voltando a ter essa satisfação, e isso é fundamental. Sentir orgulho e prazer em trabalhar. Eu levanto de manhã e venho trabalhar com satisfação. Se eu levantar, e vou pra um negócio de que eu não gosto, vou me sentir mal, vou me agredir. Várias pessoas para que você pergunta, vêm trabalhar de manhã com satisfação. E é duro trabalhar 10, 12, 14 horas por dia, exigimos à beça, e apesar disso as pessoas ficam satisfeitas. É o jeito de ser que faz isso, como no passado também era. É isso.
P2 - Eu ia perguntar quais são hoje os principais produtos da Rhodia, assim, que vendem mais.
R - O primeiro produto é antigo, que é Profenid, anti-inflamatório, que tem uns 20 anos, talvez. O segundo, são dois produtos: o Flagil, vocês devem ter conversado com o pessoal que lançou isso, o Rodrigo deve ter contato a história, a Angelita participou. Se criou, até hoje o Flagil não tem promoção, mas quando você investe bem no passado, até hoje o Flagil é o segundo produto. O terceiro é novo, o Klexane, que foi lançado há quatro anos e este ano chegou a ser o terceiro, por todo um trabalho que a gente fez. Tem um concorrente da _______ que é (Flaxofarina?), a Upjohn lançou um produto concorrente esse ano e a gente conseguiu bloquear, que é um produto bom também. Então, é um novo, por foco, com um treinamento importante, que é para trombose venosa profunda, negócio de vender conceito por médicos, que ainda não tá bem definido. Mas acho que há um potencial no Brasil enorme e que a gente tá arranhando. Vendemos 12 milhões de dólares, somos líderes, temos 60% desse mercado. Um negócio que pode chegar a 200 milhões de dólares no futuro. O quarto é um produto antigo, da Upjohn ainda, que é a Fradimicina, mas já temos o (Taxotan?), que é oncológico e é o oitavo produto, com dois anos de lançamento. Aquele processo de renovação, a gente tem os produtos novos com participação maior no faturamento em detrimento dos antigos. É o que vem da pesquisa, é o que faz a indústria farmacêutica evoluir. Um país que tem patente, que está protegido, quando cai a patente esse produto cai. Então, tem que estar sempre com coisa nova. O Klexane é o novo, o Taxotan é novo, o Nasacor, que é anti-histamínico, foi lançado em outubro de 97 já é o 12o, em menos de uma ano. Depois do Viagra, é o produto que mais evoluiu. A gente vê que nos novos, esse foco de investimento, promoção, tá tendo resultado. Claro, tem o Gardenal, que é um produto antigo, tradicional da empresa, que faz 10 milhões de dólares por ano, é o 6o ou 7o produto, é descontínuo, não tem outro no mercado, é uma vaca leiteira. Mas, nos dez primeiros, já temos quatro dos últimos três ou quatro anos, temos um processo de renovação importante. A _________ teve um atraso nisso, porque ficou alguns anos sem produtos importantes na pesquisa, portanto tem muita coisa de produto antigo, ainda, o que é um dilema, é um problema. E o enfoque é Klexane, a Taxotan, os dois produtos carro-chefe que a gente quer, a nível mundial, fazer esse negócio crescer. E na área de alergia respiratória, também. Então, os principais produtos são esses. Dois, Klexane e Taxotan, da área hospitalar, o pessoal de marketing e vendas trabalha com hospitais, com clínicas oncológicas, é um processo diferente de promoção. O Nasacor, o Flagil, o _______, que é a evolução do Flagil, da open-care, um número maior de representantes, é promoção junto ao consultório médico, com visitas diárias, com equipes de médicos, levando os produtos.
P1 - Em relação a esses produtos novos de pesquisa, existe perspectiva de realização de pesquisa no Brasil?
R - Bom, vamos definir o que é pesquisa no Brasil. Quer dizer, tem a pesquisa básica, fundamental, que não tem condição de fazer no Brasil por falta de recurso, falta de massa cinzenta e equipamentos. A pesquisa, descoberta de moléculas, esse negócio é muito centrado na Europa, EUA, Japão.
P1 - A da (Roonan-Polan?), hoje em dia, tá na...
R - França, EUA e Alemanha.
P1 - É distribuída?
R - É. Tem uns 3000, 3500 pesquisadores, mais ou menos, em dois, três centros mundiais. Forte na França, nos EUA e Alemanha. Centro de pesquisa. Agora, a gente fala, pesquisa pura, descoberta de molécula, ou pesquisa fase em animais, ainda a gente não faz. Agora, quando você pega a fase dois, três ou quatro, seja, quando você passa para a fase de testes em humanos, antes de lançar, que é a fase dois, que serve para alimentar os dossiês de aprovação nos ministérios, ou fase dois e três, antes de lançar, e quatro, depois do lançamento, nós, a maioria dos laboratórios de prescrição estão fazendo no Brasil. Fase dois, três e quatro, que é você ter uma droga, ter um conjunto de médicos, e você faz a experimentação da droga com acompanhamento, com todo o rigor científico para ir para um dossiê, para aprovar aquele negócio. Então, pesquisa no Brasil vai ser isso. Cada vez mais os médicos, os clínicos participarem de pesquisa junto com o laboratório, no sentido do acompanhamento do desenvolvimento da droga. Pesquisa pura, infelizmente, acho que vai demorar muito tempo para fazer. Mesmo porque, as indústrias nacionais também nunca tiveram, no tempo que não tinha patente, interesse em fazer isso junto com as universidades. É complicado, custa uma fábula descobrir um medicamento novo. 300, 400, 5000 milhões de dólares, às vezes. Não tem laboratório nacional que consiga, para vender no Brasil, porque você divide isso no mundo inteiro depois. Uma droga que custou 500 milhões de dólares vende, porque é global os laboratórios? Porque você vai vender isso no mundo inteiro, para 6 bilhões de pessoas, para pagar essa pesquisa, para cobrir o investimento, para fazer outra depois. Infelizmente, no Brasil...
P1 - Nem em relação à fitoterapia?
R - Em fitoterapia tem alguma coisa. O laboratório Catarinense, o ______, que é o dono, está fazendo uma série de pesquisa com a universidade federal de Santa Catarina, tem apoio do CDTI, então está fazendo alguma coisa nessa área. Algum outro laboratório está fazendo...
P1 - É sempre nacional?
R - Sempre. A multinacional, no passado, inclusive a Rhodia, não sei se o Ruderico falou sobre isso, o pessoal tentou pesquisar planta, aqui. Ele contou a história da planta? Então, já está contada. A Sandra, que está no Klexane, hoje, na época era recém-formada, ficou na Paraíba um tempão catando planta para fazer. Era um produto respiratório, se não me engano. Então, a Rhodia tentou fazer, alguns laboratórios tentaram, depois, com a crise, vários pararam. E hoje, eu digo, é difícil, porque mesmo a pesquisa por planta evoluiu bastante. O pessoal teve uma fase de química combinatória, fazer no computador as moléculas, parece que o pessoal poderia estar voltando agora para os produtos tipo na Amazônia, uma série de produtos. Alguns laboratórios têm sua captação de plantas, fazem seus extratos, mandam para o exterior para fazer, mas o grosso é feito lá fora. Infelizmente, os nacionais, além de recurso, não têm interesse, o governo e as universidades, esse negócio... Você vê o pessoal criticar muito, mas falta recurso para fazer esse negócio. Não adianta sair pela Amazônia para catar planta, ver com o pajé lá como funciona; a hora que você vai para o rigor científico tem uma trabalheira tão grande, que custa dinheiro, tempo e massa cinzenta. Alguns laboratórios se interessam por isso em programas específicos na área de pesquisa. Parece que a Merck alemã, não área de oftalmologia, tem alguma coisa, (Pilocapina?), tem alguma coisa, no nordeste, de plantas, eles fazem extratos, mas que eu conheça, são poucas.
P1 - A gente quer fazer só mais umas perguntas...
R - Tem tempo.
P1 - Agora que perdeu a (Festa?), que se dane. [risos] Acho que é melhor a gente ficar aqui até eles terminarem de festejar. Eu queria que você dissesse o que significou em sua carreira essa coisa da Farma. Começar um trabalho com um universo complexo.
R - Bom, primeiro foi um grande desafio, como eu disse, deu para provar para mim mesmo que, mesmo sem ser especialista no negócio, a gente conseguiu montar uma boa equipe, com pessoas de confiança, e conseguiu reverter esse negócio. Não fui eu que fiz, eu só criei as condições para o pessoal fazer. Não sei se você viu lá em cima, o que está escrito naquela plaquinha, a liderança, quanto menos aparecer, mais liderança, hoje. Quem fez foi o pessoal, porque faltou dar condições para usar a criatividade e competências das pessoas. Tem mais um que veio do plástico, o Eraldo, que está na área hospitalar. O Humberto e o Eraldo que vieram do plástico. Então, foi um desafio, uma satisfação muito grande de ver reverter uma posição negativa para uma positiva. Uma série de prêmios que a gente tem esse ano mesmo, resultado, (Proec, a gente vê que vai num crescendo, as pessoas crescem junto com a empresa, é uma satisfação pessoal bastante grande. Por outro lado, foi um aprendizado, acho que o marketing farmacêutico é o mais complexo que existe. Podem falar marketing de consumo, business-to-business, mas o marketing farmacêutico é um negócio completo, o teu cliente é o médico, cada cabeça de médico é uma coisa, tem o aspecto técnico-científico, é importante. _____________ como é que o médico vê o laboratório, tem aquele que entende que é um aporte importante, tem aquele que acha que o laboratório é uma multinacional exploradora, tem aquele que só quer amostra-grátis para passar por fora e até vender. Quer dizer, uma coisa negativa que me causou, eu mudei muito a imagem que eu tinha dos médicos. Antes de vir pra cá, eu imaginava aquele cara super ético, profissional. Mas você entra na indústria farmacêutica e vê que tem um mercantilismo incrível.
P1 - Você diz entre os médicos, ou entre a indústria e os médicos?
R - Acho que a indústria, pela competição, não é que ela corrompe, mas pela competição, para comprar os médicos, muitos deles receitam seus produtos ou aceitam seus produtos, principalmente naqueles que tem muito mito muito parecidos. Quando é um primeiro que aparece e é uma inovação, o médico aceita e tal, mas começa a aparecer muitos semelhantes, para você fazer que ele mude, você entra num processo de marketing que é complexo, mas que tem também um problema individual. Você paga congresso, paga viagem, uma série de coisas, e isso me agrediu, na época, porque eu não via o médico desse jeito. Hoje é natural, faz parte do negócio farmacêutico, de você mandar o médico e a mulher, de primeira classe, em determinado local que tem um congresso de dois, três dias, em que ele vai. Você paga, porque se não seu concorrente paga. Isso é um negócio que agride, para quem vem de fora. Quem está no dia-a-dia é natural. Foi uma coisa de decepção no começo, de mudar a imagem muito positiva que eu tinha. Por outro lado, tem aqueles abnegados, que fazem as coisas, que vale a pena ajudar. Tem um pouco de tudo, como em toda a profissão. O marketing é um negócio complexo, que tem muito de psicologia, de conhecer pessoa a pessoa, grupo a grupo.
P1 - Você consegue ver, isso me intriga, qual é o médico, essa relação do médico um a um, praticamente?
R - Um a um não, mas você tem duas ou três classes: os primeiros são aqueles paparicados, que são os opinion-leaders. Então, você tem, na categoria, numa classe terapêutica qualquer, aqueles que se sobressaem, os mais estudados, mais sucesso, têm mais competência. Então, o laboratório tem que trabalhar junto com ele, tem que ter o opinion-leader que fala da tua droga, que aceita. Você convence ele de que ela é igual ou melhor que a outra, ou é inovadora. Geralmente ele faz ensaios clínicos com a droga para estar convencido ou não. Você tem essa relação muito importante, é a nata que carrega o resto. O cara que está falando que a droga tal é poderosa por isso, os ensaios mostraram que cura, ou ameniza tal problema de saúde. Depois você tem os médicos que são prescritores, aqueles que estão nesse caminho e são os grandes prescritores, e depois tem todos os seguidores. O problema é - e aí você precisa da força de venda, da competência dos representantes - para saber quais são o A, o B e o C, onde interessa trabalhar. Não adianta gastar dinheiro com um médico C, que só quer amostra grátis para vender e não vai, que tá numa região que ... Aí tem o aspecto comercial da indústria farmacêutica. Como não tem reembolso do governo, quem compra remédio, paga. Você tem que vender para quem pode pagar, quem não pode é o governo que, às vezes, compra e distribui. Não é o laboratório que distribui gratuitamente, porque o acionista não vai dar nada para ninguém. Essa relação é complexa. Conhecer bem os opinion-leaders, conhecer o A, o B e o C. É necessário, a empresa inteira, eu deveria estar em contato com esses opinion-leaders, que é uma falha, eu faço pouco, devia fazer mais. Os responsáveis de marketing, de vendas, você tem que ter uma relação com o médico muito estreita, claro, quando você tem drogas importantes, de pesquisa, não tem produtos de malho, depende de em que posição você está. Laboratório de prescrição, aquela coisa. Depois, como você converte, você tem os ________ importantes e tem nos médicos A e B, como leva a informação dos ensaios clínicos, a informação da tua droga comparada às outras, as vantagens que tem mais, que tem menos, menos ou mais toxicidade, as comparações. O representante vai dizer para os médicos para mudar a cabeça dele. Na cabeça dele cabem 30 ou 40 marcas, a marca, não as drogas, que não lembra o nome. O teu negócio é botar na cabeça dele que o teu produto, aquela marca, aquela droga, que tem um nome químico completo, que ele acredite que aquilo no tratamento dos pacientes dele é positivo, e que ele vai acreditar e você vai vender. Não cabe mais que 30 ou 40 na cabeça dele. Quando tem 50 ou 100 diferentes, você tem que entrar lá e como é que faz? Aí o médico é científico, é um futuro opinion-leader, ou é um cara que está no posto de saúde, atendendo cinco minutos, a turma entra e sai? Tem vários tipos, e o representante tem que captar isso e trazer, porque não dá pra você, gerente de marketing, conhecer 160 mil médicos no Brasil. Ou 50 mil clínicos. É tremendamente complexo, porque cada médico é uma situação, uma posição, você leva uma peça igual, quase, para todos. Quando você entra nisso, para quem gosta de marketing, comércio, é um negócio que cativa, e dificilmente quem entrou na farmacêutica abandonou. Então, foi um aprendizado importante, porque eu conhecia marketing de plástico, de química, business-to-business, de consumo. Apesar das decepções, do mercantilismo, você acaba aprendendo. Então, foi bastante positivo no aspecto pessoal. O outro, é aquele negócio que a gente botou na cabeça de todo mundo: "Queremos fazer a melhor filial do grupo". A gente não fala isso, mas como o grupo não é tão bom, fazer uma filial, com um esforço, a gente chega lá. [risos]. Então, certas coisas você tem que alimentar e jogar para as pessoas, para fazer o pessoal acreditar. É um desafio importante e a gente teve progressos enormes. Essa empresa não valia nada em 91. Em 95 nós vendemos a Rhodia Farma para a (____ Polamk?) por mais de cento e tantos milhões de dólares. Um acordo que, se a gente evoluísse numa pressão, podia chegar a 200, como podia voltar para 100, por exemplo. Isso é meio confidencial, vocês guardam esses valores para vocês, mas foi uma satisfação, não só pra mim, mas para o grupo que estava naquele momento. Ficamos um ano discutindo com a ( _______ Polank Rohr?), nós, a Farma, do lado de cá. Uma empresa que não valia nada, que em 90 não participou do ________ porque diminuía o valor da ( ______Polank?), depois de três anos e meio, quatro anos, valia cento e tantos milhões de dólares. Então, nós criamos valor para o acionista Rhodia Brasil. Tá certo que entrou num bolso, saiu no outro, os sócios minoritários aqui perderam, mas o importante é que o grupo, que está ainda hoje, nós demos valor, o que é uma das coisas fundamentais hoje numa empresa, criar valor para o dono, para o acionista, para progredir, pagar salários, investir. Foi um dos pontos importantes desse período. Aí vem o reverso, a ________ comprou, pagou: "Já que disseram que valia tudo isso, vocês vão ficar agora aqui e provar que é válido". Tá certo também, você pode comprar e pôr outro time. Foi outro desafio: "Nós dissemos, não blefamos, valorizamos ao máximo a empresa, vamos atrás disso". E com altos e baixos, cada ano um chefe novo, desde o breve até o francês, vamos levando esse negócio : "O que nós dissemos está acontecendo". São coisas que dão satisfação para as pessoas, que estão cada vez mais acreditando no que a gente está fazendo. Foi importante para -__________, para o acionista. Valorizou um negócio que não valia nada, em pouco tempo recuperou. Tá certo que houve a recuperação de preço, mas podia ter tido e não ter acontecido nada diferente e estar com os problemas, ainda. Podia não ser negativo, mas não ter o valor que teve. Tudo isso dá satisfação. Para quem começa com uma carreira pessoal inferior, ou veio de outra empresa de tesouraria, batendo cheque, o objetivo era evoluir e chegar a ser presidente de uma empresa de 150, 200 milhões de dólares, dá satisfação, e animado pra continuar. O problema, agora, é como é que faz a passagem, a sucessão, a mudança, que seria bom a gente poder fazer também. Não sei se vou conseguir ou não, mas a maior parte do caminho a gente já fez. E pensar que quando sair, ser um empresário, que a gente não foi lá atrás.
P1 - Eu ia perguntar em relação ao futuro, mas pessoalmente.
R - A gente tem o programa. Você, alguém deve ter falado para vocês.
P2 - Não escutei, ainda.
R - Então, o Programa Você, a gente está falando do presente, eu não tenho muita coisa do passado para falar, tenho do presente. O Programa Você a gente implantou há uns dois, três anos e é de preparação para aposentadoria.
P2 - Ah, desculpe ...
R - Tem muita gente da fábrica e do comercial que, quando passa dos 45 anos, a ideia é, pelo sistema de fundação nosso, até os 53, 58 ele trabalha, e depois sai. É preparar o camarada para não ficar em casa amolando a mulher, ou o marido, depois ficar doente e morrer. Treinar para fazer alguma coisa, criar, trabalhar, estudar. A gente começou com o programa e eu disse: "Escuta, daqui um tempo eu tenho que parar, porque é compulsório, chegou aos 58 anos, espirra." Tenho duas opções: uma é negócio antigo, se puder empresariar, tentar se empresário para provar pra mim mesmo se eu posso ou não. A outra, se não der, eu vou voltar a estudar, vou para faculdade de novo. Estudar o que não tenha nada a ver com administração, com economia. Ufologia, cosmologia, sei lá, alguma coisa. Tem duas opções: uma é econômica, financeira, fazer, tal.
P1 - E você tem ideia o que seria que te...
R - Não sei, vou ter que acelerar agora, mas eu tinha dois anos ainda pela frente. Nesses dois anos eu estava imaginando no comércio, numa área que não precisasse de muito capital. Alguma coisa mais no sentido de provar. Você ser gerente, diretor de uma empresa, é uma coisa, ser empresário é outra. Tem que mudar a cabeça, diferente.
P1 - Você tem vontade de tentar provar isso?
R - Tenho porque no passado eu tinha duas ________. Esqueci uma e agora eu paro nessa e vou enquanto tiver saúde, disposição. Se der certo. Se não der, ficar em casa enchendo a paciência da minha mulher eu não vou ficar nunca. Não tem porque. É um outro desafio, tem que achar sempre um novo. E aqui, como a cada cinco anos eu mudava, a Farma, também, só tem que deixar esse pessoal continuar e fazer a sucessão natural. Na realidade, eu já tinha conversado com o pessoal da França no processo de quem viria no meu lugar, porque na realidade não é do grupo, aqui, que tá _________________ ou pessoas muito jovens, que não estão prontas ainda, ou pessoas mais antigas que não estariam preparadas. Tentando buscar alguém no mercado para ficar esses dois anos junto. A ideia é que fosse alguém que pudesse não doutrinar, mas que entendesse os valores, os princípios da gente e continuasse com esse programa. Com o negócio da _________ a gente parou tudo e agora vamos ver como é que fica, de repente a _______ já tem uma solução. Vamos ver.
P1 - Então, pra você, pessoalmente, essa integração não é uma quebra de planos?
R - Não. Eu acho que, veja, o que eu estou tentando me automotivar é: será que o que a gente fez aqui não dava para fazer na outra, ou tentar trazer o que tem de bom na outra e tentar fazer uma nova?
P1 - Tem esse desafio, também.
R - Tem, mas tem que ver se os caras querem. Isso é algo que poderia ser uma automotivação. Porque me preocupa o fato de mudar e a gente perder todo o trabalho feito. Aí vai ser frustrante. Até para quem está aqui, porque boa parte do pessoal que participou, que acredita, se a gente mudar e voltar para um outro paradigma, vão deixar empresa ou estar frustradas. Vai voltar para um outro patamar. Sei lá, pode até alavancar a empresa num curto prazo, mas eu não acredito nessa forma, acho que seria uma ruptura muito grande na cultura atual da Farma. Seria frustrante, depois de tudo feito, quebrar esse negócio. A ideia era, talvez, poder participar disso, mas não vai depender de mim.
P2 - Tem 50% de chance.
R - É.
P1 - Você queria fazer alguma?
R - É isso mesmo? Eu falei muito, mas do passado não tenho muita coisa para falar, é de 92 para cá. O pessoal para trás é que pode... Talvez tenha uma coisa a mais que me escapa, mas. Com a Upjohn a gente conseguiu um negócio muito...
P1 - É, eu ia perguntar sobre isso.
R - Também foi um pouco por aí. A gente fez aquela reunião catastrófica com o Fernando Leal e __________.
P1 - Quando foi isso?
R - 93. 92, acho. E a licença ia até 96. Em três anos eles iam recuperar os produtos. A gente tinha interesse em estender o contrato por cinco anos, pelo menos, para dar a Fradimicina, ainda é o quarto produto hoje e é deles. Então, houve a primeira reunião e a gente tinha esse objetivo. Engraçado, começou e eu tinha uma série de material sobre parceria na área de fornecedores, que a gente tinha trabalhado no Plástico e ia fazer aqui na Farma. Peguei um pouco daquilo e depois da reunião eu escrevi para o Fernando Leal, nos EUA: "Realmente você foi duro, você chegou aqui e não viu nada, ainda, a empresa está mudando, tem que dar um voto de confiança, vamos começar a discutir normalmente? O que você acha desse troço aqui?" Tinha uma teoria de que parceria leva um tempo, a gente tinha que estar junto... (fim do lado A – fita 4) discutir muito, levava um certo tempo para ter confiança mútua, blá, blá, blá. Ele gostou, respondeu e a gente começou um namoro. "Escuta, vamos esquecer aqueles problemas, o que tem que a gente converge, o que você acha que é bom entre os dois - muito pouca coisa, quase nada - e o que é divergência? Vamos discutir a divergência primeiro". Em um ano a gente foi pouco a pouco fazendo isso. Aí chegou ao ponto dele propor, eles queriam voltar para o Brasil, queriam retomar alguns produtos, a gente queria estender a licença. Foi quase um ano de negociação, projeções, o que eles queriam receber de volta. A gente chegou a concluir, estendemos o contrato por mais cinco anos, até ____________ três produtos, eles recuperaram outros, voltaram pro Brasil e nós produzimos para eles aqui na fábrica, toda produção é feita aqui, tem um contrato com eles. A gente tem uma relação excelente com eles, não é o _______ que está aqui, mas o gerente-geral, o gerente anterior. Mudamos em dois anos completamente a relação e hoje a gente trabalha como parceiros.
P1 - - A Upjohn foi internalizada?
R - Em produtos, sim, nós produzimos, eles têm o marketing deles.
P1 - Aqui?
R - Não, lá fora. Eles têm no Robocop, nas Nações Unidas. Mas, numa primeira fase, a gente fazia faturamento, compras, fazia realmente o marketing e as vendas, e toda a logística era feita por nós, com custo, com preço, margem, lucro rentável. Foi um processo que um ano e meio, dois anos, a gente conseguiu reverter e é simples. É discutir com as pessoas. Mesma coisa foi na fábrica. Quando eu cheguei, o produtor de ampolas e de frascos, a Vitrosul, era o pior fornecedor que nós tínhamos. Todo mundo metia o pau porque as ampolas vinham quebradas, os frascos não serviam. Fui lá falar com o diretor. Por sorte o cara estava chegando também, estavam trocando. "Você é o pior fornecedor nosso. Os caras só não te xingam porque te respeitam, mas você tá disposto a discutir e melhorar esse negócio?" Isso foi em 92, 93. Em dois anos a gente reverteu complemente. Hoje os operários da Vitrosul vêm aqui ver o processo, os nossos vão lá ver como funciona. Detalhamos pessoal de compras, produção, manutenção, de gestão, reuniões para definir os problemas, como a gente atacava. Grupos de trabalho. Em dois anos, a melhor parceria hoje é com a Vitrosul, ela ganhou um prêmio ___________________ na Alemanha de melhor relação fornecedor-cliente num programa de qualidade que eles iam começar a implantar, Rhodia Farma e grupo _______ Vitrosul. 92 era o pior, 94, 95, prêmio mundial de melhor relação. É ter vontade de resolver os problemas sem aquele negócio de "Quero ganhar tudo". É parceria, discussão, abertura. Tem mais um monte de exemplos como esse, o Danienzo deve ter, o Humberto deve ter, então, tudo isso é disposição de fazer as coisas certas, sem sofisticação, sem pressão e atrito, com confiança. Claro que tem uns que não são confiáveis, não dá, não funcionam, mas eliminam e partem para outra. A gente conta os casos bons, os ruins escapam e a gente não fala. Tem vários casos de sucesso que a gente fez e transformou a empresa. Eu falo bastante porque é satisfação, várias pessoas falam porque participaram também. E o bacana é que no passado também falam. Você esquece o buraco que houve num período, a gente voltou a fazer o que esta empresa já foi há muitos anos, líder, importante, pessoas motivadas. Espero que com a _______ continua. Vamos fechar os nossos 79 anos e meio e começar o primeiro da __________- e vamos ver como vai fazer. Não sei. [risos].
P1 - Eu ia te fazer uma pergunta, ______ ideia clara, a gente tá fazendo um trabalho que é resgate da história e tentando marcar alguns pontos, não sei se vamos cobrir tudo. Eu me lembro dessa reunião, em que eu estava, e houve essa descoberta, todo mundo percebeu que tinha uma postura, não sei se estava evidente antes, de que forma você acha que esse saber que a gente está resgatando, deveria ou poderia ser aproveitado para incremento gerencial ou humano.
R - Com a nova?
P1 - A gente estava pensando na Rhodia, mas com a nova...
R - Como a gente não conhece a história do outro lado, a gente não sabe se é bom ou ruim, só vai ver depois. Quer dizer, acho que o que eu estou tentando passar para o pessoal é que o que temos de bom temos que valorizar bastante. E propor muito humildemente: "Nossa experiência é essa, funcionou, é boa, vocês querem tentar, querem partilhar? Qual é a de vocês?" Esse trabalho pode ser um documento, algo que a gente está preparando para mostrar o que a gente foi e o que está sendo e que isto possa ser positivo. Vai depender muito do emissor e receptor, como vai receber. Para nós, fazer isso como um resgate histórico do que esta empresa foi, é importante. A ideia é essa, será que a gente consegue com isso alavancar a nova, que é outra experiência? A gente pode pegar isso e dizer o que tem de bom e alavancar a outra? Temos que discutir, pode parecer um pouco de petulância, de prepotência nossa. Precisamos pensar um pouco. No primeiro trimestre a gente vai ter contato, vai ter uma ideia de... Não dá para responder ainda. Mas, de qualquer maneira, este é o histórico nosso, é importante completar da melhor maneira possível vamos ver quais são os _____ para talvez não ficar no livro, só. O que possa fazer. Porque é pena, não só a Farma, a Rhodia como um todo, que era uma empresa poderosa, está acabando, se esfacelando toda, não é mais aquela grande empresa. Como a Hoescht também não, o pessoal está criando novas coisas. A Rhodia vai perder. Essa história toda que você está vendo na Farma, se você for na Têxtil, na Química, vai ter maior até. Tudo isto está sendo perdido. É uma pena. O pessoal estava brincando, você vai dizer para o seu filho que trabalhou na Rhodia: "Rhodia? O que é isto?" Vai morrer, vai acabar. É bom ter um resgate. Podia aproveitar para jogar para frente, o que tem de positivo, o aprendizado com o erro que a gente possa ter tido no passado, que sirva para melhorar na frente. Vamos ver o primeiro trimestre como é que é. Eu posso estar, o Falcão pode não estar: "Esquece esse negócio, é besteira". Vamos ver como, eu tenho um pouco de incerteza. Até junho, mas depois não sei como vai ser.
P1 - _________________
R - Tem que ser. C'est la vie. De repente tem um pacote de indenização e as pessoas resolvam ir embora, quando mexe no bolso... Mas é isso.
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