P/1 – Primeiro, bom dia, Eduardo.
R – Bom dia.
P/1 – Você diz pra gente o seu nome inteiro, a sua data de nascimento e o local?
R – O meu nome é Eduardo Silhetes Ferreira Xavier, eu nasci dia cinco de julho de 1968, sou natural de Juiz de Fora, Minas Gerais.
P/1 – E o seu pai, você pode fazer a mesma coisa?
R – Meu pai é José Nogueira Ferreira, já falecido. Minha mãe, Orly Silhetes Ferreira, que mora hoje no Rio de Janeiro.
P/1 – O seu pai nasceu em Juiz de Fora, também?
R – Meu pai é de Juiz de Fora. Minha mãe é do Espirito Santo. Eles se conheceram, o meu pai era policial civil, na época, detetive, né, que era o nome que se chamava e conheceu a minha mãe no Espirito Santo, em Vitória e ela muito nova e eles se casaram e voltaram para Juiz de Fora.
P/1 – Entendi. Então, o que ele fazia na infância dele, você sabe? Tem alguma história dele?
R – Na realidade, a minha avó criou cinco filhos homens. Minha avó era uma merendeira, aquelas senhoras que cuidavam das merendas escolares, muito pobre, criou cinco filhos, na realidade, tiveram seis filhos, morreu uma, ficaram cinco filhos. Cinco homens. Um deles, meu pai. Então eles moravam numa área pobre de Juiz de Fora, não seria uma favela, mas tinha que subir uma escadaria bem grande e os meus tios para ajudar em casa, eles vendiam salgadinhos, essas coisas que a minha avó fazia. Então, foi uma infância bem difícil para eles.
P/1 – E como é que ele entrou na policia?
R – Eu não sei se eu vou lembrar de toda história (risos), mas assim, cada um seguiu um caminho. Meu pai nunca gostou muito de estudar. Então, antigamente tinha esse ditado, né: “Se você não for fazer nada da vida, vá ser policia”, e aí foi o que aconteceu com ele, ele não quis estudar e aí, acabou fazendo esses concursos de policia civil e foi ser policial civil. Aí os outros irmãos, um é dentista, outros fizeram Administração, né, tem um tio meu que é Fiscal da Receita aposentado. Então, cada um seguiu o seu caminho. Meu pai foi no caminho, talvez, mais fácil, não sei, naquele momento para ele era… e ele é o mais velho, né? Era o mais velho, que ele também faleceu também muito jovem. A gente tem um problema na família que a maioria dos meus tios, todos eles têm… todos nós, né, que eu também me incluo, a gente tem algum problema de coração. Então, o meu pai morreu com infarto. Meu avô, pai dele morreu com infarto, o meu pai morreu com infarto, novo, 38 anos, meu tio, antes dele também. Os outros três que são vivos, todos tomam remedinho, quando sentem alguma coisa, botam o remedinho debaixo da língua e o meu irmão, tem dois anos, com 45, um ano mais velho que eu, com 45 anos, ele também faleceu. Mas assim, todos que não se cuidaram, né, porque na realidade, o meu irmão fumava muito cigarro, então foi pegando peso, isso tudo acabou atrapalhando ele, né? Eu não bebo, não fumo, bebo socialmente, mas eu não fumo até em função disso.
P/1 – Sofre um pouco com isso, hoje, então?
R – Na realidade, é uma avaliação que eu faço da minha vida que já era para eu ter ido, né, dento do histórico familiar. Mas eu acho que em função do que a gente tá vivendo nesse momento, nos últimos quatro anos, foi me dado mais um respiro, vamos dizer assim, né? Porque isso é um histórico familiar, mesmo.
P/1 – E a sua mãe, qual que é a história dela?
R – Minha mãe… como meu pai, antigamente, tinha essa questão de casar muito cedo, né?
P/1 – Mas ela é de?
R – De Vitória, Espirito Santo. Então, a minha mãe… meu pai mais velho conheceu ela nessas viagens e aí, ela com 16 anos, saiu de casa para casar com ele. Então, ela meio que abandonou a família. Isso gerou um clima ruim, porque ela saiu na época do Espirito Santo, foi morar em Juiz de Fora, casada com o meu pai, casada, igreja e tudo, mas ela saiu meio que fugida de casa, então ela ficou dos 16… até é uma história interessante, porque ela saiu de Vitoria, veio para Juiz de Fora, casada, 16 anos, quer dizer, você imagina um pai e uma mãe, né, a filha sair de casa, apaixonada, né? E casou, tiveram aí o meu irmão e ela sem contato nenhum, desde os 16 anos com a família. Interessante que quando nós começamos o projeto em 2011, que é “Os Caçadores de Bons Exemplos”, uma tia minha que eu não conheço nenhum parente da minha mãe, vim conhecer agora, que é irmã dela viu uma reportagem na televisão, entrou nas redes sociais, mandou… o filho dela mandou uma mensagem para mim falando: “Queria noticias da sua mãe, não sei o que… você é o Eduardo? Quem que é o seu pai? Quem que é a sua mãe?”, foi tentando saber se era a mesma pessoa por causa do nosso sobrenome. E aí, houve esse encontro da minha mãe com a família, que teoricamente, na análise da minha mãe, tinha abandonado ela, porque na realidade, foi ela que saiu de casa e perderam o contato. E aí, por uma questão, hoje, minha de ter aparecido em algumas reportagens, acabou que houve esse reencontro. Então foi muito legal porque, daí voltando um pouquinho atrás, a minha mãe, como casou muito nova, 16 anos…
P/1 – Teve problema com a família, né?
R – É, teve esse problema e não é que resgatou ele agora, mas pelo menos, reviu os irmãos que estavam vivos, a mãe dela já tinha morrido e tal, mas pelo menos, ela reviu as irmãs e tudo. E a minha mãe, quando os meus pais se separaram, quando eu tinha oito para nove anos, e na separação, nós ficamos com o meu pai e com a minha vó, mãe do meu pai. Então, foi ela que nos criou, vamos dizer, desde os oito anos em diante. E aí, a minha mãe, como saiu, a minha mãe foi morar no Rio, voltou para o Espirito Santo, mas sem rever a família.
P/1 – Só agora que…
R – E só agora, tem uns três anos, mais ou menos, dois anos e meio que houve essa descoberta da família, né, acho que as redes sociais acabaram ajudando, né, e aí, localizaram e tudo. E foi até interessante que ela me ligou, né, porque descobriu porque nas nossas redes sociais têm celular, tem tudo, ela me ligou no meu celular: “Aqui é a sua tia e tal…”, eu falei: “Tia? Que tia?”, né? “Tia Maria Luiza, irmã da sua mãe, que o Ricardo passou a mensagem. Eu quero falar com a sua mãe. Você pode me dar o telefone?”, que aí eu expliquei que eu tava viajando, que a gente não tem mais residência, tal. Eu falei: “A senhora me desculpe, eu vou ter que ligar para a minha mãe pra saber se ela conhece alguma Luiza, se eu posso dar o telefone”, né, porque eu não sei, porque essa história da minha mãe de infância, para ela, é traumática, ela que viveu. Não sabia se ela queria falar ou não, tanto tempo, né? Mas aí eu liguei para ela no Rio, ela falou: “Não, pode passar o meu telefone”, aí passei, aí elas já se viram, foi no Rio, ela foi no Espirito Santo. A do Espirito Santo já foi no Rio várias vezes.
P/1 – Você tava no dia em que elas se reencontraram?
R – Não. Na realidade, como a gente tava em viagem, eu tenho um amigo de infância que ele é frei em Vila Velha no Espirito Santo. Então, eu liguei para ele, que a minha mãe, ela é analfabeta, não escreve, não lê, então tem uma certa dificuldade. E aí, eu falei com esse meu amigo que é frei lá, falei: “Paulo, minha mãe vai para o Espirito Santo, você podia receber ela aí na rodoviária e levar até a irmã? Porque na realidade, a gente não sabe que tipo de relacionamento que vão ter, se vai ter uma briga, a gente não sabe, porque tanto tempo sem se vê, você vai com ela, né, você conhece a gente desde infância”, a gente é da mesma idade, só que ele tomou outro caminho, né, e aí, ele que foi na rodoviária, foi fazer o meio de campo, foi lá levar, conhecer e saber se realmente não ia ter nenhum atrito, né? Mas aí foi tranquilo, hoje tem um irmão dela que tá com ela no Rio, então, houve um… foi bom esse reencontro foi bom, até em função da morte do meu irmão, né, que eu acho que a gente… acho que Deus escreve certo, né, talvez por linhas tortas, mas se não houvesse esse reencontro, talvez ela tivesse ficado sozinha no Rio, porque o meu irmão estava morando com ela no Rio. Então, como o meu irmão faleceu, acabou que ela ia ficar sozinha e como houve o reencontro da família nesse momento, foi muito próximo, foi um ano antes do meu irmão morrer, então aí, acho que foi uma coisa…
P/1 – Ajeitou, né?
R – Ajeitou. Foi bom para ela.
P/1 – Voltando um pouco, quantos anos seu pai tinha quando a sua mãe se mudou com ele?
R – O meu pai devia ter… não vou saber te falar não, eu sei que ela casou com 16, ele devia… ele tinha uns… quase uns 28…
P/1 – Quase 30, né?
R – É, quase 30, talvez.
P/1 – E aí, ele trabalhava na policia e ela ficava em casa?
R – Em casa. Era do lar. E por essa questão dela muito cedo sair de casa, o meu pai também, antigamente tinha isso, não deixava ela estudar, essas coisas, então ela acabou não se desenvolvendo, né? E como o meu pai era um pouco machista, então, era mais fácil ter uma pessoa analfabeta e tal, mais fácil de dominar e fora da sua cidade, então foram umas coisas que a própria vida foi encaminhando.
P/1 – E você foi o primeiro a nascer ou seus irmãos são…?
R – É, eu sou… era eu e o meu irmão. Eu sou o mais novo, meu irmão nasceu primeiro.
P/1 – Você teve um irmão só?
R – Só um irmão. Nós éramos em dois, eu e o meu irmão. Ele é de maio, dez de maio de 67 e eu de julho de 68.
P/1 – Entendi. Como é que foi crescer em juiz de Fora?
R – Na realidade, eu lembro pouco da minha infância. Até interessante que tem nesse resgate de fotos para mandar para vocês, né, naquela época, não tinha o habito de tirar muita foto, também, né? Hoje que ficou mais fácil, qualquer celular tira foto, antigamente era mais difícil. E interessante que tem algumas fotos que o meu avô, naquela época, tinha mania de pintar as fotos, né, não sei se é da época de vocês, né, mas o meu avô pintava as foros, tirava foto preto e branco, ele mesmo relevava e tudo, depois, pintava as fotos. Foto colorida era pintada. Mas voltando na questão da minha infância, eu não me lembro muito da minha infância, tava até revendo as fotos, eu não consigo ver a foto…
P/1 – E se lembrar do momento.
R – E lembrar daquele momento. Então, tem várias fotos que eu olhei e não consegui identificar. Por exemplo, a foto minha e do meu irmão na casa da minha avó de velotrol, uma bicicletinha que antigamente tinha, eu na garupa e ele… é até uma das fotos que nós separamos para mostrar, eu sei que sou eu e o meu irmão, mas…
P/1 – Não se lembra…
R – Eu não lembro daquela ocasião, como outras fotos da gente passeando, a gente tinha parente no sul de Minas.
P/1 – Mas você ficou de que ano até que ano em Juiz de Fora, nessa infância?
R – Não, a minha vida toda foi em Juiz de Fora, até, porque na realidade, eu nasci, meu pai faleceu quando eu tinha 11 anos… que na realidade, antes de separar, o meu pai teve uma embolia cerebral que paralisou o lado direito dele, então ele não mexia com um braço, com a perna e perdeu a voz, só balbuciava, não conseguia formar palavras e não queria aprender a escrever com a esquerda, né?
P/1 – Ele era destro?
R – É, ele era destro. Então, houve um grande dificuldade até de aceitação, né, logo depois veio a separação, nós fomos morar com a minha avó, que é a mãe dele e foi morar eu, o meu irmão, ele…
P/1 – Mas tudo em Juiz de Fora?
R – Tudo em Juiz de Fora, nós estamos falando só de Juiz de Fora. Aí ficamos em Juiz de Fora, meu pai depois faleceu, porque como ele tinha fumado na adolescência, na vida normal dele até antes dele sofrer a embolia, o coração dele já tava muito dilatado e aí foi tentar fazer na época uma cirurgia cardíaca, uma ponte de safena, fez, foi um sucesso, mas aí de sábado pra domingo, ele piorou e aí faleceu, teve aquela melhora repentina, assim: “Vai sair no domingo”, de repente, amanheceu morto. Aí com a morte dele, continuamos morando com a minha avó e o meu irmão, quando jovem, quando criança, ele tinha problemas neurológicos, então ele tomava um remédio controlado, que ele ficava muito nervoso, tal, então ele tomava remédio e tal, então toda atenção familiar era mais para o meu irmão porque ele era o mais velho, né, antigamente tinha isso, se você consegue um bom emprego, primeiro para o mais velho, depois… vai seguindo uma cadeia assim, uma sequência de prioridades. Então, meu irmão sempre estudou em escola particular, eu na escola pública. Primeiro emprego era para ele, com 17 anos, mas aí ele não quis, talvez por querer seguir o caminho que o meu pai fez, porque o meu pai nunca gostou de estudar, então meu irmão tinha esse hábito e eu já era diferente, já gostava de estudar. Então, o primeiro emprego que a minha família arrumou, né, que aí, os irmãos do meu pai já tinham… um já era da Receita, outro já era dentista, outro já trabalhava em Administração, conseguiram uma entrevista para o meu irmão de emprego e eu, na época, tava fazendo entrevista para office… não sei qual é o nome hoje, office-boy. Hoje seria…
P/1 – Auxiliar de escritório?
R – Não, esses meninos que ficam… o jovem aprendiz, que fica na rua, tinha um programa desse em Juiz de Fora e eu fiz e já ia começar a trabalhar. Fiz isso por minha conta…
P/1 – Você tinha 16 anos?
R – É, 15 para 16 anos. E o meu irmão tinha arrumado… meu tio tinha arrumado uma entrevista para ele fazer numa empresa grande em Juiz de Fora, que é a Siderúrgica Mendes Junior.
P/1 – Tá. Eu só queria voltar um pouco. Qual que foi a sua primeira casa que você se lembra, que você cresceu? Foi a casa dos seus pais?
R – A casa que hoje ainda existe, que é no bairro Grama, é em Juiz de Fora, foi lá que nós crescemos até os meus pais se separarem, foi lá que nós moramos. Depois que nós mudamos para o Centro, que é um bairro mais afastado. Então lá da minha infância, são essas fotos que eu vejo e não consigo lembrar, assim. Existiu aquela foto lá, mas…
P/1 – Sim, você não se lembra direito da casa…
R – Mas não me lembro de nada! Não, da casa sim, porque a casa tá lá até hoje, depois, o meu irmão quando casou, morou nela antes de ir para o Rio…
P/1 – E como que ela é?
R – É uma casa simples, com uma área aberta, com uma arvore, duas, três arvores, cercada, mas do lado uma igreja que ainda existe até hoje a igreja.
P/1 – Vocês brincavam nessas arvores?
R – Sim, a gente brincava ali, dentro de casa mesmo, no terreno e tudo, mas assim, não me lembro. Tem fotos lá, mas… a gente brincava lá. Não tenho lembranças, eu lá, tem algumas fotos, a nossa infância foi lá.
P/1 – Você lembra de brincar no bairro, ou na rua?
R – Não. Depois, no Centro, quando eu morava com a minha avó, porque em frente tinha um campo de futebol, que hoje não existe mais, é uma rodovia. Então, em frente, a gente até brincava, porque esse meu amigo que virou frei lá do Espirito Santo, ele morava na rua de trás e eu morava… a gente chamava rua de trás, mas na realidade, ele falava que a minha que era a de trás, era a minha casa e aqui, uma ruazinha, hoje asfaltada, mas na época não era e depois, o campinho de futebol e depois, o rio. Que é o Rio Paraibuna que corre Juiz de Fora inteiro. Então, lá no bairro Manoel Honório, a gente jogava bola ali e depois, quando começou a obra da coisa, acabou, foi acabando o campo e tudo. Hoje tá tudo asfaltado lá, tem policia federal hoje ali em frente onde era o nosso campinho, hoje é a policia federal. Hoje é outra estrutura, mas era muito simples, a gente jogava bola ali. Então, eu lembro que quando eu chegava do colégio, eu estudava de manhã, todo dia tinha que jogar bola, jogar peladinha lá, já tava todo…
P/1 – Isso na época da sua vó, já?
R – Isso já é na época da minha vó…
P/1 – Que você se lembra mais…
R – É, porque lá no bairro Grama eu não lembro de nada. Aí quando eu tava no Manoel Honório, aí sim, tinha isso. Quando lá não podia, porque chovia, a gente jogava já na rua de trás, onde morava; aqui em frente a casa dele, a gente fechava a rua aos domingos, aí jogava lá, jogava vôlei…
P/1 – Tá. Nessa época, você se lembra da escola que você frequentava?
R – Sim, sim. Até uma das fotos que eu trouxe é do Colégio Estadual Antônio Carlos. Estudei até a quarta série, tinha um grande amigo lá, lembro de algumas coisas assim, da professora chamar a atenção da gente, ele era o meu espelho, porque ele era um cara muito inteligente, né, então eu me espelhava nele, então a gente era muito amigo e tal e às vezes, como qualquer criança, fazíamos alguma arte e eu lembro de algumas vezes, a professora chamando a atenção da classe, nossa também. Lembro de alguns momentos, a gente assim, chorando que tínhamos feito alguma coisa errada, alguma arte de jogar papelzinho, alguma coisa… mas lembro da Antônio Carlos, sim, até a quarta série. Porque depois, eu fui para uma outra escola estadual que é o Colégio Estadual Sebastião Patrus de Sousa, estudei até a oitava série. E depois que eu fui para uma particular que era Machado Sobrinho, porque aí eu já trabalhava, então eu podia pagar o cientifico, na época, que não foi cientifico, eu fiz o curso técnico de Contabilidade
P/1 – Que seria meio que nem o ensino médio de hoje, é isso?
R – Sim, é isso, né?
P/2 – E tinha alguma matéria que te encantava, assim?
R – Eu sempre gostei muito da área de exatas, números, assim. Tanto é que eu fui fazer Ciências Contábeis e Administração, depois.
P/1 – Mas já começou dessa época, já, você acha?
R – Dessa de infância? Não sei…
P/1 – Na escola, por exemplo.
R – Sim, na escola, sim. Eu até lembro que no tempo de faculdade, é até interessante, não sei nem se dá para colocar isso aí, é uma época que é uma conversa informal, mas assim, quando a gente fazia prova, quando eu tava na faculdade de contabilidade, eu fazia a prova do meu amigo, aí pegava, a gente não colocava nome, passava em branco, fazia a prova, passava para ele assinar e dava tempo de eu fazer a minha, ainda e entregar para o professor. Só que fazia uns errozinhos da dele para não ficar a prova igual, né? Tirava sempre nota boa, mas eu lembro disso, que eu gostava muito de exatas. E aí tem tudo a ver com contabilidade, também.
P/1 – Você lembra de algum professor dessa época que te marcou?
R – De faculdade?
P/1 – Não, da escola.
R – Da escola, tinha uma professora de Português muito bacana. Tinha um professor de Artes, lá tem uma parte legal da primeira a quarta série, lá no Antônio Carlos, hoje eu não sei se existe, mas na minha época, tinha aula de Artes, então você aprendia a pintar, a fazer tapeçaria, né, tinham até uns trabalhos desses lá em casa, pintar quadro… e isso é uma coisa que me encantava, até tinha uma época que até desenhava e esse professor elogiava muito, eu não sei se eu vou ter lá, mas tinham uns bloquinhos que tinham uns desenhinhos, eu gostava assim, de olhar os desenhos e replicar eles, era bem interessante, mas depois, isso foi se perdendo pelo caminho. E esse professor, Pável que ele chamava, ele tem até um livro escrito lá em Juiz de Fora, ele era uma pessoa muito carismática, todo mundo gostava dele, talvez até por esse tipo de aula, né, que é uma aula de Artes, mais relaxada e tal e ele era uma pessoa muito especial, assim, muito bacana. Eu lembro dele. A professora de Português, eu não me lembro o nome dela, eu sei que era uma pessoa mais velha, era uma pessoa muito simpática, também. E na faculdade, tinha o Jair de Estatística que depois, virou um grande amigo. Ele foi meu professor de Estatística, enjoado, daqueles que gostava de… Jair Gross, ele gostava de deixar o pessoal de recuperação. E Estatística não é uma materiazinha boa, né, então, ele gostava de falar que ele deixava 30, 40 de recuperação, né? Mas graças a Deus, eu sempre passei com ele. E ele era um cara muito correto, mas muito exigente e acabou que depois, nós fomos trabalhar juntos quando eu fui gerente de uma empresa, ele era de outra e a gente acabava que se encontrava em eventos, quer dizer, foi um professor meu e acabou que nós viramos grandes amigos e assim, ficamos pouco tempo porque ele morava em Juiz de Fora, eu já estava em Ubá trabalhando em Ubá, mas tinham encontros regionais que a gente se encontrava em Juiz de Fora.
P/1 – Entendi. E como é que era a casa da sua vó?
R – A casa da minha vó era uma casa simples, mas era uma casa grande, porque apesar da minha vó ter poucas condições, antigamente, no tempo deles, se comprava muito no fio do bigode. Até hoje, eu levo isso para a minha vida, não preciso registrar contrato com ninguém, se eu falar com você que eu vou fazer, eu vou fazer e… às vezes, o papel é importante para o outro, para mim, não. E meu vô viveu muito isso. Então, a casa onde a minha vó morava que era um terreno, ele comprou assim, para pagar do jeito que ele podia, né, e ele era muito habilidoso com essas coisas de fotografia, então acabava tendo um dinheiro não muito, mas pagava parcelado, então ele construiu a casa da minha vó e antigamente, cada filho tinha que ter a sua casa, então ele construiu a casa da minha vó, fez a estrutura na de cima para outro tio meu, do outro filho; fez nos fundos e essa no bairro da Grama ficou para o meu pai, porque originalmente, eles tinham muita afinidade no bairro da Grama, até tem um clube lá, hoje seria um clube que tinha até… que foi o meu avô que fundou, tem uma rua lá que tem o nome deles nesse bairro, né, que é Franklin Soares Ferreira, eles fizeram essa homenagem para ele que a minha vó até brincava, né, que esse ele não tivesse gasto tanto dinheiro com o futebol, talvez eles tivessem mais condições. Não é que a minha avó era rica, mas ela aposentou com um salario e meio e ela tomava conta do meu irmão, né? Do meu irmão, durante muito tempo foi assim.
P/1 – E seu pai um tempo também, né?
R – E meu pai, mas ele recebia a aposentadoria e tal, mas era mixaria e tal, tudo bem, eu estudava em escola pública, o meu irmão estudava em escola particular, mas o meu tio que tinha uma condição melhor ajudava a pagar, né?
P/1 – Morava junto com vocês, também?
R – Não. Esse tio não morava, não, mas esse tio ajudava a pagar as contas pra gente não; então, sempre ajuda dos outros filhos que ela ajudou a criar, em parte, também a gente tava ali fazendo companhia para ela, né?
P/1 – Sei. E você falou que vocês jogavam bola lá na rua, o que mais vocês faziam para se divertir nessa época?
R – Nessa época, era mais futebol, né? A gente brincava, era chegar do colégio, tinha o futebol todo dia. Aí tinham os campeonatos de bairro contra bairro, tinham sempre…
P/1 – Quem que eram os bairros, você lembra?
R – Ali tinha uma grande rivalidade do Manoel Honório com o bairro Bairu, que era próximo. Mas tinham os do Centro também, que às vezes, vinham jogar. Mas assim, sempre foi uma relação muito legal, assim, era rivalidade só no futebol, mas as pessoas se encontravam… que o pessoal do Bairu era mais elitizado e a gente ali no Manoel Honório, pessoal achava que era mais… menos privilegiado, então acabava que dava… brincadeira normal, de criança, né? Mas era interessante que no tempo que a gente namorava, o nosso ponto de encontro era lá, até para ficar longe das mães daqui, né? Então, era o ponto de encontro lá e era todo mundo muito saudável.
P/2 – Você lembra se teve alguma paixão nessa época?
R – Eu comecei a trabalhar por causa disso.
P/1 – Já na adolescência, já então?
R – É. Eu quis trabalhar por causa disso. Quando eu tinha uns 14 para 15 anos, numas férias de uma menina de Barbacena que foi passar em Juiz de Fora na casa de uns amigos, acabou que eu conheci, nós nos conhecemos e aí, aquela paixãozinha, né, de menino e falei: “Pô, pra eu ir no ano que vem lá…”, que ia ter uma festa em Barbacena, que era a Festa das Rosas, que é tradicional lá e nessa festa tem um desfile e ela ia desfilar, porque tinha aquelas coisas de desfile para miss não sei o que, né, miss rosa, miss não sei o que, não me lembro na época o quê que era, mas era na Festa das Rosas lá em Barbacena, então eu pensei assim: ‘eu tenho que arrumar dinheiro para ir’, que a minha vó não tinha condições, como é que eu ia? Pensei: ‘tenho que começar a trabalhar’, foi quando eu comecei a procurar um emprego nesse guarda-mirim, eu não sei mais o nome, que eu tinha passado e ia começar em julho. Isso foi em janeiro, eu fia para começar em julho, quer dizer, eu ia ter o dinheiro para o ano que vem ir. Era 80… acho que a gente recebia 80% do salario mínimo, que era menor de idade, tal. Então, comecei por causa disso, mas acabou que não deu certo, porque quando eu fui… né? Era só da minha parte, mas chegou lá, o pai não quis, os pais dela não quiseram que ela me visse, tal: “Muito nova para namorar”, aquelas coisas assim. Então, isso ficou perdido no caminho, né?
P/1 – Ela era da sua idade, também?
R – Ela era da minha idade… não, ela tinha 12 anos, eu tinha 14, 14 para 15, alguma coisa assim, porque eu comecei a trabalhar com 16 no outro emprego, né, que arrumaram emprego para o meu irmão, meu irmão não quis… arrumaram entrevista para ele, ele não quis ir na entrevista, que achou que não era o momento dele trabalhar, que era tudo muito novo, que ia trabalhar só depois do Exército e tal, e aí, eu fui fazer entrevista no lugar dele, acabou que eu entrei na Mendes Junior, fiquei lá até 1991. Entrei lá em 84. De 84 a 91.
P/1 – Voltando um pouquinho, lá na casa da sua avó, do seu pai, vocês iam a igreja naquela época? Tinha uma frequência, lá?
R – Não. A minha avó, sim. A gente, tradicionalmente, por ser uma família católica, eu tenho um tio que é ministro da eucaristia. Tradicionalmente, por ser da igreja católica, eu fiz Primeira Comunhão, Crisma, fiz tudo isso. Então, eu ia nas igrejas aos domingos, né? Às vezes, sim, às vezes, não. Minha vó com frequência porque ela era bem católica. A família toda é católica, né? Então, tradicionalmente, sim, a gente ia. Mas eu não lembro se eu ia com frequência. Eu sei que eu fiz Primeira Comunhão, Crisma, porque até esse meu amigo que virou frei foi em função… né, nós fizemos todos esses caminhos, né, juntos e depois, ele seguiu estudar para ser padre, virou frei franciscano, porque a mãe dele já era ministra e a mãe dele foi minha professora de Português, dona Aparecida, que também é uma pessoa… você perguntou de professora, aí tem a mãe do Paulinho, dona Aparecida. Que o pai também era professor, acabou que… ele não foi meu professor, foi ela que foi minha professora.
P/1 – O quê que mudou entre a infância e a adolescência, você acha?
R – Da infância para adolescência?
P/1 – É. Que você começou a fazer para sair, o quê que você fazia?
R – Eu não sei. Eu sempre fui uma pessoa de poucos amigos. Não é que eu não gostava dos meus amigos, é que como o Paulo, esse que virou frei, acabou sendo o meu melhor amigo, né, assim, apesar de ter os amigos do futebol, né, que acaba criando ali uma amizade, que é todo mundo das ruas próximas ali, paralelas, então a gente acaba fazendo amizade. Mas eu sempre fui de sair sozinho. Então, como eu comecei a trabalhar muito cedo, com 16 anos, a minha vida era ir trabalhar, primeiro que tinha que acordar muito cedo, que o ônibus passava circulando e a empresa ficava a 25 quilômetros de onde ei morava, o ônibus passava na cidade recolhendo as pessoas para ir para o trabalho. Então, e de lá, às vezes, eu não passava em casa, ia direto para a escola. Então, só chegava em casa de noite. E chegando em casa de noite, só tinha o sábado e o domingo. Aí no sábado e domingo, às vezes, eu tava estudando, às vezes, tinha algum futebol. Então, quer dizer, aquela fase de jogar bola todo dia na parte da tarde, isso foi acabando. Então, isso vai acabando também até com as amizades. Assim, eu tenho contato com todos eles ainda, fiquei um tempo afastado, mas com as redes sociais, acaba que você vai descobrindo os amigos de novo, a gente vai se comunicando. A gente não se encontra, mas conversa, às vezes, pelas redes sociais. Então, eu não sei da mudança, assim, como eu não lembro muito da minha infância, eu lembro de quando eu comecei a trabalhar, dos 16 em diante. Isso foi mais frequente, porque aí eu comecei a trabalhar, estudar e aí, tem a evolução profissional, aí são outras amizades que você vai fazendo. Aí, esse meu amigo Paulo já tinha entrado nessa linha católica, religiosa. Então, quando ele vinha de férias, aí a gente se encontrava, a gente saía junto e como eu sempre namorei, então sempre não tinha muitos amigos, porque aí eu tava namorando, terminava o namoro, tava namorando, então ficava muito pouco tempo para sair assim, para sair sozinho, ou sair com o pessoal. Quando eu trabalhava, o pessoal já tinha o futebol uma vez por semana, então uma vez por semana eu tinha que matar aula, porque aí, a gente saía, já descia direto da empresa para ir jogar bola e aí, tinha também final de semana, os meus tios sempre gostaram de futebol, até em função do meu avô, né, então a gente era sócio de um clube que chama Sociedade Portuguesa, porque os meus avós têm… minha avó tem alguns parentes portugueses, então a gente ia jogar bola todo sábado. O futebol era sábado à tarde e domingo de manhã. Então, se você fosse jogar domingo de manhã, dificilmente, você iria sair ao sábado. Mas às vezes saía, porque como era novo, né, chegava em casa duas, três horas da manhã, acordava às sete para jogar bola, né? Hoje não tem como fazer isso, né? Mas naquela época, acontecia isso, saía e conseguia acordar para jogar bola, porque o meu tio já passava para pegar pra gente ir jogar bola, então…
P/1 – Que idade isso, mais ou menos?
R – Isso, 18, 19 anos.
P/1 – Você se lembra o quê que você fez com o seu primeiro salário?
R – Não. Eu lembro que… apesar de eu ter começado a trabalhar com 16, desde os nove, dez, eu engraxava sapato dos meus tios para eles me darem um dinheiro, que eu gostava de comprar bala, essas coisas, então não me lembro a primeira vez que eu engraxei o sapato de um deles, o que eu fiz com o dinheiro, não, porque tinha essa coisa de menino, de querer comprar bala e tal e a única forma era… eu lavava o carro deles, né, então ajudava a lavar, então desde dos dez, doze anos, já fazia isso e logicamente que é uma coisa de criança, né, mas não era nada todo dia, era para ter cinco, dez reais, seria hoje, não sei. Então, quando eu comecei a trabalhar, eu recebi, eu lembro que foi muito dinheiro porque eu ia receber nesse guarda-mirim, 80% do salario mínimo.
P/1 – Era bastante para você!
R – Já era bastante, mas eu ajudava, nessa época, eu ajudava em casa. Quando eu recebi, quando eu trabalhei nessa empresa, era quase dois salários mínimos para um menino de 16 anos. Então tudo bem, eu fui fazer faculdade, colégio particular, que eu fiz o técnico em Contabilidade, depois, técnico de Informática, mas parte disso, eu ajudava em casa, a minha avó. Não ajudar assim, de dar o dinheiro para ela, porque ela não gostava disso, mas às vezes, comprava alguma coisa para a casa, trocava a televisão. Nessa empresa que eu trabalhei, naquela época, tinha uma… não sei se é tendência – não sei se vou usar a palavra certa – mas as pessoas gostavam muito de fazer consórcios entre amigos e como cada vez, saía um, não era consorcio de dinheiro, era consórcio de coisas, então eu lembro que o primeiro consórcio saiu e era de um vídeo cassete, então quer dizer, o vídeo cassete foi para lá, depois, televisão. Então, sempre tinham essas coisas assim. Então foi dessa forma que foi…
P/1 – Gasto.
R – Gasto. E lá nessa empresa que eu trabalhei, por estar trabalhando, eu não servi o Exercito. Então foi uma coisa também que me ajudou, quer dizer, trabalhei, fui dispensado do Exercito e aí, pude continuar a ajudar a minha avó.
P/1 – E você ficou até… nesse emprego, dos 16 até 91?
R – Até 91, que aí veio uma crise… trabalhei na Siderúrgica Mendes Junior… não sei se pode falar o nome da empresa…
P/1 – Pode, claro!
R – Mas trabalhei na Siderúrgica Mendes Junior, houve a crise de 91 do Collor…
P/1 – O que aconteceu especificamente?
R – Especificamente, lá na empresa, assim, houve uma crise no Brasil, onde pegaram o dinheiro da poupança de todo mundo, aquele negócio do dia pra noite, então as empresas começaram a fechar e a Mendes Junior, a Siderúrgica Mendes Junior, não a Mendes Junior, mas a Siderúrgica, onde eu trabalhava, acho que na época tinha quase cinco mil funcionários, reduziu para mil e poucos, sei lá. E dentro do meu setor… porque aí tem uma trajetória dentro da Mendes Junior. Entrei lá com 16 anos e lá, tem uma politica dentro da empresa que quando surge uma vaga de auxiliar de escritório, lá a gente chama de boy, chama office-boy, né, é office-boy, mas na realidade, a função era continuo, é o menino que leva correspondência, lá dentro da empresa tinham uns 20 e poucos que ficavam dentro da empresa, então gente andava de bicicleta distribuindo correspondência…
P/1 – Dentro da empresa?
R – Dentro da empresa. Então tinham aquelas bicicletas com aquele negócio na frente, você colocava o malote, são correspondências…
P/1 – E você andava pra lá e pra cá.
R – É, você tinha que ir de bicicleta, andar 20 quilômetros e entregar as correspondências que são setores dentro da Siderúrgica.
P/1 – Não era perigoso?
R – Não, você tinha capacete, tinha bota, né? E era interessante que o sonho de todo mundo era trabalhar lá e o uniforme era muito feio. Era uma calca vinho, calca social vinho, com cintinho e uma camisa de botãozinho de manga curta creme com aquele símbolo vinho. Só que eu sentia um orgulho de usar aquilo porque era uma empresa grande dentro da cidade, todo mundo…
P/1 – Conhecia, né?
R – Conhecia e tal, mas a roupa era horrorosa. Na hora que você entrava lá, ficava mais horroroso, porque você tinha que montar numa bicicleta, botar um capacete, porque você andava dentro das siderúrgicas, né, dos escritórios de cada setor, eram quatro e botar uma bota que você usava sapatinho social de amarrar e tudo, mas para você fazer entrega de correspondência dentro do escritório que já era grande. Mas quando você ia pegar a bicicleta, você ia entrar dentro dos setores, que era trefilaria, aciaria, caldeira, né, passava longe, mas tava… você tinha que ir com equipamento, que era bota e o capacete e óculos, dependendo do setor que você entrasse, tinha que colocar o óculos, que às vezes, tinha que passar… tinham aquelas linhas, né, na verdade, você não corre nenhum perigo porque tem as linhas de proteção, você passava para entrar no escritório, mas tinha do lado uma caldeira…
P/1 – Vai que, né?
R – É. Então você tinha que usar todos os equipamentos, que a gente estava dentro de um… o EPI era importante. Mas aí, voltando, então eles tinham essa filosofia, o garoto fazia 18 anos, então tentavam tirar ele do Exercito e a primeira vaga que ia aparecendo era para os mais velhos, né, quem tá com 18, 19 anos. Só que aconteceu uma coisa diferente, eu com oito meses que eu estava na Mendes Junior de continuo, surgiram duas vagas, uma no setor financeiro e uma no setor de transportes, de auxiliar de escritório. Então, foi primeiro para essa pessoa, que já tava com 18 anos e eu tinha só 16 anos. Só que esse outro setor exigiu que se não fosse eu, ele não queria nenhum dos outros, ainda tinham mais uns três lá, e tinham outros que tinham mais tempo que eu, eu tava com oito meses de empresa. Por que isso? Porque eles viram… era um setor de… eram os motoristas da empresa, né, então os meninos, todos os contínuos, no horário de almoço, iam para a sala de motorista, até porque os caras tinham experiência de vida, quer dizer, você sentar lá para ouvir as histórias dos caras para um menino de 17, 18 anos é uma coisa fantástica! Só que eu não tinha esse tempo, porque como eu estudava, eu aproveitava o meu horário de almoço para ir para a biblioteca estudar, então eu não aparecia muito lá, né, conhecia porque eu sempre passava lá para distribuir correspondência, mas não tinha muita liberdade com eles. E eles acharam que isso era importante, uma pessoa que fosse trabalhar no escritório, que na realidade, o auxiliar de escritório ia controlar eles, então tinha que ser uma pessoa que não tivesse muita intimidade, que a intimidade acabaria atrapalhando os controles. Então, era essa exigência, que se não fosse no caso eu, eles iam abrir uma vaga externa e aí, como a filosofia da empresa é aproveitar primeiro quem tá dentro, depois abre vaga externa, eles acataram e acabou que eu que fui. Então, fui promovido com oito meses, quer dizer, pra mim, foi uma coisa fantástica, né?
P/1 – E você lembra de alguma história que contaram para você, esses motoristas?
R – Nossa, tinha muita história!
P/1 – Tem alguma que você pode contar pra gente?
R – Nossa! Eu não sei se eu vou lembrar de alguma, porque tem o Dutra… não, tem uma história, tinha um cara lá, o Mangueira, motorista do Rio, ele era do Rio e foi pra Juiz de Fora para trabalhar lá, porque eles buscavam os melhores motoristas, como era uma empresa que tinha poder, né, tinha um bom salário, então eles buscavam motoristas de grandes empresas, viajar para outros estados, tal, quer dizer, muita gente mandando currículos… e esse cara, o Mangueira era um cara do Rio, conhecia o Rio como a palma da mão e naquela época, não existia o GPS, né? Então assim, ele um dia levou um diretor lá e os diretores mandavam: “Pode porque nós temos que chegar no horário”, naquela época, eram os Opalão, Comodoro, carro de luxo da época era esse, né? Carro top eram esses carros. E a gente era responsável por esses carros, que o nosso setor era o setor de transportes, então a gente controlava os carros da diretoria e os carros que… os ônibus que buscavam todo mundo, que era uma empresa terceirizada, mas a gente controlava a empresa. E ele conta lá que ele subia e descia canteiro, não sei o que, o diretor doido com aquilo e ele passou dentro de uma comunidade e diz ele que o cara ficou desesperado, porque você pensa bem, até hoje quando você passa, você acaba ficando assustado, mas é uma coisa natural, mas para quem não tá acostumado, né? E ele falou que o cara: “não, não, não tem pressa mais não, você pode andar devagar, mas não precisa cortar caminho”, porque é caminho que você corta, né? “Não precisa fazer atalho, não, não sei o que…”, e além dessas histórias assim, de cortar, né, esses atalhos, eles eram os primeiros a saber se a gente ia ter aumento ou se ia cortar ao meio, porque como eles transportavam os caras, a diretoria, eles conversando lá: “Vem corte ai” “vai ter aumento acima do que o sindicato exigir, eles estão planejando outro aumento”, então assim, a gente tinha as informações privilegiadas, né? Porque chegava pra gente… lógico que ficava entre a gente, a gente não espalhava para a empresa, mas a gente sempre tinha uma informação meio que privilegiada. Então assim, tem muita coisa legal. E fora as histórias de vida deles, que são caras que viajavam naquela época em que eles trabalhavam com ônibus, às vezes, eles tinham que viajar, virar a noite, aí tomar alguma… que eles chamavam de arrebite, tomavam aquelas coisas pra virar a noite, para chegar no horário. Nunca nenhum deles que era uma coisa que tava no currículo deles também, não sofreram nenhum acidente. Não sofreram, mas tinham seus probleminhas que eles enfrentaram de ter que viajar longos trechos, ficar acordado muito tempo. Lá para mim, foi uma escola de vida. Eu falo que como eu entrei lá com 16 anos, eles acabaram sendo os meus pais, cada um deles com a sua particularidade, porque como eu já tinha perdido o meu pai, assim, eles me tratavam como filho, mesmo. Então toda proteção: “Eduardo, não faz isso. Hoje nós vamos sair”, aí saiam, porque eles tinham muito isso, porque eles não faziam nada a noite, então ou jogavam o futebol, “Vamos sair”, tal e eles tinham uma proteção: “Você não vai beber, você é menino ainda”, tal. Então quer dizer, eles me tratavam como filho, mesmo. Então, isso pra mim foi uma grande escola, que eu aprendi muito com eles sobre isso, sobre vida, o que é certo, o que é errado, porque às vezes, o nosso trabalho é bem estressante, se você pensar, 16, 17 anos eu já controlava 15 motoristas, uns caras vividos, você imagina o quê que é isso! Mas assim, eles sempre tiveram muito respeito, sempre me trataram super bem.
P/1 – Você ficou de 84 a 91 nesse cargo?
R – É. Fiquei de 84… aí o que aconteceu? Aí teve as promoções internas dentro dessa empresa e eu cheguei até onde poderia chegar, porque acima, o próximo cargo seria o do meu chefe, coordenador e acima dele, o chefe de divisão. Então, cheguei até onde eu podia chegar e aí, aconteceu de em 91 ter essa crise e aí, foram mandando as pessoas embora. Inclusive meu chefe foi mandando… porque aí criaram, na época, o setor de informática e aí me passaram para esse setor do departamento do transporte e a gente trabalhava quatro pessoas e aí, teve essa crise, foi mandando um, aí acumulei o serviço dele, dois, três e no final, fiquei sozinho até 91, de passar a ter que dormir lá, para você ter uma ideia, porque tinha que trabalhar, então quando eu sai, eu recebi quase dois meses de hora extra, para você ter uma ideia, quando eu sai, eles me indenizaram mais dois meses, porque é uma empresa muito correta e tudo. Não tinha como fazer, não tinha como compensar essas horas, não sei nem se hoje isso poderia ser feito, mas sei que recebi todos os meus direitos, mas era uma opção minha também, porque eu tinha esperança de ainda ficar, então foram seis meses trabalhando dessa forma, porque foram saindo e eu tinha que fazer o serviço, com 20 anos, né?
P/1 – E para as outras pessoas, você lembra como que foi esse período de crise?
R – Foi muito complicado! As pessoas iam saindo, assim, tinham pessoas com família, né, então foi uma época bem complicada. E para própria cidade foi complicado, porque essas pessoas começaram a cair no mercado, eu sofri isso quando eu sai, das empresas não quererem admitir, porque achavam que elas estavam mais qualificadas do que precisariam. Eu quando sai de lá, eu fiquei acho que uns seis meses ou mais para arrumar, porque todo lugar que você batia, pessoa… tudo bem que tinha o seguro desemprego, né, a pessoa falava assim: “Seu currículo é bom demais, você não pode vir para cá”. Isso aconteceu com muita gente, teve gente que caiu em depressão, conheço pessoas que se deprimiram porque chegava, ou então tinha que sair dali, tinha que ir para São Paulo, para outro lugar. Então, na época, eu lembro que… hoje não, porque… eu mesmo, né, porque como eu sempre quis aprender, lá era um centro de tecnologia, lá as pessoas iam para São Paulo, Rio e traziam as coisas mais novas para dentro da empresa. Então tinha curso quase todo mês de… hoje, já não existe mais, mas Lotus, que hoje é o Excel, Lotus I, II, avançado, dBase, aquela de você escrever, programação, tudo, Power Point, essas coisas, tudo que era novidade na época, ali já tinha. E eu sempre gostei de fazer, porque como eu conhecia um cara do treinamento, toda brecha de curso, ele me ligava e o meu chefe me liberava: “Vai faltar um aqui em tal turma, quer fazer?”, então fiz curso de tudo o que você imaginar, eu fiz, até curso que não tinha nada a ver comigo, eu fazia, porque era uma forma de aprender, eu achava nessa forma uma oportunidade. Então quando eu sai também, aconteceu isso. Até que um dia eu cheguei na confecção, o cara falou assim: “não posso…”, eu falei: “pelo amor de Deus, preciso trabalhar”, e tinha passado uma outra pessoa antes de mim lá que ele tinha dado a oportunidade e a pessoa não aguentou, porque é muito trabalho e a remuneração não é tão alta quando a que eu tinha, então ele não se adaptou e acabou saindo, vindo para São Paulo, um cara muito competente. Eu falei pra ele: “Me dá uma oportunidade que eu preciso trabalhar”. Aí, com muito custo, eu fui contratado via uma empresa que trabalhava com funcionários temporários, porque aí a empresa não tem muito vinculo, ela paga para empresa temporária, a temporária que me pagava, né? Então, eu fiquei lá três anos e cheguei a gerente da empresa.
P/1 – Noventa e quatro, uma coisa assim?
R – É, mais ou menos isso.
P/1 – E nesse meio tempo, você foi fazer faculdade, também?
R – Sim, aí eu fiz Ciências Contábeis… porque lá em Juiz de Fora, se você fizesse um curso técnico de três anos, se você fosse fazer outro, você ganhava um ano, ganhava dois anos, na realidade. Então, eu fia três anos de técnico de Contabilidade e fiz um ano de técnico de Processamento de Dados – não sei nem se existe isso mais – então, em quatro anos, eu tive dois cursos técnicos, que tinha essa possibilidade, que eu fiz no Machado Sobrinho e o outro era no Pio XII, que tinha essa possibilidade. Depois eu fiz faculdade no próprio Machado Sobrinho, porque o meu tio tinha estudado lá, um dos irmãos do meu pai, então tradicionalmente, era uma faculdade boa. Então fiz lá, eu acho que eu fui da segunda turma já no campus novo, porque era no centro da cidade, depois fizeram um campus. Depois, fiz Administração também, aí depois, fiz especialização, três especializações, MBA, aí eu fui fazendo essas outras especializações porque eu fui mudando de lugar. Porque eu morei em Juiz de Fora, eu fiz a faculdade lá, trabalhei lá e aí surgiu uma oportunidade de eu ir para Ubá, também Minas Gerais…
P/1 – Depois da confecção, né?
R – É, depois da confecção, eu trabalhei… a confecção quebrou, foi me oferecido abrir uma cooperativa junto com as pessoas, com as costureiras. Eu, naquele momento, achei que não era a minha praia, nunca tinha me visto sendo dono de um negócio, eu achei que eu produziria mais se eu trabalhasse como funcionário, não quis. Aí ele se desfez da empresa, fez facções, ele tinha outros negócios, foi tocar outro negócio, aí eu fui para uma empresa de recauchutagem de pneus, fiquei lá dois anos, que depois também ela fechou, que tinha sido um diretor da Mendes Junior, que quando saiu, montou um negócio, quebrou. Aí o outro assumiu e aí, esse que assumiu… aí foi quando eu entrei para ser gerente, esse que assumiu não conhecia do negócio e acabou que fechou. Aí, nesse meio tempo, surgiu uma oportunidade, um processo de seleção em Juiz de Fora, onde o Jair, esse meu professor de Estatística era o gerente geral, aí participei do processo de seleção, não passei, mas a mesma empresa que fez esse processo de seleção fez para uma outra empresa em Ubá, aí falou assim: “Já tem num processo de seleção que ele ficou em segundo, quer ouvi-lo?”, porque aí não precisa abrir o processo, era a mesma vaga, né, mesmo segmento. Aí, fui para lá, aí senti lá, me ouviram e disseram: “É você mesmo”, aí fui para Ubá. Lá em Ubá, eu já tinha feito uma especialização na UNIPAC em Juiz de Fora, onde esse Jair era professor lá também, só que de outra matéria. Aí quando eu fui para Ubá, a maneira que eu encontrei de fazer amizade era fazer uma outra especialização lá que eles estavam começando com parceria com a Universidade Federal de Viçosa, Associação Comercial, Sebrae criaram o primeiro curso lá, o MBA de Gestão Empresarial, falei: “É uma boa oportunidade de eu fazer amizade na cidade, porque eu não conheço ninguém”, fui para ser gerente geral de uma empresa, né? E foi excelente, porque aí, eu conheci vários outros gerentes de empresa, aí fiz lá, fiquei lá uma gestão, porque eram empresa que de quatro em quatro anos, eles têm eleição, aí muda a diretoria e aí, eu fiquei mais um ano na outra diretoria, aí ele resolveu colocar mais uma outra pessoa, eu treinei essa pessoa e aí quando eu tava para sair, surgiu Divinópolis.
P/1 – Tá, então vamos dar uma pausa que já foram cinco anos, já. Você queria fazer uma pergunta?
P/2 – Eu queria. Queria perguntar nesse período todo, incluindo a adolescência e tal, você lembra o que era um bom exemplo pra você, assim? Você tinha algum bom exemplo?
R – O meu conceito de bom exemplo é um pouco diferente do que eu tenho hoje. O meu bom exemplo era a minha avó, que é uma pessoa que batalhou sem ter recursos, colocou quatro, cinco filhos para estudar, criou cinco filhos, então se hoje… se eu não tivesse vivido o “Caçadores de Bons Exemplos”, naquela época se me perguntassem: “Quem é um bom exemplo?”, eu falaria: “Minha avó”, que ela me criou, criou os filhos, dedicada, batalhadora, mas eu não tinha o conceito que eu tenho hoje do quê que seria um bom exemplo. Então seria ela o meu bom exemplo, que é o que a maioria das pessoas acham hoje: “meu pai, minha mãe…”, na real, um bom exemplo, não deixa de ser. Mas um bom exemplo ainda é uma coisa maior, alguém que faz algo pelo outro, né?
P/2 – Você lembra também se, por exemplo, você foi contando que as coisas foram muito naturalmente, mas você tinha algum sonho, se você pensava: ‘nossa quero chegar em tal lugar?
R – Sim. Quando eu fui promovido com seis meses, lá na Mendes Junior, com 16 anos, pensei assim: ‘puta merda, eu vou ser presidente dessa empresa. Em seis meses eu já fui promovido’.
P/1 – Dá tempo, né?
R – Dá tempo! Com 16 anos, né? Eu pensei nisso. Então, eu acho que pensei sim, e só não fui porque eu não quis ser, porque quando aconteceu em 91, eu poderia ter seguido outros caminhos e ter ficado na empresa, só que eu não acreditava mais nisso. Então, eu falo assim, são aqueles males que às vezes, a pessoa acha que é mal, né, que acontecem, mas é para o nosso bem. Eu acho que se eu tivesse ficado lá com esse ideal que eu tinha com 16 anos, aí depois, com 20, 21 isso acabou, eu hoje talvez não estaria aqui. Eu tenho essa certeza. Porque tinha outra coisa traçada. Então, como as coisas foram acontecendo muito naturalmente e eu sempre acreditei que a gente tem que esperar as coisas passarem, se tiver muita turbulência, você tem que dar uma esperada, contar até dez, se dez não deu, conta até 20, vai passar. Porque o que aconteceu em 91 que eu contei que foi traumático para várias pessoas, foi para mim. Você imagina um garoto com 16 anos promovido com oito meses de empresa, com um sonho de ser presidente dessa empresa, depois de algum tempo, quatro anos, sei lá, vem um choque desse, sai um, sai dois, você fazendo serviço de quatro e aí pensa: ‘não, não é isso não…’
P/1 – Não é pra mim.
R – Não é pra mim. Hoje eu tenho essa certeza, eu não tinha isso lá. Noventa e um foi barra.
P/1 – Começou a mudar a sua cabeça aí, então?
R – Eu acredito que sim, foram várias sequencias, eu acho. O fato de eu não lembrar a minha infância, talvez, seja o trauma da separação dos meus pais, até da maneira que foi. Eu lembro do meu pai lá no bairro Grama, eu não sei se foi dessa forma, ou da forma que eu lembro. A gente sentado numa mesa, ele caiu e teve a embolia. A partir daquele momento, ele teve embolia e paralisou o lado direito todo dele e parou de falar. Isso é uma memoria que eu tenho. Eu não tenho outra memoria do meu pai. Tenho, tenho algumas em que ele… tenho memória da minha avó, eu e o meu irmão fizemos arte e aí ela pegou aquela varinha e bateu na gente, que era um corredorzinho, assim, então tinha que passar ali, não tinha jeito de fugir dela, nós fizemos uma arte e tínhamos que passar ali e ela bateu na gente. Do meu pai, eu lembro dele correndo atrás da gente, mas já com embolia que ele tinha a muletazinha, a bengalazinha, então quer dizer, não conseguia pegar a gente, muito vagamente, eu lembro dessas coisas, assim. Então quer dizer, tem esse… não sei se é um trauma, tem esse corte, depois na morte dele, que eu tinha uns 11, 12 anos, que foi um trauma, que eu lembro que eu tava jogando bola e aí, eu cheguei no portão da minha vó, perguntei: “O que tá acontecendo?”, era o meu pai que tinha saído… que antigamente, velava o corpo em casa, o corpo tava na sala e o meu tio me chamou atenção: “Você não sabe o que tá acontecendo?”, eu tava jogando bola, não tava entendendo o que tava acontecendo, nervoso, tal, quer dizer, aquilo foi um outro choque e talvez, depois esse trauma de querer trabalhar… trauma, não, né, essa outra vivencia de querer trabalhar por causa de um amor d criança, de jovem, adolescente, aí você chega lá, não se realiza, mas aí você já tá trabalhando, porque é um ideal, você é promovido com oito meses, tem um sonho de ser diretor presidente da empresa, isso corta seis anos depois, 91 e aí, depois foram acontecendo outras coisas, né, então… eu acho que são vivencias, eu acho que são experiências. Às vezes, são boas, às vezes, são ruins.
P/1 – São marcas suas, né?
R – É, são marcas, como hoje eu só tenho marcas boas. Apesar de às vezes, vivenciar coisas ruins, mas todo dia, você vivencia coisas boas. Talvez, tudo isso que eu vivi me fortaleceu para eu estar vivendo isso hoje. Eu tenho certeza disso, porque quando você passa alguma dificuldade aqui, você vai lá atrás: ‘pô, não posso reclamar, olha a vida que eu tive!’, não tem do que reclamar, a gente não pode reclamar da vida.
P/2 – Você falando tem uma clareza do que é bom, do que é correto, assim, você lembra da onde veio isso?
R – Eu acho que talvez da minha família. Da criação, assim. Eles são muito corretos, talvez por essa criação da minha avó, todos eles têm esse senso de correção e isso acabou, de uma certa forma, entrando na gente, porque você acaba vendo os exemplos, né, ter um tio correto, ter a tia correta, ver a sua avó muito correta. Eu não tive esse exemplo dos meus pais, assim, não me lembro assim: ‘meu pai era correto’, não sei porque eu perdi assim… e do tempo que eu lembro dele, ele já tava com embolia e não falava. Então… e minha mãe a mesma coisa, porque quando eu lembro, eles já estavam separados, depois fui revê-la… porque a minha mãe, depois que separou, ficou muito tempo sem nos ver, foi agora recente, dez anos que a gente… que aí ela voltou, meu irmão foi morar com ela… tem o outro lado também que o meu irmão sempre foi muito ligado a minha mãe. Então, quando houve essa separação, ele sentiu muito. Ele foi o que mais sentiu nessa separação. Ele teve um trauma, isso é certo, todo mundo sabe e pra ele, foi muito ruim ir viver com a minha avó, para mim, foi uma coisa natural, para ele foi muito traumático, tanto é que ele era revoltado no dia a dia com a minha avó, com algumas atitudes, tal e às vezes, eu tinha que… eu era mais novo e tinha que falar: “Pô, baixa a sua bola aí, não é assim, tal”. E talvez pelo histórico dele neurológico, tudo se justificava e as pessoas acabavam passando a mão na cabeça dele e talvez isso não fosse bom naquele momento ou foi, não sei. Então, tem todo esse histórico também. Então, no período da vida que ela voltou, primeira coisa que ele fez foi largar tudo e morar com ela, tudo bem que era na casa que o meu pai tinha deixado, deixou pra gente, eles foram morar lá, que era lá na Grama, onde nós fomos criados. Então, ele foi morar lá, ele vinha todo dia que são quase 30 quilômetros, se eu não me engano, para trabalhar no Centro, quer dizer, a vida dele não era fácil, era de ônibus e tal. E depois que eles foram para o Rio, aí não quiseram mais ficar lá… então assim, para ele foi mais traumático, eu acho.
P/1 – E você sabe o que a sua mãe estava fazendo depois da separação?
R – Depois da separação, ela teve, acho que mais dois relacionamentos, casou mais duas vezes e aí, confecção, vários segmentos, foi morar no Espirito Santo, mas não viu a família, depois voltou, morou no Rio, depois que veio para Juiz de Fora e aí, pediu para morar na casa primeiramente, com essa pessoa que ela tava se relacionando, morou lá, depois o meu irmão resolveu ir para lá porque essa pessoa que tava com ela foi embora, então o meu irmão foi para lá. Meu irmão casou, teve um filho, então ficaram todos eles lá, depois o meu irmão separou, aí foi o meu irmão, a minha mãe e o meu sobrinho para o Rio de Janeiro, que aí eles conseguiram comprar uma terra lá, começaram a fazer um comercio… então assim, foi…
P/1 – Eles foram para outra…
R – É, para outra direção. E como a minha relação com a minha mãe sempre foi distante, continuou distante, porque aí… não é que o meu irmão era preferido, mas eles tinham uma afinidade maior, tanto é que ele resolveu sair para ir. Eu não faria isso, eu tinha outros segmentos, acho que… eu não gosto, assim, de voltar muito no passado, acho que se perdeu, você pode tentar corrigir, tal, mas não tem como recuperar aquilo que não aconteceu. Não tem como recuperar, a gente se fala no telefone, quando o meu irmão faleceu, eu dei o maior apoio, na medida do que eu podia, foi um trauma para mim, porque a gente tava em Tocantins quando o meu irmão faleceu e eu tinha duas opções: ou eu ia vê-lo, ou o dinheiro que eu ia gastar para ir vê-lo, eu mandava para ele fazer o exame, porque ele não tinha plano de saúde. Naquele momento, eu resolvi mandar o dinheiro, que eles estavam precisando. Só que fez o exame, não adiantou nada, ele morreu. Então… são escolhas, a vida é feita de escolhas.
P/1 – E como é que foi para você, isso?
R – É… na realidade, nós tivemos uma desavença, eu e o meu irmão, quando ele tinha 16 anos, nós ficamos sem conversar até dois anos antes dele morrer.
P/2 – Por quê?
R – Porque como eu comecei a trabalhar cedo, na época, e o meu irmão nunca quis trabalhar, então ele tentou me furtar, pegar um dinheiro meu para ele aproveitar a vida dele, na época, era um dinheiro, um relógio, tal e isso nos gerou uma briga, mas nós não brigamos de um bater no outro, briga de conversa: “Você tem coragem de roubar o seu irmão! Acho que nós não somos dignos de conversar mais”, e a partir daquilo, paramos de conversar. A gente vivia na mesma casa, depois que ele foi morar com a minha mãe, mas a gente não… só falava: “Oi”, eu não queria saber da vida dele, ele não queria saber da minha, hesitei quando o filho dele nasceu, meu sobrinho, fui lá na casa da Grama umas duas vezes, no Rio de Janeiro também. Mas assim, eu ia para visita-lo, mas ia para conversar com a esposa dele, né, a gente não se conversava, o máximo que falava era “Oi”. E aí, quando aconteceu isso, né, que aí voltou, a gente já tava dois anos voltando a conversar, porque a gente… tinham se passado muitos anos, né, mais de 20 anos e aí, nós voltamos a conversar por telefone, eu ligava: “E ai, tudo bem? Como é que estão as coisas?”, já conversava o suficiente, não tinha muita afinidade e fui lá umas duas vezes no Rio para ver se estavam precisando de alguma coisa antes da gente sair para a expedição e depois, aconteceu dele ficar… ele já tinha ficado doente algumas outras vezes, mas não se cuidava e aí, dessa última vez, foi parar no hospital e ficou uns 15 dias, saiu, ficou uma semana em casa, voltou, passou mal de novo e aí, ficou uma semana, que foi quando aconteceu que tinha que fazer uns exames, não tinha plano, o SUS não fazia e tinha que fazer particular e aí, um tio meu também ajudou, que mora hoje em Brasília, o outro tio também e aí, o dia que nós decidimos, falamos assim: “Nós vamos gastar x para ir lá”, para sair daqui, né? “Vai chegar lá para ver, ele tá precisando fazer uns exames, em vez de gastar esse dinheiro, deposita lá que vai fazer o exame que precisa que era urgente”, foi a opção que nós fizemos, quer dizer, eu fiz, né? “Vamos mandar o dinheiro e não vamos e vamos por telefone, saber noticias”. Mas aí, passaram dois, três dias, fez o exame, foi um sucesso, mas depois teve alguma complicação que… e aí, tinha despesas, porque o hospital era longe de onde eles moravam e às vezes, de ônibus era demorado, então às vezes tinha que ir de taxi, ou com algum vizinho que tinha que botar a gasolina porque senão, não chegava no horário de visita, SUS, né? Então, infelizmente, aconteceu. Para ela foi mais traumático e para o menino que ficou, né, que eles eram… o meu sobrinho que era muito ligado, ligado demais. Então, aí de vez em quando, eu ligo, dou alguns conselhos para ele, mas distante, né, são só conselhos. Nós passamos lá duas vezes, esse ano mesmo, passamos. Você conversa, muda, né, mas você saiu dali, se não tiver alguém todos os dias, um menino de 16 anos, né, é complicado!
P/1 – Seu irmão morreu em que ano?
R – Tem dois anos.
P/1 – Dois mil e treze?
R – Quinze, 14, 13. Morreu uma semana antes de fazer aniversário.
P/1 – Voltar um pouco antes. Depois de 95, o que você acabou fazendo? Estava fazendo faculdade, estava morando em Ubá, né?
R – É, aí eu já tinha feito faculdade, né, aí fui para Ubá, e em Ubá, eu comecei na realidade em 98, porque eu entrei na época em que foi da regulamentação dos planos de saúde, 1998, foi agosto de 98 e eles queriam reformular a empresa, precisava de alguém nessa área. Como tava tudo começando, era tudo novo da área de saúde, que era uma regulamentação que ia entrar em vigor em agosto, depois só entrou em janeiro de 99, eu entrei numa empresa que já funcionava, mas tudo ia mudar, então era como se fosse uma empresa nova. Então, teoricamente, para mim, ia ser mais fácil, né? Porque tudo o que ia se fazer dali pra frente era novo, não adiantava quem tinha dez anos, quinze anos de empresa, não adiantava, porque era novo. Então tinha que estudar, são leis novas. Então, fiz muito curso. Eu fui para lá em 98, fiz muito curso. Nesse momento, eu já tava casado, o meu menino nasceu em 98, dezembro de 98.
P/1 – Estava casado com quem?
R – Com a Elisabete, não é com a minha esposa hoje, né?
P/1 – Como é que você conheceu ela?
R – Aí tem que voltar um pouquinho (risos). Na realidade, aí é uma outra história, mas eu tenho dois filhos, né? Eu tenho uma menina de 26 e um menino de 16. Eu com 20 anos, eu casei a primeira vez, que é a minha menina de 26.
P/1 – Tava na siderúrgica, ainda?
R – Tava na siderúrgica, quase saindo, né, porque eu sai em 91, nós casamos acho que 97… 87, é, porque eu entrei na Mendes Junior em 84. É, sai em 91. Acho que nós casamos em 87, 88. Aí, nós nos conhecemos, em um ano, já queria casar.
P/1 – Ela era de?
R – O pai dela é militar… essa história é boa, hein? O pai dela é militar e ela tinha amigas em Juiz de Fora, então ela ficou em Juiz de Fora para estudar. Então, ela tava fazendo cursinho para fazer faculdade em Juiz de Fora. Nesse meio tempo, nós nos conhecemos porque o meu chefe da Mendes Junior, a mulher dele é irmã da amiga dela, não sei se dá para entender, ela ficou na casa da mãe da mulher do meu chefe estudando junto com essa amiga dela, que irmã dela. Não sei se deu pra entender, porque ela tava estudando em Juiz de Fora para fazer vestibular no final do ano. Nesse meio tempo, meu chefe me apresentou ela, nos conhecemos, me apaixonei, né, e aí quis casar. E aí, nos conhecemos, sei lá, já tava em novembro, dezembro, eu quis casar, ela achou que a gente era muito novo para casar e ela ia embora para onde os pais… porque o pai dela é militar, morava, na época, Espirito Santo? Não sei, acho que era no Espirito Santo. Ela falou: “Vou tentar vestibular lá mesmo, nós somos muito novos para casar”. Só que ela já estava grávida e não sabia e foi embora no final do ano para tentar o vestibular lá em janeiro ou fevereiro, o que fosse. Nesse meio tempo, atrasou, né, as regrinhas lá e ela ligou e nesse meio tempo, nesse um mês, eu sou muito radical, falei: “não vou querer mais, acabou, acabou, se ela não quer, vou tocar a minha vida”. Aí, ela ligou e falou assim: “Tô grávida e tal”, aí resolvemos casar", pai dela militar… e aí, volta naquilo que você perguntou da minha família muito certa e aí, eu falei com um tio meu que é meu padrinho: “Tio, aconteceu isso, isso e isso, eu não queria casar, queria assumir, trabalho, tal, vou assumir, registrar, pensão, o que for, mas não queria casar. Você vai comigo pra gente conversar? Porque o pai dela é militar, tá vindo lá da cidade pra conversar comigo e diz que o cara mata, o cara é bravo”, era a fama dele, até hoje é, hoje nós conversamos mais do que na época, que foi a formatura da minha filha no ano passado, ele veio, tal, nós ficamos conversando um tempão. Tinha muito tempo que a gente não conversava. Aí, o meu tio falou assim: “Você fez, você assume. Eu não vou lá com você. Isso é um problema seu”, não foi com essas palavras, foi um pouquinho mais… ele falou: “Você fez a cagada, você assume, eu não vou lá consertar nada seu”, falei: “beleza. Tá bom, vou lá”. Aí fui para tal reunião: ele, a mãe, a menina, esse meu amigo cedeu a casa, o gerente lá, foi na casa dele, porque eu não podia fazer isso… eu morava com a minha vó, não ia fazer isso na casa da minha vó, fizemos lá, ele saiu de casa, ficou todo mundo na sala e aí contei para ele a história. A mãe era apaixonada por neto, a mãe dela, chorando e tal… e aí, ele virou e falou assim… aí eu contei: “Eu quis casar, ela não quis, depois descobriu que tá grávida e quer casar? Vamos assumir, eu trabalho, mas casar eu não quero casar, não. Acho que agora não faz sentido”, ele virou e falou assim: “Eu prefiro levar a minha filha divorciada do que mãe solteira para minha cidade”, eu entendi o recado, né? Eu falei: “Perfeitamente. O senhor pode marcar o casamento que eu tô casando, agora só não sei quanto tempo vai durar”. Aí, teve festa, na época, telefone valia uma grana. Esse dia da formatura da minha filha, ele jogou isso na minha cara: “Tive que vender o meu telefone”, mas já brincando, né, logico que se passaram 26 anos, é outra…
P/1 – Ele vendeu o telefone para pagar a festa?
R – É. Ele vendeu o telefone para pagar a festa, naquela época, o telefone valia… uma linha valia uma grana, e ele vendeu isso, vendeu mais algumas coisas, que ele quis fazer uma grande festa, porque…
P/1 – Como que foi? Onde que foi?
R – Foi no clube que tem lá do Exercito, um clube tradicional, era na época, em Juiz de Fora. Meus amigos todos foram, me jogaram pra cima, aquelas coisas todas e aí, houve o casamento. Aí esse meu tio, esse mesmo que falou que eu tinha que assumir o que eu tinha feito, tinha a casa da minha vó nos fundos, era dele que tava alugada, que ele morava em Uberaba na época, ele ainda era fiscal lá na Receita, cedeu a casa, falou: “Um ano, você pode morar lá de graça. É o meu presente de casamento”, então nós fomos morar lá, mas não durou um ano o casamento, durou oito meses. Aí separamos, por vários motivos, ciúmes porque como eu estava trabalhando, eu queria fazer outros cursos, porque aí eu precisava crescer, né, porque agora tinha mais duas pessoas, não tinha ninguém, né, tinha mais duas pessoas. Então, eu quis fazer curso, curso de inglês, não sei o que e ela achava que não era certo, ciúmes que eu saía de noite, não sei o que, grávida, né, tal. Aí nasceu, ficamos mais um tempo casados e aí resolvemos separar, porque a gente não tava conseguindo, aí ela levou tudo que ela quis, ela levou. Fizemos lá a separação com pensão, na época, 35% do salário e ia ver a minha filha de vez em quando, já tava em Três Corações, já tinha sido transferido. Então, eu fui ver a minha filha um período e teve uma época que correu um boato que se eu fosse lá, ele ia acabar com a minha raça.
P/1 – O pai dela?
R – É. Aí, eu falei assim: “Não vou arriscar, não conheço ninguém lá”, aí eu fui distanciado e acabei distanciando da minha filha, por questões de trabalho, fui para outra cidade, não sei o que, trabalhando muito, estudando, fazendo faculdade, tal, não dava tempo, aí fui distanciando, aí passei a ver ela uma vez por ano, aí foi crescendo sem a minha presença e tal e aí… aconteceu dela…
P/1 – Crescer longe.
R – Crescer longe, então foi uma grande surpresa para mim… eu acho que Deus vai fazendo o caminho, né, porque aí, ela veio morar em Juiz de Fora, a minha filha, porque aí, ela casou de novo, separou e aí, resolveu voltar para Juiz de Fora e a minha filha veio para Juiz de Fora, onde ela fez a faculdade, tudo e formou agora e me chamou, eu nem tava esperando ela me chamar, a gente conversava, toda vez que eu ia a Juiz de Fora, a gente se via, mas uma relação muito distante, assim, não era aquela relação de pai e filho, tal. E foi uma surpresa para mim na formatura dela, ela me chamar para eu entrar com ela, tanto na igreja quanto na colação, na festa, dançar valsa, dançou comigo, com o avô dela, que na realidade, foi quem a criou esse tempo todo, assim, foi muito bacana a relação, a festa, a confraternização, saímos para jantar, almoçar com o meu ex-sogro, minha ex-sogra, então os ex-amigos todos desse período, mas teve essa distância.
P/1 – Entendi. E qual que é o nome dela?
R – A minha filha chama Rafaela.
P/1 – Ela se formou em quê?
R – Ela fez Fisioterapia, o sonho dela era fazer Medicina, ela tentou uma, duas, foi tentando, aí falou assim: “Não, vou fazer Fisioterapia”, e eu acho que foi a melhor coisa que aconteceu, porque ela fez Fisioterapia, uma excelente fisioterapeuta, já formou, já tá trabalhando no hospital que é um hospital lá em Juiz de Fora que é da mesma faculdade, então os melhores alunos vão trabalhar lá, quer dizer, ela já era monitora no tempo que ela tava fazendo faculdade. Eu falo que foi a melhor… e ela trabalhou em UTI, quer dizer, é quase uma médica, que na enfermagem, ela fica responsável lá por 20 leitos sozinha no final de semana, quer dizer, não é médica, mas uma fisioterapeuta muito competente, não é porque eu sou pai, mas pelo o que eu avalio que lá só vão os melhores alunos para trabalhar lá, tem um processo de seleção rigoroso, ela passou no processo, passaram duas a outra entrou, ela entrou agora, quer dizer, eu acho que ela fez uma escola boa.
P/1 – Sim. E você teve outro casamento depois?
R – Sim, aí em 90 nos separamos, aí namorei depois cinco anos uma outra pessoa e não casamos e aí conheci a Elisabete, deixa eu ver onde eu conheci… na verdade, eu namorei cinco anos e Elisabete também tava saindo de um relacionamento de cinco anos e não sei onde nós nos conhecemos, mas assim, bateu o tipo de vida assim, e acabou que nós nos conhecemos e em um ano, casamos.
P/1 – Onde é que foi o casamento?
R – Em Juiz de Fora, aí foi só no civil, né, porque eu já tinha casado na igreja primeiro. Aí casamos no civil e aí, teve o meu menino que é o Bruno em… ele nasceu 21 de dezembro de 98, foi quando eu fui para Ubá, fui para Ubá trabalhar em agosto, em junho ele nasceu, aí morei em Ubá quatro anos, uma gestão e meia, quase quatro anos e pouquinho, que era para fazer as mudanças dentro da empresa e lá tem uma história interessante que a empresa, como é um plano de saúde, né, então eles estavam passando por uma reforma na sede e eu fui lá para ser gerente geral e tinham três gerentes e eles não podiam saber que eu ia ser o gerente, porque eu tinha que entender, senão eles iam puxar o meu tapete, tal e eu fui trabalhar no porão porque como tava tudo em obra, não ia deslocar ninguém da sua sala pra mim que tava chegando. Aí eu era mais um gerente, na realidade, eu entrei como gerente comercial para conhecer a área comercial, estruturar e depois, ir conhecendo os outros setores. Então, eu fui no porão no meio de obra, tal, tinha só uma mesinha, assim, fiquei lá uns seis meses…
P/1 – Com caixa, essas coisas…
R – é, com caixa, arquivo… até acabar a obra e ter a minha sala, né? Foram seis meses depois, foi onde foi feito o comunicado que eu tava ali e ia ser o gerente geral. Aí comecei a fazer os cursos, né, como era tudo novo, fui fazendo os cursos, tudo e aí fiquei em Ubá, resolvi fazer a outra especialização, que seria um meio de eu fazer relacionamento, já que eu ia ser o gerente geral, precisava conhecer, porque o nosso foco eram as empresas, então precisava ter relacionamento também. Aí fiz o MBA lá em Gestão, da Universidade de Viçosa, parceria com o Sebrae, aí fiquei lá até 2001, porque aí entrou… teve uma eleição, teve uma outra gestão e eles queriam colocar uma outra gerente e aí, ela ficou comigo uns três ou quatro meses…
P/1 – Treinamento.
R – Porque aí eu comecei a passar como que funcionava e tudo, ela já vinha de outra cooperativa, então mais ou menos ela entendia. Aí eu fiquei trabalhando como terceirizado, abri uma empresa para vender os planos que existiam nessa empresa. Aí fiquei lá, mas fiquei dois meses, porque nesse período, uma empresa de Divinópolis me convidou para ser o gerente em Divinópolis, então aí fechei a empresa lá, dei baixa e fui pra Divinópolis, na verdade, não fechei, só… porque na realidade, depois eu precisei dela em Divinópolis, porque surgiu uma outra oportunidade lá. Aí fui para Divinópolis, a minha segunda esposa, ex-esposa, Elisabete também se mudou…
P/1 – Foi para lá com o seu filho?
R – Primeiro, ela ficou em Juiz de Fora, aí fica todo final de semana indo para Juiz de Fora, falei assim: “tem que mudar, senão… não dá”, né?
P/1 – Mas Juiz de Fora a Ubá, Divinópolis é perto, tudo?
R – De Juiz de Fora a Ubá são cento e poucos quilômetros, é perto. Mas de Juiz de Fora a Divinópolis são 330. Aí, a viagem era mais complicada, né? Aí, eu ia todo final de semana, era o tempo de chegar, ver e voltar, né, porque segunda-feira tinha que trabalhar. Às vezes, eu conseguia assim, uma folga na segunda, na sexta, até por causa do cargo, às vezes, conseguia, mas mudou para lá…
P/1 – Aí não tinha mais condições.
R – Não tinha mais condições e ela é muito apegada a família, a mãe dela é uma pessoa fantástica, a dona Wanda, então tem essa afinidade muito próxima, é a filha mais nova, então tem esse probleminha de ir e vir, aí mudou, aí nós mudamos de vez para Divinópolis e aí, eu fiquei de Divinópolis… eu entrei em 2002, março ou fevereiro de 2002, fiquei nessa empresa até 2007. Mas em 2004, aí nós nos separamos, porque ela queria voltar para Juiz de Fora, eu não queria, que na realidade, quando eu estava em Juiz de Fora que eu fui para Ubá, em Ubá, eu recebi um convite para ser gerente geral do sistema em Belo Horizonte…
P/1 – E você já teve que não aceitar…
R – Aí eu não quis ir e aí, nesse meio tempo, veio a proposta de Divinópolis e eu fui para Divinópolis, então quer dizer, Belo Horizonte, teoricamente era mais próximo de Juiz de Fora do que… então, isso já gera um trauma no relacionamento, aí resolvemos separar em 2004. Tava no meio do curso, isso foi um outro… isso para mim foi pesado nessa época, porque eu e o meu filho, a gente tinha um relacionamento muito próximo, diferente do que tinha acontecido com a minha filha que durou pouco, nós nos relacionamos cinco anos e assim, cinco anos intensos, porque ele estudava comigo, a gente fazia os deveres, à noite, eu chegava, ele não dormia se a gente não sentasse para ver um filme juntos, então foi muito traumático para os dois. Eu lembro que a gente se separou em julho e logico que foi consensual, né, e o acordo era que eles iriam… eu sai de casa para eles ficarem, e eles iriam ficar até o final do ano e depois que eu assinei o acordo, no dia seguinte, já pegou as coisas e mudou para Juiz de Fora, quer dizer, já tava o caminhão de mudança lá e foram embora no final de semana. Então, eu ia todo final de semana pra Juiz de Fora. Ia de ônibus, porque aí eu abri mão de tudo, ela levou o carro, porque ia precisar do carro para levar… já tinha feito esse acordo, então eu pegava um ônibus… porque o ônibus de Divinópolis sai às cinco horas da tarde, só tem um horário. Então, eu saía mais cedo na sexta, eu saía cinco horas… minto! Ele na verdade, vem de Uberlândia e para em Divinópolis, passa lá meia-noite, uma hora, chega em juiz de Fora às sete da manhã e de Juiz de Fora para Divinópolis é às cinco horas da tarde. Então, eu ia na sexta, meia-noite, chegava lá sábado de manhã, sete horas, ficava com o meu filho e no domingo, cinco horas da tarde, eu voltava, chegava meia-noite para trabalhar na segunda. Então isso foi todo final de semana e todo dia conversando pelo telefone, então foi assim, foi um período… e nesse meio tempo, eu conheci minha atual esposa, que foi quem segurou essa barra, que eu pensei em suicidar, foi… (emoção/choro) foi um momento… (pausa) pô, o meu filho pegava o telefone (pausa)…
P/1 – Vocês conversavam muito?
R – (emoção/choro) Ele pegava o telefone e falava assim: “Papai vem para cá, tô com saudades de você”, você explicar isso para uma criança de cinco anos é muito difícil. E eu fiquei morando em Divinópolis e foi bem difícil esses seis meses, mas como tudo passa, né? A gente foi se adaptando e aí, eu fiquei todo final de semana indo, para mim não era sacrifício nenhum, pessoal da empresa, às vezes, me liberava sexta-feira, que a gente tinha muitos eventos final de semana e que precisava da minha participação, então, isso em parte foi prejudicando até o meu trabalho também, mas era compreensível, eles entendiam isso. E era interessante que eu ia para Juiz de Fora e ficava na casa dela, porque ela saía de casa, ia para casa da mãe e ficava eu e ele dentro da casa, uma situação estranha para alguém de fora olhar, né? Apesar de eu estar muito magoado com ela porque não foi o que a gente tinha combinado, mas ela também não tinha culpa, era a forma que ela… ela era muito ligada a mãe dela, acho que faltou coragem dela falar: “Eu quero ir embora”, que a gente tinha combinado dela ficar mais seis meses, ele estava estudando”, aí conseguiu colégio lá de última hora e tal, mas enfim, isso já aconteceu. Mas o mais importante foi isso que nesse período que se eu não tivesse conhecido a Iara, eu acho que não tinha… eu pensei mesmo em me suicidar, mas como a nossa fé é maior, te faz: “Isso não é o caminho”, se a gente tem que sofrer, a gente tem que sofrer aqui, não adianta a gente encurtar esse sofrimento, a gente acredita muito nisso, não existe esse encurtamento de sofrimento, se tiver, tem que ser aqui. Então, foram seis meses difíceis, mas passaram, eu sabia que ia passar, não sabia quanto tempo ia durar. Nos seis meses, fui todo final de semana, aí depois veio as ferias e aí, eu fui, passei com ele, ficamos 30 dias lá no final do ano. Só que era… toda despedida era ruim, porque ele não entendia porque eu tava indo embora, porquê que eu não podia ficar, porquê que eu não podia mudar para Juiz de Fora.
P/1 – Quantos anos ele tinha?
R – Tinha seis anos. Então, não entendia.
P/1 – Difícil explicar, né?
R – É difícil explicar. Mas aí passou, aí no outro ano, comecei a ir uma semana sim e a outra, não. Aí já não ia mais de ônibus, consegui comprar o carro de novo, aí já ia de carro, já era mais fácil, né? Apesar de ser 330 quilômetros, mas aí já era mais fácil de ir e de voltar, porque chegava lá, eu dependia do carro da mãe dela, porque o carro que eu deixei lá ela já usava para outras coisas, ela saía também, mas a mãe dela tinha carro, então me emprestava, então quer dizer, esse relacionamento sempre foi bom, então… nunca teve esse problema.
P/1 – E como é que ele tá hoje?
R – Hoje ele tá… um cara super inteligente, estudioso. A gente hoje, com internet, se fala quase todos os dias, né? Continuei sempre nas datas comemorativas estar presente. Natal, ou ele passava comigo ou passava com a mãe dele, a gente sempre revezou, isso sempre foi bom. Dia dos pais a gente sempre passa junto, durante essa viagem nossa, foi uma das coisas que a gente não abriu mão e ao mesmo tempo, foi uma coisa que comeu o nosso dinheiro, né, literalmente, porque no dia dos pais, eu sempre volto para ver os meus filhos, a Iara sempre volta para ver os pais dela, dia das mães também e Natal também. Então, Natal, onde a gente tá, a gente chega numa sexta, sai numa segunda, mas a gente faz questão de três dias… nós já viajamos o dia inteiro para chegar lá, ficar um dia e voltar no outro dia, a gente acha isso importante. Isso pra gente é importante. Pode ser que as pessoas que receberam isso nunca deram valor, mas pra gente isso é importante. Isso é que fortaleceu a gente, apesar da partida ser sempre doída, mas isso pra gente era importante. A gente achava que… que a gente acredita muito que a gente tem que estar junto enquanto tá quente, porque depois quando estiver frio, não adianta você ir lá e ver a pessoa. Então, a gente fazia questão de nos sacrificar. Então, enquanto a gente pode sacrificar, nós sacrificamos. Hoje, às vezes, a gente volta porque eles fazem uma vaquinha e tal, porque agora já ficou outra situação, né?
P/1 – E ele gosta de fazer o quê?
R – A gente… nesses seis anos, a gente brincava muito dentro de casa, os brinquedos quebravam, a gente reformava eles, assistia muito vídeo, ele tinha uma prateleira lá com um monte de fitinha cassete, hoje é DVD, né? Tem até hoje guardado na casa dele, as fitinhas dos desenhos que ele gostava Toy Story, todos lá. Eu gravava, costumava gravar em Divinópolis, às vezes, algum filme que passava na televisão “Homem Aranha”, essas coisas, gravava para quando eu fosse, a gente assistia… então tem muita… ele quer ser cineasta, não é o que a mãe dele quer, mas é o que ele quer. Já falei com ele, se ele quiser, eu tio dentro com ele, vou morar com ele no Rio quando ele quiser fazer faculdade, tá com 16, daqui uns três anos, porque ele gosta muito de cinema. Gosta, assiste todos os filmes, né? Então, acho que ele levaria jeito para isso, que ele gosta disso. Mas ele estuda muito, tá estudando. Esse período agora é um período de muita prova, muito estudo, mas ele é um cara nota dez, assim, eu acho que ele tem uma cabeça muito boa pelo o que nós passamos, sabe assim? Eu acho que para ele foi traumático, bem traumático, porque eu senti na pele o quê que é, né? Então, pode ser que isso hoje nem faça muito sentido para ele, mas nós vivemos isso juntos.
P/2 – Eu ia te perguntar, muito bonita sua história, mas assim, a gente tá com quase duas horas de entrevista…
R – Ainda não começou… vamos lá…
P/1 – Como é que você conheceu a sua atual esposa?
R – Então, a história minha e da Iara foi uma história bem interessante porque ela vinha de um relacionamento muito difícil de namoro, um namoro quase casamento, e eu tava há dois anos no meu relacionamento, terminando assim: termina, não termina, porque como eu era muito apaixonado pelo meu filho, a minha esposa sempre usava isso pra gente continuar: “Se você se separar de mim, você não vai ver seu filho”, eu já tinha vivido isso com a minha filha: “Se vier aqui, eu te mato”, eu tinha perdido, já tinha tido essa vivencia, pensei: ‘vou viver isso de novo?’, e com a minha filha eu vivi dois, três meses, quer dizer, um bebê e com ele eu já tinha vivido cinco, né? Três mais dois, cinco, quer dizer, entrou no sexto ano, era muito mais difícil e a gente vê esses tipos de casamento, às vezes, fica casado em função de um filho, tal. Só que chegamos no limite e esse limite, eu trabalhava numa empresa e a Iara trabalhava em outra e por uma coincidência da vida, ela tinha vivido várias coisas, tinha quebrada e tal e tava ajudando a sogra dela a resolver um problema na empresa em que eu trabalhava. E teve uma reunião nesse dia, onde estava o meu chefe, meu superintendente, e ele me chamou para essa reunião. Essa reunião seria com ele e com a ex-sogra dela, que essa ex-sogra, depois, me adotou como filho, apesar de eu ter ficado com a namorada do filho dele, veja como que são as coisas, loucas. Ela foi para reunião, resolveu levar ela para entender o quê que tava acontecendo, porque ela era muito idosa e estava querendo sair e deixar ela administrando, porque ela tava com um monte de doença e tal. E aí, ele me chamou para essa reunião, porque eu era o gerente comercial e era uma empresa, então comercial… e aí, sentamos na reunião, nós quatro e naquele momento, deu um frio na barriga, perna tremeu, só de ver e ela teve esse mesmo sentimento também. Então ali, falei: “Opa, aconteceu alguma coisa diferente”. E aí, nesse meio tempo, separei e tal e nós ficamos ainda uns seis meses só nesse flerte de conversar, reunião e tal e sempre com essa sensação, sempre que ia dava um frio na barriga, a perna tremia… ficou esse tempo, uns seis meses, tanto que eu já tinha separado e ela tava separando do namorado. E essa ex-sogra dela tinha percebido isso e ela vinha conversar comigo sobre o filho dela que namorava, um negócio muito louco, assim, que ela achava que tinha tudo a ver e tal… e aí, um belo dia, não sei dizer quando, precisamente, ela resolveu a situação dela e aconteceu da gente ficar junto e decidimos que íamos ficar junto mesmo, que a gente se merecia por tudo que a gente já tinha passado, né, nesse meio tempo como amigos, a gente já conversava sobre o que eu tinha vivido, o que ela tinha vivido, éramos amigos mesmo, porque a gente não podia ter nenhum relacionamento porque ela ainda estava… e eu tava na rotina de ir ver o meu filho, né, então não fica final de semana, só dia de semana conversava nas reuniões e aí, ela resolveu… contou um pouquinho da história dela, me apaixonei e ela resolveu a situação e no dia 28 de outubro de 2004, teve o aniversario dela, eu fui convidado e esse dia eu brinquei lá com… nem conhecia os pais dela, falei assim: “O próximo aniversario dela, nós não vamos estar namorando, a gente vai estar casado”, aí todo mundo riu com a brincadeira, tal. Aí começamos a namorar, ela contou o sonho dela, que ela tinha um sonho de dar uma volta ao mundo e ter 50 filhos. Não sei de onde ela tirou isso, eu achei que era brincadeira, falei assim: “Essa mulher tá querendo me testar". Eu tô dentro”, e a partir dali, nós começamos a… ficamos junto, em um ano, nós casamos, aí foi uma história interessante porque a gente queria… como nós não somos católicos, apesar da minha família toda e da família dela também ser toda católica, a gente queria fazer os nossos votos na beira do mar, tal e escolhemos Maceió e convidamos todo mundo: “Nós vamos casar lá em Maceió, vocês vão pra lá e tal”, e ninguém acreditou, nós fomos, casamos só nós dois e tal, tiramos fotos, mandamos para todo mundo, foi no réveillon de 2004 para 2005 e aí tem uma outra história interessante que não vai dar tempo de contar, vou resumir. A gente tinha reservado um hotel e esse hotel, o quarto era quarto de fundos, que era pacote, e aí, por uma coisa do destino, lotou e aí, a menina errou e botou a gente num de frente para o mar. Só para você ter uma ideia, então quer dizer, foi um negócio magico, chegamos esperando ficar no quarto de fundos, ficamos de frente para o mar, então foi muito bacana, fizemos nossos votos, voltamos casados, começamos a morar juntos e aí, fomos vivendo e ela assim, ela apareceu nesse momento difícil na minha vida que foi… não digo, a perda do meu filho, mas a separação desse laço e ela foi me dando vários conselhos e era uma forma de continuar, saber que tinha alguém apesar da gente não ter ficado junto ainda, mas de estar nascendo aquele friozinho na barriga, perna tremendo e tal e fomos vivendo a nossa vida, ela trabalhando, eu trabalhando só com essa ideia, né, vamos ter 50 filhos, quando vai ser? Quando vai ser? Dar a volta ao mundo, como vamos fazer? Tem que trabalhar, tem que juntar dinheiro, não sei o que, como que vai fazer e aí, um dia, a gente indo para a roça do pai dela, em 2008, mais ou menos, a família dela é muito festeira, faz festa para qualquer coisa, se quebrar uma unha do pé, tá fazendo festa, eles são muito animados e eles me adotaram como um membro da família, porque eu não conhecia ninguém, né? A família deles é grande, uma festinha, 60 pessoas e aí, eles me acolheram com muito carinho, os tios dela me chamando de sobrinho, sabe? O pai dela e a mãe dela também. Os irmãos, todo mundo. Então assim, me senti em casa. E em 2008, indo para roça, ela teve um insight, a gente até brinca que lá em Minas, a gente chama de clarão. Teve um clarão, assim, uma viagem não é para conhecer lugares, não é uma viagem para conhecer o mundo, paisagens, é uma viagem para conhecer pessoas, pessoas que fazem algum trabalho social de fazer uma transformação porque vocês precisam disso para poder criar 50 filhos, como que vocês vão criar 50 filhos do jeito que vocês vivem, com esse mundo materialista e tal… pronto! Ela teve essa ideia, falou, continuamos, chegamos na roça lá do meu sogro, continuamos para a festa, não contamos para ninguém, aí falamos: “Tá, como vamos fazer isso? Primeiro, não podemos contar para ninguém, porque na hora que você falar que você vai ter 50 filhos, vão te chamar de doida. Quando você falar que você quer dar uma volta ao mundo, vão te internar, então vamos guardar isso só para a gente, vamos tentar planejar isso”.
P/1 – Isso em 2008?
R – É, isso em 2008. E esquecemos, a gente ia trabalhando, tal, tal… aí quando chegou no meio de 2010, não sei se foi julho, em algum momento em 2010 é que caiu a ficha, porque lá quando ela teve esse insight, veio também: ‘quando você tiver 30 anos, e como você vai fazer uma viagem de cinco anos pelo mundo, quando você voltar você vai estar com 35. Então dos 35 aos 40, dá para você ter três filhos biológicos, de preferencia, trigêmeos. Tem dois com o Eduardo, tenho cinco, adoto 45, 50, fechou a conta’, foi isso que ela pensou lá, indo pra roça. E aí, chegou e no meio do ano, falou: “Janeiro tá aí, o que você vai fazer? São os 30 anos, temos que sair, como é que nós vamos fazer?”, aí: “Vamos vender o que a gente tem e vamos sair com o que a gente tem”, aí, doamos as roupas, os moveis, botamos o apartamento para vender, a gente tinha dois carros, vendemos um, pegamos a Ecosport que a gente tinha, botamos mala dentro que sobrou e aí, fizemos uma festa, porque 2010, a gente estaria fazendo cinco anos daquele casamento lá em Maceió, que nós fizemos o nosso casamento, mas isso era uma coisa que incomodava a família, porque foi só votos e eles são católicos e tal e eu não queria cancelar o meu casamento, que achei que isso é traumático com a minha ex-esposa. Falei: “Vamos fazer uma festa no civil, porque aí dá o presente para a sua mãe que…”, aí resolvemos fazer uma festa no réveillon, aí tem uma história bem interessante, porque nós fomos no Juiz de Paz e ele não faz casamento no réveillon, dia 31 de dezembro, são três datas, acho que semana santa e carnaval e réveillon não fazem casamento no civil, isso é uma regra, ele falou: “Não posso fazer”, e ela contou a história para ele, falou assim: “Nós só estamos fazendo isso por causa da minha mãe, que para gente assinar papel não faz sentido nenhum, então você dorme com isso aí que vai ser um problema seu, não é problema meu mais, a única data que nós temos é 31 de dezembro que nós vamos sair em janeiro, não tem outro jeito. Nós estamos fazendo uma viagem, tal;”, aí eu acho que o Juiz ficou doido com isso, passou meia hora, ele ligou e falou assim: “Tudo bem, eu vou fazer, vou abrir uma exceção, mas vou começar o casamento às cinco horas, não atrasa, seis horas eu vou terminar porque eu tenho que passar o réveillon com a minha família em belo Horizonte, ok? Tá fechado?” ”Tá fechado”. Como a gente já não recebia presentes nos nossos aniversários, o casamento não foi diferente, nós pedimos cestas básicas, porque a gente tinha ideia de começar no Vale do Jequitinhonha entregando essas cestas básicas do casamento, janeiro e aí, começar o projeto. E aí, o casamento foi lindo, maravilhoso, todo mundo de branco no sitio, esse Juiz que queria… que já faleceu, que queria fazer em uma hora, uma hora e meia, foi sair do casamento às onze horas da noite, para você ter uma ideia. E o casamento foi sexta, sábado e domingo, porque foi o casamento, depois teve o réveillon, e sábado e domingo foi num sitio, então foi onde nós fomos dar a noticia para as pessoas: “Nós estamos indo” “Vocês estão bêbados, vocês não vaio fazer nada disso”, e aí na semana nós saímos e aí, um amigo nosso, por coincidência, estava indo com um caminhão para o Vale do Jequitinhonha, botamos as cestas no caminhão de tecidos dele, ele levou, tiramos uma nota na segunda-feira, ele levou e nós fomos com a Ecosport e encontramos lá e fizemos a distribuição das cestas, foram 200 famílias que nós distribuímos. E aí, aconteceu uma coisa mágica no inicio da expedição que foi essa convivência com a miséria que a gente não conhecia… conhecia de noticias, mas não conhecia vivenciando e lá, nós vivenciamos isso, nessas 200 famílias, crianças tomando conta de criança, estupro familiar, o tio, o primo, que é uma coisa cultural da região, convivemos com uma coisa que mexeu muito com a gente. E aí, vínhamos descendo, nessa descida, a gente foi começar o projeto em Diamantina, saímos do Vale do Jequitinhonha, nesse trajeto, a Iara começou a passar mal, passar mal e aí, paramos numa cidade para tomar água, que a gente não tinha estrutura na época, era um carro cheio de malas e aí, paramos lá e aí falamos: “já que estamos aqui, vamos começar por aqui. Aí, ela fez a pergunta para o atendente: “E aí, quem que é um bom exemplo aqui?, aí a pessoa: “O quê que é isso, bom exemplo?” “Alguém que faz um bom trabalho, que transformou a comunidade, pode ser uma pessoa, uma ONG”, e aí, foi o nosso primeiro bom exemplo registrado que foi o Tião Rocha, que hoje é um grande incentivados, um grande amigo, quando a gente tem alguma dificuldade, a gente liga e aí, tivemos a certeza de que era isso que a gente tinha que fazer. A gente queria desistir lá no vale do Jequitinhonha, quando visitamos as famílias. Na hora que nós chegamos ali: ‘não, esse é o caminho’.
P/1 – Isso só com uma ação…
R – Com uma ação assistencialista, que a gente não sabia o que fazer, porque na realidade, o quê que aconteceu? Quando teve a ideia, nós falamos: “Tá, mas o quê que nós vamos fazer? Nós não sabemos”, sem saber o que fazer e como fazer, falamos: “Vamos vender tudo, já que a gente tem que se encher de coisas boas, a gente tem que tirar tudo, então tirar tudo é vender tudo e viver com o que a gente tiver, que é o carro e vamos vivendo com isso” “Onde nós vamos? Nós sabíamos que a gente ia começar em Minas, em Diamantina, rodar o Brasil inteiro e terminar no Chuí, mas qual cidade que a gente ia fazer? Sabia que ia começar em Diamantina. Em Diamantina, íamos perguntar: “Quem é um bom exemplo?” “Fulano de tal de tal cidade”, e assim, íamos fazendo o roteiro. Só que nesse caminho, teve Araçuaí, que ela passou mal, então na realidade, não começou em Diamantina, começou em Araçuaí e depois, nós fomos chegando até Diamantina.
P/1 – E como é que veio essa ideia de perguntar quem é um bom exemplo?
R – Em Minas, a gente não procura as coisas. A gente caça, então: “Tô caçando o meu óculos, tô caçando a minha calca, que eu perdi”, então a ideia era essa: buscar pessoas que estão fazendo alguma ação social. Então, primeira coisa, chegar e perguntar. Então, a gente chega na cidade e pergunta: “Quem é um bom exemplo?” “Não sei, não tem isso aqui”, aí a gente tenta, se a pessoa não lembrar, a gente vai para outro lugar, num posto de combustível, numa padaria, no supermercado, a gente vai perguntando e sempre aparece.
P/1 – E por quê que vocês acham que é importante fazer isso?
R – Na realidade, um dos objetivos é esse, né, é porque a mídia hoje tá focada… há muito tempo, né, não só hoje, em divulgar coisas ruins e a gente não acreditava que essa é a realidade do mundo, a gente acha que existe alguma… não vou chamar de conspiração do mal, mas existe algum movimento que a gente tem que quebrar essa corrente, porque existem muito mais coisas boas. Nós somos provas disso, nós rodamos o Brasil inteiro, conhecemos mil, 150 projetos, não demos conta de conhecer mais, tem muita indicação nossa em redes sociais que a gente não dá conta, por isso, até nós criamos o mapa, né, que a pessoa consegue ir lá e colocar essa boa ação. A gente acha que isso pode transformar o mundo, isso pode mudar o mundo, que se o jovem de hoje tiver acesso também às informações boas, às informações do bem, a gente acredita que isso pode mudar gerações. A gente não vai conseguir mudar… o Tião Rocha fala isso, o trabalho dele que ele já faz há mais de 30 anos, até hoje ele fala isso: “O meu trabalho não é para um, dois anos, o meu trabalho é para 50 anos. A gente tem que mudar a cabeça das pessoas que estão aqui”, porque quem tá maduro ou idoso, vai mudar, mas vai terminar muito rápido. Esse jovem ainda tem uma longa caminhada, a gente tem que dar essa oportunidade, a gente vivenciou muito isso. Às vezes, existe um problema numa comunidade e às vezes, a gente quer criticar aquele jovem, ou aquela pessoa, mas você não conhece a história dela. Ele só tá fazendo aquilo porque o pai dele fez, o avio fez, o tataravô fez. Ele vai replicar isso. Ninguém mostrou outro caminho para ele ou mostrou o que existe, nós não somos contra os ídolos que existem hoje: Neymar, Robinho, Raí, mas nós temos outros ídolos: aquela professora que tá fazendo um trabalho legal, o pessoal que tá fazendo um trabalho cultural aqui, olha, existe coisa boa. Como que você vai criticar uma pessoa, nós fomos na Rocinha, uma pessoa que tá lá há 30 anos, nunca desceu no asfalto? Ela só conhece aquilo ali, ou conhece aquilo que tá na televisão, ouve falando que lá fora só tem matança e não sei o que… nós tivemos, por exemplo, na Rocinha na época da pacificação, as TVs estavam todas mostrando um monte de coisa, minha sogra ligou no dia: “Vocês por favor, não vão na Rocinha”, a gente tava na Rocinha. A gente tava num lugar que não tinha nada daquilo que eles estavam mostrando. Lá são 70 mil habitantes, eles estavam mostrando um pedacinho desse tamanho, mas um pedacinho desse tamanho numa proporção de uma mídia desse tamanho. A grande maioria lá não estava mostrando. Então, a gente tá pegando; a mídia hoje tá pegando uma coisa desse tamanhozinho e fazendo crescer.
P/1 – Generalizando, né?
R – Generalizando. Nós tivemos uma vivência com um jornalista uma vez, ele falou o seguinte: “O poder tá nas nossas mãos, quem tá com o controle somos nós”, e ele contou uma época em que a mídia, a TV fala só falando de uma facção, falando nome: “Comando…”, aí uma pessoa ligou, porque eles têm um canal de atendimento ao publico, um 0800, e falaram: “Ninguém aqui conhecia essa facção que vocês estão falando, vocês estão fazendo propaganda do mal”. E eu não sei se vocês perceberam de uma época pra cá, não se fala mais nomes, fala: “Facção…”, mas não fala: “Comando Vermelho…”, não fala mais isso, por causa de um telespectador que ligou e abriu os olhos dele, então a gente tá com esse poder. Tá, mas isso é um negocinho desse tamanho. Tá, mas se todo mundo fizer um negocinho desse tamanhozinho, a gente muda e a gente acredita que esses bons exemplos que nós identificamos, que qualquer um pode identificar, isso vai transformar o mundo, porque quando a gente senta numa rodinha, a gente não fala de coisa boa. Nós fomos fazer uma palestra um dia desses em Uberlândia, aí o pessoal saiu para jantar com a gente. O assunto foi muito bom, ficamos só conversando de coisa boa. Um contou um caso, o outro contou outro, sem ser coisa triste não: “Que eu fui lá no hospital de câncer, ver aquele menino, sai de lá…”, não, o assunto não precisa ser a doença, pode ser a história de vida: “Aquela mãe, que superação, empenho, teve aquela criança, conseguiu superar, hoje tá fazendo mais pelos outros, ajudando”. Eu acho que a gente tem que mudar um pouco o olhar e eu acho que isso é uma sementinha que a gente tá plantando, que a gente sabe que caçadores de bons exemplos não pode ser só um casal, caçadores são todos nós. Todos nós somos caçadores, precisa ver se a gente quer caçar bons exemplos ou mal exemplos.
P/1 – Você acha que isso aproxima as pessoas delas mesmas, mas também de projetos que às vezes, estão na própria cidade?
R – Sim. A gente identificou muito isso. Às vezes, chegávamos em um lugar e a pessoa não conhecia o projeto do lado da sua casa. Eu lembro quando a gente tava em Minas, na época, a gente fazia backup e botava… gravava em CDs e mandava para nossa cidade, a gente tava em Araxá e eu fui no Correios para colocar uns CDs para casa da minha sogra guardar e aí, chegando no Correios, a menina perguntou: “O quê que é isso Caçadores de Bons Exemplos?”, aí expliquei para ela, ela falou: “Mas aqui não tem isso, não”, acabei de falar: “Acabamos de visitar a duas quadras aqui do Correios, chama Hospital de Brinquedos” “É mesmo?”, aí expliquei: “Então vou levar uns brinquedos, lá e tal”, que eles reformam os brinquedos. Estava a duas quadras e uma pessoa que teoricamente, não é nenhuma pessoa mal informada, né, tá trabalhando e tal. Só que no dia a dia ali, você não consegue identificar, porque não é o foco, né, você chega em casa, vai ligar a televisão, do noticias ruins, passa para outro cana, também. Então…
PAUSA
P/1 – Estava falando de Araxá, né, do hospital de brinquedos.
R – Então, isso aconteceu lá em Araxá, mas aconteceu em vários lugares. A gente está num lugar… aconteceu isso no Rio Grande do Sul. Quando nós postamos… que a gente sempre posta nas redes sociais, né, a nossa foto na divisa: “Chegamos no Rio Grande do Sul”, aí uma pessoa escreveu no facebook, escreveu nas redes sociais: “Bah…”, que é o que eles falam muito lá, “…precisaram vir de tão longe para me mostrar um projeto pertinho de mim”, quer dizer, a pessoa não conhecia e de repente, começa a postar, as pessoas vão… então falam: “Tá aqui pertinho, vou começar a ajudar”, só que nós somos pequenos, então se mais pessoas fizerem isso, se mais coisas forem acontecendo nesse sentido, a gente acha que consegue mudar. Agente tinha uma resistência em aparecer, nós ficamos dois anos e meio sem dar entrevistas televisivas, porque a gente achava que quem deviam aparecer eram os bons exemplos e não nós. Nós sempre pensamos dessa forma, porque se a gente estava em busca desses tesouros, eles sim que tinham que aparecer. Nós só estamos caçando para alguém divulgar. Essa sempre foi… sempre que nos procuravam, nós sempre falávamos assim: “Nós temos lá no site 300…”, a primeira vez que nos procuraram, tinham 300, outra 500. “Tem 500, divulga eles”, então na terceira vez que por exemplo, o Fantástico nos procurou, a gente tinha 700 projetos, daí nós falamos a mesma coisa que tínhamos falado as outras duas vezes, que era o Fantástico também e a gente não sabia, só ficamos sabendo nessa terceira vez que as outras duas vezes eram eles, também. E aí, a produtora falou: “Espera aí, vocês querem divulgar essas ações, não é isso?” “É” “Vocês querem que isso chegue ao maior numero de pessoas possível, não é?” “É” “Muito obrigado, vocês me deram as 700, está tudo no site, com contatos e tudo, mas eu não consigo contar 700 histórias…”.
P/1 – Na TV.
R – “Na TV. Eu vou contar uma, duas no máximo, três. Porque são várias pessoas elegendo matérias para serem divulgadas num horário como esse. Agora se eu contar a história de vocês, eu tio contando 700 histórias, porque as pessoas vão entrar no site de vocês, vão entrar nas redes sociais e vão conhecer. Então, eu tenho que contar a história de vocês”. Então, ela quebrou a nossa argumentação e nós percebemos que realmente, é isso. Hoje, nós somos instrumentos para que os projetos apareçam. Então depois disso, nós relaxamos. Aí foi mídia em quase todos os lugares, depois nos procuraram de novo, agora no final do ano, para fechar, porque a partir dali, nós criamos um elo de confiança e aí, a gente mandava projetos: “Isso aqui tem tudo a ver, por quê vocês não fazem?”, eles conseguiram fazer alguns projetos lá e aí, final do ano, eles resolveram fazer um programa diferente. Aí, nós mandamos algumas indicações, só que aí no dia, a gente tava chegando no Chuí e aí, a produtora ligou, a Iara tava pilhada, falou assim: “Nós estamos no Chuí, pô, conhecemos cada projeto, maravilha…”, aí ela falou: “Opa, para tudo! Não são os projetos que vocês nos enviaram, vamos ter que contar a história de vocês de novo, porque aí, faz o fechamento da história de vocês, daí a gente pincela alguma outra historia”, foi quando nós viemos filmar aqui em São Paulo, Monte Azul. Então quer dizer, novamente, fez a corrente do bem. A gente acredita que isso é a corrente do bem e as coisas são muito natural, né, como a gente estava conversando mais cedo. As coisas foram acontecendo assim, a gente não queria dar entrevista, aí chegou o momento que deu. Aí foi um monte de entrevistas, um determinado momento do nosso projeto, acabou o dinheiro, que foi em 2013. Aí, resolvemos financiar o nosso carro durante 12 meses. Financiamos ele no ano de 2013, que a gente vendeu o carro em dezembro de 2013 e começamos 2014 de mochila. Aí acontece a coisa mágica que é a reportagem em setembro. Aí, a gente já tava com o carro financiado, ia perder o carro, mas a reportagem não sabia. A reportagem só falou que a gente ia vender o carro para continuar de mochila, só. Nós não falamos que o carro tava financiado. E aí, de repente, sai a matéria, muita gente entra nas redes sociais, quer nos ajudar, quer mandar dinheiro e a gente fala assim: “Que beleza! Uma divida, um monte de gente, vamos pagar a divida, né, e viver”, e aí, a gente resolve tomar uma outra decisão, de não aceitar essa doação, que quem quisesse doar dinheiro para gente, procurasse um projeto perto da sua casa, quer dizer, ele ia ter que conhecer alguma coisa perto da sua casa e ajudar esse projeto lá. E aí, foi uma briga: “não, mas eu quero doar para vocês” “Tá, o dinheiro é nosso, só que você vai levar pra gente para um projeto perto da sua casa”, daí deu outro rebuliço e aí foi onde surgiu a reportagem lá no Caldeirão que eles ficaram sabendo que a gente não tinha patrocínio, não tinha apoio, queriam nos ajudar: “Nós temos um programa aqui que chama ‘Agora ou Nunca’, vocês participam, vocês têm que vir aqui dia 28 de outubro e vale 30 mil reais”, dia 28 de outubro é o dia do aniversário da minha esposa, da Iara e 30 mil, a gente devia 36 mil. Aí que nós contamos que a gente tinha uma divida, aí eles ficaram doidos e tal. E aí, aconteceu, naturalmente, de ir no programa, ganhar o quadro e eles ainda nos deram um caminhãozinho que nós pudemos vender ele para gerar recursos para 2014. Aí estamos vivendo até hoje.
P/1 – Com isso?
R – Com isso.
P/2 – E 2015?
R – E aí, nós arrumamos um outro problema para 2015, que a gente ia… nós terminamos a; que na realidade, o projeto era cinco anos em uma viagem pelo mundo, a gente ia fazer dois anos no Brasil e três anos fora. E aí, nós fomos ficando no Brasil, fomos ficando no Brasil, porque como você não tem patrocínio, não tem apoio, você vai do jeito que… vai indo, vai indo… e aí, terminamos 31 de dezembro, a ideia era 2015, a gente ir para o exterior, ficar um ano lá, vender o carro para gerar recursos pra gente ir e ir de mochila um ano, 49 países em todos os continentes. Isso seria para esse ano de 2015. Só que aí surgiu uma outra oportunidade, como teve esse programa no final do ano, nós tínhamos que fazer um resumo pra emissora do que nós vivemos nos quatro anos. E aí, esse resumo deu 40 páginas. Aí uma editora nos procurou para escrever um livro. Já tinha nos procurado em 2013, nós falamos: “Não”, porque a gente queria fazer um livro com todos os projetos para distribuição gratuita em todas as escolas. E aí, ela falou: “Isso é inviável, sabe quantas escolas tem no Brasil? Quase 200 mil, como é que vou fazer um livro para distribuir gratuitamente para distribuir?”. Aí, lá não aconteceu. Aí agora, ela veio com a argumentação que quebrou a nossa, igual na emissora: “Espera aí, vamos fazer um livro contando a história de vocês porque pode gerar uma repercussão e aí, quem sabe vocês atingem esse objetivo, aparece um patrocinador para fazer um livro para as escolas públicas? Nós vamos começar aqui, fazer um livro, vamos vender e vamos fazer uma parceria: abrimos mão do nosso direito autoral e esse dinheiro, a editora vai tentar junto internamente, para que cada livro vendido, um livro vai ser doado para uma escola”. Então, primeiro passo: cada livro vendido vai para uma biblioteca. Então, são cinco mil poucos municípios, então cinco mil livros. Vender cinco mil, para eles mandarem cinco mil para lá e aí depois, vai fazendo gradativamente. Então aí, nós deixamos de viajar pro exterior para fazer esse livro, vai ser lançado agora em Agosto e surgiu nesse momento, a gente fazer 50 mini documentários, porque nós percebemos que quando passou a reportagem em setembro de 2013, ninguém entendia o nosso projeto. A nossa família, ninguém entendia, até hoje tem gente que não entende, mas quando viu a reportagem sentiu o quê que a gente sente, o audiovisual tem esse poder. Então, surgiu a ideia da gente fazer 50 mini documentários pra gente divulgar nas redes sociais, quem quiser divulgar na sua rede, divulgar, TV, onde quiser divulgar… porque aí vai dar luz aos 1150, pessoa vai querer entrar no site, então quer dizer, por que 50, também? Não me fala, a gente tem alguma coisa com 50, né? Cinco anos, 50 filhos, tudo de bom acontece pra gente no dia 28. Tudo! Muita coisa no dia 28 é magico! Isso sempre foi na vida dela, na minha veio depois, mas na dela, tudo o que ela conseguiu… e ela é do dia 28 de outubro, então nasceu no dia 28 e geralmente, no dia 28 de outubro, você vê, nós fomos no “Caldeirão do Huck” no dia 28 de outubro.
P/1 – No aniversário…
R – No aniversário dela. Foi no ar em novembro, mas a gravação foi dia 28. Então, nós resolvemos fazer esses 50, tentar distribuir isso para o máximo de pessoas possível, aí já surgiu uma parceria com uma emissora que quer 15, só que a gente tem que entregar, gratuitamente. Eles cederam o espaço, então a gente vai entregar dez minutos de gravação e eles vão editar para dois, três. E aí, nós conseguimos uma produtora que vai cortar sem custo. Então, a gente vai ter os vídeos cortados, aí a gente precisa de alguém para editar para gente colocar no nosso canal.
P/1 – Onde é que vocês foram até hoje no Brasil?
R – Nós rodamos todos os estados brasileiros, mais o Distrito Federal, foram 220 mil quilômetros rodados.
P/1 – Com a Ecosport?
R – Não. Aí, nós começamos com a Ecosport e aí, nós depois, passamos para uma Hilux de cabine que é onde a barraca ficava, na cabine, mas ainda assim, a gente continuava com as malas que nós não conseguimos fazer armários na cabine, então quer dizer, era mala e lona, então tinha que tirar a lona, puxar a mala. Então, isso também foi complicado e aí, em 2012, eu acho que foi 2012, iniciozinho de 2012, nós conseguimos essa SW4 2008, carro de… esses presentes assim, o cara tava vendendo pela internet, nós descobrimos ele pela internet, uma história muito bonita essa. O cara esperou a gente vender o carro para pagar ele do outro, ficou com o recibo até conseguir pagar e aí, nesse carro, nós conseguimos arrancar os bancos traseiros, fizemos um armário de roupa, aí passamos a barraca para cima e fizemos a geladeira e gavetões com as panelas elétricas. Então é um carro que só tem dois lugares e atrás, tudo que tava nos outros carros deu para acomodar. E as coisas aconteceram muito naturalmente. Foi uma Ecosport, porque a gente só tinha ele, tinha que sair com um, na estrada, nós vimos que… a Ecosport nós trocamos com dois meses. Aí um amigo nosso que vendia carro, arrumou um carro pra gente, trocou. Aí nós só fomos em Minas, um amigo nosso plotou o carro, já plotou, botou a barraca, já saímos para viagem. Aí depois, procurando carro, entre os amigos, estávamos procurando carro por causa desse negócio da lona, era difícil demais, abrir lona, puxar mala e aí, apareceu esse carro de Belo Horizonte, quer dizer, a gente tava na Bahia, apareceu um carro em Belo Horizonte, voltamos da Bahia em um dia, nosso amigo já estava esperando para plotar, já desplotou um, já plotou o outro, já deixou para vender, já voltou com o carro para Bahia, o cara ficou com o recibo, depois que nós pagamos, ele mandou o recibo, quer dizer, foi tudo…
P/1 – Correria, né?
R – Correria. E tudo mágico, o cara tinha três carros na garagem, aquele tava parado lá, nós pegamos o carro com dez mil rodados, carro novo, cheiro de novo, até com plástico. Então, são as coisas que vão acontecendo assim, muito naturalmente, sabe?
P/1 – Como é que é o cotidiano da viagem?
R – É…
P/1 – Quem dirige?
R – Imprevisível. A maioria… a Iara dirige, né, em alguns momentos, mas a maioria sou eu, porque ela tem uma habilidade que eu não tenho que é de ir trabalhando no carona ali, tirar foto em movimento, eu não consigo… ler alguma coisa, eu não consigo ler andando com o carro. Então, a maioria, eu tô dirigindo, e ela trabalhando ali, fazendo alguma coisa, adiantando, respondendo e-mail quando dá, tentando fazer algum planejamento.
P/1 – E vocês têm que cozinhar lá mesmo também, né?
R – É. O primeiro passo quando a gente chega na cidade é procurar um posto de combustível, esse é o primeiro passo. Chegamos na cidade, a gente não tem regras, mas tem duas regrinhas: não viajar longas distancias e não viajar à noite. A gente evita. A gente viaja durante o dia, só quando não dá mesmo, aí… porque você chegar à noite num local é difícil você conversar com um posto de combustível, frentista deixar você ficar, tem que às vezes, conversar com o gerente para ele liberar. Geralmente eles não gostam que tire fotos porque se são postos que não têm o hábito de receber e nos recebe pelo projeto, eles não gostam de divulgar, senão, amanhã alguém para com motor home lá, para com barraca, né? A não ser postos que têm essa tradição, esses postos que param caminhões, param motor home, tem estrutura, banheiro… mas a maioria que nós ficamos, não tem essa estrutura. Então, a gente até tira foto para o nosso arquivo pessoal como forma de agradecimento a pessoa e tal. Então, primeiro ponto: chegou, vamos para um posto de combustível, já sabemos onde vamos dormir? Beleza! Quem que é um bom exemplo? Pergunta ali mesmo no posto: “Quem que é um bom exemplo?”, não sabe? Então, vamos procurar, você já sabe para onde vai voltar para dormir, então chega lá, arrumou a barraca, a barraca fica em cima do carro, é uma barraca automotiva, fácil de armar, armou, geralmente tem tomada, nós optamos por ser tudo elétrico, porque ficamos com medo de bojão de gás, às vezes, numa batida, né, nunca sofremos nenhum acidente, mas essa precaução nós tivemos. Então, tudo elétrico, ligou lá, cozinhamos, deita, dorme. No outro dia, a mesma coisa. Final de semana que a gente tira para limpar o carro. Então a gente procura um lugar maior que a gente tem mesa, que isso não dá no dia a dia ficar montando e desmontando mesa e cadeira, né? Aí, a gente monta mesa, cadeira, vai postar as coisas. Quando tem wi-fi, a gente aproveita, alguns cantos, às vezes têm, às vezes, não. Mas a gente tem um modem, né? Então, aí a gente aproveita para postar as coisas, botar a internet em dia, né, programa já para a outra semana, responder os e-mails e limpar o carro, que aí, a gente tira tudo, passa um paninho, tal. Aí tem um tubo para fazer café, essas coisas, a rotina normal de uma casa, né, só que uma casa sobre rodas, né? Mas é uma rotina normal. Chegou, descobriu o mais difícil é descobrir o local. Hoje é mais fácil porque a gente é conhecido, mas no inicio, a gente tem muitas histórias assim, de perrengues de chegar num posto, o cara não deixar você dormir e aí, você tem que procurar outro. Essa regrinha de não viajar à noite, teve uma vez que nós viajamos à noite, o cara não deixou a gente dormir, nós ficamos desesperados, estava chovendo, tava no Mato Grosso, a estrada estava em obra: “Como é que nós vamos dormir?”, porque dormir no carro não dá em função de que o banco não reclina, né, se reclinasse, deitava e dormia em qualquer lugar, mas como não reclina… você não pode armar uma barraca na beira de uma estrada por causa dos riscos muito mais… a gente também não é inconsequente. Então, já aconteceu isso, da gente parar num lugar, o cara não deixar e aí, você ficar desesperado e aí, aquela coisa que eu falei, né, é parar e pensar: ‘vamos esperar e vamos ver o que a gente vai fazer’, e aí aparecem coisas assim, que não dá para acreditar. No Mato Grosso, eu tava parado, chovendo, o cara parou a caminhonete: “O que vocês estão precisando?” “A gente queria dormir aqui, o gerente não tá e o cara não quer deixar, nós temos que procurar outro posto”, falou: “Não, sou dono do hotel ali, vocês vão ficar comigo ali no hotel”, e o cara nem conhecia a gente. “Podem ficar lá, só não vão reparar porque tá em reforma, mas tem um… eu moro nos fundos, estou reformando, vocês dormem lá se vocês não se importarem” “Lógico que não”, então quer dizer, você ia dormir num posto de combustível, foi para um hotel e dormiu no hotel.
P/1 – Conta outras histórias para a gente de coisas que aconteceram na viagem, que ficou na sua cabeça, assim.
R – Tem muitas. Tem que definir o quê que você quer ouvir (risos).
P/1 – Uma história assim, que te surpreendeu quando você tava na cidade, alguém que te surpreendeu, que…
R – De projeto ou pro bem, pro mal? Pro mal, eu não sei, por exemplo, lá no sul teve um motoqueiro, ele é até da policia, eu acho. A gente tinha acabado de visitar um projeto super bacana com adolescentes, super legal e o cara parou a moto no sinal e falou: “Bom exemplo? O quê que é isso?”, aí explicamos o quê que era, falamos: “Acabamos de conhecer um projeto ali com adolescentes” “Que adolescentes? Esses adolescentes estão todos perdidos, tem tudo que matar. Eu sou policial, vejo que só…”, quer dizer, ele tá no meio, né, “Eu sou policial e só vejo moleque roubando…” “Que é isso? Não é isso que nós estamos vendo, cara! Depois você entra no nosso site, você vai ver que não é isso. Acabamos de conhecer aqui na sua cidade” “Isso não existe”, pegou a moto que abriu o sinal e não deixou nem eu acabar de argumentar, né? Então, tem esses casos que a pessoa tá tão focada em coisa ruim que ela não acredita. Mas em compensação, tem casos assim: “Pô, vocês já visitaram…?, esses dias, o cara foi indicar um projeto pra gente, a gente já tinha conhecido já: “Vocês têm que conhecer, lá em Barretos”, na rodovia. Nós paramos, voltando de São José do Rio Preto, o cara cortou a gente, entrou no pedágio, pagou o dele e o nosso, nós fomos passar, a moça: “Ele já pagou. Ele falou que é para você parar ali que ele quer conversar com você”, paramos lá: “Paguei porque eu queria indicar um projeto lá em Barretos e tal, tem o Vovô Antônio”, falei: “Nós estivemos lá, registramos” “Queria indicar para vocês porque é um excelente exemplo”, parece que alguém da família já fez tratamento lá, e tal. É uma casa de acolhimento. “Nós passamos lá em 2011 e registramos”, então ele já tinha assistido a reportagem, então já sabia quem a gente era e ele pagou: “Vocês não aceitam doação, mas presentes vocês aceitam, então eu paguei o pedágio de vocês, pouca coisa, mas é o que eu posso fazer nesse momento”, pra gente é muita coisa,. Quer dizer, as pessoas ficam se questionando: “Como vocês sobrevivem?” A gente tem uma reserva que é o que a gente vai gastando, mas toda vez que alguém ajuda,. Essa reserva não é usada, né? Então, às vezes, cinco reais de um pedágio pode parecer pouco, mas se você for analisar, se você gastar cinco reais todo dia, no final do mês dá quanto/ No final de um ano dá quanto? Então, são coisas assim. Agora, já passamos dificuldades. Não ter dinheiro e você falar assim: “O quê que nós vamos fazer? Vou ligar para a minha sogra para pedir dinheiro?”, e aparecer alguém do nada e te ajudar.
P/1 – As pessoas reconhecem vocês na rua, já?
R – Sim. Alguns, sim.
P/1 – No meio da expedição?
R – Sim, várias. Várias vezes, nós fomos reconhecidos, é uma coisa boa e ao mesmo tempo, ruim, porque a gente fica constrangido, às vezes, a pessoa quer tirar foto, ou visitamos um projeto agora lá em Minas, e nós tivemos lá em 2011, que é a APAC, que é um sistema prisional onde não tem guardas, os próprios presos tomam conta dos presos. Para você ter uma ideia, o sistema comum custa dois mil e 200 reais para o governo, esse custa 900, porque eles mesmo cozinham, eles comem de garfo, talher mesmo, não é plástico, eles cozinham, eles pintam, eles têm horta, tem 280 detentos lá. E nós tivemos lá em 2011 e voltamos lá agora para filmar um dos 50 são eles. O cara tava lá com o nosso cartãozinho de 2011, que nem é o nosso cartão mais, que o nosso cartão hoje é um papel de semente, que é uma história bonita também. Esse papel semente foi um cara que nós conhecemos pela internet, ele faz pra gente desde 2011, não nos cobra nada e ainda envia para onde a gente está. E esse cartão que esse cara tava lá é o antigo ainda, de papel, ele falou assim: “Vocês lembram de mim?”, não porque é muita gente, né, falou assim: “Eu tenho um cartão de vocês”, já abriu a carteira, eu: “Cara, esse cartão nem existe mais! Guarda ele que é uma relíquia, nem nós temos ele mais”. Então, quer dizer, são histórias assim, que… e o outro lá, nós passamos, falou: “Quando vocês passarem, me dá um autografo para mostrar a minha mulher no dia da visita, porque eles estão presos. Falei: “Pô, cara, autografo?”, sabe? “Vamos tirar uma foto? Melhor, né, tira numa foto, depois pede pra sua esposa entrar pela mensagem, eu mando a foto, é muito mais…”, que autógrafo não é a nossa praia, nós não somos celebridades para isso. Às vezes, o cara quer guardar e tudo, mas “Vamos tirar uma foto, porque foto guarda, né, ela entra lá e a gente manda foto”. Ai o outro rapaz tirou que eles não têm , não podem ter celular, tirou com o nosso, no dia de folga dele, ele pode ir lá e entrar na internet. Então, histórias assim, tem muitas. Tem a história de um cara que quando nós postamos que a gente não aceitava doação em dinheiro e todas as pessoas que vinham doar, a gente pedia para ajudar algum projeto, teve um dia que a caminhonete parou assim, emparelhou, pediu pra gente parar, nós paramos, o cara veio e falou assim: “Eu queria ajudar vocês”, ai a Iara já vai com o discurso, né: “Não, mas nós não aceitamos a doação de dinheiro de pessoa física, tem que ajudar o próximo” e tal, se tinha alguma empresa que ele quisesse ajudar, se a gente tá no posto de gasolina, se quiser pagar, quando acabamos de abastecer, o cara jogou o dinheiro dentro do carro, 100 reais e saiu correndo. Entrou na caminhonete dele e foi embora. Eu falei: “Que doido”, né: “Que doido”, eu comecei a chorar no carro, sabe assim quando você olha uma cena daquele garotinho que faz uma arte sai correndo, aquela cara do garotinho que fez arte: Foi o cara! O cara jogou o dinheiro e saiu correndo, entrou na caminhonete e foi embora, eu falei: “Que é isso? Que doido”.
P/1 – O cara queria mesmo ajudar, né?
R – Queria mesmo ajudar. A gente nem sabe quem é o cara, não guardei placa. Eu lembro que era uma caminhonete porque ele parou na frente. Então assim, tem muita história assim, e tem história de projetos fantásticos, igual na Bahia que nós visitamos um projeto, a mulher estava fechando o projeto.
P/1 – Como que era?
R – Chama “Mães Educadoras”, no complexo do Baianão, uma comunidade bem violenta, onde as professoras não queriam ir para lá dar aula, elas queriam que fosse com escolta. As professoras. Então, as mães tiveram que se apoderar e as próprias mães viraram educadoras dos filhos, que era melhor do que um filho assistir uma aula com um policial do lado, não fazia sentido para ela. Então, elas se apoderaram e criaram esse projeto que chama Mães Educadoras e quando nós estivemos lá, ela tava querendo fechar o projeto. Aí ela falou assim: “Tá vendo aqui? Tá cheio de caixa aqui”, na hora que nós fomos nos despedir: “Eu ia fechar o projeto. Eu vim aqui hoje para fechar, daí aparecem vocês dois, dois doidos, batem na minha porta e dizem que tem um monte de gente fazendo isso, passando por dificuldades igual eu tô, então eu prometo a vocês que eu não vou parar. Enquanto eu tiver vida, eu vou estar aqui. Não tenho coragem de falar para vocês que eu vou fechar o projeto”, isso é uma vitória, quer dizer, nós fomos ali fazer o quê? Somente falar para ela que ela é um bom exemplo. E quem faz projeto social, a pessoa não tem apoio, todo mundo critica, aí chega um momento que ela acha que tá sozinha no mundo: ‘só tô eu fazendo, eu vou parar’. Então quer dizer, foi isso que aconteceu ali, nós simplesmente, mostramos para ela que ela tá no caminho certo, que tem muita gente fazendo isso e tem muita gente passando dificuldades igual ela. E ela não pode parar, parar um projeto lindo, não tem jeito!
P/1 – Você acha que além desse problema de mídia que você falou que tem que insistir muito numa história única, né, o que você acha que além disso contribui para que não haja tanta ação social ou reconhecimento de bons exemplos no Brasil, por exemplo?
R – Eu acho que existem muitas ações sociais. Elas só não são divulgadas com o critério e com o reconhecimento que elas merecem. A gente acha que são os heróis invisíveis, porque se não fossem essas ações, eu acho que o nosso país estaria muito pior do que as pessoas acham que está. Mas não está. Nós ouvimos uma vez um jornalista que falou o seguinte: primeiro, noticia ruim dá ibope, quem tá no controle somos nós, então enquanto tiver dando ibope, eles estão falando que eles não vão mudar essa rotina, então, o primeiro passo. Segundo, é muito mais fácil noticiar uma coisa ruim do que uma coisa boa, por quê? Se o Eduardo matou a Iara, eu vou noticiar: “Eduardo matou Iara”, às vezes, ele nem matou, mas todo mundo já vai começar a criticar, todo mundo vai começar a ler, vai começar a postar um monte de coisa. Tá o cara morto lá no chão, se eu tirar uma foto lá e postar, isso bomba, porque todo mundo quer ver a desgraça do outro e eu não preciso provar que o Eduardo matou a Iara, só noticio: “Eduardo matou a Iara”, tal e aí todo mundo: “Oh, você lembra? Ele olhava meio assim, mesmo. Eu acho que tem razão, ele deve ter matado a Iara”, as pessoas começam a viajar. Diferentemente de um projeto social, quando eles vão fazer alguma reportagem sobre uma ação social, eles têm que buscar data de fundação, quantas pessoas atendem. Eles não podem anunciar: “O Eduardo é um bom exemplo”, não vende. Para vender… então, dá trabalho. Ele falou assim: “Para você noticiar uma coisa do bem, dá trabalho” e muitos não querem ter trabalho, porque a mídia precisa de notícia a too momento. O tempo que nele vai gastar aqui para colher essas informações para fazer uma matéria bonita que vai emocionar, ele já noticiou umas dez ruins. Ele já fez girar o jornal ou o que for, a mídia. Então…
P/1 – Você acha que a politica influencia as pessoas?
R – A politica…
P/1 – De um jornal.
R – De um jornal? Com certeza! A gente fala muito… nós fomos fazer uma palestra no setor de jornalismo e nós falamos sobre isso, ele faz… a gente vê isso pelo… aqui é o país do futebol. Uma mídia já como era o jogador, no outro dia, ele já é o pior, não é? Isso acontece no dia a dia, é a mesma coisa. Eles têm o poder de realmente transformar. Se eles quisessem noticiar coisas boas, eles teriam noticias todos os dias. Nós temos 1150 projetos, o ano tem 365. Nós temos projeto para todo dia, uma noticia boa todo dia.
P/2 – Então, conta uma noticia boa pra gente. Queria saber de um projeto de meio ambiente, assim, que vocês viram.
R – De meio ambiente?
P/2 – É, que a galera quer ajudar realmente o planeta, assim.
R – Cara, tem um projeto que nós conhecemos no Mato Grosso, em Alta Floresta que eles trabalham com orgânicos e eles fazem todo um trabalho de preservação, além do trabalho de preservação da região – eu não vou aqui criticar agrotóxicos, né, porque eu acho que eu tenho poucas informações, a gente sabe que é ruim, mas não vou entrar em detalhes técnicos, mas lá, eles estão trabalhando com orgânicos e em contrapartida, reflorestando a área em volta. É um projeto pequeno, são 60 famílias, mas é um projeto que eu acho que… acho, não, tenho certeza que é o futuro do osso planeta. É você voltar nas nossas raízes e começar a dar valor nas coisas mais caseiras, porque se você começar dar valor na sua alimentação orgânica, eu não sou, tá, mas nós gostaríamos de ser vegetarianos, e tal, mas não conseguimos ainda ser. Mas se você começar a dar valor a plantação orgânica, comer as coisas mais orgânicas, a gente vai transformar isso, porque você vai começar a dar valor ao orgânico, então você vai dar valor à natureza, às arvores que estão ali, então esse projeto lá chama Ouro Verde. Ouro Verde por causa do reflorestamento e dos orgânicos. Mas nós conhecemos vários de reflorestamento aí pelo Brasil, tem Alagoas. Em Alagoas, por exemplo, se você pensar num lugar seco, o cara conseguir fazer uma plantação hidropônica, aproveitando o sol para gerar água e gerar tecnologia… usando a tecnologia em favor da natureza, de empoderamento de comunidade, um projeto fantástico com a Engenho lá. Lá tem muitos. Tem muitos e eu acho assim, eu acho que a gente não pode dar valor a nossa natureza depois que a gente perder. Eu não sei quem falou isso, mas tem um ditado que fala assim: “Será que o homem só vai dar valor a natureza no dia em que perder ela totalmente?”, porque a gente ainda tem muito isso, né, de dar valor depois que perde, né? Às vezes, as pessoas: “Pô, mas você perdeu, agora…”, eu acho que a gente ainda tá num momento que a gente consegue virar isso, porque nós temos ainda muita riqueza natural, nós temos muitas pessoas dispostas a melhorar esse país, pessoas que fazem o dia a dia, lá, as formiguinhas, né, que vão fazer esse país, um país melhor, mas depende da gente. Eu acho que pra gente fazer um país melhor também, a gente precisa de primeiro, mudar gente, mudar a nossa família, a nossa rua, o nosso bairro. Eu acho que aí que vai fazer essa ressonância do bem. Eu acho que a gente só vai transformar esse país se cada um tiver a consciência de qual que é o seu papel aqui, a gente brinca muito, eu e a Iara… brinca, não, a gente fala muito: “Essa nossa experiência de quatro anos, se ela não tiver válido por nada, se a gente não tiver transformado a vida de ninguém, se não inspirou ninguém a fazer alguma coisa, se não motivou alguém a continuar seu trabalho…”, ela já mudou dois mundos: o meu e o dela. Então, só por isso, é um pouco egoísta, né, mas só por isso já valeu a pena. A gente sabe que tiveram várias pessoas que mudaram e a gente sabe que existe até uma passagenzinha que é a Canção de Hunos, a gente não sabe onde a nossa canção vai chegar, mas a gente sabe que ela vai chegar em algum lugar. A gente nunca sabe onde, tanto para o bem, quanto para o mal. Tem uma parabolazinha da Canção de Hunos que é uma pessoa que vai morar com um monge, não sei se você conhece, e aí, o monge deixa ele varrendo o pátio e ele fica varrendo o pátio um ano, dois anos, e cantando uma canção. Um dia ficou de saco cheio, falou: “Monge, eu vim aqui para ter uns ensinamentos com o senhor, o senhor me bota para varrer pátio todo dia? Tô aqui há dois anos varrendo pátio. Eu vou embora, vou para o mundo” “Ok.”. E ele foi. Aí, foi atravessando o deserto e tal, passou mal no meio do deserto, desmaiou e aí, uma tribo acolheu ele, levou ele lá, tratou dele e no meio, na hora que ele tava voltando, ele ouviu uma canção, pensou: ‘conheço essa canção’, e aí perguntou ao pessoal que tava acolhendo ele: “quem que é?” “são as crianças daqui que ouviam essa canção, não sabem de onde e essa canção veio no momento em que a gente estava passando uma grande dificuldade na nossa tribo e essa canção transformou a nossa tribo, ficou mais calma, conseguimos recuperar tudo que a gente tinha perdido aqui”. E aí ele entendeu que aquela canção era a canção que ele fazia varrendo o pátio, que ele achou que não tava fazendo nada. Então, quer dizer, a gente não sabe onde que a nossa canção vai chegar. Tava muito longe de onde ele estava e aí, ele voltou., fez a caminhada de novo e aí, falou para o monge: “Posso continuar varrendo o pátio aqui”, e voltou a varrer o pátio e a cantar a canção dele, quer dizer, a canção acalmou uma tribo lá não sei onde, transformou, coisa que ele nem imaginava. Então, acho que é isso que a gente tem que fazer. Quando a gente estiver enviando boas energias, isso vai chegar em algum lugar que a gente talvez não saiba onde que é.
P/1 – Vou passar para as perguntas finais. Queria perguntar se você tem alguma coisa pra perguntar para o Eduardo?
P/2 – De tudo isso que você tá vivendo, o quê que você sentiu que mais te transformou como pessoa?
R – Eu sou outro, né? Mas assim, eu aprendi que viver com muito ou viver com pouco, pra mim, não faz diferença. Eu consigo ser feliz com o que eu tenho hoje. Eu não preciso ter mais do que eu tenho para ser feliz. Eu aprendi que a felicidade não tá em você ter nada. Às vezes, as pessoas ficam preocupadas conosco, principalmente família, né: “Nossa, vocês perderam tudo! Vocês vão voltar, se voltar para cá, vocês vão ter que começar tudo do zero”, eu falei: “Nossa, o que nós vivemos não tem dinheiro nenhum no mundo que pague”, porque o que nós vivemos, ninguém, por maios que a gente tente expressar, por mais que esse livro que vai sair agora em agosto que a gente tem algumas experiências lá, alguns ensinamentos, nós vivemos isso. Então assim, isso ninguém tira da gente. É um aprendizado que não tem como… a gente tenta partilhar isso de alguma forma, o livro tem esse poder, mas isso é uma transformação, eu sou outra pessoa, não sei a Iara, mas eu sou outra pessoa. Eu, apesar de todos os dias, a gente tem que fazer… todo dia um trabalho, que as pessoas falam: “Vocês não são materialistas, que legal, vocês tiraram tudo”, mas a gente tem os desejos, os desejos do ser humano. Eu andava de terno e gravata, ar condicionado e às vezes, quando você tá lá no sol escaldante, assim, você fala: “meu deus cadê aquele meu arzinho condicionado?”, mas aí você faz: ‘pô… isso não faz sentido’. “Pô, hoje não consegui me alimentar direito, hoje…”, você fica meio cansado, assim, principalmente, quando você passa um dificuldade, a vida não é só isso, né? É legal você ter as coisas, nós temos um carro e temos que ter um carro porque ele vai nos levar, mas se amanha não tiver e tivermos que ir de mochila, igual aconteceu em 2013, que falamos: “Vamos vender o carro e ir de mochila”, para algumas pessoas pode ser difícil. Pra gente, foi muito tranquilo, só que não era isso que o destino queria, no meio do caminho, apareceram algumas coisas pra gente continuar de carro mais um tempo. Então, esse ter ou não ter hoje, não é que nós somos inconsequentes, que às vezes, as pessoas: “Mas vocês não pensam no futuro”. Eu não sei se existe futuro, eu tenho que viver o presente. Hoje eu tô aqui com vocês, amanhã pode ser que eu não esteja mais aqui com vocês. Então, se a gente não viver isso daqui intensamente, não faz sentido. Então, acho que mudou tudo! Na minha vida, mudou tudo!
P/1 – Como que vocês fazem com coisa de higiene pessoal, assim, tipo no meio da estrada, assim? Para manter a…
R – O banho, todo posto de gasolina tem banheiro. Então quer dizer, se der uma dor de barriga no meio da estrada, você tem que fazer no meio da estrada, mas assim, chegou num posto de combustível, tem. Pra Iara é mais complicado, nós já passamos algumas dificuldades assim, de eu ter que ficar na porta do banheiro, porque só tinha banheiro masculino, e não é um banheiro lega, então quer dizer… mas aí ela toma as precauções dela, né, mas assim, acho que nós nunca ficamos… acho que só no norte, eu acho que nós ficamos dois dias sem tomar banho assim, mas aí também não visitamos nenhum projeto, porque quando a gente visita, se a gente não conseguiu tomar banho em algum lugar, se o projeto tiver, a gente toma, a gente pede. Uma coisa que nós aprendemos, trabalhar com orgulho, né? Você chegar e pedir para tomar um banho, tal, então isso a gente… mas fora isso, é tranquilo. Acho que dificuldade maior de higiene pessoal, assim… o que aconteceu foi blusa, né, às vezes perguntam: “por quê que você usa preto?”, é porque as roupas claras foram ficando, porque o branco lavar duas, três vezes debaixo de um chuveiro e em qualquer lugar, ela vai amarelando. E você chegar num lugar com uma blusa… o preto esconde. Dura mais tempo. Então, as cores claras foram se perdendo no caminho, mas se entrar nas nossas redes sociais, vai ver foto nosso antiga lá com camisa azul clara, branca, vermelha… hoje em dia, se abrir o nosso armário, agora, só tem preto, acho que tem uma branca que eu uso para dormir (risos), porque aí vira um uniforme.
P/1 – Bota também…
R – Bota, a bota foi pro… é mais essa daqui porque eu ganhei e o meu tênis que ficou comigo quatro anos furou, começou a entrar água, eu tive que comprar outro, mas foi uma coisa que nós aprendemos,. Eu tinha quatro, cinco sapatos, pra que se seu vou usar só um? Então, hoje, nós aprendemos: usa… a Iara passou um dia desses, a irmã dela viu ela nas reportagens com a mesma sandália, ligou: “pelo amor de Deus, tira essa sandália! Não aguento ver essa sandália”, ela falou assim: “Vou usar enquanto tiver…”, e ela perdeu ela porque nós fomos visitar um projeto e aí, no projeto tinha um cachorro do lado de fora, nós tivemos que deixar os sapatos do alfo de fora para entrar na casa, eles têm esse hábito lá, então deixamos e entramos. O cachorro detonou a sandália dela, o cachorro mordeu (risos), quando ela foi pegar, tava toda comida. Aí eu falei: “Agora não tem jeito de você usar esse sapato comido. Temos que trocar ele”, entendeu? Teve que pegar o outro, que a gente sempre tem dois, uma bota e um tênis. Então, vou revezando, tá frio, uso a bota, não tá, é o tênis.
P/1 – Queria continuar por mais um tempo, mas acho que a gente vai voltar depois para a sua esposa, né, daqui a pouco já deve estar dando o tempo. Eu queria te perguntar se você tem alguma coisa que eu não perguntei para você e que você acha que era bom eu ter perguntado.
R – Não, acho que a pergunta que você fez foi interessante, não sei se eu respondi, né, 2015, é esse o projeto, né, então a nossa ideia é em 2016, aí sim, ir para o exterior. A ideia de ir para o exterior, ela não é uma coisa assim… como a gente não planeja, pode ser que… agora, é 2016, pode não acontecer em 2016, porque tem vários fatores: patrocínio, não tem, quer dizer, na realidade, nós estamos segurando o carro que é a única coisa que nos sobrou para vender pra nos bancar na viagem do exterior de mochila, mas nós já penhoramos ele agora para fazer um aplicativo de celular porque o cara queria cobrar e nós tivemos que deixar o carro de… pode ser que não tenha mais o carro para vender, pode ser que 2016 não vá para o exterior. Então, volto na mesma coisa, as coisas acontecem muito naturalmente. Então, pode ser que daqui a dois meses, uma empresa venha e queira bancar o aplicativo, não vai precisar vender o carro, vai pagar para o cara lá o aplicativo, resolveu o nosso problema. Mas acho que os planejamentos são esses, é uma pergunta que todo mundo faz: “E aí, quando vocês voltarem, e agora? Em 2015, 2016?”, eu só tenho a agradecer a tudo o que nós vivemos hoje. A Iara até brinca: “Se esse aplicativo sair agora em agosto – que é o outro sonho, né, que o livro tá encaminhado e vai sair, o aplicativo com o carro penhorado, também vai sair – a gente pode morrer, que nós fizemos a nossa parte”, aí eu brinco com ela: “Você pode morrer, eu não que eu ainda quero viver mais um pouquinho” (risos). Mas assim, as coisas vão acontecendo muito naturalmente, acho que a gente não vai passar por tudo aquilo que a gente não tenha que passar, eu acho que se tiver que passar é porque a gente merece passar, a gente tem que saber passar por isso. Se o avião tiver caindo, não adianta você se desesperar, ele vai cair de qualquer jeito, se você se desesperar, você vai só criar mais pânico em quem tá dentro do avião, concorda? Então, vai cair, que seja de uma forma tranquila, né? Mas a gente acredita que a gente tem uma fé incondicional, a gente sabe que essa ideia não foi nossa, nós só estamos executando. Então, se alguém tem essa ideia, ele vai encaminhar o que tiver que acontecer, a gente sabe que algumas pessoas chamam de Deus, de Alá, Universo, a gente sabe que quem teve essa ideia que é alguém maior do que nós, vai orientar, vai fazer acontecer e nós tivemos várias provas disso durante esses quatro anos, sabe? Coisas que aconteceram que se contassem para mim, eu não acreditaria.
P/1 – Tipo o quê?
R – Aparecer gente do nada, assim, e te ajudar. Você tá assim, num lugar, num posto de combustível, botando água de um galão, saindo de uma cortesia de um hotel, botando água no galão para voltar para o posto de gasolina, sai um cara do nada e fala assim: “que bom que eu encontrei vocês, quero que vocês fiquem no meu hotel quantos dias vocês quiserem”. O cara nem conhecia o projeto, viu o nome: “Caçadores de Bons Exemplos”, achou bonito: “Nossa, que nome bonito, Caçadores de Bons Exemplos, parece uma coisa linda”, né, sabe umas coisas assim, quer dizer, o quê que tocou ele um nome para chegar lá e conversar com a gente? Então… o que tiver que ser, vai ser, né?
P/1 – Você respondeu minha próxima pergunta…
R – Qual que era?
P/1 – Que era quais são os seus sonhos? É quase isso, né?
R – É, quase isso, assim. O nosso sonho é viver o hoje. A gente tenta todos os dias viver o hoje. A gente tem alguns planejamentos para o futuro, que são esses aí que eu falei, do livro, do aplicativo, da viagem, de ir para o exterior, na realidade, não é nem… é só para ter um contraponto, assim, tem uma escola alternativa lá em Portugal, mas tem uma aqui em Minas Gerais que faz a mesma coisa, por quê que as pessoas só conhecem ele e não conhecem aqui? Tem um grupo lá na Europa que faz reflorestamento muito bacana, estão mudando o mundo, não sei o que, mas tem um aqui em Alta Floresta, Mato Grosso, tem uma aqui não sei onde, sabe? é mais para ter essa comparação, porque nós não sabemos falar inglês, francês, espanhol, nada, e nós vamos! (risos). Nós vamos! Nós temos todos os lugares e todas as pessoas para nos acolherem, por enquanto, você tá conversando na internet, no Google ali que vai traduzindo, vai conversando, mas já explicamos a proposta e a pessoa lá tá tentando achar alguém que fala português para andar com a gente, nós estamos tentando fazer um curso aqui que a gente consiga conversar alguma coisa, porque uma coisa é você escrever, outra coisa é você conversar, se conversar muito rápido, você não entende, então tem alguns desafios. Mas a vida é desafios, né? (risos) Energia, né? A gente fala que existe uma língua maior, aí, né, uma linguagem maior que é a linguagem do amor, né? O cara já sabe o projeto, já sabe o quê que é, a gente sabe que vai fazer.
P/1 – O quê que você achou de contar a tua história aqui pra gente?
R – Achei interessante, assim, é bacana que eu acho que fica registrado, né, a gente conta algumas histórias nas palestras, mas aqui é mais pessoal, assim, tinha muito tempo que eu não me lembrava da história do meu filho, assim, porque como vai ficando lá para trás, você reviver isso, acho que é bacana, acho que é legal. Isso aí na hora que editar como vai ficar, né, pra mim foi muito legal, porque às vezes, você vai fazendo as coisas no dia a dia e você esquece essas coisas, igual vocês pediram as fotos: ‘onde estão minhas fotos? Onde será que tá isso?’, porque como eu não tenho nada, né: “Onde será que eu botei isso?”, porque o que a gente tem hoje é o que tá no carro e um quartinho na casa da minha sogra que é desse tamanhozinho aqui, né? Então, tem lá um armário de roupa e alguns documentos, né, muitos eu joguei fora, outros… e fotos, assim, como na minha época, não tinha foto, né? Tem foto agora, assim, da expedição e tal. Você contou aí, vi a foto do meu irmão, meu irmão… não lembrava daquele momento, né? Porque você vai no dia a dia, você acaba não; então, para mim, foi muito bacana, fantástico, mesmo! Poder reviver isso, tal.
P/1 – E o quê que você acha de contar história de vida para as pessoas e registrar isso?
R – Eu acho que é importante porque eu não sei se a minha história vai inspirar alguém ou não, mas alguém pode se identificar, né: “Também vi isso…, também vivi isso, tal”. Eu acho que é importante, é um pouco do que a gente faz, porém numa área mais social, assim, que a gente tenta colocar: “Pô, se o cara ;lá faz, eu também posso fazer”, né? Não é a ONG, não é o projeto, é o cara que teve a ideia, né? Eu acho fantástico você poder se identificar no outro, eu acho que o trabalho de vocês, não sei se é isso, mas eu, Eduardo, avalio isso, você se identifica no outro e quando você vê uma história boa, eu também: ‘isso já passou na minha vida, também posso fazer isso, que legal’. Eu acho uma oportunidade, né, acho que eu nunca tive a oportunidade de falar a minha história assim, gravada. Alguns trechos que nós conversamos, converso às vezes com um, com outro, mas nessa linha do tempo assim, legal! Gostei.
P/1 – Tá certo. Obrigado, viu, Eduardo.
R – Obrigado vocês e obrigado pela paciência.
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