Entrevista de Maria José dos Reis
Entrevistada por Luiza Gallo e Bruna Oliveira
São Paulo, 01/10/2021
Projeto Comunidade Zaki Narchi
Entrevista número: PCSH_HV1050
Realizado por: Museu da Pessoa
Transcrita por Selma Paiva
Revisado por Luiza Gallo
P/1 - Dona Zezé, pra começar, eu queria que você falasse o seu nome todo.
R - Maria José dos Reis.
P/1 - Em que ano você... qual é a sua data de nascimento?
R - É vinte e seis de novembro de 1924.
P/1 - Em que cidade você nasceu?
R - Santa Rita do Passa Quatro.
P/1 - Agora, eu preciso que você faça uma viagem nas memórias. Qual é a sua primeira lembrança da sua vida, de pequenininha?
R - Bom, de pequenininha, eu vim com um ano de idade de Santa Rita, com a minha mãe. E minha mãe se instalou no Brás, comigo. Eu tinha um ano de idade, que ela veio de lá de Santa Rita. E fui me criando lá. Aí a minha mãe foi uma mulher que vendia verdura na rua, eu ainda pequena. Aí ela se instalou na - eu tenho que contar, já, tudo direitinho, né? - Rua Santa Clara, que é no Brás. E lá ela foi levando a vidinha dela, pra me criar. Depois, ela começou a vender verduras na rua. Ela me deixava, assim, em casa, fechada. Porque ela saía às quatro horas da manhã pra ir no Mercadão, que até hoje existe, pra comprar as coisas pra vender. E ela não me levava, ela me deixava lá. E foi assim, levando a vidinha dela. Depois, veio a Revolução de 1932. E ela morava na Santa Clara. E foi assim, me criando. Do jeito que ela podia. Depois veio essa Revolução de 1932. E ela pegou... agora eu já não lembro da Rua Santa Clara, pra que rua que ela foi. Eu já não lembro isso. E foi, assim, me criando, eu crescendo, indo pra escola. Foi a vida dela.
P/1 - E o seu pai veio junto?
R - Não. Porque a minha mãe foi assim... não sei se é pra contar a história da minha mãe. Ela trabalhava em Santa Rita e ela trabalhava, porque antigamente, era baronesa, que hoje é rei. Não. Naquele tempo era...
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Entrevistada por Luiza Gallo e Bruna Oliveira
São Paulo, 01/10/2021
Projeto Comunidade Zaki Narchi
Entrevista número: PCSH_HV1050
Realizado por: Museu da Pessoa
Transcrita por Selma Paiva
Revisado por Luiza Gallo
P/1 - Dona Zezé, pra começar, eu queria que você falasse o seu nome todo.
R - Maria José dos Reis.
P/1 - Em que ano você... qual é a sua data de nascimento?
R - É vinte e seis de novembro de 1924.
P/1 - Em que cidade você nasceu?
R - Santa Rita do Passa Quatro.
P/1 - Agora, eu preciso que você faça uma viagem nas memórias. Qual é a sua primeira lembrança da sua vida, de pequenininha?
R - Bom, de pequenininha, eu vim com um ano de idade de Santa Rita, com a minha mãe. E minha mãe se instalou no Brás, comigo. Eu tinha um ano de idade, que ela veio de lá de Santa Rita. E fui me criando lá. Aí a minha mãe foi uma mulher que vendia verdura na rua, eu ainda pequena. Aí ela se instalou na - eu tenho que contar, já, tudo direitinho, né? - Rua Santa Clara, que é no Brás. E lá ela foi levando a vidinha dela, pra me criar. Depois, ela começou a vender verduras na rua. Ela me deixava, assim, em casa, fechada. Porque ela saía às quatro horas da manhã pra ir no Mercadão, que até hoje existe, pra comprar as coisas pra vender. E ela não me levava, ela me deixava lá. E foi assim, levando a vidinha dela. Depois, veio a Revolução de 1932. E ela morava na Santa Clara. E foi assim, me criando. Do jeito que ela podia. Depois veio essa Revolução de 1932. E ela pegou... agora eu já não lembro da Rua Santa Clara, pra que rua que ela foi. Eu já não lembro isso. E foi, assim, me criando, eu crescendo, indo pra escola. Foi a vida dela.
P/1 - E o seu pai veio junto?
R - Não. Porque a minha mãe foi assim... não sei se é pra contar a história da minha mãe. Ela trabalhava em Santa Rita e ela trabalhava, porque antigamente, era baronesa, que hoje é rei. Não. Naquele tempo era baronesa. E ela trabalhava na casa dessa baronesa. Mas ela me deixava com uma mulher lá. Aí a mulher não quis mais, porque ela tinha que ficar comigo, a baronesa não a quis mais. Foi aí que ela pegou e veio pra São Paulo, mas sozinha, porque o meu pai matou um homem lá, eu não sei. Ele não chegou a ir preso, porque a polícia não conseguiu pegá-lo, mas com o tempo ele morreu. E ela ficou completamente sozinha. Ela tinha só quatorze anos, a minha mãe. É a história que ela me contou, que ela me contava. E foi aí que ela me pegou e veio pra São Paulo. Eu, com um ano de idade. E ela sozinha, sempre sozinha. Pra me criar, tudo.
P/1 - E você tem irmãos?
R - Eu tive uma irmã. Mas diz que, quando eu nasci, ela faleceu. Depois aí que vim eu, né?
P/1 - E qual o nome da sua mãe?
R - Da minha mãe? Teresa Maria Bento.
P/1 - E como você a descreveria? Como era o jeitinho dela?
R - É, eu sei que ela era branca. O meu pai que era de cor. Mas ela era morena, muito bonita. O meu pai que era de cor. E foi assim que a vida da minha mãe, também, foi um romance, viu? O tanto que ela sofreu pra me criar, tudo. Quando veio essa guerra de 1932, eu já estava, ia fazer sete anos. Aí, nessa época, nós morávamos já na Brigadeiro, perto da Brigadeiro Machado, que é no Brás. Parece que até hoje tem ela. E lá tinha uma sede de bombeiro. Uma sede, assim, de bombeiro. E estava tendo a Revolução de 1932. Então, era assim: o governador falava que, quando tocasse uma sirene, era pra todo mundo correr pra onde pudesse. Pra onde pudesse. E no mesmo tempo que tocava a sirene, já era blecaute, era pros aviões que vinham, que eles soltavam bomba. Pra que não pudessem enxergar, que era tudo escuro. A história que a minha mãe contava. E eu me lembro. E quando vinha a sirene, todo mundo corria, apagava as luzes. E a minha mãe me pegou no colo e correu pra essa sede dos bombeiros, que tinha um porão. Mas era um prédio que era um quarteirão todinho, na Brigadeiro Machado, que eram os bombeiros. Aí a minha mãe me pegou no colo e correu. Na hora que ela foi, que tinha escada, na hora que ela pôs o pé no terceiro degrau, caiu uma bomba do avião. Eu e minha mãe fomos parar longe. Aí foram os bombeiros já querendo cuidar de mim, porque eu era criança. É tudo isso que a minha mãe me contava. Ela me contava tudo. Ela conversava comigo. Ela me contava o que ela passava com o meu pai. Ela me contava tudo. E ela me contou essa parte da guerra de 1932.
P/1 - Você tem outras lembranças desse momento?
R - Tenho, assim, lembrança que eu ia, às vezes ela me levava pra ir vender na rua, que ela tinha medo de estar me deixando sozinha. Eu a ajudava. É por isso que eu gosto de trabalhar, porque eu tinha sete anos, eu já ajudava a minha mãe. Que eu amo, do jeito que eu te contei que eu gosto de ler, é que eu gosto de trabalhar (risos). Com essa idade que eu tenho, eu ainda até choro quando eu não vou à feira, porque eu gosto de trabalhar. Aí eu ajudei minha mãe, fui ajudando, ajudando. Depois ela casou de novo. E foi assim, me criando. Ela me pôs na escola, que a escola existe até hoje. É a Padre Anchieta, na Rangel Pestana, até hoje aquela escola que eu entrei pra estudar. E foi assim, levando a vida. Ela me criando, ela me pôs pra estudar. Depois, fui pra trabalhar, doze anos, já fui trabalhar. E assim foi levando.
P/1 - E que lembranças você tem, que a sua mãe contava, da relação dela com o seu pai?
R - Não. Ela tinha a lembrança que a minha mãe era branca. E ela não gostava de preto (risos). Ela não gostava, porque o meu pai judiava muito dela. Porque ela era muito bonita e ele tinha muito ciúmes dela. E ele batia. É coisa que a minha mãe me contava. É uma coisa verdadeira mesmo, que ela me contava. Por isso que, às vezes, ela falava: “Minha filha, não casa, pra você não ter o destino que eu tive, com o teu pai”. Às vezes, me aconselhava pra eu não casar. E ela me contava que ele judiava muito dela, porque ele tinha muito ciúme dela. Mas ela não tinha moradia, porque o meu pai era um homem que morava em qualquer lugar. E aonde ele ia, ele a carregava. E ela tinha quatorze anos, já, né? E era a história que ela me contava do meu pai, que ele judiava dela. Só isso, que batia nela, queria matá-la. Tudo isso ela me contava. E ela tinha medo que um dia eu casasse. Porque o que ela sofreu. E ela não gostava de preto. A minha mãe não gostava. E eu sou, assim, de cor, porque o meu pai era, diz que era um negão. Mas ela não gostava, não. E ela já era branca. E ela não gostava. Que era tudo história que ela contava da vida dela com o meu pai. Mas, assim, eu com ela, ela me criou muito bem. Muito bem mesmo. Me deu do bom e do melhor, que ela trabalhava pra isso. E foi me criando, crescendo, trabalhando sempre. Depois, ela casou. Ela casou com um homem que estava muito bem. Ele pegou, abriu uma, duas pensões, que ela gostava muito do negócio de pensão. Lá na Rua Bresser. Ela tinha duas pensões. E foi indo assim, a vida.
P/1 - Como foi esse segundo casamento da sua mãe? Você lembra desse rapaz?
R - Com ele? Não. É uma família que, quando ela veio de Santa Rita, depois, com o tempo, conheceu essa família. Até hoje ainda tem. Ainda tem. Eles moram lá em São Mateus. E a minha mãe casou com um dos moços da família. Ela casou com ele. Ele chamava José Conti. Depois, com ele, ela teve dois filhos, que são meus irmãos, hoje. São irmãos por parte de mãe. Eles moram em São Mateus. Quer dizer que, no mundo, eu tenho só um irmão, porque o outro faleceu. O Décio, que mora lá. Eu tenho só ele mesmo, da família. Da família, tudo, é só ele, que eu tenho. É assim, viu? A minha mãe sofreu muito, coitada. Tudo pra me criar. E eu nunca dei aborrecimento pra ela. Acho que é essa benção que eu tenho de Deus, que eu sou uma pessoa que tenho muita fé em Deus, porque Deus olha muito por mim, viu? Muito. Então, eu acho que essa é a recompensa. Porque eu sempre fui uma boa filha. Trabalhava pra ajudar. A ajudei a criar meus irmãos. Porque o pai morreu, eles eram pequenos. Aí eu estava estudando, na escola normal. Estava estudando. Eu saí do estudo, que eu queria ser professora. Eu saí do estudo pra trabalhar nessa firma que eu trabalhei quatorze anos, pra ajudar a criar os meus irmãos. Assim, a minha vida. Depois casei. Casei também, graças a Deus, o meu marido era muito bom. Era branco.
P/1 - E o que a senhora lembra da escola?
R - Da escola, eu lembro que é a escola normal, Padre Anchieta, que é ali na avenida. Que lá tinha a parte do primário e tinha a parte que nem antigamente era até quarto ano, que a gente recebia o diploma. Até o quarto ano, não tinha? Depois do diploma, a gente ia pra outra parte lá mesmo, pra estudar o que eu queria. E eu queria ser professora. E a minha mãe... eu consegui entrar pro curso, mas o meu padrasto faleceu. Eu precisei sair do estudo pra trabalhar, pra ajudar minha mãe a criar meus dois irmãos. Tudo isso.
P/1 - E aí a senhora foi trabalhar onde?
R - Eu trabalhei numa fábrica de ampolas, na Rua Visconde Parnaíba. Trabalhei quatorze anos. Eu fabricava ampola, com maçarico. Trabalhei quatorze anos, lá. Aí saí de lá pra casar, que o meu marido não queria que eu continuasse. Porque lá na fábrica, eles não queriam que eu saísse, porque eu dava muita produção. Eles pediram pra eu não sair, mas o meu marido não queria. Quer dizer, naquele tempo eu era noiva ainda. Mas ele não queria, aí eu saí. Mas sempre continuei trabalhando. Ou alguma coisa ou outra, eu tinha que fazer alguma coisa pra trabalhar. Como hoje, eu estou aqui, com quase cem anos, vamos dizer, né? Ainda ontem, eu estava chorando (risos). Eu estava chorando, que eu quero voltar pra feira, pra continuar trabalhando. Mas eu não posso, por causa das tonturas minhas. Eu não posso, porque me dá tontura, eu caio. Quando eu vou pra casa, tem que alguém me levar, porque eu não posso ir sozinha. E eu estou assim. Sempre trabalhei na vida. Sempre.
P/1 - E, Dona Zezé, você se lembra como era o seu dia a dia, na fábrica?
R - Era assim, eu entrava às sete horas. Onze horas saía pra almoçar, entrava meio-dia e meio. E saía às cinco e meia, parece que era. Era assim. Agora, quando eu fazia hora extra, eu saía sete horas. Eu ficava quase todo dia, fazendo hora extra. Quer dizer que o meu horário era sair sete horas. Quatorze anos, eu trabalhei.
P/1 - Eu vou voltar um pouquinho, tá?
R - Pode. Eu estou aqui, às suas ordens.
P/1 - Você sabe, a sua mãe já te contou a história do seu nascimento?
R - Não. É uma coisa que eu não sei se você vai ficar triste ou vai dar risada, (risos) que é assunto que a minha mãe me contava. Às vezes, ela ficava costurando, eu sentava perto dela e ela ficava me contando tanta coisa. Contava do meu pai, quando ele matou um homem, lá em Santa Rita. Ela me contava muita coisa. Aí a minha mãe me contou que, quando ele matou esse homem... e antigamente, a minha mãe também falava... tudo o que eu vou falar é tudo o que minha mãe contava. Até eu contei pras minhas filhas. Eu contava essa história. Eu também contava pras minhas filhas. E até hoje eu conto pros meus netos, se for preciso, que a minha mãe me contava. Aí a minha mãe disse que meu pai tinha muito ciúmes dela. E ele matou esse homem. E ele fugiu. Mas a minha mãe dizia que hoje, quando foge de polícia... mas lá, não. Lá, antigamente, eles se escondiam no mato. Minha mãe falava. Não tinha aquele negócio de presídio, não existia. Ele se embrenhava no mato, pra se esconder. E ele se escondeu. Mas, quando ele fugiu, eu tinha, minha mãe disse que eu era pequenininha, parece que eu tinha seis meses, não sei. Uma coisa assim. E ela me carregando, né? Quando ele fugia com ela, levava ela e levava eu, logicamente. Eu olhava pra minha mãe e falava: “Mamãe, onde é que a senhora dormia?” Ela falou: “No mato, minha filha. Eu dormia no mato”. Assim ela falou. Que, quando eu conto pros meus netos, eles começam dar risada. Eu falei: “Aqui não estou falando mentira”. Falando pra eles. “Não tem necessidade. Estou falando uma verdade que eu já passei, e minha mãe”. Aí eu falei: “Mamãe, mas onde é que a senhora dormia?” “Eu dormia no mato” “Mas assim?” Ela falou: “No mato, minha filha. E você quer saber de uma coisa? Você mesmo, que vinha as cobras”. Ela disse: “Vinha as cobras. Mas sabe o que a cobras faziam?”, ela contando pra mim, ela pegava o rabo da cobra, a cobra, punha na minha boca, o rabo, né? Pra ela poder mamar na minha mãe. Ela fazia isso, pra ela poder mamar no peito da minha mãe. Minha mãe contava. E depois, teve um dia, teve um tio meu, até ele faleceu também, ele me contava: “É verdade que a sua mãe contou pra você. É verdade. Tudo o que ela conta, esse negócio de cobra, é verdade, porque eu vi”. Ele chamava, até, Pascoalino, esse que faleceu: “Mas é verdade, tudo o que tua mãe conta, Zezinha” - porque o meu apelido era Zezinha, né? - “É verdade que a tua mãe passou tudo isso. Ela fazia essa mamada e ia embora”. Agora, se meu pai fosse fazer um movimento, tudo, ela atacava. Então, ele deixava, porque não podia mexer. Ele deixava. Ele via aquilo e ficava quieto. E aí ele levava a minha mãe lá pros matos, pra se esconder de polícia. E no fim deu uma dor de cabeça nele, ele morreu. Não chegou nem a polícia a pegá-lo, porque ele ficou doente. Foi uma doença que ele pegou lá no mato, lá, não sei. E ele faleceu. Eu era pequena, quando ele faleceu. Era muito pequenininha. Aí a minha mãe começou a trabalhar na casa dessa baronesa, mas a baronesa não queria que a minha mãe me levasse. Que a minha mãe desse eu pra alguma mulher ficar olhando, tudo. Minha mãe deu pra uma mulher lá olhar. Mas dizem, depois contaram pra minha mãe que eu chorava muito, que a mulher não me alimentava. Então, o que a minha mãe fez? A minha mãe falou com a baronesa, se podia me levar. Ela falou: “Não. Assim...” - até chamava a minha mãe de Maria - “... Maria, assim não dá, não. Ou você dá pra alguém pra olhá-la, porque pra trabalhar com criança, não dá”. Minha mãe falou: “Eu sinto muito. Então, eu vou embora”. E foi aí que a minha mãe me pegou e veio aqui pra São Paulo. Mas aí eu já estava com quase um ano, que a minha mãe veio aí pra São Paulo. Chegou aí na Estação da Luz. Ela ficou lá, não sei quantas noites lá, dormindo lá na calçada da Estação da Luz, comigo pequenininha. Até depois, essa parte, minha mãe contou que uma família passou e a levou pra trabalhar na casa dessa família, porque eu dormia na rua com a minha mãe. Então, essa família ficou com dó, levou. E a minha mãe trabalhou quase cinco anos na casa dessa família. E eu crescendo. E foi aí que ela arrumou um lugar pra morar na Rua Santa Clara, que ainda tem, hoje. Até hoje. Na Rua Santa Clara. E que foi aí que veio a Revolução de 1932.
P/1 - Ainda na sua infância, eu queria saber se você gostava e se tinha tempo, se você podia brincar?
R - Quando eu era criança?
P/1 - Isso.
R - Eu brincava, assim, na Rua Santa Clara, toda noite. Eu me lembro que eu brincava de noite, assim. Eu brincava...
P/1 - Do que você brincava?
R - Como?
P/1 - Quais brincadeiras que eram?
R - Era, assim, de amarelinha (risos). Eu não lembro de brincar de amarelinha, agora, não, eu não sei como é que era (risos). Amarelinha. Brincava, assim, de roda, corda. Tudo assim. Tudo na Rua Santa Clara.
P/1 - E a senhora tinha amigos, vizinhos?
R - Tinha. Tinha. Tinha amiga. Batia. Porque viviam me chamando de “neguinha” (risos). Quando brigavam, assim. Estudava muito. Tinha horário pra estudar. Minha mãe deixava eu brincar, mas depois que eu fizesse a lição. Tudo isso. Ela soube me criar muito bem. Coitada da minha mãe.
P/2 - Dona Zezé.
R - Oi.
P/2 - E como era a Rua Santa Clara, naquela época?
R - Olha, era uma rua... eu não sei porque nunca mais eu vi. Você sabe onde fica a Rua Santa Clara? É uma travessa da Rua Bresser, sendo pra lá. Conhece a Rua Cachoeira? Então, era assim, logo era a Cachoeira. Eu morava numa casa que era esquina, que era Santa Clara esquina com a Cachoeira. Até quando era o tempo do Circo Piolin, lembra esse circo? Circo Garcia, o Piolin. Era tudo ali, na Rua Cachoeira. Tinha um terreno muito grande e eles armavam lá, o circo. Eu me lembro de tudo isso. Agora, a Brigadeiro Machado, que era a dos bombeiros, é aqui, quase em frente ao Largo da Concórdia, que eram os bombeiros. Eu fui criada aqui no Brás. Aqui no Brás, eu conheço a palma da minha mão. Eu fui criada. Quando casei, fui pra Vila Maria. Também morei muitos anos na Vila Maria.
P/1 - E como era esse circo? Você ia?
R - Era o Circo Piolin, o Garcia. Eram esses circos muito famosos. O Garcia, o Piolin. Acho que não existe mais. Nunca mais eu ouvi falar, o Garcia, o Piolin. Um tempo tão bom, viu? Também, com a minha idade. Só tem mesmo que lembrar de tudo isso. Uma coisa _______, eu estava falando pra minha neta, eu falei: “Meu Deus, mas como esse mundo virou”. Eu estava, assim, na janela, eu vi uma estrela. Lá na minha casa, eu estava. Eu falei: “Meu Deus, uma estrela”. Porque, antigamente, quando eu brincava na rua, eu ficava…
P/1 - Antigamente.
P/2 - ... quando você brincava na rua…
R - Quando eu brincava na rua, de noite, a minha mãe me chamava pra ir dormir: “O que você está fazendo?” “Estou contando as estrelas”. Minha mãe falava: “Não faça isso, não, minha filha, que não pode”. Eu falei: “Por quê?” “Porque, se você contar até cinquenta, é sinal que você vai durar cinquenta anos” (risos). Minha mãe falava: “Você conta as estrelas, são os anos que você vai durar. Não pode”. Mas se você visse que coisa linda era o céu de estrela! E hoje não existe. Não existe, viu? Eu falo, pelo o que eu vi e agora, não existe. Eu vi uma outro dia. Eu comecei a chamar meu neto pra ver: “Olha uma estrela”. Antigamente, meu Deus, como o céu era lindo! Tanta estrela no céu! Então, eu falei: “Meu Deus, mas como esse mundo virou”. Mas como o mundo virou!” O que eu lembro de antigamente e estou vendo agora, não é mais aquele mundo. Não é. Tsc. Não é, não.
P/1 - Quais são as diferenças, além das estrelas?
R - A diferença... que tinha um senhor chamado “seu” José. E ele tinha um armazém, que antigamente era armazém. Se você ia comprar leite, era leiteria, o lugar. Era tudo isso. Não existia mercado, supermercado. Não existia. Tinha sempre um armazém, uma venda. E o “seu” José, coitado, o mataram. Se você visse, veio repórter não sei da onde, não sei da onde, porque era coisa difícil, ter esse negócio de assassinato. Não existia, também. Olha agora! Eu falando tudo isso pros meus netos: “Olha agora!” Por aí você vê como o mundo mudou. Não é o mundo do meu tempo. Não é. Tanta coisa que eu vejo, que eu nunca vi na minha vida, meu Deus! Aí o meu neto fala: “Também, a senhora já está com cem anos (risos). O que a senhora quer?” Ele me “tiram”, viu? Eu estou falando as coisas, eles levam tudo na brincadeira (risos). É tudo isso, a diferença. Então, quer dizer que eu conheci, eu conheci. Pelo tempo de antigamente, o tempo de agora, eu conheci. É maldade de mãe com filho, filho com mãe. É mãe que mata os filhos. Tudo isso é coisa que eu não me conformo.
P/2 - Dona Zezé.
R - Oi?
P/2 - E como a senhora conheceu o seu marido?
R - O meu marido eu conheci porque a minha mãe, quando nós viemos, depois da revolução, a minha mãe mudou. Aí ela foi morar na Rua Major Marcelino, que tem ainda. Ela foi morar numa pensão, comigo. Aí tinha um rapaz chamado Ricardo. E aquele tempo, tinha chalé de bicho. Chalé. Porque hoje é proibido. Naquele tempo tinha aberto, tinha tudo. E tinha um dono do chalé que gostava da minha mãe, porque a minha mãe sempre foi bonita. Eu tenho uma foto dela, em casa, que eu queria tanto ter o prazer de vocês verem. Ela é muito bonita. E ele gostava da minha mãe, o Ricardo. A minha mãe não queria saber. O que ela passou com o meu pai, ela tinha até medo. Mas eu sei dizer que eles acabaram namorando. E ele era dono desse chalé de bicho, na Rua Bresser. Aí acabaram namorando, tudo. E ele pegou e... e a minha mãe era louca por esse negócio de pensão. E tinha uma pensão ali na Rua Bresser que estava à venda, a mulher morreu, a Dona Elisa. Ela morreu, morreu de repente. E o Ricardo comprou a pensão, porque ela morreu e o marido dela logo já vendeu. Aí o Ricardo comprou, pra minha mãe. Ele comprou pra ela. Então, ela era dona dessa pensão. Depois na Rua.... Como é que chama? Agora eu já não lembro o nome dessa rua. Tinha uma outra pensão pra vender, ele pegou e comprou. Quer dizer que a minha mãe era dona de duas pensões. E, quando vinha esse pessoal do norte, se hospedava lá, morava, quando tinha vaga. E o meu marido foi um deles, que veio. Aí eu já era mocinha. Eu acho que eu já [tinha] os meus quinze anos. Eu trabalhava na fábrica de ampola. Aí ele veio. Eu já comecei a namorar, namorar. Fiquei namorando com ele [por] uns três anos. Aí casei. Casei só no civil. Depois de sete meses... não. É, casei só no civil. Depois de três anos, eu casei na igreja. Conhece a Igreja São João? A Igreja São João. É uma igreja que é em frente aquele ali do Edir Macedo, o templo. É uma igreja que é bem em frente. Eu casei lá. E fiquei casada com ele, porque ele morreu, senão, ele estava vivo até hoje... tão bom, ele. Ele era branco, também. Branco. Tive dez, olha só, dez filhos, hein? Mas Deus me levou quase todos. Estou só com uma filha. Ela está com cinquenta anos, essa minha filha. É a única. Eu sempre fui bem-casada, muito bom marido que eu tinha, trabalhador. Eu tive muita sorte, viu? Porque eu sou, assim, feinha, né? (risos) De cor, ainda feinha. Mas ele não viu isso, não. Fiquei muito bem casada com o meu marido. Muito bem casada, mesmo. Meus filhos tudo bonitos, tudo bons. Três morreram de doença, né? Três filhas. Uma com câncer. A outra, a Izilda, com esse negócio que dá nos rins, esse negócio que mexe assim com os rins, com a urina, ela morreu disso. Uma outra morreu de hipertensão, a mais velha, pressão alta. Mas é. Tive dois filhos que mataram. Um mataram aqui. Outro, mataram lá na Vila Maria. Esse da Vila Maria vinha vindo do serviço, o mataram lá na ponte. Assalto, né? Agora, o outro se meteu com briga. Agora, faz pouco, não faz muito tempo, não, o Márcio, ele já morreu, de tanto beber. Moço ainda, bebia, bebia. Faleceu. Quer dizer que cada um foi... tsc. É. Deus sabe o que faz, né? E tem agora essa, a Cidinha, a única. Mas não tem nada, não. Deus tirou os meus filhos, mas me deu os netos. Acho que ele falou: “Não. Eu levei os teus filhos, mas tem os teus netos pra você criar”, como eu crio eles até hoje. Aqui, ó, eu moro há 26 anos, aqui, 25, aqui. Todo mundo aqui, de ponta a ponta, me conhece. Eu vendo na feira, a maioria é tudo minha freguesa. Não estou me achando grandeza. Não estou contando grandeza pra vocês, não. Estou contando uma verdade que está saindo daqui, do coração. Deus está vendo. Não estou me achando a tal, não. Eu juro pra vocês. Mas aqui não tem quem [não] me queira bem. De ponta a ponta, eu conheço. Quando eu vim morar aqui, tinha só cinco barracos. Ali, nessa rua de trás, era um campo. Não tinha barraco. Aí, depois que veio negócio ______ do Maluf, que fez tudo isso. E estou aqui até hoje. _______, graças _______. Crio os meus netos, ________, trabalhar ou não. Se precisar de comida, tem lá. Eu não largo deles, de jeito nenhum. Pode perguntar pra qualquer pessoa, que eu sou mãe e pai dos meus netos todinho, todos. Então, isso é uma provação que Deus me deu (choro). Todos. Eu choro porque, coitadinho dos meus netos, tudo ficou um pouco sem mãe, um pouco sem pai. Então, sou eu que cuido deles. Na doença, em tudo. Eu cuido deles. Dou conselho de alguns que não têm juízo. Estou sempre assim. Eu falei pra você que eu perdi o sono? Eu não durmo por causa deles. Quando eu escuto tiro, que vira e mexe, aqui, solta tiro. Outro dia, a Rota entrou, não sei se foi a Rota, aqui no morro. E eu tenho um neto que mora aí, o Fábio. Ele está aí porque ele quer. Porque eu cuido muito deles. Mas vagabundo eu não cuido, não. Eles podem trabalhar no que eles quiserem, mas parado eu não aceito. Mas também não deixo passar fome. Não deixo, não. E eu não durmo por causa disso, porque eu não sei o que está acontecendo aqui. Toda noite a polícia está invadindo, está dando tiro, dá surra aí nos meninos, que deixa desmaiado. Eu fico com medo que os meus netos ficam de noite. Tem só dois. Tem o Welington que mora comigo. Olha, essa noite mesmo, ele não veio dormir em casa. Então, eu já não durmo, eu fico pensando. Por isso que eu perdi o sono, eu só fico preocupada. Eu não deixo de olhar eles, não. Mas também eu não dou moleza pra ele ficar o dia todo parado. Alguma coisa tem que fazer, eu falo pra ele: “Trabalha. Cata latinha. Faz qualquer coisa. Só que não rouba”, que é a coisa que eu ponho na cabeça deles, nunca fazer isso. Eu peço: “Pelo amor de Deus, nunca pega nada que não é teu. Pelo amor de Deus, não faça isso”. Eu dou conselho pra eles. Mas eu me preocupo. Porque um já não veio dormir essa noite, o Welington, não veio dormir. E é tudo isso. E aí todo mundo aqui me conhece por causa disso: “Dona Zezé, guerreira, é mãe e pai desses meninos”. Não deixo ninguém, mesmo. Então quando chega essa parte, eu choro. Por causa deles. Porque eu tenho muito cuidado com eles. São os filhos que Deus me tirou, são os filhos que Deus me deixou. Então, é uma coisa muito pesada pra mim. Com a idade que eu tenho. Agora, então, que eu saí daqui, se ele ainda não chegou, eu já saio pra ver onde é que ele está, onde é que ele ficou, o que aconteceu. É uma coisa muito chata, viu? Mas do resto, graças a Deus, graças a Deus, eu sempre tenho as minhas compras em casa. Todo mês eu faço compra. Eu ganho dois _______, duas aposentadorias: uma do meu marido e uma de um filho meu, que faleceu, que trabalhava aí no Anhembi. Seis anos, ele trabalhou aí no Anhembi. E ele tem a aposentadoria do Anhembi, que ele ganhava muito bem. Então, eu consegui pegar a aposentadoria dele. Então, tenho duas aposentadorias, mas tudo pros meus netos. Eu faço compra aí, tudo pra pôr comida pra eles. Quando não tem uma roupa, eu dou dinheiro: “Vai em Santana comprar roupa” “Ô, vó. Ô, mainha” - eles me chamam de “mainha” - “Me arruma dinheiro pra cortar o cabelo?” “Dou. Tó, vai cortar o teu cabelo”. É assim que eu vivo. Eu estou vivendo pra eles. Então, eu acho que, pela minha idade, é um pouco pesado. Porque eu não paro de chorar. Ó aí, agora, a minha preocupação que o Welington não chegou. Estou esperando que eu chego lá, ele esteja em casa. Então, é uma coisa que eu vou te falar, viu, filha. Tsc. É a preocupação de uma avó. Porque tem muitas avós que não estão nem aí. Tsc. Eu moro aqui, eu conheço aqui direitinho. É por isso que chega nesse ponto de eu chorar, falando deles. Agora, pra ajudar, veio um tataraneto. Tem dois aninhos. É a minha vida, esse tataraneto. Ontem, a mãe deu nele. Ontem, quando eu estava aqui, eu estava em casa chorando, quando a Laís foi me buscar. Ela não reparou que eu estava chorando, mas por quê? Porque a mãe deu um tapa nele. Ele tem dois aninhos, só. Ele estava assim, com o tapa que ela deu, ele foi parar ali. Dois aninhos só, coitadinho. Eu não posso falar nada, que ela me maltrata, né? Então, eu fico quieta.
P/1 - Dona Zezé, posso voltar um pouquinho?
R - Pode.
P/1 - Quantos anos você tinha, quando você teve o seu primeiro filho?
R - O meu primeiro, a filha?
P/1 - Sim.
R - Eu casei com vinte... o meu marido era mais... eu era mais velha do que o meu marido. Eu casei com 25 anos, parece que eu tinha. O meu marido era... eu era dois anos mais velha do que o meu marido. Assim, na beira dos vinte e poucos anos, mas eu não lembro. Eu sei que eu casei dia oito de setembro. Quer dizer que, agora, dia oito que passou, eu não sei quantos anos eu estava casada. Ainda eu falei, lá. Aí a minha neta falou: “Eu acho que a senhora está completando as bodas de diamante”. Eu falei: “Por quê?” “Setenta e cinco anos” (risos). Setenta e cinco anos. Eu não lembro. Eu sei que eu casei dia oito de setembro, mas eu não lembro. Eu estava beirando vinte e poucos anos, entre eu e o meu marido. Eu era dois anos mais velha do que ele.
P/1 - E você engravidou logo em seguida?
R - Não. Ó, com licença, que eu vou falar. Dá licença, viu? Foi sem querer. Mas eu casei grávida (risos). Eu tenho vergonha de falar. Eu casei grávida. Casei com cinco meses. A minha mãe quase me mata. Ô, meu Deus. A minha mãe tinha duas pensões quando casei. A Marcília era a minha filha. Casei grávida.
P/1 - Você ajudava na pensão?
R - Ahn?
P/1 - Você ajudava na pensão?
R - Ajudava. Eu vinha da fábrica e ainda ajudava a minha mãe a servir os pensionistas, ajudava a empregada a lavar as louças. Que a minha mãe tinha duas empregadas. Tinha a Henriqueta, chamava Henriqueta, que era de limpar e tinha a Donana, que era a cozinheira. Eu as ajudava. A minha mãe tinha tanto pensionista. E era tudo da Itália. A maioria era tudo italiano. A minha mãe tinha que fazer macarronada todo dia. Todo dia fazia macarronada para os italianos. No fim, um dia fugiram, não a pagaram. Eu falei: “Viu, mãe? A senhora agradava. Ó aí”. Coitada da minha mãe! Quando ela levantou, as camas... acho que tinha bem umas dez camas, que tinha um quarto só pra eles. E, quando fugiram, acho que combinaram tudo. Quando chegou de manhã, a minha mãe levantava quatro e meia, cinco horas, pra fazer café pra eles. Quando ela chegou no quarto, estava só mesmo a cama e o colchão. Pegaram a mala, levaram tudo embora, tudo devendo pra ela. Mas ela tinha tanto pensionista, tudo italiano, tudo. Coitada da minha mãe, viu? Minha mãe também pastou tanto na vida, meu Deus. E tinha só eu. Mas é uma vida. É uma história.
P/1 - E quando a sua filha nasceu, como foi?
R - A Marcília?
P/1 - É.
R - Como “quando ela nasceu”, assim? Pode falar.
P/1 - O que você fazia? Como foi se tornar mãe?
R - Ah, gritando. Pondo a... (risos) gritando. Pedindo socorro. Chamando minha mãe. Nessa hora que a gente chama a mãe, né? Minha mãe falava: “Na hora de ter nenê, me chama. Mas na hora de fazer, você não me chamou, né?” (risos) Ela falava: “Fazer escondido, você não me chamou, né? Sem vergonha” (risos). Ai, meu Deus. Eu a tive na Leonor Mendes de Barros. Não. A Marcília nasceu em casa, com parteira. Ela nasceu em casa, na pensão da minha mãe. Ela nasceu... eu tive cinco filhos em casa. Depois o resto foi tudo na Leonor Mendes de Barros.
P/2 - E como era? Chamava? Quando estava pra nascer, chamava a parteira?
R - Chamava a Dona Tereza. Ela morava ali na Rua Frei Gaspar. Ela era curiosa, né, que fala? E ela que pegou os meus cinco filhos. Parteira muito boa, ela. Mas ela xingava, quando eu gritava: “Agora você grita, né? Na hora você não gritava” (risos). Era tudo assim. Ela era muito brincalhona. Mas eu sofri pra ter a Marcília, quase que eu morro. Marcília, minha filha, meu Deus. Tsc. Ela morreu de pressão alta. Tão nova. Nova pra morrer assim, de hipertensão. Agora, os outros, assim, foram tudo, graças a Deus, normal, nunca fiz cesariana. Nunca tive esse negócio de levar ponto, não sei o que. Nunca. Tudo normal.
P/1 - E nessa época, você ainda morava no Brás?
R - Morava. Era tudo na pensão da minha mãe. Quase tudo. Eu casei no Brás.
P/1 - E quando que a senhora veio pra cá?
P/2 - Pra Zaki Narchi.
R - Pra Zaki Narchi eu vim, que eu morava ali na Rua da Coroa. Eu morava num quintal e tinha umas casas. E o dono queria que todo mundo mudasse, que ele ia derrubar, pra fazer não sei o que. E ele deu prazo. Agora, ninguém me aceitava, porque eu tinha os meus netos. Eu tinha... os netos... os filhos pequenos. E casa nenhuma me aceitava, por causa das crianças. Ninguém queria criança. Aí eu peguei e arrumei aqui, com os meus filhos. Nunca tinha morado... era uma favelinha. Eu nunca tinha morado... eu não queria, eu falei: “Eu não, ficar morando, assim, em favela. Eu tenho filho pequeno. É briga”. Aí eu comecei a... mas tive que morar, porque eu tinha prazo pra ficar na casa, senão o dono ia me despejar. Aí eu vim morar aqui. Tinha cinco, uns cinco ou seis barracos, tinha.
P/1 - Como era aqui?
R - Era essa rua aqui, você vê, é movimentada, nesse tempo ainda era um campo grande, um campo. E aqui era tudo campo. E aqui, agora você está vendo esse conjunto aqui de apartamento? Eu vim morar aqui, mas aqui era um... não, tinha um barraco e o homem estava vendendo. E eu comprei. Aqui onde está esse prédio. Ali, aquele lugar era o primeiro barraco que eu morei. E estou aqui até hoje. Depois de lá, eu fui pro morro. Depois o morro pegou fogo. Porque esse morro, já são três vezes que pega fogo. Pegou fogo e depois vieram os apartamentos. Estou aqui, até hoje. Eu não estou nem pagando mais aluguel porque, com vinte e cinco anos de habitação, parece que não cobra mais. Agora, eu preciso ir lá pra saber, porque eu pago aluguel. 57 é aí, o aluguel. Cinquenta e sete, você acredita? Mas eu não deixava de pagar. Eu pagava. Agora, me falaram aí, um senhor falou pra mim: “Não, Dona Zezé, a senhora tem direito de pagar mais, não. 25 anos”. Agora, eu preciso ir lá pra ver, porque eu não estou recebendo mais o carnezinho. Eu preciso ir lá pra ver. E agradecer, né?
P/1 - E Dona Zezé... diga. Pode falar.
R - Não. Eu não ia falar coisa que... eu nem sei o que eu ia falar.
P/1 - Eu queria que você me contasse um pouquinho como era a vida aqui, naquela época?
R - Aqui, na Zaki Narchi?
P/1 - É. Como os jovens se divertiam? Que conselhos você dava pros seus filhos?
R - Não. Aqui eu tinha medo, porque... bom, é um pecado eu falar, porque eu estou num lugar que eu agradeço a Deus, primeiramente. Mas de contar, eu acho que, se eu não contar, outras pessoas contam, entende? Mas era muito... aqui era assim: quem tomava conta, era - eu vou citar o nome - o Nei, um tal de Nei. Mas ele era o chefão, aqui. Mas você sabe que com ele não tinha conversa. Qualquer coisa que acontecia, ele matava. Então, quando eu mudei, eu não tinha geladeira, eu não tinha um chuveiro, que eu me lembre. Bom, eu sei dizer que uma mulher que morava ali, chegou na minha casa... aí eu comprei uma geladeira usada. E a pessoa que vendeu, mandou pra mim. Aí essa vizinha chegou lá, falou: “Ô, dona, a senhora que vai morar aqui?” Eu falei: “Sou”. Ela falou: “Olha, eu tenho que avisar uma coisa: o meu marido não queria que eu avisasse a senhora, mas eu vou avisar, que a senhora tem tanta criança, dá dó. Mas a senhora toma cuidado porque, quando entram móveis aqui...” - e ela falou o nome deles, eu não lembro, porque eles tinham um nome, a turma - “... eles vêm e tiram. E a senhora não pode falar nada, hein? Senão, a senhora morre. A senhora, não. Mas, se a senhora tem marido, tem filho, tudo, eles se vingam”. Ai, pra que ela foi falar isso! Eu queria ir embora na mesma hora, mas pra onde que eu ia? Aí eu comecei a me pegar com Deus. E era o Nei, né? Ele era o chefão aqui, meu Deus do céu! Você conheceu a história do cangaceiro? Não conheceu, né? Hum. Ele era pior do que o cangaceiro. Ele matava. Eu tenho uma amizade com a mulher dele, hoje. Tenho uma amizade. Ela não mora aqui, ela mora em Santos. E um dia desse eu recebi um recado dela, que ela vem me ver, a mulher dele. Meu Deus do céu, mas como ele era ruim! Meu Deus do céu! Ele tinha um irmão que mora em Santos, era o Nenê, ele tinha o apelido de Nenê. Ele vinha, no dia de pagamento, que até hoje tem, o dia 25, né? Aquele tempo, vamos dizer, dia dez, vai, todo dia dez, aqui passavam os ônibus, os ônibus passam. Aí ele vinha de Santos. Ele ficava sentado numa mureta que tinha ali na avenida, assim, pra sentar. Ele, com uns três ou quatro, ficavam sentados. E tinha um ponto de ônibus bem aqui. E, quando o ônibus parava, que descia o povo, alguma pessoa, eles assaltavam. Era assim o negócio. O irmão do Nei, o Nenê, que fazia isso. Era tudo no meu tempo, de quando eu vim morar. Uma coisa muito triste, viu? Tem o Eliseu também. Eu não sei se você conhece o Eliseu. Se eu não me engano, a mulher dele, eu acho que vem aqui, que eu a vi, a mulher dele. Ah, ele também era triste! Ele é irmão de um tal de Elias. Ai, mas como o Eliseu era triste, meu Deus do céu! Tsc. Quanta vida que ele tirou! Ele também gosta muito de mim, me compra tempero. Porque eu vendo tempero, mas não na feira. Eu vendo em casa. Eu tenho muita freguesia e elas vêm tudo na minha casa, comprar. E a mulher dele é uma que é minha freguesa. Quando não vem ela, vem ele. Ai, mas quanta vida que ele já tirou, meu Deus do céu! Era tudo assim, no tempo que eu vim. Muita violência. Muita maldade. Eu, graças a Deus, nunca mexeram comigo. A mulher falou: “E ele tira geladeira, tira o chuveiro que a senhora comprou e a senhora não pode falar nada”. Mas, graças a Deus, nunca ______ pra tirar nada. Nada, nada. Até hoje, eles me respeitam. Porque até hoje tem, viu? Tem. Mas me respeitam, me chamam, tudo, de mãe, de avozinha. É assim que eles me tratam. Mas também eu não dou motivo. Meus netos, também, são levadinhos, mas não de mexer com os outros. É assim, querida, quando eu vim morar. E eu adoro aqui. Eu gosto muito daqui. Gosto de todo mundo.
P/2 - Quando que a senhora fez a feira, aqui?
R - A feira?
P/2 - É.
R - Que eu trabalhei?
P/2 - É.
R - Olha, eu sou franca em dizer pra você: eu tenho máquina. Eu tenho uma máquina de moer os temperos. Mas elas custam caro. Custa mil, mil e pouco. E eu tenho uma. E essa minha... e um neto meu, que eu tenho, que é muito levado, um gordinho, estava brincando em cima da mesa e ele deixou cair uma moeda dentro da máquina. A moeda, olha só! Aí não podia mais trabalhar. Bom, deixa eu encurtar a conversa. Eu a levei pra arrumar num homem que tem ali em cima, em Santana. Olha, está fazendo quatro meses que a minha máquina está lá e ele não acha a peça. Ele não acha. Ele falou: “Dona Zezé, não tem, não existe mais essa peça dessa máquina, não”. E está lá, a minha máquina. Eu fui ver uma, mas está mil e duzentos. Eu fui ver, mas eu não posso. Porque eu ganho, sim, mas sabe aquele dinheirinho que é tudo contadinho? Que, se a gente tiver que tirar... eu mesma, se eu tenho que comprar alguma coisa pra mim, eu já não compro, porque já faz falta. É uma coisa que na minha casa é tudo direitinho. Pago o gás. O gás. O gás, água. O condomínio que eu tenho que pagar. A água. A água é de uma companhia aí, chama Lusitana e a água vem deles. Não é assim da Sabesp, vem dessa companhia. Mas tem vez que vem duzentos. Ó, eu preciso pagar até quatorze, 241, de água. Tem que pagar. Quer dizer que, se eu vou tirar do meu dinheiro, já faz falta. Tem que tirar. Ainda ontem, eu estava falando pra minha neta: “Jaqueline, e o dinheiro da água, pra dia quatorze?” Ela falou: “Ah, mãe. Eu tenho cem reais, guardado”. Então é assim, é um dinheiro que é contadinho. Não tenho dinheiro sobrando. Não é porque eu ganho duas aposentadorias, que sobra. Não sobra, não. Porque eu tenho as minhas contas. Eu sou muito correta com as minhas contas. Essa menina aí que tem esse bar aqui pegado, você viu esse barzinho? Eu tenho que dar trezentos reais pra ela. Porque ela me dá fiado. Ela vende pra mim e mais duas. O resto ela não vende, porque ninguém paga. Então, ela dá fiado pra mim e pra mais duas. Eu tenho que dar. E eu quero pegar a máquina, comprar e não posso. Então, eu comprando a máquina, domingo agora eu já começava a trabalhar. Porque eu tenho muita freguesia, porque os meus temperos são muito bons. É tudo tempero do norte. E é coisa tudo pura que eu compro. Porque o colorau, tem o colorau, que tem quatro qualidades de colorau. Mas nas três é tudo misturado, misturam fubá, tudo, pra aumentar. E o meu não. O meu é puro. É colorau Paraíba. Ele é purinho. É o mais caro. E eu o compro. Eu compro todas mercadorias boas. Eu não compro mercadoria com mistura. Eu não faço isso. Eu não faço. Eu tenho dó. Agora, assim, você quer um colorau e eu ponho e misturo fubá? Eu tenho dó. Eu não faço isso. Então, é por isso que eu tenho freguesia, que eles sabem que eu sou assim. Então, eu falei pra minha neta ontem: “E domingo, né, já?” Ela falou: “É, mãe. Precisa ver a máquina, né?” Então, é isso. Mas se eu tivesse a máquina, eu já trabalhava até domingo. Eu, não. A minha neta, que eu dei a barraca pra ela trabalhar, que eu não posso.
P/2 - Sempre foi de tempero?
R - Ahn?
P/2 - Sempre foi tempero que a senhora vendeu?
R - Sempre. Sempre. Até a hora que vocês precisarem. Mas sabe o que eu vou fazer? É uma amostra grátis. Pode ir, é no quarenta e dois. Pode ir buscar: tempero baiano, o colorau. E agora tem um tal de tempero que chama “espera marido”. Você acredita, esse nome? Mas diz que é uma maravilha. Diz que a comida fica uma delícia. Chama “espera marido”. Olha, se eu estivesse lá, eu ia trazer pra vocês, antes de vocês irem embora. Que eu moro aqui. Mas eu não tenho. A minha neta precisava ir buscar amanhã. Mas vocês não vêm na semana que vem aqui? Vêm? Vocês também? Ah, então eu vou trazer pra vocês um pouco, tá? Então, senão eu já trabalhava domingo. Mas a máquina está muito cara. Eu paguei oitocentos, essa. Agora está 1250. Eu não. A minha neta trabalha.
P/1 - Ô, Dona Zezé, mas como era? Você trabalhava na barraca?
R - Na barraca.
P/1 - Como que era?
R - Ah, eu levantava cedo. De sábado eu ficava moendo, preparando tudo. Sábado à tarde todinha, pra eu trabalhar domingo. Preparava tudo, tudo, tudo. Tem que ter saquinho. Ih, tem que... é um trabalho, viu? Trabalho, não, que pra mim nunca, nada é trabalho. Eu preparava. Quando era domingo, seis horas, seis e meia, o meu neto me ajudava a levar a barraca. E ia até duas horas, duas e meia. Quando eu ia na feira, que eu ia na feira e, quando calhava que eu podia ir, que eu tinha um tempinho pra chegar até a feira, eu deixava lá, o peixeiro lá, tomando conta da barraca, eu ia com o dinheiro na mão e voltava. Os feirantes não pegam dinheiro meu: “Ah, é pra Dona Zezé, é pra vozinha, é pra mainha”. E até hoje o peixeiro me manda peixe. Até hoje. Domingo. De domingo, quando a minha neta vem, ela vem com um peixe que o Paulinho me manda. Peixe pra mim. Era assim a minha vida. Mas o que vai fazer? Deus quer assim, não quer que eu vá mais, eu não vou.
P/1 - Dona Zezé, como foi sair do barraco aqui e subir pro morro?
R - Foi assim: que estava construindo os apartamentos, estava construindo. Então, foi assim, que nem uma... assim, que nem, vamos dizer, um sorteio, vamos falar assim, já, de escolher as pessoas que iam pegar apartamento. As pessoas que iam pegar apartamento, até ficar pronto, iam pro morro. E eu fui escolhida. Aí eu fiquei no morro, quase um ano, um ano e pouco, até o apartamento ficar. Aí saiu, assim, entre eles, que senhoras idosas, mulheres gestantes e mulher que tinha filho pequeno pegavam só as partes de baixo. Não podia pegar em cima, por causa da idade, da mulher gestante e das crianças. Que nem, tem uma vizinha aí, a Dona Severina, ela perdeu um filho. Ele caiu do quarto andar, ela perdeu. Então, falaram não sei pra quem foi aí. Foi pra essa também, que é... ela mora até ali. Eu sei que o assistente social falou pra ela, falou: “Olha, a Dona Zezé tem que pegar no primeiro andar, por causa da idade dela”. Mas eu não sei. Não. Não foi, não. Por causa que ela tem as crianças. Ah, eu não sei como é que foi, eu sei que eu fui parar no quarto andar. E eu não queria, né? Porque eu tinha criança. Mas quando foi ver, já não tinha vaga. E estou no quarto andar até hoje. E até hoje, as minhas pernas doem. É quarto andar, né? Às vezes eu passo, até, quinze dias, dez dias, sem descer. Por causa dessa tontura minha que eu caí duas vezes na escada. Por causa da tontura. Só por causa disso. Se não fosse a tontura, eu ia trabalhar, mas eu não posso.
P/1 - Você falou dos incêndios. Quando você estava no morro, teve?
R - Ah, não. Quando teve incêndio, eu já não morava no morro. Eu não estava. Mas do morro eu fiquei com duas lembranças de incêndio.
P/1 - Quais?
R - Agora, quer dizer, agora, agora há pouco tempo teve o último. Parece que faz uns meses. Quebrou o meu vidro. O calor arrebentou o meu vidro da varanda e da sala. Agora, do outro incêndio, foi uma cortina minha que, com o calor, ela chegou a pegar fogo. Porque eu moro bem... daqui vê o meu apartamento. E ali o morro. Quer dizer, o calor, né? Mas eu morar mesmo no incêndio, não, não cheguei. Eu já morava no apartamento.
P/2 - Mas dá medo?
R - Ahn?
P/2 - Dá medo?
R - Olha, pra mim dá medo, dá tristeza, entende? Que nem o meu neto. O meu neto mora lá. Ele ficou doze anos na minha casa. Porque pegou fogo, queimou tudo dele, tudo: fogão, guarda-roupa, roupa. Ele ficou com a roupa do corpo. Eu dei dois cobertores pra ele. Eu dei. Mas ele ganhou muita coisa, até televisão ele ganhou. Ele está lá. Me dá tristeza. Que tristeza ver aquele povo com criança. Tudo encostado. E estava um frio esse dia que pegou fogo. Vendo aquela mulherada tudo sentada lá. Coitado, com criança. Eu ajudei o meu neto. Eu dei dois cobertores, o deixei ficar dois dias aí. Depois vem a prefeitura, logo. A ajuda que a prefeitura dá é uma benção, né? Logo no dia seguinte eles vêm com comida, vêm com tudo, colchão. Aí o meu neto conseguiu pegar um colchão, alguma coisa e foi se virando. E está lá com a mulher dele, lá. Eu tenho dó. E está arriscado pegar outro, viu? Está arriscado, que um dia desse aí, diz que o dono, diz que estava lá, assim, com drogas, não sei. E ele caiu. Aí viram fumaça, já estava pegando fogo, o barracão dele. Já correram. Está fazendo uns vinte dias. E é assim, minha querida, a minha história do Brás, minha história um pouco aqui do Zaki Narchi. Agora é esperar Deus, quando lembrar da velha.
P/1 - Dona Zezé.
R - Oi, querida.
P/1 - Pensando um pouquinho no passado e hoje em dia, quais são as transformações que você enxerga aqui, na Zaki? O que mudou, o que continua igual?
R - Aqui?
P/1 - É.
R - Olha, igual, continua, assim. Igual, [o que] continua, eu sou muito franca a dizer, igual, vamos dizer o português claro, da ruindade, da maldade. Eu acho que a gente aqui, aqui eu considero uma família pra mim, todos, de tanto que eu gosto daqui. Gosto de todo mundo. Tenho amizade com todos daqui. O que eu... olha, quando eu ganho peixe demais, eu começo a pensar pra quem eu vou repartir. Eu sou assim. Essa parte, né? Agora, da outra parte, eu nem sei o que falar. Porque é das mulheres que brigam. Assim, tem briga todo dia, de mulher se agarrando. É uma que rouba o marido da outra (risos). É uma que rouba namorado da outra. Então, é esse ambiente que vive, de ter briga todo dia, quando a polícia cisma de vir soltar tiro aqui, que tem muita criança. E é essa... é só isso que eu vejo, cada um nas suas casas. No tempo meu... é só essas duas coisas que eu te falei. Que aqui tem mandão. Tem. Aqui tem mandão. Manda. Que nem ó, deixa eu contar só essa parte. Porque eu estou pegando…
P/1 - A senhora estava contando, tinha alguma coisa ali...
R - Não. Que tem uma parte aqui, ali, que está vazio. É da Dona Maria. Não é querendo falar mal dela, que ela já deu entrevista. Mas, se der, eu não estou falando mal dela, não. Ela tem uma parte lá, que ela tem dois barracos e ela usa. Porque aí é assim: cada um tem as suas partes. Ela usa. Então, eu sei que ela usa lá, vai. E tem uma parte que ela tem um caminhão. E as vizinhas aí estão se queixando que está aparecendo muita ratazana. Aí descobriram que foi do caminhão dela, que está criando aquelas ratazanas. Porque você vê, quem mora aí embaixo é ruim, porque elas vão. Já pensou, ratazana? Então, falaram com ela e ela disse que não ia tirar o caminhão. A minha filha, que é médica, que só vem da Jaqueline, que é essa que trabalha na feira, ela é muito médica. Mas é uma menina que já, até a convidaram pra ela ser daí, não sei o que e ela não quer saber. Não é que ela é médica. Ela, quando tem que falar as coisas, ela fala. Não ofendendo, mas fala. Assim, que não tem medo, ela fala o que é certo. Ela é assim. O povo sabe que ela é assim, que é essa que trabalha na feira, pra mim. Então, ela falou pra mim: “O médico...”, porque foi um médico do pronto-socorro que me proibiu de trabalhar. Tem dois médicos. Aí até um deles falou: “Eu vou mandar um segurança lá na Zaki Narchi, no domingo. Se a senhora estiver trabalhando, eu vou mandar prender a senhora”. Bom, ele brinca comigo. Mas ele falou e não falou brincando, o Doutor Sérgio, ele me proibiu de trabalhar. Eu combinei, eu não quero largar da feira. Eu falei: “Jaqueline, eu não quero largar”. Bom, tudo bem. Mas ela também... porque ela é separada do marido, ela tem quatro filhos. E ela precisa trabalhar, né? E ela falou... eu falei: “Jaqueline, você não quer sair de lá do Paulinho e fazer a feira pra mim?” Então, combinou que ela vai ficar no meu lugar. Combinou tudo isso. Mas eu queria ajudá-la na feira e ela não quer que eu vá. Então, uma vizinha aí, pegou e falou pra ela: “Jaqueline, por que você não pega uma daquelas partes lá e faz uma barraquinha? E você... é até melhor pra você. Porque muita gente, às vezes, pra não subir lá em cima, deixa de comprar tempero”. Só de pensar de subir a escada, elas não vão comprar. Então, a vizinha falou: “O povo vai, às vezes, pra não ir lá em cima, não compra. E aqui embaixo...”. Aí tudo bem. Então, a Jaqueline falou com a Dona Maria: “Dona Maria, dá pra senhora tirar o caminhão?” Aí, a mulher ficou doida. Até chamou os meninos aí, aquela confusão. Aí ela falou: “Não. Ela vai tirar. Porque, se ela já tem dois lugares dela, por que ela está ocupando de um que precisa?” Minha neta falou. É uma coisa que deram razão pra ela. Bom, eu sei dizer que ela pegou, falou com o chefão daqui. Ele é bravo. Ele não mora aqui. Ele mora ali numa favela lá, não sei qual vila que é. Mas o que acontece aqui, falam pra ele e ele vem com a turma todinha. E quando ele vem, ele não vem pra brincar. Aí é pra bater, é pra muitas coisinhas. Aí a Jaqueline falou com ele e ele deu razão. Aí ele falou: “É pra vozinha, né?” A Jaqueline falou: “É. É a banca da minha...”. E ele me chama de “vozinha”: “Não! Pode... ela vai tirar esse caminhão!” E deu tempo pra ela tirar. E ela, eles ficaram com medo, tudo. E ela tirou. E está lá, o lugar. Vazio. E está lá. Agora... e eles vão me dar a barraca, pra mim. Eles mandaram dizer pra mim, pra eu não comprar nada, assim, pra armar a barraca, que eles vão dar. E eles mandaram perguntar pra mim, se eu quero de lona, ou se eu quero... como é que chama? De bloco, né? Aí eu falei: “Não, de lona”. Então eles falaram, o moço mandou me avisar: “Não. Fala pra vó vir aqui, que nós vamos dar o dinheiro pra comprar os materiais”. Parece que até hoje ou amanhã vai armar a minha barraca. Ele. E é isso. Quer dizer que tem uma parte que eles fazem maldade, tem uma parte que eles também ajudam. É tudo no certo. Vocês estão vendo? O que é certo, eles apoiam. Estão vendo? Está errado, eles também não gostam. E o meu caso é esse. Tudo isso. E foi essa pergunta que você me fez, não foi? Então. E é isso. Comigo é esse o problema. Eu nem sei. Eu sei que foi tudo a Jaqueline. Eu não abri a boca pra nada. Eles vão me armar uma barraca ali.
P/1 - Dona Zezé, como foi a pandemia, aqui? O que essa pandemia mudou? Ou não?
R - Na minha família?
P/1 - Na sua família e aqui na Zaki.
R - Aqui na Zaki, graças a Deus, eu acho que foi bem difícil eu saber de gente que pegou. Aqui na minha casa está tudo em ordem. Eu mesmo estou aqui, estou sem. Hoje, a mulher falou pra mim: “Ô, Dona Zezé, e a máscara?”. Eu falei: “A minha cara já não é uma máscara?” (risos) Até vou sair daqui, vou ver se eu compro, porque a minha... porque a gente tem que usar só umas duas, três vezes, né? Precisa sempre mudar. Então, a minha já faz uma semana que eu comprei, que eu tenho, mas está tudo bem, graças a Deus, que Deus está pondo a mão aqui, porque é bem difícil eu escutar [sobre] a pessoa que pegou doença. Escuto falar disso aí, porque vai, mas com outro problema. Não com esse. Graças a Deus. É bom.
P/1 - E, Dona Zezé, algum neto seu participa da escolinha de futebol, ou faz alguma atividade aqui?
R - Tem. Tem o meu netinho, o Wiliam, está começando a jogar. Tem o pequenininho, que é o bisneto, ele está na creche. Agora, tem um gordinho, que ele é tão gordo, que tem apelido de Tourão. Porque tem apelido de Tourão, o meu neto, esse que não veio dormir, ele tem apelido de Tourão. E o pequenininho, que não quer ir pra escola de jeito nenhum. Ele já vai fazer sete anos, não quer ir pra escola. Todos os outros... a Ketlen vai começar a estudar, que ela fez a oitava. E ela parece que vai ver se pega pra trabalhar no Banco. Numa parte do Banco que tem, ela quer ver se pega. Na minha casa, é esse problema de estudar. É esse problema.
P/1 - E, Dona Zezé, como funcionam as doações? Aqui tem? Como é esse trabalho coletivo? Existe?
R - Existe. Muito bem, sim. A prefeitura, mesmo. Agora, esse tempo que está tudo isso, eles não descuidaram. Porque quando eu recebo uma cesta básica, sempre a pessoa fala: “É da prefeitura”. E, graças a Deus, não estão esquecendo da gente, não. É uma coisa muito bem feita, a prefeitura. Eles não esquecem das pessoas. Eu acho muito bonito, viu? Tanto das pessoas, como na parte de estudo. Também. Às vezes, muita gente fala mal da prefeitura. Mas falar o quê? Eu, pra mim, eu acho que eles são bons em tudo. Porque tudo, dizer que é de ruim, sempre é a primeira a estar presente, não é mesmo? Que nem agora, o tempo do frio, eu estava vendo pela televisão, os caminhões vindo com colchão, com aqueles kits com agasalho, com tudo, até... ai, uma coisa linda, viu? Eu acho muito, o serviço muito bonito, o de prefeitura. Eu acho. Porque quando acontece alguma coisa, eles são os primeiros. São os primeiros a acudir. Quando pega fogo aqui, nossa! No dia seguinte, tem que ver: é colchão, é comida, é roupa. É tudo. Eu gosto, porque eu gosto de fazer bem. Eu apoio. Porque quer ver uma pessoa gostar de fazer bem, sou eu, viu? Nossa! Quando eu ganho muita coisa da feira, eu reparto com as minhas vizinhas. Eu começo a pensar aquela que não está com a vida muito boa, eu chego lá e dou peixe. Eu sou louquinha pra estar ajudando os outros. O meu marido é que xingava. O meu marido, nossa, teve um dia que ele até me bateu. Casada, foi a primeira vez que ele me bateu. Só porque eu dei... porque ele comprava tudo em saco. Era saco de arroz, era assim a despesa do meu marido. O meu marido ia embora, trabalhar, eu falava pra vizinha: “Traz uma vasilha, traz”. (risos) Ela vinha. Olha eu enchendo de arroz e feijão. Os meus filhos contavam pro pai e eu apanhava. Eu sempre fui assim. Eu não sei por que, viu? Eu gosto de não ter nada demais, eu acho que pra mim é muito. Eu sou assim, eu trago esse negócio, viu? O povo fala: “É por isso que Deus ajuda a senhora, Dona Zezé. A senhora é muito boa”.
P/2 - Dona Zezé, a senhora falou que queria ser professora.
R - Queria.
P/2 - A senhora sempre gostou de ler?
R - Até eu já não falei pra você, aquela hora, como eu gosto de ler e escrever? Eu tenho loucura pra ler. Quer me agradar, me dá dois livrinhos, me dá um pouquinho de revista. Eu te abraço, eu te beijo, de tanto que eu gosto. Não sei porque, viu, que eu gosto tanto de ler, assim. Eu durmo lá na sala e, assim, num cantinho, se você for em casa, você vê, perto da janela. Até a Jaqueline, ontem, estava achando ruim comigo: “Ô, mainha, vê se arruma outra biblioteca, que aqui não dá” (risos). Eu tenho duas caixas cheinhas de revista. Ali tem Contigo, tem essas revistas. Tudo cheia. Na outra caixa... ontem, Jaqueline foi em Santana, foi buscar o meu remédio, eu falei: “Passa no ‘seu’ Célio”. Ela passou e me mandou duas revistas. Eu falo pra passar lá, pra ele mandar revista. Agora, eu tenho que ler aquelas duas que ele me mandou, um jornal que ele me mandou agora. Ai, meu Deus. E está lá (risos). Agora, eu chego lá e vou ler. Ai, como eu gosto de ler, meu Deus do céu! Eu gosto, viu? É gostoso, né? Escrever também. Eu tenho tudo isso, a ‘veinha’ aqui, que em novembro vai fazer noventa e sete anos (risos).
P/1 - O que você gosta de escrever, Dona Zezé?
R - De fazer?
P/1 - O que você gosta de escrever?
R - Ah, qualquer coisa.
P/1 - Qualquer coisa.
R - Nossa! Escrever uma carta, assim, sabe? Mas eu quase não escrevo cartas. Quase não escrevo. Não tem pra quem escrever (risos). Mas eu gosto.
P/1 - E como é o seu dia a dia, hoje?
R - Ah, minha querida, velhinha assim, só sentadinha no sofá, vendo televisão. Agora eu vou ler as minhas revistas, que o Célio me mandou. A minha neta que faz a comida. Eu limpo ali, um canto que eu durmo, assim, no sofá. Que eu durmo ali, no sofá. E é assim. É tão ruim, né? Pra mim é ruim. Porque eu fico só nessa vida, todo dia. E não posso descer. Às vezes, eu vou na casa de uma vizinha minha, lá. Subo lá, converso. Mas eu não gosto de ir lá, porque ela tem um cachorrinho, ele gosta muito do meu colo, viu? É só eu sentar, ele vem. Eu falo: “Ai, Luzia, eu não venho mais. Tudo por causa da...” - ela chama, olha só o nome: Catarina. Olha só o nome da Catarina. E é assim a minha vida, todo dia. Todo dia. E é chato, viu? Pensa bem, todo dia aquela mesma coisa. Por isso que gosto de ler, eu fico lendo. Que coisa, meu Deus do céu! Eu nunca pensei que, depois de velha... eu nunca pensei. Ainda quando tem alguém pra gente conversar, né? As minhas vizinhas, coitadinhas, não têm tempo pra nada.
P/1 - Dona Zezé, a gente está acabando e queria saber se você gostaria de contar mais alguma história, de algum momento da sua vida, que a gente não tenha te perguntado. Ou de alguém importante.
R - Olha, minha querida, eu acho que eu já contei tudo, viu? O que eu estou falando, eu estou só vendo cabeça lá na janela (risos). Acho que estão tudo olhando de cara feia pra mim. Acho que eu vou sair, eu vou apanhar (risos). Eu vou apanhar. Vocês são culpadas. Eu já vi umas três, quatro pessoas. Tem uma ali que ficou me encarando. Acho que eu vou apanhar dela (risos). Não. É assim, sabe? É o que eu contei pra você, quando eu vim de Santa Rita. Tudo da minha mãe, que a minha mãe também sofreu um bocado pra me criar. Ainda bem que ela me criou, né? Porque senão ela não me jogava no lixo, que ela não gostava de preto. Ela não gostava, não. Minha mãe não gostava. Meu Deus! Ela desfazia na cara. Eu me lembro. A Henriqueta, que era empregada dela, era neguinha, ela xingava a mulher. Eu ali e ela xingando a mulher de preta. Nossa! Acho que eu contei, até, coisa a mais. Não sei, não. É tudo isso que eu contei pra você. Eu até te contei do meu dia-a-dia. Eu contei coisa dos netos, assim, né?
P/1 - E como foi se tornar avó?
R - Ahn?
P/1 - Como foi se tornar avó, ter netos?
R - Bom, um pouco foi raiva, né? Foi raiva. Não. Foi raiva porque as minhas netas casaram grávidas, né? Mas eu tinha vontade de bater. Eu não reparo a barriga, quando disse isso. Não é que xingava. Era tudo brincadeira, a palavra. Depois ajudei a criar. Tem essa parte, que eu ajudei a criar os meus netos, os pequenininhos. Os bisnetos, eu ajudei a criar. Ajudo até nesse momento, que eu vinha vindo, outro já vinha falando, me pedindo dinheiro pra comprar um chocolate: “Mainha, dá dinheiro pra comprar um chocolate” “Vai pra lá, Davi, que eu vou chegar logo”. É assim. Agora eu vou lá no bar e compro um e levo pra ele. É assim o meu dia-a-dia com os netos, com os bisnetos. Agora tem o tataraneto. Mas você sabe que eu estava falando uma coisa pra não se queixar, por causa de... mas eu tenho ocupação, viu? Eu tenho. Com a cabeça, principalmente, eu tenho, sim. Eu tenho. Se eu não tenho o que fazer, eu tenho muito o que pensar.
P/1 - E, Dona Zezé, quais são os seus sonhos?
R - O meu sonho? Assim, do que eu quero ainda viver, assim? É esperar por Deus, que ele sabe o que faz. Procurar - não sou eu que estou falando, é o meu coração, eu juro pra você - ajudar os outros, se for preciso. É a minha primeira coisa, que eu penso, no que precisar de mim. E levando a vida e Deus me dando força pra cuidar ainda dos meus netos, pra eles terem cabeça mais no lugar. E a minha barraquinha ir pra frente, que eu estou pedindo a Deus que vá pra frente. Aí eu já contei, porque eles vão descer, né? A barraquinha vai ser bem ali. E ficar ali. E Deus me dar ainda, força, saúde, porque eu peço muito pra ele, pra não desamparar a Jaqueline com os filhos. É só isso que eu penso. Eu quero o melhor pra todos os meus netos, bisnetos, tataranetos. E não deixar de pensar nos outros, também. Só. Principalmente se for na minha frente ou eu souber. Tudo isso. Só isso eu peço a Deus, pra me dar força e saúde. Porque você vê os médicos aí do pronto-socorro de Santana, quatro me conhecem. Eles ficam bobos. Um deles falou: “Ô, Dona Zezé. A senhora quer fazer o favor de… eu não vou dar uma receita pra senhora”. Eu falei: “Não sei, Doutor, eu não sei o que eu tenho”. Ele só dá risada. “E a senhora, quando vai embora, deixa uma pra mim, viu?”. Eu falei: “Eu, doutor?” “É. Pra senhora chegar nessa idade e ser lúcida. Como é que pode?” Aí, nessa hora, entrou um médico no consultório dele e ele fez assim: “Como é que pode essa velhinha aí? Olha. Lúcida. Agora me pergunta o que ela tem?” Diz que eu não tenho nada. Só estou com uma anemia. Acho que é por isso que tenho essa tontura, é anemia. Porque eu não sou de comer. Eu não sou de comer. Nem dormir, nem comer. Então, o médico falou: “A senhora não tem nada. Não tem hipertensão. Não tem colesterol”. A única coisa que está me estragando, que parece que eu melhorei, são os ossos, fracos. É osteoporose. Estou boa. O meu sangue é bom. O meu coração, bom. A pressão está sempre treze, quatorze. É isso que a “veinha” tem. Agora, dá tontura, aí eu penso, não é que ele falou. Eu. É anemia. Eu não como. Eu não tenho vontade de comer. Pra eu comer um pouquinho, eu começo a tomar limonada. É. Eu pego a limonada e bebo, pra dar aquela vontade de comer. Então, é anemia que eu tenho. Eu acho que é isso a tontura. O médico falou: “A velhinha aí não tem nada. Me dá a receita aí, Dona Zezé”. Eu falei: “Levanta daí, que sento eu, aí”. Eu brinco muito com ele. Ele é tão bom! Mas tem que ver que médico, viu? Tão humilde. Ô, mas que beleza. Ele falou isso, que eu não tenho nada. Então é Deus, né? É Deus que está me conservando. Porque Ele acha que ainda eu tenho que ajudar muita gente. E criar os meus netos.
P/1 - Dona Zezé, como foi passar essa manhã com a gente, contar um pouquinho da sua história, rever algumas cenas na cabeça? Como foi, pra senhora?
R - Olha, minha querida, vou te falar de coração. Pode confiar em mim. Eu estou sentada aqui, não estou inventando, não estou querendo ser a tal, não. Parece que não sou eu que estou falando, é o coração, entende?
P/1 - Sim, eu tenho certeza.
R - Porque, olha, eu vou falar uma coisa pra você: tem um Deus no céu. Tem, existe. Deus existe. Muita gente não acredita, mas existe, sim. Eu estou pedindo pra Ele, agora, se eu falei uma mentira pra vocês. Ele que toma conta de mim. Falei tudo o que tinha que falar, tudo. A verdade. Falei tudo, tudo o que eu sentia. Olha o que eu fui contar pra vocês, até aquele negócio que a minha mãe me deu de mamar, que veio a cobra. Uma coisa que eu acho que não tinha nem que contar, uma coisa, mas contei. E agora eu vou falar pra você de coração, Deus está vendo: eu nunca vou me esquecer desse momento. Enquanto Deus me dar vida e saúde. Enquanto ele me dá, principalmente, vida, eu não vou me esquecer desse momento que eu estou aqui. E, se eu não comentar com a minha neta, que eu vou comentar tudo com ela. Eu vou ver se ela está de bom humor. Porque, se ela estiver de mau humor, eu não vou falar nada (risos). Tem dia que ela fica nervosa com os filhos. E se a gente fala: “Jaqueline” “Que é? O que você quer?”, ela já esta brava. Eu vou sentar lá de tarde e eu vou falar pra ela tudo o que se passou aqui. E que eu não vou esquecer, enquanto eu estiver viva. Um momento muito maravilhoso. Agradeço muito a vocês. Que Deus abençoe.
P/1 - Nós que agradecemos, imensamente.
P/2 - Muito obrigada.
P/1 - Foi muito bom.
R - Agradeço mesmo. Agradeço de coração. Não vou me esquecer. E onde eu vou, eu vou comentar. Eu vou dar um pouquinho de fofoqueira. Hoje mesmo eu estou pra ir na casa da Nice. É uma amiga muito grande, minha. Os anos que eu moro aqui, são os anos de amizade. Nunca ela falou de mim, nunca eu falei dela. Nunca briguei. É uma amizade. Ela se chama Nice. Acho que ela não vai poder... não sei se ela foi escalada pra vir aqui. Ah! Ela é muito amiga da... como é que chama essa moça morena?
P/1 - A Eli?
R - A Eli. Ô, meu Deus, tanta amizade, eu esqueço o nome dela. Ela é muito amiga dela, também. Ela é muito amiga. E eu estou querendo, de tarde, ir lá visitá-la. Se eu não ficar falando tudo o que eu fiz aqui, pra ela...
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