P/1 – Seu Nadir, muito obrigada pela sua presença, em nome do Museu da Pessoa e da White Martins.
R – Eu que agradeço o convite de vocês, para nós é uma honra estar participando dessa comemoração de cem anos de vocês.
P/1 – Para gente começar, por favor, seu nome completo, data e local de nascimento.
R – É Nadir Figueiredo Neto, eu nasci em 12 de junho, dia dos namorados, de 1957.
P/1 – Conta um pouquinho a história da sua família, Nadir, a origem, a história dos seus avós.
R – Bom, vou tentar resumir. A história é muito longa, mas acho importante comentar. Meu bisavô era engenheiro, morava em Belo Horizonte, ele foi (corte no áudio) para projetar a cidade de Belo Horizonte. Então na época, ele não tinha muito dinheiro, isso em (1700?) e alguma coisa. Então ele não tinha muito dinheiro na época, ele era de uma família de uma classe boa, nível alto e tudo. E o que aconteceu? Ele ficou doente, teve tuberculose e, naquela época, não tinha tratamento. E com isso, o que aconteceu? A família gastou tudo o que tinha tentando curar a doença do meu bisavô. O meu avô, na época, deveria ter cinco ou seis irmãos; meu avô era o mais velho. E o meu bisavô veio a falecer, a família perdeu quase tudo, com isso, o que que teve de fazer o meu avô com o irmão menor dele, que é o Morvan, tiveram de vir para São Paulo trabalhar – não tinham emprego em Belo Horizonte – para mandar dinheiro para família, para os irmãos menores que tinham. Então veio meu avô para cá com o irmão…
P/1 – Que era o Morvan?
R – Era o Morvan. Vieram os dois para cá. Tinham um parente que tinha uma pequena loja de material de escrever e coisa assim. Vieram trabalhar aqui, indicados. E ficaram trabalhando, mandavam dinheiro para mãe e para os irmãos em Belo Horizonte; e mais alguns anos eles acabaram ficando sócios dessa empresa. O irmão Morvan foi trabalhar fora para tentar...
Continuar leituraP/1 – Seu Nadir, muito obrigada pela sua presença, em nome do Museu da Pessoa e da White Martins.
R – Eu que agradeço o convite de vocês, para nós é uma honra estar participando dessa comemoração de cem anos de vocês.
P/1 – Para gente começar, por favor, seu nome completo, data e local de nascimento.
R – É Nadir Figueiredo Neto, eu nasci em 12 de junho, dia dos namorados, de 1957.
P/1 – Conta um pouquinho a história da sua família, Nadir, a origem, a história dos seus avós.
R – Bom, vou tentar resumir. A história é muito longa, mas acho importante comentar. Meu bisavô era engenheiro, morava em Belo Horizonte, ele foi (corte no áudio) para projetar a cidade de Belo Horizonte. Então na época, ele não tinha muito dinheiro, isso em (1700?) e alguma coisa. Então ele não tinha muito dinheiro na época, ele era de uma família de uma classe boa, nível alto e tudo. E o que aconteceu? Ele ficou doente, teve tuberculose e, naquela época, não tinha tratamento. E com isso, o que aconteceu? A família gastou tudo o que tinha tentando curar a doença do meu bisavô. O meu avô, na época, deveria ter cinco ou seis irmãos; meu avô era o mais velho. E o meu bisavô veio a falecer, a família perdeu quase tudo, com isso, o que que teve de fazer o meu avô com o irmão menor dele, que é o Morvan, tiveram de vir para São Paulo trabalhar – não tinham emprego em Belo Horizonte – para mandar dinheiro para família, para os irmãos menores que tinham. Então veio meu avô para cá com o irmão…
P/1 – Que era o Morvan?
R – Era o Morvan. Vieram os dois para cá. Tinham um parente que tinha uma pequena loja de material de escrever e coisa assim. Vieram trabalhar aqui, indicados. E ficaram trabalhando, mandavam dinheiro para mãe e para os irmãos em Belo Horizonte; e mais alguns anos eles acabaram ficando sócios dessa empresa. O irmão Morvan foi trabalhar fora para tentar progredir. Foi para Santos trabalhar nas docas de Santos. E o Nadir ficou aqui, e acabou ficando dono dessa pequena empresa, dessa pequena loja. Depois acabou chamando o Morvan. Por isso que a empresa chama Nadir, porque foi ele que ficou e o irmão foi garantir o ganha pão diário, meu avô foi arriscar com um negócio novo, né? Depois acabou vindo o irmão trabalhar; aí começou. E depois começou a mexer com lustre também, porque máquina de escrever... Tinha conserto de lustre, conserto de material elétrico, então começou a mexer com lustres. Em 1919, com a Guerra, até então o vidro era importado, não tinha vidro no Brasil. Com a guerra de 1919 parou o vidro, não tinha a importação de vidro, então tiveram de começar a fazer o vidro da luminária. Daí em diante começaram a mexer com metal, com metalúrgica; muito pequeno o negocinho. Daí começou a fazer o vidro também, aí começou a trabalhar com vidro. Perto de 1930, começou uma (corte no áudio) de São Paulo das luminárias que eram a gás para elétrica. Meu avô ganhou a concorrência disso. Como ele mexia com lustre, com luminária foi um dos que ganharam a concorrência disso. A empresa deu um arranque fazendo a transformação dos postes das luminárias de gás para elétrica, daí deu mais um arranque. Aí começou a fazer vidro; o vidro ficou mais forte, a metalúrgica, continuava, mas o vidro ficou muito forte; e começou a fazer vidro doméstico. Trouxe uma máquina importada dos Estados Unidos em 1932, meu avô contou que foi uma aventura trazer essa máquina, tá? Uma semana de viagem para ir mais dias para voltar, mas trouxe uma máquina e começou uma produção e vidro um pouco maior. E foi indo... No começo era uma produção manual, de vidro soprado; depois começou a automatizar. Em 1940 e poucos meu avô comprou esse terreno aqui. Na época, os empresários da época, achavam que ele estava louco, pois onde eram as indústrias na época? Ficavam no Brás, na Mooca, onde tinha o Matarazzo... Do lado do rio para cá não tinha nada, não tinha, logicamente, não existia marginal, tinha uma ponte de madeira para vir para cá, uma coisa assim; tanto que ele teve de construir uma série de casinhas para trazer mão de obra aqui, porque não tinha mão de obra aqui, porque era muito, a distância era longa, era fora de São Paulo quase. Tinha só a Dutra que chegava aqui, mais nada. E hoje pelo contrário, hoje aqui já ficou o centro da cidade, hoje já estamos precisando mudar daqui, como estamos mudando, estamos saindo daqui e mudando para Suzano, estamos no meio dessa mudança, né? Na minha família, se eu contar um pouco, tem um pouco da história da indústria, como que começou. A família, o meu avô morava em Belo Horizonte, mudou para São Paulo quando era pequeno, morou aqui desde pequeno. Minha família é toda mineira, por parte de avó também. Vou contar um pouco do meu avô, ele, a história profissional eu já contei, a vida familiar, ele casou-se com uma senhora, teve dois filhos e ficou viúvo, isso o meu avô. Já morava em São Paulo e soube que tinha uma senhora muito bonita que frequentava muito Lindóia, que era uma viúva que tinha uma filha. Esse meu avô deveria ter talvez vinte, perto de trinta anos de idade, já era empresário na época e começou a frequentar, naquela época, São Paulo era muito pequena, né? E começou a frequentar Lindóia para conhecer essa senhora. Conheceu, acabou se casando com ela e aí que nasceu meu pai. Meu pai é filho do segundo casamento, tem dois meios irmãos, todos falecidos já, e tinha uma meia irmã. Meu pai foi o único filho do segundo casamento. Já está com oitenta e seis anos de idade, ele até uns seis meses atrás, mais ou menos, vinha aqui na fábrica todo dia; ele está bem, só que com mais dificuldade de andar. Então ele está mais em casa. Acompanha ainda tudo, pede relatórios, pede mapas, pergunta resultados, como está, mas já não quer mais vir. É muito vaidoso, então não quer que vejam que ele está andando com mais dificuldade, mas ele está muito bem. Uma outra característica, meu pai é primo da minha mãe de primeiro grau. Minhas duas avós eram irmãs. Meu pai morava em São Paulo e minha mãe morava em Belo Horizonte. Então não tinham uma convivência de primos, ele ia passar férias lá, encontrava com ela, morava aqui, na época, a comunicação era muito difícil, telefone e carta, então era um negócio muito difícil, o contato. Acabou namorando com ela e casou com ela, apesar de na época muita gente ser contra, né? Mas casou-se com ela, são primos de primeiro grau. Meu pai nunca gostou de falar de fábrica em casa, nunca, nunca gostou de trabalhar em casa; ele separava muito as coisas, até hoje ele não gosta de falar de fábrica em casa; mas o que eu me lembro muito de quando era pequeno, deveria ter uns cinco, seis anos de idade, minha irmã mais velha tinha sete, dois anos a mais que eu, todo sábado nos levava para uma fábrica, a fábrica trabalhava o sábado, o escritório trabalhava sábado naquela época, a fábrica de vidro manual que a Nadir tinha no Brás. Para ver a fábrica, dar uma volta, tal. Eu sempre me lembro que a gente pintava os copos, rabiscava primeiro o copo, ele mandava depois queimar, e no final levávamos os copos. Isso fazia o maior sucesso, porque na escola ninguém tinha um copo que você pintou com uma tinta que não saía, então isso fazia o maior sucesso na época, a gente falava, rabiscava, encomendava e tal... Umas coisas que a gente lembra assim de quando era pequeno. De fábrica, meu pai nunca falava o que era a fábrica, ninguém sabia o que acontecia, e o que não acontecia, sempre foi do perfil dele. Eu fui começar a viver o dia a dia da fábrica com vinte anos de idade, fiz estágio em outra empresa, na Phillips, durante uns seis meses e depois vim trabalhar na Nadir Figueiredo, em 1979. Aí que eu comecei a viver o dia a dia da fábrica, cheguei a conviver um pouco com o meu avô. Eu estava numa outra fábrica e meu avô ficava aqui, mas já conversava um pouco com ele, já sabia um pouco de fábrica, tive alguma convivência com meu avô na parte profissional; tinha muita convivência familiar, morei na casa dele uma época, meu pai viajava e eu ficava na casa dele uma época, convivia muito com meus avôs. Mas no trabalho tive pouca oportunidade de trabalhar com ele. Comecei a trabalhar, ficava em outra fábrica. Uns cinco anos depois, ele já começou a não trabalhar mais, então convivi muito pouco com ele. É uma empresa meio familiar, meio profissional; sempre teve uma mentalidade profissional, regras muito rígidas. Meu avô desde os sessenta e cinco anos de idade saiu do Executivo e passou para o Conselho, embora ainda mandasse, e até hoje é assim, a pessoa quando faz sessenta e cinco anos de idade sai do Executivo, passa para o Conselho, para quê? Para ter uma sucessão, para modernizar, para inovar. Porque senão as pessoas que têm idade não conseguem acompanhar a evolução e se eternizam. Ao mesmo tempo, quem entra também ainda tem um acompanhamento dessa pessoa que saiu, ela passa a ser do Conselho, mas vem todo dia aqui, mas o Executivo é outro. Então você não tem uma ruptura, por isso que eu acho que esse é o grande segredo da empresa, empresa nacional de origem familiar durar cem anos, como estamos fazendo o ano que vem. Acho que o grande mérito é esse.
P/1 – Essas histórias todas que você está contando, quem contava para você? Ou você leu em algum lugar?
R – A gente lê. Meu pai nunca gostou de falar essas coisas, a gente ouvia de conhecidos. Tem livros, às vezes tinha livros que você conta, faz uma biografia que denota um pouco a história do meu avô. Meu pai comentava alguma coisa, meu pai não era muito de falar, mas perguntando ele contava um caso.
P/1 – Seu avô também era mais fechado, não gostava de falar de trabalho…
R – Ele gostava de trabalhar, meu avô (risos). A diversão dele era trabalhar. Na minha época, me lembro disso, minha avó ficou um pouco doente e foi para Belo Horizonte, meu avô quis acompanhá-la. Então meu avô ficou seis meses morando com ela lá. Quando voltou, ele rejuvenesceu uns dez anos. A vida dele no trabalho, ele levava para casa. Na casa dele tinham umas pastas que ficavam na sala de TV, a família vendo TV e ele no fundo na mesa, na escrivaninha vendo as pastas dele. Todo dia ele carregava duas malas de pastas para ler em casa, sempre foi o perfil dele.
P/1 – Você é formado em quê?
R – Eu sou administrador de empresas, eu fiz Pós-Graduação de Finanças nos Estados Unidos, fiz pós na FGV (Fundação Getúlio Vargas) aqui em São Paulo também. A minha carreira aqui sempre começou na área financeira, não porque eu gostasse, porque surgiu a oportunidade. “Estamos precisando de uma pessoa na financeira numa das fábricas da Nadir”, estagiário ainda e fui para lá. Acabei sendo Gerente Financeiro dessa unidade, depois vim para matriz ser Tesoureiro. Durante uma época, eu saí da Nadir porque já era casado; meu sogro tinha uma empresa e de repente faleceu. Tinha duas filhas, uma delas minha mulher, estava com um filho pequeno, minha cunhada grávida e ele tocava o negócio sozinho. Então tive de ir para lá junto com meu cunhado. Então fiquei uns cinco anos fora. Acabou fechando aquela empresa e voltei para cá. Quando voltei, voltei na área de Logística e até hoje fiquei na área de Logística, é uma área que eu gosto muito mais que a Financeira.
P/2 – Mas você falou que o seu primeiro emprego foi na Philips…
R – Foi na Philips, como estagiário.
P/2 – Por que você foi para lá primeiro e não veio direto para cá?
R – A ideia era ter uma experiência fora daqui. Eu acho importante ter uma experiência fora daqui, e eu aí foi engraçado, foi muito difícil para mim porque o que uma empresa quer de um estagiário? Quer investir numa pessoa para essa pessoa crescer, para se tornar um executivo, um profissional. A pessoa via Nadir Figueiredo Neto e pensava: “Eu vou treinar para depois ele trabalhar numa empresa da família dele?”. Então foi difícil arrumar estágio (risos). Não foi fácil. Fiz estágio na Philips na área de Recursos Humanos, fiquei seis meses lá, depois vim para cá, né? Hoje eu cuido da parte de suprimentos da empresa, toda a parte de compras, importação, suprimentos, almoxarifados. Como eu falei, é uma empresa com uma mentalidade muito profissional. A maioria dos executivos são profissionais, não é porque é parente, filho ou neto ou qualquer coisa assim que tem uma carreira garantida, que tem uma profissão garantida; tem de trabalhar e entrar; por isso que a empresa durou até hoje. Ninguém tem privilégios aqui.
P/1 – Além de você e seu pai, tem mais pessoas da família?
R – Tem mais quatro ou cinco parentes, tem um irmão meu que é gerente da área comercial; o presidente é parente; o vice-presidente no caso é um profissional; tem mais um genro casado com uma neta, mas se está aqui é porque ou já veio ou com uma formação de outro lugar, entrou no lugar, se era gerente financeiro, entrou como gerente financeiro, não é que chegou aqui “já vou ser diretor”. Ou porque cresceu aqui dentro, ou porque já veio com uma formação e tem um lugar compatível à competência dele. Eu comecei como estagiário, e hoje sou superintendente, não sou diretor. Meu irmão é gerente, o outro é presidente, mas todos tiveram uma carreira aqui dentro. Nenhum chegou como presidente porque é filho do dono. Esse, eu acho que é da empresa e acho que é por isso que ela dura cem anos, porque quem não é parente sabe que tem oportunidade, que os direitos são iguais. Não tem privilégio, “ah não adianta ter parente do meu lado, ele vai ser promovido a diretor e eu não vou ser nunca, só cresce quando é parente”. Não. Cresce quando é competente, quando dedica. Logicamente tem mais parentes porque é uma empresa de origem familiar.
P/1 – E vocês são em quantos irmãos?
R – Eu tenho uma minha irmã que não trabalha aqui, é corretora, e meu irmão que trabalha na área comercial aqui.
P/1 – E eu não perguntei dos seus pais, você falou do seu pai e não falou da sua mãe.
R – Como eu falei, ela tem oitenta e um anos de idade e, naquela época, mulher não trabalhava. Se formou no Curso Normal como se fazia na época e nunca trabalhou. Na época era assim, hoje ela ainda está bem, vive com meu pai, os dois estão muito bem, acompanham tudo o que acontece, mas os dois se dão muito bem, estão casados há quase sessenta anos, estão velhinhos, mas estão muito bem.
P/1 – Mas conta um pouco de hoje aqui na Nadir, das suas responsabilidades, seus desafios.
R – A Nadir está numa fase muito interessante se você pegar dos últimos três anos para cá, porque essa unidade aqui, a fábrica aqui... Um imóvel muito valorizado para se ter uma fábrica, problemas ambientais, problemas logísticos, então surgiu uma oportunidade e compramos uma unidade em Suzano, que existia uma fábrica de vidro fechada, compramos, fizemos uma adaptação para o nosso uso lá. Como eu mexo com a parte de suprimentos, é uma área que está muito ativa nesse momento. Toda a compra de equipamentos, instalações, reformas, fora a rotina de compras normal são de minha responsabilidade. Aí surgiu agora também, nesse ano, a compra da Santa Marina, para gente foi um passo enorme; era um grande concorrente nosso, uma empresa multinacional…
P/2 – Francesa, né?
R – Francesa, a empresa é gigantesca, a Saint-Gobain, do mundo, deve ser com certeza uma das vinte maiores empresas do mundo. No Brasil deve estar com certeza entre as cinquenta maiores empresas privadas nacionais, tem muitas divisões de venda de mercado de material de construção, lixas, metalúrgicas, é um grupo muito grande. E eles nos venderam a divisão de artigos domésticos, para nós foi muito importante essa compra. É um o mercado de crescimento muito difícil, o de vidro, não é como o eletrônico, como comunicação que cresce trinta por cento ao ano. O vidro é um crescimento vegetativo. Se você lança um produto novo, você não cresce com aquele produto novo. Ninguém mais quer comprar copo. É diferente de celular, todo mundo tem celular, cada ano lança um celular novo, a pessoa quer um celular diferente. Então o jeito de você crescer é o exportando, que é muito difícil no mundo e outro jeito de crescer é comprando o concorrente. Surgiu a oportunidade, compramos, fechamos o negócio há pouco mais de um mês, então está numa fase muito importante para gente, então já vieram várias pessoas para cá, tem uma expectativa de crescer muito nos próximos anos.
P/1 – Quem são os fornecedores da Nadir, equipamentos ou quem fornece?
R – Bom, são várias. Vamos falar por etapas, vai: matéria-prima é quase que monopólios. Você tem a matéria principal do vidro que chama-se barrilha, não tem no Brasil; até uns cinco anos atrás tinha uma empresa nacional que fechou, então hoje é tudo importado. E só tem basicamente três grupos mundiais que te vendem barrilha, não tem opção. É a principal matéria-prima do vidro, não em volume, mas em preço... A outra matéria-prima principal é a areia, só que uma areia especial, com especificação técnica, baixo teor de ferro, coisas assim, isso são dois fornecedores que existem também. Então, na matéria-prima, a gente está na mão de poucos fornecedores. Os concorrentes compram globalizado. Como são três empresas mundiais que vendem matéria-prima; como a Saint-Gobain, ela compra na França para todas as fábricas do mundo, a Owens, que também é um grande concorrente nosso mundial, também compra mundial. O nosso nível de poder de compras é muito menor que o deles. Mas é um mercado que a gente está aí, não adianta ficar lamentando.
P/2 – Onde são os países? Quais são os países…?
R – Esses que produzem? Na verdade, existe uma associação americana de produtores de barrilha, são quatro ou cinco fábricas de barrilha, mas que a venda deles para o mundo é através de uma associação deles, então você tem de comprar da associação deles, embora sejam quatro produtores. O outro é a Solvay, uma empresa mundial, eles estão no mundo inteiro, e também fornecem para o mundo inteiro. E tem uma outra que hoje é americana, mas que um indiano comprou. Tem umas que são muito pequenas, lideradas, por exemplo, por turcos, mas são mercados spot que não conseguem preço e não tem volume.
P/1 – E sempre foi assim? Esse monopólio…
R – Antigamente, até cinco anos atrás, existia uma fábrica nacional, chamava-se Companhia Nacional de Álcalis, ficava no Rio de Janeiro (corte no áudio) anos atrás, sem utilidade. Hoje estão na mão de estrangeiros, e o nosso poder de compra é muito pequeno perto desses nossos concorrentes aqui no Brasil.
P/2 – O que é a barrilha?
R – É um produto químico, que você tem duas origens a barrilha: é um mineral que você extrai nos Estados Unidos ela é extraída de minas de setecentos metros de profundidade; e no resto do mundo é um processo químico. Que faz no processo químico? No fundo é soda cáustica, só que em pó; só que ela tem então todo um processo de granulometria de extração. O processo de extração mineral é mais barato do que o processo químico. O processo químico chama processo Solvay, porque foi a Solvay que inventou esse processo químico. Então, no mundo inteiro, você só tem produto natural nos Estados Unidos e talvez em algum lugar da China, o resto é tudo processo químico. Não é reação química.
P/1 – Então temos a barrilha, a areia…
R – São as duas principais. O que pesa muito no nosso mercado de vidro doméstico é a embalagem, o papelão. É um produto frágil, leve, então você tem uma caixa para proteger e para divulgar o seu produto. Então a embalagem pesa muito também; o papelão é um produto muito relevante e tem os acessórios, tampas e depois tem todos os equipamentos, manutenção, refratários para os fornos, combustível, oxigênio, que componham para produzir o vidro.
P/1 – Fala um pouquinho dos clientes da Nadir então que devem ser muitos mais. (risos)
R – São muitos, mas estão ficando cada vez mais menos, porque um vem comprando o outro. Pega nesse mercado de varejo até uns anos atrás existiam vários supermercados diferentes, vários atacadistas diferentes, hoje acabou concentrando muito. Hoje você tem o Pão de Açúcar, o Carrefour, basicamente foram comprando as menores, Sondas, e Atacadão e foi concentrando. Então é um mercado muito complicado também. O nosso vidro tem uma característica que ele é muito diferente de outros produtos: quando vocês vão comprar um produto no supermercado; vocês vão comprar um Nescau, vão comprar, tem lá uma lata de cerveja Brahma. Copo ninguém vai comprar a marca, a pessoa vai comprar um copo, o que ela vai ver no copo? A beleza e o preço. Ninguém vai comprar um copo Nadir Figueiredo, um copo Cisper, um copo Santa Marina e um copo importado. Ninguém vai com esse intuito. É diferente de um cigarro. Eu quero comprar um Hollywood, eu quero comprar Skol, se não tem, de repente, ele nem compra, vai no outro supermercado para comprar. Copo não, então está faltando copo em casa, ninguém se preocupa com a marca, ele vai ver o quê? A beleza e o preço. Se achou bonito e o preço está bom, ele compra, se não achou, ele compra outro; não quer nem saber se é nacional ou importado, se é da Nadir ou se é da Cisper. Então o que que é importante? É você estar presente na prateleira. Não adianta você fazer muita propaganda, não existe muita propaganda de copo. Ao contrário de cerveja, de guaraná, de Coca-Cola para divulgar o seu produto. Não adianta fazer uma propaganda de copo da Nadir Figueiredo. Ela até pode: “Pô, legal, achei bonito aquele copo da Nadir Figueiredo. Vou comprar um copo da Nadir Figueiredo!”. Tá bom. Onde eu encontro? Encontro num supermercado, numa loja de presentes. A hora que ela chegar lá vai ter trinta marcas diferentes. Eventualmente, ela até vai comprar aquele da Nadir Figueiredo, mas ela vai ver outros trinta. Uma hora ela vai comprar o que ela achar bonito e o que preço for conveniente. Então, você tem de estar presente, você tem de estar vendendo; não é um produto essencial. De repente, um Nescau é essencial pro supermercado: se a pessoa vai comprar um Nescau e ela não acha Nescau, ela vai em outro supermercado. Se ela quer uma cerveja, e ela não acha aquela cerveja, muito possível, ela vai no outro supermercado comprar aquela cerveja. Ele perde o cliente. Copo não. Chegou lá, não tem, ele compra um outro copo, um outro copo qualquer. Não vai em uma outra loja comprar. Então essa é uma das características de clientes nossos que são as grandes redes varejistas, que são importantíssimos para gente. Outro tipo de venda nossa são os atacadistas, que é copos mais para bares, institucionais, o famoso copo americano nosso. É diferente. O dono do restaurante, ele já se preocupa um pouco mais com a marca, por quê? Se ele compra esse copo aqui e põe no restaurante dele, ele quer daqui a um mês, quando alguém quebrar aquele copo, comprar um copo igual, principalmente os donos de restaurantes. Se ele compra importado, uma marca desconhecida, quem garante que você vai encontrar o mesmo copo daqui a um, dois meses? Se ele não encontrar, ele tem de mudar a linha toda dele do restaurante. Então esses assim já se identificam um pouco mais com a marca por esse aspecto, não pela a marca em si. Se ele comprou um, quer ter certeza de que vai encontrar aquele mesmo copo daí para frente, para não ter de mudar a linha dele a cada dois, três meses. Então com isso, é outro canal de distribuição nossa. O que que é importante? É importante a pessoa encontrar o copo. O dono do bar não pode ficar sem copo. Se ficar sem copo, ele para de vender e vai comprar outro copo e muda de linha. Então é importante você estar presente no atacadista e no distribuidor ali. Temos também uma linha que a gente chama de personalizados, que são copos para publicidade, cerveja compra para os que servem lá, Brahma, Antártica, Schincariol, uma promoção quando tem Pizza Hut, compre pizza e ganhe um copo, então os outros itens que a gente vende, e tem a exportação. A gente exporta principalmente para América do Sul e Europa, alguns países do Oriente, onde tem um mercado que está sendo muito difícil nos últimos anos por causa do câmbio, mas importante a presença nossa, porque te dá, assim te garante que você está no mesmo nível do mundo. Se você só fica no Brasil, você tende a acomodar. Então, você estando no mundo, está sempre se atualizando, embora hoje está sendo muito difícil a exportação; e começamos a enfrentar muito concorrente importado também. Como falou do câmbio, hoje você está lá no supermercado, você encontra produtos do México, da Turquia, dos Estados Unidos, da Itália, da França, do mundo inteiro.
P/2 – Chinês ainda não?
R – Chinês também.
P/2 – Copo chinês?
R – Também tem chinês. E já não são mais aquela fama de qualidade ruim como era há uns anos atrás. Hoje cada vez estão mais, a gente vê hoje, você já encontra carro chinês, hoje ninguém fala praticamente de problema em carro chinês, eles estão evoluindo muito ainda nesse sentido.
P/1 – Quando é que vocês começaram a ter visões internacionais?
R – Há alguns anos que a gente começou. Nos anos oitenta, a gente começou a exportar já. Começamos a investir nisso. É uma coisa de longo prazo, não adianta você olhar a curto prazo. Você tem de visitar, tem de mostrar o seu produto, começar, levar uma amostra, a pessoa gosta, você tem de ter o representante local, e ele deve ter confiança no seu produto, na sua entrega, na sua qualidade, para começar a vender. Então, mesmo hoje com sacrifício, a gente mantém uma carteira, às vezes até com margens muito pequenas ou negativas, a gente mantém a exportação porque está muito difícil, perder está muito fácil. O representante que vende copo da Nadir na Espanha, por exemplo, se ele deixa de ter o copo da Nadir, ele vai procurar outro fornecedor, um chinês, um turco, um mexicano, e não vai perder o mercado que ele tem; então você tem de estar presente com ele. Outro mercado de fornecimento que nós temos é o alimentício, de embalagens, não é o principal nosso, mas é muito importante também, que vende extrato de tomate, potes para doces, compotas para azeitona, palmito assim. Azeite também, estamos entrando no mercado de azeite, um mercado que é importante para gente também. Mas não é o nosso... A gente tem crescido mais no mercado doméstico.
P/2 – E na cadeia de produção, vocês fabricam o vidro e aí a tampa do vidro não é de vidro…
R – Não, a tampa é metálica...
P/2 – Então vocês têm que depender também de outros fornecedores de outras fábricas, então gostaria de saber como é essa relação...
R – Então a gente vende...
P/2 – O vidro que está pronto vai para lá…
R – A gente vende vidro. Vamos supor: o fabricante do doce compra um pote nosso e compra a tampa de outro fornecedor. Existem padrões de tamanho, de rosca, de coisas assim que é uma coisa meio padronizado. Você pode comprar a mesma tampa, pode servir num vidro meu, num vidro de uma tampa de um concorrente meu. A mesma tampa serve também no meu pote, em outro pote, então, existem certos padrões de produção. O Brasil ainda está meio estável hoje, há um tempo atrás o vidro andou perdendo mercado para lata, para o tetra pak, hoje o Brasil estabilizou, tem país que o vidro já está aumentando. Até um tempo atrás, você não achava refrigerante em garrafa de vidro. Hoje você já encontra no Brasil. A Coca-Cola já começou a ter mais... Um tempo atrás você não achava mais. Antigamente era tudo vidro, até uns anos atrás. Daí sumiu o vidro. Ficou tudo lata e PET. Hoje já está voltando o vidro outra vez, o requeijão…
P/2 – E você sabe dizer o porquê?
R – Ambiental, a qualidade, a qualidade é muito diferente. O vidro é cem por cento reciclado. Tem uma característica que é diferente dos outros produtos recicláveis. O plástico também é? Também é, mas o vidro, quanto mais cacos de vidro você põe no forno, mais barato fica, porque o caco de vidro derrete a uma temperatura mais baixa do que a matéria-prima. Então, se você põe vidro no forno, você economiza energia.
P/1 – Vocês têm uma estatística disso de reciclagem e de comprar matéria-prima? Vocês conseguem trabalhar nessa…
R – Depende muito do vidro que você faz. Nosso vidro é mais o que a gente chama de vidro cristalino. Ele aceita menos caco de vidro, por quê? Porque você não pode colocar um vidro de garrafa, um vidro sujo, um vidro contaminado, um vidro de plano, como a gente chama, não servem para produção do nosso cristal. Uma garrafa de cerveja escura ou de vinho você pode pôr até noventa por cento de caco de vidro e qualquer tipo de caco de vidro. Então são perfis diferentes. Quando a gente faz um vidro escuro, a gente põe mais caco. Quando põe o vidro cristalino que a gente chama, é mais um caco interno nosso, é um caco muito mais. Existe um mercado que a gente chama de “caqueiros”, são pessoas que recolhem cacos em vários restaurantes, na rua e colocam em caçambas, fazem isso nos condomínios, pegam aquele caco e separam um pouco o caco escuro do caco limpo; às vezes tem caco de lâmpada que não serve para gente, tem caco de vidro de janela que não serve para gente, tem aquele vidro moído. Então é muito complicado você ter o caco limpo para o tipo de produto que a gente faz. A gente faz vidro escuro, pode pôr qualquer caco. Então um fabricante de cerveja, de vidro de garrafa de cerveja pode pôr oitenta por cento de caco em qualquer tipo de caco.
P/1 – A Nadir tem algum trabalho na comunidade nesse sentido, como é que é a relação de uma empresa com essa comunidade no entorno?
R – Bom, fala nessa parte de reciclagem?
P/1 – Sim, também ou projetos sociais ou não, como é uma fábrica no meio da Marginal aqui, não sei se teria alguma relação com a comunidade
R – Não, o que a gente tem uma série de entidades que a Nadir contribui. Não é uma empresa que a gente chama de empresas… É uma empresa que a gente chama de low profile, a gente não é muito de aparecer, de divulgar, de fazer coisas assim. Tem escolas que a Nadir patrocina, tem uma escola SENAI que a Nadir patrocina, SENAI é uma escola pública na Zona Leste que a Nadir incentiva muito, dá muito suporte, tem uma no conjunto residencial aqui do lado. Tem umas entidades que a Nadir patrocina, patrocina alguns clubes esportivos, mas nada muito importante no sentido de divulgação. Por dois motivos: é uma empresa que, como eu falei no começo, a publicidade não vai fazer você vender muito mais. É uma empresa que não gosta de aparecer também, é um perfil nosso, é uma empresa que não gosta de estar na mídia, não gosta de aparecer, igual eu estava falando, sempre foi tudo muito discreto, sempre é cultural. Acho que isso vem desde o meu avô e continua com o pessoal que trabalha aí. E a publicidade que a gente faz é muito mais direcionada. Quando você faz uma campanha com o Pão de Açúcar, com o Carrefour dá muito mais resultado do que fazer uma campanha numa televisão. Você vai gastar muito mais dinheiro e o resultado é muito pequeno. Então uma ponta de gôndola, um cartaz que você põe na loja isso dá muito mais resultado do que uma coisa pública.
P/1 – E com relação a White Martins. Qual que você acha que é o diferencial da White nessa área comercial mais que você atua? Como é a parceria das duas empresas?
R – O fundamental realmente é a parceria, porque é diferente você ter um fornecedor que você compra a tampa, compra a matéria-prima, e te entrega aqui e pronto. Vocês não! Vocês trabalham junto com a gente. Principalmente depois que entrou a fabricação do oxigênio dentro da nossa planta, então trabalha em conjunto. É uma fábrica dentro de uma outra fábrica. Então é muito mais do que uma parceria, é quase uma sociedade, é quase como se a gente fosse um sócio. Vocês usam energia nossa, a gente usa o equipamento de vocês, usa o know-how de vocês, vocês fornecem para gente, então é muito mais do que comprar uma peça qualquer, um insumo qualquer e utilizar. Existe toda a parte tecnológica, toda a parte de low qualidade de envolvimento, de desenvolvimento, vocês estão participando de um projeto para Suzano que tem envolvimento diretamente com a White Martins, o que vai ser feito lá, que tipo de planta será instalada lá. Então, é um envolvimento muito grande nesse sentido. É muito mais do que um fornecedor que compra e outro que vende, tem todo o envolvimento de muitos anos, a mesma coisa de hoje eu compro de vocês e amanhã do outro. Não. É de vocês e vai continuar com vocês. Durante quanto tempo? Indeterminado, né?
P/2 – Como é que o senhor está de tempo?
R – Um pouquinho mais de conversa, mais uns dez, quinze minutos, por aí.
P/2 – Só para saber, a gente vai fazer uma pergunta tentando fazer os links com os processos de industrialização no Brasil, a Nadir Figueiredo sendo uma empresa familiar, eu queria perguntar (corte no áudio) de base.
R – Certo.
P/1 – Não sei se vai ser pertinente perguntar: uma empresa como essa, ela não se instala em outro país, ela só exporta o produto. A ideia de se instalar fisicamente em um outro país, isso não existe?
R – Nós já pensamos isso uns anos atrás, só que a gente é uma, como eu falei, empresa perfil muito conservador, embora ela invista, ela cresça, ela tem um perfil conservador. Se ela acha que pode dar dois passos, dá um só. A empresa não corre riscos, riscos no sentido de aventureira. A gente é muito ciente do nosso tamanho, da nossa condição, do nosso mercado. Como falei, já pensamos em abrir uma coisa fora. Chegamos a abrir na Bélgica, fechamos o ano passado, não chega a ser uma fábrica, mas um armazém próprio, junto com um sócio belga, existia um distribuidor belga nosso. Nos associamos a ele, criamos uma empresa, tinha um armazém para produtos, tinha umas máquinas de decorar produtos lá que pertenciam a essa empresa, funcionou durante uns dez anos. Então não chegava a ser uma fábrica fora, mas era um ponto importante. Então toda a venda para Europa era feita através dessa empresa belga. Tinha um gerente de vendas, um corpo de vendas, uma máquina de produção de decoração de produtos, montar estojo, mandava-se o copo numa caixa que a gente chama de semiacabado, nada, posto num estojo exclusivo para algum cliente, ou decorado lá, hotel tal e vendia para aquele hotel na Europa. Com o câmbio, isso começou a não ser viável mais. Juntou o câmbio com a crise na Europa. O mercado ficou muito mais difícil na Europa, a importação para Europa da Turquia, da China foi muito maior e o câmbio não nos favoreceu. Então tivemos de desativar essa unidade nossa, hoje continua um representante nosso lá, mas não como unidade nossa. A gente tem uma unidade semelhante na Argentina, essa ainda está ativa na Argentina, só não tem a máquina para decorar; a gente vende o produto lá, muitas vezes embala lá e vende para toda Argentina. A Argentina tem um mercado muito forte para gente. Tínhamos planos desse tipo de investimento em vários outros países, isso até em 2004. Tínhamos planos já de abrir eventualmente na Venezuela, no Chile, na África com esse tipo de... Não era uma fábrica, mas era uma unidade. Você fica presente num país, a entrega passa a ser mais efetiva, se passa a ser uma empresa local, quem está vendendo não está vendendo um produto importado, quem compra da empresa local. Com o câmbio, isso se tornou inviável, não é um assunto esquecido, mas hoje está aguardando ter uma oportunidade de voltar outra vez.
P/1 – Seu Nadir, qual que é o segredo de empresas como a White e de vocês que estão completando cem anos ano que vem continuar no mercado? Como que foi e é estar completando cem anos, e para o futuro, como é que…
R – Acho que o principal segredo é se você tem regras rígidas, ainda mais numa empresa familiar, porque se você tem pessoas diferentes, se tem anseios diferentes, entram parentes novos, cunhados, esposos, genros, filhos, netos, que às vezes tem anseios diferentes e vontades... A gente sempre teve uma cultura muito rígida nesse aspecto de só trabalhar pela competência, não pelo sobrenome. São muito unidos. Hoje são cinco sócios principais que estão na empresa, são muito unidos, daqui a pouco serão quarenta; que meu pai já tem oitenta e seis, outro tem mais de oitenta, outro tem sessenta e cinco, outro tem setenta, sessenta e quatro, já estamos preparando essa outra geração que já são quarenta, e já estamos se preocupando com isso com acordos de acionistas para que as regras se perpetuem. A empresa não pode perder agilidade. Se para cada negócio, se você vai fazer, se hoje são cinco pessoas; é muito fácil essa decisão, daqui a pouco vão ser quarenta, com gente que trabalha aqui e gente que não trabalha aqui, esses cinco trabalham aqui, fora meu pai que saiu agora há pouco; desses quarenta, poucos trabalham aqui, talvez cinco ou seis trabalham aqui. Para a pessoa de fora é muito fácil criticar ou ter ideia diferentes, ou sugestões que não consegue implantar. Então estamos criando mais regra, um acordo de acionistas para que a empresa continue com agilidade, continue todo mundo na mesma direção. Não é fácil isso? Não é fácil isso, mas se você acreditar que sim, mas o principal nisso é respeito, as pessoas que são acionistas e não estão aqui dentro sabem que quem está aqui dentro está por mérito, sabe o que que ganha, o que que faz, o que que não faz. Então se passa muita confiança para quem é acionista, mas não trabalha aqui dentro. Isso eu acho que o segredo principal é esse. Não aconteceu de uma chegar e “primeiro, eu quero tirar a minha parte”, um acha que tem que comprar e o outro que vender, um quer ter um iate, o outro quer ter um carro, um quer ter um cargo de diretor, o outro quer ganhar sem trabalhar, então isso não existe, não pode. Então tem muita serenidade nesse aspecto.
P/1 – Além de ter um dono principal, essa história familiar tem acionistas?
R – Sim, é uma empresa S/A de capital aberto hoje, embora o domínio acionário esteja na mão de cinco famílias. Já não são cinco pessoas mais, são cinco famílias. Mas uma empresa, como eu falei, sempre teve uma cultura profissional, senão você não conseguiria trazer bons profissionais para trabalhar numa empresa onde só privilegiam parentes. Você não teria um cargo de diretor aqui se ele não se sentisse... Bom não adianta trabalhar num lugar onde só parente vai crescer. Não, ele é um vice-presidente não é parente, por isso que quem não é parente trabalha aqui.
P/1 – Fala...
R – Isso acontece às vezes em multinacional, acontece isso. A pessoa numa empresa alemã sobe, diretor, tem de ser alemão para ser diretor, aqui não; aqui não tem de ser parente para ser diretor. Tanto que dois vice-presidentes hoje são profissionais; o diretor financeiro é profissional, e assim por diante.
P/1 – Fala um pouquinho da sua história então fora da Nadir, da empresa
R – Fora daqui?
P/1 – É, o que você faz no seu dia a dia, lazer, nas férias, se é casado…
R – Bom, na verdade eu tenho duas filhas, ambas se formam agora. A menor está se formando agora em Administração; e eu de doze anos atrás, por opção, fui morar em Campinas, por uma questão de qualidade de vida. Trabalho aqui todo dia, duas três vezes por semana durmo em São Paulo, o resto fico em Campinas. E minhas filhas, uma está se formando agora em Administração de Empresas, está fazendo estágio na Exxon, ExxonMobil. Eu gostaria que elas não começassem trabalhando aqui, para ter uma experiência fora, conhecer uma empresa diferente para, se um dia vier para cá, vir por opção e já vem até com um conhecimento, trazer coisas novas para empresa, e se ela quiser vir um dia. A mais velha, ela se formou dois anos atrás em Londres, ela fez um curso em Relações Internacionais numa escola que tinha um campus nos Estados Unidos e tinha um campus em Londres. Ela fez dois anos em Londres e dois anos e meio nos Estados Unidos. Hoje ela está trabalhando no Bradesco, no Bradesco Investimentos, já está há um ano e meio lá; e está mudando agora para o Departamento de Economia, e também é a mesma ideia: se um dia ela quiser vir trabalhar aqui é porque surgiu a oportunidade, ou porque quis ou porque foi convidada, mas veio por ser uma profissional que vai poder agregar uma coisa a mais para Nadir. E não porque é parente; é lógico que sempre tem um certo gosto por trabalhar numa coisa que nem seja pouca, que vai dividindo, lógico, mas, se vier, vai ser porque surgiu oportunidade ou porque quis e não porque só tinha emprego lá. Então, elas, uma está procurando emprego agora, está acabando o estágio e se candidatando em várias empresas por aí e são perfis muito diferentes. Uma filha muito caseira, essa que mora com a gente em Campinas, a outra mais independente, já mora sozinha em São Paulo, morou cinco anos fora; e são perfis muito diferentes. Embora a educação seja a mesma que a gente dá, cada uma tem um perfil diferente. Minha mulher é corretora, trabalha com aluguel de imóveis em geral para empresas estrangeiras; também mora em Campinas. Trabalha duas, três vezes por semana e vem para São Paulo. Tem gente acha que é meio louco porque a gente mora em Campinas e trabalha em São Paulo; mas, quem mora no Morumbi, acho que leva mais tempo do que eu para chegar aqui na fábrica.
P/1 – E suas filhas querem trabalhar aqui?
R – Não, mas eu não quero; acho que é porque elas falam que trabalham muito e ganham pouco sabe? (risos) Tô brincando. Elas acham também que é bom trabalhar fora, querendo ou não, trabalhar aqui é sempre neto, bisneto, é filho de alguém, tem um sobrenome, não que tenha privilégio, mas é vista diferente, então eu prefiro que sigam a carreira fora. Se elas se sentirem bem fora ótimo; se um dia também quiserem vir para cá, porque tem oportunidade, porque foi convidada ou sei lá porque, eu preferia que cada uma seguisse a sua carreira, então, elas estão satisfeitas. Elas têm orgulho da empresa, elas gostam da empresa, não conheceram o fundador, conhecem meu pai. E meu pai não é de falar muito, então elas não conhecem muito a história.
P/2 – Você fez Administração e depois nunca mais voltou a estudar?
R – Então eu falei, fiz administração em São Paulo na FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado)...
P/2 – MBA no caso?
R – Não, depois eu fiz um curso de extensão universitária na UCLA (University of California, Los Angeles) em Los Angeles, morei um ano fora. Morei seis meses... Na época, a Nadir tinha um parceiro mexicano muito grande, chamada Vitro, que era dona de sete por cento da Nadir. Nessa ocasião, eu fui fazer estágio lá de seis meses e morei no México. Depois voltei para cá e há três anos atrás fiz uma pós na GV, dei uma reciclada, de Gestão Empresarial. Quando fui nos Estados Unidos, fiz de Finanças na época, e aqui não, aqui eu já fiz uma de Gestão Empresarial, fiz três anos atrás e achei que estava precisando de uma reciclagem. E foi um ensino meio presencial e meio por sistema.
P/2 – Aí você tinha quantos anos?
R – Nessa época. Isso foi quatro anos atrás, quando eu tinha cinquenta. Estou com cinquenta e quatro.
P/2 – Voltou a estudar por quê? Gostou da experiência?
R – Voltei a estudar. Gostei por dois motivos que foram importantes: um era a reciclagem, porque eu já tinha formado há muitos anos e acho importante dar uma reciclagem, e o outro era o método de ensino que eu achei importante, porque era meio presencial na Getúlio Vargas e meio pela internet. Você se habituar a estudar e fazer prova por internet, o que é um aprendizado. Para hoje, para geração das minhas filhas é fácil, quando eu estudei não era. Meu trabalho é lógico, mas quando eu estudei não. Então foi interessante fazer uma prova pela internet, assistir uma aula não presencial. Então o professor está lá e de repente você estava na Turquia lá viajando a trabalho e você discutia e debatia com ele e com outros vinte alunos espalhados no Brasil. Eles tinham aula presencial também, então foi interessante o aprendizado de se usar uma ferramenta que na minha geração, quando eu estudei, não existia; e o curso em si foi uma reciclagem importante.
P/2 – Minha outra pergunta é se o senhor se imagina aposentado.
R – Não (risos), ainda não, acho que ainda não estou preparado para isso ainda não. Eu sei que está na hora aí de começar a pensar, mas é difícil, é difícil ainda. Não consigo imaginar em casa ou em lugar algum. Fazendo alguma coisa? Sim, mas o que ainda também não... Como a minha vida inteira trabalhei aqui dentro faz quatro, cinco, talvez fazer alguma outra coisa que não seja aqui dentro. Mas isso é uma coisa que a gente tem de começar a pensar. Que vai chegar. E não demora muito para chegar. Eu tenho, eu falei que gosto muito de morar em Campinas. Eu gosto muito de andar de bicicleta, é meu hobby é andar de bicicleta; faço viagens de bicicleta, carrego mochila na bicicleta; viajo trezentos, quatrocentos quilômetros em uma semana e eu vou continuar assim.
P/1 – Sozinho?
R – Não, com turmas. Viajam grupos de cinco, seis pessoas, deixam o carro na cidade e vai rodando. Andam cinquenta quilômetros num dia, dormem em hotel, numa pousada, viaja mais outro, tudo com bagagem na bicicleta. Então é um lazer que eu tenho e acho importante porque me motiva a fazer ginástica durante a semana, que eu gosto. Motiva a ir na academia, pedalar na academia, é importante para manter a forma, para não ficar atrás dos outros na bicicleta, né? Mas é uma coisa saudável que me motiva a ir na academia pensando no fim de semana. No fim de semana normalmente eu ando de bicicleta, perto de Campinas tem muita trilha. Sempre em trilhas de terra, não gosto de asfalto. Sobe morro, desce morro, trilha, coisa assim.
P/1 – Alguma viagem especial?
R – Já fiz algumas no Brasil, no exterior não. Estamos planejando para o ano que vem eventualmente uma na Itália, França, mas também com mochila e uma bicicleta, dormindo em hotel, mas por enquanto efetuamos só em Santa Catarina e no Paraná, já fiz algumas viagens assim; interior de São Paulo também já fiz.
P/1 – Finalizando já, o que você achou desse projeto da White Martins em parceria com o Museu da Pessoa de contar a história da industrialização, os cem anos da White Martins através de um projeto de memória, né?
R – Eu acho muito interessante porque a gente não tem, não sei se tem muitas empresas para contarem isso, porque muita empresa grande que começou nos anos de 1900 e pouco, em 1930, 1920, 1940, não sei se muita empresa hoje ainda existe. Muitas foram vendidas, muitas fecharam, não se conserva essa história assim. Hoje em dia as coisas são muito dinâmicas, muita fusão, muita cisão, muita compra, fecha empresa, abre empresa, então eu acho muito rico se encontrar uma coisa assim. Que tenha uma leitura, que tenha um histórico, um agrupamento de informações de pessoas que viveram parte disso, que viveram a parte profissional de 1970 para cá, de 80 pra cá, como na parte profissional mais. Mas a empresa tem cem anos, quer dizer, eu conheço uma parte da história dela. Eu vivi uma parte da história dela. A gente enxerga, como eu falei, a gente olha o futuro, está mudando daqui, compramos a Santa Marina, investimos muito, é um segmento que exige muito investimento esse que a gente está, de capital intensivo. A concorrência é brutal com estrangeiros, com nacionais; a gente sempre esteve no meio de empresas multinacionais; é uma concorrência muito dura nesse sentido de compra, de know-how, de tecnologia, de poder de comprar matéria-prima, como eu comentei, aqui então é um ambiente muito agressivo nesse sentido; está sempre muito focado, muito compenetrado, não pode relaxar. Uma coisa que o meu avô sempre falava, que a gente sempre segue aqui: “Um dia que você achar que a sua fábrica tá boa, pode achar que hoje a sua fábrica tá boa; no dia seguinte a sua fábrica começa a cair, porque nunca a fábrica tá boa”; você sempre vai ter o que fazer, você não pode achar que agora está com uma boa fábrica, não está. Outra coisa que ele sempre dizia: “Você pode dar dois passos ou dar um só”. A gente, de repente, não cresce tanto, não diversifica como muitas outras empresas, mas também estamos sólidos, não fechamos, é uma empresa sólida, uma empresa firme, muito bem vista graças a essas duas políticas aí de serenidade e regras rígidas... E de respeito, respeito no sentido profissional e não à família, respeito no sentido de não é porque é a família que tem uma carreira aqui dentro, não, tem um profissional. Eu estou aqui como profissional e não como neto do meu avô. Estou como profissional, eu tenho de ter competência, eu estudo, me preocupo, procuro atualizar sempre, porque não podemos nos dar ao luxo de não ter gente não preparada aqui dentro, seja parente ou não parente, porque o mercado não permite isso. Se eu não estou preparado como eu estou, um concorrente vai fazer melhor que eu. E não podemos nos dar esse luxo no mercado do jeito que ele é competitivo. E isso serve para vida: o presidente pensa assim, o funcionário pensa assim...
P/1 – A Consuelo te perguntou da aposentadoria, pelo jeito não é um sonho, mas você tem um sonho?
R – (Risos) Eu gostaria de morar na praia. Gostaria muito de morar no Rio de Janeiro, gostaria, de repente, quando parar mesmo, morar numa quadra da praia do Rio de Janeiro. Minha mulher também. Embora hoje a gente more no interior, nosso sonho mesmo seria morar à beira-mar, mas por enquanto não quero pensar nisso não. Pretendo um dia sabe... Quando parar mesmo, ficar mesmo, morar em Ipanema, Leblon, perto da praia, poder caminhar na praia. Andar a pé só, não precisar de carro. Mas isso, eu ainda não penso nisso não. É vontade que a gente tem sim, mas eu ainda não sei quando vai ser isso.
P/1 – Muito obrigada pela entrevista, parabéns pela sua história de vida, o Museu e a White Martins agradecem.
R – Obrigado. Eu agradeço a oportunidade de vocês de poder falar um pouco sobre a minha empresa que começou com meu avô, que eu tenho muito orgulho, que a gente viu crescer, ela é sólida, muito respeitada. Então é muito agradável poder contar um pouco disso. Muito obrigado.
P/1 – Obrigada.
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