P/1 ¬– Bom, Adriane? Bom dia, pra começar, eu queria de agradecer muito por você ter vindo aqui, passar esse tempo com a gente, muito obrigado. Por uma questão de identificação, para o nosso registro aqui, eu queria que você falasse o seu nome completo, o local e a data do seu nascimento.
R – Meu nome é Adriane da Silva, eu nasci em 73, tenho 41 anos, e nasci em São Paulo, em São Miguel Paulista.
P/1 ¬– Adriane, antes da gente começar a falar sobre você, sobre a sua história, eu queria que você falasse um pouco sobre a sua família, sobre os seus avós, conheceu seus avós?
R – Não.
P/1 ¬– Não?
R – Só meu avô.
P/1 ¬– Só seu avô? Conta um pouco sobre ele.
R – Ah, eu lembro assim muito pouco, ele ia de vez em quando em casa, visitar a gente, a minha mãe, a gente ia lá na casa dele tudo, a gente desde quando eu era pequena, bebê assim, eu não lembro da convivência assim, 100%, eu não vou saber dizer como é que foi, do que eu lembro, eu me lembro poucas vezes assim, era muito legal quando ele ia lá em casa, ficava conversando com a minha mãe, e é isso.
P/1 ¬– Você sabe a história dele, da onde ele veio, se ele era de São Paulo mesmo?
R – Ele era de Minas.
P/1 ¬– Ah, ele veio de Minas?
R – Isso.
P/1 ¬– Entendi.
R – Ele era filho único.
P/1 ¬– Trabalhava com o que seu avô?
R – Ele era caminhoneiro, ele viajava assim, com caminhão, sabe? Eu não me lembro se ele trabalhava em transportadora, assim eu não vou poder dizer, isso só minha mãe vai poder dizer. Entendeu? Desculpa, tá?
P/1 ¬– (risos) Não precisa, imagina, a gente está aqui conversando. E os seus pais? Qual o nome deles, conta um pouco sobre a história de cada um.
R – O nome da minha mãe é Olinda Faustino da Silva. Minha mãe nasceu no Tucuruvi, aqui em São Paulo e minha mãe sempre foi assim, sempre foi independente sempre trabalhou, e minha mãe sempre foi uma guerreira, sempre lutou pra dar sustento pra mim, pras minhas irmãs. O meu pai, eu não sei muita coisa dele, o nome do meu pai é Carlos Alberto Mota e minha mãe é mãe solteira e assim, eu não tive convivência, eu sempre fui criada com a minha mãe, é isso aí o que eu posso dizer.
P/1 ¬– E você tem algum contato com o seu pai?
R – Meu pai já morreu faz tempo. Já é falecido, já. Eu tinha contato sim, ele ia em casa visitar a gente, ele conversava comigo, brincava, ele era muito brincalhão, muito legal.
P/1 ¬– E qual o nome da sua mãe, desculpe?
R – Olinda Faustino da Silva.
P/1 ¬– E ela trabalhava com o quê, a Olinda, sua mãe?
R – Ela era copeira hospitalar, trabalhava em hospital, sabe? Muito legal, é o que eu sei, o que eu me lembro agora no momento.
P/1 ¬– Quando você fala dessas brincadeiras, por exemplo, o que você brincava nessa infância?
R – Ah, eu brincava de fazer bolinho de terra, brincava de boneca, essas coisas assim. Eu não era de sair na rua, por causa da minha deficiência então, eu ficava mais em casa do que na rua. Minha mãe trabalhava, então, eu ficava mais na casa da minha tia, que era o mesmo quintal.
P/1 ¬– Você nasceu com a deficiência visual?
R – Não, isso foi erro médico, porque eu nasci de 6 meses incompletos e me colocaram na incubadora e não tamparam minhas vistas e queimou as retinas e aí eu fiquei assim.
P/1 ¬– Um erro médico.
R – Só que não avisaram a minha mãe, minha mãe não sabia. Então isso ai.
P/1 ¬– Me conta um pouco, por exemplo, irmãos, você tem?
R – Eu tenho duas irmãs.
P/1 ¬– Duas irmãs?
R – Isso.
P/1 ¬– Qual o nome delas? Quantos anos?
R – Olha, a mais velha é Andrea da Silva, ela tem 43 anos e a mais nova é a Amanda Cristina da Silva, ela tem 29 anos.
P/1 ¬– Você se dá bem com elas?
R – Muito. É legal ter irmãs. Muito bom.
P/1 ¬– Eu vou começar lá pela sua infância e a gente vai subindo, tá bom?
R – Tá bom.
P/1 ¬– Você se lembra da sua casa de infância?
R – Olha, eu lembro que morei em uma casa que o bairro se chamava Castelo, lá em Ferraz de Vasconcelos, eu lembro que a casa era muito grande e atrás dessa casa, tinha uma goiabeira onde eu ficava me balançando e ficava esperando minha mãe chegar do serviço, é só o que eu lembro, dessa casa ai, é o que me lembro. Depois, a gente se mudou pra rua que tem lá em Ferraz, que se chama Nove de julho e onde tinha a casa da minha tia, era na frente e a casa que eu morava com a minha mãe era nos fundos e eu ficava mais com a minha tia, porque a minha irmã mais velha estudava, ainda não tinha minha irmã caçula, e eu ficava mais na convivência com minha tia, com as minhas primas, entendeu? E era muito legal, que eu podia correr no quintal, andar atrás da casa, fazer meus bolinhos de terra e ficava lá assistindo televisão, essas coisas assim, brincando de boneca.
P/1 ¬– Isso sempre com as suas primas parceiras?
R – Ás vezes, sim porque eu tinha umas primas mais velhas, já adultas, elas não brincavam muito comigo, então eu brincava mais sozinha, não tinha amigos, porque eu só ficava em casa, que a minha mãe trabalhava, a minha irmã estudava, não tinha como eu ficar saindo a semana toda, mais de final de semana, a minha mãe sempre procurava sair com a gente, ir pra casa do meu tio, que ele morava em Guaianases. Então, quando dava, a minha mãe sempre levava a gente pra passear. E depois, eu brincava com as filhas do meu tio, a gente brincava não de correr, mas brincava de boneca, essas coisas assim, sabe? Era muito legal, minha infância foi maravilhosa.
P/1 ¬– Ótimo e a escola?
R – Eu estou me alfabetizando agora, depois de adulta, porque minha mãe sempre procurou escola pra mim quando eu era pequena, mas eles falavam que não dava, porque tinha que ser… criança assim, que tinha que… eu não sei explicar direito, tá? Minha mãe não conseguiu, porque… é que não era pra ser. Estou me alfabetizando agora.
P/1 ¬– A sua mãe tentou que você frequentasse a escola, quando criança, e não conseguiu?
R – Sim. Não conseguiu.
P/1 ¬– E isso assim, sua irmã indo, elas te passavam, por exemplo, o que elas viam na escola para você? Você tinha essa curiosidade da escola?
R – Ah tinha, como era uma sala de aula, por exemplo, como que a professora se vestia, então assim ficava sonhando acordada. Que um dia isso ia acontecer, eu sempre ficava imaginando eu na escola assim, porque eu enxergava um pouco, quando eu era menor, que agora, eu tenho catarata na vista esquerda, eu só enxergo a claridade. Então, ficava assim, quando dava cinco horas da tarde, lá em Ferraz onde eu morava, eu subia no registro de água, que o muro da casa minha tia era bem alto, aí eu ficava esperando as crianças subir da escola, eu ficava olhando assim, eu ficava sonhando acordada. Até que um dia, aconteceu, mas eu já era adulta, eu estava em uma escola no ano passado, que eu estava aprendendo o braile, aí eu vim pra cá, porque era muito distante, muito longe, tava uma correria assim, que não tava dando muito certo. Então, a minha mãe pediu a transferência pra essa escola, pro Cieja, que é uma benção, é maravilhosa essa escola, muito boa.
P/1 ¬– Como foi esse processo de entrar pra escola, hein, já adulta? Quando que veio que essa ideia, quando que veio a oportunidade, conta um pouco pra gente, como é que foi isso?
R – A minha irmã caçula tem uma amiga, que conseguiu pra mim, uma entrevista na escola que estava, na Adeva, que é escola pra deficiente visual e a gente foi fazer a entrevista e eu tava aprendendo o braile com meu ex-professor João, que é ótimo, que é uma ótima pessoa também, e foi estranho, logo a primeira vez que eu cheguei lá, pra aprender a andar sozinha, a fazer locomoção que se fala, olha, foi muito diferente, mas foi bom, foi legal, muito bom.
P/1 ¬– Adriane, eu vou até perguntar de novo, porque assim, realmente, pra mim, é muita novidade. Bom, primeiro eu queria entender. A primeira escola que você foi pra Adeva? Como que veio essa ideia, como que eram as aulas?
R – Foram ótimas, que meu professor, meu ex-professor, ele é deficiente visual também…
P/1 – O João?
R – É, o João, o professor João, ele é deficiente visual, então ele foi me ensinando o alfabeto, o braile, que tem o alfabeto colado, depois eu aprendi, tentei escrever na reglete, que é um tipo de material que tem pra deficiente visual, mas não deu muito certo, porque eu não consigo, não consigo! Já na máquina, eu consigo, na máquina braille é mais fácil, foi muito bom, cada coisa nova que eu aprendia pra mim, era um passo que eu tava dando.
P/1 ¬– Você lembra do seu primeiro dia na escola?
R – Nossa, lembro.
P/1 ¬– Como foi?
R – Como eu fiquei nervosa, gente! Ah, foi muito bom, foi uma mistura de sentimentos bom e assustador, porque pessoas, que eu nunca tinha visto, não conhecia, primeiro, foi uma reunião que teve explicando como que ia ser, depois, cada um dos alunos se conhecendo, tal, foi muito bom, gostoso, maravilhoso.
P/1 ¬– Você lembra dessa classe, das pessoas que faziam? Como era a história dessas pessoas?
R – Ah, mas a história eu não lembro, eu lembro das pessoas.
P/1 ¬– Quem era quem, qual era a idade? Conta um pouco dessa turma.
R – É tudo adulto já, tudo adulto que tinha voltado a estudar ou pessoas que já sabiam ler e escrever, que ficaram deficientes visuais, cada um tinha uma história ali, entendeu? Mas eu não vou saber lembrar a história, não, porque faz muito tempo.
P/1 ¬– Faz muito tempo, isso?
R – Faz.
P/1 – Quando?
R – Dois mil e onze, 2012, por aí.
P/1 ¬– Se tornaram amigos?
R – Ah, é amigos de classe porque não era uma escola como é a escola aqui, do Cieja assim, que tem carteira, não. Era uma sala grande de reunião, onde tinha uma mesa comprida e onde o professor colocava as máquinas pra gente escrever, ele fazia eu pôr o alfabeto em braile assim, em ordem, ele ia me explicando qual era qual, e assim, eu aprendi muito com ele, uma ótima pessoa, maravilhosa.
P/1 ¬– E como foi essa passagem pro Cieja?
R – Então, estava sendo muito cansativo pra minha mãe, que ela enfartou, em 2010, ela não andava se sentindo muito bem, quem tava me levando era minha irmã mais velha, e tem uma amiga da minha irmã, que é coordenadora e ela conseguiu a transferência aqui, pro Cieja, que estava muito cansativo, eu não conseguia me alimentar direito e tava assim, que eu chegava até passar mal, porque não dava pra almoçar, porque tinha aula de locomoção terça-feira, então, eu ficava muito tempo sem almoçar, eu passava mal e era muita horas longe de casa. Pegava metrô, tal. Depois que conseguiu a transferência aqui, melhorou. A Adeva é muito boa, muito boa, excelente viu, maravilhosa.
P/1 ¬– Hoje, você está morando aonde?
R – Morando no Jaçanã, que eu morava no Jardim Brasil, aí eu mudei pro Jaçanã.
P/1 ¬– E a Adeva é?
R – É lá na zona sul.
P/1 ¬– Tinha que atravessar a cidade.
R – É, lá na Santa Cruz, tinha que pegar metrô cheio, sabe? Sair de madrugada de casa pra chegar lá, oito horas da manhã, entendeu? Todo dia é essa correria.
P/1 ¬– E hoje, como está seu cotidiano?
R – Tá ótimo.
P/1 ¬– Como que é seu dia a dia?
R – Tranquilo, calmo, maravilhoso, agora dá pra chegar mais cedo em casa, o pessoal da perua são ótimos, a dona Sonia, o seu Jairo, são ótimas pessoas assim, olha nota dez pra eles.
P/1 ¬– Tá registrado (risos). Mas qual que é seu horário no Cieja?
R – Meu horário é das dez ao meio-dia e quinze.
P/1 ¬– Você lembra também, como foi esse primeiro dia?
R – Olha, foi menos tenso do que da outra escola, viu? Pra mim, era tudo novidade, comecei no dia 5 de fevereiro desse ano, caiu numa quarta-feira. Ótimo, foi assim, diferente, legal, muito bom.
P/1 ¬– Por quê?
R – Porque era uma coisa nova, eu tava mesmo, em uma sala de aula, uma professora assim, a professora Neusa, que é uma ótima pessoa também, gosto muito dela, e nossa, foi muito bom assim, muito diferente, descobri coisas diferentes que até então eu não tinha vivido.
P/1 ¬– Por exemplo? Quando você fala isso no que é que você pensa?
R – No computador, mexer no computador, aprender assinar meu nome na escrita normal que em braile, eu já sei escrever na máquina, mas na escrita normal é ótimo aprender, com o alfabeto normal. É muito legal.
P/1 ¬– Eu não conheço nada sobre as aulas que vocês têm, você podia me contar um pouco das aulas? O que você faz no computador, por exemplo?
R – Ah, eu estou aprendendo o alfabeto, eu estou aprendendo a mexer no espaço, inclusive o professor Marcos, que está aqui ele é ótimo, maravilhoso, ele ensina bem, ele é um ótimo profissional. Então, é legal, eu estou aprendendo a escrever no teclado normal, sem ser o teclado em braile, o alfabeto normal, é muito gostoso, porque é uma coisa diferente. Até então, eu não descobria, não sabia como era direito, apesar de ter computador em casa, minha mãe mexe, minhas irmãs, mas eu até então, nunca tinha me interessado pra falar a verdade. Na outra escola, eu tive até a oportunidade que todo mundo falava pra mim: “Ah, mas você tem que aprender a computação”, falava: “Não gente, tenho que dar prioridade pra me alfabetizar primeiro, senão, como eu vou saber com o que eu estou mexendo no computador?” E é muito bom, muito gostoso, muito legal.
P/1 ¬– Adriane, nossa conversa, nós vamos indo e voltando, tá? Você já estava no Jaçanã, na sua infância? Ou em São Miguel e você foi pra lá?
R – Não, não. Estava em Ferraz.
P/1 ¬– Estava em Ferraz, na zona Leste?
R – Em Ferraz de Vasconcelos. E foi assim, uma coisa muito gostosa, porque aí foram chegando as minhas primas, quando tinha o aniversário das minhas primas eu gostava muito, porque eu gosto muito de festa, ah sou muito feliz, eu gosto de dançar, de cantar, eu gosto de festa mesmo, é muito legal, participar assim, sabe? É muito bom.
P/1 ¬– Mas essas festas assim, de família de casa, ou festa fora, festona?
R – É de família, porque minha tia sempre fazia na casa dela. Era muito legal, porque tinha bastante criança, bexiga, bala, essas coisas que criança gosta, brigadeiro, (risos) então era uma coisa muito legal, era muito gostoso. Natal, ano novo, nossa, quantos natais maravilhosos, nossa.
P/1 ¬– Olha, você lembrou de um aí, qual foi?
R – Um que minha mãe me deu uma boneca, que eu queria muito, eu sempre ganhava boneca da minha mãe, mas criança, sabe como é que é curiosa. Eu arrancava um braço, uma perna, pra saber como colocava. Muito legal. E minha mãe me deu uma boneca, que eu nunca mais esqueci dessa boneca, que foi a boneca dorminhoca, que eu andava com essa boneca pra cima e pra baixo e no Natal, a minha mãe me deu essa boneca, nossa eu fiquei tão feliz, tão contente! Eu brincava muito assim, eu brincava e brigava também era muito briguenta, então, graças a Deus essa fase já passou, (risos) vamos desapegar (risos)
P/1 – Página virada…
R – Esquece, deleta é melhor. Mas quantos natais com a família toda assim, sabe, minha tia minhas primas, depois minha irmã caçula nasceu, minhas irmãs, minha mãe, nossa gente, inesquecível, agradeço a Deus por ter a minha mãe Olinda como mãe, que ela é maravilhosa, uma grande mulher pra mim, ela é o exemplo do que eu sou hoje. Se não fosse ela, eu não seria nada. Nem eu nem as minhas irmãs.
P/1 ¬– Adriane, me fala um pouco como era essa infância com a deficiência visual, essa brincadeira com as crianças, como é que você se virava ali, com o pessoal?
R – Ah, eu corria pra tudo quanto era lado, eu andava na ponta do pé, que eu caí do caminhão do meu tio quando eu tinha dois anos. Aí encolheu o tendão da perna, não vou saber te explicar, eu sei o que os médicos falam. E imagina, isso não atrapalhava em nada, não, eu brincava, eu brigava, tudo ao mesmo tempo (risos), não atrapalhava nada, não saía na rua, mas quando criança chata vinha me encher o saco, eu já brigava também, então normal, eu me considero uma pessoa normal, como todo mundo.
P/1 ¬– E essa vontade de sair pra rua, você tinha?
R – Bastante, principalmente quando as minhas primas estavam na fase de ir pra balada, nossa, eu ficava sonhando com isso, eu indo pra balada, minha irmã mais velha, quando ia pro salão de domingo pra dançar, minha mãe arrumando minha irmã, minha irmã mais velha, nossa, ficava sonhando acordada, mais tudo sonho.
P/1 ¬– Você chegou a ir, alguma vez?
R – Não, nunca tive, depois que eu fui crescendo assim, nunca tive vontade, pra mim, tanto faz sabe, então. Mas eu gosto de festa, por exemplo eu gosto de final de ano, quando tem bastante gente em casa assim, todo mundo dançando, cantando, conversando, nossa, que gostoso, eu gosto de passear, de fazer piquenique também, muito bom.
P/1 ¬– Vocês tem esse costume?
R – Às vezes, sim, às vezes, a gente faz sim.
P/1 ¬– Onde vocês costumam ir?
R – Ah, pro Horto Florestal, de vez em quando, pro Ibirapuera, entendeu? Pro Museu do Ipiranga, muito legal, minha mãe sempre procura deixar a gente assim, como se diz? Sempre a fim de coisas culturais assim, sabe? Muito legal.
P/1 ¬– E sempre levou você e as suas irmãs?
R – Sempre, a primeira vez que eu fui no teatro, que eu fui ouvir uma apresentação da minha irmã caçula, muito legal, gostei pra caramba, muito bom, muito bom. Um programa muito gostoso, viu?
P/1 ¬– Mas conta pra gente o que foi isso? Aonde foi? Como foi, o que era?
R – Olha, o teatro eu não vou saber o nome, eu não vou saber te dizer. A peça, o nome da peça era “A Pátria que me Pariu”, que é uma música do Gabriel, o Pensador, nossa muito legal, assim falando de droga, de prostituição, de violência, coisas do dia a dia. Nossa, foi muito legal, muito legal, muito gostoso, minha mãe me contando o que estava acontecendo, minha irmã mais velha. Muito legal, gostoso, parece que você está na história, sabe? Muito legal.
P/1 ¬– E que outros que você lembra de passeios, de lugares que foram marcantes pra você? Que você gostou muito.
R – Quando a primeira vez que a gente foi no Horto Florestal, eu achei muito legal, que eu gosto de lugares assim que tem árvores. E quando tem muito sol, é gostoso passar assim, embaixo das árvores, eu só não gosto de lugar sossegado. A única coisa que eu não gostei até hoje, foi de ir ao cinema, a primeira vez que eu fui no cinema, estava passando um filme em inglês, que minha mãe me levou e levou minha irmã caçula também, eu não gostei, porque eu não entendia nada do filme, não sabia o que estava acontecendo. Mas depois na Adeva assim, a gente ia no cinema e os filmes sinceramente, que passava ali com o áudio descrição, o pessoal falando que estava acontecendo, mas era muito cansativo, não interessou muito.
P/1 ¬– Os filmes com áudio descrição são cansativos?
R – A história não tem nada a ver, a história muito cansativa, não prende a atenção. É legal quando você ouve uma história, que parece que você está dentro da história, então fica muito legal.
P/1 ¬– Me fala e essa cidade, hein? Como é pra você se deslocar ir pra lá, ir pra cá?
R – Tirando as calçadas quebradas e você virando pé e caindo, está ótimo (risos).
P/1 ¬– Já aconteceu isso com você ou não?
R – Ô! Quantas vezes! Quantas vezes eu já beijei o chão. (risos) Mas é sério, o que tem de errado é esses buracos, calçada quebrada, mas isso a gente não liga muito, mas tudo bem.
P/1 ¬– Adriane, hoje você anda pela cidade sozinha?
R – Ando com a minha mãe, faz tempo que eu parei de fazer aula de locomoção que eu mudei de escola. Mas por exemplo, já lá na escola eu já conheço o ambiente. Já estou mais ou menos familiarizada lá, eu ando ali, com tranquilidade, sem medo de cair, nem nada, até porque, não tem nada pra tropeçar, nem pra cair. É legal, é ótimo.
P/1 ¬– Fala um pouco como é que é a aula de locomoção? Como que é essa formação?
R – Eles ensinam como o deficiente deve andar com a bengala, a posição da bengala, como atravessar a rua, quando você tem que prestar atenção, quando, por exemplo, do seu lado direito, está tudo parado, do seu lado esquerdo, tem um carro passando, aí você pode atravessar, mas você tem que esperar ficar tudo parado, em silêncio assim, sabe? É muito legal, eles ensinam a atravessar a rua, só não aprendi a andar no metrô, que também eles ensinam, mas tem os funcionários pra ajudar então, você fica mais tranquilo. Ensina a subir e descer escada com bengala, mas eu subo e desço escada normal, com bengala ou sem bengala, tendo corrimão.
P/1 ¬– Tendo corrimão, funciona?
R – É.
P/1 ¬– Você fez um teste drive? Foi atravessar a rua na Paulista?
R – Na Paulista, não, porque eles não soltam, porque na Santa Cruz, tem avenidas também. Então, tem o jeito certo lá que eles ensinam, que é do jeito que eu falei. Assim, dá uma insegurança, eu sou muito insegura, muito, muito. Lugar que eu não conheço, eu fico bem insegura mesmo, pra caramba.
P/1 ¬– E o lugar que é muito silencioso é mais difícil, do que o lugar que tem mais barulho, é isso?
R – É porque é assim, você tem que saber… por exemplo, eu no meu caso, teria que saber lá na rua da escola onde eu estudava, eu tinha que saber se o carro que passou, está longe, está perto, entendeu? Eu ficava muito insegura, muito insegura assim, sabe, com medo de errar, porque em uma rua normal, sem ser avenida, é uma coisa, agora, na avenida é outra muito diferente.
P/1 ¬– Essa cidade ajuda?
R – Ajuda, se você tem paciência e segurança, sim.
P/1 ¬– E as pessoas são solicitas assim, tipo pra ajudar no metrô, no ônibus?
R – Ah, ajuda bastante, tem pessoas que ajudam bastante sim, tem pessoas que são muito solidárias, antes de eu vir pra cá, o ano passado, que eu pegava o metrô lá no Santa Cruz e descia no Tucuruvi, as pessoas viam me ajudar, nossa, no começo a primeira vez que eu fiz isso, que eu entrei no metrô e desci no Tucuruvi sozinha, fiquei meio assim, meio cismada, que com a minha mãe e minha irmã era uma coisa, mas sozinha, é outra muito diferente. E deu certo, correu tudo bem.
P/1 ¬– Conta direito, como foi isso ai, porque primeira vez foi assim, liberdade, tipo…?
R – Liberdade e mistura de medo de você está sozinha, sem enxergar, você está sozinha, sem um familiar por perto assim, fica bem inseguro, mas aí tem as mulheres, as funcionárias do metrô, que aí você fala, por exemplo, como eu falava, se tinha alguém pra me ajudar a entrar no metrô, eu falava a estação que eu ia descer, como a minha mãe sempre me ensinou a falar a rua que eu ia e tal, lá da escola, que eu ia pra escola tal, minha mãe sempre me ensinou essas coisas assim. Falar pra onde eu vou, para onde eu quero ir, nomes das ruas e tal e assim, eu falava pra menina lá do metrô: “Vou descer no Tucuruvi”, aí já avisavam aqui no Tucuruvi, uma funcionária, que ficava esperando na porta do metrô, então eu não chegava a ficar com medo, eu ficava tranquila, entendeu? Ela me ajudava a subir, a minha irmã caçula me pegava lá onde tem a bilheteria, lá do metrô, normal, ficava de boa, tranquila, ficava até feliz, então, era um pouco da minha independência, de desapegar um pouco, dá um alivio pra minha mãe, não ficar grudada com a minha mãe, embora eu goste muito de ficar com a minha mãe, minha mãe é muito boa, maravilhosa.
P/1 ¬– Tem uma coisa a ver com a familiaridade do lugar e o reconhecimento.
R – E a independência também.
P/1 ¬– Me fala uma coisa, por exemplo, na sua casa você sabe onde está tudo, tudo?
R – Na minha casa, eu desço e subo a escada, toda hora.
P/1 ¬– Tranquilíssima.
R – E não tem corrimão, tá? Tem duas paredes.
P/1 ¬– E sem corrimão, tem uma questão desse reconhecimento. Daí, você vai, aos poucos, conhecendo os caminhos, da escola, da casa pra escola e assim que é a formação, digamos?
R – É, porque assim, como eu vou de perua agora eu fico mais tranquila, nossa antes, eu sou muito insegura, muito insegura. Eu não gostaria, mas é um medo de você estar em um lugar que você não está acostumado, todo dia. Você tem aquela coisa do medo, da insegurança, de você estar com estranhos, então fica aquela coisa de medo.
P/1 ¬– Adriane, me descreve a sua casa, por exemplo.
R – A minha casa, ela é grande, tem um quarto embaixo, tem dois quartos em cima, é um sobrado, tem uma lavanderia embaixo, bem fechadinha, bonitinha e tem a lavanderia lá em cima, você tem que subir as escadas pra ir pros quartos e sobe outra escada pra ir pra lavanderia, é grande lá, bonito a minha casa, legal.
P/1 ¬– Quintal?
R – O quintal tem embaixo, o quintal é grande, tem uma porta de vidro bem grande que, é a entrada assim, tem o quintal na frente é bem grande, um canteirinho que minha mãe ainda vai fazer um jardim e o banheiro também é grande, a cozinha é grande, a sala. E o quintal é grande, a lavanderia de baixo também é grande e a de cima, também.
P/1 ¬– Me fala uma coisa, você conhece aquele Lara Mara?
R – Conheço, eu fazia parte lá, eu fazia aula de violão, lá.
P/1 ¬– Ah é?
R – Eu já fiz.
P/1 ¬– Aula de violão?
R – Só que a professora não gostava de mim. É.
P/1 ¬– Opa, conta essa história ai.
R – Então, eu fazia aula de violão lá, no Lara Mara, eu estava indo bem, eu nunca tive um violão meu próprio, é um instrumento que eu gosto muito, acho muito bonito. Haja paciência pra aprender, chatinho viu, tem que ter paciência, mas é legal, tudo com paciência, dá certo. Eu tava aprendendo aula de violão lá, aí a professora saiu de lá foi embora e eu parei, eu lembro até o nome da professora, professora Elvira. Nossa, faz muito tempo isso.
P/1 ¬– Faz tempo? Foi antes da Adeva?
R – Bem antes, mais bem antes mesmo, bem antes, muito legal.
P/1 ¬– Isso é uma coisa que eu não conheço, porque enfim, existe todo um universo, que eu não conheço de escolas, de curso pras pessoas que tem a deficiência visual. Eu me lembro do Lara Mara, que eles liam histórias, eles gravavam as histórias e depois, quem quisesse ouvia o livro sendo narrado.
R – É tem o livro em CD.
P/1 ¬– É o livro em CD, por exemplo.
R – Eu tenho um, só que a história é longa. Você dorme, acorda e está na mesma história (risos). Mas a história é interessante, porque você põe lá no DVD, eu sei mexer no DVD, que a minha irmã me ensinou, a minha mãe me ensinou, a história é muito, sabe parada. Você quer prestar atenção, mas aí te dá um sono, mas é gostoso, eu sempre gostei de história. Sempre.
P/1 ¬– Você prefere ouvir um filme, a novela, ou você prefere…?
R – Eu gosto de filme e depende eu gosto de novela, depende dos filmes que eu gosto, não todos.
P/1 ¬– Me conta um que você gostou bastante, por exemplo?
R – O Homem Bicentenário.
P/1 ¬– O Homem Bicentenário?
R – É. Você já viu esse filme?
P/1 ¬– Deixa eu tentar lembrar, dá uma dica, como é que era?
R – É a história de um robô, que queria ser um ser humano.
P/1 ¬– É com o Robin Williams?
R – É.
P/1 ¬– Ah, já vi.
R – Lindo esse filme.
P/1 ¬– Sim.
R – A história dele é muito linda. Eu gosto também, de filme infantil, que eu gosto de filme de criança, a Encantada, que é uma princesa também, tendo uma história assim, eu gosto do Homem Bicentenário, Mudança de Hábito, o 1 e o 2 é muito da hora, A Vovózona também é muito legal, eu gosto. Só não gosto de filme de terror, filme de terror, ninguém merece.
P/1 ¬– Ah é?
R – É. Antes quando eu era menor, que eu tinha meus 13, 14 anos, eu até gostava, mas depois, eu desapeguei sabe? Aí não dá não.
P/1 ¬– Não dá, né?
R – Não.
P/1 ¬– Adriane, você disse que você era religiosa, católica?
R – Era não, sou. Sou muito católica e devota de Nossa Senhora Aparecida.
P/1 ¬– Vai na igreja? Vai na missa?
R – Vou.
P/1 ¬– Conta um pouquinho, como é essa religiosidade?
R – Eu gosto de ir pra Aparecida do Norte também, quando dá a gente vai assim, sabe? Nossa Senhora Aparecida me ajuda muito. Eu sou católica, porque minha mãe sempre ensinou a gente assim, a rezar, a ir na missa, a importância de uma religião pra gente, me sinto bem na minha religião, eu amo ser católica, gosto muito, me faz muito bem, eu gosto de ouvir o padre Marcelo, o padre Juarez de Castro, o padre Antônio Maria, é muito gostoso, eu amo ir na missa, eu já fui na missa do padre Marcelo, muito boa. Eu me sinto bem na minha religião, eu gosto de ser católica, entendeu? Me faz muito bem.
P/1 ¬– O que você gosta desses padres, que você citou, o que eles falam?
R – O padre Marcelo tem uma oração muito boa, as missas do padre Marcelo são ótimas, me faz bem, ele tem o programa na Rádio Globo, das nove às dez, e tem o padre Juarez, que participa do programa do Paulo Barbosa, das nove horas também. O padre Juarez, ele explica bem qualquer assunto que se comentar com ele explica, ele sabe esclarecer muito bem e o padre Antônio Maria, eu gosto das músicas dele, muito gostosas, ele é bem tranquilo, bem calmo, eu acho ele muito legal.
P/1 ¬– Você disse que gosta de cantar também. Cantar e dançar?
R – Gosto, gosto.
P/1 ¬– E cantar músicas religiosas ou tudo?
R – Ah, músicas do padre Marcelo, do padre Juarez, eu gosto de cantar, gosto de um forró também, forrózinho, tipo Fala Mansa, Bicho de Pé, que é um grupo de forró também, muito gostoso.
P/1 ¬– E dança um forró também?
R – Ah, eu danço (risos) eu gosto também.
P/1 ¬– E você vai dar uma palhinha pra gente ou não?
R – Não! (risos) Não, melhor não. Você quer que estraga tudo você fala, tá? (risos) Não, não, músicas só canto do Daniel, tá?
P/1 ¬– Você canta do Daniel?
R – Eu gosto do Daniel e cantor assim, estrangeiro eu gosto da Laura Pausini, que eu gosto de italiano.
P/1 ¬– Da onde que veio será, esse gosto de italiano?
R – Não sei menino, mas eu amo italiano sabia, sério de verdade.
P/1 ¬– Quem que gostava, sua mãe ouvia quando, era criança?
R – Eu não sei, ela só falou que meu nome é de origem italiana, então, deve ser por isso, eu gosto de italianos, muito lindos.
P/1 ¬– A sonoridade, assim?
R – É, ah eu não sei te explicar eu amo italiano, simples assim.
P/1 ¬– Qual que é sua música predileta da Laura Pausini?
R – “La Solitudine”, gostoso, muito linda essa música. “Strani Amore” também, que é dela.
P/1 ¬– Strani Amore”. Você é romântica?
R – Sou.
P/1 ¬– Legal. Me fala uma coisa, voltando, bom você está se alfabetizando, começou a fazer o trabalho de alfabetização, está se formando, quais são os outros cursos que você tem feito, você falou do violão, se eu não tivesse falado do Lara Mara, nem ia aparecer. Que mais que você tem feito, que você faz ou já fez?
R – Eu quero me alfabetizar ainda pra poder fazer o meu curso de culinária, eu já fiz curso de artesanato também, aprender a fazer cachecol no tear, é muito gostoso, é muito legal, eu gosto de artesanato, é muito bom.
P/1 ¬– Como foi esse curso? Conta um pouco.
R – Ah, assim no começo foi difícil, porque até então, eu só tinha ouvido falar e fazer esse curso de tear por causa da Kátia Fonseca, do “Mulheres”. Aí foi ela que me incentivou. Então eu falei pra minha mãe: “Eu quero aprender a fazer alguma coisa no tear”, aí eu contei pra ela como é que a Kátia estava fazendo tudo, muito legal e eu fiz um cachecol pra minha mãe, no tear, não foi fácil, mas que eu fiz, eu fiz, entendeu? Eu sou muito persistente. E eu não gosto de ser desafiada, quando a pessoa fala: “Ah você não vai conseguir tal coisa”, aí é que eu faço. Consigo. Gosto de fazer comida, é gostoso.
P/1 ¬– Olha, da onde veio isso?
R – Minha mãe que me ensinou, minhas irmãs, porque eu ficava muito sozinha. Eu ficava sozinha em casa, minha irmã caçula estudando, minha irmã mais velha trabalhando e minha mãe também. Aí minha mãe me ensinou a cozinhar, porque eu comia comida fria, não sabia esquentar comida, minha mãe me ensinou tudo que eu precisava saber. Sei fritar um ovo, sei temperar feijão, fazer arroz, fazer macarrão alho e óleo, tudo, tudo que precisa, eu faço.
P/1 ¬– Tem um determinado momento que você ficava muito sozinha em casa? Porque todo mundo ia trabalhar e você já era mais adulta e ficava sozinha, é isso?
R – É, ficava sozinha, porque minha mãe não tinha conseguido escola, então, eu ficava sozinha, eu arrumava a casa, ajudava a minha mãe, lavava roupa pra minha mãe. Eu gosto de lavar roupa, muito legal, é bom.
.
P/1 ¬– E você prepara, de vez em quando, almoço pra todo mundo?
R – Sim, quando a minha mãe está ocupada, eu vou e faço o almoço.
P/1 ¬– Entendi, e essas preocupações com faca, óleo?
R – A minha mãe sempre tem, mas eu tomo cuidado, presto atenção, porque no fim, quem vai se queimar sou eu, então eu tenho que prestar atenção no que está fazendo. Então, quando eu vou fazer arroz, eu procuro deixar a panela no fogo baixo, secar bem a panela, porque se estiver molhada espirra pra caramba. Mas isso é caso de prestar atenção.
P/1 ¬– E hoje, por exemplo, você fica na escola. Depois, você fica em casa? Você fica sozinha?
R – Eu fico com a minha mãe, aí a gente almoça as duas horas, depois a gente fica assistindo a novela.
P/1 ¬– E depois, hein, Adriane, o que você está pensando em fazer? Você está fazendo curso Cieja, o que você está esperando pra daqui a pouco?
R – Ah, que quero fazer meu curso de culinária, logo.
P/1 ¬– Culinária, onde?
R – Onde tiver assim, que não precisa pagar, ótimo, porque eu me inspirei por causa da Palmirinha Onofre. Então, eu quero fazer por causa dela, porque eu gosto.
P/1 ¬– Quer a prender a cozinhar?
R – É, eu sei fazer até sobremesa.
P/1 ¬– Ah é?
R – É.
P/1 ¬– O quê?
R – Ah, eu sei fazer pantera cor de rosa, muito legal.
P/1 ¬– Puxa, não sei o que é que é uma pantera cor de rosa.
R – Pantera cor de rosa é gelatina com creme de leite e leite condensado.
P/1 ¬– Adoro isso (risos), eu não como isso, mas eu adoro isso.
R – Pior que engorda, mais é gostoso, eu não gosto de coisa diet, aí é problema.
P/1 ¬– E viagem, hein? Já viajou?
R – Já! Quando dava assim, a minha mãe levava a gente pra praia, sabe? A gente ia viajar, muito gostoso! E viagem assim, eu sempre fico acordada, não consigo dormir, não adianta. Tem que ficar prestando atenção em tudo. Eu falo eu não tenho visão boa, mas a minha audição é ótima.
P/1 ¬– Nossa, é como ver o mar então. Tem um som diferente.
R – É uma delícia. É ótimo. Indiscutível.
P/1 ¬– Você lembra a primeira vez que você foi pro mar?
R – Claro, imagina, muito bom, minha mãe levava eu e a minha irmã mais velha pra Santos. Quando a minha irmã caçula ainda não tinha nascido, nossa, que delicia! A gente se divertia na água, na areia, era muito gostoso, muito legal. Por isso que eu digo pra você, a minha infância foi abençoada, maravilhosa, agradeço a minha mãe por isso.
P/1 ¬– Essa relação com a audição, realmente é… você consegue ouvir um monte de barulho ali do vizinho, da cidade, coisa que a gente nem está ouvindo, você gosta de prestar atenção nisso?
R – Presto atenção em tudo. Tudo a minha volta, eu sempre procuro prestar atenção no que eu estou ouvindo, sabe? É muito bom, ficar esperta (risos).
P/1 ¬– E com as mãos? Esse tato, por exemplo.
R – É bom também.
P/1 ¬– Você mesmo que falou que trabalhou com artesanato, quer fazer culinária. São coisas bem manuais assim.
R – É isso. Porque é importante, a pessoa que enxerga não usa muito tato, mas pra gente é indiscutível. Legal, você tem que usar o tato, só que no frio, não funciona muito, que a mão fica gelada e não dá pra sentir direito, mas é bom, é ótimo. Eu gosto muito de artesanato, artesanato é relaxante, é bom, eu sei fazer até artesanato no sabonete. Muito legal.
P/1 ¬– Como que é isso?
R – É mais fácil, então, depende do guardanapo que você tiver, da estampa que você tiver, aí você só rala um pouco o sabonete, depois, você passa aquela lixa de artesanato no sabonete, passa cola e cola assim a estampa que você quiser e pronto. Acabou. Gostoso.
P/1 ¬– Você aprendeu aonde?
R – Então, na escola que tinha perto da minha casa, que era lá no Jardim Brasil. E tinha artesanato lá e minha mãe foi ver, aí eu me interessei e fui fazer, legal, não precisava pagar nada, muito gostoso, muito bom.
P/1 ¬– E essas mudanças de casa? Você mudou muitas vezes? Ferraz?
R – Ah, algumas vezes e depois a gente mudou pra Edu Chaves, depois a gente mudou pro Jardim Brasil e enfim, agora estamos no Jaçanã, e pra mim não é tão difícil me adaptar é só conhecer o lugar, a casa, entendeu?
P/1 ¬– Você gostava da mudança?
R – Ah, eu acho muito legal, dá trabalho, mas eu acho super legal. Mas como eu tava assim nessa mudança agora pro Jaçanã, eu não podia ajudar, que eu estava com sonda tudo eu não tinha como ajudar, mas é legal, é divertido, sempre coisa nova é muito bom pra gente, é legal se adaptar.
P/1 ¬– A casa tem adaptações falando nisso?
R – Não, normal.
P/1 ¬– Normal? Não botaram nem um corrimão?
R – Não, por enquanto não, mais a gente pra tudo se dá um jeito.
P/1 ¬– Adriane, pra gente começar a fechar um pouco a nossa conversa, quais são as coisas mais importantes pra você, hoje?
R – Ser feliz, me alfabetizar e ter a minha independência.
P/1 ¬– Quais são seus sonhos futuros, o que você fica pensando?
R – Ser uma culinarista, aprender a fazer bijuterias e dar uma casa pra minha mãe, pras minhas irmãs.
P/1 ¬– Vocês moram de aluguel?
R – É.
P/1 ¬– De bijuteria você não tinha falado nada, hein?
R – Ah, mas é que ainda é um projeto ainda, é um projeto ainda pra ser feito ainda, é mais pra frente, não agora.
P/1 ¬– Só depois de fazer a gastronomia, ali?
R – Gastronomia não, meu filho, que ter que mexer com morto não rola, isso pra mim é aterrorizante.
P/1 – Depois do curso de culinária…
R – É, depois do curso de culinária, vou aprender a fazer bijuterias. Se Deus quiser.
P/1 ¬– Entendi, tem que ter planos.
R – Claro.
P/1 ¬– E o que você achou Adriane de contar um pouquinho a sua história?
R – Legal, estou chique, estou uma estrela (risos).
P/1 ¬– Tem alguma história, que eu não perguntei, que você gostaria de contar? Algum causo que eu não perguntei?
R – Nenhum, nenhum. Só teve uma mudança ai na minha vida, assim, eu já tenho 41 anos, você não perguntou se eu fiz alguma operação, nem nada, mas tudo bem, mas tudo bem.
P/1 ¬– Você fez alguma operação?
R – Fiz, operei da perna, como eu falei pra você, que eu cai do caminhão do meu tio, posso te chamar de você.
P/1 ¬– Claro.
R – Cai do caminhão do meu tio, fiz a cirurgia da perna já adulta também, depois, eu fiz mais uma cirurgia, operei assim, e agora, estou com a minha barriguinha chique, mudanças na vida que a gente tem, às vezes, pode até todo mundo dizer que é castigo, não sei o que, mais pra mim, é amadurecimento, muito legal. Eu sou uma pessoa feliz, eu não vou fazer um personagem pra você, só porque eu estou sendo filmada, não, eu sou do jeito que você está me vendo aqui tranquila, dou risada pra caramba, gosto muito de rir, muito legal.
P/1 ¬– Mas a sua operação, só pra eu entender, foi uma coisa bem marcante, o que foi essa operação? Conta direito o que foi isso, foi por causa da queda lá da infância, como é isso?
R – Porque eu fiquei com escoliose eu fiquei com problema na coluna, aí eu tive que operar, fazer esse alongamento de tendão, eu não vou saber te explicar que é coisa de médico, coisa de médico pra gente, que é leigo sempre é complicado. Fica assim, sei lá, pra explicar até a pessoa entender o que a gente está explicando, é muita coisa, mas serviu, foi bom de eu ter feito, que agora eu estou andando direito, que eu andava na ponta do pé. Então eu sempre brincava com a minha mãe que eu era a bailarina do Municipal porque eu andava na ponta do pé, mas eu achei ótimo, foi bom, legal.
P/1 ¬– Tem mais algum causo que eu não perguntei? De repente, você tira umas histórias. O violão?
R – O violão não deu tempo de aprender, porque eu não era alfabetizada, gostaria de ter aprendido mais, de ter trabalhado mais, quando eu era mais nova, o meu desejo era aprender a ler a escrever assim, porque eu sempre achei o som do violão muito bonito, muito gostoso, já peguei o violão na mão assim, acho muito bonito, queria um pra mim, mas é caro pra caramba, mas é lindo, violão é a coisa mais linda do mundo, não mais do que o piano, mais é bonito, não é?
P/1 ¬– Eu acho. Música, esses instrumentos.
R – Mas eu nunca me liguei assim em instrumentos, bastante instrumento eu nunca me apeguei assim, não, eu gosto mais é de coisa que me interessa, assim coisa de fazer artesanato, coisa de comida, coisas diferentes que eu possa aprender assim fácil, eu me interesso, entendeu?
P/1 ¬– Algum amigo? Eu não perguntei sobre seus amigos, por exemplo.
R – Amigos, eu tenho poucos.
P/1 ¬– Mais tem?
R – Ah, tenho. Eu tenho um amigo assim, eu considero ele como amigo, ele é padre, faz tempo que eu não o vejo, padre Jorge Molinari, é um padre excelente, ótimo, maravilhoso, foi ele que me batizou. Eu fui batizada agora, depois de adulta. Nossa, muito bonito meu batizado, momento marcante pra mim.
P/1 ¬– Conta pra gente como foi, foi agora?
R – Foi em 2004. Foi no dia 13 de novembro de 2004. Caiu no sábado. Que momento lindo! Ótimo, meus padrinhos, minha mãe, minhas irmãs, todos que me conhecem, familiares, conhecidos, todos ali no meu batizado, pra mim foi um grande momento. Aí depois, no mesmo mês, no mesmo ano, no dia 20 de novembro do mesmo ano, eu fiz minha primeira eucaristia, é muito importante pra quem é católico assim, nossa, é um momento meu, momento que eu me senti a pessoa mais feliz da face da terra, momento lindo, meu, maravilhoso, muito bom.
P/1 ¬– E todas foram com o padre Jorge, foi isso? Padre Jorge é seu tutor?
R – É. Ele é um ótimo padre, eu considero ele como amigo, meu amigo assim, eu me confesso com ele, eu acho que ele me entende, quando eu vou me confessar, quando eu vou falar com ele, ele sabe me explicar as coisas, sabe me entender assim, eu não falo muito de mim pras pessoas, que eu acho que não interessa, que não importa, tem coisas que eu prefiro guardar pra mim e falar assim, às vezes, quando eu tenho vontade, eu falo, ou fico quieta assim, no canto, entendeu?
P/1 ¬– Mas está gostando de contar a sua história?
R – Ah legal, estou achando diferente, agora eu estou até mais calma, estou tranquila, sério porque é uma coisa nova. Então, dá aquele nervoso se falar coisa errada, se eu falar coisa errada, como vai ser? Assim, contando um pouco da minha história eu não tenho muito o que contar. Só isso, entendeu?
P/1 ¬– Eu aposto que tem um monte de coisa e que não cabe em uma fita só.
R – Eu gosto de fazer maquiagem, eu gosto de fazer hidratação no meu cabelo, meu sonho é ter cabelo grande, eu gosto eu acho muito bonito.
P/1 ¬– Grande, grande assim?
R – Não grande exagerado, mais aquele cabelo bonito bem cuidado assim, até aqui, por exemplo, eu acho muito lindo, muito legal. Já em festa da minha prima Eunice, que ela fez um baile à fantasia de aniversário dela, sabe? Foi muito legal, muito legal. Momentos maravilhosos, divertidos, foi muito bom.
P/1 ¬– Foi uma festança?
R – Foi. Foi uma festa no salão, muito legal, muito bonita. Dancei pra caramba, muito legal. Minha fantasia foi de cigana, eu tava lá, muito bonita de cigana, muito legal.
P/1 ¬– Essa foto você não trouxe.
R – Não. Não, porque está no computador. Mas foi muito legal, foi muito da hora. Formatura, casamento que a gente foi assim, foi marcante, muito legal.
P/1 ¬– Conta um, qual foi?
R – Eu tenho o casamento da minha prima Daniele, foi muito lindo o casamento dela, aí a gente se arrumou, fiz escova, minha mãe me arrumou, passou maquiagem em mim, eu gosto muito de maquiagem, eu acho muito legal, e salto alto também.
P/1 ¬– Salto alto, também?
R – É, mais não alto assim, mais ou menos, aquele saltinho mais ou menos? Não exagerado, coisa exagerado eu não gosto não, eu gosto de pôr minhas bijuterias, meus brincos, eu gosto de cuidar do meu rosto, passar um leite de colônia, pra ficar bem limpinho, eu gosto de me cuidar, eu gosto de ouvir rádio também.
P/1 ¬– Ah é? Você ouve o quê?
R – Ah, eu gosto de ouvir Eli Correa. Eli Correa é tudo de bom, muito legal.
P/1 ¬– Você tem um dia a dia bem parecido, como você se organiza? Ou cada dia é uma coisa?
R – Meu horário de almoço é sempre o mesmo, às duas da tarde, meu horário de café da manhã, quando eu não vou pra escola, é nove horas da manhã e quando eu janto, de vez em quando, é às nove da noite. Então tudo a minha mãe fala que tem que se acostumar com os meus horários, mas eu acho legal isso, você ter horário pra comer, pra você não comer qualquer hora assim, você tem que ter o horário básico pra se alimentar, eu gosto muito de almoçar às duas da tarde.
P/1 ¬– Mas e entre o café, o almoço e a janta, normalmente?
R – Eu não como nada não, eu não sou de comer entre o almoço e o jantar não dá, porque eu sei se eu for almoçar, eu não vou conseguir comer, então, eu deixo só pra hora do almoço.
P/1 ¬– É que eu tô vendo que você gosta de fazer muitas coisas, eu queria ver como você encaixa isso no seu dia a dia. Você encaixa isso? O rádio todo dia, todo dia uma TV.
R – É que agora eu estou sem rádio, mas eu gosto muito de ouvir rádio, assim de manhã, eu não ligo pra televisão, sete horas da manhã, seis horas da manhã, eu prefiro rádio, entendeu? Eu sou mais rádio, porque eu gosto de ouvir Paulo Barbosa, Eli Correa, o Paulinho Boa Pessoa, tudo da Rádio Capital, eu gosto. Mas eu gosto também de ouvir histórias assim, como no programa do Paulinho Boa Pessoa de tarde tem o contador de histórias, eu gosto de sentar ali, ficar ouvindo a história, como se tivesse participando da história, só que depois, às seis da tarde, eu já gosto de ver novela, ver a novela da tarde, Vale a pena ver de novo, é muito legal, eu gosto de novela, porque ai, é como você fizesse parte da história. Então, fica muito legal.
P/1 ¬– Você se coloca dentro da história?
R – Ah, às vezes sim, quando a novela é interessante, sim, quando não, não presto muita atenção. Como a novela das nove mesmo, está ficando, está legal agora, porque quando sai muito barraco na novela é muito legal, nossa eu dou muita risada, muita risada, eu gosto de novela de história romântica assim, sabe? Eu acho muito legal, eu não sou muito de filmes. Você assistir vários filmes, assim, depende do filme que me prende assim, que me chama atenção, depende, não é qualquer um.
P/1 ¬– E uma história sua que você queira contar aqui, que você vivenciou, que você gostaria de deixar registrada. Algo que eu não perguntei e que você poxa, aquele dia que a gente foi pra não sei aonde ou enfim, como o casamento da sua prima.
R – O casamento da minha prima foi um momento muito assim, que se conseguiu reunir a família toda, foi muito legal, porque foi um momento bonito, um momento dela, ela foi a estrela do dia, tudo assim a festa, o casamento, a festa, depois no outro dia assim, como por exemplo, um passeio depois do casamento da minha prima, que lá em Guarulhos, tem o Bosque Maia, que legal, olha, que momento assim, momento de aventura sabe, você andar ali, meio do mato, eu ficava imaginando antes, eu numa floresta à noite sozinha eu não sou corajosa, é sério, eu não sou nem um pouquinho corajosa, mas quando eu fui nesse Bosque Maia, foi um ex-namorado da minha irmã que levou a gente, nossa, que gostoso, que momento legal, as árvores.
P/1 ¬– Mas por que era legal? A sensação? O que é?
R – Porque você conhece árvores diferentes, ah sei lá, é de aventura, de nunca acabar o momento, de você poder eternizar o momento, muito legal.
P/1 ¬– Mas qual era a sensação que dava, você estava perdida em uma floresta, é isso?
R – É como se estivesse, entendeu? Mas não sozinha, porque sozinha ninguém merece (risos). Muito legal, porque você conhece árvores de tamanhos diferentes, de formas diferentes, eu gosto disso, mas já morar assim, numa fazenda, num sítio não dá, pra mim não dá certo. Eu gosto mais da cidade por causa do barulho dos carros, essas coisas assim, muito legal, mas silêncio assim, não gosto, não. Nossa, quando eu vou no centro da cidade com a minha mãe, eu fico muito feliz.
P/1 ¬– Vocês costumam ir pra onde, assim?
R – Ah, a gente, às vezes, vai passear no centro da cidade, na 25, coisa que eu não gosto, mas, a 25 ali é muito cheia. Mas é legal porque você vai no centro da cidade, é muito gostoso, é muito bom. Eu gosto de passear. Entendeu?
P/1 ¬– Qual é a parte que você gosta lá do centro? Tirando a 25 que é muito cheia, muita gente, aonde que você gosta?
R – O centro da cidade ali, na Luz, sabe onde passa bastante carro, tem um monte de gente pra lá e pra cá, gente como me deixa feliz, é muito gostoso, muito bom, eu gosto de barulho, não gosto de silêncio.
P/1 ¬– Ok. Tem uma pergunta, Marcos? Tem uma pergunta pra fazer pra Adriane, aproveitar? Caio? Adriane, quer falar mais alguma coisa pra gente terminar?
R – Você é legal!
P/1 ¬– (risos) Obrigado! Adriane, então em nome do Museu da Pessoa, em nome do Projeto, muito obrigado por ter dado a sua entrevista, espero que você tenha gostado.
R – Eu fui bem?
P/1 ¬– (risos) Essa pergunta foi bem (risos). Claro!
R –Fala sério! Ah, Danilo!
P/1 ¬– Obrigado.
FINAL DA ENTREVISTA
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