Conte a sua história
Histórias de Esperança – Projeto Criança Esperança
Depoimento de Elson Pedro de Orlando Júnior
Entrevistado por Rosana Miziara
São Paulo, 22 de julho de 2014
HECE_HV001_Elson Pedro de Orlando Júnior
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Claudia Lucena
MW Transcrições
P/1 – Elson, você pode começar falando o seu nome completo, local e data de nascimento?
R – Sim, meu nome é Elson Pedro de Orlando Júnior, nasci em Guaxupé, sul de Minas Gerais e no dia 29 de outubro de 1977.
P/1 – Elson, e seus pais, são de Guaxupé?
R – Os meus pais são de Guaxupé.
P/1 – Pai e mãe?
R – Quer dizer, o meu pai é de Passos, e depois, nasceu em Passos, morou em Itaú de Minas, depois foi pra Guaxupé, onde conheceu minha mãe e se casou com ela, que ela é nascida em Guaxupé.
P/1 – Seus avós paternos são da onde?
R – Os meus avós paternos, o meu avô paterno é de Passos, a minha avó, eu não lembro se ela é de Passos ou se ela é de Itaú, porque eu não cheguei a conhecê-la, eu nasci, ela já tinha falecido. O meu avô também não conheci, mas o meu pai falava muito dele, era mais próximo assim, que a minha avó faleceu, meu pai era muito novinho, então ele foi criado mais pelo meu avô, então é onde eu tinha mais esse conhecimento. E meu avô trabalhava na estação da Mogiana, então viajava muito, quer era trem, então foi assim, onde que teve essa ida pra Guaxupé e se instalou lá e viveu uma boa parte, assim, do final da vida dele em Guaxupé.
P/1 – Ele mudou com o seu pai pra lá?
R – Sim, mudou com o meu pai e com os irmãos do meu pai.
P/1 – O que ele fazia, o seu avô?
R – Então, o meu avô, assim, eu não sei bem ao certo o que ele, qual era o trabalho dele, mas meu pai falava que, tipo, usava aquela roupinha, aquele quepe, ele era um operador na Mogiana, a estação de trem, não operador das máquinas, mas tipo na manutenção, uma coisa assim, eu não sei bem ao certo o que era, mas eu sei que ele trabalhava, trabalhou muitos anos lá.
P/1 – E os avós maternos, o seu avô e sua avó?
R – Então, os meus avós eram de Guaxupé, da parte da minha mãe, e, assim, minha avó era do lar, né, e meu vô, ele trabalhava com a lavoura de café e tal, e trabalhava com cultura popular, que era o reisado, tanto do meu lado paterno e do lado materno, só que o meu avô materno era mais assim, lavoura, que ele trabalhava.
P/1 – O que essa arte de cultura popular?
R – Era o reisado, o congado, que lá no sul de Minas é muito forte, então é, que sempre é no final de ano que acontece, o reisado é no final de ano, o congado é agora em setembro e o reisado é na época do natal, o nascimento de Jesus, então tem aquela comemoração, né? Então os meus avós, vem de geração em geração na família, então desde o meu tataravô que vem essa história na família da cultura popular brasileira, e aí foi o que até me influenciou a trabalhar com cultura popular brasileira, me inserir no teatro e tal e assim que a minha vida de educador, de arte educador vem também um pouco muito dessa coisa da minha família, da raiz, da minha família, que tem.
P/1 – Nós vamos falar mais disso. Você sabe como o seu pai e a sua mãe se conheceram em Guaxupé?
R – Então, o meu pai era músico, então ele fez amizade com o irmão da minha mãe, o meu tio, que era músico também, então primeiro eles se conheceram, assim, os dois, e depois de muito tempo que o meu tio apresentou minha mãe pro meu pai, né? E aí eles tinham muita amizade, assim, só que ela tinha mais amizade, ela pegou mais amizade com o meu tio, irmão do meu pai, então ficou aquela coisa assim, era só uma amizade deles bem, assim, uma amizade, vamos dizer, uma amizade bem simples assim, eles tinham mais afinidades entre os irmãos. E aí, depois de um bom tempo, o meu pai pediu a minha mãe em namoro, e, assim, o meu avô, o pai da minha mãe já tinha falecido, porque ele era bem rígido, então ele não deixava a minha mãe namorar, então passou, depois de muito tempo que o meu avô faleceu, que aí a minha mãe veio começar a sair. Naquela época, cidade do interior, Guaxupé, as coisas eram muito assim, os pais muito rígidos em questão de namoro, aquela coisa toda, a gente tá falando isso há 38 anos atrás, 39 anos atrás quase.
P/1 – Mas quando você nasceu seu avô, o pai da sua mãe, já tinha morrido?
R – Já tinha falecido, eu só conheci a minha avó materna e, assim mesmo, ela já tinha tido um derrame, tal, um AVC, e já estava bem debilitada a saúde dela, ela faleceu em 85.
P/1 – Aí os seus pais casaram e foram morar aonde?
R – Ficaram morando em Guaxupé mesmo e daí passou um ano de casado, eu nasci e depois, após mim, nasceu três, mais três irmãos.
P/1 – Você morou até que idade em Guaxupé?
R – Eu morei em Guaxupé até os 25.
P/1 – Vinte e cinco anos?
R – É, 24 pra 25 anos.
P/1 – Então vamos voltar, como que era a sua casa de infância em Guaxupé?
R – A minha casa de infância é uma casa bem simples, como toda a casa no interior, casa grande, casa grande, mas simples e muito povoada, muito cheia de gente, assim, porque, por conta dessa questão da minha família trabalhar com cultura popular brasileira e meu pai depois fundou uma escola de samba, então a minha casa servia de sede pra essa escola de samba no interior, que foi fundada em 85, logo após a morte da minha avó, não, minto, antes da morte da minha avó, que a minha avó faleceu no meio do ano. E aí ficava assim, no começo do ano era carnaval e aí chegava mais pro meio do ano, assim, começava congado, que aí já era pro lado da minha mãe, final do ano reisado, que era o lado da minha mãe, então a gente vivia sempre assim, o sagrado e o profano, vivendo sempre juntos. Mas isso nos ajudou bastante porque conhecemos muitas pessoas, tivemos oportunidades, assim, a gente falava, a gente viajava muito sem sair de Guaxupé, porque na maioria das vezes tinha que escolher temas pra escola de samba e tal. Eu lembro até um tem que ficou muito latente, assim, foi quando a escola de samba saiu com o tema da Amazônia, e falava da Amazônia, o pulmão da nossa terra, e eu lembro que eu estava na terceira série da escola e aí na matéria de Geografia a gente tava estudando, a Amazônia, e eu lembro que muita coisa que se perguntava, muita coisa que o professor falava e eu falava junto, aquela coisa assim: “Meu Deus, da onde você tirou isso?”. E eu falava, aí foi aonde eu falei: “Não, é que eu faço”, sempre nas reuniões na minha casa que acontecia, da diretoria da escola, eles discutindo o tema, assistindo vídeos do tema tal e eu junto, sentado, assistindo. Então aquilo ali foi me dando um desenvolvimento, um crescimento muito bom, então a gente falava, eu e meus irmãos falavam, a gente viajava muito sem sair de Guaxupé, sem sair de casa, então isso me ajudou muito no processo de crescimento, desenvolvimento na escola, foi muito bom essa parte.
P/1 – Quantos irmãos?
R – Três, quatro irmãos, comigo.
P/1 – Você é o mais velho?
R – Eu sou o mais velho.
P/1 – Todos homens, mulher?
R – Todos homens, minha mãe ficou ali sozinha, ali, assim, era o sonho da minha mãe e meu pai ter uma menina, mas aí, com o passar do tempo, eles falaram: “Que bom que não veio menina, porque os quatro irmãos homens, depois muito ciumentos, né?”, a gente tinha um ciúme já da minha mãe. Então o meu pai ainda falava: “Olha, é bom a gente não ter uma menina, não, porque, se for ter uma menina, ela vai sofrer na mão dos quatro, né?”, mas acabou sendo quatro homens e, assim, graças a Deus muito bem criados pelo meu pai, pela minha mãe.
P/1 – Quais eram as suas brincadeiras de infância?
R – Então, as minhas brincadeiras de infância, até eu falo que eu sinto muita falta, hoje quando eu vejo as crianças brincarem, porque em Minas a gente tinha a liberdade de brincar no terreiro, no quintal, que a gente fala. Então a gente brincava muito, era bolinha de gude, era muito, brincadeira, pique-esconde, pique-bandeira, bola, porque tinha campinho de futebol, assim, próximo a casa, a gente fazia num pastinho assim, gramado, então jogava-se futebol. Mas, assim, quando se reunia, quando estava os homens, que era brincadeira de futebol, tal, quando reunia com as meninas, aí tinha aquela brincadeira de amarelinha, tinha aquela pera, uva, maçã, salada mista, aquelas coisas assim, né? Mas era mais, era brincadeira que a gente construía, muitas vezes a gente construía o nosso próprio brinquedo, então às vezes era carrinho, a gente pegava latinhas, material reciclável até, que a gente nem falava em reciclar, mas a gente pegava as coisas que tinha pra fazer, embora a gente tinha os nossos brinquedos, porque os pais davam, compravam, mas a gente brincava muito assim. Andava muito pelo mato e colher fruta, às vezes, muita erva, essas coisas, a gente acaba conhecendo porque via os pais falarem, e depois a gente pegava e olhava aquilo, andava, chegava próximo, tinha muita proximidade com isso, tinha muito animal, assim, próximo à casa, porque criação de cavalo, vaca, essas coisas, próximo ao lar, assim, então a gente vivia muito de perto com isso, com essa criação de animais, né? Então isso aí ajudava muito, a gente, a nossa brincadeira às vezes era isso, era ajudar as pessoas a cercarem os carneiros, cercar os cavalos e tal, levar pra dar água, aquela coisa, então a gente brincava muito assim.
P/1 – Como vocês comemoravam, quer dizer, tinha o reisado, o congado na sua casa, você lembra de alguma comemoração dessas especial, que tenha te marcado?
R – Olha, a que me marcou, assim, foram dois momentos que me marcou, assim, porque foi a primeira vez, porque, assim, o reisado, ele vem de uma ramificação da religião católica. O que acontece? Eu, no meu processo, de crescimento, quando eu tinha sete anos de idade, sete não, seis anos de idade, eu estudava no pré e foi um choque que eu e um menino, a gente correndo, aquela coisa de criança, correndo no pátio da escola e batemos a cabeça. E, nesse bater a cabeça, a professora chegou, colocou nós dois de castigo, porque foi uma batida muito forte, assim, e elas acharam que na hora, ali: “Nossa, os dois tão sangrando e tal”, mas não tinha acontecido nada e colocou a gente sentado lá de castigo, beleza. A hora que acabou o intervalo, o recreio que a gente falava, tava armando um temporal muito forte e elas: “Vamos todo mundo pra sala”, aquela coisa assim e levantou, o menino estava sentado do meu lado e ele levantou e foi, eu não consegui levantar, eu tentava levantar assim, não conseguia. E daí tinha um pilar assim próximo, eu coloquei a mão no pilar tentando levantar e a professora começou a perguntar, né: “O que está acontecendo? Vai, levanta, levanta, você está fazendo graça, olha a chuva” e falando pra ela: “Eu não estou conseguindo levantar”. E aí, a partir daquele momento, ela me ajudou a levantar com muita dificuldade, eu fui indo pra sala e eu não conseguia me locomover direito, os meus pés foram abrindo assim, e daí ela mandou chamar a minha mãe, urgente, porque eu morava próximo, a minha mãe sempre ia buscar a gente no final, eu e meu irmão, que eu estudava já no pré, meu irmão estudava no jardim, na mesma escola. E aí, quando a minha mãe subiu pra pegar a gente, minha mãe levando o meu irmão no colo e eu andando, e ela vendo que eu andando com uma certa dificuldade, ela: “Nossa, está acontecendo alguma coisa” e, quando chegou em casa, ela deu banho no meu irmão, tal, eu fui tomar banho, e começava a doer muito as minhas juntas. E meu pai chegou, nessa época o meu pai trabalhava na Telemig, que é a extinta Telemig, hoje é a Telemar em Minas e daí ela falou pro meu pai: “Olha”, eles me chamam de Júnior, né, falou: “O Júnior não está bem, bateu a cabeça na escola e tal”. E aí naquele dia eu fiquei com aquelas dores, no outro dia eu já não, da cintura pra baixo eu não tinha movimento mais, e aí correram comigo pro médico e tal, aí eu fiquei acho que uns 15, 20 dias assim, de cama e sentindo muitas dores nas juntas, tudo onde era junta eu sentia muita dor. E daí, depois de vários exames de sangue e tal, constataram reumatismo no sangue, o médico não sabia se era por conta da batida, mas foi assim, a partir daquela batida que apareceu os sintomas e tal, e aí eu fiz um tratamento, fui fazer um tratamento até os 18 anos, tomando muita injeção, aquela coisa toda, eu tenho trauma de agulha, eu morro de medo, assim. Mas aí, a partir disso, a minha avó, que era, ainda era, ainda estava viva, fez uma promessa, que eles falam, pra que, no reisado eles falam Santos Reis, então falou pra que me curasse, a partir daquele momento que eu fosse curado eu iria fazer parte, ou seja, eu ia ser um folião da Companhia de Reis. Então, e eu gostava muito, por ser criança, então tem os palhaços, aquela coisa toda, então toda criança gosta, muito alegre, muita música, aquela coisa assim. E aí, quando completou os sete anos, eu me inseri no reisado, foi o meu primeiro ano, que a criança só pode sair após sete anos de idade, pelos costumes que tem, então foi onde que me marcou, que foi o primeiro ano que eu saí. E tinha um tio, que era irmão da minha mãe, hoje falecido, que ele era assim, ele não tinha filho homem, todas as filhas dele eram mulher e até então ele não tinha tido filho homem e ele me tratava como filho, assim, pra todo lugar que ele me levava era: “Meu filho, meu filho”. Então eu era, eu era muito mimado por ele, então era aquela disputa, ele e o meu pai, assim, e ele era músico também, então pra onde ele ia me levava, aquela coisa toda. Então o que me marcou também, porque eu me espelhava muito nele, além do meu pai, eu espelhava muito nele, era músico e tal e era, fazia parte do reisado, entendia muito, da história do reisado e tal. E depois, quando foi em, aí a minha avó faleceu em 85, quando foi em 89, esse meu tio faleceu, então esse momento foi outro momento que me marcou muito, porque, pra eu continuar no reisado, porque a minha mãe, só estava eu, assim, mesmo, que aí acabou ficando só eu da família, porque foram morrendo. Então o meu tio faleceu e aí restava eu, então, ou seja, eu que fui dar continuidade na minha família, ficou aquela responsabilidade nas minhas costas, assim, de continuar pra que não morresse isso na família, o reisado na família. Então aquele momento foi muito difícil pra eu ter que ir todo ano fazer parte e ver que o meu tio não tava lá mais, e, assim, foi muito duro, que pra minha mãe foi também um choque, assim, que ele era um irmão muito próximo da minha mãe, então pra minha mãe foi muito difícil, pra todos nós, assim, da família, mas tanto pra minha como pra minha mãe foi muito forte, assim. Aí passou um período que o meu irmão começou a querer se inserir no reisado e tal, aí foi, com o passar do tempo, foi vindo minha mãe, minha mãe começou, a minha mãe voltou a sair, que ela saía na época do meu... A gente fala sair, porque tem a saída e tem a chegada na Folia de Reis, então a gente fala sair, então a minha mãe sempre fazia, começou a fazer parte quando o meu avô estava, depois o meu vô faleceu e minha mãe, deu aquela parada, depois que a minha avó fez essa promessa que aí continuou comigo. E aí, depois que o meu tio faleceu, aí a minha mãe, depois de algum tempo, começou a sair, aí meu irmão, aí hoje está praticamente a família toda e eu não estou mais, né? Aí o meu pai, que o meu pai faleceu em 2012 e, assim, o meu pai apoiava muito, só que ele gostava muito de ver, o reisado e tal, só que ele não saía no reisado, não fazia parte, ele fazia parte dos bastidores, né? Agora, aí, já a minha mãe entrou de cabeça assim, tal, daí a minha mãe cantava e tudo e hoje o meu irmão tomou o meu posto, eu saí, o meu irmão tomou o meu posto e ficou lá. Então eu passei por todos ali, todo o processo do reisado, que tem o embaixador, tem o bastião, tem tipe, contratipe, que são as vozes, são separadas, eu passei por todos ali, e fui ensinando os meus irmãos e aí eles aprenderam, foram aprendendo e eu fui me distanciando, me distanciando, até... E depois também ficou um pouco difícil quando eu vim pra cá, pra São Paulo, pra eu ter que ir pra lá, eu ia todo final de ano, eu ia, mas aí sempre tinha os trabalhos aqui que eu tinha que parar no meio, então às vezes eu fazia saída e não fazia chegada.
P/1 – O que é fazer saída e o que é fazer chegada?
R – A saída é assim, todo dia 25, como se comemora o Natal, o nascimento de Cristo, a Folia de Reis sai, ou seja, ela sai de uma casa específica, ou seja, se você, é como a gente fala, lá o pessoal faz as promessas para serem curados, receber uma cura, uma benção e tal, então essa pessoa, ela faz a promessa de que daqui um ano a Folia de Reis faça a saída da casa dela e faça a chegada na casa dela. Então a saída, a Companhia de Reis, ela sai num processo de cumprir várias promessas, então vai cantando em casa em casa, é como se fosse uma oração, vai fazendo em todas as casas. E aí ela faz esse trajeto da saída, ela como faz a comparação da viagem dos três reis magos quando foram visitar o Menino Jesus, então nessa saída ela faz assim, como se fosse a visita dos três reis magos, quando saíram do oriente pra ir pra Belém pra visitar o Jesus Menino. Então a Companhia de Reis faz esse trajeto, como se tivesse saindo do oriente e indo pra Belém, aí a chegada é, tanto que a saída, ela sai pelo lado direito e chega pelo lado esquerdo, ou seja que não veio pelo mesmo caminho, caminho diferente, então está indo pra, saindo do oriente pra Belém, então faz essa comparação, né? É muito bonita a história, essa época lá em Minas, que são muitos, são muitos turistas que vão pra cidade, para aquelas cidades da região, que todas as cidades ali têm, então é muito turista no final de ano pra ver, pra participar das festas. E, assim, cada casa que se passa, vão se comendo, alguma, tem casa que é almoço, tem casa que é janta, tem casa que é café, então muitas pessoas, eu lembro que, assim, era cerca de, na minha casa, era final de ano, assim, ou saída ou chegada, quando fazia lá, ou se fosse janta, que a gente falava, chegava a ir três mil pessoas, duas mil e quinhentas pessoas lá em casa, em cada casa, assim, muita gente, é uma festa muito grande, e muito bonita por sinal.
P/1 – Como que era a convivência na sua casa, quem que exercia a autoridade, seu pai ou sua mãe?
R – O meu pai.
P/1 – Como que ele era? Descreve um pouco.
R – O meu pai era uma pessoa pacata, tranquila, a gente costumava falar assim, que de tão tranquilo que ele era, quando ele ficava nervoso, ele estourava, ele guardava muito, ele estourava de uma vez, assim. Mas ele era uma pessoa, assim, muito estudada, falava muito bem e falava assim, a gente falava que ele conseguia falar as linguagens seja com criança, adolescente, adulto, sempre antenado, sempre tava ali, como eu posso dizer? Ele sempre estava atualizado em tudo em tudo, com todos, é uma pessoa muito tranquila, muito calma e enérgica quando precisava ser, mas uma pessoa que conversava bastante, conversava muito. E passou por muita dificuldade na vida dele, passou por muita dificuldade mesmo e isso ajudou muito a ele amadurecer e a passar isso pra gente, então ele conversava muito com a gente. Por ser todos filhos homens, então a gente tinha muito essa proximidade com ele, lógico que com a minha mãe também, mas tinha muito essa proximidade com ele e de conversar muito, conversar bastante, geralmente a filha mulher conversa mais com a mãe, o homem conversa mais com o pai, né? Então a gente tinha isso de conversar com os dois, porque sempre os dois estavam sempre unidos, meu pai e minha mãe, a gente brincava, todos os amigos meus que iam lá em casa ainda falavam: “Nossa, seu pai e sua mãe namoram até hoje, tipo, depois de 30 anos de casado, eles ainda namoram”. Então porque era muito grudado um ao outro, assim, tanto que, após o falecimento dele, a minha mãe, não só nós, mas a minha mãe sentiu muito, a gente se preocupa muito com a minha mãe. Mas o meu pai, assim, sempre foi uma pessoa muito centrada, muito dedicada naquilo que ele...
P/1 – Que lembrança que você tem dele, assim, que te marcou, um dia, um episódio?
R – Olha, foram tantos que pra escolher um, eu lembro que teve uma, quando teve aquela época do Plano Collor, então o meu pai, ele trabalhava na Telemig, que é extinta, a Telemar, então foi uma debandada de vários funcionários ir embora, que mandaram embora, e o meu pai tava nesse meio. E eu lembro que naquela época, o dinheiro que o meu pai tinha guardado no banco, aquela coisa toda, assim, também sumiu, e ele ficou no desespero, que já tinha os três filhos, ainda o caçula não tinha nascido ainda. E eu tinha 11, eu tinha 11 anos, dez pra 11 anos, e daí eu sempre falava pro meu pai: “Pai, eu quero trabalhar”, desde novo, muito novo, porque a gente conversava muito, ele falava que tinha começado a trabalhar cedo, a gente querendo trabalhar, o meu pai: “Não, vocês vão estudar, não vão trabalhar, vão estudar, vocês não precisam trabalhar” e eu querendo sempre trabalhar. E aí chegou nesse momento que o meu pai falou: “Meu Deus, o que é que vai fazer?”, falou, aí eu falei pra ele: “Pai, eu quero trabalhar pra te ajudar” e ele: “Não, mas não precisa, o pai vai dar um jeito”, eu falei: “Não, eu quero trabalhar pra te ajudar”. E aí eu lembro que consegui trabalhar, consegui emprego numa padaria, de balconista, e naquela época eu estudava de manhã na quinta série, eu tava na quinta série, sexta série, estudando de manhã e ele, e trabalhava à tarde, entrava às duas da tarde, trabalhava até às dez da noite. E aí o meu pai falava pra mim, ficava muito preocupado comigo, falava: “Júnior, você não tem vida, você estuda de manhã e trabalha da tarde à noite, chega em casa, dorme, o outro dia vai estudar”, e eu: “Não, mas eu quero assim”. E aí, depois, o passar do tempo, eu lembro que eu trabalhei nessa época pra ajudar o meu pai, depois ele começou a trabalhar, entrou na prefeitura da cidade lá, começou a trabalhar. E chegou um dia que o meu padrinho de batismo, chegou pra mim e falou: “Olha, eu estou muito orgulhoso de você”, aí eu falei: “Mas por quê?”, ele falou assim: “Olha, o seu pai chegou pra mim e ele falou que (emocionado)”, ele falou assim: “O seu pai, ele conversando comigo, falou: ‘O Júnior é um filho de ouro, eu tenho um filho de ouro’”. E aí o meu padrinho falou: “Mas por quê?”, ele falou: “Eu não preciso de falar nada pra ele, ele, a gente tem uma sintonia tão grande que no momento que a gente tava mais precisando em casa, ele, ali eu vi que ele fez, desde pequeno, desde novinho, ele fez jus de ser o filho mais velho e tomar as rédeas da família naquele momento, e pra assumir a responsabilidade de trabalhar pra sustentar os irmãos e sustentar a mãe dele e me sustentar”, falando pro meu padrinho. O meu padrinho falou: “Então eu estou muito orgulhoso de você por conta disso” e aí e meu pai nunca tinha me falado isso, o meu pai, ele comentou isso com o meu padrinho, o meu padrinho que falou. E aí chegou em 2012, agora em setembro de 2012, que ele estava internado aqui em São Paulo e eu cuidando dele no hospital, ele, aí ele veio, aí ele falou, aí foi onde ele falou, veio falar pra mim, ele falou pra mim: “Olha, você pra mim está sendo um filho de ouro, você cuidou de mim a vida toda”, ele falou: “Agora, no último momento da minha vida, você está cuidando de mim”. Aí ele falou: “Eu te amo muito e nunca deixei de te amar, pode ter certeza que eu vou te amar pra sempre” e aquilo, e eu lutando pra recuperação dele e falei: “Pai, mas não fala assim, o senhor vai se recuperar e tudo”, ele falou assim, ele olhou pra mim bem no meu olho, assim, falou: “Deus que sabe” e começou a chorar muito, né? Então isso me marcou, eu sou difícil pra chorar, eu seguro até no último, mas é que meu pai foi, foi não, o meu pai é pra mim, até hoje ele é muito vivo, assim, em tudo o que eu faço, em tudo que eu faço hoje, assim, tudo na minha vida, eu sempre, o meu pai sempre me ensinou, a respeitar as pessoas, a sempre, a contribuir pras pessoas, né? Que ele sempre me falou assim: “Não seja uma pessoa que vai tirar de alguém sem acrescentar algo”, ele falou: “Seja, faço o contrário, seja uma pessoa que vai acrescentar sempre algo na vida de alguém, porque é isso que vai tornar a sua vida importante, isso vai tornar a sua passagem por esse mundo de alguma forma importante, né, porque valeu alguma coisa você ter vivido”, ele falou: “Então acrescente sempre na vida de alguém”. Então isso foi uma coisa que marcou e eu guardo isso pro resto da minha vida, e tento passar pro meu filho agora, que eu tenho um filho de três meses, choro muitas vezes, porque eu queria muito que o meu pai tivesse conhecido o meu filho, que o meu filho tivesse conhecido o meu pai, né? Eu falo pro meu filho, ainda falo: “Se você tivesse conhecido, tivesse a oportunidade de conhecer o seu avô”, eu tava brincando outro dia com o meu filho, ele tem três meses, mas brincando, falando com ele, a minha esposa ainda começou a chorar, porque eu falei pra ele, eu falei: “O pai pede perdão pra você por não ter se programado pra você vir antes e ter tido tempo de conhecer o seu avô”, né? Eu falei: “Mas você vai ver muito falar dele”, porque na cidade, assim, na minha cidade, Guaxupé, o meu pai foi muito conhecido lá, então todo mundo, até hoje, isso fica muito vivo na gente, que sempre alguém tem um depoimento que o meu pai conversou e aquela coisa assim, pessoas que, tem pessoas que chegaram em mim, eu nem sabia, depoimento de falar assim: “Olha, eu estava enterrado na droga e depois de uma conversa com o seu pai”, ele falou: “Eu refiz a minha vida”, outros: “Depois de uma conversa com o seu pai eu construí minha vida assim, assado”. Então isso eu levo pro resto da minha vida, então sempre quando, às vezes, a gente está naquela... bate aquela depressãozinha, da falta, sempre tem alguém que chega e conta uma coisa, uma história dele interessante, uma coisa que viveu com ele e isso nos mantém ele vivo dentro da gente, e onde nos dá aquela força pra continuar o que ele deixou, né?
P/1 – E a sua mãe, como é que ela era na infância?
R – A minha mãe, na infância dela, a minha mãe foi uma pessoa que trabalhou muito, porque o meu avô, ele ficou doente muito cedo, o meu avô, ele contraiu a doença de Chagas, então ele, assim, ele ficou muito debilitado, pelo motivo do coração e isso fez com que a minha mãe, assim, na infância dela aqui em Minas sempre trabalhou, né? Então, e, assim, embora a minha cidade lá, Guaxupé, era uma cidade de barão de café, aquela coisa, né, então ainda, vamos dizer assim, na época da minha mãe, época de infância, ainda tinha muito aquela herança da época do período colonial, da época da escravatura, então tinha, era muito preconceito, muita discriminação naquela época ainda, mais forte ainda. Minha mãe trabalhava em casa de família, então ela passou um período, assim, de infância, muito pesado pra ela, assim, tanto que a minha mãe, ela não terminou os estudos, ela não conseguiu terminar os estudos, ela estudou até a quinta série, quinta, sexta série. E pelo fato, justamente, ela até conta uma coisa que ficou marcado isso na minha vida, quando ela contou, que ela, deu um temporal na cidade lá e começou a destelhar a escola, uma escola bem simples e começou a destelhar a escola e os alunos todos correram pra próximo à professora, pra se abrigar e, quando ela foi correr, a professora, os alunos disseram: “Não, não, você não vai ficar perto da gente”, porque a minha mãe era a única negra da sala. Então isso, ela, tipo, ela já tinha uma dificuldade, pra estar estudando e tal, tinha que trabalhar e tudo, ela não era a irmã mais velha, mas ela cuidava até do irmão mais velho dela e ela acabou se, tipo, tanto que até hoje ela, os irmãos, os dois irmãos que ficaram, que são mais novos que ela, o meu tio, eles não fazem nada sem, assim, estar com a minha mãe, sempre tem a minha mãe ali como porto seguro, que ela acabou ficando assim, desde criança cuidando deles e cuidando do meu avô, da minha avó, né? Mas ela teve o tempo dela de brincar, aquela coisa toda, assim, mas muito pouco, só que, por conta também do meu avô ser um pouco bem rígido com ela, mas gostava, tinha um apreço muito grande por ela por ser filha, uma filha que ele gostava muito, falava, só que então ela teve essa responsabilidade de ter que arcar com a responsabilidade do lar, essa responsabilidade da casa, né? Então ficou, isso ficou, ela trabalhou muito, trabalhou muito, tanto que ela até, depois de um tempo, que o Marcos Frota, ele é de Guaxupé e minha mãe trabalhou na casa dele, então ele tem, assim, gosta muito da minha mãe até. Então às vezes a gente se encontra, final de ano ele sempre está em Guaxupé, por conta do reisado, que ele gosta muito, ele sempre vai, ele sempre vai na Folia de Reis, onde está a minha família, tal, porque ele conhece, tudo, então chega lá, conversa, tudo, com a gente, conversa com a minha mãe e tal. E a gente vê que uma, assim, são pessoas que a minha mãe tem carinho por eles, eles têm um carinho grande pela minha mãe por essa fase dela de ter trabalhado. E, assim, a minha mãe só parou de trabalhar quando ela se casou, que o meu pai disse pra ela, falou: “Você não vai trabalhar mais, você trabalhou muito na sua vida, já passou por muita coisa, então agora, a partir de hoje, eu tomo a responsabilidade como seu esposo e você não vai precisar trabalhar”, tanto que não mais, a minha mãe não trabalhou mais por conta disso, por cuidar do lar, aquela coisa toda e tal. Porque principalmente naquela época, hoje também já é difícil, mas aí pra que a minha mãe ia continuar trabalhando no lar, casa de família, tudo, o meu pai não queria isso pra ela, ele falou: “Não, isso não, pra você não, que eu vou trabalhar, então não precisa você trabalhar”. Mas a vida da minha mãe foi assim antes do casamento, até a mocidade dela, de muito trabalho, tudo, se divertia, tudo, mas mais a responsabilidade de cuidar da família.
P/1 – Com quantos anos você entrou na escola?
R – Eu entrei na escola com, na idade normal, eu fiz o jardim, o pré, cinco, seis anos, e entrei na escola com sete anos de idade.
P/1 – Como que você ia pra escola?
R – Eu ia na escola com a minha mãe levando, minha mãe levava, a escola era sempre no bairro, as três escolas que eu estudei, nos três períodos, foram ali no bairro em Guaxupé aonde eu moro, morava. Então a minha mãe no começo me levava e depois, a partir do momento que estava já na terceira série, já não precisava mais, que a escola era perto, então a gente já ia com aquela turma de amigos e tal pra escola, ia conversando e brincando e tudo, pra aula e voltava pra casa. Então foi assim, a minha mãe levou mais o período quando eu era mais novo, no jardim e pré.
P/1 – Você lembra das suas professoras?
R – Lembro, lembro, lembro muito.
P/1 – Lembra o nome delas?
R – Lembro, no pré a minha professora era a Marcy e a Vanilda, até há pouco tempo eu ainda encontrei com ela lá em Guaxupé, a Marcy faz um bom tempo que eu não a vejo, eu até queria vê-la porque ela estava, quando eu fiquei sabendo, ela tinha contraído câncer, então não sei como que está a vida dela agora, se ela está se tratando, tal, porque já faz algum tempinho que eu não vejo ela. Antes ela morava próximo à casa da minha mãe, então eu sempre via ela, depois não a vi mais, mas eu conheço. A minha primeira professora de escola, que foi a Dona Regina, professora do primeiro ano, que foi assim, uma professora excelente e depois tive parentes que estudaram com ela depois de mim, assim, até comentava. Mas eu falo que é uma, foi uma das primeiras professoras, assim, que me ensinou a ler, depois de ter saído do pré, então é uma professora que marcou muito, embora na época eu lembro que eu não gostava muito de ler, mas é uma professora que sempre esteve ali me apoiando, sempre esteve ali comigo do lado e falava: “Elson, é aqui, aquela coisa”, teve aquele carinho, aquele cuidado e hoje eu agradeço muito a ela. Mas aí tive, desde, aí da primeira série, a professora, a Dona Marilda, Dona Geni, Dona Bete, assim, lembro muito, e depois as professoras no ginásio também, professoras que, eu lembro que eu, eu tive uma época minha de escola que eu, assim, brincava muito, assim, estudava, sabia todo conteúdo, mas não por falta, mas brincava mesmo, então eu cheguei até a reprovar por conta dessas brincadeiras, né? Mas eu agradeço até uma professora de História, que é a Dona Lúcia Aldeoti, eu lembro que na oitava série ela me reprovou por conta de um décimo, um décimo, ela era muito rígida, só que era uma, assim, uma professora que eu agradeço muito, porque depois ela até foi madrinha de casamento do meu irmão, então a gente conversava muito, brincava, mas é uma professora que eu aprendi muito de História com ela, né? E eu acho que até depois eu me interessei um pouco por conta do teatro, da história do teatro, por conta de ter aprendido a gostar de História, que na época eu nem gostava, mas foi uma professora que ela me ensinou uma forma de, uma maneira de estudar História sem se tornar cansativo. E só que ela, por conta de eu brincar demais, ela falou: “Elson, se você precisar de um décimo pra passar de ano, eu não te passo”, eu lembro, e ela falava muito isso, eu sempre levando na brincadeira e chegou no final do ano, justo um décimo que eu precisei ela não deu. Eu: “Pelo amor de Deus, eu faço um trabalho”, ela: “Não, você não vai” e aquela turma toda, que a gente começou desde a quinta série, assim, a turma toda acompanhando junto, a turma passou, eu vendo a turma passar, e eu ficar, eu falei: “Meu Deus”, e aí caiu a ficha, né? Então depois eu falei: “Nossa, eu vou ter que correr atrás do prejuízo”, mas foi muito bom isso na minha vida, que foi muito importante, que aquela professora que não passava a mão na cabeça e tal, mas aquela professora que chegava, falava uma coisa, cumpria, com aquilo que ela falava, mas tinha um compromisso com o que ela fazia, o que ela foi designada a fazer, né? Mas aí a Vânia também, uma professora de Português que eu tive, maravilhosa, que daí me deu abertura, assim, pra que eu pudesse, eu escrevi uma peça de teatro e a gente encenou uma peça na escola como trabalho final, né? Eu lembro que muita gente precisava de nota e ela, e eu tomei responsabilidade da nota desse pessoal, que eu falei assim: “Ó, deixa eu fazer um trabalho com esse pessoal aqui que está precisando de nota”, eu já tinha até, já tinha fechado a matéria com ela já em notas, eu não precisava e ela: “Mas você quer fazer esse trabalho?”, eu falei: “Eu quero”. Daí pedi pra fazer um trabalho com esse pessoal e fiz e aí escrevi uma peça, encenamos e tal, e eu lembro que na época eu peguei a moto do meu primo pra encenar e a moto, chegou na hora da peça, o nervosismo, eu entrei com a moto no cenário e a moto, eu fui brecar, a moto não brecou e eu saí levando um monte de gente da cadeira assim. E aí tive que continuar a peça e tal, mas foi muito legal esse dia, mas foi um susto, assim muito grande, todo mundo se assustou e ela: “Pelo amor de Deus, quase você mata ali o pessoal”, né? Mas foi muito legal porque a galera conseguiu recuperar a nota e no final de ano passar, então foi, assim, uma coisa que eu gostei muito. Eu cheguei em casa igual louco com uma caminhonete lá: “Mãe, eu preciso levar o jogo de sofá da senhora”, “Quê? Você está ficando louco?”, eu falei: “Eu preciso levar”, “Pra quê?”, eu falei: “A gente vai fazer uma peça hoje lá e eu preciso de alguma coisa pra fazer o cenário. E aí eu lembro que eu levei o jogo de sofá da minha mãe, da sala, eu levei uma cama lá de casa, uma cama de solteiro, pra fazer, pra montar o cenário, que a gente não tinha, a gente tinha que montar com que a gente tinha e ninguém tinha nada. Eu falei: “Então pera aí que eu vou lá em casa e pego”, pegamos uma caminhonete de um amigo meu e fomos lá e pegamos, mas foi muito bom e, assim, uma coisa que eu guardo, assim, pra sempre da minha fase de período de escola, período escolar. E, assim, e onde eu comecei, e nessa escola foi onde eu comecei a minha carreira como músico, porque em 94, quando o Brasil foi campeão, a gente montou na escola, no intervalo da escola, a gente era acostumado a ir pro intervalo com instrumentos de música e tocar pagode, tocar samba, porque era da raiz da família e tal, dos amigos. E aí, a partir daí, a gente fundou um grupo que chamava, no começo chamava Sedução, depois chamou Inspiração, mas a gente, aí eu fiquei à frente desse grupo aí durante 15 anos, e a gente veio, na verdade, parar com o grupo depois que eu vim embora pra São Paulo, praticamente.
P/1 – Mas aí foi na escola que você começou como músico que você criou esse grupo?
R – Sim, foi na escola, no Polivalente, chamado Polivalente, lá na Doutor André Cortez Granero que era a escola.
P/1 – Quantos anos você tinha?
R – Eu tinha 16 anos e daí a gente ensaiava em casa, na minha casa, e, assim, me tornei vocalista desse grupo por livre e espontânea pressão, porque a gente, todo mundo, a gente organizou os instrumentos: “Ó, todo mundo vai, cada um vai tocar isso, isso, aquilo”. Aí chegou depois, tudo bem, a gente separou quem vai tocar, quem vai fazer o que, separamos o repertório, mas quem vai cantar, ninguém sabia quem ia cantar, aí eu falei: “Ó, tudo bem”. A gente já tinha, por incrível que pareça, a gente já tinha um compromisso marcado, eu falei: “Nesse primeiro evento que a gente vai eu canto, mas nos próximos a gente escolhe outra pessoa pra cantar”, aí tudo bem. E aí no primeiro evento eu fui, cantei e aí todo mundo do grupo: “Ó, não tem jeito, vai ser você mesmo que vai ficar”, eu falei: “Não, eu não, pelo amor de Deus, eu sou muito tímido”, eu sempre fui muito tímido, e eu falei: “Não, não vou, não vou” e eles: “Não, mas não tem outra pessoa que cante, tem que ser você e a voz é assim”. Eu falei: “Não, não tenho voz”, “Tem voz sim”, e aí juntou que as pessoas que foram nos assistir, nos prestigiar no evento, falavam: “Nossa, que legal você cantando, tudo”, e aí já vinha de família, né? E eu lembro que uma vez eu falei pro meu pai, tinha uma festa nessa mesma escola, muito antes de eu começar a cantar, e o meu pai, a gente estava, eu, meu pai, minha mãe, vendo a festa lá, uma quermesse que tinha nessa escola, que era semana das flores, e aí o meu pai: “Vem cá pra você ver o menino cantar lá, vem cá pra você ver o menino cantar”, o meu pai, por ser músico: “Olha ali o menininho cantando, que legal”. Aí eu olhei pro meu pai assim, eu estava brincando com os meninos, eu olhei pro meu pai: “Ah, pai”, eu olhei assim: “Eu canto melhor que esse menino aí” e saí pra brincar, e aí o meu pai falou: “Meu Deus”. Aí eu lembro que o meu pai ainda comentou comigo, falou: “Júnior”, eu fiquei com tanta vergonha que eu olhei pras pessoas que estavam do lado e falei assim: “Ó, ele nunca abriu a boca pra cantar e fala que canta melhor do que o menino”, eu falei: “Meu Deus do céu, não sei o que ele está falando”, mas passou. E aí, com o passar do tempo, depois o meu pai chegou pra mim e falou: “Realmente você canta melhor do que aquele menino”, porque aí depois a gente cresceu e eu acabei tendo amizade com esse menino, ele canta música sertaneja e eu cantava outros estilos de música. Mas aí o meu pai: “Realmente eu tenho que afirmar agora, que você canta melhor que ele, né, não é porque é meu filho, tal”, mas aí a gente veio lembrar desse episódio, meu comentando e eu comecei até a dar risada, porque eu falei: “Quem diria, eu ter falado aquilo, que canto melhor, mal eu sabia o que aconteceria ali na frente”. Mas aí, daí fiquei assim, ficamos um bom tempo com o grupo e na verdade o grupo só parou porque aí eu resolvi vir embora pra São Paulo, porque eu queria estudar mais, eu queria estudar música, queria estudar teatro e tal, queria ter uma busca maior, que já na minha cidade já não tinha mais, não tinha tanto.
P/1 – Quantos anos você tinha?
R – Quando eu vim pra São Paulo? Tinha 24 pra 25 anos.
P/1 – Mas antes dos 24 você foi, você se formou no colegial.
R – Sim, formei no colegial, aí servi o Exército, aí fui fazer, fiz o técnico ainda em Contabilidade, aí servi o Exército.
P/1 – Por que você escolheu fazer técnico em Contabilidade? Quem te influenciou?
R – Porque na minha escola tinha duas opções, ou era Enfermagem ou era Contábil, e aí eu lembro que no primeiro mês que a gente poderia escolher, ter opção, eu fui, a gente começou na aula de Enfermagem, a gente começou a assistir um vídeo de um parto. Aí, a partir daí, como eu tinha muito medo de agulha já, a partir daí, que eu assisti esse vídeo de um parto, e era um parto cesárea ainda, então a hora que começou a cortar e tal, aí a hora que, assim, estourou a placenta, eu falei: “Meu Deus”, eu falei: “Não, não é isso que eu vou fazer, não”. E eu não, assim, eu detestava Matemática, mas eu falei: “Eu vou fazer Contabilidade” e aí até influenciou porque o meu pai tinha um primo que tem um escritório de contabilidade e me levou pra fazer estágio lá, então já veio a calhar, que eu falei: “Agora já estou, então vou fazer”. Então aí trabalhei um bom tempo nesse escritório, assim, eu sempre, quando eu tava em Guaxupé, depois de um período, eu sempre comecei a trabalhar na área administrativa, né, então isso foi influenciando e eu tinha que procurar.
P/1 – Você trabalhava desde os 16 já?
R – Sim, sim, trabalhava desde os 11, mas aí fui indo, trabalhando de balconista na padaria, aí saí, depois trabalhei numa empresa de água mineral e tudo, trabalhei numa, até numa distribuidora de bebidas lá. E depois comecei a trabalhar, com a idade, um pouco já depois de ter até servido o Exército, na área administrativa, então eu precisava de me especializar, então eu falei: “Vou ter que, vai ter que ser Contabilidade pra mim fazer”. E na verdade, até na faculdade que tinha na minha cidade, que era a única faculdade, os cursos que tinha era Contabilidade, era Administração, tal, eu falei: “Meu, não quero”, e eu queria fazer Jornalismo, tanto que quando eu vim pra São Paulo eu comecei a fazer Jornalismo e não consegui pagar, porque na época eu não consegui bolsa e tal e era caro, então eu comecei no primeiro ano e já parei. Eu falei: “Não, eu vou ter que começar a trabalhar, começar a correr atrás”, aí foi onde que eu comecei a fazer o teatro e me especializar.
P/1 – Vamos voltar, aí em que momento que você decidiu vir pra São Paulo? Como foi a sua vinda?
R – A gente ainda tava tocando bastante lá, fazendo shows, eu fazia já teatro lá em Guaxupé e eu decidi, eu falei, aí vim passear, aos 16 anos eu vim, a gente vinha muito pra São Paulo, na casa dos meus parentes aqui, a minha tia-avó, a irmã do meu avô materno.
P/1 – Que bairro que era?
R – Jabaquara. E aí, assim, a gente gostava muito daqui, aí chegou um dia, que a minha tia-avó ficava: “Por que você não vem morar aqui e tudo?”, então eu depois mudei pra Guaxupé, quer dizer, eu voltei pra Guaxupé e ficava com aquilo na cabeça, mas sempre vinha pra cá nas férias, passeava, e ela querendo que eu ficasse e tal. Daí chegou, eu tava lá, eu falei pro pessoal: “Gente, eu preciso buscar mais, eu preciso estudar mais técnica de música, eu preciso, de canto e tal, justamente pra banda mesmo, e buscar mais conhecimento, e me desenvolver um pouco mais”. E aí foi onde eu vim pra cá pra São Paulo, pra poder ter essa busca aí, tanto eu queria fazer o teatro e lá já era limitado, os poucos grupos que tinha, já não tinha tanto, né? Hoje já é diferente, totalmente diferente, mas e assim mesmo ainda vê que ainda tem falta, sabe, de muita coisa lá, o pessoal ainda encontra com a gente, ainda pede: “Ô, traz isso pra cá, traz aquela coisa outra”.
P/1 – Quando foi a primeira vez que você veio pra São Paulo, você lembra?
R – A primeira vez? Ah, acho que deveria ter uns seis anos, seis.
P/1 – Qual que é a impressão que você tinha de São Paulo, assim, quando você chegou, como foi?
R – Então, não era menos, acho que uns cinco anos, cinco a seis anos, quando a minha mãe e o meu pai preparavam, tipo, eu, que aí só tinha eu, meu irmão Everton e o Eder, eu lembro que eles, a gente se preparava pra vir pra São Paulo e chegava aqui era São Paulo, terra da garoa. A gente sempre vinha nas férias e era muito frio, então a lembrança que eu tinha de São Paulo. Quando falavam: “A gente vai pra São Paulo”, a gente já pensava naquele frio, tal, então a gente sempre vinha, saía pra comprar agasalho, então a gente gostava, porque a gente ia pra loja pra comprar agasalho, comprar aquela coisa toda e tal, pra vir aqui, chegar aqui, aquele frio e tudo, aquela garoa. E brincava, né, com os meus primos na época, ia jogar futebol na quadra, que tem o Clube do Metrô, que era onde que a minha tia morava próximo, então tinha quadra, society, tal, então a gente ia jogar bola ali, aquela coisa. E depois, quando eu fui ficando mais velho, aí vinha mais porque, tipo, por ser corintiano, aí: “Ah, quero ir”, aí o meu tio, a família inteira é corintiana, a minha tia, a minha tia-avó já ficava: “Vem cá pra você ir assistir o jogo do Corinthians no estádio”, tal, aí os meus primos levavam a gente. Então o que marcava a gente mesmo era isso, sempre por causa, por conta das férias, a gente viajava muito pra BH também, Belo Horizonte, que tem família lá, tinha a irmã da minha mãe, que hoje é falecida, mas tinha os meus parentes lá. Então o meu pai, um período a gente ficou morando um pouco em Belo horizonte, por conta do meu pai ter tido, o me pai tinha miopia e astigmatismo, então ele teve que fazer uma operação, uma cirurgia nos olhos, e ele teve que ficar um tempo morando lá em BH, então eu me acostumei um pouco lá também, né? Embora, por ser Minas, então a gente ficava mais tranquilo até, mas aí quando, eu lembro que a gente pensava em vir em São Paulo, pensava no frio, era o que a gente tinha em mente: “Ah, o frio de São Paulo”. Aí depois não, depois, eu gosto da agitação de São Paulo, então eu sempre falo pro pessoal, a minha esposa, ela gosta muito de Guaxupé, porque ela nasceu aqui em São Paulo. Então a primeira vez que ela, quando eu falei pra ela: “Vamos lá pra conhecer minha família?”, ela: “Vamos”, aí ela, depois que ela veio contar isso pra mim, ela não contou na hora, mas ela falou assim: “Eu fiquei com medo, porque eu achei que a gente ia chegar lá em Minas, é aquele monte de mato, eu tenho medo de mato, tenho medo de bicho, aquelas coisas todas”, eu: “Ah”. Ela falou: “Quando eu cheguei lá, ué”, ela falou: “Eu vi uma cidade, não é uma cidade pacata, mas uma cidade tranquila e tal”, eu falei: “É uma cidade”, ela falou: “É uma cidade como se fosse São Caetano, Diadema, do ABC, assim”, ela falou: “Eu vi uma cidade normal, eu achei que eu ia chegar lá, era mato”. Eu falei: “Não, você está confundindo com a roça” (risos), eu falei: “É diferente” e aí comecei a apresentar pra ela, as coisas assim e tal e ela ama lá, Guaxupé, eu também gosto de lá. Só que, assim, eu saí de lá justamente porque era muito parado, ela fala assim: “Ah, porque você não gosta de lá, eu adoro lá”, eu falei: “Então, mas lá não tem nada, tipo”, ela falou: “Eu gosto da agitação de São Paulo, a cada dia coisa diferente, né”. Então eu falei pra ela: “Olha, aqui em Guaxupé você passa numa rua hoje está a mesma coisa, passa na semana que vem, a mesma coisa, passa daqui a um ano, tá a mesma coisa”, eu falei pra ela: “Em São Paulo, você passa numa rua no período da manhã, ela é uma coisa, à tarde ela já tá totalmente diferente, né”, eu falei: “É muita coisa, o processo aqui em São Paulo é totalmente diferente de uma cidade do interior” e eu gosto dessa agitação, né? Então esse foi um dos motivos também de eu vir pra cá, né, pra buscar um pouco mais, eu falei: “Nossa, aqui está muito parado, monotonia”, eu falei: “Eu não sou assim, eu preciso tá fazendo coisas”, tanto que aqui eu me divido fazendo várias coisas, assim, ao mesmo tempo, mas eu gosto.
P/1 – Mas vamos voltar lá um pouquinho. Aí você decidiu vir pra São Paulo.
R – Sim, aí eu decidi vir pra São Paulo pra poder estudar e tal, aí fui morar no Jabaquara com a minha tia, na casa dos meus parentes.
P/1 – E você trabalhava aqui, como é que foi?
R – Isso, aí no começo, que eu vim pra cá, eu não trabalhava, eu comecei a estudar, a fazer teatro aqui, e aí eu queria começar a trabalhar e a minha tia, ela tinha um restaurante, então eu comecei a trabalhar no restaurante dela, a gente entregava marmitex, eu e o meu primo, a gente saía pra entregar marmitex. Então eu fiquei durante o tempo que ela tinha esse restaurante, fazia entrega de marmitex, então eu trabalhava lá com ela. Aí eu só fui parar de trabalhar com ela depois que eu saí, né, eu saí da casa dela e fui morar com uns amigos de Minas, justamente da minha banda, que veio pra cá alguns amigos e a gente foi morar na Saúde, no bairro da Saúde, juntos ali. E ficamos por um ano morando juntos ali e aí os outros dois não: “Ah, eu não vou conseguir ficar, eu não vou conseguir ficar”, voltaram pra Guaxupé, daí eu fiquei sozinho aqui, depois veio um outro amigo de lá, a gente começou a morar junto. Aí, a partir daí que eu comecei a trilhar a minha vida aqui em São Paulo, tirando a dependência da minha tia, de estar morando com ela e tal.
P/1 – E aí como é que você se virava pra sobreviver depois que você parou com o marmitex?
R – Então, depois eu comecei a trabalhar com, eu fiquei trabalhando com teatro mesmo, então, exemplo, tinha as peças que estavam, eu entrei num grupo na época, da companhia chamada Afrogueto na época, depois que virou, se transformou em Omoaiê, que é aonde que eu comecei a fazer parte de uma peça que chamava Odara na época, que era um espetáculo afro e eu me interessava. O meu pai era muito militante, assim, da questão racial, então ele participava daquele movimento MMU e, assim, a militância dele a vida toda, trabalhando nessa questão e assim foi acabando que nós lá de casa começamos a trabalhar muito com a cultura afro-brasileira, né? E aí chegou aqui, que eu fui começar a procurar, pesquisar um pouco mais a fundo desse teatro, ou seja, o teatro negro, que a gente fala, e comecei a gostar e me especializar na dança afro, né? E, assim, e a partir daí, foi até a partir daí que eu comecei a trabalhar em outros projetos, assim, em São Bernardo e tal, dando aula de dança afro, dando aula de teatro, tudo, depois até que fui me especializar pra tirar o DRT e tal. E comecei a trabalhar no, fazia paralelo, nas Noites do Terror do Playcenter, que tinha, né? Então eu trabalhei três anos seguidos no Playcenter fazendo as noites do terror, porque eu conheci uma produtora, que a produtora me ofereceu esse trabalho lá, eu falei: “Ah, eu vou, um teatro a céu aberto”, eu falei: “Eu vou fazer, é uma experiência, diferente, eu quero fazer”. E depois fui passando pelos processos do teatro, do teatro tradicional, o teatro de rua, o teatro a céu aberto, então foi legal essa experiência pra que eu pudesse ter bagagem, e tanto que hoje, como eu estou fazendo um curso de Artes Dramáticas até, e, assim, pelo, esse processo que eu passei pra mim foi muito rico agora, né, porque a gente está especializando muito da dramaturgia, na história mesmo do teatro e tem muita coisa que na prática eu já vivi e que hoje se fundem, né? Então foi uma, assim, foi uma busca que eu fiz, foi um processo muito legal, que foi aonde até que me ajudou na minha inserção do Criança Esperança, no Projeto Criança Esperança, quando eu comecei a trabalhar lá.
P/1 – Como que você começou a trabalhar no Projeto Criança Esperança? Como você soube?
R – Então, o Criança Esperança, ele tava precisando, tinha uma professora que dava aula de dança afro lá e eu dava aula de dança afro, e essa professora tava de saída, que era a Soraia, e ela fazia parte de um grupo chamado Afro Dois, que tem até, eu acho que tem até hoje, um grupo de dança afro, teatro, ballet, e eu fazia parte do Omoaiê. Então eram dois grupos diferentes, mas que a gente se conhecia, as pessoas, só que eu não conhecia ela, e daí tinha, como eu morava, eu moro na Brasilândia até hoje, e o Espaço Criança Esperança é na Brasilândia. Tinha o Jairo, que ele prestava serviço, era um terceirizado, ele prestava serviço ali pro Criança Esperança, o Instituto Sou da Paz, e ele comentando um dia comigo, ele falou: “Olha, eu fiquei sabendo que você dá aula de dança afro, eu fui assistir um espetáculo, você estava, você, né?” e na época não era a minha esposa, era a minha namorada, ele falou: “Você e a sua namorada, tal, tal”, que eu conheci ela lá. E daí ele falou: “Nossa, por que eu você não vai lá no Criança Esperança pra dar aula lá?”, eu falei: “Não, mas já tem gente dando aula”, ele falou: “Não, mas ela está de saída, está procurando alguém que possa entrar no lugar dela, né”. Aí eu falei: “Ah, tudo bem”, ele falou: “Eu vou ver com ela, depois eu te falo” e daí ele falou com a, na época a coordenadora pedagógica, que era a Joana, aí ele falou com a Joana, que aí ela falou: “Ah, legal, vai ter um processo do Instituto Sou da Paz, então pede pra ele ir lá e levar o currículo, tal, mandar o currículo pra gente”, tanto que mandou currículo até, na época, eu e a minha esposa, porque ela também dava aula. E daí ele falou assim: “Ó, se não for, de repente eles não queiram ficar com um homem e queiram ficar com uma professora, não querer um professor, fica com uma professora”. E aí chegamos lá nesse processo, nessa seleção lá no Instituto Sou da Paz, tinha, era, tinha eu, ela e mais duas pessoas pra fazer essa entrevista e a gente fez a entrevista e aí fizemos a entrevista com a Beatriz Miranda, e com a Joana, e elas disseram: “Ó, na próxima semana a gente vai ligar pra vocês, entrar em contato pra ver quem foi aprovado e tal”. E aí eu aguardei na semana da frente, eu tava me desligando lá de São Bernardo, que eu estava dando aula lá num projeto chamado PET, que era da prefeitura lá, a gente trabalhava com, tirando menores da rua, e tal, e aí eu já tinha, tava me desvinculando do projeto lá e recebi a ligação da Bia. E aí fui lá pra fazer a entrevista com ela no Espaço Criança Esperança e elas falaram pra mim: “Olha, a vaga, pela a sua grade, tal, pelo seu currículo que a gente viu, é o que a gente tava pensando pra cá, pra como educador”, ela falou: “Então a vaga só não é sua se você não quiser, né”, eu falei: “Ah, legal”, eu falei: “Eu quero a vaga”, então foi onde eu entrei.
P/1 – Que ano que foi?
R – Foi em 2009, 2009, eu fiz a entrevista, assim, foi um processo.
P/1 – O Sou da Paz, Criança Esperança, o que é que é o quê?
R – O Sou da Paz é uma instituição, que ela, é assim, ela administra o Projeto Criança Esperança aqui em São Paulo, ela é responsável pelo projeto.
P/1 – O que você já sabia desse projeto?
R – Então, na verdade o que eu sabia do Projeto Criança Esperança era só o que eu via na TV e tal, eu, na verdade eu não conhecia o Sou da Paz, eu passei a conhecer o Sou da Paz a partir desse momento que eu fui fazer essa entrevista, que aí eu vi que era o Sou da Paz que gestava ali o Criança Esperança em São Paulo. E o Projeto Criança Esperança eu só conhecia pelo fato de assistir na TV, né, vi alguns projetos que desenvolvia, mas eu não conhecia.
P/1 – Mas que imagem que você tinha?
R – A imagem que eu tinha, na verdade, era assim, de um projeto na qual ajudava, trabalhava com as crianças e adolescentes, e que era, assim, e que na verdade as pessoas no meio do ano, assim, sempre nessa época do meio do ano até setembro, tal, tinha a campanha que arrecadava o dinheiro, as pessoas, ajudavam, depositavam na conta na Unesco e esse dinheiro era revertido pra que ajudasse na vida dessas crianças de alguma forma, mas também não sabia de que forma, né? E aí, a partir do momento que eu entrei no Criança Esperança que eu fui ver a amplitude que é o negócio, e o tamanho da grandeza que é um projeto e da importância que tem isso na vida, ou seja, por ser o terceiro setor, que a gente fala, mas a importância que tem isso pra muitas famílias, não só agindo na vida daquele que é o educando, que é atendido pelo projeto, mas no entorno dele, que chega a mudar a vida daquelas crianças, daqueles adolescentes.
P/1 – Aí você foi selecionado.
R – Fui selecionado, aí comecei a dar aula lá de dança afro.
P/1 – Quem que era o público, qual que era o público assistido?
R – Então, na minha linguagem, que era dança afro, tinha as crianças, como eu trabalhava com, eu vim com a dança um pouco diferente, que ela trabalhava dança afro específico, e eu trabalhava a cultura popular brasileira, então eu queria apresentar não só a dança afro pra eles, mas eu queria apresentar também um pouco de todo Brasil pras crianças pra ele terem essa oportunidade, né? Porque muitas crianças não tinha oportunidade a partir do Criança Esperança de sair do bairro pra ir pra um museu, pra ir pra uma exposição, pra ir assistir um espetáculo, então eu falei, já que o Criança Esperança tinha essa, como fala? Tinha essa condição de dar isso pra esses assistidos, eu falei, então o meu papel ali era, com o meu conhecimento, fazer de ferramenta pra que se chegasse esse conhecimento até essas crianças, pra eles terem esse desenvolvimento. Então o público ali que eu atendia era crianças de todas as faixas etárias, que era acima de sete anos, então eu tinha educando ali de sete anos até 25 anos, divididos.
P/1 – Quantas crianças, quantos educando você atendia?
R – Olha, chegou ter, eu cheguei ter turmas, assim, uma turma no período da manhã com 20 e outra turma no período da tarde com 25, aí e assim, faixas etárias diferentes e depois uma outra turma com 30, outra turma com 18, assim, mas vamos lá, eu acho que umas 70. É porque depois eu comecei a, assim, eu comecei a dividir as linguagens, por ter outras habilidades, aí eu comecei a dar aula de teatro, dar aula de dança afro, que eu já fazia, cultura popular brasileira, dar aula de música, ou seja, de percussão e aula de canto. Então se dividia, eu comecei a dividir em várias linguagens, aonde começou a abrir bastante o leque, que depois eu passei até a dar aula pra algum, assim, acima de 22, 23 anos, que pra Unesco, que até os 25 anos eram os jovens, então tinha essa faixa etária na minha turma, que se expandia até à noite, nas turmas à noite, mas era muito legal.
P/1 – Qual que era o perfil das crianças e dos jovens que frequentavam o espaço?
R – Olha, assim, são crianças comuns, como toda parte do Brasil e tal, que a única coisa que elas não tinha era a oportunidade, a mesma oportunidade que outras pessoas tinham, de às vezes quem está estudando em colégio particular e tal. Mas são crianças que também brincavam, tinham aquela vontade de brincar, aquela vontade de crescer, vontade de estudar e de alguém na vida, só que precisava de alguém pra dar essa oportunidade pra elas, né? Então, assim, crianças muito amorosas com a gente, não só por conta de eu fazer parte lá da comunidade, que aí, depois desse período, dois antes de eu entrar no Criança Esperança eu mudei pra Brasilândia, eu não era, assim, o Criança Esperança me ajudou até eu conhecer mais o bairro, que eu não conhecia, né?
P/1 – Como que era o bairro nessa época que você foi morar lá?
R – É assim, o bairro era, em vista, quando o pessoal falava: “Nossa, Brasilândia, meu Deus, a Brasilândia é muito violenta e tal” e eu fui morar lá, não vi nada disso. Eu falei: “Mas será que eu estou no mesmo bairro que o pessoal falava”, “Não, porque o bairro aqui é”, contam as histórias que o bairro foi muito violento, aquela coisa toda. Por conta disso o Criança Esperança tava lá, se instalou lá pra dar essa ajuda, esse desenvolvimento ali, só que, assim, era um bairro, é um bairro normal, tranquilo. Tem as ocorrências que acontecem, como todos os outros bairros, tudo, mas eu não via esse, o que pintavam daquele bairro, de ser perigoso, aquela coisa toda. E eu comecei a fazer amizades no bairro antes de entrar no Criança Esperança, mas eu não ficava muito lá no bairro por, minhas atividades eu fazia todas fora de lá. Aí foi onde que eu comecei a conhecer um pouco mais o bairro, a partir do momento que eu comecei a trabalhar no Criança Esperança, porque, exemplo, eu morava na Brasilândia, mas trabalhava em São Caetano, trabalhava em São Bernardo, trabalhava no centro da cidade, né? E a partir do momento que eu comecei a trabalhar ali, eu comecei a olhar um pouco mais pra dentro, e comecei a ver que tinha muitos valores ali que estavam se perdendo, valores assim, da história mesmo do bairro, de pessoas ali que ajudaram a fundar o bairro, pessoas que ajudaram. Exemplo, eu tenho um exemplo da Escola Rosas de Ouro, que nasceu ali na Brasilândia, e, assim, tem parentes da minha esposa que ajudaram na fundação da escola e têm toda uma história, isso acabou se perdendo com o tempo, né? Então muita coisa a gente trabalhava pra fazer o resgate dessas coisas assim, pra que as próprias crianças pudessem, as próprias crianças que estavam crescendo no bairro pudessem começar a ver que: “Opa, pera aí, meu, tem uma história aqui no meu bairro, assim, tem uma história que a minha família começou a construir esse bairro” e tomar pertencimento do bairro, né? Mas é assim, é um bairro que eu aprendi, eu falava que em São Paulo eu gostava, sempre gostei do Jabaquara, eu vim, o primeiro bairro que eu morei em São Paulo foi no Jabaquara, amo até hoje o Jabaquara, eu gosto muito do Jabaquara, mas, a partir do momento que eu conheci a Brasilândia, eu falei: “Eu não consigo sair da Brasilândia”. Eu me enraizei ali na Brasilândia, assim, com muita coisa, assim como tem o Jabaquara, mas antes eu não conseguia ficar sem ir pro Jabaquara, eu hoje eu fico um bom tempo sem ir no Jabaquara. O pessoal fala: “Nossa, você não vem mais no Jabaquara, a Brasilândia entrou no seu coração de vez”, eu falo: “Não, ainda tenho um pedacinho do coração pro Jabaquara”. Mas é que, a partir do momento que você vai começando a conhecer, conviver com as pessoas na comunidade e tal, então você vai pegando amor pelas pessoas, por aquilo que você faz, as coisas que a gente começa a desenvolver no bairro e você vê que tá surtindo efeito, então isso ajuda a você ficar cada vez mais próximo do bairro, e se enraizar mesmo ali.
P/1 – Você sabe por que o Criança Esperança escolheu a ONG Sou da Paz pra trabalhar com as crianças, pra investir?
R – Eu não sei, isso eu não sei, mas eu creio que, depois eu estando dentro lá do Sou da Paz, eu creio que é pela forma do trabalho do Sou da Paz, de trabalho de pesquisa, é um trabalho junto à Secretaria de Segurança Pública, sempre a estar, só pelo nome, Sou da Paz, pela questão da questão de trabalhar sempre pra manter a ordem, manter a paz e a organização mesmo nos bairros, e nos projetos do Sou da Paz, que sempre eles vão desenvolvendo em vários outros lugares. Eu lembro que a gente tinha, por exemplo, ao mesmo tempo o Criança Esperança ali na Brasilândia, mas no Morro Grande, que é um bairro próximo, tinha o Projeto Praças e que funcionava muito, aonde que eles revitalizavam as praças, e traziam a comunidade de volta, pra tomar pertencimento daquele espaço. Justamente foi aonde, esse Projeto Praças aconteceu onde até aconteceu uma chacina ali naquele local, e onde os moradores estavam assim, então o Sou da Paz entrou ali pra o quê? Recuperar ali, o pertencimento daquela comunidade naquele lugar. Então eu creio que a escolha foi por conta disso, por conta desse compromisso do Sou da Paz com a comunidade, com a comunidade em si, na verdade com o ser humano, né?
P/1 – Você tem um episódio, um fato marcante desse período que você trabalhou com as crianças e adolescentes do Projeto Criança Esperança?
R – Nossa, tem muitos.
P/1 – Conta alguns.
R – Assim, eu tenho, quando eu entrei teve uma, eu não digo uma rejeição, mas teve uma diferença muito, assim, uma indiferença entre tanto as mães, e alguns educandos, porque a Soraia já tava lá há muitos anos, é uma professora muito querida, é uma pessoa muito querida, muito legal ela, mora lá na Brasilândia também, e ela já tava, tipo, o pessoal gostava muito dela já. E aí ela, quando eu cheguei ela já tinha avisado os alunos, os educandos, que ela ia sair, então todo mundo já ficou com o pé atrás: “Vai chegar um outro professor” e homem ainda, no lugar de uma professora. E eu lembro que muitos educandos na época falavam pras mães que ia parar, que não ia continuar mais por conta dela e tudo, e aí até a Joana na época conversou comigo, falou: “Olha, Elson, eu não sei, não, mas eu acho que você vai ter um trabalhinho aí, porque tem algumas crianças que estão falando que não querem vir mais, tal e tudo, a gente está falando pra pelo menos conhecer o professor novo, aquela coisa toda, que nem conhece você ainda, você nem chegou a dar aula, nem chegou a mostrar a cara aí, tal”. Eu falei: “Ah, tudo bem, vamos pra esse desafio” e eu lembro que uma, a Amanda, na época, hoje ela não mora mais aqui, ela foi embora, que a família dela é toda, acho que é Paraíba e elas foram embora agora, mas ela foi uma aluna que, assim, eu acho, na época quando eu comecei ela tinha oito, acho que ela tinha oito anos, e ela tava, assim, era uma das que estavam falando pra mãe dela: “Não, não vou ficar, não vou ficar”. Aí quando teve, a Soraia foi apresentar eu pra turma, tal, ela foi uma que já no outro dia já falou pra mãe dela: “Não, não vou mais, não vou mais”, a mãe dela: “Não, mas vem conhecer o professor”, não sei o que, aquela coisa. E aí, com o passar do tempo, com o trabalho, a maneira que foi fazendo, ela foi uma das educandas que mais se apegou comigo, ela falou que não ia e a partir daí, depois, tipo, assim, a gente até brincava: “Essa menina não me dá sossego, meu Deus do céu”, mas ela chegou ao ponto de ficar com ciúmes da minha esposa, né? Se ela via eu com a minha esposa, se a minha esposa às vezes chegava em algum evento lá no Criança Esperança, ela ficava com ciúmes, porque ela se apegou de uma tal forma comigo que eu falei: “Nossa”. E aí a mãe dela vinha sempre conversar comigo, falava pra mim: “Olha, você não tem noção a forma que, a transformação que foi você ter entrado na vida da Amanda como professor, como educador”, eu falei: “Nossa, muito obrigado”. Ela falou: “O desenvolvimento dela, a questão dela na escola e tal melhorou muito”, ela falou: “Mas ela teve uma rejeição muito grande quando você começou a dar aula, foi difícil”. E aí, a partir daí, os irmãos dela e tal, todos, e aí quando ela descobriu até que, ela falou assim: “Aí, professor, eu fiquei sabendo que você é evangélico”, eu falei: “Sou”, “Eu queria ir na sua igreja, visitar a sua igreja”, eu falei: “Tá bom, vamos”. E a mãe dela quis levar ela lá na igreja, tudo, aí ela e os dois irmãos depois, que nem faziam aula comigo, passou a, porque, assim, a gente tem um trabalho com as crianças na igreja, então passou a querer frequentar a igreja também, porque ela falou assim: “Não, quero ficar o mais tempo possível junto com você”. E aí hoje, depois que ela foi embora, ela chorou muito, tadinha, ela sofreu demais, assim, e aí hoje a gente tem contato por rede social, mas todo dia, todo dia ela fala comigo, todo dia ela entra, manda foto e: “Professor, vem aqui pra casa, vem passar as férias aqui, que eu ainda vou pra São Paulo pra ir aí pra te ver”. E depois até que ela viu umas fotos que a gente postou do meu filho, ela: “Ah, eu perdi o trono”, agora está maiorzinha: “Eu perdi o trono agora, porque agora tem um bebê e tudo, mas eu quero conhecer o bebê”. Então, assim, foi o que me marcou muito porque, assim, a gente vê como o trabalho começou, não só ela, isso foi ela na turma dos pequenos, mas com os adolescentes eu passei um período também muito difícil, porque eles batiam de frente comigo, já eram maiores e às vezes não respeitavam, assim, no começo e tudo. Eu entendia isso porque era a questão da troca dos professores, tal, eu falando: “Gente, eu não sou o culpado, a professora resolveu sair e eu vim pro lugar dela” e hoje são, assim, os melhores amigos que eu tenho, que se tornamos amigos.
P/1 – Quais são as principais transformações que você percebe nas crianças e adolescentes com esse trabalho desenvolvido?
R – Olha, na verdade eu nem falo assim.
P/1 – Na vida dessas crianças, o impacto.
R – O impacto, eu falo que na verdade a gente simplesmente, é o que eles já têm, que a gente simplesmente ajuda a eles trazer o potencial, mostrar o potencial que eles têm, que às vezes está ali parado, escondido, né? Eu sempre costumava falar: “Gente, o talento de vocês, o conhecimento de vocês”, eu falei: “O caráter de vocês, vocês já têm aí”, eu falei: “Eu sou apenas uma pessoa que vai lá e aperta a tecla SAP”, eu falei: “Algumas pessoas de alguém apertar a teclinha SAP, alguns já saem com a tecla SAP acionada, vocês, algumas pessoas precisam”. E o que eu queria dizer com isso? É porque às vezes a gente falava assim: “Não, mas eu fui lá, a gente transformou”, não, a gente não transformou, a gente simplesmente ajudou a eles desenvolver uma coisa que eles já tinham dentro deles, a pessoa, os valores que eles já tinham, a gente simplesmente só fizemos isso, ajudar, foi uma ajuda de chegar e falar: “Olha, é por aqui, o caminho é esse”. Porque às vezes as pessoas, eu não digo desprezadas, mas esquecidas, as pessoas às vezes tão esquecidas, fica meio naquele pouco caso, aquela coisa assim, então o nosso papel simplesmente é fazer com que aquelas pessoas se sintam amadas e falar: “Ó, você tem o seu valor, você tem que mostrar o seu valor”. Eu tenho um exemplo, que é o Rubens, que era um jovem quando eu comecei a dar aula pra ele, um menino que não queria saber de ter aula comigo de jeito nenhum: “Porque eu quero a professora”. Qualquer coisinha, todo evento que fazia, ele era o primeiro a começar a gritar depois o nome da professora, o evento dava certo, , que a gente apresentava, montava a peça, tudo, a encenação, chegava no final, ele começava a gritar o nome da outra professora, tudo. E, com o passar do tempo, a gente começou a ter uma afinidade e, a partir daí, como os parceiros que o Sou da Paz tem, e o Criança Esperança, ele começou a participar do Projeto Criar e a partir do Projeto Criar, e aí a gente já tava num ótimo relacionamento, eu com ele, e eu convenci numa conversa, a ele participar desse Projeto Criar, que é um curso técnico que ele ia fazer. Ele se formou na área de produção e hoje está aí, se formou, está trabalhando, está bem, a gente conversa muito e: “Professor, a gente precisa trabalhar junto e tal, alguma peça que você for dirigir, eu quero tá na produção” e aquela coisa. E, assim, eu vi, a gente vê o crescimento, o desenvolvimento, da onde ele saiu, da maneira como foi, que às vezes é aquilo, a pessoa, eu falo que a pessoa está ali, um pouco pelo fato, da vida: “Ai, eu nasci pobre, o que que eu vou fazer?” e assim, tal, e não, a pessoa que foi, correu atrás. Eu falei: “Não, mas é assim, ó, a gente nasceu assim, nasceu nessas condições assim e tal, mas a gente pode ser alguém na vida estudando fazendo isso, fazendo aquilo” e aí começar a abrir os olhos deles, né, e de umas coisas que eles já sabem, simplesmente dar um caminho: “Olha, você pode seguir por esse caminho, esse caminho”, a gente poder ser exemplo, tentar ser um exemplo de alguma forma pra eles. Então são pessoas que hoje, quando eu saio pra fazer apresentações, eu montei, a gente mesmo não estando lá mais, e eles não estando mais no projeto, mas a gente faz, desenvolve trabalhos fora, porque muitos deles quiseram seguir na dança, quiseram seguir no teatro, então algumas peças que eu vou fazer, algumas montagens, sempre eles estão comigo, trabalhando comigo. Sempre a gente está, eu estou indicando e eles sempre, às vezes me indicam: “Ó, professor, tem um trabalho em tal lugar, vamos fazer” e não sei o que, a gente sai pra viajar junto, pra apresentar espetáculos e tudo. Então teve uma afinidade muito grande e eu vi esse crescimento deles, esse desenvolvimento deles e simplesmente um potencial que eles já tinham, só precisava ter um apoio, né?
P/1 – Deixa eu fazer uma pergunta, voltando lá atrás, por que você decidiu trabalhar com arte e educação pra crianças e adolescentes? Como foi essa escolha?
R – Então, é que na verdade eu queria, aqui, na minha vida, como eu comecei criança trabalhando, por meu pai trabalhar com carnaval, e minha mãe com reisado, ou seja, a cultura popular brasileira ser muito viva lá em casa e a gente trabalhava muito com isso, a questão do artista, por meu pai ser músico, essas coisas e vir da família de músicos. Na minha família ninguém era ator, então a gente falava, o único ator era eu, depois, mas eu comecei a ver, eu falei assim: “Eu acho que se surtiu efeito na minha vida a questão de eu trabalhar com a música, trabalhar com a arte, e me levou em lugares que eu nunca imaginava que eu poderia chegar, eu acho que com essas crianças pode fazer o mesmo efeito que fez na minha vida ou até maior”. Então eu queria passar um pouco do que eu vivi, das oportunidades que eu tive, pra essas pessoas, que às vezes não conhecia, às vezes não tinha de uma forma como chegar, eu falei: “Então eu vou querer passar”, tanto que eu falava, a gente brincava muito, eu e os meus irmãos: “Ah, a gente já viajou”. Eu lembro que na aula de Geografia, o professor estudando, a gente falando sobre o Rio São Francisco e seus afluentes e tal e o professor falando, eu: “Ah, não, tem isso, tem aquilo, tem aquilo outro”, eu conhecia até das lendas do rio. Aí o meu professor parou, falou: “Meu Deus do céu, como é que eu vou elaborar uma prova pra você diferente”, ele falou pra mim: “Vou ter que elaborar uma prova pra você diferente, porque você está muito na frente, da matéria que a gente está falando, você está muito na frente do que os outros alunos aqui na escola”. E aquilo, eu fui crescendo com isso e eu falando: “Nossa, que bom que o meu pai pôde proporcionar isso pra mim”, e eu queria de alguma forma dividir isso com alguém. Então de que forma que eu posso passar? Então com o pouco conhecimento que eu tinha e da forma que eu tinha, ou seja, na cultura popular brasileira, eu queria fazer com que chegasse essas crianças até lá, os jovens e tal. E, assim, eu fico muito feliz por eu ter conseguido de alguma forma ter levado a esse conhecimento, a essas oportunidades, a dar essas ferramentas pra que eles consigam chegar. Eu falei, não é que eu queria formar atores e formar músicos, não, mas é que com essa ferramenta da arte eles pudessem se tornar um administrador melhor, pudesse se tornar um advogado melhor, que pudesse encontrar nesse caminho aí, que essa ferramenta simplesmente servisse pra que fosse um cidadão melhor, de alguma forma, pudesse acrescentar algo na vida de alguém, como sempre o meu pai falava: “Procura acrescentar algo na vida de alguém”. Então eu falei: “Eu quero acrescentar isso na vida dessas crianças, na vida da família deles, que às vezes não tem oportunidade de sair pra ir ver um espetáculo de teatro, às vezes não tem noção do que é um espetáculo de teatro”, eu falei: “Então eu quero acrescentar isso na vida dessa família, na vida dessas crianças. Então, assim, o me compromisso, eu não digo, posso dizer que seja meu compromisso maior, mas que era tentar passar de alguma forma a minha linguagem como ferramenta pra que fosse um cidadão melhor, não que eu quisesse falar: “Não, você vai ter que ser um músico, você vai ter que ser”. Alguns escolheram ser atores e bailarinos, tal, por conta ali da atividade, por conta que também já vinham com um histórico de querer dançar, de querer fazer alguma coisa, mas outros, eu tenho, tinham educandas lá que queria ser enfermeira, e ela falou assim: “Ah, mas eu, olha, eu aprendi a ser mais próxima das pessoas, ter mais proximidade das pessoas, fazendo aula de teatro, fazendo aula de dança, isso tá me ajudando muito agora no curso de Enfermagem e tal”. Então eu falei: “Nossa, que legal”, que não era pra que dar um seguimento pra você, não, é que pra você possa somar como cidadão na vida das pessoas.
P/1 – De que maneira você acha que isso chega, esse dinheiro, essa quantia destinada pro Criança Esperança pros projetos sociais ajudam a construir um mundo melhor?
R – De que forma?
P/1 – É.
R – Pera aí, de que forma como?
P/1 – Esse recurso do Criança Esperança, você acha que ele contribui pra construir um mundo melhor?
R – Contribui, sabe por quê? É assim, como a gente, eu lembro, pelas atividades que eu fazia, eu tinha a oportunidade de poder levar essas crianças, de montar espetáculos com essas crianças, de levar essas crianças em um museu, levar essas crianças em uma exposição. Exemplo, eu lembro que eu muito levava as crianças nessas feiras que tinham dos imigrantes e tal, então eles passaram a conhecer um pouco mais da história de bairros aqui de São Paulo, coisas que até eu mesmo não conhecia da Cidade de São Paulo, que eu não sou daqui, então eu aprendia junto com eles. Então visitamos museu, olha, o Museu do Ipiranga, quando às vezes a pessoa poderia entrar no Museu do Ipiranga pra chegar lá e ver a história do Brasil, o descobrimento do Brasil, aquela coisa toda, ouvia falar em livros, gravuras de livros e tal, e aí chega lá e olhar, entrar no museu, ver a história, ver parte da história, né, daquilo. Então sem esse recurso não seria possível levar essas crianças, não seria possível de alguma forma chegar essas crianças até lá, então eu acho que abre, esse recurso que o Criança Esperança, proporciona que as pessoas doam. Então já ouvi muitas vezes as pessoas: “Ah, mas a gente vai doar esse dinheiro, eu não sei pra onde vai, que não sei o que” e aí eu tenho uma coisa minha que é assim, independente, eu sou assim, se eu tiver que doar, seja dinheiro ou me doar de alguma forma, eu não quero saber: “Ah, mas o que que vai fazer?”, não, não é assim. Lógico que a gente quer saber pra onde vai, onde vai ser empregado, tudo, mas desde o momento que no meu coração eu estou sentindo que eu estou doando pra fazer uma boa ação, aquilo vai ser destinado pra uma boa ação. A partir do momento que eu fico: “Ai, eu vou doar isso”, eu vou doar o meu tempo, mas eu estou doando o meu tempo com o meu coração amargurado, não vai ser, aquele tempo que eu doei não vai surtir efeito de alguma forma, não vai surtir efeito nenhum, porque não vai ser aproveitado. Eu acho que tudo na vida a gente faz com amor, então todas as pessoas que se proporcionam a doar essa quantia, tal, que seja, eles, a primeira coisa que toca no coração deles é amor acima de tudo pelas vidas, né, independente de quem vai ser atendido, se é criança, se é jovem ou se é adulto. A pessoa doa porque ela está vendo que estão sendo desenvolvidos projetos em tal lugar, ou seja usando a arte, seja usando a educação de alguma forma, mas que esse recurso eles sabem que vai chegar e vai ser desenvolvido com alguma coisa. Então eu, a partir do momento que eu tive lá dentro, eu falei: “Meu Deus, olha o que”, às vezes eu vou num, independente da quantia, às vezes é irrisória pra gente, mas aquela quantia somada com outra pessoa, com uma outra pessoa, com outra pessoa proporciona eu pegar uma criança aqui e levar ela no Museu do Ipiranga pra conhecer a história do país, que ela pode chegar um dia lá na frente e falar: “Olha, eu conheço tal, assim, o país, porque assim, aconteceu isso, a história do meu país”, aquela coisa toda. Então na escola pras crianças, o que a gente sempre pensa lá no projeto, a gente falava assim: “Olha, a gente tem que ser um complemento da escola, um complemento da família, então a gente não tem que tomar o lugar da escola e não tem que tomar o lugar da família, a gente simplesmente tem que ser um complemento”. Então o que a gente pode ajudar na família? O que a gente pode ajudar na escola, no desenvolvimento da escola dessa criança? Então todas as nossas atividades é sempre bem pensadas, sempre bem estudadas no contexto, simplesmente nas análises que a gente fazia, nos diagnósticos que a gente fazia da região, do bairro: “Opa, então o que a gente precisa fazer? Precisa desenvolver mais aqui, ó, tal escola tá, o índice das notas na escola tal está fraco, não sei o que”, “Então pera aí, tem educandos nosso que estudam lá?”, “Tem”, “Então o que a gente pode desenvolver neles aqui pra fortalecer lá?”. Então é assim, sempre trabalhando em parceria com a comunidade, trabalhando em parceria com a família, porque não adianta a gente tentar acrescentar alguma coisa só na vida do educando, mas a gente tem que trabalhar no meio onde ele vive, né? Porque o educando, ele está sendo atendido por nós, mas aí chega na casa dele, se ele não tem a continuidade, tudo o que a gente construiu vai ser descontruído, tudo o que a gente construiu junto com o educando vai ser desconstruído. A partir do momento que a gente começa a trabalhar com o educando e com a família, que é o entorno onde ele vive, a escola onde ele vive, o bairro, a padaria onde ele frequenta, a rua onde ele anda, a partir desse momento a gente começa a ajudar ele num todo ali, né, e esse todo aonde vai surtir o efeito na vida dele lá na frente.
P/1 – Pra você, na sua vida pessoal, quais foram as principais transformações que você teve desenvolvendo esse trabalho na Brasilândia?
R – Olha, desenvolvendo esse trabalho na Brasilândia, pra mim foi muito bom a princípio, eu comecei a conhecer o bairro onde eu estava morando, diferente da cidade onde eu nasci, onde eu conheço tudo, todas as ruas, quem foi, a história da cidade, tal, e aqui em São Paulo eu conhecia muito pouco. Então ali na Brasilândia, eu passei a conhecer a Brasilândia, a história da Brasilândia, o histórico da Brasilândia, os personagens que a gente fala, da Brasilândia, as pessoas mesmo, as famílias, comecei a olhar mais, assim, pra dentro do bairro, ver o bairro aonde eu estou morando, a rua onde eu estou passando, a história foi isso, o bairro aqui, aquela coisa. As formações que a gente, que o Sou da Paz nos proporcionava, através, é onde eu chego a falar, através dessa, desse recurso que é passado pro Sou da Paz administrar com o Criança Esperança, as oportunidades que eles nos dão de preparo, pra que a gente possa desenvolver um bom trabalho lá na frente, também maravilhosos, que as formações que a gente sempre teve, que na nossa grade curricular acrescentou muito, né? A gente, assim, eu digo, pelo menos eu tive um ótimo crescimento, como educador, como pessoa, porque a gente passou a ver coisa mais de perto, coisas mais a fundo, né? Ter, exemplo, ter uma proximidade maior principalmente com a Secretaria de Segurança Pública, então de está ali dentro, de levar questões ali pra Secretaria de Segurança Pública, ou seja, de como chegar num bairro mais precário, ou seja, assim, essa parceria. Então questão de trabalho em parceria, isso me acrescentou muito, e na vida, só da questão de você ter um sentimento de querer acrescentar na vida das pessoas, mas você não tem condições, mas você ter um veículo que você consiga ter a oportunidade de levar as pessoas e levar o seu exemplo. O projeto que a gente montava, desenvolvia: “Pera aí, eu tenho que montar um planejamento de aula, um planejamento de atividades pros meus educandos” e você ter o respaldo de poder montar um planejamento e ter recurso pra aplicar aquele planejamento e ver aquele planejamento dar um resultado final é, assim, é sem palavras, né, que você fala: “Poxa, realmente valeu a pena ter feito parte, valeu a pena ter acrescentado na vida”. A gente não consegue pegar todo mundo e falar: “Vamos todo mundo, vamos junto”, mas pelo menos ali, a boa parte que você consegue transformar, ajudar a ter esse crescimento na história da vida deles e na vida da gente pra contribuir com a vida da gente. Porque, assim, eu não estou trabalhando ali em prol dele, mas em prol da sociedade, eu quero ter uma sociedade melhor, então eu tenho que ajudar o meu próximo, eu tenho que ajudar quem está vindo. Qual que é a geração que tá vindo aí? São os educandos meus agora, de oito anos, de 12, de 16, então é esses aí que eu tenho que ajudar, que eles vão ser o futuro o Brasil, vão ser o futuro do nosso país, vai ser um próximo educador quem sabe, vai ser um próximo advogado, vai ser um próximo policial, né? Então, ou seja, vai ser um cidadão que vai saber, os valores da vida, e lá na frente ele vai poder falar assim: “Não, valeu a pena aquele professor, aquele educador que esteve comigo, pra hoje eu poder semear na vida de alguém”. E, assim, tem um grupo de umas amigas minhas, que a gente se formou junto no teatro, elas formaram um grupo chamado Capulanas, elas trabalham com teatro negro também, eu fui assistir um vídeo delas, um depoimento, que elas deram num documentário. E eu lembro que a Priscila deu um depoimento nesse documentário que foi muito interessante, que ela disse assim: “A árvore a gente tem que construir, pensar na árvore, ela vai criar raiz, depois ela vai crescer, então da mesma forma que ela cresce, ela está crescendo fora da terra, mas está crescendo embaixo, em base, ela está criando base também pra poder se manter de pé. E quando ela começa a dar as folhagens, começa a dar as flores, começa a dar os frutos, ela tem que ser uma árvore bonita, tem que ser uma árvore linda, por quê? Porque aqueles frutos lindos que ela deu, aqueles frutos bonitos que ela deu, vai se transformar em sementes pra gerar uma outra árvore, ou seja, é uma cadeia”. Ou seja, eu preciso pensar no meu trabalho no melhor possível, da maneira que eu possa desenvolver o melhor possível pra que, a hora que ele chegar a ser um trabalho bonito, esse trabalho poder, os frutos desse trabalho gerarem outras árvores que possam crescer e nisso eu vou poder falar assim: “Realmente eu acho que eu pude contribuir um pouco pra sociedade”.
P/1 – Qual que é o seu cotidiano hoje, o que você faz?
R – Hoje o meu cotidiano é, eu estou voltando lá pra onde se instalava o espaço Criança Esperança na Brasilândia, como voluntário, após a minha saída de lá, como voluntário pra desenvolver um trabalho na comunidade, com o teatro, depois de uma reforma que teve. Então a gente sempre lutava, quando eu trabalhava no projeto, a gente sempre lutava pra comunidade se apropriar do espaço, todo lugar, e assim, é a política do Sou da Paz também, fazer com que a comunidade se aproprie do espaço onde eles estão vivendo ali. Então depois da reforma o clube ficou vazio, o espaço ficou vazio, lógico, porque ficou um bom período fechado por conta dessa reforma, e aí eu estou tentando, como eu moro na comunidade, é fazer com que essa comunidade de alguma forma, os educandos na minha época, comecem a se apropriar desse espaço também, como já estão se apropriando de lá agora. E aí eu vim pra cá pra somar, fui pra lá agora pra somar, pra que eles comecem a se apropriar do espaço que tem, da melhora no espaço que foi feita pra eles. Eu estou fazendo no período da tarde, estudando técnicas em artes dramáticas, técnica em dramaturgia, e tenho os meus trabalhos que eu faço na igreja, porque sou regente de um coral na igreja e tem os trabalhos que eu estou à frente, e o trabalho de evangelismo que eu faço na rua. Então o meu cotidiano é esse, não para, e às vezes ir pra Guaxupé, pra Minas, vou lá dar aula de música, dar aula de teatro, volto, às vezes vou dar um workshop lá e volto pra cá, então a minha vida sempre é esse corrido, mas eu gosto, né? E hoje curtindo um pouco o meu filho, de três meses, que nasceu, e a minha esposa, e assim, cuidando um pouco da minha mãe, porque depois da perda do meu pai, pra nós foi uma perda muito grande na família, assim, toda, todo mundo sentiu muito forte e principalmente a minha mãe, que era muito, muito, muito ligada ao meu pai, assim, né? Que o meu pai tinha aposentado há pouco tempo, e aí veio a falecer, deu um AVC e tal, mas ele se importava muito com vidas, ele se importava muito em cuidar e amar as pessoas, assim, então hoje eu falo que, assim, na minha família a gente tenta procurar dar seguimento nas coisas que o meu pai deixou, né? Então que ele sempre falava: “Gente, não para, se preocupe sempre com o seu próximo, ame as pessoas e tal e tenta fazer alguma coisa pra acrescentar na vida das pessoas, o que você vai acrescentar, nunca pense em tirar, não, tirar proveito das coisas, não, pense em acrescentar. Se você não pode somar com as pessoas, pelo menos não tentar tirar nada, das pessoas, ou tentar usurpar alguma coisa das pessoas que vai prejudicar, mas sempre tenta acrescentar alguma coisa de alguma forma, porque a gente tendo amor pelas pessoas no coração a gente já consegue acrescentar muita coisa na vida das pessoas”. Então hoje eu tento de alguma forma, do pouco tempo que eu tenho, às vezes o tempo que me resta, eu tenho uma hora vaga em tal dia, então eu quero tentar, seja voluntário, o que for, mas eu vou tentar dar aula pra alguém, trabalhar de alguma forma com algumas pessoas, assim, e hoje a minha vida é isso, se resume a essa correria, mas ao mesmo tempo...
P/1 – Quais são os seus sonhos?
R – Então, os meus sonhos, eu falo que muita coisa na minha vida, que eu sempre programei na minha vida, já estou vivendo, né? O meu sonho é poder viver com a minha arte, tanto seja no teatro, seja na música, seja na dança, mas eu viver com a minha arte, eu poder de alguma forma, hoje eu falo em questão, nem falo questões religiosas, não, eu falo assim, em questões de amor mesmo, porque pra muitas pessoas, fala assim: “Ah, mas”, eu vou falar pra você, eu falo pra todo mundo: “Gente, Deus é amor”. A partir do momento que você, independente de religião que você seja, você tem amor no seu coração, tudo aquilo que você vai fazer você tenta levar com amor. Então os meus sonhos é eu trabalhar, continuar trabalhando com a minha arte, eu queria trabalhar com a minha arte, levando amor pras pessoas, fazendo com que as pessoas se amem mais, que as pessoas sejam, tenham mais uma aproximação com a outra. Num mundo hoje que a gente vê que a violência chega muito forte, e ela bate muito de frente com o trabalho que a gente vem fazendo, que a gente vem sempre tentando desconstruir uma coisa que, ou seja, que as adversidades da vida, assim, vai colocando na vida de cada um, então a gente tenta desconstruir isso e construir uma vida, ajudar a pessoa a construir uma vida melhor. Não construir pra ela, mas ajudar em ferramentas e a ferramenta que eu quero, o meu sonho é isso, é a minha ferramenta, o que eu sempre tento passar pras pessoas é o amor, então é que eu consiga chegar com amor na vida das pessoas e evangelizar de alguma forma na vida das pessoas pra que possam ter mais amor, serem mais próximas e serem mais amáveis pra construir um mundo melhor.
P/1 – Elson, o que você acha de contar a sua história de vida aqui no Museu da Pessoa?
R – Maravilhoso, porque eu já tinha ouvido falar no Museu da Pessoa, mas não conhecia, aí hoje, quando eu vim conhecer e comecei a olhar ali, eu estava lendo até uns depoimentos ali, eu falei: “Nossa, que legal que você pode chegar”. Porque, assim, tem lugares que eu não vou conseguir chegar, eu Elson, pessoa física assim, chegar em algum lugar pra contar, pra somar alguma coisa, falar alguma coisa com as pessoas, mas através de um depoimento as pessoas que vêm visitar o Museu, que acessam o site, de alguma forma podem ver, nem que não veja todo o depoimento. Mas de alguma forma, eu sempre falo assim, a história de vida de cada um é um testemunho, e sempre testemunhos, a história de vida das pessoas, de alguma forma a gente se identifica, em algum momento a gente vai se identificar ou às vezes não, e aí às vezes a gente pode mudar alguma coisinha ou tentar ajudar em alguma coisa. Eu já tive oportunidade de assistir alguns depoimentos em alguns outros lugares, eventos e tal, e acrescentou algo na minha vida, me ajudou em algo, e às vezes até coisa que eu tava procurando uma solução pra minha vida, assim, em algum momento, o que que eu devo fazer, alguma experiência que a pessoa já tenha passado, e era a mesma experiência que eu estava vivendo no momento e aquilo me ajudou. Então de alguma forma eu sei que esse trabalho que vocês tão desenvolvendo aqui, eu sei que chega na vida das pessoas de uma maneira diferente, né? E essa maneira diferente, como vocês fazem trabalho de contação de história aqui, que eu amo contação de história, então você fazer um trabalho de contação de história pra crianças, seja, criança, adultos, jovens, independente, mas a pessoa que vem, de alguma forma ela vai chegar aqui, e aí ela vai conhecer. "Nossa, eu fui lá através de uma contação de história”, aí através dessa contação de história eu vou entrar no site: “Nossa, eu vi um depoimento”, então tem várias ferramentas aqui que as pessoas podem se apropriar. Eu, agora eu vou começar a divulgar mais aqui esse trabalho de vocês, porque eu não conhecia, agora eu conheço, então, a partir do momento que você conhece uma coisa, você pode falar com propriedade, e pode começar a divulgar e falar pras pessoas. Eu sou assim, se eu passo por algum lugar, eu quero de alguma forma que a pessoa também tenha a oportunidade de chegar aonde eu fui: “Olha, eu fui em tal lugar assim, vai lá, porque”. Então hoje eu trabalho, ainda trabalho com educandos em vários lugares, em vários lugares aqui também, tanto em Belo Horizonte, quando a gente vai pra lá, pro Rio de Janeiro, em Minas, e pra poder falar e poder divulgar: “Vocês podem entrar e tal, tem um site assim e procurar”, então de alguma forma, algum lugar desse Brasil, nesse mundo, a gente vai conseguir atingir alguém com esse trabalho. Então eu achei muito legal, parabenizo vocês por esse trabalho que vocês estão fazendo e, assim, pra mim estar dando esse depoimento aqui hoje é muito importante. Porque eu nunca parei pra contar, até eu fiquei um pouco meio confuso, mas eu nunca parei pra contar a história da minha vida, ou seja, começar da minha família, começar a contar a história da minha família, eu desde pequeno, tem muita coisa que a gente acaba deixando passar. Mas só por ter a oportunidade, já ter essa abertura nesse espaço pra contar um pouco da minha história, um pouco da minha vida, né, e compartilhar com as pessoas, um pouco da minha história e um pouco do que outras pessoas também puderam fazer na minha vida, e com muito amor fizeram na minha vida e hoje é por isso que eu estou aqui pra poder dar esse depoimento, né? Então isso não tem palavras, sabe, não tem palavras, de tudo que eu já sempre passei, assim, a cada dia as coisas vão surpreendendo a gente na vida, né? Quando, eu lembro quando eu trabalhava no Criança Esperança, eu falei: “Nossa, que legal poder fazer isso pelas pessoas, poder ter um apoio, pra poder fazer, desenvolver isso”, e aí cada coisa que vai acontecendo na vida da gente, você fala: “Nossa, que legal”. Aí eu entrei aqui, de novo eu falei: “Nossa, que legal poder contar um pouquinho da história, contar um pouquinho da experiência ali, pra poder de alguma forma você somar, né? Então mais uma vez eu falo que eu estou muito feliz de poder somar de alguma forma, eu não sei como, mas de alguma forma poder somar na vida das pessoas.
P/1 – Obrigada, eu queria agradecer em nome do Museu.
R – Eu que agradeço.
FINAL DA ENTREVISTA
Recolher