Projeto Memória nos Bairros
Depoimento de Sérgio Antonio Pereira Leite Salles Arcuri
Entrevistado por Marina e Stella
São Paulo, 24/10/2000
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista número: MT_HV035
Transcrito por Marília Eira Velha
Revisado por Luiza Gallo Favareto
P/1- O senhor poderia nos dizer o local e data de seu nascimento?
R- Eu nasci no dia quatro de Agosto de 1944, São Paulo, capital.
P/1- O nome dos seus avós, por favor.
R- Vicente Salles Arcuri e Raquelina Salles Arcuri. E avós maternos, Aníbal Pereira Leite e Marta Caim Pereira Leite.
P/1- Qual é a origem da sua família paterna?
R- Pelos dois lados nós temos... Por parte do meu pai, meu avô paterno é brasileiro nato e a minha avó paterna é italiana. Pelo lado da minha mãe, o meu avô é brasileiro nato e a minha avó materna é de origem francesa.
P/1- O que os seus avós faziam, o seu avô paterno?
R- Meu avô paterno era um humilde contador, trabalhava no Grupo Polis, que era radicado também no Guarujá. E a minha avó era do lar. Com relação ao meu avô materno, ele era inspetor da Receita Federal e minha avó era professora de francês.
P/1- O senhor sabe porquê a sua avó veio para o Brasil?
R- Eu desconheço as causas da vinda para o Brasil, mas com certeza, por ser italiana, ela veio na grande imigração pós-guerra. Eu acho que veio no mesmo grupo de italianos que vieram somar com o crescimento de São Paulo.
P/1- E o que os seus pais faziam?
R- O meu pai era de uma família humilde, meu avô Vicente e minha avó Raquelina. Ele trabalhava desde cedo, ajudava no sustento da família, ou contribuía quase que totalmente para o sustento da família. Sempre desejou, quando jovem, ser padre. Deixou de ser padre para ser professor e, de professor, acabou indo para diretor de escola.
P/1- Ele é formado em História, né?
R- Não, naquela época não existiam faculdades específicas para a área de Educação. Qualquer pessoa com curso superior, quer de Advocacia,...
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Depoimento de Sérgio Antonio Pereira Leite Salles Arcuri
Entrevistado por Marina e Stella
São Paulo, 24/10/2000
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista número: MT_HV035
Transcrito por Marília Eira Velha
Revisado por Luiza Gallo Favareto
P/1- O senhor poderia nos dizer o local e data de seu nascimento?
R- Eu nasci no dia quatro de Agosto de 1944, São Paulo, capital.
P/1- O nome dos seus avós, por favor.
R- Vicente Salles Arcuri e Raquelina Salles Arcuri. E avós maternos, Aníbal Pereira Leite e Marta Caim Pereira Leite.
P/1- Qual é a origem da sua família paterna?
R- Pelos dois lados nós temos... Por parte do meu pai, meu avô paterno é brasileiro nato e a minha avó paterna é italiana. Pelo lado da minha mãe, o meu avô é brasileiro nato e a minha avó materna é de origem francesa.
P/1- O que os seus avós faziam, o seu avô paterno?
R- Meu avô paterno era um humilde contador, trabalhava no Grupo Polis, que era radicado também no Guarujá. E a minha avó era do lar. Com relação ao meu avô materno, ele era inspetor da Receita Federal e minha avó era professora de francês.
P/1- O senhor sabe porquê a sua avó veio para o Brasil?
R- Eu desconheço as causas da vinda para o Brasil, mas com certeza, por ser italiana, ela veio na grande imigração pós-guerra. Eu acho que veio no mesmo grupo de italianos que vieram somar com o crescimento de São Paulo.
P/1- E o que os seus pais faziam?
R- O meu pai era de uma família humilde, meu avô Vicente e minha avó Raquelina. Ele trabalhava desde cedo, ajudava no sustento da família, ou contribuía quase que totalmente para o sustento da família. Sempre desejou, quando jovem, ser padre. Deixou de ser padre para ser professor e, de professor, acabou indo para diretor de escola.
P/1- Ele é formado em História, né?
R- Não, naquela época não existiam faculdades específicas para a área de Educação. Qualquer pessoa com curso superior, quer de Advocacia, quer de Engenharia, de Medicina, tinha condições legais de lecionar em qualquer estabelecimento de ensino. As faculdades de Educação vieram muito depois e, naquela época, o governo sempre permitia que esses profissionais liberais podiam exercer o Magistério. Eram chamados os autodidatas da educação em nosso país.
P/1- Ele nasceu em que ano mesmo?
R- Meu pai nasceu em 1913.
P/2- Doutor Sérgio, ele fez faculdade de Direito em que lugar?
R- Ele era bacharel pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco, a USP. Formou-se em 1933, ou 36, não me lembro bem.
P/1- Como era a sua casa antiga? Vocês moravam onde e como é que era a vida?
R- A vida era uma vida modesta, não faltava nada. Mas meu pai, essencialmente quando eu nasci, vivia praticamente do Magistério. "A condição de diretor foi um acidente de percurso" ele dizia assim na vida dele, porque o que ele gostava mesmo era de ser professor. Acredito eu que deve ter lecionado para mais de cem mil alunos durante esses 56 anos de Magistério.
P/1- Na sua casa eram quantos irmãos?
R- Nós éramos uma família de cinco irmãos onde eu era o mais velho. Onde eu sou, ainda, o mais velho.
P/1- E como era a vida no dia a dia da família?
R- O meu pai sempre primou por uma educação relativamente rígida, defensor dos princípios da moral, preocupado muito com a educação dos filhos. Não só com a educação dos filhos, com a dos seus próprios alunos. Incentivou sempre muito o estudo e, se não bastasse o incentivo ao estudo, ele incentivava muito ao trabalho. Todos nós começamos a trabalhar muito cedo.
P/1- E a sua mãe? Como ela era na família?
R- Ela sempre foi um ponto de equilíbrio entre ele e ela em relação à educação dos filhos, porque ela foi sempre mais maternal. Mas os dois somavam bem.
P/1- E como era a vida dos seus irmãos, as brincadeiras?
R- Nós convivíamos muito bem, cada um tinha os seus afazeres. Cada um foi para uma área profissional, embora tivéssemos trabalhados juntos, todos, até 1992, colaborando com ele. Não só no ressurgimento do Colégio como na administração do Colégio, até 1990.
P/1- Como é que era a infância, brincadeiras, os amiguinhos?
R- Sim, nós tínhamos recreação, nós tínhamos apartamento no Guarujá. Isso, na época, era um pioneirismo, que isso foi em 1955. Acabamos tendo que vender o apartamento para poder montar o ressurgimento do Anglo Latino, em 1957. Porque a paixão dele foi sempre o Colégio e o fechamento do Colégio, em 1950, por ele não ser sócio majoritário, foi um baque. Então ele mobilizou quase quinhentas pessoas para conseguir economicamente viabilizar a reorganização desta escola que hoje tem 44 anos de vida.
P/2- Por que o senhor falou que a entrada dele no Colégio, na parte de direção, foi um acidente de percurso? Conta essa história.
R- Porque, na verdade, o Colégio Anglo Latino existia desde 1873. Mas para conhecimento visual nosso por álbuns, fotografias, ele existiu desde 1913. De 13 a 22, na Avenida Paulista. De 22 a 1936, na Avenida Liberdade. De 37 a 50, na Rua São Joaquim e Galvão Bueno. Em 1935, aproximadamente, meu pai, o Celestino Rodrigues e o Léo Bonfim montaram um curso preparatório para a Escola Politécnica. Então o curso Anglo Latino era, exclusivamente, para preparação de alunos para a Poli. Funcionava, inicialmente, dentro das instalações de um tradicional colégio de São Paulo, que era o Colégio Paulistano, na Rua Taguá. Quando eles precisaram sair de lá, por motivos que eu desconheço, eles foram usar as instalações do Colégio Anglo Latino na Liberdade, antiga Escola Guerreiro. E na Avenida Paulista começou com o nome de Colégio Guerreiro. Escola Guerreiro, do velho professor Guerreiro. Um ano depois deles estarem instalados na Avenida Liberdade, o velho Guerreiro faleceu e os filhos não tinham a mesma habilidade para conduzir os negócios do Colégio, e o Colégio começou a perder aluno. Com a perda de alunos o Colégio ia fechar. Para não fechar o Colégio, eles compraram o Colégio. Foi aí, em 36, que ele virou dono, junto com Léo Bonfim e Celestino Rodrigues, do Colégio Anglo Latino na Avenida Liberdade.
P/1- O seu pai?
R- O meu pai, Benjamim Arcuri.
P/1- Na Avenida Liberdade?
R- Próximo à Casa de Portugal.
P/2- E ele contava histórias? Porque o senhor não chegou a conhecer essa sede, né?
R- Na Avenida Liberdade, não. E muito menos na Avenida Paulista. Conheço por fotos, álbuns que ficaram no acervo nosso, aqui. Mas, na verdade, eu conheci muita coisa, ou alguma coisa, das instalações da Rua São Joaquim, da Galvão Bueno e da área que eles iriam ampliar para a instalação da Universidade, que ia da Rua Conselheiro Furtado à Galvão Bueno. Galvão Bueno, Rua Taguá e mais uma frente onde tinha o prédio principal, na Rua São Joaquim, 550.
P/2- E ele contava coisas...
R- Contava, ele se orgulhava da instituição. Ele era essencialmente um educador, defensor ferrenho dos aspectos de moralidade. Era monarquista, defendeu a Monarquia até os últimos dias que viveu. Era fundador da Pátria Nova, junto com o Arlindo Veiga dos Santos, com Plínio Salgado, enfim, com essa turma.
P/1- Pátria Nova? Plínio Salgado?
R- É, Movimento Monarquista, integralista também. Ele foi integralista antes de ser monarquista. Ele tinha um entusiasmo muito grande pela história do Brasil e, dentro da docência, ele sempre defendeu a monarquia e entendia que o Brasil, enquanto viveu sob o regime monárquico, tinha um apogeu e tinha uma projeção no mundo todo. Muito maior do que tem hoje. Ele acha que a República foi um malefício para o país.
P/1- Como ele enveredou pelo ensino de História, já que ele saiu das arcadas?
R- Na verdade, ele... Eu não vou dizer que ele se decepcionou. Ele não dava para ser advogado, porque Advocacia é uma atividade diferente da personalidade dele. Na verdade, ele advogou um ano e meio e dali para frente enveredou para o Magistério e nunca mais teve outra atividade a não ser educador.
P/1- Mas e a escolha da matéria História?
R- A história da matéria História eu acredito que estava relacionado pelo próprio entusiasmo dele com relação à defesa da própria Monarquia. Ele se aprofundava muito em História Secreta para poder justificar as suas teses e justificar a própria defesa da Monarquia.
P/1- Como História Secreta?
R- Porque existe muitas coisas que não estão nos livros ou, se estão nos livros, estão em alguns livros que muita gente não tem acesso ou quase ninguém tem acesso. Então ele se aprofundou de uma maneira muito grande com relação a essas atividades e chegou a escrever, em 1943 e 44... Porque ele teve pneumonia e pneumonia, naquela época, para curar levava seis meses. Então, na verdade, ele acabou escrevendo dois livros, "O Antigo Curso Ginasial de Terceira e Quarta Série." Livros que tiveram apenas uma edição e ele usou muito para preparar as suas aulas, as suas apostilas. Porque ele, até morrendo, preparava as suas aulas para dar.
P1- Mas essa História Secreta me intrigou. O que seria? Dá para contar o que é? Ele era maçom?
R- Não, porque o monarquista dificilmente é maçom. E o monarquista nunca seria comunista e ele era anti-comunista. Ele se entendia com alguns elementos, alguns teóricos do regime comunista, mas eu prefiro não declarar o nome porque eu acho que estão vivos ainda. Não vale a pena.
P/2- E esse entusiasmo por essa forma de governo, por esse sistema de governo, ele levava para a sala de aula? Como que ele era em sala de aula?
R- Permanentemente.... E tinha um dom de dramatizar as suas aulas, de vincular a História aos acontecimentos de uma forma teatral. Ele costumava dizer, e ele se vangloriava disso, que dentro da cadeira de História do Brasil, quando ele dava aula sobre D. Pedro, ele podia, ao mesmo tempo, fazer a classe dar risada e se quisesse, em seguida, fazia a classe inteira chorar. E ele conseguia mesmo, porque ele tinha o dom de dramatizar e de vivenciar a vida de D. Pedro como um grande imperador. “Apesar de suas fraquezas”, ele falava. Porque o D. Pedro tinha tido os seus amores.
P/1- Mas no Colégio, ele sempre tinha sócios, é isso?
R- Tinha. Desde o começo era Léo Bonfim e Celestino Rodrigues. Depois, quando o Anglo Latino saiu da Avenida Liberdade, em 44, para a São Joaquim, foi aberto um leque de sócios. Foi aí que ele não manteve a maioria das ações e o Anglo Latino, em cinquenta, por interesses do governador Ademar de Barros, que precisava instalar a Academia de Polícia, foi vendido para a Caixa Econômica Estadual. E a Caixa Econômica cedeu o Colégio para a Academia de Polícia, que depois foi transferida para a USP.
P/1- Mas o prédio era próprio?
R- Era, mas na verdade associou o interesse do governo de Estado em comprar o prédio e o desinteresse de alguns sócios majoritários. Por exemplo, Eduardo Celestino Rodrigues foi construir Brasília, Eduardo Celestino Rodrigues foi Secretário de Aviação em Obras Públicas. Então, enveredou para a política e para a construção civil e isso levou a um desinteresse dos sócios majoritários que votaram, em 1950, pelo fechamento do Colégio e a venda dos prédios.
P/1- Aí se instalou ali a Academia de Polícia?
R- Aí se instalou a Academia de Polícia. A Academia de Polícia saiu dali e foi para a USP, o prédio ficou vazio. Aí precisou reformar... Mas isso é um comentário, porque não faz mais parte da nossa história, mas sim da história do prédio. Aí precisou acontecer a reforma do prédio do Corpo de Bombeiros da Praça Clóvis. O Corpo de Bombeiros mudou numa madrugada e se instalou dentro do prédio do Anglo Latino. Todo aquele complexo do Corpo de Bombeiros ficou lá anos, até reformar o prédio da Praça Clóvis. Com todas essas interferências, acabaram recalcando o prédio e o prédio foi demolido e vendido.
P/1- Enquanto tudo isso aconteceu, o Anglo Latino se instalou... Não fechou, né?
R- Ele ficou de 1951 a 1956, fechado.
P/1- Fora do ar?
R- Fora do ar.
P/1- Não existiu mais?
R- Não.
P/1- Como é que foi essa reabertura?
R- Essa reabertura foi decorrente do descontentamento do meu pai no fechamento e de muitas pessoas que trabalharam no Anglo Latino. Professores, funcionários, pais de alunos, ex-alunos. Isso ensejou uma mobilização de quase quinhentas pessoas e essas quinhentas pessoas conseguiram dar força para o meu pai viabilizar o Colégio economicamente.
P/1- Aí ele ficou sócio?
R- Nessa nova situação, ele era sócio majoritário.
P/1- Porque, quando você falava em Colégio Anglo Latino, ele sempre era o professor Acuri. Nunca tinha falado...
R- É verdade, porque ele, como professor, como educador, se destacou muito. E mesmo como professor e como diretor, ele tinha um relacionamento muito estreito com os alunos. Ele era muito querido por essa relação professor-diretor. Aliás, ele sempre dizia que ele gostava muito mais de ser professor do que ser diretor. Ele costumava dizer que diretor foi um acidente de percurso que ele acabou exercendo até o fechamento do Colégio. Chegou a ser diretor geral do Anglo Latino lá na Rua São Joaquim em alguns momentos, depois foi diretor do departamento feminino na Rua Galvão Bueno. Mas nunca deixou de ser professor.
P/2- Departamento...? Desculpa.
R- Naquela época, se separava o departamento feminino do masculino.
P/2- Aqui já não?
R- Não, mas havia, no ressurgimento de 57, pátios separados, escadas separadas, recreios separados. Isso acabou desaparecendo porque seria um absurdo isso, hoje. A vida moderna e a educação moderna não convivem com essa nova realidade.
P/1- A vida do Colégio está muito ligada ao bairro, também, né?
R- Sim. Ele escolheu a Aclimação contrariando alguns companheiros dele na época. Escolheu esse terreno aqui, porque ele estava vizinho ao Parque da Aclimação. Ele tinha uma preocupação muito grande com relação ao ar que os alunos respiravam. Ele tinha uma preocupação muito grande em não ter vizinhos no futuro e ele praticamente conseguiu isso, porque o terreno que foi comprado inicialmente, com a expansão que foi feita depois, ele acabou ficando sozinho nesse canto do Parque da Aclimação. Então nós temos 50% de divisa com o Parque da Aclimação e temos mais quase 50% para frente, para a Rua Oscar Guanabarino. Com isso nós nunca teremos vizinho em momento nenhum.
P/1- Oscar Guanabarino?
R- É a primeira rua do lado, aqui. Nós não teremos vizinho nenhum nessa região. E ele achava muito importante essa reconstrução do Anglo Latino no lugar onde ele está atualmente, desde 1957 até agora.
P/2- O senhor sabe se quando estava lá na Liberdade, São Joaquim, já tinha essa imigração japonesa no bairro? E o Colégio recebia?
R- A imigração japonesa também tem um momento durante a guerra e pós-guerra. Houve muita perseguição contra os japoneses e contra os italianos. Na verdade, ele era defensor dos japoneses, tanto que o Colégio Anglo Latino foi, na época e no ressurgimento, um reduto da colônia japonesa. Ele foi padrinho de uma grande professora de Português, que a senhora conheceu, que foi Tsui Aono. A maior professora de Português, sem demérito de ninguém, que o Anglo Latino teve.
P/2- Tsui? Japonesa?
R- Tsui Aono. Os irmãos também foram, acho, que seus colegas. Inclusive, um dos irmãos foi o responsável pelo projeto de reconstrução desse prédio. E na verdade, a Tsui foi afilhada dele, a filha foi afilhada de batismo e ele tinha uma grande admiração pela colônia japonesa e pelo trabalho que os japoneses fizeram no Brasil quando vieram aqui, no processo migratório.
P/2- E muita gente saiu do bairro da Liberdade e veio para a Aclimação, né?
R- Quando nós ressurgimos para cá, com certeza, muitas pessoas vieram para cá por força do Colégio. Houve uma movimentação da colônia japonesa do bairro da Liberdade para cá, também. Até por causa da vinda, depois desses últimos anos do processo migratório, dos coreanos.
P/2- Então ele era o defensor da colônia?
R- Sim.
P/1- Mas o Colégio, quando estava na Liberdade e na São Joaquim, havia também aquele Colégio Roosevelt, né?
R- Sim. Na verdade, o que combinava como escolas de alto nível naquela região, na década de cinquenta, era o Roosevelt, da Rua São Joaquim, era o Colégio Paulistano e a Anglo Latino. A briga da qualidade era entre os três, porque era o único colégio estadual.
P/1- É verdade. E nesse ranking onde é que entrava o Colégio São José?
R- O Colégio São José sempre esteve na Rua da Glória, pertence à Santa Casa de Misericórdia. E sempre foi uma opção da família brasileira, da família paulistana, em relação a ser uma escola exclusivamente feminina, na época, que pregava a religião católica. Naquela época isso era muito importante. Prestou um grande serviço e presta serviços à educação até hoje.
P/1- Quais os outros colégios que existiam ali na São Joaquim, além do Roosevelt? Não tinha um que queimou? Como era o nome daquele? Uma escola que pegou fogo recentemente. Recentemente, não. Não tão recente. A que está grudada no Roosevelt.
R- Não me lembro dessa escola. O que era? Colégio da Independência? Ginásio...
P/1- Ainda existe, é do governo. Fica em frente ao Templo Budista.
R- Um prédio que está deteriorado, caindo aos pedaços? Mas aquilo não pegou fogo. O buraco apodreceu e caiu, mesmo. Porque o que eu sei é um prédio do Estado. Então, mas ali não era o Roosevelt. Ou era o Ginásio do Estado que depois foi para o Parque D. Pedro? Esse Ginásio do Estado que está lá em cima, na São Joaquim, é o atual Ginásio do Estado do Parque D. Pedro que teve como professor seu de Português, o Francisco Daniel Trivinho. Lembra do Trivinho?
P/1- Mas espera um pouco. Eu quero entender essa história do Colégio, porque tem um queimado até hoje.
R- Não sei se foi queimado. Para mim ele caiu de cupim.
P/1- Disseram que foi um incêndio.
R- Não me lembro disso.
P/1- E o Roosevelt, que era famoso também, na época.
R- Ficava na Rua São Joaquim, também.
P/1- Isso. Então, era o Anglo Latino lá embaixo, o Roosevelt, vizinho?
R- Esse que deve ter se deteriorado com a queda do telhado ou incêndio, eu creio que é o atual Ginásio do Estado do Parque D. Pedro.
P/1- Que se mudou para lá?
R- É.
P/1- Que mais ligações tinha o Colégio com o bairro?
R- Aqui ou lá?
P/1- Lá.
R- O Anglo Latino, até pelo seu apogeu na década de cinquenta, com 4200 alunos, centenas de professores, belíssimas instalações, belíssimos laboratórios e bibliotecas, acabou se tornando acho que o maior colégio da América Latina. Não só do ponto de vista de qualidade como de vista de quantidade. Poderia ter instituições, do ponto de vista de projeção, com a mesma projeção do Anglo Latino, mas nunca inferior. O que foi lamentável o seu fechamento na década de cinquenta, que acabou ensejando, não sei se a senhora lembra, publicações de páginas inteiras no jornal O Estado de São Paulo criticando o fechamento. Realmente, eu considero um crime contra a educação brasileira a extinção do Anglo Latino. Eis o porquê, repito, meu pai se sentiu muito magoado com esse fechamento e fez questão de ressurgir aqui, com a mesma qualidade, com a mesma dedicação, com o mesmo desvelo que ele sempre teve. Não só como diretor, mas como professor.
P/1- Foi em cinquenta o fechamento?
R- Foi.
P/2- E em 56 foi a reabertura?
R- Em 56, ele reuniu os descontentes e mais aqueles que achavam que o Anglo Latino carecia de uma escola e ensino de Curso Ginasial, o atual Ensino Fundamental, e o antigo Colegial e atual Ensino Médio, para poder atender às necessidades do bairro. Porque, dentro do Bairro da Aclimação, não existia nenhuma escola com toda a infra-estrutura e que começasse com a Educação Infantil e fosse até o Ensino Colegial, ou Médio atual.
P/2- O senhor tem lembranças dessa reconstrução aqui, da inauguração?
R- Tenho, total.
P/2- Como é que foi?
R- Total, porque eu era ainda menino de dez, onze anos, e eu participei muito da reconstrução. Quando ele vendeu as cotas para os cotistas, na época eu participava das reuniões todas, embora pequeno, embora fosse um menino de onze anos. Eu ajudava na cobrança, andava de bicicleta pelo bairro cobrando os cotistas, e foi somando que ele conseguiu restabelecer o Anglo Latino. Ele tinha um ditado que não se soma zero, então qualquer colaboração era bem-vinda e essa somatória de colaborações é que ensejou o ressurgimento do Colégio.
P/1- Foi toda uma iniciativa dele?
R- Sim. Ele liderou o grupo, incluindo professores do antigo Anglo Latino, como o Blanche Buarde, o Teixeira, Rafael Pero Sobrinho, que foi seu professor de Português. Está aqui, trabalha comigo até hoje e está com 88 anos.
P/1- Ainda trabalha?
R- Trabalha. Seria interessante a senhora entrevistá-lo, ele tem um...
P/2- Ele veio de lá da Liberdade?
R- Ele veio da Liberdade, não. Ele foi professor do Paulistano. Ele fez o meu exame de admissão ao Ginásio de 1955. Porque eu estudei um ano no Paulistano, depois eu vim para cá. Eu tinha uma vida dupla, eu era funcionário, o bom office-boy, o boy auxiliar, e era estudante. Meu pai obrigava, no bom sentido... Obrigava coisa nenhuma, mas ele direcionava a vida dos filhos para o estudo e, preferencialmente, para o trabalho.
P/2- Como era essa história do exame de admissão, seu Sérgio?
R- Naquela época, existia uma apostila do Osvaldo Rangel... Não, não era Osvaldo. Do professor Rangel, a senhora deve ter estudado nele. Lembra de uma apostila do Rangel que tinha capa vermelha ou capa verde? Não lembra disso?
P/1- Não lembro. Tantos anos, né?
R- Pois então, eu tenho uma memória fotográfica terrível. Eu estudei nos livros do Rangel todo mundo, de São Paulo inteiro, se preparava nos livros do Rangel e iam fazer o exame de admissão ao Ginásio. Porque não havia compulsoriedade do Ensino Primário feito em escola. Você podia estudar em casa com a sua mãe ou com uma professora, com quem você quisesse, e depois era avaliado através do famoso exame de admissão ao Ginásio. Havia um certificado que antecedia o certificado do Ginásio. Esse certificado, dado por uma pessoa formada no Magistério, permitia que você prosseguisse nos estudos na Primeira Série do Curso Ginasial.
P/2- E as pessoas tinham medo do exame de admissão? Era como um vestibular?
R- Nossa senhora! Era uma coisa bárbara.
P/2- Tão grande?
R- É. E na sua época também tinha um Ginásio de cinco anos, né? Que englobava o Ginásio e o Colégio. Ginásio de cinco anos.
P/1- É que o último era...
R- Era o Pré?
P/1- É.
R- O preparatório.
P/1- Sabe uma coisa que eu lembro, daí eu posso ajudar o seu depoimento? O uniforme era bordô.
R- É, isso mesmo.
P/2- Que ótimo! Como é que era?
R- Era bordô, blusa branca e boina.
P/2- Boina?
R- Boina. Aqui, a boina era azul.
P/1- Mas lá, não.
R- Tinha uma boina roxa, ou uma fita roxa no cabelo.
P/1- Mas não tinha gravata, né? Não ia ter gravata.
R- Não. Gravata, eu acho que você vai encontrar na Avenida Paulista.
P/1- Era saia bordô, blusa branca e o sapato preto e meia branca.
R- E minha tia tomando conta para todo mundo vir de uniforme.
P/1- Eu não me lembro de boina. Eu tinha vindo do Eugênio Brandão, sabe aquele colégio? Lá tinha boina preta.
R- O secretário seu era o Viana.
P/1- Do Eugênio Brandão?
R- Não, do Anglo Latino.
P/1- Eu lembro das escadarias, eu lembro que tinha um cursinho...
R- Preparatório.
P/1- Que os rapazes iam à tarde.
R- Preparatório para a Faculdade.
P/1- Quando as meninas já estavam tudo trancadas na sala de aula, entravam os rapazes do cursinho. Eles punham a cara no vidro para olhar as meninas.
R- Todas as portas tinham vidro.
P/1- (risos) Exatamente.
R- Eram portas pretas, escuras... E o corredor...
P/1- Era verde.
R- Aqui era verde, agora, aqui é bege.
P/1- Não, lá era verde.
R- Eu não me lembro disso.
P/1- Acho que era da cor que é aqui e os vidrinhos...
R- Não, verde claro era o corredor e azul aqui. No começo, era verde claro.
P/1- Não é tudo verde, agora?
R- Não, azul.
P/1- Então já substituiu. Tinham muitas escadas, a gente subia para a aula e na entrada tinha uma rampa...
R- Não, a rampa era à direita. Na entrada tinha um passadiço entre a calçada e o prédio e, por baixo, a gente passava e ia na lanchonete.
P/2- Lá é isso ainda?
R- É isso mesmo.
P/1- Eu lembro que tinha...
R- Tinha uma livraria também, ali embaixo.
P/1- Quando entrava, não pela rampa, tinha um portãozinho...
R- Pequeno, do lado esquerdo. De ferro.
P/2- A livraria era da escola?
R- Era do meu avô e da minha avó. Eu vou mostrar uma coisa para a senhora que a senhora não acredita. O brasão do antigo Anglo Latino está na fachada.
P/2- O brasão da...
R- Ele tirou quando vendeu o prédio e levou para a casa. Ele levou o brasão, ele levou uma máquina de escrever, levou um cofre e um arquivo que estão aqui até hoje.
P/1- A história dos bombeiros eu já era jornalista. Eu fui entrevistar os bombeiros lá quando incendiou o Joelma, no mesmo prédio. Eu entrei lá para entrevistar o comandante.
R- Na São Joaquim?
P/1- Na São Joaquim. Depois do incêndio do Joelma, que foi em 73. Já estavam os bombeiros lá...
R- A senhora se formou por onde em jornalista?
P/1- Na FAAP.
R- Em que ano?
P/1- Em 75. Eu demorei para continuar os estudos.
R- A senhora é casada?
P/1- Divorciada.
R- Tem filhos?
P/1- Três.
R- Onde estudaram?
P/1- Mudou a entrevista. Agora, eu sou a entrevista.
R- Você é filha dela?
P/2- Não.
P/1- Agora, eu estou sendo entrevistada, Stella. Eles estudaram na FGV, na Superior de Marketing e Propaganda e na FAAP.
R- Muito bom.
P/1- Estão formados. Bom, voltando a nossa entrevista... (risos) Nós só invertemos a nossa entrevista, e agora, de repente, eu estou entrevistada. A gente queria fazer mais uma ligação da escola com o bairro da Liberdade. Qual foi a sua ligação, em termos de escola e pessoa, com a construção do metrô? Existiu alguma?
R- Diretamente, não. Mas, na verdade, o metrô se desenvolveu no mundo todo, é considerado o transporte modelo no mundo todo, é uma das melhores, ou a única opção por transporte subterrâneo. Algumas vezes aéreo, né? E com certeza, até por força da experiência nossa, por nós termos implementado há mais de dez anos esse uso do transporte do metrô, nós fizemos uma conexão com os nossos carros de transporte gratuito.
P/1- Explica como é isso.
R- Porque trazer o filho na escola é um problema. Problema para a mãe que tem que tomar conta da casa, problema maior para a mãe que trabalha fora. Então no momento em que eu não trago a mãe para cá, na minha porta, com o carro, e não crio problemas de trânsito aqui na minha porta... Porque houve momentos que eu tive brigas terríveis com os carros que passavam, com vizinhos. Quando eu passei a criar o transporte, em 1961, o escolar, porque era uma coisa que eu não queria, mas acabou sendo uma necessidade. E implementado, em 1983, com o ônibus Mercedes... Quer dizer, é uma atividade de transporte mais profissional. Nós resolvemos, no momento que o metrô se consagrou na região da Liberdade, em os alunos usarem os nossos carros gratuitamente. Inclusive, os pais onde os filhos são pequenos. Com isso o pai não vem aqui. Ele deixa o filho no metrô ou na cabeceira, no embarque, ou no desembarque, ou acompanha o aluno dentro dos nossos carros. É um trabalho que nós fazemos para mais de duzentos alunos de manhã e mais de duzentos, 250, para o Ensino Superior. Tanto que o metrô resolveu fazer um convênio conosco, no pioneirismo do nosso trabalho de implementação da conexão metrô. E mais uma colocação que nós estamos fazendo pelo terceiro ano. Nós escolhemos, experimentalmente, o bairro do Klabin. O Klabin foi um bairro que cresceu muito na vertical. Nós instalamos, também, um transporte gratuito dentro do Klabin.
P/1- Bairro do Klabin?
R- O Klabin começa ali embaixo, na Marginal, no Rio... Como é que chama o rio ali embaixo?
P/1- Tietê? Pinheiros?
R- Não. Bom, ali na Marginal.
P/1- Pinheiros.
R- É Pinheiro, ali? Não, aqui em cima da Vila Mariana, no Jabaquara. Bairro do Klabin, a senhora conhece?
P/1- Sei, ali...
R- Ele começa aqui embaixo e termina lá em cima, perto do metrô, o Klabin. Porque tem o Klabin Novo, e tem o Klabin Velho. E na verdade, o metrô também tem embarque e desembarque nessa região. Tanto que nós estamos pensando até, nas nossas expansões, em usar áreas próxima ao metrô.
P/1- Em que estação?
R- Na estação Ana Rosa. Porque nós entendemos que o metrô é uma situação irreversível e só tende a crescer e interiorizar o seu processo de atendimento em toda a cidade de São Paulo. Não se fez mais, acho, que por falta de recurso porque, na verdade, é um serviço que veio para ficar e veio com qualidade.
P/1- Mas vocês são pioneiros nessa coisa do convênio, ou não?
R- Sim, tanto que o metrô aceitou de pronto esse convênio. Porque, na verdade, ele não quer, só que o Anglo Latino ganha convênio com o metrô. Ele não vai querer que outros estudantes não façam. Eu faço no sentido justamente de minimizar o problema do tráfico na porta das escolas e diminuir o grande fluxo de movimentação de veículos. E nós estamos fechando o entendimento, também, com o estacionamento próximo ao metrô para que os alunos da Faculdade que vêm de carro, não venham até aqui. Ele pára no estacionamento ao lado do metrô, ou do metrô, eu não sei se é bem assim que funciona, e nós trazemos os nossos ônibus para cá.
P/1- Isso está funcionando desde quando?
R- Esse convênio com o metrô começou esse ano.
P/1- Este é recentíssimo?
R- É, e nós também estamos fechando venda exclusiva de tickets do metrô aqui dentro da Faculdade, para o aluno não perder nem tempo na fila do metrô.
P/1- Vocês ainda não colheram o resultado disso em termos de afluência de alunos?
R- Nossos ônibus, os três carros que atendem o metrô estão lotados. Eles chegam lotados e vão embora lotados.
P/1- Qual é a população que está se utilizando desse convênio?
R- À noite?
P/1- Durante...
R- Uns quinhentos alunos, entre manhã, tarde e noite.
P/1- Nos três períodos?
R- Claro.
P/1- Quinhentos alunos? E esses ônibus, como funcionam?
R- Os ônibus são nossos. Os mesmos ônibus que atendem o serviço contratado de transporte são desviados em parte para poder atender a conexão metrô-Anglo Latino e Anglo Latino-metrô.
P/1- E como o metrô aceitou? Quais são os interesses que ele teve de aceitar esse convênio?
R- Eu acredito que o metrô veio para atender a comunidade. E dentro da necessidade dele crescer, também, e atender a comunidade na cidade de São Paulo, ele achou que essa ideia de integrar metrô a transporte rodoviário...
P/1- Escolar?
R- Escolar, principalmente. É muito importante porque, por exemplo, na região da Domingos de Moraes, da Avenida Jabaquara, a senhora tem dezenas de escolas. Eu acho que isso deve servir de exemplo para que outras escolas, usando o seu próprio transporte e incrementando o transporte, possam fazer essa conexão para evitar o afluxo, como eu já disse, do transporte na porta das escolas e implementar o crescimento do uso do metrô.
P/1- Vocês são pioneiríssimos nisso, é isso?
R- Sim. Tanto que o convênio foi assinado com toda a pompa com a diretoria do metrô, justamente, para servir de estímulo para outras entidades que façam.
P/1- Em que data foi assinado esse convênio?
R- Foi assinado agora, faz o quê? Noventa dias ou 120 dias.
P/1- Com toda a pompa e circunstância?
R- Sim, porque o metrô faz questão. Tanto que nós estamos soltando um material nosso falando da conexão com o metrô. Pede lá para ver a...
P/2- Eu peguei o material.
R- São três materiais.
P/2- Não, eu peguei um só.
R- Vai pegar a revista da Faculdade e a nossa revista. Aqui deve ter uma parte.
P/1- E foi com o presidente do metrô, tudo?
R- Foi.
P/1- Vocês têm fotos desse momento?
R- Temos. E a nossa revista, não só a do Colégio como a da Faculdade, faz a revista da nossa federação aqui, em São Paulo, e vai divulgar isso com bastante ênfase, como um estímulo.
P/1- Você que liderou as negociações?
R- Foi.
P/1- E a primeira vez que o senhor propôs esses recursos, como é que foi a receptividade?
R- Muito boa.
P/1- Direto?
R- Muito boa. Aliás, por se tratar de uma empresa estatal, porque o governo... O meu pai costumava dizer que tudo o que o governo faz, ele faz mal. E o metrô tem um trabalho muito bem feito, tem uma qualidade que até surpreende. Acredito eu, talvez até pela própria independência que ele tem na sua gestão de comando sobre a operacionalidade. Mas não deixa de ser uma empresa estatal.
P/1- Você tem alguma coisa interessante para contar dessas negociações? E também, como é que isso está evoluindo e acontecendo?
R- Um fato pitoresco eu não tenho. Mas, na verdade, para nós foi muito bom, porque nós não gostamos de ser primeiros em nada, pioneiros em nada. Mas não gostamos de ser o último em nada. Porque nós temos uma linha de atuação na Educação como um todo, que nós não podemos transformar alunos em cobaias. O processo de experimentação em cima de aluno é uma coisa muito séria. Ela pode ser até traumática se ela for mal usada ou mal organizada. Então o Anglo Latino sempre primou pela modernização das suas atividades educacionais, implementadas por atividades culturais, esportivas e recreativas. Porque a escola completa hoje tem que manter o aluno, independentemente de estar no curso integral ou não, que isso é um outro assunto que nós temos. A escola tem que ser a mais eclética possível e ter atividades extra-curriculares que mantêm o aluno o maior tempo possível dentro da escola. De que forma? Com atividades culturais, esportivas e recreativas. Não há outra forma. Manter o aluno na escola exclusivamente durante o período de aulas, no meu entender, não gera uma educação completa. Porque a nossa maior preocupação é com a formação do que com a informação. Informação se adquire a qualquer momento na vida, até na velhice, mas a formação tem que ser organizada e graduada, desde a Educação Infantil até os dezessete anos. Que vai, no meu entender, a parte preventiva dos onze aos dezessete, que nós consideramos a área de risco da Educação. E aí nós entramos pelo trabalho de prevenção de drogas. A nossa federação, no país, é a única entidade representativa de 44 mil escolas que está entrando pesado na campanha de prevenção de drogas a partir dessa semana. Nós temos um acordo com a Presidência da República, com a Secretaria Nacional de Drogas do General Cardoso e também fazendo um trabalho de prevenção de nível nacional, porque nós entendemos que da Educação tudo isso faz parte.
P/2- Doutor Sérgio, eu queria voltar um pouquinho, que o senhor falou da ligação do seu pai com o Colégio. Eu queria saber como é que deu a ligação do senhor com o Colégio.
R- Como eu disse, o meu pai sempre se preocupou em formar os filhos, e informar os filhos mais do que formar. E dentro do processo, aqueles que escorregavam na educação, ele forçava a vincular a educação ao trabalho, o estudo regular ao trabalho. Então todos nós começamos a trabalhar muito cedo. Eu acredito que eu fui um dos que comecei mais cedo, mas logo em seguida vieram os que são mais novos do que eu e ficamos juntos aqui até 1990. Depois um era dentista e foi para a profissão, o outro achou melhor ir para a atividade de Buffet, dono do Buffet La Residence, e as duas moças continuam comigo aqui, como vice-diretora geral e assistente de direção. Na verdade, a gente analisa tudo isso como um processo sucessório natural, que tem que ser muito bem cuidado para que a instituição não venha a crescer por força do crescimento das famílias. Tem que tomar muito cuidado com isso, que isso acontece em todos os lugares.
P/2- Qual foi a sua primeira atividade na...
R- Aqui?
P/2- É.
R- Eu comecei como office-boy, menino de recados da secretária. Carimbava a caderneta, preenchia a ficha de ocorrência. Fui motorista durante muito tempo.
P/1- O que é uma ficha de ocorrência?
R- Essas ocorrências dos alunos, os problemas disciplinares dos alunos.
P/2- Traquinagem.
P/1- Policiavam?
R- É, vinha do professor e a gente transcrevia. Depois, de motorista eu passei para assistente de direção, de assistente de direção a diretor administrativo, de diretor administrativo a inspetor geral. Depois, presidente da mantenedora e com o falecimento do meu pai, eu assumi a direção geral em 1992.
P/2- Falando em disciplina, o senhor acha que desde os primórdios do Colégio até hoje, a forma de manter a disciplina mudou muito?
R- Mudou.
P/2- Em que sentido?
R- Mudou, porque a sociedade mudou, a vida mudou. A educação sofreu interferências de outros países, sofreu interferências de uma educação moderna até um tanto perigosa. Então nós tivemos que nos recolocar do ponto de vista do relacionamento com os alunos e com toda a comunidade, de forma a não quebrarmos os nossos princípios básicos e a gente conviver com uma nova realidade. Hoje nós temos que conviver de uma forma muito mais democrática. Sem quebrar os princípios, eu volto a colocar, tendo um diálogo mais aberto. Porque, hoje, a escola tem um papel predominante na formação dos alunos. Até porque, por força dessa crise que o país está passando e não vai mudar muito nesses próximos anos, as senhoras mães, hoje, vão para o mercado de trabalho para ajudar a pagar conta. Estão conscientes, lamentavelmente, que a rede pública presta um desserviço, ou um mal serviço. Com isso, tem que ficar na escola particular por menos graduado e qualificado que seja o ensino. Então precisa trabalhar, ajudar, para pagar conta. O pai perdeu o poder de compra com a crise, principalmente do plano real. É necessário somar a renda da mãe com a do pai para poder manter o filho numa escola como esta. Com isso, há uma ausência da mãe dentro de casa, com essa ausência, a escola aumentou a sua responsabilidade. Eu tenho reuniões de encontro de pais lotadas. E a maioria desses pais e mães de alunos fazem verdadeiros apelos para que a gente fique o maior tempo possível com os alunos e interfiramos o máximo possível na formação desses jovens. Há a preocupação com o uso de drogas, a preocupação com a formação, com atividades... Aí que eu insisto no problema da atividade esportiva, recreativa e cultural. Quer dizer, independentemente dos cinco dias de aula com cinco ou seis aulas por dia, o aluno deve voltar para a escola, no mínimo, duas, três vezes, para usar a biblioteca, para usar a informática, para fazer as pesquisas dentro da própria escola. Atividades esportivas dentro da escola. Nós abrimos às 6:50 da manhã e vamos até às 23 horas. A parte desportiva nossa vai até às 21:50 com atividades de esporte, basquete, vôlei, futebol de salão, handebol, tênis de mesa, judô, ballet, natação.
P/1- Com tudo isso, então não fica aqui dentro?
R- Fica aqui, não quer embora. Às vezes eu tenho que mandar embora, senão ele dorme aí. E aí nasceu o curso integral contra a minha vontade.
P/2- Como que é?
R- Porque mães viraram executivas e elas, como executivas, não têm condições de tomar conta dos filhos. Teve uma mãe que me disse: “Ou o senhor monta ou eu tiro.” Dona de uma editora e dona de uma grande empresa, ela tentou manter o filho em casa com empregada, não deu certo. E a gente viu o que anda acontecendo pela televisão. As empregadas ou as babás fazem verdadeiras barbaridades. Aí tentou procurar uma escola que tivesse integral e, nem sempre, as escolas de integral mantêm padrão de alto nível. Porque não é fácil manter curso integral com padrão e a nossa responsabilidade é total. O aluno entra aqui às sete horas da manhã e saí daqui às cinco horas da tarde. Ele vai para a casa para quê? Para tomar banho, jantar e dormir. E o integral funciona o ano inteiro, ele não para nas férias.
P/2- Geralmente, o integral é mais Educação Infantil? Aqui é...
R- Não, eu vou até a oitava série.
P/2- Até a oitava série?
R- É, e não aceito transferência. Só aceito transferência até a quarta série, não aceito transferência de aluno de curso integral a partir da quinta série, porque eu quero manter a qualidade. Porque eu quero os meus alunos que venham desde o berçário integral. Eu começo aqui com três meses.
P/1- Com três meses o bebê entra?
R- É, e a comida é feita aqui. A senhora já imaginou?
P/2- E para esses alunos do Ginásio? Eles também almoçam?
R- Almoçam aqui e fazem o estudo dirigido na parte da tarde, entremeado com atividades recreativas e esportivas. Senão ele fica neurótico. E durante as férias, nós suspendemos a atividade educacional e montamos um planejamento de atividades internas e externas, culturais, teatros, museus, enfim, tudo aquilo que a gente pode incrementar. Jogos... O aluno do integral só tem vinte dias de férias por ano, dez dias em Julho, não é isso? E dez dias em Janeiro.
P/2- Como é que os alunos recebem isso?
R- Muito bem. E para nossa surpresa, o resultado escolar desses alunos... Que isso, para mim, é o termômetro. Tem sido excelente e eles têm se classificado entre os melhores alunos nas classes.
P/1- E você já incrementou até o quarto ano...
R- Na quinta série não aceita aluno transferido. E não sai nenhum. Só sai do curso integral os alunos que, eventualmente, não se adaptaram, porque se não houve a adaptação de um aluno no curso integral, com certeza eu sou obrigado a tirar. Principalmente quando nós não temos o apoio da família. Como é que faz? Eu não posso omitir que um aluno me estrague... Porque as classes do curso integral são pequenas. Eu não posso colocar cinquenta alunos numa classe de curso integral, ou quarenta ou 35, num momento em que ele fica fazendo as tarefas e estudando. E tem que ser professor adequado.
P/1- Hoje, quantos alunos são no total no Colégio?
R- 2300. E devemos ir para um crescimento agora, por forças... Circunstâncias diversas, com o próprio crescimento do Ensino Superior.
P/1- Agora, você acha que se está viabilizando melhor o fluxo de alunos para você desde que vocês fizeram o convênio? Porque, vamos supor, se vai querer colocar num colégio aqui, sabendo que tem um ônibus no metrô e tal...
R- Olha, eu vou contar uma coisa para a senhora. Em 1957, o bairro era uma coisa. Nos últimos vinte anos o bairro da Aclimação envelheceu. Com esse envelhecimento, você teve uma fuga dos filhos dos moradores da época, que emigraram para outros bairros. Casaram e saíram. O bairro da Aclimação, que era um bairro essencialmente residencial, também passou a ser um bairro comercial. A Avenida Aclimação não tinha um comércio. Hoje tem doze bancos. A senhora pode até anotar isso aí. Eu te digo que tem dez ou doze bancos na Avenida Aclimação. Então, o que significa isso? Que o Anglo Latino ficou... O bairro da Aclimação ficou uma continuidade do centro da cidade e, principalmente, da Avenida Paulista. Onde não se instalou banco, se instalou lojas do comércio ou de alimentação, lanchonetes, restaurantes e etc. Na Avenida Aclimação, entre o bairro da Aclimação e a Rua Conselheiro Furtado.
P/1- Mais uma razão para ter o afluxo de alunos de bairros mais afastados?
R- Mais um motivo para nós implementarmos o transporte escolar com conexão do metrô predominantemente.
P/1- Exatamente. A perspectiva...
R- A verdade é a seguinte: o metrô, hoje, faz parte da história da cidade de São Paulo. É irreversível isso para tudo. A senhora já imaginou nas greves de ônibus, se nós não tivéssemos o metrô? Acho que quebraria o país, quebraria a cidade. Eu acho que é até estratégico. E a gente sabe a segurança que o metrô tem com relação até a paralisações. A senhora conhece?
P/1- Do que o senhor está...
R- A segurança que o metrô tem com relação à greve.
P/1- Não.
R- Então procura saber. Isso eu não vou falar aqui, não.
P/1- Fala, vai.
R- Não. O metrô é uma organização perfeita, eles são muito bem organizados.
R/2- Eu fico admirada.
R- É, são muito organizados, muito seguros. Eu fui fazer uma visita no metrô outro dia para conhecer o metrô, porque, por incrível que pareça, eu moro no bairro, trabalho no bairro, e não uso o metrô. Quando vou para a cidade, eu vou de motorista. Na verdade, eu fiquei surpreso com a segurança do metrô. Eles sabem até quem não usa o metrô, ele conhece o usuário do metrô. Durante toda a minha visita no metrô... Eu viajei da Estação Ana Rosa até a estação Jabaquara, e até o centro da cidade. A segurança do metrô é uma coisa maravilhosa.
P/2- Foi quando essa visita?
R- Isso foi tudo para poder justificar o convênio, porque eu não faço nada sem pesquisar.
P/2- O senhor já tinha andado de metrô antes?
R- Já, há muitos anos. Andei no metrô quando eu casei, em 71, fora do país. Mas eu tinha feito aqui, há muitos anos atrás, o trecho Aclimação-Largo São Bento, porque nós tínhamos reuniões no Colégio São Bento. Então muitas vezes eu ia de metrô.
P/2- Foi a primeira vez que o senhor andou?
R- Foi.
P/2- Como foi a experiência?
R- Eu achei ótimo. E achei o metrô, do ponto de vista qualitativo, até porque é mais novo, muito mais conservado e atualizado do que o metrô de outros países.
P/2- O pai do senhor... Só voltando um pouquinho porque a gente estava falando de transporte. Quando ele morava na Aclimação e dava aula na Liberdade, como ele fazia esse trajeto da casa dele até a escola?
R- O meu pai morou na Rua São Joaquim. Meu pai morou na Rua Bueno de Andrade e, da Bueno de Andrade foi morar na Rua Topázio. Ele morou desde 1942 até praticamente morrer, na Rua Topázio.
P/2- E ele dava aula lá?
R- Dava aula lá. Em cinquenta ele morava na Rua Topázio.
P/2- E esse trajeto o senhor sabe como ele fazia, até o Colégio?
R- Eu tenho a impressão que ele fazia a pé.
P/2- A pé?
R- Ele fazia a pé. Porque o primeiro carro dele, que ele comprou, foi em 1948. Usado. Ele só foi comprar um carro novo em 1952, depois que fechou o Anglo Latino. Ele ia a pé. Ele andava muito, ele gostava de andar. Praticamente, morreu andando no Parque, apesar de já estar enfartado. E há um detalhe que estão me colocando aqui e que eu já falei. Ele escreveu um livro. O metrô recebe constantemente os nossos alunos da Educação Infantil para fazer a visita ao metrô.
P/2- É o projeto Conheça o seu Metrô?
R- É.
P/2- Como é?
R- Dentro das atividades recreativas, esportivas e culturais, nós fazemos questão que o aluno, dentro do horário regular ou fora do horário regular, faça algumas atividades. Entre as atividades está a visita ao Museu, à Cidade da Criança, ao Parque do Gugu e etc. O metrô está incluído nas nossas atividades de todos os anos. Faz parte do projeto pedagógico da instituição, começando da Educação Infantil. E como um dos meios de transporte na cidade de São Paulo. Eu não fiz. Mas as minhas diretoras fizeram e estão muito contentes com o que viram até hoje.
R/2- É uma visita espetacular, o trabalho que eles fazem... Eles mostram para a criança toda a segurança do metrô, como que a criança deve andar no metrô, como é que deve ser, onde ela não pisa, como é a segurança para ela...
P/1- O pessoal do metrô faz toda...
R/2 - Faz todo um trabalho...
R- Todo o acompanhamento da visita. As visitas organizadas pela escola, com predominância nas faixas etárias mais baixas, são feitas por nós. Nós levamos, mas todo o atendimento é feito pela equipe de visitação do metrô, aborda a importância do metrô, aborda a própria segurança do metrô e como uma criança deve se portar não só na visita, mas também quando usa sozinho o metrô. Eis o que justifica a nossa conexão de transporte com o metrô.
R/2 - Para que ele serve, como ele surgiu...
R- É, e nesse momento a criança toma conhecimento da história do metrô, do surgimento do metrô, da construção do metrô e da própria expansão do metrô.
P/1- Olha que interessante!
R/2 - É muito. A visita é maravilhosa.
R- Eu acho o seguinte, a escola tem que ser completa. Acabou a ideia ou a perspectiva que uma instituição de ensino vai sobreviver com quadro negro e giz. Isso já era. E o apagador.
P/2- Como é que é a vida do senhor hoje em dia, o seu cotidiano?
R- A atividade de um diretor de escola é um pouco pesada, porque a maioria dos diretores de escola acumulam a função pedagógica com a função administrativa. Eu consegui, nesses últimos dez, quinze anos, delegar grande parte da parte pedagógica, porque eu estabeleci linhas do projeto e eu vou modernizando com a minha equipe. Quer dizer, apresentam propostas e a gente vai modernizando a parte pedagógica. E a gente acaba ficando mais com a parte administrativa. Mas a gente, sempre à distância, está acompanhando. Porque as pessoas não são perenes, as pessoas morrem. Nós tivemos agora, há um ano atrás, a perda de uma diretora que ficou conosco 38 anos. Eu não tenho nenhuma diretora aqui, salvo os novos diretores em fase de... Os chamados de experimentação ou de adaptação, que não tenha 38, quarenta anos de casa. E não são caquéticas, não.
R/2 - Eu tenho 44.
R- Ela está aqui há 44. A minha diretora do serviço de Orientação Educacional está conosco há 44 também. A diretora que saiu ficou comigo 38 anos, a que faleceu ficou comigo 38. E na verdade, eu não sei porquê. Talvez seja pelos meus maus tratos. Quem entra aqui não sai, só quando morre (risos). A minha encarregada da limpeza limpa a minha sala há quarenta anos. Nós destacamos muito isso porque isso demonstra que gosta da instituição. Porque ninguém gosta de ficar sofrendo, né?
R/2 - Na Educação Infantil, os professores...
R- A média são quinze anos.
R/2 - Quem tem menos anos de casa tem quinze anos.
R- Os nossos professores até a quarta série são formados por aqui. Nós temos um curso de formação do professor de nível um. E agora, a partir do ano de 99, nós temos o curso de Pedagogia, porque é obrigado a ter Pedagogia para poder lecionar. O governo deu cinco anos de prazo. Então eu tenho, mais ou menos, umas quinze professoras minhas normalistas que estão fazendo Pedagogia comigo para atender essa necessidade. Necessária do ponto de vista pedagógico, que eu não vou discutir os princípios dos direitos adquiridos. Na verdade, não existiria motivo para refazer isso, porque elas estão se sentindo preparadas para continuar fazendo o que estão fazendo. Mas o governo assim exigiu. Acho que exigiu para si mesmo, até para modernizar, adequar ou melhorar a capacitação dos professores na rede municipal e estadual em todo o país. Mas o nosso professor estuda aqui, o nosso futuro professor nasce do meu curso de Magistério. E o curso de Magistério é gratuito.
R/2 - A minha vice-diretora foi minha aluna no Jardim.
P/1- Como assim o Magistério é gratuito?
R- Na época do Ademar, nós começamos a sentir dificuldade na contratação de professores do Curso Normal. Chamava Normal, lembra disso? Ainda chama, né? Magistério, Formação de Professor de nível um. Para contratar professores de alto nível, nós acabamos montando o curso de Magistério. Naquela época, com o ato do Ademar de Barros... Porque quem autorizava era o governador. Começamos a ter o professor de nível um formado por aqui. Houve uma pequena parada, depois nós retomamos e mantemos até hoje. Nós formamos, mais ou menos, 25 a trinta professores todo ano, e sem pagar. A medida de ser sem pagar é de propósito. Porque se eu cobrar, poucos virão. E eu estou mais preocupado com a quantidade dos que eu formo do que com os aspectos pecuniários. Faz uma prova de seleção. Agora não muitos. Mas nas primeiras provas de seleção, há dez, quinze anos atrás, eu cheguei a ter mil inscritos para quarenta vagas.
P/2- Nossa! A quantidade também é difícil.
R- É, e hoje a gente tem menos de cem para tirar para quarenta, então eu reduzi para 25.
P/2- O senhor estava falando que separou a parte pedagógica da parte administrativa, né?
R- Isso. Então outras pessoas tiveram que ocupar esses espaços. Até por força do crescimento, até por força dos aspectos qualitativos. Porque a especificidade, hoje, em quase tudo, principalmente na Educação, acaba predominando. Nós temos uma diretora de ensino do Departamento Infantil, que é a professora Ana, temos uma diretora de Ensino Fundamental de primeira à quarta, uma de quinta à oitava e temos um diretor responsável pelo Ensino Médio. Em cima disso, tem uma diretoria de Serviço de Orientação Educacional que acompanha todo o processo pedagógico, principalmente o desenvolvimento dos alunos. E com esse desenvolvimento dos alunos, a gente acaba acompanhando e associando a administração dos departamentos e vinculando o rendimento do aluno à família. Nós temos que sensibilizar a família que, embora ausente, ela tem que estar presente. Se ela não está presente aqui, ela está presente em casa. Porque no momento em que a gente sente não tem a atividade presencial do pai em casa, à noite, no sábado e domingo... Isso tem que acontecer. A criança não pode ser educada sozinha, só sob o comando da escola. A gente insiste nisso e a estrutura fica cada vez mais sofisticada para suprir, em parte, a ausência da família.
R/2 - Diante de tudo isso, imagina como é que é o dia dele.
P/1- Nossa senhora!
R- E voltando para o problema da minha atividade, por força de eu ter ido para a vida sindical em 71, como vice-presidente do sindicato, e até hoje ocupando a diretoria da maior representação de ensino do país, que é a Confederação Nacional, eu tenho uma vida um tanto atribulada. Mas onde eu faltei, a minha mulher me substituiu e Deus ajudou a conduzir tudo isso de uma maneira equilibrada. Me sacrificando um pouco, mas valeu a pena até hoje.
P/1- E qual é seu grande sonho?
R- Se eu for ter que responder isso hoje, o meu grande desejo em primeiro lugar é ver que isso aqui continue. E continue nas mãos dos meus filhos. Se não for nas mãos deles, terá que ser na mão de alguém, porque eu entendo que o Colégio Anglo Latino, quando veio, veio para servir o bairro. Hoje, mais do que nunca, depois de 44 anos, ele está integrado ao bairro. Muita gente veio morar no bairro. Muita gente veio e matriculou os filhos aqui. Eu entendo que, embora a escola seja uma instituição de ensino de iniciativa privada como esta, ela tem mais uma função social do que uma função de rentabilidade. Porque a rentabilidade eu procurei acomodar da forma mais inteligente, modesta e à parte, dando um rendimento ao capital e não um rendimento à empresa. Até porque, por força de necessidade e para atender os menos favorecidos... Normalmente a mensalidade escolar aqui é uma das mais altas, mas nós temos um departamento com duas assistentes sociais que estão adequando a mensalidade ao orçamento da família. Isso vem desde o berçário até o Ensino Superior. Então o aluno paga o que pode, e não o que nós cobramos. Mas tem que provar, fazer prova de incapacidade parcial. Nada não existe, de graça só...
P/1- Não tem redução?
R- Tem muitas. O ano passado nós demos dois milhões e oitocentos mil reais em bolsas. Devemos manter o patamar um pouco maior esse, por força do crescimento do Ensino Superior. Na verdade, o que nós queremos é continuar servindo e dar bolsas no limite da capacidade da mantenedora. E mantemos ainda uma creche com 180 crianças aqui ao lado, que tem o nome do fundador Benjamim Arcuri há mais de cinco anos.
P/2- E essa creche atende crianças...
R- Atende crianças carentes do bairro ou adjacências. Alguns funcionários nossos têm filhos lá, mas são muito poucos. Serventes, porteiros, vigias.
P/2- Está certo. A gente está já encaminhando para o final. Tem alguma outra questão que o senhor gostaria de levantar?
R- Eu fico feliz de poder ter tido a oportunidade de colocar essas coisas, porque a memória é fraca e, na verdade, acaba ficando aquilo que a memória permitiu que ficasse no papel. Eu acho que o trabalho de vocês vale a pena. A gente tem que elogiar a iniciativa do próprio metrô em registrar essas partes da história da cidade de São Paulo, vinculadas ao metrô ou não. Eu acho que isso vale a pena e isso deve ficar... E no momento que eu estou apresentando para vocês um dossiê do antigo Anglo Latino de 1873, que foi quando ele foi fundado para atender à demanda dos alunos da colônia portuguesa, ligadas à maçonaria portuguesa, eu acho que isso valeu a pena. Embora houvesse uma interrupção pequena na década de cinquenta, o Anglo Latino, com certeza, prestou relevantes serviços à Educação nesse país. Ainda esta semana, eu tive o prazer de tomar conhecimento que o nosso responsável pela campanha indígena, o Villas Bôas... Como é o nome dele?
P/1- Orlando.
R- O Orlando Villas Bôas foi aluno do Anglo Latino na Avenida Paulista. E vou lhe contar mais uma, junto ao Anglo Latino, um pouco depois, na Avenida Paulista, a senhora vai lembrar, havia um colégio chamado Colégio Panamericano. A secretária daquele colégio foi ser secretária do Colégio Bandeirantes, veio para cá há uns trinta anos e, até o ano passado, foi minha secretária geral. Está com 99 anos, praticamente lúcida.
P/2- Bom, nós só temos a agradecer.
R- Não, eu que agradeço essa oportunidade em dizer que isso vale a pena. Porque a gente registra as atividades de muitas pessoas e fica fazendo parte da História.
P/2- Está jóia.
P/1- Exatamente. Muito obrigado.
R- Eu é que agradeço a oportunidade.
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