Depoimento de Ailton Brasiliense Pires
Entrevistado por Lúcia Pedrosa e Mônica Braga
São Paulo 15 de junho de 2018
Entrevista nº MET_HV011
Realização: Museu da Pessoa
P/1 - Bom, boa tarde, é um prazer estar aqui entrevistando o senhor. Nós vamos começar falando um pouquinho da identificação e alguns fatos relacionados à sua história de vida, família, infância, juventude. Então, a primeira coisa, eu gostaria que o senhor me dissesse o seu nome completo, data e local de nascimento.
R - Ailton Brasiliense Pinto, eu nasci em São Paulo, no dia 02 de agosto de 1946, na maternidade do Brás.
P/1 - Na maternidade do Brás. Muito bem. Eu gostaria de saber um pouco da origem da sua família, já me chamou atenção o nome, Brasiliense, já fiquei tentando saber que história tem por trás desse nome. Então, gostaria que o senhor falasse um pouco dos seus avós maternos, paternos, o nome do seu pai, da sua mãe, se o senhor sabe como eles se conheceram, então, contasse um pouquinho da origem da sua família.
R - Os meus quatro avós eram portugueses, minha mãe era portuguesa e meu pai era paulistano. Meu avô veio para o Brasil, o paterno, em 1900, meu avô materno em 1902. Meu pai nasceu em 1906, também em São Paulo. Minha mãe nasceu em Figueira da Foz, Portugal, ela veio para o Brasil em 1912, ela já veio órfão, a mãe morreu em Portugal. Como é que eles se conheceram? Eles eram vizinhos, meu avô um português normal, proibia minha mãe de namorar antes dos 20 anos, critérios portugueses. Então, ele ficava no portão da frente tomando conta da casa, esqueceu que meu pai e minha eram vizinhos, então eles iam lá no fundo do quintal, muro baixo, fácil. Um dos dois avós que eu tenho tem muito a ver com a história que eu acabei passando depois, e são bem diferentes, meu avô materno era analfabeto, trabalhou como assentador de trilhos na São Paulo (Reigory) [00:02:46], que é precursor na CPTN. Meu avô paterno ele falava cinco línguas, ele morava no Brás, lugar que só tinha italiano, tinha muitos amigos espanhóis, por razões muito cumpridas ele sabia inglês e francês decorrentemente. E esse meu avô era extremamente prático. E por que eu estou falando isso? Porque ele foi um dos primeiros pilotos da força pública aqui em São Paulo, e por conta disso ele conseguiu cair três vezes ali, na última vez era uma hélice, devia ter um metro, mais ou menos, essa hélice ficou na minha casa acho que uns 20 anos e depois passou para uns tios etc. e tal. E o meu pai, o meu avô foi da força pública e o meu pai também, os dois participaram da Revolução que teve em São Paulo em 1924, que nem o livro de história conta, as nossas histórias são parcialmente contadas. E em 1932 os dois estão na Revolução constitucionalista de São Paulo, em 32 meu avô era piloto, ele pousou perto de Pindamonhangaba e foram almoçar, foram almoçar e vinha um voo provavelmente do Governo Federal, rasante, com uma metralhadora, e deve ter sido o primeiro cara morto no mundo por ataque aéreo, a bala pegou bem no centro da cabeça dela. Isso foi em 32, e, 63 nós fomos exumar o corpo e levar para o mausoléu que tem aqui no Ibirapuera, acharam um crânio praticamente inteiro parece que alguém pegou uma broca, fez um furinho, a história do meu avô é rica de acontecimentos. E muita coisa que eu aprendi sobre São Paulo, sobre os seios também de transporte e de eletricidade, que no fundo acabei me formando nisso. Tem a ver com a história do meu pai, o meu avô eu não conhecia, aliás, nenhum dos dois eu conhecia, mas as histórias do meu pai vieram, por uma coincidência eu morei em uma rua em que a pessoa em frente virou meu padrinho que trabalhava na Light. Então, a minha história ela vai convergindo em termos de história de avô, de pai, do outro avô, do vizinho de frente, e acabei entrando na Light, e acabei entrando no metrô. Então, umas coisas assim meio que são interessantes, que foram marcantes para as minhas escolhas futuras. O que mais depois disso? Bom, eu fiz o primeiro em uma escola católica, os dois primeiros anos, a partir do terceiro em escola pública, até o colégio. Estudei no ginásio que se chama Ginásio Estadual, que depois viril Colégio Estadual Frei Paulo Lins, que fica ali no (Parim) [00:05:52], depois o Colégio Estadual Dr. Otavio Mendes de Santana, onde eu terminei o colégio. Nesse período todo eu conheci a Sirinha, nós namoramos e estamos casados há 46 anos. Temos dois filhos, uma menina que é Odontóloga, Patrícia, um garoto que é Advogado, Maurício. Nos damos relativamente bem, nos tempos de hoje é razoável. Bom, me formei em Engenheiro Eletricista, e no meio do caminho, eu não tenho curso, eu fiz faculdade em uma escola paga, cara, escola de engenharia em Mauá, grande parte do pessoal da década de 70 é tudo Mauá, o Décio, por exemplo, lá da operação, o Nivaldo que já saiu, nós entramos acho que quatro ou cinco aqui no metrô. E quando eu estava em 1967, eu estava no primeiro ano, não tinha Professor de matemática, física, química e biologia no curso médio, então os diretores tinham um problema sério, e arrumavam Professor de qualquer jeito. Quando chegou em 1970 o MEC criou, para que já tinha no mínimo o terceiro ano de engenharia, um curso complementar de matemática, onde você só faria as matérias pedagógicas. Fizeram uma experiência em 70, eu fui o segundo grupo junto com os companheiros, eu me formei em 71 em Itajubá. Em Itajubá tem uma vantagem, a gente viajava na sexta à tarde, em Itajubá é relativamente perto, são três horas, a aula começava às 19:00 da noite e ia até meia noite, e no dia seguinte das 07:30 às 17:30 com uma hora de almoço. E por que foi em Itajubá? Porque tinha o apoio da Escola Federal de Engenharia de Itajubá de um lado, tinha uma fábrica de Filosofia lá, e ficava mais ou menos no centro de São Paulo, Rio e Belo Horizonte, que eram as três cidades quando tinham as maiores carências nessas matérias, então existia um curso para biologia, um para física e tal. E nós formamos lá, mas obviamente não conseguimos perder nada da engenharia, formei em 71 em matemática, em 72 na engenharia eletrotécnica. E por conta das convergências fui trabalhar lá na Light, é claro. Boa parte da história da Light eu já ouvia na minha casa, das minhas tias, meus tios, primos, meu pai principalmente. E a história da Light e a história de São Paulo tem muita convergência, muita mesmo. A Light entrou em São Paulo em 1900, São Paulo tinha 200 e poucos mil habitantes. Quando a Light saiu em 47 já tinha 2 milhões, ou seja, em 42 anos a população multiplicou por dez. E ela foi uma empresa contratada para prestar uma série de serviços, os principais são transporte e energia elétrica. Então, você se imagina na pele de um empresário canadense, capitalista, tendo uma cidade de 200 mil habitantes crescendo 6, 7, 8% ao ano, ou seja, a tua demanda crescia tudo isso. E você tinha a oportunidade de propor para a Prefeitura fazer um loteamento aqui, outro aqui e outro lá, de tal forma que você utilizasse o seu transporte e tua eletricidade. Então, a Light deve ter ganho muito dinheiro, acho que poucos negócios no mundo foram melhores do que esse, não foi só aqui, é lógico, essa lógica aqui construiu as cidades no mundo, inclusive as americanas até a década de 20, na década de 20 nos Estados Unidos tem uma história que vocês conhecem, o Henry Ford, ele fez uma fábrica para fazer não sei quantos automóveis e fechou a fábrica, ele esqueceu que o cara envelhece. E só que a população, a urbanização americana era igual a nossa, igual europeias, cidades hiperdensas. E aí em uma cidade hiperdensa você vai a pé, andando, você vai a pé, e os carros, eles vendiam carros para classe altíssima, carro não era barato, se bem que ele fez o carro relativamente barato. Mas aí tinham outras indústrias que precisava que o país explodisse, estou falando dos Estados Unidos, principalmente na construção civil, inclusive tem uma tese de um Professor americano, que inclusive tem isso lá no metrô e na NTB também, que é porque o Estados Unidos explodiu, ou seja, porque ele era um país de densidades densas, porque ele explodiu, e mesmo porque a pessoa da engenharia civil precisava fazer estrada, precisava fazer ponte, precisava fazer viaduto. Se fizesse tudo isso a indústria de petróleo, a indústria de carro agora, poderia começar a vender carro porque o carro começava meio longe, e começava lá meio longe e precisava do carro, e o carro precisava de petróleo. Então, se somou à necessidade da construção civil, do uso do carro, do petróleo, essa soma, e eles tiveram uma ideia brilhante, porque as pessoas tinham que perceber isso, e as pessoas não percebem, as pessoas têm esse defeito. Então, chamaram uma tal de Hollywood, e fizeram dezenas, centenas, milhares de filmes mostrando como era bom morar na casa que você no caso tinha o quarto próprio, porque que nem que moravam os casais com seis, sete, oito filhos, mais o cunhadinho, mais a sogra, mais não sei quem, todo mundo em um apartamento de 60, 80 metros quadrados. A palavra chamada privacidade, como é que tem privacidade com 15 morando em 60 metros quadrados? Isso foi injetado na classe média americana, você comprava a casa e o carro com juros de 1% ao ano, só não dava de graça porque você tinha que pagar alguma coisa. Então, o Estado Americano fazia isso. As cidades europeias investem, porém eles não conseguiram segurar depois da Segunda Guerra, e resolvemos seguir o modelo americano, que não é o nosso modelo, nosso modelo é o europeu, cidade densa. Meu pai e minha mãe nunca usaram transporte público para trabalhar, eles iam a pé, no máximo meia hora eles chegavam aonde tinha que chegar, meu pai no quartel e minha mãe era tecelã de seda, uma curiosidade, teoricamente era para ela ter ficado cega, trabalhando com seda, nada, com 99 anos ela pegava uma agulha e uma linha e costurava. Acho que minha mãe não sabia que ia ficar cega, falta de conhecimento. Mas isso foi um modelo americano que depois nós incorporamos com casca e tudo aqui, e a Light ajudou a segurar isso, a Light ganhou dinheiro vendendo transporte, vendendo eletricidade e vendendo terras, nosso Pacaembu, da região central, a Lapa. A Light vendeu, construiu a cidade vendendo terra, comprava lote no mato, loteava e colocava uma linha de ponte. Os empresários, outros começaram a ver que o bonde é legal, mas se você tivesse um caminhão ou um ônibus também era, que você também podia comprar um loteamento não sei aonde, fazer uma linha, entre aspas. Então, São Paulo que era um ovinho, em 1900 São Paulo toda cabia em 40 quilômetros quadrados, mais ou menos, que é um quadrado seis por seis, por isso que dava para ir a pé em qualquer lugar. Em 1950 já era um quadrado grande, já chegava a quase 200 quilômetros quadrados, e tinha 2,5 milhões de pessoas, São Paulo tinha explodido, e aí os empresários se associaram, inclusive empresários de terra, com a Light até, onde foi interessante, e eles construíram uma cidade que interessava para eles, jamais se interessava para o usuário, que somos todos nós. E essa é uma história de que pela NTP, a gente fez um estudo, tarifa de 1950 trazendo para aqueles fatores de economia, custaria em São Paulo 1,90, se a gente tivesse construído o resto da cidade em cima dos eixos do transporte público, coisa que a princípio foi essa lógica do metrô depois. (inint) [00:14:30] desmontou os bondes e disse: “Não, melhor do meu bonde, agora só vai ter metrô”, só não disse quando. Se tivesse implantado a rede básica, dez anos, ou o que fosse, São Paulo teria uma outra ordenação, outros tempos de viagem, outros custos, provavelmente esse subsídio enorme que a Prefeitura gasta lá, e o Estado gasta aqui, provavelmente seriam dispensáveis.
P/1 - Vamos voltar um pouquinho na sua família, o senhor falou um pouco da sua mãe, o senhor tinha irmãos?
R - Tinha um irmão, meu irmão era um Engenheiro nato, mas detestava matemática, logo não se formou em engenharia. Esse cara com 14 anos ele fez um barco, vocês estão pensando que ele fez uma jangada, ele fez um barco à vela, remo e tudo mais, claro, que eu também não vi, ele era 14 anos mais velho que eu, tanto que eu enchia o saco dele, chamava ele de tio, claro, 14 anos mais velho. Então, ou seja, esse barco, por causa das histórias e pela foto. Um dia meu pai voltando como sócio do Tietê, então foi um monte de gente levar o barco, uns cento e poucos metros do rio, lá foi ele remando e tal, o barco ficou lá. Eu fui sócio em 78, só tinha uma plaquinha, de que aquele barco meu irmão tinha doado para o Tietê, mas só tinha a plaquinha, o barco evidentemente tinha a minha idade, 46, não era possível que ele tivesse vivo. Mas várias pessoas doaram barcos e tal, ele foi um deles. O que mais? Eu pulei aí?
P/1 - Tem mais alguém, só ele de irmão?
P/2 - Só tem um irmão?
R - Só um.
P/1 - Então, eu já vi que o seu irmão já tinha um talento aí especial, porque criar um barco, desenvolver, construir, não é uma coisa...
R - Ele fez o projeto sozinho com 14 anos de idade.
P/1 - Isso. O senhor teve esse talento também assim, nessa época da vida?
R - Não, na divisão ele ficou com tudo, ele dividiu antes, na fase anterior, era o mais velho, isso aqui é meu, eu fiquei com a qualidade de entender matemática. Foi uma divisão razoável.
P/1 - O senhor foi um bom aluno?
R - Fui, tanto que eu fiz matemática e engenharia, mas inclusive eu montei um cursinho uma época, por conta da faculdade, para as pessoas entenderem matemática, porque a matemática a princípio ela é muito abstrata. Então, para uma criança tem que ser alguma coisa concreta, com bolinha, com pedrinha e tal. Acho que ajudei muita gente a entender a matemática elementar que é a base de tudo, se você não entende aquela coisa elementar lá de baixo, como é que soma, subtrai, multiplica, divide etc., porque esse exercício utiliza você pensar abstratamente, e imaginar triângulos, circunstância e coisa, que é aparentemente simples, mas não é, para quem não tem uma visão matemática um pouquinho mais trabalhada. Então, como fiz matemática, acabei trabalhando uns anos poucos, dando aula de matemática e física, naquela lógica que eu falei agora pouco, e mantemos a mesma classe do segundo colégio, que na época tinha científico clássico. E tinha uma menina que falou: “Eu vou mudar de classe, eu vou para o clássico, porque eu não entendo nada de matemática”. Poxa vida, me diga uma coisa, o nome dela era Angélica, ela era negra, falei: “Faz o seguinte, fica um mês comigo aqui no científico”. “Mas imagina”. “Tenta. Faz o seguinte, você assiste a aula, traz um caderno, e damos exercícios, e você vê se entende”. Se formou em matemática, não mudou para o clássico, terminou o científico, e fez matemática, um dos meus orgulhos é a Angélica, em termos de aluno. Bom, aí tinha parado na relação aí da Light com a cidade.
P/2 - E o seu trabalho ali?
R - Sim.
P/2 - A sua função ali?
R - De contar história, e você ir e voltar.
P/1 - Sim.
R - Porque quando eu fui para lá eu já sabia muito bem a importância da Light na cidade, na construção e tal. E uma coisa que eu achei interessante foi o primeiro dia da Light, foi no dia 09 de janeiro de 73, nós éramos uns dez Engenheiros novos, entramos em uma sala, entrou um canadense 1,70 metro de altura, 1,90 metro de largura, o (Dr. Arthur Coen) [00:19:00], vocês não vão ter aula não, vocês vão ter uma palestra do Dr. Coen. Assim: “Bom, nós vamos falar durante duas horas”. Tudo bem, ele era o Diretor na sala naquele tempo. “Então, vamos começar”, naquela época não tinha essas transparências, era tudo covalente. “Então, vamos conhecer o plano vinternal da Light”. Vinternal? Pelo amor de Deus, estamos em 73. Ele falou dez minutos sobre quais eram os planos dos próximos 20 anos que a Light estava imaginando para São Paulo. Aí os dez anos seguinte falou: “agora vamos para o plano decenal”. “Está bom”. Aí falou mais ainda: “Aí vamos para o plano quinquenal”. Ele foi lá em baixo. “E agora nessa próxima hora nós vamos falar sobre o plano anual, o que é que nós vamos fazer esse ano”. Eu achei interessante, porque alguns dos meus colegas que estavam ali não tinha a menor ideia do que era a (o rio da Light) [00:19:58] e coisa do tipo, a gente sabia o curso, eletricidade, mas o que era a Light, o que ela fazia efetivamente, que ela pretendia fazer. Ele contou meia hora a história da Light, que a (inint) [00:20:08] já conhecia quase tudo, como é que ela começou, as primeiras unidades que ele fez, que ela construiu e tal. Contou o lado bom é claro, a empresa não diz, tem que contar o lado bom. Se os governantes que a gente teve não fossem o que eram, a cidade teria aproveitado muito mais, lamentavelmente nós temos uma classe política calhorda, além de corrupta. Então, a Light fez muita coisa do que ela quis. E tem um pedaço que precisa contar que é o seguinte, vocês de 29, deu uma enchente braba, (inint) [00:20:43] foi em 29. Então eles estavam tentando construir uma barragem elevatória que tem aqui no Rio Pinheiros, então eles acertaram com a Prefeitura que até onde inundasse, como poderia repetir os (outros anos) [00:20:55] seria o terreno da Light. Legal, é assim que termina. Vai plantar batata. A Light ficou uma latifundiária da cidade, coisas que contando em detalhe é uma coisa pavorosa. Bom, eu tenho uma outra ideia de coisas que aconteceram, de 1909 a 1930 a Light ganhou tanto dinheiro que a tarifa não subiu, e um detalhe, ela entrou em 1900, em 1917 ela já tinha implantado 220 quilômetros de trilhos. Tem ideia o que é isso?
P/2 - E o senhor foi contratado quando?
R - Em 72.
P/2 - E qual a função que você assumiu lá na Light?
R - Eu era Engenheiro Eletricista Júnior, essas coisas, mas deixa contar esse pedacinho da Light que é interessante. Aí teve uma guerra mundial, foi um impacto financeiro no mundo todo, menos para a Light, outro detalhe interessante. Ela só não voltou a aumentar quando teve a crise de 29, que foi aquele quebra geral que aconteceu nos Estados Unidos e espalhou para tudo quanto é lado. Mas ela conseguiu segurar a tarifa só por 21 anos, em uma cidade que ela começou com 200 mil e quando chegou em 1930 ela já tinha 800 mil, para você vê que nem precisava, ela estava vendendo energia elétrica pelo preço que ela queria, transporte aonde ela queria colocar, do jeito que ela queria. Ou seja, ela trabalhava os custos à vontade. Quer dizer, se a Prefeitura tivesse pessoas que discutissem melhor a contrapartida, eles fizeram uma proposta de construir o metrô na década de 27, e eles tinham tanta certeza que iam construir o metrô que eles começaram a comprar terra, um metrô subterrâneo na área central. E como eles lançaram, os governadores resolveram tirar casquinhas, e foi tanto que eles insistiam, para você ter uma ideia, o negócio era ótimo, fazer metrô, mas os governadores estão tão longe nas suas pretensões que eles preferiam desistir, e aí resolveram então entregar o serviço. A Prefeitura não tinha a menor condição de receber, acabou acontecendo depois da Segunda Guerra Mundial em 47.
P/1 - O senhor começou a trabalhar com que idade?
R - Na Light em 73.
P/1 - Ela é o primeiro emprego?
R - Como Engenheiro sim. Eu dei aula, bom, eu entrei na faculdade sem trabalhar, mas quando entrei na faculdade paga eu tive que montar curso para dar aula à noite, em casa.
P/1 - E aí tinha que idade nessa época?
R - 20 anos, 19.
P/1 - 20 anos. Então, a primeira fase foi lecionando?
R - Na primeira fase o papai bancou as despesas.
P/1 - Bancou e lecionava?
R - Não, deu para pagar a escola, só que é uma loucura, eu não tinha carro, a escola fica em São Caetano.
P/1 - E como foi esse encaminhamento aí para a área de transporte, para os trilhos, como que começou?
R - Olha, eu tinha tanta história de transporte de bonde, eu devo ter uns 20 livros da minha história de transporte em São Paulo, em casa, eu falo só da época do metrô, ano passado eu doei, retrasado, mais de 500 livros para o metrô, pelos uns 50 é só de transporte, não só do Brasil, de fora e tal. Então, eu gostava da parte elétrica, a elétrica da Light é uma coisa e a elétrica do metrô é uma outra coisa. A Light era uma empresa que prestava serviço para a cidade de São Paulo e a cidade do Rio, um pouquinho do Vale do Paraíba, mas ela trabalhava no sistema interligado do Brasil. Então, inclusive Paulo Afonso vende energia elétrica para São Paulo, eles ficam no Sul, é um sistema que ele se balanceia, basta ter linhas de transmissão, tem toda uma cumplicidade aí. Quando o Brasil começou a fazer Itaipu e eu ainda estava na Light, a gente começou a estudar os problemas da Itaipu, que era um projeto muito diferente de todos que já haviam sido feitos no Estado de São Paulo, o Estado de São Paulo tinha várias barragens aí no Rio Tietê, que a gente estudou, mas Itaipu exigiu um trabalho adicional, esse é lado legal da Engenharia Elétrica. E o outro lado foi a questão do transporte, que interessava muito nessa relação do transporte com a parte urbana, que depois mais tarde no (ITP) [00:25:31] eu trabalho bastante isso aí, inclusive tem lá na ITP alguns trabalhos que como mostrar a relação do aumento dos custos do transporte em função do desenho da cidade, (inint) [00:25:45] a gente mantida a lógica de concentração de cidade, concentração não é um prédio um do lado do outro não, (inint) [00:25:54], passaram, estava em transição, (inint) [00:25:57], dava para fazer tudo muito melhor do que foi feito, o que fizeram foi uma barbaridade. E isso tem a ver com a qualidade de vida que você dá para a cidade, nos tempos de viagem estão amarrados nisso, o nível de conforto que você dá. Qual é o grande diferencial do metrô entre outras coisas? É o nível de conforto. Hoje nós temos linhas carregadas porque nós temos uma rede básica atrasada, aos 50 anos nós deveríamos ter no mínimo 100 quilômetros a mais para o metrô, e precisa lembrar que na cidade não tem só metrô, tem a CPTM que chegou aqui muito antes, os trilhos da CPTM, que não eram da CPTM, eram de São Paulo ele, passaram por aqui em 1867, fazem 151 anos, São Paulo já existia, mas as cidades que apareceram (inint) [00:26:45], os bairros que apareceram em São Paulo foram por conta disso. Então, hoje se você pensar, você tem na cidade, o metrô tem praticamente 90 quilômetros, a CPTM tem 130 na cidade, mais 130 fora, são 220 quilômetros de trilhos de uma cidade que não é pouca coisa. Se os prefeitos, esses queridos seres que a gente elege, tivessem enxergado a importância e a capacidade que tem o sistema de trilhos, o sistema de trilhos pode levar 60 mil pessoas para lá e para 60 mil para cá em 11 metros de largura. Quer dizer, não dá para ser em menos. Ou seja, você podia ter adensado todo o trecho do metrô da CPTM se tivesse colocado 500 metros de cada lado, que não é nada, você teria em São Paulo 220 quilômetros quadrados, que é um sétimo da cidade toda, a cidade teria uma outra governação, e eu estou só nesse pedacinho, eu não estou falando do outro pedaço que o metrô devia ter feito, são no mínimo mais 90, portanto, seria mais 180, o que daria 400 quilômetros quadrados, que é 20%. Nenhuma cidade do mundo tem 20%, nós deixamos de ter por falta de visão, entre aspas, de pessoas, que deveriam ser estadistas e foram meros ocupantes de cargos de Prefeito, Governador, Deputado, Governador, a mediocridade política que a gente tem no país.
P/1 - Mas eu queria que você falasse um pouquinho da sua pontuação como profissional nessas empresas, o que o senhor fazia, como foi o seu desenvolvimento?
R - São dois campos bem diferentes, na Light especificamente Engenheiro Eletricista, o último projeto que eu fiz na Light, quando você vem na Dutra e entra na Fernão Dias, tem uma estação transformadora ali, aquele projeto foi eu que comecei, eu não acompanhei a implantação, a gente recebe 88 quilovolts, rebaixa para 22 e depois faz a divisão toda. Esse aí foi um dos que eu acho mais bacana, porque eu peguei desde o comecinho até o começo da obra, depois parou um pouco e não deu para fazer. Então, era um Engenheiro Eletricista puro de cálculo e tal. Nós tínhamos, como a gente tinha uma rede interligada, a gente tem uma rende interligada, não precisava fazer algumas simulações, as mais importantes são curtos-circuitos que acontecem, e nós tínhamos um computador na década de 70, e um metro de aparelho para cá e depois e você mais cinco metros para lá, era analógico, então você pegava (inint) [00:29:20] calculando e tal, fazia a simulação, deu errado, abriu um capacitor aqui, caiu uma linha lá, caiu uma árvore não sei aonde, o Engenheiro faz tudo isso aí. Aqui 30 anos, aí fui para o metrô, a capacidade do metrô que ele queria de computador era a capacidade era K, hoje é Giga, já está passando. Então, a evolução foi desse tamanho. Quando eu fui para o metrô, aliás, deixa eu contar como é que eu fui para o metrô que é interessante. Em 74 eu comecei a fazer mestrado na POLI, mas um custo especial de sobretensões, um problema sério que a gente tem no sistema elétrico, quando cai um raio em uma linha ou tem uma manobra indevida, aquela tensão dá um pulo e nesse pulo queima tudo quanto é coisa. Então, você tem que ter um sistema de proteção que permita agir antes de queimar tudo, como a gente tem em casa aquele fusível, sabe aquele pequenininho, que ele queima preserva a televisão, a geladeira e tal. E quando eu estava na Light, bom, eu ia para o último ano lá do Professor Roba, aí o Décio, que estava trabalhado na operação e falou: “Caramba, vem para cá, montou uma empresa nova e tal”. Aí, poxa vida, mexer com transporte deve ser legal. Só que eu estava terminando um trabalho na Light, mas eu não queria largar, então fiquei enrolando no metrô de março até junho para entrar, para poder terminar o trabalho na Light, e tem coisa que você começa desde o comecinho, pelo menos, até a hora que ele está encaminhado. E essa estação do transformador que está lá na Fernão Dias foi esse caso que eu era para ter entrado em setembro, era na verdade, para ter entrado em setembro de 74, mas eu estava terminando a parte de mestrado, e foi bom, só que terça e quinta precisa ser 16:30 porque a aula começava na POLI às 17:00, naquela época dava para sair da Xavier Toledo e chegar na cidade universitária em meia hora, hoje esquece, hoje só dá para usar o metrô. Mas eu precisava dessa aula. Aí o Décio falou: “Mas não vai dar, estou em um sufoco aqui, não saio antes das 19:00”. “Então, esquece, eu não vou, eu não vou largar o curso agora, já tinha o trabalho que eu estava fazendo na Light”. Aí abri mão, vim entrar na operação, era o Décio, o Celso Giosa, quem mais estava naquela época, o Espósito, que era o gerente, chefe do departamento, o André e tal. Aí quando chegou em março o Décio falou de novo: “Olha, aquela vaga da operação já foi, agora é planejamento”. “Mas planejamento, poxa?”. “Mas está explodindo tudo, vai inaugurar Santana e tal”. Aí eu estava pensando, mas eu quis terminar meu trabalho na Light, e aí vim trabalhar no metrô. Mas o legal, uma das coisas do metrô foi o primeiro dia, foi muito marcante porque eu conheci um cara que virou meu amigo, casos da vida, esse tal de Plínio Asma. E foi legal porque eu lembro do primeiro dia que eu entrei na Light, o Dr. Artur Koi explicou os 20 anos. Então, de novo: “Precisamos fazer uma apresentação cumprida”. Falei, quem será essa tal aí, era um cara magrinho, careca, falando pelos cotovelos, eu não sei se vocês notaram que ele fala pelos cotovelos. E começou na mesma parte do Artur Koi e tal, mas só que ele parou e falou: “Não, mas agora nós estamos em junho, daqui três meses nós vamos inaugurar, o trem vai chegar em Santana”. Eu notei no primeiro dia que eu estava na rua Augusta, onde eu estou hoje, um papel na parede falando assim: “Objetivos gerais da companhia. Um - Inaugurar o trecho de Jabaquara/Santana em 26 de setembro de 1975”. Tudo bem. Aí o Plínio foi lá, fez toda a explicação, falei, caramba, daqui três seis meses, coincidentemente estava o metrô. Aí ele terminou e falou assim: “Bom, quem é do planejamento de projeto, agora vocês vão fazer uma visita à obra com Antônio Arnaldo”, o Antônio Arnaldo que era o Engenheiro do planejamento, legal, até aí tudo bem. Falou: “Então, vamos para a obra, cada um pega um capacete e vamos”. Legal. E vamos como? Nós saímos da Rua Augusta, e passamos até a estação da Sé a pé.
P/1 - Não tinha metrô.
R - Não tinha ônibus, não tinha nada.
P/2 - Mas não tinha UBER.
R - Tinha ônibus basculante, caminhão basculante, e no caminho ele falando, não para. (inint) [00:34:08], não tinha praticamente nada, tanto que (que a CEF) [00:34:12] foi inaugurada em fevereiro de 78, mas daí nós entramos em um túnel perto de São Bento e fomos a pé de São Bento até Santana, chegamos às 20:00 da noite. Lá nós comemos um lanche, cada buraco ele gritava: “Vamos subir e vamos ver a sala técnica”, material jogado para tudo quanto é lado. “Isso aqui não vai inaugurar nunca, nunca, coisa de maluco”. Bom, e aí fui trabalhar no planejamento e a minha atividade como a de outros, era ver, você pegar o cronograma do metrô, que centenas de atividades sendo executadas simultaneamente, e você tinha que saber cada passo, aquele conjunto de ações que tinha que convergir para cá, que se não acontecesse, eles que estão indo para lá. Então, no alerta de um certo ritmo, mas estava pensando, não, o metrô é um inferno, pelo amor de Deus, uma piração. Tanto que faltando uma semana, estava com dois ou três caras que eram mais velhos, eu falei: “Isso aqui não vai inaugurar”. Porque aí depois fica sabendo, no primeiro dia eu achava que não ia, mas eu não sabia os detalhes, nas semanas eu já sabia um monte de detalhes que não ia funcionar. Ele falando: “Não, vai”. Aí estava trabalhando 24 horas por dia já há algum tempo. E inaugurou, uma sexta-feira, dia 26 de setembro, das 06:30 às 20:30, não operou sábado e domingo, eu passei os últimos cinco dias, me lembro que o trecho de Jabaquara/Liberdade já estava operando. Mas acho que as últimas duas semanas, nem ia mais para a Augusta, já ficava direto na estação Santana, ia a pé até São Bento no mínimo, voltava, porque o trem passava pela SEP, tinha feita uma casca para o trem passar, estava preservando só a faixa de pedestre.
P/1 - Depois acostumou a fazer esse trajeto a pé?
R - Sim, aliás, eu emagreci uns dois ou três quilos, porque andava que nem louco aquele negócio. E juntando as histórias lá do meu avô, do meu pai, a importância do simpático transporte com a cidade, quando inaugurou o metrô, havia uma euforia, vamos dizer assim, uma satisfação nas pessoas, do tipo, finalmente, mas olha, havia um orgulho das pessoas, os funcionários tudo bem, mas os usuários, (inint) [00:36:50] uma vez, um senhorinha que estava vindo com uma sacolinha, sapato sujo para caramba, não sei de onde ela vinha, estava indo lá para o lado do metrô, tirou o sapato, pegou um outro sapato, colocou no chão, pegou aqueles que estavam sujos e colocou dentro da sacola e entrou no metrô. Quer dizer, a imagem que a empresa deu para as pessoas, e o Plínio cismou que não podia fumar no metrô, que nenhum metrô do mundo é possível, falou assim: “Não, não pode fumar”, que é um inferno, claro que acaba fumando. Os outros falando: “Não, amigo, pode fumar aqui”. As pessoas aqui, falando na minha cara: “Olha, aqui não fuma”. E várias pessoas assim. E o agressor não se sentia, sei lá, intimado, olha, ele reconhecia que ele estava errado, ele estava no ambiente errado. Foi construído um ambiente no metrô. Então, mas isso aí era impossível segurar, claro que é impossível segurar. Mas você pegar os usuários dos últimos que estão aí há 20 anos, você ainda carrega um pouquinho. Quem andou no metrô 30, 40 anos, você vai ver, você está em uma plataforma, você vê quem nada no metrô mais tempo, quem nada mais tempo, você não vê um cara desses segurar a porta, ele para na faixa amarela, olha, a luzinha ascendeu e vai, a luzinha não ascendeu ele para. A molecada não, vai. Outro dia derrubaram uma senhora tentando entrar com a porta aberta e estava fechando. Então, o metrô ele construiu uma imagem e o respeito que foi um dos motivos pelos quais se passou a ser mais crítica com o sistema de ônibus e com os trens. Depois eu tive a oportunidade de em 94, ficar um ano na CPTM, ela era privada, ela foi federalizada, e depois foi abandonada pelo Governo Federal, e o Governo do Estado estadualizou, meados de segundo semestre de 92, eu fui até na inauguração que foi na Luz. Em 94, o Frederico Businger, que deve estar na lista de vocês, foi Diretor de Operações do metrô, sabotou esse cara, a palestra era dez horas, que o cara fala sem parar, acho pelo menos umas dez horas, depois vocês vão conseguir fazer até uma pergunta, põe aí, Frederico Businger, esse cara.
P/1 - Já anotei.
R - Fiz Diretor de Operações, tem uma história, porque ele virou diretor também, porque ele não era, ele era um peão, entre aspas, peão, sei lá, um alista pleno, e virou Diretor, não sei nem como esse cara virou diretor, também é uma história política muito legal. Mas geralmente entrou em 94, o Fred virou Presidente da CPTM, o Plínio virou Diretor de Plataforma, eu virei Superintendente de Planejamento. Nenhum trem andava com as portas fechadas, nenhum, você tinha gente pendurado do lado de fora, os muros das estações quebradas, as pessoas não pagavam, elas iam pela via e subia na plataforma, um negócio assim, caramba, quem viu o metrô, agora, isso aqui é brincadeira, é um dia no inferno, imagina. Nós fomos em vários do metrô para lá, e inclusive em junho o Governo estava pleiteando o financiamento do Banco Mundial, e lá pelas tantas a negociação parou, então nós fomos em três pessoas para lá, fui eu, Lavorente, que está até hoje, o José Luís Lavorente, até hoje ele está na CPTM. E o que saiu, esqueci o nome dele, daqui a pouco eu lembro. Então, nós fomos para a Culial, no primeiro dia falou, senta aqui, sentamos lá, chegou um velhinho, velhinho naquela época era velhinho, agora ele é pós-velhinho. Falou: “Meu nome é Valter Hamburgo”, falando em português, “eu sou italiano, estou nos Estados Unidos há 30 anos, trabalho no avião há 29. Vocês vieram falar da CPTM, conheço tudo”. Quem é esse cara? Ele trabalha no Banco Mundial ou trabalha na CPTM? E conhecia tudo da CPTM, porque ao longo do tempo, o Banco Federal, eu fui 200 vezes no Banco Mundial pedir dinheiro, ele falou: “Nunca acreditei naqueles caras”. E ele fala português, porque tinha uma parente que era portuguesa e falou com ele, e italiano para português, não, claro, ele falou um português, você imagina, macarrone ao suco. Então, ele falou: “Já sei todas as histórias da CTPM. Vocês vão me contar alguma coisa séria? Esse era o sentimento de 30 segundos de conversa”. Falei: “Bom, já que você deve falar português, então é o seguinte, vamos. “Mas o que vocês vão falar?”. Abrimos o plano, ele falou: “Agora estou sentindo. Vai parar de andar com porta aberta e janela quebrada e pingente, vai parar com isso?”. O cara sabia tudo, tudo. E ele era um cara que cuidava do Brasil, Argentina e Chile, que são as divisões. E aí ele começou a contar história da Argentina, que voltaram um dinheiro que não valeu a pena, lá no Chile valeu, no Brasil eles seguravam, porque não estava acreditando na rede do Governo Federal, nem na companhia (inint) [00:42:20]. Ficamos lá uma semana, nós saímos, porque acontece em 94 uma eleição, e o PMDB perdeu a eleição, é isso, quem ganhou foi o PSDB, ganhou o Mário Covas, e aí deram uma esfriada, foi retomado, e a CPTM felizmente depois melhorou, são os trens mais novos da cidade, em praticamente todas as linhas. E a CPTM para o metrô, para o centro de transporte e para a região metropolitana, os 22 Municípios que interessa, é fundamental, ela tinha que estar com o padrão do metrô já há 20 anos. E de novo, você pega, quer dizer, como era serviço tinha que estar implantada uns 500 metros em volta, que é o que o (inint) [00:43:06], na hora que começou eles só fazem o óbvio, e nós conseguimos, nós vamos fazer o óbvio, só tem uma coisa que tem, é uma baita capacidade de transporte, eu tenha que chamar as pessoas a morarem, trabalharem, consumirem nessa região, para elas é melhor, claro que elas podem ir, para onde elas quiserem, depois. O mérito de Curitiba, do Prefeito lá, Jaime Melo, muito interessante, porque em 1940, Curitiba tinha 140 mil habitantes, tinha exatamente 10% da população de São Paulo, São Paulo já era dez vezes maior. Quando ele entrou na Prefeitura em 1960, tinha crescido bastante, tinha dobrado São Paulo já tinha triplicado, já estava com quase 4 milhões. E ele é um cara que tinha viajado um pouco, falou: “Nós não vamos ser de São Paulo”, ele tinha uma referência então ele não queria ser. Porque o que São Paulo foi e deixou de ser foi essa razão, essa bagunça. Então, eles tentaram, os corredores não tinham dinheiro para fazer metrô, bonde, tiraram fora, então vamos ficar nos ônibus. Mas isso era uma vantagem, os prefeitos de lá, de 140 mil para 250 a 300, fizeram um desenho urbano evitando, por exemplo, colocar gente morando na (inint) [00:44:34], coisa que nós não fizemos. Por quê? Primeiro que você estraga a água, segundo, você tem que buscar água no inferno e fica tudo muito mais caro. E eles conseguiram conversar com os empresários e construíram no entorno. Então, está aqui um cortador de grama, se você fizer um corte, é aí como era São Paulo como as cidades europeias, longe assim, oito quadras, tudo casa térrea, quando faltam umas quatro quadras, sobe para predinho de três andares, quando sobe uma ou duas quadras, sabe para oito, 10, 12, 15 andares. Então, é uma pirâmide o corte. Então, 70%, mas claro que isso vale para até 1 milhão, você aparecia com dois, abriram mão do espaço, estava em condições bem piores, mas conseguimos segurar isso até uns 20 anos atrás, ou seja, aquela lógica de construção, aquela lá que teve, que o metrô ia tentar implantar, que o metrô também está correndo atrás do prejuízo, ele é o metrô da cidade. Na recuperação do metrô e CTPM, daqui, sei lá, PITU 20 e 30, eu participei do 20, quando o Cláudio estava lá. A gente imaginava que em 2030 nós íamos ter a rede completa do metrô.
P/1 - O que é o PITU?
R - Plano Integrado de Transporte Urbano, foi feito em 95, 97, quando o Cláudio foi para lá como o Secretário. Eu fui em 95, 96 e 97 fiquei com o Plínio na Secretaria de Transportes, que tem uma história legal também, mas de 97 para frente, até 2001, fiquei com o Cláudio, depois o Cláudio saiu e veio o Jurandir, acabei continuando com o Jurandir. Mas a ideia do PITU 20 e 30, dava um ordenamento, era um projeto do metrô negociado pela Prefeitura de São Paulo, e em negociação pelo menos, com seis maiores Municípios aonde a CPTM atravessa. Só que era Santo André, São Bernardo, Osasco, depois ainda tem Guarulhos, que acabou não tendo, pelo menos, não tem até agora. É fazer o óbvio. Deixar as pessoas morarem onde querem, qualquer serviço para esses caras é caríssimo, a hora que você coloca muita gente morando perto você baixa custo e baixa tempos. Então, adensar, mas não de qualquer jeito, mas isso em certos padrões, há uma enorme vantagem das cidades. A gente nem implantou, implantamos o metrô, implantamos 500 quilômetros, mas ele já tinha dado uma alternada na cidade, agora acabou, agora a cidade será aquilo, o resto dane-se, você quer morar no inferno o problema é seu, aqui ele custa tanto.
P/1 - Mas a gente vai fazer esse plano integrado?
R - Nós estamos fazendo, mas o drama é o seguinte, nós estamos fazendo ainda hoje, os 90 quilômetros e com 12 milhões.
P/1 - Devagar? Porque assim, eu tinha a impressão que já era um projeto que não tivesse sido abandonado.
R - Não, nem pode. Em 1950 moravam aqui na cidade 2 milhões e 400 mil, a tal futura região metropolitana eram 400 mil pessoas, não moravam ninguém em volta, hoje aqui são 12 e em volta são 10, é outro planeta. Quer dizer, como é que uma cidade que em 60 anos sai de 2,5 milhões para 12, e de um total de 12 milhões e 800, sai para 21? Você precisa ter um país muito rico, ou pelo menos, muito vivo, muito inteligente, para permitir as coisas. O erro do Brasil não foi crescer rápido, foi crescer rápido na mão desses calhordas que andam administrando o país. Mas nós tínhamos que ter um plano, precisa falar com cuidado o que eu vou falar, um plano para a gente familiar, com cuidado, não é esterilizar a mulher que nem esse simpático capitão boçal, o capitão boçal que é candidato. Era ensinar para as pessoas que a mulher menstrua, que ela tem um período menstrual, que tem um período que ela engravida, não é para encher de pílula para a mulher engravidar, ela para dar informação para ela. Como é que você pode em um país que tinha 50 milhões, hoje tem 220, a nossa franja de miseráveis é uma barbaridade, é uma irresponsabilidade de governo, de governantes, eles não podiam ter nascido, não é isso, mas os pais tinham que ter educação para dizer, não, espera, vamos parar por aqui, (inint) [00:49:05] para isso ou para aquilo, precisa ter escola. O Brasil tinha 17 milhões em 1900, tem quase 15 vezes mais, 13 vezes mais em 110 anos, tem que pegar todos os políticos e fuzilar todos, olha o Bolsonaro falando. Mas me deixa crescer, deixou aumentar se a tua receita não acompanha? Primeiro. Segundo, você não tem méritos para dividir essa riqueza, porque a riqueza nós temos, isso ainda é outro lado, não, não, deixa os 220 milhões aí. Então, vamos voltar lá atrás e vamos rediscutir como é que vai ser essa rediscussão de riqueza. Não tem cabimento você ter um PIB de 2 trilhões e ter a visão de renda que nós temos, então isso que vale pelo lado macro da economia e tal, vale até para o transporte, quando você organiza uma cidade e deixa aí de qualquer jeito. Claro que algumas pessoas ganham muito dinheiro com isso, até os empresários do fundão, inclusive os ligados ao empresário de ônibus, eles ganharam dinheiro para eles, e eles deram como contrapartida um nicho de cidade, a gente não precisava ter um nicho de cidade, podia ter os mesmos 12 milhões em uma outra organização, em uma outra estruturação. Esse que é o lado que incomoda a gente. Se tivesse sido invadido e tivesse tido uma guerra, sei lá, com os paraguaios, e perdido e tal, dá para entender, nem isso tiveram. Nós não temos como explicar essa bagunça que a gente fez no país, um país que tem, eu vi um relatório semana passada, de 2009 a 2015, a produção agrícola dobrou. Você tem ideia o que é isso? Os outros países crescem assim 3%, 5%, a gente cresceu 100%, o Brasil produz mais de 220 milhões de toneladas. Bom, pelo menos, todo mundo come. Mentira, também não.
P/1 - Também não.
R - Então, você faz é uma riqueza que ela fica sempre concentrada, e isso vale para tudo quanto é lado, vale para a educação, que a educação que é um lixo vale para o transporte que é um lixo, para a saúde que é outro, fica pouca coisa para escapar.
P/3 - Desculpa, eu que sou leigo no assunto, aqui de fora, do metrô, essas instâncias do planejamento da mobilidade de São Paulo, ela é feita no metrô junto com a Prefeitura?
R - Junto com o Governo do Estado.
P/3 - E com o Governo do Estado?
R - Nós somos uma empresa que nasceu na Prefeitura em 1968, e mudamos, digamos, mudamos de dono, em 79, quando (inint) [00:51:46] Paulo Saline, é uma empresa com perspectiva, com esse simpático senhor Governador, mas não foi não, quem fez a negociação foi o setor produtivo, o metrô precisava de um caminhão de dinheiro, e a distribuição tributária do Brasil, a Prefeitura ficava com isso de dinheiro, o metrô levava quase 60% do orçamento de investimento, é impossível a Prefeitura aguentar aquilo. Então, o setor fez adequadamente, passa para o Estado, que tinha mais condições de poder fazer o investimento no metrô. Mas toda negociação, a empresa, o metrô hoje faz parte de uma Secretaria de Transporte metropolitano, que tinham outras duas empresas, uma de trilho, que é a CPTM, e outra que é uma gerenciadora dos ônibus intermunicipais, de regiões metropolitana, não é do Estado todo. Então, tudo que se faz a nível de transporte, pelo menos, é relativamente amarrado, isso entra no orçamento do Estado que rebate no orçamento ele. Tem algumas contrapartidas da Prefeitura, mas nem sempre o Prefeito, também nem sempre o que tem lá à disposição orçamentária isso não sai. E isso tudo nos amarra muito, isso aí atrasa muito a implantação do metrô. A gente está entrando agora com a linha cinco, 300 mil passageiros, é uma linha que a hora que ela cruzar a linha um, ela via para 900 mil, de um dia para o outro. E alguns usuários que usam, você fica quieto ouvindo o pessoal novo: “Cara, eu não sei como é que vai acontecer isso aqui, porque eu vou vender meu carro”. Quer dizer, isso tem reflexo na economia do cara, que quando ele soube que o metrô ia passar por não sei aonde, ele foi morar perto da mãe ou perto da sogra, ou perto de uma irmã etc. e tal, e assim que ele morava para lá, e precisa ter dois carros, porque ele vai para um lado e depois vai para o outro, um carro pode ser vendido. E ainda ganha tempo. Então, hoje leva uma hora e não sei quanto tempo médio, em São Paulo hoje é 70 minutos, médio, médio. Eu levo 45 da minha casa até à Rua Augusta, 50, mas de carro levo no mínimo uma hora a mais, para ir embora, aí você ganha dinheiro, você ganha tempo, você ganha padrão de vida, esse simpático (inint) [00:54:11] em casa, quando minha mulher, meus filhos não, já trabalham, eu tenho cachorro e gato, mas isso aqui é sagrado, do metrô. O transporte que você pega, em pé, sentado, tanto faz, lê, e ainda por cima rabisco, grifo coisas. Então, se você quer uma qualidade de vida, o metrô dá um salto para as pessoas. Ainda fez algumas pesquisas, de avaliação do serviço e tal, então principalmente o pessoal da Zona Leste: “O metrô está lotado”. Bom, tudo bem, como é que era a sua vida antes? “Não, nem pensa. Eu estou criticando porque está lotado. Não mexe nisso aqui”. O metrô chegou na Zona Leste em Tatuapé em novembro de 81, o metrô chega em Tatuapé, o prédio mais próximo ia ficar assim umas seis quadras, lá no Edifício Romero lá em baixo, um predinho de três andares, passa junto à Tatuapé.
P/1 - Esse momento é um grande marco na história do metrô, essa chegada à Zona Leste?
R - Olha, você sabe porque o metrô começou pela Zona Sul e não pela Leste e Oeste? Na rede básica, a rede básica a linha SOS não era essa aí, era uma linha que saía da Casa Verde lambia a Sé e ia para a Vila Maria, porque a ideia aqui era levar a Vila Maria para Guarulhos, que Guarulhos é um grande parque industrial, é o segundo maior Município em termos de população e de orçamento. Então, os vários projetos que a Prefeitura fez, negociando com o Estado e tal, nessa época então era a Prefeitura, então eram um eixo que ia pegar a Via Dutra, a Dutra ia ser uma referência e tal. E, então, lá atrás teve a rede básica, bom, e por onde começa? Aí o Governo Federal falou: “Não, eu vou investir na rede ferroviária, aqui deixa que nós vamos investir”. Está bom, então o metrô vai fazer a linha Norte-Sul, e eles não fizeram provavelmente. E o serviço da rede era péssimo, aquilo tem porta aberta, tinha um detalhe adicional, havia um ódio das pessoas com relação ao trem, porque o trem servia para muita coisa, assalto, roubo etc., servia para matar. Então, é uma história horrorosa, você matava um fulano não sei aonde, à noite você amarrava e jogava ele no trilho, aí o trilho vinha e passava por cima, e falava, não, quero pedir indenização, uma vergonha. Eu sei que o ano que eu passei lá, o primeiro, passei em duas vezes, passei em 91 e 94, acho que teve mais de 100 casos de morte, havia, são casos. Então, uma relação de ódio. As pessoas jogavam pedra nos trens, o serviço era tão ruim. Se vocês pegarem algumas fotos da rede, os trens são tudo martelados, cheio de pedra, porque a rede não tinha dinheiro e passou a arrumar mais os vidros. Então, chovia, e chovia dentro. Uma que eu vi, entrei com o planejamento, peguei um pessoal, vamos conhecer a linha, o pessoal que não tinha vindo do metrô, nossa, ou então iluminação, que seria a futura linha 11. Tinha uns buracos no solo, então os caras fizeram manutenção de degrauzinho, um chapeuzinho retangular cobrindo o buraco, ou seja, você andando no trilho você não caia, você tropeçava lá dentro, e algumas ainda estava com o buraco. Quer dizer, um cara que presta esse serviço ele não despreza você, e como ele te incomoda muito um dia você joga pedra, um dia você quebra a porta, e o diabo. A parte da frota da CBTU, que estava em manutenção era quase do tamanho do que operava, era o fim do mundo. Por isso simpático Valter Hamburgo lá, o que é que você vai fazer, não faz nada que preste, poxa. Aí para ganhar...
P/2 - Mas ele deu o dinheiro?
R - Deu um pouco, porque ele estava no final do Governo Fleuri, que foi muito discreto aqui e lá fora, aí entrou o Covas, não sei se era o Covas, bom, o simpático Orestes Quercia e acabaram com o Estado de São Paulo, tanto que nós tivemos que ir ao Banespa, que era o terceiro maior banco do país, era Banco do Brasil, Caixa Econômica e Banespa, Banco do Estado de São Paulo, esse nome (inint) [00:58:57], banco (inint) [00:59:00] o banco, e mais a ferrovia de carga, que era a maior ferrovia do Brasil, que era a FEPASA, tinha a FEPASA carga e a FEPASA passageira. Ou seja, nós pegamos a coroa, e daí a coroa do Federal no poder para pegar empréstimo lá fora, para pagar empréstimo. A administração do senhor Quércia e Fleuri, famoso arrasa quarteirão. Em 95 eu fui com o Plínio para a Secretaria de Transportes, e tem uma historinha legal. Então, fui com o Plínio conversar com o Collor, que é um cara grosso para capeta. Então, fui ao Plínio, o Collor (inint) [00:59:45] cabeceira, o Plínio de um lado, eu do outro: “Fala, Plínio”, assim bem gentil, “fala Plínio”. Aí ele faz uma exposição e tal, aí foi na hora que eu ia expor, e eu peguei e fiquei o tempo todo assim, expliquei como é que ia ser, nós íamos fazer curso, a proposta era fazer curso, o Estado não tinha dinheiro, mas os caras gastavam ladeira abaixo. Então, a proposta da recuperação e na expansão na malha rodoviária era fazer concessão, só que tem uma série de coisas, tinha carga roubada (inint) [01:00:17] naquela época, agora não tem mais, agora não tem mais carga roubada. Então, nós criamos um lugar que chama Posto Geral de Fiscalização, e todo mundo que entrava na rodovia a gente tinha uma anotação da placa, acessava o banco do DETRAN para saber se o carro estava licenciado, e o banco da segurança pública, esse carro não é roubado. E à frente tinha um painel, parada obrigatória para o veículo com placa, aí estava lá, ABC 1234. Então, esse cara sabia que ele tinha que entrar nesse posto geral. A polícia era avisada, caso ele resolvesse passar, a polícia pegava ele na frente. Acabei de explicar, ele olhou para mim e falou assim: “Você acredita nisso?”. Me deu uma vontade de levantar e ir embora. Mas bancou, topou, a gente saiu, arrumamos, vamos ter rodovia descente (inint) [01:01:17], e o único jeito, (inint) [01:01:19]. Secando o barato ou não é outra história, você pode acertar, verificar, o que você quiser. Mas as dez melhores rodovias do Brasil são todas no Estado de São Paulo, tanto que eu tinha um amigo que era cearense, lá tinha ferrovia, que tinha um metrô, lá tinha rodovia aqui. Ele falava: “Não, os paulistas são muito legais, eles nem pedem passaporte”, que é o diferencial do padrão de Minas para São Paulo. Sai de São Paulo e vai para Minas, não é como o terror do Rio, vai para onde você quiser, pelo amor de Deus. E não deveria ser assim. Então, uma das coisas do Plínio, ele no metrô, ele tinha a condição que era a seguinte, nós tínhamos que fazer o melhor pelo menor preço, não se abre mão de qualidade em nenhuma hipótese, porque você não pode abrir mão da segurança. E aí nós tínhamos todos sem estar escrito em lugar algum, o seguinte, o metrô jamais, no metrô, jamais poderá ter um acidente, não pode, esquece. Isso é meio óbvio, porque uma coisa é você ter um acidente em uma via aberta, que é uma tragédia, e uma outra coisa é você ter em um ambiente fechado, de repente fica tudo escuro, e aí a tragédia multiplica por dez. Mas a preocupação é construir uma imagem que era possível fazer um sistema de transporte de alta qualidade, mas não é assim, não, eu fui para a Europa, vim em tal lugar, fui para o Estados Unidos, fui para o Japão, dá impressão que eu nasci em uma sub-raça, não é nada disso. Então, os méritos do Plínio, tanto lá como na Secretaria de Transportes, depois na CPTM, a briga é por qualidade, mas não é qualidade a qualquer preço, é o máximo de qualidade, não se discute qualidade, mas o preço não pode ser o máximo, tem que ser um pouquinho abaixo. E uma outra coisa, desenvolver fornecedores nacionais. Então, nos primeiros anos do metrô, coisa que a gente mais teve foi ensinar fornecedor a trabalhar nos padrões que o metrô precisava. Então, o cara vinha e falava, isso aqui custa tanto, a gente falava, não, mas tem que atender essa norma, essa e essa. Você está louco, isso vai custar 100 vezes mais caro. Não, primeiro, não vai custar 100 vezes mais caro. E ele queria uma eternidade para fazer, não, não é nem 100 vezes mais caro e nem uma eternidade, você tem que entregar isso aqui em 90 dias. Mas só se vocês me ajudarem. Então, tinha muito técnico do pessoal que ia para dentro da fábrica do cara, para ajudar ele a fazer direito. Porque o mercado não exigia essa qualidade. Uma vez chegou uma pessoa, acho que a empresa do Rio, as fechaduras das salas técnicas do metrô você não consegue com uma chave falsa abrir, ninguém abre, a fechadura tem uma especificação, tipo de banco. E tinha essa fábrica que fez isso aí tinha um nome, (inint) [01:04:35]. Então, um dia o cara estava visitando, ele falou: “A minha chave acho que serve aí”, esse cara que estava acompanhando, esse simpático, acompanhando ele, falou: “Olha, mas também olha só a fechadura que vocês colocam”. Sim, porque se é um gaiato que entra em uma sala técnica e mexe em qualquer coisa, além dele morrer, o que podia acontecer, sei lá o que pode acontecer, não sei que sala ele está entrando. Então, a preocupação com metrô, da construção, de no mínimo possível e acidentes na construção ou na operação, o Plínio tem uma marca que deu para ele no Governo Federal uma marca significativa. O primeiro grande salto no metrô como Engenheiro ele foi ser Presidente da COSIPA, Companhia Siderúrgica Paulista, fica ali em Cubatão. E uma das marcas da COSIPA era assim: “Estamos há três dias sem acidente grave, estamos há dois dias sem acidente grave, estamos há quatro dias sem acidente grave”. Falei: “Para com isso”. Qual é a causa disso? Juntou todo mundo, aí eu não fui nessa época. Ele foi para a COSIPA, o chão era uma bagunça, material jogado para tudo quanto é lado, acondicionado de qualquer forma, lata de ácido sulfúrico misturado, coisa inflamável, que precisava cortar. Para, limpa tudo isso aí, e colocou os caras para irem, vocês têm que ter acidente zero, morreram de rir, imagina, a gente matava no mínimo um por semana. Olha, a regra, matar um por semana era regra. Até que um dia eles chegaram a 180 sem nenhuma morte. Então, foi essa imagem que ele veio para o metrô. Então, a construção de uma empresa de alta qualidade e segura, está impregnado, pode entrar a mulher que for hoje no metrô, já vai entrar dentro dos padrões. O metrô desenvolveu as normas técnicas, a famosa Associação de Normas Técnicas, um monte delas, foram desenvolvidas pelo metrô no campo metroviário e fora dele também. Porque não adianta você fazer uma especificação de um equipamento que não tem fornecedor nacional que faça, ou que faça com aquela durabilidade que você quer. Entendeu? Então, o parque industrial do Brasil deu um salto com o metrô, que serviu para metrô, ferrovia e outros. E uma das coisas que se viu foi procriação da própria (inint) [01:07:06]. Quando o metrô começou a andar, era fazia (inint) [01:07:08] chegava a fazer um buraco na cidade, a Avenida Vergueiro, a Presses Maia, acabava com a cidade, a cidade já não tinha projeto urbano nenhum, aí vinha um cara e fazia um buraco e ficava lá um ano aquele buraco aberto, como é que existe tráfego? Então, tiveram que criar no metrô uma área que fizesse o desvio de tráfego. Daí uma evolução dele, um dia o setor falou, mas desse jeito não dá, o metrô está de olho na Prefeitura, ou vocês são uma coisa ou outra. Aí o Prefeito falou, não, está na hora de separar. Então, eu quero uma área que vai cuidar do tráfego. E na época o trânsito era, segundo os nossos iluminados amigos da farda, era o trânsito é um problema de segurança pública, olha a cabeça dos tios. Portanto, tinha que estar ligado com a polícia.
P/1 - A Polícia Militar?
R - Militar. Então, o Plínio e o (inint) [01:08:03] criaram a Companhia de Engenharia de Tráfego, a gente só ia colocar plaquinha, fazer estudo de desvios, imaginar fluxo, e os miliares ficavam olhando, depois foi fazendo o resto. Quando eu fui para a SET, eu fiz o primeiro convênio de colocar pessoas na Prefeitura, próprio da SET para administrar o trânsito. Isso levou dois anos, isso só saiu porque no segundo turno da eleição do Fleuri, foi o Fleuri e o Maluf, (inint) [01:08:36], não, o Maluf não dá. Então, vai o Fleuri, ele ganhou a eleição no domingo. Na segunda-feira, tive uma reunião com ela, estava eu, o Secretário que era o Ademar, que estava na sala, entrou a Mônica que era a Secretária também, falou: “Olha, o Fleuri está aí, veio aqui cumprimentar você, que você ajudou na campanha”. Aí falou, na manda ele entrar, um cara de 1,90 metros. (inint) [01:08:59] sobrou um metro, era baixinho. Cumprimentou, beijou e tal. Conta comigo, o que você precisar você fala, se você tiver alguma coisa você fala, eu tenho. Eu quero fazer um projeto para o Estado, eu quero administrar o trânsito: “Pode mandar, eu tomo posse dia 15 de março, dia 16 de março nós assinamos”. Nós assinamos 16 de março (inint) [01:09:20] 17 de junho, todos os marronzinhos queridos estão na rua, porque eu tinha, o mesmo conceito que eu tinha, levei para a SET e eu conseguia no metrô, você tinha que administrar, o dono da estrada tem que ser você. Porque no metrô, quem que manda no metrô? Não, mas você tem alguma dúvida de quem é que manda no metrô? É o mesmo monitoramento, tem que fazer uma coisa diferente, a gente coloca sempre para fora, ou leva o seu para a cadeia, no corpo de segurança, no corpo de operação, tem o circuito fechado de televisão (inint) [01:09:46] para dar garantia para o cara. Então, o (inint) [01:09:51] foi criado com esse objetivo, de ordenar, isso aqui era uma zona. No final de tarde todos os cruzamentos ficam trancados, o sistema fica verde, verde e amarelo, e tudo cruzado, estava vermelho e vai cruzar do mesmo jeito. Quer dizer, normalmente isso seria um inferno, com essa disciplina, essas coisas são importantes. Então, algumas coisas que aprendi na Light, que depois eu incorporei muito nas coisas aqui no metrô, e levei para a SET e isso me ajudou muito a enxergar a cidade. Como eu já tinha a história da cidade, como é que ela tinha crescido, já sabia, tinha crescido torta, defeituosa, porque ela foi criada para ser defeituosa, então isso me ajudou a fazer muita coisa na SET, que amenizou um pouquinho o problema daquela época.
P/3 - Mas (inint) [01:10:33], porque no fim o metrô tem um poder muito grande no desenho da cidade.
R - Tem menos.
P/3 - Tem menos, hoje?
R - Não, tem menos. De 68 quando começou a obra, a terminar Norte-Sul, tem a Sé, foi 75, sete anos. Aí para terminar a Leste-Oeste levou 11, depois de tudo só tinha Norte-Sul e Leste-Oeste. Então, nosso espaço é pequeno. E os prefeitos nem sempre ajudaram. É preciso trabalhar um pouco a questão da história da Zona Leste, a Zona Leste era toda do lado da Celso Garcia, era ao lado da Radial Leste, a Zona Leste existia em cima da Celso Garcia, senão a Celso Garcia ia embora, o outro lado era nada, tinha um monte de córregos, era um inferno. E tinha uma curva famosa, sabe onde era a Avenida Salim Farah Maluf, o pai desse imbecil? Ali os caras (inint) [01:11:33] capotava três por dois. Então, o metrô retificou aquela curva, não é nada o que foi. Então, retificou aqui e canalizamos todos os córregos que cruzavam a rede, nunca mais o trem da rede, depois da (inint) [01:11:49] parou por inundação. No verão, normal da (inint) [01:11:53] ia parar na vaga até o nível do tabuleiro do trilho, e às vezes, acima do nível do trem, imagina, se você saiu do trabalho e ia para casa você não chegava, porque tem que esperar a água descer, porque senão o trem não andava, e se ligasse trem eletrocutava todo mundo. O metrô para a Zona Leste foi um presente brutal, existem duas Zonas Leste, depois do metrô, ele ordenou o crescimento. Falando assim, mas canalizou o córrego, não é nada, porque você não mora lá, lá era uma região baixa, e tenta ver o córrego que extravasa para você saber o que você está falando. Então, esses benefícios, se bem que tem uma curiosidade, até uns cinco anos atrás começou a pagar IPTU das casas que desapropriou para poder fazer a Radial Leste, para desapropriar nós temos que endireitar a rede, tinha que analisar córrego etc. e tal. Então tinha que fazer a nossa via, e não tinha a Radial Leste, então tinha que desapropriar para fazer a Radial Leste. Então toda vez que a gente desapropriou ficou na conta do metrô, o metrô ficou pagando IPTU 30 anos, e a (inint) [01:13:00] não aceitavam receber de volta, essa Prefeitura também. Agora estou meio confuso, fui para lá e para cá, não sei aonde eu estou.
P/1 - Vamos fazer uma pausinha.
P/3 - Claro, claro, agora vamos fazer uma pausa.
P/1 - Rodando. Então eu queria que você falasse um pouco de fatos marcantes na sua carreira, dentro do metrô, e na própria história do metrô. Então momentos que tenham sido importante para a cidade, e que você participou disso, daquele projeto. E também assim, quais foram os desafios que você venceu na sua carreira no metrô, na vida mesmo, que passou por vários órgãos públicos aí, casos. E qual a perspectiva também de futuro que você vê para o metrô, para o transporte público, para a cidade. Mais ou menos isso.
R - Está bom. Então vou começar por algumas coisas. Eu acho que em termos de carreira, eu fui convidado para ir para a operação pelo Fred, o Fred era o Diretor de Operações, o (inint) [01:14:17], eu era chefe de planejamento do metrô. Então eu fui para a operação, e no primeiro dia nós tivemos um probleminha, nós fomos levantar qual tinha sido o programa horário naquele dia, assim, batizado por PH, Programa Horário. E tinha até um funcionário novo, tem uns trabalhos que ninguém quer fazer, porque são chatos para chuchu, mas são significativos. Aí o chefe novo faz pergunta chata ou besta. Então falei assim: “Mas qual era o intervalo de trem previstos?”. 153 segundos, previstos. “Quantos dias?”. Ninguém sabe responder. “Mas como que não sabe?”. Desculpa, era 135, e o medido foi 153. Falei, caramba, 18 segundos na hora do pico e tal. Não, mas depois a gente compensa e tal. Falei, mas compensa como? Eu quero viajar às 18:23, foi a hora que eu cheguei, não adianta você colocar o trem que eu não queria às 19:20. Então você sabe que nessas horas você tem que ter os seus aliados que aparecem dentro. Então o General espartano o Leônidas, ele tem atribuído uma série de frases. Então uma delas, quando você pegar um destacamento novo, você começa a dizer o que você pensa e tal, e você precisa ficar olhando nos olhos das pessoas para ver quem é que está concordando com você, porque é com esses caras que você vai poder contar depois. Eu lembro que eu li isso aí, eu não era um marciano, a minha história toda está ligada à expansão do metrô, e não à operação do metrô, claro que eu conhecia muita gente da operação. Então eu fiquei assim, mas como, como é que foi ontem? De novo vazio, ninguém respondeu. Ou seja, nós temos entrado em um momento perigoso da operação, que a gente tinha o previsto, mas não necessariamente se acompanhava o que efetivamente aconteceu. Aí eu usei minha prerrogativa de chefe novo e falei, então está bom, amanhã, 09:00 da manhã nós vamos chegar aqui, vamos pegar algumas pessoas do CSO, pessoas da minha, e vamos analisar o que aconteceu ontem à tarde, porque era hoje, e amanhã cedo. Ficou todo mundo me olhando com uma cara chata, (inint) [01:16:40]. Nas minhas reuniões então juntaram os diversos departamentos que tinham na operação, movimentação de trens, acesso veloz, segurança, habilidade, o diabo, tinha muito assalto à bilheteria àquela época. Então nós tínhamos problemas técnicos, problemas operacionais e problemas com usuários, o que é normal. (inint) [01:17:04]. Então no começo houve uma má vontade assim, tipo da coisa, bobagem, aí quando você começa a pegar os detalhes, porque que o intervalo de trens na Sé, que tinha que ser no máximo 30 segundos, a média deu 50 segundos. Você não saia, acumula mais gente, atrasa mais trem, e começa a ficar parado e o sistema é desiquilibrado desde que ande. Agora se todos os trens pararem começa a ter problema. Aí apareceram aqueles caras que eu olhei no olho, para saber quem é que estaria do meu lado, então apareceu um antipático para caramba, Pedro Cetiro Nagão, acabou ficando meu amigo quando fui para Brasília e acabei levando ele também. Aí ele falou: “Mas também aqui a gente não acompanha exatamente o que acontece, então vamos acompanhar, é isso mesmo”. Depois veio um tal de Marco Antônio, um tal de Jurandir, falei, ótimo, meu papel então é ir lá fazer arruaça. Mas me pareceu que vira um ponto fundamental, nós tínhamos que saber exatamente porque na hora do pico que tinha que dar 120 segundos, ou 130, estava dando 140, 150, isso tinha tudo a ver com (inint) [01:18:15], tinha a ver com a imagem do metrô. Quer dizer, uma coisa é você estar em um trem, e a partir de agora você está em um trem totalmente lotado, por que está acontecendo isso? Um dos motivos é porque o simpático operador de trem, ele recebia um sinal na (inint) [01:18:30] para ele fechar a porta, mas ele olhava, e tinha gente chegando, ele era um motorista de ônibus, tinha 24 portas abertas de um lado, mais 24 do outro, e quer dizer, em que momento as 48 estariam liberadas para ele fechar. Falei: “Meu, é para fechar com 30 segundos”. “Mas e se não der?”. Vai pegar a segurança, daquela, da Praça da Sé, e das duas, uma, o senhor vai entrar ou sair? “Não, mas agora não”. “Tira o cara”. Hoje não teria mais problema, na época que eu lembro, assim, soca o cara ou arranca o cara, na volta não fica. Já que vou pagar uns pecados, mas a ordem que eu dei foi exatamente essa soca ou tira. Aí baixou de 50 foi para 40 e pouco, abaixou para 36, aí passou a dar menos problemas, e o usuário acostumou, porque estava começando a acostumar quando tocava aquela cigarrinha, (inint) [01:19:25], há muito tempo que você não sabe, que tocou, sai dali, e vai tocar a porta. Eu não acredito na questão organizacional, mas eu acredito que tinha fixado muito no planejamento, que era a imagem, os padrões do metrô que tinha que persistir, porque aquilo ia significar que ia ser tenso, entre aspas, folgados, e superlotados, um atrás do outro, não tem horário diferente. E isso é péssimo no metrô, porque a imagem que fica assim, um dia está bom e outro dia está ruim, não, a imagem que você tem que ter do metrô é todo dia está bom. Então obviamente isso foi feito porque havia uma cultura pronta para ser tocada, ou seja, aquela despreocupação com o que de fato estava ocorrendo na linha, estava incomodando muita gente. Então eu tive a sorte de também perceber aquilo, e juntar meus aliados.
P/1 - Qual era a sua função?
R - Eu era chefe do OPC, Departamento de Controle Operacional. Então todos os sistemas, menos o trem, o trem ficava como Atílio. Então o Atílio é um cara muito fácil de convívio, o outro é o Nea, que era da estação, pessoas que o ambiente de operação, pelo menos, o tempo que eu fiquei lá, sempre foi muito bom. Por dois motivos, porque as pessoas se entendiam e porque era fundamental que se entendessem, porque os sistemas são todos interdependentes. E outro exemplo, o momento que eu tive, foi o dia 13 de agosto de 87, foi uma falha do operador do CCO, ele permitiu que vários trens dessem partida simultaneamente, mas primeiro na retificadora, é que deu um sobreaquecimento, o trem saiu e decepou o terceiro trilho, isso aconteceu no dia 13, em uma sexta-feira às 13:30. Certo? Guardou os números? O sistema ia ser reestabelecido às 19:00, nós passamos seis horas no inferno, porque você imagina a minha dor, que tinha acabado o lado Norte, por sorte ele ia até Tiradentes, mas o problema era voltar, porque o gás já tinha dado no ponto pequeno. E nós ficamos indo para a via, voltava para o CCO e tal, e aquilo é lento, a operação de trabalho e de espaço também, um trabalho de carro de cada vez e tal. Está bom, 19:10 vamos tirar o primeiro trem que está parado no estacionamento de Tiradentes, e ele vai sair como direção à Santana. Então você só fala para o operador para ele se preparar, avisa o cara da sala técnica para alinhar o MV, para ele sair, pegar a via e sair. Um operador novo, em uma bobeada, me coloca o trem em situação antes de estar alinhado o trem, vai descarrilhar, às 19:10. Nossa senhora, esse é um fato de construção, isso aqui é uma (inint) [01:22:35] do cara do CCO, que era um absurdo, (inint) [01:22:40] não, era subordinado na área de estação. Mas foi um momento assim de extrema tensão, mas de extrema tensão. Depois de seis, sete horas parado, você ficou mais uma hora e pouco, vai demorar o trem para colocar em cima do trilho, quebrou a ponta da agulha, tive que buscar a ponta da agulha, um inferno.
P/1 - Mas o trem vazio, descarrilhou sem usuário?
R - Descarrilhou sem usuário, ele estava parado no estacionamento de Tiradentes. Da operação, acho que esses dois, e eu aprendi horrores, a operação é outro planeta, o planejamento é um, o projeto é outro, dali eu fui para o projeto, que coisas interessantes assim, projeto. Uma interface com cidadão, e que depois se repetiu na linha quatro, na estação Jardim em São Paulo, a plataforma fica transversal à linha, e aproveitando, nada mais natural, os trens que vem de Guarulhos, os ônibus, ele podia manobrar no Estado de São Paulo e voltar, baixava à custa do cara, baixava o tipo de viagem. Aí arredondou, não, nós não queremos terminal de ônibus aqui. Mas nós temos duas alternativas, cansá-los para explicar, não dava mudava nada, que hoje ela passa ali do mesmo jeito, ou ele passava (inint) [01:24:09], ou ele passava e dava a volta, não mudava absolutamente nada na vida dos caras. Quem era o Governador, meu Deus? Acho que era o Fleuri ainda, não, o Quércia foi em 87, o Fleuri foi em 91, isso foi em 88, então era o Quércia. E aí quem era o Presidente mesmo? Acho que era o Valter Nori. Então ele fez uma reunião com a gente, eu fiz a explicação para ele do porquê fazer o terminal e não fazer, o usuário daquela linha só teria vantagem, os moradores não teriam vantagem e nem desvantagem. E o Nori foi sozinho, não queria que fosse ninguém lá falar com o Quércia. Aí ele voltou muito nervoso, falou assim: “Olha, eu vim aqui trazer uma decisão do Governador, a decisão é a seguinte, não tem terminal”. Todo mundo ficou olhando. A hora que ele relaxou alguém falou assim: “Presidente, (inint) [01:25:26] você acha que ele ia perder voto?”. Ele falou: “O que você acha?”. Assim como a gente não fez a licitação, depois do Faria Lima, até a operação, era para ter uma estação (inint) [01:25:41] que felizmente já morreram, os caras que foram lá encher o saco, não tem prejuízo nenhum, que a estação do metrô, que eu saiba, onde é que tem o prejuízo no metrô. E nessa eu estava fora do metrô, mas eu fui no dia que teve a reunião com a comunidade. Eu falei: “Olha, a (inint) [01:26:00] cronograma, vai levar acho que mais quatro anos para chegar aqui e tal, só vai ter beneficiado”. “Não, mas eu não quero, porque vai prejudicar a minha casa”. Eu falei: “Mas só para mim mostrar algumas das estações do metrô, aqui de São Paulo, de algum lugar, que houve um prejuízo financeiro, teve uma perda de valor”. “Isso não me interessa”. Aí ele já pegou, e apelou com o diretor: “Não, porque se vocês não quiserem, não vou dar na mão do Vereador, vou trazer o Vereador não sei das quantas aqui”. Falei: “Mas meu amigo, essa estação vai durar só uns 100 anos. O senhor está momentaneamente morando aqui. O senhor tem alguma ligação com o Governador? Deixa eu fazer prevalecer isso, porque vamos trazer os outros moradores, serão beneficiados, o senhor já ganhou na loteria, ficar rico”, eu não ia dizer que ele ia morrer, para você ver como eu fui educado, isso eu sei, queria matar aquele cara, um imbecil. E ele era atrelado naquele Vereador, que é de um determinado partido desses que existem por aí, que vale 20 reais, 20 merreis, um Governador da época, também não vou dizer o nome do Governador, me engole um negócio desse, como é que você tem um espaço de dois quilômetros entre uma estação do metrô e outra, isso é um negócio idiota, idiota. Você tem Governador que topa por causa de meia dúzia de votos. Quer dizer, é para ouvir o morador vamos ouvir todos, os que vão se sentir prejudicados com as razões deles e os que vão ser ouvidos. Porque infelizmente, daqui a pouco está todo mundo morto, para de encher o saco e vão ter que fazer a coisa que deve. Então essas interferências políticas vou te contar, são de matar.
P/3 - Mas, Ailton, a expansão do metrô não é sempre política? Porque realmente, aonde vai o metrô tem valorização.
R - Sim, mas teve um gênio que veio dizer que ele ia provar, claro que nunca provou, o quanto o entorno dessa estação Santana foi prejudicada. Não teve estação prejudicada, o que aconteceu na estação de Santana, e quem viu, passa lá para você ver, que tem os prédios novinhos, todos bonitinhos sendo levantados. (inint) [01:28:05] que é o máximo que tem. Não tem, é um idiota que quis prevalecer de força.
P/3 - Mas a determinação de para onde vai é política ou técnica?
R - Não, técnica.
P/3 - É uma questão técnica?
R - Técnica. Eu contei dois exemplos e infelizmente atrapalharam o projeto, ainda está na linha quatro, e esse na linha um, por falta de um cara que entendesse o benefício da comunidade, a comunidade não é necessariamente somente os usuários, a comunidade é maior que o usuário, para você ter usuário precisa ter o morador. Bom, aí depois de tudo isso eu estava em um projeto, depois eu fui para o projeto funcional. No projeto funcional, vou contar uma coisa ruim, o projeto funcional da Estação Sacomâ, o metrô vem enterrado, ali é o morro, aqui está a Avenida Nazaré, acaba a Nazaré e despenca, então o metrô virava em superfície, ele ficava em nível, aqui em baixo já tem um terminal de ônibus, e aqui tem a estação de metrô, e aqui a gente ia usar o espaço aéreo. Então vamos usar, até o Arquiteto (Orácio Rich) [01:29:20], que morreu há pouco tempo. Então levamos para a Prefeitura e tal, e a Prefeitura: “Não, de jeito nenhum, imagina, nós não queremos o terminal aí”. Falei: “Mas o terminal tem que ficar mais próximo possível do metrô, o metrô”. O metrô eu não posso levar para lá como se fosse uma cadeira. E ainda por cima era o espaço exato, a gente precisava de uns 12 metros para passar com a linha, é o que tinha em um terreno vazio enorme. Quer dizer, tinha vantagem da desapropriação, o terminal tinha que ser aonde ele é, só que hoje vocês vão lá, o terminal está aqui e a estação está do lado, do outro lado da rua. Ainda bem que ninguém faz pergunta, porque aquilo é um absurdo, graças ao pessoal da Prefeitura que cismou que não era para ser desse jeito. Você trabalha o tempo todo, um dos méritos do metrô. É valorizar a cidade Segundo reduzir o máximo a desapropriação e facilitar ao máximo a vida do cara aqui ou mora perto ou vem integrado, como que você facilita? Faz a integração o mais próximo possível, pode ser embaixo, em cima, o que você quiser, estação Santa Cruz é um exemplo, por exemplo, quando a gente chegou em Tatuapé, tinham dois terminais imensos, um de cada lado, hoje são dois shoppings. Você faz a adaptação, Itaquera aconteceu a mesma coisa, você tem um Shopping, uma escola técnica, você procura buscar no entorno do metrô o máximo possível de atividades de interesse da cidade que você pode usar.
P/1 - Apesar de tudo isso, você acha que o metrô cumpre esse papel?
R - Na medida do possível, sim. Você tem dois casos, não são muitos casos em que a interferência política atrapalhou. A linha dois, eu estava vendo o projeto dela, era para terminar a estação (inint) [01:31:12], e lá pelas tantas, a prefeitura resolveu, o prefeito tinha proposto o projeto Cidade Tiradentes, que era pegar aquele ônibus elevado, descia na (inint) [01:31:28] e ia até a cidade de Tiradentes. E o metrô não era para ir tão longe, o metrô não foi feito para chegar nas periferias, na periferia, para chegar, é de ônibus. O metrô é feito para ter demanda na faixa de 15, 20 mil no trecho mais leve, mas também não é para passar de 60 mil, pouquíssimas cidades de vias têm isso, o Rio não tem nenhum pedaço desse, São Paulo tem, tem na Leste-Oeste, norte-sul nunca deu 60 mil, 45, 50, agora, uma linha equilibrada, o número de pessoas que vai para o norte para o sul, do Sul para o norte, nós acertamos na mosca, na linha norte sul. Na Leste-Oeste a gente não acertou porque os planos de utilização de uso e ocupação do solo não foram feitos com a prefeitura. O amaldiçoado Jânio Quadros, devia ter morrido no nascimento, mas ele continuou vivo, ele fez aquele monte de porcaria em Brás. Não é para encher de moradia do lado, você tem que fazer tudo do lado, moradia, comércio, serviço, para o cara morar naquela estação e fazer compra naquela, na escola, essa aqui visitar, naquela outra, você ajuda a vida do cara, uma barbaridade, isso me magoa muito, a gente não consegue vender o óbvio para determinados políticos. Não consegue. A Zona Leste era para ter 70 mil como está, mas do outro lado é para ter 70 mil. Porque você tem 70 mil lugares aqui, estou em volta, então devia estar com 70 mil, hoje até que está com bastante, no sentido contrário, mas era para estar com menos aqui, e mais aqui. Aí você tem um sistema equilibrado. Temos o problema sério de ter que buscar terreno para fazer pátio, a zona leste, nosso projeto, como fomos para leste, íamos para Penha, não tinha terreno, apareceu o presidente do Corinthians, o Vicente Matheus, ofereceu lá a pedreira, então de repente, claro que teve contrapartidas, é óbvio, ninguém está precisando de esmola, mas para chegar no pátio, aquilo significou uma mudança no plano da prefeitura, em termos de uso de ocupação do solo, só que ela só fez um pinto daquilo, então a nossa linha é um problema, pátio. Onde vou botar? Veja o pátio da meia 5, qualquer linha, a minha preocupação, onde que eu vou enfiar o pátio? Tanto que lá fora existem pátios totalmente subterrâneos. Minha preocupação, onde é que eu vou enfiar o pátio, tanto que lá fora existem pátios totalmente subterrâneos, ele começa subterrâneo, ou posteriormente colocado uma cidade em cima, Hong Kong, por exemplo, é assim, porque é um espaço enorme, o pátio de Jabaquara tem 300 mil metros quadrados, para para pensar.
P/1 - É grande.
R - É, sim, mas poderia ter feito uma cidade em cima, mesma coisa do Pátio Itaquera. Os próximos pátios nossos serão fatalmente integrados, e terão que ter uma ocupação do uso do solo, porque é impossível, você tem que ter uma forma de conseguir ressarcir. E é uma forma, de novo, de você construir. A linha 17, um dos pátios via ser construído na Roberto Marinho, em elevado, e embaixo você tem um córrego, uma região de córrego, são córregos, então é o espaço que tem, o espaço disponível, onde você vai fazer. Então, a própria linha 17, a linha 17 é uma linha, ela atravessa todo o quadrante oeste da cidade, ela sai da linha 1 Jabaquara e vai até a linha 4, exatamente, ela faz essa ligação todinha. No projeto hoje não, por enquanto está sendo feito um pedacinho, mas ela vai sair do Jabaquara, até a vila Sonia na linha 4, vai cortar a linha 9 como faz hoje, vai cortar os 2 módulos, (inint) [01:35:28] 500 mil pessoas, cada um deles, Ibirapuera e Santo Amaro, olha a integração que isso dá. É uma bobagem, que chega no aeroporto de Congonhas. Bobagem, não tem 10 mil pessoas por dia, 12, quem é que mora ali que vai usar aquele negócio todo dia? Ali, dos empregados, só falta você. Uma linha que vai ter um milhão de passageiros, um sobe e desce brutal. O que a prefeitura está fazendo para aproveitar tudo isso? Os projetinhos fraquinhos. A própria prefeitura não se aproveita do investimento do metrô, isso tanto faz o prefeito A ou B, se você tem um projeto desse, o que muita gente faz, muda todo o uso do solo, cada vez que tem que mudar o uso do solo, uso de ocupação do solo, é um inferno, negociação com prefeito, com câmara. Agora, a gente conseguiu aprovar para construção do entorno dos terminais, caramba, o quinquagésimo ano do metrô, era para ter sido o décimo ano, devia ter acontecido com a Norte-Sul, é um problema cultural complicado, os outros entes, prefeitura, e outras entidades do lado, com dificuldade de aproveitar o ganho que estamos dando, mas favorecendo também.
P/1 - Isso tem uma causa política, porque geralmente…
R - …mas política burra, não é de partido A ou partido B.
P/1 - Política burra, mas é sempre porque o partido que está no governo não está na prefeitura, e por conta disso, eu não te ajudo porque, é uma lógica que eu imagino.
R - Veja bem, o metrô é uma obra que dura no mínimo uma época, uma década são no mínimo 2 ou 3 prefeitos, no mínimo 2 governadores. Então, isso tem que estar no plano do executivo, do legislativo do estado, do legislativo municipal. Não é um projeto do prefeito A e governador B, é um projeto de longa duração, o metrô fica pronto em menos de 10 anos, mas todo o entorno, esse rearranjo leva décadas, 2, 3 décadas. A zona leste, falei para você agora, falei novembro de 81, você fez a conta? Está fazendo 37 anos, claro que há uns 15, 20 anos, a zona leste já era muito melhor do que era em 81, mas nada do que é hoje, ela tinha a inércia dela para se acomodar, para abandonar determinadas regiões e ir para outras, vocês pegaram qual entorno do centro da cidade de São Paulo? A região mais rica de São Paulo é no centro, no máximo ali, de Consolação, Parque Imbu. O meu avô, falando do meu avô de novo, ele gostava de recortar jornais. E no Brás, tinha a famosa partida do Brás, toda vez que vinha um trem, tinha trem de passageiro, de carga, fechava a maldita porteira, fechava (inint) [01:38:25], ficava tudo bloqueado. Então, o grande sonho do pessoal do Brás era um viaduto sobre, um negócio mais trivial, demorou 40 anos para fazer o viaduto. Bom, em 1929 saiu um projeto, um desenho no jornal chamado A Gazeta, que botava o raio do viaduto no (inint) [01:38:46], que acabou sendo feito na década de 50. No verso dessa notícia que meu avô recortou, essa era o foco, tinha uma notícia policial, vou te dar só a manchete. 1929. “Mais um crime cometido no longínquo bairro do Pacaembu”.
P/1 - Longínquo.
R - Você entendeu o que era a cidade de 1929? O Pacaembu era (inint) [01:39:14], fica 5 quilômetros da praça da Sé, acho que nem isso, 5 quilômetros é o Tatuapé, deve ficar a uns 3 quilômetros, era um ovo de cidade com 800 mil pessoas, mas estavam todas arrumadas em cima dos trilhos do bonde da (inint) [01:39:30], o que me deixou com raiva é que a maldita empresa que veio aqui para ganhar dinheiro a rodo e se beneficiar barbaramente fez e depois que a gente tinha conhecimento, tinha poder político, não fizemos. Um negócio irritante. “Não, mas eles subornaram todo mundo”. Não foi só isso, um somatório de interesses que descolou, a cidade de São Paulo não podia se dar ao luxo de não implementar o metrô o mais rápido possível, e dentro da lógica que pensar: “Uso do solo, transporte, trânsito”. E com isso, vem toda a parte comercial, moradia, comércio, serviço, aqui em cima. É o que foi feito durante 40 anos, 50 anos. “Essa é uma experiência que tem no outro lado”, não estava aqui na cidade, as pessoas que estavam vivas em 50 viram o que aconteceu, todo mundo, qualquer um da rua sabia o que tinha que ser feito. Um negócio revoltante, e você chega no quinquagésimo do metrô, tem 100 quilômetros. Desmontando 600 quilômetros de trilhos da (Lite) [01:40:35], tinha 600, jogou tudo fora. Mas nem a linha de Ibirapuera, nem a linha de Santo Amaro. Se tivesse preservado o espaço, você podia ter um VLT, um metrô, podia ser um metrô de superfície, qual o problema? Tem em tanto lugar, pô. A CPTM é isso, e você fazia as adaptações necessárias na cidade, ia ter viaduto, ia ter passagem por baixo, qual o drama? Se você pode se planejar. Estava pronto, de graça, não, jogamos fora. E levou mais 30 anos para construir um corredor de Santo Amaro, Ibirapuera, até aí.
P/1 - Ailton, você se sente realizado, faltou alguma coisa na sua carreira?
R - No metrô? Não, eu passei nas áreas que eu gostaria de ter passado. Quando eu saí da operação, eu tinha uma proposta para manutenção, eu fiquei meio balançado. Tinha feito planejamento, operação e manutenção, mas eu fui para outra área que gostei mais, que é o projeto de pensar a cidade do futuro, a cidade que por onde a cidade tinha que andar, em cima dos trilhos do tal do entorno, isso foi em 80, fui para lá em 88. Fiquei pouco tempo, tive um problema de (inint) [01:41:57], saí no final de 89 e fui mudar de ramo, se bem que cuidar da mesma coisa, que é transporte, só muda o modo de como as pessoas são transportadas. Depois fui pra CPTM, fiquei um ano na superintendência, fiquei 4 anos na assessoria, foi um prazo legal de 2007 a 2010, muito bacana, na CPTM, nessas sucessões que você fala, de mesmo partido, engavetado, foi para a gaveta, gastamos uma nota, foi um projeto bárbaro, não estou dizendo que o que está sendo feito, mas podia ter melhorado, não fazer outro. Passei pela secretaria, que é a visão que você tem das duas empresas de trilhos, mais a relação do transporte de passageiros da região metropolitana. Se você pensa bem, São Paulo é uma cidade só, tem 39 prefeitos por razões políticas, é uma cidade só e uma administração não dividida adequadamente, tem diversos trechos da cidade que podia estar sendo em São Caetano ou Santo André e outros pedaços de outros, que voltavam para cá. E também 10, foi feito, em 25, Santo Amaro até hoje (inint) [01:43:12] para dentro, e Osasco, em 50, foi para fora, por razoes políticas bestas, teria sido muito melhor Santo Amaro ter vindo, mas não Osasco ter saído. Então, ter passado pela secretaria também foi bom, hoje voltei para o metrô, na diretoria e planejamento de transportes metropolitanos, que hoje tem a visão de você ter uma linha implantada, que temos aí, mas o que me incomoda é o fato de ter perdido enormes oportunidades, podia até não ter feito mais metrô, podia ter feito os mesmos 90, mas podia ter encaixado melhor os nossos projetos, os projetos da prefeitura, São Paulo seria melhor, com certeza. Seria melhor no metrô, seria melhor no ônibus. Se eu disser para você que a tarifa de 1950 para cá dava R$ 1,90, a tarifa em São Paulo, o custo em São Paulo, para a taxa do empresário, hoje é R$ 6,40, mais ou menos, você paga R$ 4, R$ 2,40 a prefeitura paga no subsídio. Não precisava pagar isso aí. Se tivesse as mesmas premissas, a gente chegaria perto de R$ 3,80, ou seja, não precisaria de nenhum subsídio. Então você imagina a cidade de São Paulo podendo contar com 3 bilhões por ano, seis quilômetros de metrô por ano, só com subsídio que a prefeitura paga no sistema de ônibus, ou seja, em 10 anos ficaria a rede básica, teria rearranjado a cidade, teria botado em uma CPTM, que é uma empresa municipal, ela tem 130 (inint) [01:44:49] aqui dentro, uma empresa está pendurada, é uma empresa municipal. A prefeitura tem todo o interesse nela. E não fizemos, não tivemos evasão, os paraguaios não invadiram, os marcianos não invadiram, não tivemos peste bubônica, nada. É muito ruim perder para incompetência. Você pode perder quando o você não sabe, quando você é ignorante, mas você sabendo fazer o problema e perder para incompetência, coisas políticas de pequena ordem, muito complicado, muito chato, desanimador.
P/1 - E como você vê o futuro do metrô?
R - Bom, a gente é otimista, eu tenho filhos, um dia talvez tenha filhos, neto, se bem que está muito difícil, ninguém quer mais ter filhos, a minha mãe teve 2, o pai dela teve 6, todo mundo tinha 5, 6 filhos.
P/1 - A curva é para baixo.
R - Sim, 4, 3, 2, agora quem tem 2: “Você já tem 2”? Até olham feio para o cara. Eu acho que o Brasil é um país que se esforça horrores para não aprender as lições já vividas, erramos ciclicamente sempre, nos mesmos erros, e às vezes nas mesmas pessoas. Um dia, a gente aprende. Apenas sou filho de militar, neto de militar, sobrinho de militar, mas meus parentes militares, não os meus, os meus eram gente de cabeça certa, mas os amiguinhos deles prestaram um enorme desserviço com o maldito golpe de 64. Sem aquilo, o Brasil estaria melhor hoje, seriamos não muito melhores, mas estaríamos melhores. Vou dar um exemplo para você, ontem à assembleia, o congresso da Argentina aprovou (o aborto) [01:46:51], aquela coisa óbvia, você não é obrigado a votar, mas se acontecer alguma coisa você pode contar com a área pública, não entra como uma bandida, não precisa se esconder, como pode alguém imaginar que o aborto é uma coisa de criminoso? Só uma coisa de criminoso. Esse conhecimento cultural, também foi arrasado pelos militares. Aqui, se fizer um plebiscito, com certeza vai dar que não, sem nenhuma dúvida, mas pena de morte, votam a favor. É uma barbárie. E até tem ligação, de certa forma. Então, por estar Vivo, por ter filhos e amigos, os amigos terem filhos, olhar para todo mundo, aquele moleque, 30 anos mais novo que eu: “Não é possível que a geração de vocês consiga fazer tudo errado de novo. Não é possível que vocês não aprendam. Porque foi muito dolorido ter errado. De 1968, eu vivi 68, tinha 22 anos, vi um monte de amigos meus serem presos. Presos, mortos, sumiram, sem mais nem menos. Uma molecada que ia ter opinião política, o cara foi morto, é claro, é um cara novo, devia saber pouco sobre as coisas, quem sabe pouco você não mata, você ensina. Coisa mais elementar do mundo, e hoje aparece um bando de cretinos: “O Brasil tem que ter uma ditadura”. É de desanimar. Qual estrada que leva para o Paraguai? Vou sair daqui a pé. Então, o animal, candidato, o cara tem X%, eu acredito que uma demonstração de que estamos bem, esse boçal deveria estar em 1% dos votos. Te contar uma coisa, numa sala de aula em 74, quando alguém falou sobre o golpe, estava dando aula de matemática: “Conta uma coisa para nós, qual o problema da ditadura, pô? ” Nossa, o sangue foi até um metro na cabeça, falei: “Eu vou te explicar, vou explicar, você que perguntou, faz o favor, fica de pé olhando para a parede, só para você entender”. O cara levantou assim meio, né. Uma menina que era muito nova, e todo mundo sabia: “Você não precisa estudar mais, vou te dar 10 até o final do ano”. Aí peguei um cara que ia muito bem, falei assim: “Você, eu vou tirar no mínimo 3 pontos da tua média”. Aí deu um (inint) [01:49:22] já. “Professor, mas (inint) [01:49:23]”. Eu falei: “Vocês perguntaram o que é o arbítrio. A ditadura é arbítrio, vocês estão dando poder para um cara fazer coisas do tipo, pega um cara, bota ali. Eu podia matar ele, vocês repararam que eu não mandei matar, mas eu podia mandar matar em seguida. Vocês acharam justo eu dizer para a moça aqui que ela vai tirar 10 independente do que ela estuda, e esse que estuda pra caramba tira 2 pontos”? “Não, mas isso é um absurdo”. Falei: “Exatamente, quando vocês perguntaram, eu tomei o lugar do cara que vai arbitrar as coisas. Não tem mais justiça, eu prendo e mato quem eu quiser”. Deu um baita reboliço. Eu acho que eu exagerei um pouco, mas sinceramente, quem fala isso não sabe o que está falando, estão passando um WhatsApp do alemãozinho boçal, ele fala que vai matar 30 mil, e outras coisas, tem que passar, tem que mostrar quem é esse cara, mas ele não é o único, a sociedade tem que aprender o seguinte, democracia é um pé no saco, é muito chato, eu gostaria que você parasse de me amolar e fizesse o que estou falando, mas eu sou obrigado a tentar mostrar para você os motivos pelos quais você tem que fazer, e você vai me encher a paciência dizendo por que você não quer, eu só tenho uma forma, tenho que ter argumentos para te convencer, isso cansa, e pior, às vezes eu não tenho, eu só tenho vontade que você obedeça e não me encha o saco, então assim, me obriga, como não posso te agredir, me obriga: “como que vou convencer essa chata de galocha a fazer o que quero”? Eu tenho que achar argumentos, e quando eu começo a achar argumentos, você também vai ter que achar argumentos, que viu que batemos de frente, a democracia ensina o seguinte, o único caminho é conviver e dialogar, e aprender os malditos erros do outro, porque a única forma de você suportar o outro é suportar os limites do outro. Em contrapartida, eu suporto os teus. Esse negócio de mão dupla, você tentar aprender a conviver. Esses 20 anos foi uma tragédia, essa coisa implantada no país, essa corrupção para tudo quanto é lado, antigamente era um partido ou outro, e depois viram que não é, são as pessoas que entraram no esquema, o Brasil está num momento que se tiver um grupo de pessoas inteligentes, o Brasil dará um salto ou não, dará apenas um passinho. Essa coisa aqui, que permite mandar qualquer bobagem em um segundo, boto mil pessoas para saber, se for bem usado, ele vai nos permitir exatamente isso, a diferença entre o passinho e o salto. Hoje, com isso aqui, aquela dependência que tínhamos de formação de currículos e pessoas, viam televisão, o jornal, a revista tal, ficou desse tamanho. Eles vendo o negócio, eu posso detonar esse cara, eu, o minhoca de não sei aonde, eu sei de uma coisa, aquilo espalha, em 2, 3 dias tem 100 mil pessoas sabendo que aquilo que a revista falou é mentira. Esse poder eles estão perdendo, e quando o poder perde, o poder de manipular, você convencer as pessoas, e não impor, porque no fundo estamos vivendo uma ditadura diferente. Até uns anos atrás tinha a rede de televisão tal, jornal tal, que dizia: “Esse aqui é mocinho, aquele é bandido”. Estamos passando para a fase que essa fonte não tem mais o poder, e eles vão ter que pensar duas vezes, porque vão perder o que eles têm, que é a credibilidade. Então, o Brasil, se tiver, não é o pai da pátria, esse é outro negócio legal. Nenhum país salvou-se com o pai da pátria. Foi o nível cultural que subiu, que é a única coisa que não tem. Que a hora que o pai da pátria some, faz assim. A hora que o (inint) [01:53:24] não sobe, é tudo muito mais lento, mas consolidado. A esperança que a gente tem, tem coisas que estou falando, e tem coisas que não falo, só falo no caso da minha idade, e também não é o caso de vocês, eu falo: “Eu não vou ver”. Se eu viver mais 10 anos, é nunca, não tem régua para medir essa coisa. Mas quem viver 30 anos vai ver, vai ter um salto. Porque foi assim, (inint) [01:53:50] não é nem um pouco melhor do que nós, nada, nem o Japão, nem a China, a China era um monte de analfabeto, tinha uma cultura legal, mas era a elite que tinha a cultura, o resto era povoado. O que fizeram lá? Investiram. Tinha uma frase genial do Mao Tse Tung, independente de quem goste dele, um jornalista inglês falando, querendo confortar o Mao: “Você tem 800 milhões de pessoas”, como se isso fosse um mal, uma desgraça. Ele falou: “Você está enganado, eu tenho 800 quilos de massa cinzenta para pensar”. A hora que pegarmos nosso exército de 200 milhões e conseguir dar conhecimento e ensinar adequadamente, é outro país. Hoje, vivemos talvez as principais decisões do país, não tem 100 mil pessoas tomando. Não dá meio por cento, o resto vai na valsa, não pode ser assim, e o Mao sacou. A China era, economicamente, uma porcaria em 1949, não passaram 70 anos, estão com um PIB, passou todo mundo, vão passar os Estados Unidos em mais de 10, 15 anos. Os Estados Unidos sabem disso, a China está assim, os Estados Unidos assim. Passam fácil, se continuarem o que estão fazendo. Mas o fundamental está investido nas pessoas, e não no esquema de porrada, apesar da China dizer que não tem ditadura, não sei, eu sei que investiram uma barbaridade em educação. Hoje eu estava na reunião do Unimetro, implementaram 500 quilômetros de metrô em Pequim, sabe o que estão fazendo? Pagando para 6 metroviários viverem 2 anos na China, ensinando alguns detalhes que eles não sabem. Assumiram que sabem muito, mas não sabem tudo, até os caras ali: “Na América do Sul, tem um tal de Brasil, tem uma cidade lá, tal de São Paulo, tem uns caras que manjam pra caramba”. 2 anos na China, então esses caras estão investindo em tudo quanto é lugar do mundo, com formatos diferentes dos ingleses, e dos americanos, que é o formato que todo mundo sabe qual é. Não estou dizendo que esse é melhor do que aquele, mas o Metro é diferente, e não podemos ficar debaixo da bota desse ou daquele, só tem um jeito, levantar o nível cultural, não tem alternativa. Partido que vai salvar o planeta não tem, o herói que vai ser eleito, não tem. A única coisa que tem é educação e cultura, o resto esquece.
P/1 - Acabou o nosso tempo? Está dando.
R - Então, 3 horas só. Deram as 3 horas, vamos programar as próximas 3.
P/1 - Bom, a gente vai agradecer muito a sua vinda até aqui, sua disponibilidade, foi bem rico mesmo.
R - Você não me deixou falar da CIT, você não me deixou falar do Denatram, você é uma castradora.
P/1 - Então, o que eu ia te falar é justamente isso, se tem alguma coisa que você ainda queria acrescentar nessa conversa.
R - Não, acho que o foco tem que ser o metrô, o transporte, CIT e Denatram é outro planeta. Ele envolve o país como um todo, e tem tudo de bom e de ruim que tem o lado de cá. Mas o de lá é pior, porque as pessoas se acham, as pessoas cometiam infrações porque elas achavam que elas tinham direito, na primeira pesquisa que fizemos na CIT, a pessoa comete a infração tal, o cara olhava para você como se você fosse um verme. “Como ousas me criticar por tal coisa”? Depois de 20, 30 anos, está mudando, hoje as pessoas sabem que estão cometendo infrações. (inint) [01:57:44] é um direito passar em cima da calçada, um direito trancar cruzamento, beber. Vou dar um dado, só para terminar. Em 1986, eu estava no metrô, com um projeto. Na operação. São Paulo tinha 8 milhões de habitantes, matou 3 mil pessoas no trânsito. Ano passado, 4 milhões de pessoas a mais, matou 800 pessoas. É muita gente, mas naturalmente, teria matado mais 5 mil. O nível de consciência das pessoas é muito lento. Estava falando agora pouco com a política do Brasil, vale para nós enquanto cidadãos na cidade. É lento, puxa, matou 800, é uma barbaridade. Matamos 3 mil com 4 milhões de pessoas a menos. Vou dar outro dado para você, em 86, tínhamos um milhão e meio de automóveis, sabe quanto tem hoje? 7. Botou 4 milhões de pessoas a mais, tinha um milhão e meio, agora você tem 5 milhões e meio de carro a mais, devia ter matado muito mais, não, matou muito menos. E essa escala é muito lenta, mas se tivéssemos outros esquemas de trabalhar melhor com as pessoas, esse dado teria vindo 15 anos atrás, não precisava ter demorado tanto tempo. Mas temos uma área política que não tem nenhum interesse em que isso aconteça, isso é outro lado, desanima um pouco. Vencer, não matá-los. Mas, convencê-los que ganhariam muito mais dinheiro se a cidade fosse melhor, é óbvio, só alguns não entendem. Quando tudo melhorar, ficam melhor para todo mundo, não só para eles, e quando tudo piora, fica pior para eles, mesmo com dinheiro, agora tem carro, parece uma casa blindada, trabalha, o filho dele vai para a escola, tem um cara fazendo escolta. Coisa de maluco, de débil mental, construir uma cidade que o cara acha que para ficar rico tem que andar com carro blindado, com cara com um revolver na cintura, o que é isso. Veja o que você construiu, é isso que você quer mesmo? Aí o cara (inint) [01:59:57] vai mudar para Miami, só que ele não vai, porque lá ele é um Zé. Lá, ele é um cara qualquer, ele é chique pra caramba aqui. Melhor desligar esse microfone, que eu não vou parar de falar, vocês que sabem.
P/1 - Ok então.
P/3 - Você, bom, então em nome do projeto, do metrô 50 anos, em nome do Museu da Pessoa.
R - Nem falei 50 horas.
P/3 - Muito obrigado por sua entrevista. Foi ótima.
R - Eu que agradeço.
P/1 - Obrigada.
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