Saturnina Sebastiana da Silva nasceu em Cuiabá em 21 de janeiro de 1916 na localidade rural de Moinho, no entorno da capital mato-grossense. Saiu da casa de seus pais com cinco de idade a pedido da sua avó Maria Angélica pois esta era muito velhinha, havia ficado viúva e precisava de companhia.
Veio então residir em Cuiabá na ria Barão de Melgaço e assim que completou sete anos sua avó a matriculou na escola particular da professora Amelinha Lobo, que funcionava como escola reunida, ou seja, era sala de aula em que meninas e meninos estudavam juntos, sendo que nesta escolinha não havia uniforme. Só usou esta vestimenta quando foi transferida para o grupo escolar modelo “Barão de Melgaço”, era blusa branca e saia azul marinho. Sua primeira professora no grupo era Lucínia de Campo uma moça “velha de idade”, esta expressão era usada para mulheres com mais idade que não tinha se casado. Ela ensinou o abecedário, iniciava pelas letras depois ia para as sílabas. Começava pela turma do B depois passava para turma do C e já ia fazendo ditado. Às vezes os professores aplicavam castigo e colocavam as crianças para ficarem em pé até passar a hora da saída e advertia: - se amanhã não me derem esta leitura não vou soltar vocês! Saturnina completou os estudos primários ali.
Fez um curso de admissão que funcionava no colégio estadual, mas não entrou para a escola normal uma vez que voltou para região rural do Moinho levando consigo sua avó, porque era uma mulher com idade avançada e precisava de cuidados. Professora Saturnina nunca se casou, chegou a namorar um rapaz, mas não deu certo para concretizar um casamento. O sítio do seu pai era um lugar muito agradável de viver tinha muita fartura, tinha plantação, criação de animais, umas cabeças de gado e pomar. Então decidiu começar a trabalhar na localidade, montando uma escola particular na casa de seu pai, lecionou durante cinco anos. O ordenado que recebia neste...
Continuar leitura
Saturnina Sebastiana da Silva nasceu em Cuiabá em 21 de janeiro de 1916 na localidade rural de Moinho, no entorno da capital mato-grossense. Saiu da casa de seus pais com cinco de idade a pedido da sua avó Maria Angélica pois esta era muito velhinha, havia ficado viúva e precisava de companhia.
Veio então residir em Cuiabá na ria Barão de Melgaço e assim que completou sete anos sua avó a matriculou na escola particular da professora Amelinha Lobo, que funcionava como escola reunida, ou seja, era sala de aula em que meninas e meninos estudavam juntos, sendo que nesta escolinha não havia uniforme. Só usou esta vestimenta quando foi transferida para o grupo escolar modelo “Barão de Melgaço”, era blusa branca e saia azul marinho. Sua primeira professora no grupo era Lucínia de Campo uma moça “velha de idade”, esta expressão era usada para mulheres com mais idade que não tinha se casado. Ela ensinou o abecedário, iniciava pelas letras depois ia para as sílabas. Começava pela turma do B depois passava para turma do C e já ia fazendo ditado. Às vezes os professores aplicavam castigo e colocavam as crianças para ficarem em pé até passar a hora da saída e advertia: - se amanhã não me derem esta leitura não vou soltar vocês! Saturnina completou os estudos primários ali.
Fez um curso de admissão que funcionava no colégio estadual, mas não entrou para a escola normal uma vez que voltou para região rural do Moinho levando consigo sua avó, porque era uma mulher com idade avançada e precisava de cuidados. Professora Saturnina nunca se casou, chegou a namorar um rapaz, mas não deu certo para concretizar um casamento. O sítio do seu pai era um lugar muito agradável de viver tinha muita fartura, tinha plantação, criação de animais, umas cabeças de gado e pomar. Então decidiu começar a trabalhar na localidade, montando uma escola particular na casa de seu pai, lecionou durante cinco anos. O ordenado que recebia neste período era muito pouco porque a maioria dos alunos eram muito carentes, alguns pagavam com dinheiro outros ela recebia qualquer coisa que pudessem dar. Mesmo com poucos recursos, para melhor acomodar os estudantes, mandou fazer três bancos grandes de madeira.
Sua situação melhorou um pouco quando foi nomeada como professora pelo Estado de Mato Grosso, em 1947 para lecionar na escola rural mista de “Tamanduá” na localidade do Aricá, na fazenda Conceição, município de Cuiabá. De vez em quando o inspetor escolar aparecia por lá para verificar a movimentação da escola, os livros de frequência e os planos de aulas de cada classe.
A escola de “Tamanduá” era mista, isto quer dizer que, os alunos que compunham a turma eram meninas e meninos com graus de aprendizagem diferentes. Só para o primeiro ano tinha mais de trinta alunos aprendendo a ler e escrever e sempre contava com estudantes mais adiantados para ajudar com os iniciantes. O pai da professora Saturnina comprou um terreno no lugar, e, construiu primeiro um barraco de palha no qual começou a funcionar a escola, mas como não cabia todos os estudantes, logo construiu uma casa de alvenaria e nessa casa maior construiu um salão grande com a preocupação de comportar todos os estudantes. Outro problema a ser superado foi conseguir carteiras. Fez pedido para que o governo as enviasse, mas não foi atendida, resolveu o problema mandando construir bancos para ter lugar para todos os estudantes se sentarem.
Relembrou que era um desafio dar conta do trabalho com estas salas, pois era diferente das turmas da cidade que a professora lecionava apenas para uma turma, no qual os grupos de estudantes eram mais homogêneos, ela calculava que deveria ser mais fácil do que o trabalho na zona rural que a turma era multisseriada, tinha que lecionar para 1º, 2º e 3º anos ao mesmo tempo e depois passava o outro período do dia corrigindo cadernos, passando tarefa para todas as crianças, e, pela quantidade de trabalho ela considerou que esta profissional deveria ganhar um salário maior. Porém o pedido feito para que o governo desse adicional de 30% em seus vencimentos foi negado. Toda sua vida profissional aconteceu em escolas rurais, os estudantes eram comportados porque qualquer coisa que acontecesse era informado para os pais, que eram muitos severos e não permitiam desrespeito, então todos sempre obedeciam.
Os estudantes ficavam em um só lugar, em um salão grande, e, para organizar o trabalho, a professora Saturnina distribuía os cadernos explicava às atividades a serem realizadas depois ia passando um por um para verificar como estavam desenvolvendo as tarefas. Os mais adiantados iam pegando prática ao ajudar ensinar os que estavam começando. Às vezes o governo mandava materiais didáticos para a escola, como: papel, livro, giz, lápis caderno e borracha. Tudo que chegava era distribuído e ajudava muito pois os pais que eram muito carentes.
Professora Saturnina identificou se com as pessoas que moravam no Aricá permanecendo em um primeiro momento por dois anos e meio na região. Lamentou muito quando foi transferida contra a vontade para outra região rural, chamada de Sucuri, nesta localidade ficou lecionando por dois anos. No entanto os moradores do Aricá se mobilizaram nestes dois anos que a professora estava longe fazendo um abaixo-assinado reivindicando sua volta. Primeiro porque tinha um carinho muito grande pela professora, segundo porque essa transferência foi motivada por interferência política. Professora Saturnina não queria ir para outro lugar, pois se sentia em casa no Aricá, porém neste momento foi aconselhada a acatar e seguir para o local de transferência porque se assim não fizesse poderia perder a vaga de professora de forma definitiva. Transcorrido mais de dois anos conseguiu retornar para escola do “Tamanduá” e ali se aposentou. Dos políticos ela ganhou apenas promessas de ajuda para a escola e seu pai recebeu ferramentas que repartiu com os lavradores da região.
Nesta escola havia muitos adultos querendo aprender a escrever o nome então os políticos perceberam que havia pessoas que poderiam dar votos pois estes alunos já tinham aprendido o suficiente para preencher os dados nas listas de eleitores. Professora Saturnina foi coagida por dois irmãos, que se candidataram em partidos diferentes e eram rivais, a participar das eleições pegando dados desses estudantes, eram dois partidos: UDN e PSB. O irmão candidato do PSB a obrigou a realizar alistamento e no dia da eleição deveria reunir as pessoas para que fossem levados até o local de votação para que votassem a seu favor. No entanto no dia da votação o carro que deveria chegar para transportar as pessoas demorou e outro candidato chegou com um transporte como se fosse do irmão e ficou com os eleitores para o lado dele. O candidato do PSB ficou muito zangado com o ocorrido, e, a transferiu para a Sucuri na região da Chapada. Ali também foi bem quista e ao conseguir autorização para retornar para o Aricá tanto o dono da casa que o Estado alugou para ela morar e funcionar a escola quanto às pessoas não queriam que ela saísse. Mas a locomoção para chegar ou sair de Sucuri era feita com muito sacrifício. O meio de transporte era o cavalo e na época de chuva o rio enchia e a água cobria o lombo do animal. Para chegar até lá professora Saturnina saía às cinco da manhã e ia o dia inteiro de viagem. Quando o rio estava muito cheio tinha que ficar esperando o rio baixar daí a viagem durava muito mais tempo.
Todos os meses se deslocava da área rural até a delegacia de ensino que funcionava na cidade para apresentar o mapa de frequência dos estudantes ao inspetor para conseguir liberação do pagamento mensal. Relembrou que às vezes estava fazendo frio outras vezes garoando mas não importava como estava o tempo tinha que vir a cavalo todo mês para trazer documento comprovando a assiduidade dos estudantes para receber o dinheiro.
Professora Saturnina não tinha formação de professora primária da escola normal então para completar seus estudos começou a frequentar o curso de férias. Ela saía da zona rural que trabalhava e se juntava com outros professores que não tinham formação docente. A capacitação era organizada e realizadas nas férias do meio e do final do ano em Cuiabá, umas vezes no ginásio São Gonçalo outras vezes no Palácio da Instrução. O curso era patrocinado pelo estado e os professores recebiam os materiais e uma bolsa de estudos. Algumas pessoas vinham e ficavam na casa de parentes, mas como tinha a opção de ficar interna, professora Saturnina recebia alimentação e local de repouso. As aulas aconteciam de segunda a sábado, das sete horas da manhã até às cinco da tarde. Pela manhã trocava de professor de hora em hora e na parte da tarde faziam os trabalhos propostos para que os professores aprendessem o método novo. Depois que jantavam conversavam um pouco e logo entravam para fazer os trabalhos que se desenrolava até às dez da noite. No domingo faziam excursões para Rosário Oeste, Santo Antônio do Leverger e Poconé. Durante o passeio era necessário fazer anotações sobre alguns monumentos, seu significado, alguma pessoa da localidade etc. Guardava para no outro dia elaborar um relatório das atividades realizadas e colocar as informações coletadas no “jornalzinho da hora do almoço”, sendo que cada dia era uma pessoa que montava o jornalzinho. Nestes cursos eram repassados para os professores novas noções de ensino. Aprendeu ali que as crianças desde cedo aprendiam com brinquedos, a ensinar com desenhos em cartolinas, a usar palito de fósforo e feijão para contar e a elaborar cartazes com informações do município, da cidade e da família. Ao concluir, recebia certificado e aumento salarial. Recorda que muitas professoras reclamavam do modo como era conduzido o curso pois para elas era muito cansativo pelo pouco tempo que se tinha para descansar, pela quantidade de matérias e pela falta de tempo para realizar leituras de cada professor, pelo que se ensinava de como se deveria ensinar. Algumas diziam: Vou embora! Ensinar! Isso não é ensinar! Várias não concordavam com os novos métodos outras tiveram dificuldades, desistiram e foram exoneradas.
O lugar em que a escola do Tamanduá foi construída era do pai da professora Saturnina, e, antes de falecer fez a partilha dos bens entre todos os nove filhos. Três anos após se aposentar às escolas rurais isoladas foram extintas e todos os estudantes da região do Aricá foram transferidos para uma escola rural de I e II graus, chamada de “Abolição” ao se aposentar continuou um tempo no Aricá mas depois vendeu sua parte e veio novamente para o Moinho. Com relação aos seus vencimentos como aposentada, considera que pelo nível e dedicação com que trabalhou, deveria ter ganhos bem melhores.
A mãe de professora Saturnina era enfermeira e sugeriu que a filha fosse trabalhar na mesma profissão, porém dispensou porque havia decidido que trabalharia como professora. Depois de aposentada não lecionou para turma com muitos estudantes porque já estava cansada, mas, quase todos os dias aparecia criança apurada pedindo ajuda para entender alguma tarefa e ela ensinava o que dava para ensinar e quando perguntada se escolheria essa profissão novamente, ela responde de pronto que não, porém ponderou em sua resposta, se fosse para trabalhar no período da entrevista, que considerava o ensino mais moderno e tudo estava muito diferente de quando atuava nas escolas rurais, principalmente pelo comportamento das crianças. Exclamou: As crianças, hoje como está! Ave Maria! Ela ressalta que talvez poderia ter escolhido outra profissão, mas que já estava tarde demais por conta da idade, no entanto avaliou que por sempre aparecer crianças querendo auxílio em questões escolares, o seu destino era ensinar crianças todo o tempo.
Recolher