Entrevista com Joana Neves, em 09/05/2022 às 15h05, da cidade de Recife. O encontro foi realizado via Google Meet.
Estavam presentes:
-Pesquisadora: Juliana Andrade
-Pesquisadora: Célia Santana
Legenda da transcrição
E1: Entrevistador 1 (Juliana Andrade)
E2: Entrevistador 2 (Célia Regina Santana Silva)
R: Entrevistada Joana Neves
A transcrição foi realizada por Lara Kermily Moraes Barbosa e revisada por Yomara Feitosa Caetano de Oliveira.
Antes da entrevista a professora Juliana apresentou a professora Célia. As professoras Juliana Andrade (UFRPE) e Célia Santa Silva (UNEB), em nome da Associação Brasileira de Pesquisadores de Ensino de História da ABEH, agradecem a professora Joana por participar nesse projeto de História e Memória da Associação, que tem a intenção de ouvir essas pesquisadoras, que fundaram o campo do ensino de História no Brasil. A professora Célia Santana Silva da (UNEB) Universidade do Estado da Bahia, apresentou-se e registrou o imenso prazer de estar partilhando com a professora Juliana, um momento tão rico e importante para a trajetória do campo do ensino de História, compartilhando esse momento na entrevista com a professora Joana Neves, que é uma referência. Professora Joana Neves, disse da satisfação e prazer de poder dialogar com duas profissionais, cuja preocupação é a pesquisa do campo do Ensino de História, que segundo a entrevistada sempre foi a sua área de atuação.
E1: Então, para começar como nos já encaminhamos um roteiro previamente para a senhora. Nós gostaríamos que a senhora dissesse seu nome completo, a sua data e local de nascimento? E, como a senhora gostaria de ser chamada nessa entrevista? E, se a senhora autoriza a gravação também, dessa entrevista? [02:21]
R: Eu vou começar pelas duas últimas perguntas. Eu é... gostaria de ser chamada por Joana, que é meu nome, que é pelo qual todo mundo me conhece. E, eu me reconheço. É bem verdade que meus sobrinhos, quando...
Continuar leituraEntrevista com Joana Neves, em 09/05/2022 às 15h05, da cidade de Recife. O encontro foi realizado via Google Meet.
Estavam presentes:
-Pesquisadora: Juliana Andrade
-Pesquisadora: Célia Santana
Legenda da transcrição
E1: Entrevistador 1 (Juliana Andrade)
E2: Entrevistador 2 (Célia Regina Santana Silva)
R: Entrevistada Joana Neves
A transcrição foi realizada por Lara Kermily Moraes Barbosa e revisada por Yomara Feitosa Caetano de Oliveira.
Antes da entrevista a professora Juliana apresentou a professora Célia. As professoras Juliana Andrade (UFRPE) e Célia Santa Silva (UNEB), em nome da Associação Brasileira de Pesquisadores de Ensino de História da ABEH, agradecem a professora Joana por participar nesse projeto de História e Memória da Associação, que tem a intenção de ouvir essas pesquisadoras, que fundaram o campo do ensino de História no Brasil. A professora Célia Santana Silva da (UNEB) Universidade do Estado da Bahia, apresentou-se e registrou o imenso prazer de estar partilhando com a professora Juliana, um momento tão rico e importante para a trajetória do campo do ensino de História, compartilhando esse momento na entrevista com a professora Joana Neves, que é uma referência. Professora Joana Neves, disse da satisfação e prazer de poder dialogar com duas profissionais, cuja preocupação é a pesquisa do campo do Ensino de História, que segundo a entrevistada sempre foi a sua área de atuação.
E1: Então, para começar como nos já encaminhamos um roteiro previamente para a senhora. Nós gostaríamos que a senhora dissesse seu nome completo, a sua data e local de nascimento? E, como a senhora gostaria de ser chamada nessa entrevista? E, se a senhora autoriza a gravação também, dessa entrevista? [02:21]
R: Eu vou começar pelas duas últimas perguntas. Eu é... gostaria de ser chamada por Joana, que é meu nome, que é pelo qual todo mundo me conhece. E, eu me reconheço. É bem verdade que meus sobrinhos, quando pequenos, me chamavam de “Jujuca”, mas na verdade sou chamada por Joana, conhecida por Joana, e sim, autorizo a gravação. E, não tenho problema nenhum com expressar meu pensamento sobre o Ensino de História. Se fosse outro tema, pode ser que eu fizesse algum tipo de restrição, mas com relação ao Ensino de História não, estou às ordens então. Ah! Meu nome é Joana Neves, só mesmo.
E1: A data e o local do seu nascimento
(Risos)
R: A data e local de nascimento, já tem uma certa implicação, por ter pai baiano, que era muito folgado com relação as datas. Eu nasci, mesmo, no dia 31 de julho 1942, mas o meu registro é do dia 15 de outubro de 1942. É porque a gente morava na fazenda, meu pai era lavrador e ele registrava os filhos só quando ia para cidade, que onde tinha o cartório. E, se ele, se acontecesse como aconteceu comigo, eu ter nascido no dia 31 de julho e ele me registrar no dia 15 de outubro, teria que pagar multa pela defasagem da data. Ele não queria pagar multa. Então, ele dizia no cartório, que eu tinha nascido naquele dia. Isso aconteceu com praticamente todos os meus irmãos, menos um, mas todos, todos nós aqui em casa temos a data de nascimento, da qual a minha mãe falava. Porque era a data mais importante para ela. O dia que ela teve o filho, é... e, a data do registro. Então é isso.
E1: E, a cidade?
R: A cidade que eu nasci era uma fazenda, que era chamada fazenda do Veludo, Veludo era, é... não sei. Era alguma coisa ligada ao dono da fazenda, e meu registro é de Sertãozinho, que era a cidade mais próxima, onde meu pai me registrou. Sertãozinho, no interior de São Paulo.
E1: E professora, quais são as memórias, que a senhora mais marcante dessa cidade sertão, dessa fazenda, desse Sertãozinho?
R: Eu não conheci, porque quando minha família se mudou para São Paulo, eu tinha cinco anos. Então, eu tenho uma única lembrança do interior, da última fazenda onde meus pais moraram, onde a família toda morou e de onde nós viemos para São Paulo. Era fazenda chamada São Martinho, pertencente ao Martinho Prado, uma das grandes oligarquias de cafeicultura dos paulistas. Da família do Caio Prado Júnior, e era dessa família. É, que era assim, eu me lembro a única coisa que eu me lembro do interior, era eu estar assistindo uma partida de futebol, na várzea, no campo lá da fazenda, e eu era muito pequena. Então, eu ali entre as pernas dos assistentes, olhando pelo vão da cerca, eu só enxergava as pernas dos jogadores correndo, e me chamou atenção o entusiasmo das moças que estavam assistindo ao jogo, que comemoravam, que gritavam. E, na minha opinião, o futebol era uma coisa que provocava o entusiasmo das moças, pelas pernas dos homens que jogavam, porque era o que eu via só e o que eu ouvia.
R: É a única lembrança que eu tenho do interior. Porque a gente veio para São Paulo com cinco anos. Eu me lembro da viagem de trem, a gente vinda para São Paulo. É... nós que a minha mãe tinha que mentir a idade para o fiscal do trem. Porque quando a minha família veio para São Paulo, éramos eram, nós éramos cinco crianças, quatro crianças, que em princípio teriam menos de cinco anos. E. por tanto, não pagariam a passagem. Eram eu, meu irmão José, minha irmã Natalini e minha irmã Tereza, que de fato eram pequenos. Na ocasião, eu já tinha cinco anos, mas se minha mãe dissesse que eu tinha cinco anos, ia ter que pegar minha passagem, então, para economizar essa passagem, ela mentiu para o guarda, dizendo que eu e o meu irmão éramos gêmeos. E, portanto, eu tinha quatro anos também. Assim que foi.
E1: E, a...
R: Eu me lembro um pouco dessa viagem
E1: E a senhora, foi a senhora, sua mãe, seus irmãos, foram ao encontro dos seus avós em São Paulo, por quê?
R: Não, não, eu nem conheci nenhum dos meus avós, eu é... a minha mãe se casou muito cedo. E, ela tinha quinze para dezesseis anos quando se casou e a mãe dela faleceu, acho que quando ela teve a terceira filha, ela só tinha acho que a terceira filha, e eu sou das últimas dos últimos que nasceram, então eu não conheci a minha vó materna. A minha avó paterna era da Bahia e meu pai migrou da Bahia para São Paulo e se casou com a minha mãe, e aí eu, eu não cheguei a conhecer nenhuma das avós. A minha avó da Bahia chegou a vir uma vez para São Paulo, mas eu era muito novinha, acho que eu nem era nascida. Então, não cheguei, não tive contato nenhum com avó.
R: Então foi isso, mas eu me lembro assim, da viagem para São Paulo, a gente no trem e a minha mãe dizendo que eu e meu irmão éramos gêmeos para eu não ter que pegar a passagem.
E1: Oh, professora, a senhora sabe da história de como seus pais se conheceram? [9:43]
(Risos)
R: Sei, a minha mãe contava muito essa história, entende? É... a minha mãe tinha quinze para dezesseis anos, e era apaixonada por um minero, que morava, é... Eles eram de Ribeirão Preto. A minha avó tinha um sítio em Ribeirão Preto e a cidade que minha mãe conhecia era Ribeirão Preto, ela nasceu lá. E aí em Ribeirão Preto, vizinho da casa dos padrinhos da minha mãe, esse minero estudava lá. E, a minha mãe se apaixonou por esse mineiro. Ela tinha uns quinze anos. E, a minha avó, mãe dela, ficou com muito medo dela inventar de se casar com o mineiro, que voltaria para Minas. E, ela teria que ficar longe da filha. E, aí meu pai era um migrante Bahiano que a minha avó conhecia ali. Acho que ele ajudou a trabalhar no sítio e os outros irmãos dele também estavam lá, e eram lavradores que a minha avó conheceu. Meu pai, chamado Sebastião Neves. Onze anos mais velho que a minha mãe. Mas aí a minha avó, fez que minha mãe se casar com meu pai, para ela se assegurar que não perderia a filha para um mineiro.
R: E, aconteceu uma história interessante. A minha mãe tinha, não tinha 16 anos, tinha quinze anos e meio e quando foi casar com o juiz. O juiz disse que não podia casar com quinze anos e meio, que teria que voltar dali 6 meses quando ela tivesse dezesseis anos. A minha mãe adorou isso, porque ela não queria casar de jeito nenhum, com meu pai. E, a minha avó na saída do cartório passou na igreja e o padre disse que casava a minha mãe, no religioso, sem problema da idade. E, ela correu e fez a mãe, a minha mãe se casar com meu pai, com quinze anos e meio. Tendo prometido para o padre que quando ela fizesse dezesseis anos, casaria no civil, mas coisa que nunca aconteceu, ficou sempre valendo o casamento no padre. Por conta disso a minha mãe não gostava de padres. (Risos) Porque o padre que tinha feito ela perder o mineiro dela.
E1: (Risos) Eita!
R: E se casou com o baiano, afinal de contas eles se deram bem. Meu pai e a minha mãe, apesar de que não era o casamento que ela queria, não era o marido que ela queria, mas se deram muito bem. Até por conta da educação que as mulheres recebiam naquele tempo. Casadas elas tinham que servir ao marido, obedecer ao marido. E meu pai era gente muito boa, ele cantava lá da Bahia, botava todos os filhos para dormir. Ele ninava no colo e tudo. Ela gostava, sobretudo, de duas coisas do meu pai: o fato dele ser um excelente trabalhador, era um homem trabalhador; e o fato dele gostar dos filhos e tratar bem os filhos e tudo.
E1: Professora, e ele trabalhava com qual era a atividade dele, professora?
R: Ele era lavrador, carpia café, fazia o serviço de lavoura mesmo, mas um lavrador bem simples mesmo. O puxador de enxada, como se dizia naquele tempo.
E1: E quando vocês migraram para São Paulo, só migraram a senhora, seus irmãos e sua mãe? Ele foi junto?
R: Não, foi todo mundo, ele foi junto. Aí, meu pai arrumou em São Paulo, um serviço muito pesado. São Paulo estava se urbanizando ainda, de 1948 para 1949. E, ele foi trabalhar na arrumação de ruas que seriam asfaltadas ou casadas. Então, que tinha que fazer a parte do esgoto. Então, ele era abridor de valetas, ele abria valetas na rua. Um trabalho muito pesado, mas que ele, com a experiência dele, experiência de lidar com a terra no interior. Era muito bom, mas ele era tão bom, que se esforçou tanto que acabou ficando com problema no coração. Ele ficou com o coração dilatado. E, quando se registrou que ele não poderia mais fazer esse tipo de serviço. E, sem formação escolar nenhuma, apenas com a experiência de lavrador. Ele nunca mais arrumou serviço. E, ele ficava em casa e, na verdade, não trabalhou mais. Mas nós éramos em muitos irmãos, e meus irmãos mais velhos já estavam todos empregados. Já trabalhavam, então foi possível a ele, ficar em casa se cuidando até quando ele morreu em 1956. É cinquenta e seis parece que foi, que ele morreu. Eu me lembro bem dele, claro, mas eu ainda era criança quando ele faleceu [15:42].
E1: Oh, professora, quando a senhora saiu de Sertãozinho, vocês migraram.
R: Não, eu não saí de Sertãozinho, a gente saiu da fazenda.
E1: Da fazenda, isso da fazenda
R: Eu não cheguei a conhecer Sertãozinho. Eu conheci Sertãozinho bem mais tarde, quando eu fiz uma viagem para o interior, que eu sobrinha minha ainda morava lá em Jaboticabal. E, eu fui conhecer Sertãozinho, achei uma cidadezinha muito bonitinha e adorei que o jardim, o jardim de frente para a igreja, quase toda cidade do interior de São Paulo tem um jardim na frente da igreja, era todo plantado com rosas. Eu gostei muito de Sertãozinho, mas foi a única vez que eu estive lá.
E1: Então, quando a senhora, vocês foram para São Paulo, saíram dessa fazenda e foram para a São Paulo, quais foram os bairros que vocês foram para lá? Qual foi o bairro que a senhora ficou a sua infância? Se ficou a infância e a adolescência? Como foi essa infância? Se trabalhou na infância, quais foram as memórias que a senhora tem dessa infância lá em São Paulo?
R: Olha, é, nós fomos morar em um bairro que se chamava Parque Peruche, mas que era uma instituição de um bairro maior, chamado Casa Verde. E, quando nós estávamos indo da estação de trem para a casa que a gente iria morar, é aqui. A minha irmã mais velha, que é essa que tem 92 anos agora, com a qual eu moro. Ela mencionou, disse que nós estávamos passando pela casa verde, que era o bairro, e eu fiquei muito, muito intrigada, porque não via nenhuma casa verde, por que que pintada de verde? (Risos) Ai a Casa Verde foi apenas a passagem para a gente ir para o Parque Peruche, eu não me lembro mais o nome da rua. Esqueci o nome da rua, mas era uma rua importantíssima do parque Peruche, porque nela morava o Kid Jofre, pai do Éder Jofre, que foi um dos primeiros boxeadores importantes do Brasil. Então, ele era quase nosso vizinho. Então a criançada do bairro, "nós morávamos na mesma rua que Éder Jofre", que depois se tornou famoso. E tudo, mas nós não, nós moramos lá, eu não me lembro. Acho que até 1950, 51, quando a gente se mudou para outro bairro já bem longe de lá, chamado Vila Bela, mas depois mais perto da moca, depois da Vila Prudente. Longe da Casa Verde e do Parque Peruche.
R: Lá no Parque Peruche, é... eu só brinquei lá, eu só brinquei, porque era muito pequena ainda, mas eu já ajudava em casa sim, de vez em quando minha mãe me botava uma vassoura na minha mão para eu ajudar a varrer a cozinha, varrer a sala. Era uma casa muito pobre a família era pobre, meus irmãos operários, a minha irmã que trabalhava era empregada doméstica, mas como eram muitos, dava para sustentar a família. De modo que a minha mãe costumava dizer com um certo orgulho assim - Dinheiro a gente não tem, mas nunca passamos necessidade. Sempre para comer para vestir, de maneira simples como os pobres, como as famílias pobres dos bairros de São Paulo, não chegava a ser periferia, com um ônibus a gente ia para o centro da cidade. Essa vida de pobre que ascendeu a classe média, a partir do trabalho de operários, de operários. Na verdade, parece que naquele momento, São Paulo estava crescendo, se industrializando, mesmo. Os operários, os que trabalhavam como operários, tinham alguma possibilidade de ascensão. E no caso da minha família era porque era bastante gente, nós éramos onze irmãos.
R: A minha mãe contava que teve vinte filhos, porque ela contava um natimorto e dois abortos espontâneos que ela teve. Na verdade, ela teve dezessete filhos. Desses dezessete, houve a cota de mortalidade infantil que as famílias pobres do interior sempre tinham. Então, se tornaram adultos onze, onze filhos, então nós éramos, quando nos mudamos para São Paulo, onze.
E1: O nome deles? Professora.
R: Onze irmãos, e em 1950 faleceu a minha irmã mais velha, que sofria de epilepsia desde pequena. Ela morreu perto, ela morreu devia ter uns trinta, trinta e poucos anos...
R: Aí, desse Parque Peruche em 1950, eu acho, nós mudamos para Vila Bela, que era uma área, o Parque Peruche era um bairro, assim... com predominância de habitantes negros. Na minha infância, no nosso grupo de amigos, tinha sempre Roberto branco, Roberto preto, Eldete branca, Eldete preta, a Marlene branca, a Marlene preta, e o preto e branco era apenas a designação para identificar, não havia nenhuma espécie de discriminação, por ser preto ou branco, nesse nível social não havia. Quando nós mudamos para Vila Bela, foi uma situação muito engraçada, porque lá se inverteu, a Vila Bela, que era perto da Vila Zelina. Um pouco depois da Vila Prudente, era uma área de predominância de imigrantes eslavos, havia um grande número de lituanos lá, nossa vizinhança era de lituanos, predominantemente poloneses, húngaros, russos, e as discriminações raciais que existiam eram exatamente ao contrário. Eles, os nossos vizinhos, nos chamavam de macacos, porque a gente... A minha família é uma família de brancos, eu sou a mais escura da família, era a negrinha da família, a nega preta da família, mas essa minha irmã, por exemplo, da qual eu cuido agora, era ruiva, ruiva sardenta. Porque era muito mistura, meu pai todo de família branca, minha mãe, filha de uma italiana com um mulato pernambucano, deu uma mistura genética, assim que na minha família tem gente de toda cor e de todo tipo de cabelo, cabelo crespo, cabelo liso, o chamado cabelo bom e cabelo ruim, que era como eram chamados os ‘pixains’.
R: Na Vila Bela, então a discriminação, não era exatamente de raça, mas étnica. É porque tinham os poloneses, que chamavam a nós brasileiros de macacos e nós os chamávamos de bicho d'água, porque eles eram muito brancos. Então eles eram os bichos d'água, olho de gato, olho cinzento, havia essa... eles, eles nos chamavam de macacos e nós os chamávamos de bicho d'água, mas só nas horas da briga, quando por algum motivo a gente brigava. Estávamos brincando de amarelinha, aparecia algum entrevero. A gente usava essas discriminações, mas quando na situação normal, eu não sentia, até onde me lembro. Não sinto essa condição de ser de uma origem e o outro ser de outra, como estabelecendo preconceito, entende? As famílias eram amigas, não tive esse... o problema. A gente nunca nem tinha ouvido falar em raça, o problema lá era a cor, os mais escuros, os mais claros e tinha designação de nacionalidade, os poloneses, os lituanos, os húngaros, que eram os três grupos predominantes lá, e russos, havia muitos russos.
R: Eu tive até uma experiência muito engraçada. Porque a gente sabia que os poloneses tinham vindo para o Brasil fugindo dos russos, os húngaros tinham vindo para o Brasil fugindo dos russos, os lituanos tinham vindo para o Brasil fugindo dos russos. E, os russos? Vieram fugindo de quem? Porque tinha russo também. Ai, um dia eu levei essa dúvida para a professora. A professora disse que - Não é que poloneses, lituanos, estonianos e russos vieram fugidos dos russos, todos vieram fugindo dos comunistas. O problema foi o comunismo na União Soviética, na antiga União Soviética, que expulsou toda essa gente boa de lá, e eles foram parar no Brasil, ali na Vila Bela. É isso.
E1: Então, eu vou passar para a Célia, mas já é uma coisa para a senhora... a senhora começou a ser escolarizada nesse lugar? Foi a primeira escola que a senhora foi nesse lugar ou foi lá na Vila Peruche?
R: No Parque Peruche? Não.
E1: Qual foi o lugar que foi sua primeira escola? Aí depois, Célia continua.
(Risos)
R: Olha, eu, eu sempre considerei que minha primeira escola foi a brincadeira de escola, que a gente tinha lá no Parque Peruche. É... das... era quase nossa vizinha, tinha uma casa no meio entre a nossa e a dela. Tinha a Marlene e a Sônia, que eram as minhas amigas. A Marlene era a única que tinha idade que ia na escola, então na brincadeira de escolinha ela era sempre a professora. Porque era só ela que sabia como funcionava a escola e ela que estava na escola. Nessa brincadeira de escola, foi... despertou o primeiro desejo que eu me lembro de ter tido na vida, que era o de ir à escola. Mas, naquele momento o ir para a escola não estava associado ainda ao aprendizado, eu queria ir para a escola para na brincadeira eu poder ser a professora também, porque a Marlene como professora era muito brava. Ela punha a gente de castigo, e o castigo pior que ela dava para mim e a irmã dela, era ficar no canto, com a cara virada para parede em silêncio. O ficar em silêncio, sem poder falar, para mim era o maior castigo. Meu desejo de ir para a escola é porque aí eu podia, na brincadeira, ser professora também e botar a Marlene de castigo com a cara na parede em silêncio, entende. (Risos)
R: Mas, não foi aí no Parque Peruche, eu não cheguei a ir para a escola. Quando eu fiz sete anos, a coisa que eu queria era ir na escola. A minha mãe foi no grupo escolar, lá que seria o grupo escolar a onde a gente poderia ir e simplesmente não havia vaga. Segundo a informação que minha mãe recebeu, nos próximos dois anos, não haveria vaga. Então, eu deveria entrar na escola lá quando eu tivesse uns nove anos. Foi o meu maior desespero. Aí antes disso, a gente mudou de Peruche para Vila Bela, mas a gente mudou para Vila Bela em 1950. Eu nasci em 42 eu já tinha oito anos. Mas aí lá com todos os meus irmãos trabalhando, é... a família mais o menos segura ali. A minha mãe nos matriculou em uma escola particular [30:04] fundada por lituanos. Uma escola que o nome dela eu vim descobrir bem mais tarde. Era o nome de um rei da Lituânia Vytautas. A escola se chamava, escola mista brasileira Vytautas D.L.K, isso queria dizer, escola mista brasileira Vytautas grande rei da Lituânia, é... e. Outra vez a outra professora mandava a gente escrever escola mista brasileira D.L.K Vytautas, eu nunca entendi a diferença, e também nunca me lembrei de perguntar. A professora também nunca explicou, até que um colega meu, lituano, mais tarde, me disse que é porque na língua lituana tem declinações também, então é, Vytautas D.L.K era Vytautas, grande rei da Lituânia, e D.L.K Vytautas era o grande rei da Lituânia Vytautas. [31:07]
R: É... então foi nessa escola que eu fui matricular, que a gente, que a minha mãe nos matriculou, era uma escola relativamente barata e a minha mãe ainda tinha desconto porque matriculou três de uma vez. Eu, o meu irmão e um sobrinho meu, neto dela, que veio para São Paulo, morava na fazenda e veio estudar com a gente, na fazenda onde o pai dele trabalhava. E, depois ainda entraram as minhas duas irmãs, quando a idade foi suficiente. Então, a minha mãe tinha preço por atacado, entende? E aí, era a mensalidade um pouco mais barata por isso e a gente estudou.
R: E eu comecei a estudar em julho, em... é em julho, depois das férias de julho e... mas ai, consegui nesse meio de ano passar de ano, ser alfabetizada, fazer o primeiro ano, e foi para o... porque a minha tinha colocado assim, para a gente se acostumar com a escola ai ela. A primeira professora que tinha, com quem ela nos matriculou. A primeira chamava dona Diva, a dona Diva era uma senhora gorda que só, bem gorda. E ela sabia do trato, ela tinha consciência do trato com a minha mãe, que nós estávamos lá só para nós acostumarmos com a escola. Então ela não dava assim muito importância para ensinar. A gente tinha a cartilha, ela mandava estudar a cartilha. E eu estudava com o auxílio do meu irmão, que me ajudava nisso, eu estudava três quatro lições a frente. AÍ eu queria sempre que ela me deixasse ler todas, mas ela me deixava ler uma ou duas e depois - Não essa aí fica para amanhã. Por conta do acordo que ela tinha com a minha mãe, que não tinha muita importância.
R: Felizmente, acho que em setembro, essa professora saiu e veio uma outra professora, chamada dona Ruth, que foi das melhores professoras que eu conheci, das melhores professoras que eu me lembro, e a dona Ruth não sabia do acordo com a minha mãe. Então, o que ela fazia com a gente era estimular para a gente ir o mais rápido possível. E, aí então, eu sempre com o auxílio do meu irmão em casa, me adiantei me adiantei. E o meu, a minha primeira grande conquista foi, eu fui para o livro. Eu sai da cartilha e fui para o livro, que era como era, você ficava um tempo na cartilha e quando chegava na última lição da cartilha. A última lição dizia que a gente já estava alfabetizada, a cartilha dá Benedicta Stahl Sodré. E, a gente já estava alfabetizada e já podia ir para o livro, e eu fui para o livro junto com a turma, porque eu... como essa professora dona Ruth, é... tudo que ela fazia era...é, estimular a ação dos alunos. Então, ela estimulava isso, mas eu é... tenho plena consciência que eu fui para cartilha da Santa Lucia e um São Jorge. Porque eu é... porque na última lição do livro, da cartilha, o problema era como se lida com o que, q, u, e, o que, q, u, i, q, u, a, qua, que, qui, quo, o "quu", eu acho que não tem, e o G o grupo G, g, u, i, g, u, e. E, a Lúcia, a minha vizinha de carteira, sabia isso, porque ela já estava há mais tempo. Ela sabia dessas lições, quando ia ser o dia de apresentar essas lições. Eu pedi para ela me ensinar, e olha minha sorte, eu tinha uma Santa Lucia, que eu tinha ganhado não sei de quem, eu tinha ganhado uma imagem da Santa Lucia e tinha um São Jorge, uma imagem do São Jorge. Eu troquei a imagem de São Jorge e a imagem de Santa Lucia, para ela me ensinar como funcionava o conjunto, q, u, g, u. E, aí eu entrei no livro junto com a turma, porque eu dei conta da última lição da cartilha, porque a Lúcia me passou como funcionava o, q, u, a, q, u, i, e o g, u, a, g,u,i. Foi assim, graças a Santa Lucia e a São Jorge e à catolicidade da minha colega (Risos) que curtia isso.
E2: Okay, professora, e a senhora falou da escola, falou das professoras. Eu queria que a senhora se pudesse, se lembrasse, ainda falar um pouco, descrever um pouco, o prédio, o pátio, a sala, e falar um pouco dos professores e professora? A senhora já trouxe a dona Diva e depois a dona Ruth, e agora que outros professores marcaram ou foram marcantes para a senhora e por quê?
R: Oh, essa escola lituana, o prédio ainda existe, foi transformado em um bife, em um salão de festas, até o aniversário de quinze anos de uma sobrinha muito querida nossa foi lá. E, eu me lembrei da escola, é, é, ela nem tinha muito as características das escolas, ela foi improvisada como escola, naquela época, os grupos escolares eram feitos de madeira. Aquela escola não, era um prédio sólido, que era da colônia Lituânia, Lituânia, que tinha feito para atividades da colônia lituana, entre outras coisas festas. Ela tinha duas, duas salas bem grandonas. Uma das salas foi dividida então ficaram três salas, ela tinha um porão muito alto, que os meninos acabaram descobrindo um jeito de entrar no porão. E, quando eles brincavam de mocinho e bandido eles usavam o porão como, é... prisão. Ela tinha um jardim na frente formado por três plantações do que a gente chamava de buxo, era um arbusto que permite inclusive ser esculpido. Tem um bocado desses nos parques em São Paulo. Eram três e nossa brincadeira consistia em rodar por esses buxos, nos escondermos lá.
R: É... mas como tinha poucas salas, as classes não eram divididas. Na mesma sala tinha o pessoal do primeiro ano, do segundo ano, do terceiro e do quarto. E, a professora coitada é quem tinha que organizar o atendimento de cada uma das séries da mesma classe no mesmo horário. Elas eram um gênio, aquelas professoras. Essa professora Ruth, que eu disse que foi uma das melhores professoras que eu já conheci, ela, ela era interessante porque em uma classe que tinha alunos do primeiro ano, do segundo ano, do terceiro e do quarto ano, ela tratava quase que individualmente aluno por aluno, o número de alunos não era muito grande. Era uma escola particular, tinha pouca gente. Mas ela era incrível, ela fazia os alunos se ajudarem, quer dizer, eu diria que foi minha primeira experiência em estudo em equipe, ela botava na mesma carteira dois alunos lendo o mesmo texto, conversando sobre o mesmo texto, para depois cada um escrever a sua opinião. E ela, como a escola não tinha recursos, esse tipo de recurso, ela levava de vez em quando os alunos na casa dela, para ela mostrar o piano, para fazer a gente tocar piano, exibir quadros, que ela tinha em casa, dando uma espécie de iniciação em educação artística. Ela era excelente.
R: Isso foi a professora do primeiro ano, com a qual eu só fiz meio ano, mas, para surpresa da minha mãe, como a dona Ruth não sabia do acordo, que a gente estava lá apenas para nos acostumar, a gente passou, eu, meu irmão, passamos do primeiro para o segundo ano. No segundo ano a professora se chamava Davinha, e eu nem me lembro muito bem dela, porque ela era uma professora muito formal. Ela chegava, passava a lição, passava o exercício que a gente tinha que fazer, e a gente fazia, sem maiores, sem maiores discussões. Era uma professora bem formal, mas foi o suficiente para a gente prosseguir o aprendizado.
R: Depois, no terceiro ano, nós passamos a ter uma professora polonesa, chamada, chamava, Gênia Jursos Cones [41:32]. Eu acho que ela era um gênio. Essa mulher era um gênio. Ela era brava, ela não era essa professora primária adocicada não, ela era bem rigorosa, exigia, conseguia manter a classe em silêncio. É fazia, possibilitava interação entre os alunos da mesma série, dava, era sempre assim, a turma do primeiro ano, do segundo ano, do terceiro e do quarto. Ela, no fim da aula, ela passava para cada uma das séries uma lição de casa e, de modo que, quando começava a aula. Ela cada um, cada uma das séries, tinha que estar com seu caderno com a lição feita, revendo a lição. Ela cobrando a lição de série por série. E ela fazia isso de um jeito tão eficiente, que todo mundo sentia como se estivesse tendo as quatro horas de aula e não um pedaço da aula só, ela era realmente muito boa professora. Mas ela era rigorosa, e parece que naquele tempo ainda não era proibido, ou se fosse, ela fingia que não era. Ela batia com a régua na mão de quem conversava muito. É eu conversava muito, mas não adiantava bater na minha mão que eu conversava de todo jeito. Às vezes, ela me batia na cabeça, eu tinha muito cabelo, nem sentia a dor. Aí ela bolou um truque, para eu não falar muito lá com os colegas e nem incomodar, ela me punha na lousa marcando quem conversava. Então, eu quem iria marcar quem conversava para receber castigo depois. Até que eu saquei, com isso ela impedia que eu ficasse conversando (Risos). Porque eu estava na lousa marcando quem conversava. Mas é... no fundo, ela ocupava tanto a gente com as lições com as atividades, que era muito interessante.
R: E, ensinava, assim é... o programa estabelecido para o primário depois do terceiro ano. O primeiro ano era a alfabetização, mas depois do primeiro ano a gente tinha língua, aritmética, linguagem, aritmética e conhecimentos gerais, que incluía história e geografia. E, ela dava a aula, sempre tinha, a parte de língua, a parte de aritmética e a parte de conhecimentos gerais, em toda aula tinha.
R: E uma das coisas que eu me lembro e depois, quando eu comecei a acompanhar o trabalho escolar. Era o tanto que ela fazia a gente escrever, é... havia na escola uma espécie assim de painel, era um conjunto muito grande de figuras, de quadros. Eles ficavam em um painel assim, a professora virava, cada dia expunha um. E, cada painel que ela expunha, ela cobrava da gente. Nesse tempo, eu já estava no quarto ano, mas mesmo da turma do terceiro ano, mas principalmente do quarto ano. Ela cobrava que, de cada uma das figuras, a gente fizesse primeiro uma descrição, à vista de uma gravura. Então, era só para você descrever o que estava vendo, depois ela pedia uma narração à vista de uma gravura, e depois ela pedia uma composição à vista de uma gravura. Então, na descrição era só descrever, na narração era já identificar um pouco, então, por exemplo, tinha uma menina sentada em um banco, na descrição eu dizia - uma menina sentada no banco, na narração eu já tinha que dizer que, essa menina tinha vindo da casa dela e sentada, sentou no banco. Na composição à vista de uma gravura, eu já tinha que compor uma história que explicasse a presença dessa menina sentada no banco.
R: Eu achava, quer dizer, na ocasião eu achava que era assim mesmo, que isso era normal. Mas depois quando eu passei a acompanhar o desenvolvimento de leitura e escrita, nas outras escolas, nas outras fases já, e sobretudo atualmente, que eu me dou conta de como o processo de ensinar a ler e a escrever usado por essa professora era especial. Era de uma... não sei se em todas as escolas se fazia isso, mas ela fazia isso. E para mim, eu aprendi a ler e a escrever nesse processo.
R: É... e eu já não gostava muito da parte de aritmética, mas fazer contas, mas ela cobrava também e a gente fazia também. E os conhecimentos gerais, os conhecimentos gerais eram basicamente, países e capital, rios, afluentes dos rios, era essa descrição geográfica praticamente, distinguir montanha de planície, coisas assim. E, história, era o velho, nome, fato, data, não ia além disso, mas eram todos os nomes, todos os fatos e todas as datas da história do Brasil (Risos). Ela dava conta disso tudo.
R: Ela, como eu disse, não se reprimia com castigo físico. Aí uma vez ela exagerou, porque meu sobrinho já estudava lá também. E ele era muito mal comportado, muito indisciplinado. Um dia ele não parava de falar e ela jogou o sino, o sininho que a professora tinha, ela jogou o sino na cabeça dele, abriu aqui e fez um cortezinho.
(A professora aponta para a própria testa com o dedo, na lateral direita, um pouco abaixo do couro cabeludo)
R: Claro, meu sobrinho foi embora, e no outro dia a minha irmã mais velha, minha madrinha, que era minha madrinha. Foi lá, cobrar dela, e ela disse que, se a família tinha todo direito de denunciá-la, que ela sairia, seria substituída. A minha irmã queria fazer isso, mas quando ela foi falar com a minha mãe, a minha mãe falou - não, que eu sei o que uma sala cheia de moleque e menina faz. Eu acho que ela tem é paciência demais, e ela é uma ótima professora. Ela não vai mais fazer isso, deixa as crianças lá, deixa sossegado. E a minha mãe dizia isso porque, às vezes, ela passava perto da escola quando estava tendo aula e ela ouvia o barulho que a gente fazia lá, então ela achava que a professora aguentava demais. E, que assim, foi um deslize dela, foi uma imprudência dela, mas ela contornou e foi, estava no fim do ano, já era outubro isso - Vai trocar de professora, vai ser uma confusão, deixa a dona Gênia lá mesmo. E aí ficou assim. Mas o meu sobrinho passou a ficar mais quieto na escola, mas bem comportado na escola (Risos), não queria levar outro sino.
R: Essa professora ela tinha muita sagacidade. Ela fazia ditado, a gente fazia ditado, e depois ela via o ditado e cada erro que a gente cometia no ditado ela mandava a gente escrever aquela palavra cinquenta vezes. Uma vez em um ditado tinha a palavra machado, e eu não sabia se machado era com x ou ch, e aí em uma primeira vez eu escrevi ou com x ou com ch, apareceu de novo a palavra machado, eu escrevi diferente, uma vez com x outra com ch, porque eu calculei assim, uma das duas vai estar errada. E, por esse erro vou ter que escrever 50 vezes, mas não enganei a professora, a professora vendo aquilo falou - Isso demonstra que você não sabia como se escreve machado. Então você vai escrever 100 vezes, o machado do x e o machado do ch. (Risos), não enganei a professora. Ela era esperta.
E2: Aí, professora (Risos). Pois é, são realmente, é uma professora marcante.
R: É, foi absolutamente marcante.
E2: Professora Joana, vamos para. Isso aí é infância, vamos agora para a parte da juventude. Assim, a senhora passou a juventude aí nesse mesmo bairro? Se passou ou se não em qual cidade? Qual era a principal diversão da época? E, se a senhora se sentir à vontade para falar um pouco da sua vida afetiva, como ela se deu, essa relação, escola, casa, essa sociabilidade fora da escola. Ai, queria ouvir um pouco isso, se teve filho, se esse relacionamento, qual idade que eles têm hoje, enfim.
R: Nós vamos começar por aí, não tive filhos, tenho um mundaréu de sobrinhos, não tive filhos. É... na Vila Bela, que era onde era essa escola, a gente brincava na rua, o espaço da brincadeira era a rua, a rua não era a calçada, a rua não tinha muito trânsito, a gente brincava o grupo no qual eu fazia parte, nós brincávamos muito de amarelinha, a gente desenhava as amarelinhas, o desenho da amarelinha, na rua, ou de caracol, os meninos jogavam futebol. Havia sempre um certo problema, que o futebol dos meninos de vez em quando invadia a amarelinha das meninas, e o caracol das meninas era apagado, pelo, pelo, pela bola e pela corrida dos meninos. E, isso dava muita encrenca, até que um dia a gente acabou chegando em um acordo. Quando a gente brincava de amarelinha e caracol, os meninos brincavam juntos e, quando eles jogavam futebol, a gente ficava na torcida. E tinha uma menina que jogava futebol. Eu sempre tive muita inveja dela, porque eu gostaria de jogar futebol. Uma das coisas de que eu tinha vontade era de jogar futebol.
R: Os meus irmãos todos eram ligados a futebol. Um dos meus irmãos foi um dos grandes craques da várzea paulista, da várzea paulistana. Ele tinha o apelido de cavadeira. Todo mundo o conhecia, muitas vezes eu conseguia coisas, porque eu era irmã da cavadeira. Uma das coisas, por exemplo, eram os motoristas de ônibus, que deixavam a gente entrar pela porta da frente para não pagar passagem, porque nós éramos as cavadeirinhas, eu e as minhas irmãs. A cavadeira virou quase codinome da família. O outro meu irmão, que está ainda aqui comigo, também joga futebol, e também era muito bom de bola. Cavadeirinha, o outro meu irmão era o outro cavadeirinha, que por causa do futebol e o mais velho era o cavadeirão, mas o mais velho não jogava muito bem. Jogava mal, mas ele era o diretor do time, o técnico do time de várzea. o Fluminense da Vila Bela, meu irmão jogava no botafogo da Vila Bela.
R: A Vila Bela, a rua que a gente morava, terminava em um morro, onde hoje é um cemitério, onde tem um crematório da Vila Albina. Aliás, essa foi uma coisa que me doeu muito, o espaço onde a gente brincou a infância quase toda ser transformado em um cemitério (Risos), mas tudo bem, faz parte da vida. [55:44]
R: E era nesse espaço que a gente organizava as brincadeiras, os meninos jogavam. E, assim eu fazia uma chantagem com meu irmão e com meu sobrinho, para eles me arrumarem um jeito de eu jogar. No timezinho que os moleques faziam, que era assim: se eles, eles, a gente podia brincar, os meus irmãos, meu irmão e meu sobrinho podiam brincar do que quisessem, só não podiam ir nadar no Riachão. Tinha um riacho lá, um buracão lá, que tinha água e os moleques iam nadar lá. Então eu, a minha mãe, só não queria que eles fossem nadar lá, e eu sabia que eles iam, então eu fazia chantagem - Se vocês não me arrumarem lugar no jogo, eu conto para mãe que vocês vão nadar no buracão. Aí eles me arrumavam, mas como eu era muito ruim de bola, eu não era como a Kelsa Oscar, que jogava bem. E, os meninos a queriam no time, eles sempre me punham no gol. E, no gol que dava para uma valeta que tinha, de modo que se eu não defendesse a bola e a bola passasse, eu era quem tinha que pegar a bola na valeta. Tive que muitas vezes correr atrás da bola, para pegar a bola antes que ela caísse da valeta. Era uma das minhas grandes frustrações. Eu não ser boa de bola, não, nunca consegui ser boa de bola... Tanto que hoje eu não assisto futebol feminino de inveja. Porque elas jogam bem e eu nunca poderia ter virado uma craque de futebol, é isso.
(Risos)
E2: Certo, professora, então a senhora, Marta, está aí arrasando.
R: Uhummm! olha aí, menina, você está vendo, e tem uma formiga também, que também é muito boa de bola. O Brasil tem muita gente boa de bola, muita mulher boa de bola, e eu fico com inveja delas.
E2: Formiga se aposentou agora, né?
R: É foi, foi.
E2: Foi.
E2: Professora, e sobre. [58:06]
E2: [59:56] Professora, eu queria que se a senhora falasse um pouco da sua vida afetiva, se você se sentisse à vontade. Assim, nesse momento, que a senhora coloca a questão de gostar de futebol, da brincadeira com os meninos, mas assim a senhora já está jovem, como é que foi essa questão de namorinho de paqueras?
R: Nunca tive um namorado, não namorei, não namorei, não tinha namorado. Segundo um primo meu. Eu não arrumava namorado porque eu muito rapidamente me tornava amiga dos meninos. E, os homens não namoravam amigas. Então, não tive namorado, realmente não tive namorado. Eu me apaixonei por um colega da escola, mas era essas paixões assim de criança (1:00:49). Não...ele estava um ano à minha frente, depois ele se formou, saiu do grupo, nunca mais eu vi, nunca mais eu tive contato. É... não... E, assim, ao longo da vida, não namorei, depois, quando eu já trabalhava, e aí fui para Aquidauana. Em Aquidauana, eu arrumei...não eram namorados, mas eram relacionamentos afetivos. Lá eu tive dois bem gostosos. Bem... que me deram muita satisfação afetiva, física e tudo. Mas tudo assim, sem nenhum compromisso, eu nunca estive comprometida com homem nenhum. (1:01:47)
R: Uma vez, um sobrinho meu, pequenininho, é na verdade sobrinho neto. É... ele, um priminho dele, tinha passado as férias, ele morava, mora na Paraíba, e eu, no tempo que estava lá e tudo. E, um sobrinho dele, um primo dele, daqui de São Paulo, passou as férias, e ele achou muito gostoso ter um primo com quem brincar, com quem sair. Ai, o primo foi embora para São Paulo, ele me perguntou, por que que eu não casei para ter um filho para brincar com ele? Ele não conseguia realizar bem a genética e a idade, porque se eu tivesse tido um filho teria brincado com o pai dele e não com ele. Mas eu disse para ele assim, que eu nunca me casei porque ninguém nunca me pediu em casamento, ele perguntou - E por que você não pediu? E aí eu me dei conta, de que eu realmente nunca vivi, afetivamente, uma relação que tivesse esse percurso, namoro, noivado, casamento. Era sempre um relacionamento, e era enquanto estava sendo, não tinha nenhuma perspectiva de evoluir para nada. Entende? Não era namoro que viraria noivado, não era noivado que viraria casamento. Era o relacionamento que eu estava tendo. E eu tive uma porção deles, eu diria todos muito agradáveis. [01:03:29]
R: Quando eu fui para a Paraíba, logo depois que eu cheguei na Paraíba. Eu fui em 78 para a Paraíba. Eu cheguei em um domingo, um domingo, e na sexta feira seguinte, eu já comecei um caso, eu sempre tive casos. Como o que eu considero que foi o grande amor da minha vida. Que durou, esse nosso caso, durou enquanto ele viveu, em 1978 a 1993, quando ele infelizmente faleceu. Um colega da universidade. Eu ia dizer que prefiro não dizer um nome dele, mas todo mundo sabe. Todo mundo que me conhece sabe, mas é melhor preservá-lo. É um colega, um colega do departamento, um dos melhores professores de história, um dos melhores historiadores que conheci, muito bom. E a nossa finitude tanto era profissional, intelectual, como a proximidade afetiva, mas assim, sem nenhuma perspectiva de casamento, sem nenhuma perspectiva de filho. Filho, na verdade, eu nunca quis ter. Eu nunca desejei ter filhos, e um dos motivos, pelo menos quando eu era adolescente, eu explicava assim: por que eu nunca ia ter filhos? Porque eu jamais seria uma mãe como era a minha mãe. Eu achava assim a minha mãe perfeita. E, eu tinha plena consciência de que jamais seria uma mãe como ela. Então, eu falei - Ninguém merece ser filho de uma mulher, que não pode ser a mãe que devia ser. Eu nunca quis, realmente essa foi uma perspectiva que nunca se colocou para mim, ter um filho.
R: Uma com cunhada minha disse uma vez, definindo a situação da mulher que não se casa, não tem filho. Ela dizia assim - Deus não me deu filhos, o diabo me mandou um mundaréu de sobrinhos. Eu digo que esse é o meu caso (Risos). Mas, até agradeço o diabo, porque os meus sobrinhos são maravilhosos.
E2: Que bom, professora. Sobre isso, a senhora tocou no assunto do seu trabalho, eu gostaria de ouvir um pouco, nós gostaríamos de ouvir um pouco sobre a sua decisão profissional. Como é que foram essas escolhas? O que você lembra dessas primeiras vivências que marcaram sua formação inicial? E, se você puder contar um pouco sobre a sua decisão pelo ensino de história?
R: Certo.
E2: E, essa pergunta, esse item, ele tem mais algumas coisas, mas aí a gente vai ouvindo essa primeiro, pensando inclusive as principais referências, no início e ao longo da sua trajetória, todas relacionadas no caso ao ensino de história? E, as primeiras atividades ao longo dessa sua trajetória na docência.
R: Olha, como eu disse, quando eu tive vontade de ir para a escola, não era por conta dos conteúdos que eu iria aprender. mas quando eu estava no segundo ano, não, no terceiro ano do ginásio, eu passei a ter uma professora de história, Maria Parecida de Castro, que me encantou, me encantou. Eu cresci ouvindo histórias, o meu pai era um grande contador de histórias, a minha mãe era uma grande contadora de histórias, um tio que eu tinha, o tio Domingo, contava muita história. Eu cresci ouvindo histórias, então a narrativa histórica sempre foi uma coisa que me envolveu. Quando eu comecei a ter aula com essa professora, no primeiro e no segundo ano do ginásio, os professores de História não me tocaram assim especificamente, mas no terceiro ano eu passei a ter aula, e era história antiga e medieval, com essa professora, chamada Maria Parecida de Castro, que era muito melhor contadora de histórias que meu pai, minha mãe e meu tio juntos. Ela tinha uma narrativa organizada. Ela ia pondo um esquema na lousa, dando a aula naquele esquema. E, ela cobrava da gente que anotasse o esquema e depois da aula redigisse um texto. Eu tenho ainda um caderno desse terceiro ano. Eu tenho um caderno guardado. Quando eu estudei para o vestibular, eu usei, para parte de história antiga, esse caderno do ginásio. E, por sorte me caiu no vestibular a democracia grega, que eu tinha estudado com essa professora, e usei esse caderno. [01:09:20]
R: Essa professora me fascinava, terminava a aula eu sempre ia atrás dela com alguma pergunta, e principalmente, porque havia uma coisa no estudo de história, a história antiga, que me deixava muito intrigada. Quer dizer, a gente começava pelo Egito, depois os assírios e babilônicos, depois os gregos, os romanos, era esse o percurso. E, uma coisa, que me chamava atenção, era o que acontecia, o que tinha acontecido com aquele povo, depois que acabou o ponto? Eu sabia que, a gente estudava Egito antigo, mas eu sabia que ainda tinha o Egito. Então, qual era a relação entre aquele Egito que existia na antiguidade e esse Egito que existe aqui agora? E, eu vivia perguntando isso para a professora. Eu insistia muito com ela. Aí ela, e o interessante é que o meu interesse, e a minha insistência, parecia mais incomodar à professora do que agradá-la, porque tinha uma aluna tão interessada. Eu saía no corredor depois que a aula acabava para fazer perguntas para ela.
R: Aí um dia era sobre os Persas, eu adorei, eu adorava a história dos Persas, e eu queria saber o quê que tinha acontecido depois que os persas foram derrotados pelos gregos, nas guerras médicas, que fim levaram os Persas? Porque ainda tinham Persas. Eu ia e insistia com a professora que queria saber essas coisas, e aí ela me mandou ler Will Durant, que ele, é uma coleção de história, então eu pegava na biblioteca o livro do Will Durant, não tinha dinheiro para comprar, depois eu comprei a coleção dele, mais tarde. Naquele tempo não tinha, eu peguei a parte da história antiga do Will Durant, e foi pior, porque eu li o livro do Will Durant e eu ia perguntar para ela as dúvidas, decorrentes da minha leitura, não só da aula dela. Isso parecia que a irritava profundamente, não a satisfazia, mas a deixava irritada. Até que um dia, eu fui fazer uma pergunta para ela e ela disse - Isso, para você saber, você vai ter que fazer o curso de história. Eu falei, pois então é isso que eu vou fazer, vou fazer o curso de história, mas não vou ficar sem saber essas coisas. [01:12:06]
R: Quando eu passei no vestibular, eu fui agradecê-la. E, ao contrário do que seria de se imaginar, ela não mostrou satisfação nenhuma. Eu disse que tinha estudado pelo caderno, e ela, a única resposta dela, foi - Ainda bem que o caderninho foi útil. Foi a única coisa que ela disse, sem nenhum interesse. Ao contrário do professor de português do colegial, Lando Lofrano, o nome dele, que foi a pessoa que, digamos, acabou com a minha baixa estima com relação a escrever. Ele, eu fui falar para ele que tinha passado na faculdade, tarara, direto, sem ter feito cursinho, e tudo, ele sim demostrou muita satisfação, me levou na classe, falou - Olha aqui, a Joana passou direto, não fez nem cursinho e tá. Para estimular os outros alunos. Ele era professor de português, e era assim, eu achava, por conta da atitude da professora de português do ginásio, que eu não tinha talento para escrever. Essa minha professora de português do ginásio dizia que eu traia a língua, porque a prova de português era sempre assim, uma redação e duas partes de gramática. Era uma parte de gramática e análise e lógica. A redação valia quatro pontos e as outras duas partes valiam três cada uma, eu sempre tirava o seis das partes de gramática e lógica. E, a minha nota ia depender do que eu conseguisse tirar na redação, que era sempre baixa. Então, nunca passava de dois, dois e meio. Então, a minha nota em português era sempre os seis, que eu tinha tirado lá ou sete, sete e meio. E, essa professora conseguiu me convencer de que eu não tinha talento para escrever.
R: O professor de português do colegial, esse professor de português Lando Lofrano. Com ele eu já tive uma outra vantagem escolar, que foi que entrou a parte de literatura. E, aí ler e falar dos livros e falar dos autores, também era uma coisa que eu tinha muita facilidade. Mas, a minha redação continuava sendo sempre precária. E, quando eu estava no terceiro ano, na prova de outubro. Na sabatina de outubro, o professor, a prova ia ser uma redação, eu falei - Pronto, estou perdida, porque não vai ter a parte de gramática, a parte de análise lógica nem a parte de literatura, a minha nota vai ser bem baixa. Para minha surpresa, ele me deu sete no texto que eu escrevi. E, o texto era sobre a nossa perspectiva, a gente estava terminando o colegial e o quê que a gente ia fazer em seguida, o texto era sobre isso. E, aí tirei sete, já foi uma surpresa. E, o meu texto estava todo assinalado de vermelho, e não sei porque cargas d'água o professor me chamou e me explicou o que era cada erro, sabe, problema de concordância, problema de regência, problema de acentuação, problema disso, foi apontando as falhas que tinha no texto. Eu cheguei em casa, baseado, na correção que ele tinha feito, no que ele tinha indicado. Eu reescrevi o texto. Eu não era uma boa escritora, mas eu já era uma boa leitora, e percebi a diferença. E, aí descobri que a gente pode aprender a escrever sim, não é só uma questão de talento nato, questão de vocação e de saber, como algumas pessoas parecem ter. Você aprende a escrever, escrever também é produto de um aprendizado.
R: A partir dessa descoberta, eu comecei a sempre estudar os textos que eu escrevia. E, fazendo assim, ao contrário da Elza Nadai, que foi coautora comigo dos livros didáticos. Ela primeiro escrevia o texto de uma vez e depois ela ia trabalhando o texto. Eu não eu desenvolvi o hábito de primeiro fazer o esquema, um esquema geral, depois detalhar, detalhar esse esquema, depois o texto estava praticamente escrito, quando eu dava a forma literária ou a forma de texto mesmo para aquele conjunto. E, com isso eu, digamos, desenvolvi a faculdade, a capacidade de escrever. E, tive dois momentos de glória. Um foi já no último, no penúltimo, último ano de faculdade, quando um professor de história da América, que formou uma equipe, da qual eu fazia parte, e ele dizendo assim - Eu estou formando essa equipe, porque vocês são as quatro que escrevem melhor na classe. Então, era Ana Maria, Terezinha, Dorotéia e eu. E, eu então fui incluída pelo professor de história da América, como uma das quatro que escrevia melhor, falei - Ah! Cheguei lá. E, depois, quando eu era da diretoria da ADUF, não da diretoria da ANDES, que eu fui secretária geral da ANDES. A gente tinha na organização do trabalho da diretoria, tinha uma comissão de redação, aquele grupo que seria responsável pelos textos, que a entidade deveria produzir. Então, essa comissão era formada necessariamente pelo presidente da associação, e por duas pessoas indicadas. Eu era a terceira secretaria ou segunda secretaria, não sei, terceira secretaria. E, eu fui uma das indicadas a fazer parte da comissão de redação. E, o professor que me indicou para fazer parte da comissão disse assim - É porque a Joana escreve muito bem. Eu fique - Ah! cheguei lá.
R: Deixei de ter problemas com redação. Agora escrever para mim deixou de ser um problema. É trabalhoso, não vou dizer que é uma coisa fácil que sai assim espontaneamente não, escrever exige trabalho, exige elaboração, mas eu aprendi. Fiquei autora de livros didáticos com a Elza Nadai, e segundo um levantamento que a Margarida fez, escrevi trinta e cinco textos sobre o ensino de história. Eu nem nunca imaginei que fosse tanto assim (Risos). Tem lá, ela juntou, trinta e cinco textos, que eu escrevi sobre o ensino de história, que disse que deve fazer uma coletânea. E, eu quero fazer uma coletânea sobre textos de outros assuntos que eu escrevi, que estão aqui no meu computador. Eu estou atrás de um pendrive para ver se eu recolho eles e se imprimo, que eu fiquei sem impressora. Para elaborar esse conjunto de textos que tem escrito aí. [1:20:48]
E2: Qual a temática, professora?
R: Dos textos? Desses textos? A maior parte de coisas que eu escrevi foi sobre o ensino de história, são esses trinta e cinco textos sobre ensino de história que a Margarida levantou. Mas, olhando aqui no meu computador. Eu tenho textos de diferentes tamanhos e de diferentes temas. Dois dos últimos que eu revi outro dia, e gostei deles. Um foi a espécie, não é exatamente plágio, mas eu copiei o Vinicius, o Vinicius tem aquele texto que diz, que ele começa assim: - As feias que me perdoem, mas a beleza é fundamental. Eu escrevi uma réplica, mas inspirada nesse texto, escrito, que se chama assim: As mulheres que me perdoem, mas os homens são fundamentais. (Risos). Eu escrevo um pouco sobre a importância dos homens na minha história. São sobretudo primos e irmãos. E, um outro texto, que eu revi também, que eu gostei muito, que eu precisaria organizar, juntar ele em uma coletaneazinha. É um texto que é sobre que se chama, mulheres e a música. Eu faço uma análise, uma coletaneazinha, de como as mulheres aparecem nas músicas, começando com a Amélia, que era mulher de verdade. [1:22:48].
E2: Que interessante. Vamos continuar a entrevista, professora? quer parar um pouquinho? beber uma água? Ou, vamos seguindo?
R: Não, vamos seguindo, eu já bebi uma água a hora que eu saí (Risos).
E2: Pronto. Então, eu gostaria que a senhora falasse um pouco, a senhora já falou um pouco da docência, dessa relação, mas assim, qual a sua relação com a Educação Básica? Quais foram suas principais atividades, ações, no início e ao longo da sua trajetória na pesquisa do ensino de história.
R: Olha, a minha relação com a Educação Básica me definiu profissionalmente. Agora, porque eu tive o espetacular privilégio de ser professora no sistema de ensino vocacional. Eu diria que toda pedagogia com a qual eu me relacionei, todas as questões de ensino que eu tive a oportunidade de discutir e elaborar, têm a ver com meu trabalho vocacional, que era um trabalho feito na Educação Básica. Eu trabalhei no vocacional por cinco anos, dois anos no ginásio educacional em Barretos. Naquele tempo que a estrutura educacional era primária, ginásio e colegial. E, eu trabalhei em um ginásio em Barretos uns dois anos, e depois uns três anos no colegial. Eu fui uma das professoras que iniciou o segundo ciclo vocacional. E, eu diria a assim, toda a história da minha relação com o ensino tem a ver com esse trabalho no vocacional. Porque o vocacional, eu acho, foi o sistema mais completo e significativo de ensino nesse país.
R: Quando, há pouco tempo, se falou e se comemorou o centenário, o que seria o centenário de Paulo Freire. E, aí houve muita exposição da importância de Paulo Freire. Eu assistindo um programa na televisão, Papo com Zé Trajano, o Zé Trajano falando da importância do Paulo Freire, e da importância dos educadores, e só citou professores homens. As mulheres entravam na velha professorinha normalista, que ensinou o BÊ-Á-BÁ, que ensinava o BÊ-Á-BÁ. E, eu, nessa hora, eu tive vontade de integrar essa história de redes sociais, da qual eu não faço parte, e tentar corrigi-lo, falar - Olha, a professora Maria Nilde Mascellani, no meu entender, entendia muito mais de educação brasileira do que Paulo Freire. A obra de Paulo Freire é importante, aquela coisa de educação para o oprimido é importante, mas o que a Maria Nilde Mascellani fez na história da educação do Brasil, não tem igual.
R: Ela é uma porção de outras mulheres, tinham homens também no vocacional, Nilton Balzan, que era supervisor da área de estudos sociais, um cara muito bom. Tinham professores muito bons, mas o sistema de ensino vocacional reunia as pessoas que na minha opinião mais elaboraram na educação nesse país, Maria Nilde, a Olga Bechara, a Maria Cândida e as outras orientadoras aí, Yara Boulos, a Ivone, a Áurea Sigrist, a Edinete Ferreira de Sanchez, que eram as coordenadoras dos ginásios vocacionais, e que fizeram um trabalho excelente.
R: A minha tese de doutorado é sobre o ensino vocacional, que eu nem sei se dei conta de estabelecer toda a importância do sistema. Que foi uma importância que foi perdida por causa da ditadura. O sistema foi fechado pela ditadura. E, aí ele ficou obscurecido pelo que aconteceu depois. E, sobretudo, o trabalho assim, fora do vocacional, excelente de algumas professoras, que marcaram o ensino de história no Brasil.
R: Para começar, a professora Déa Fenelon, que foi a que, digamos, possibilitou uma reflexão teórica, metodológica, epistemológica, sobre o ensino de história, que resultou inclusive um documento, um relato, no qual eu escrevi sobre o ensino médio. A parte sobre ensino médio fui eu que trabalhei. Foi na época em que o Murilo Hingel era Ministro da Educação, e que em certo foi o melhor ministro da educação que teve no Brasil. Porque exatamente ele fez, fazer e se apanhar das escolas experimentais, das quais o sistema mais completo foi o vocacional. Mas, especificamente no ensino de história, o trabalho da Déa Fenelon, e logo o trabalho da Ismênia, lá do Rio de Janeiro, o trabalho dá... Oh! meu Deus, como é o nome dela? Aquela lá de... Esqueci, eu estou assim, eu já estou esquecendo o nome das pessoas, Selva Guimarães, que é assim, de uma importância fundamental na discussão do ensino de história.
R: E num certo sentido foi implantado pela Elza Nadai. A preocupação com o ensino de história como uma área de pesquisa. Uma área que tem temática, que é objeto de pesquisa, que foi a Elza Nadai, quando era professora de prática de ensino de história na USP, num seminário ela estabeleceu isso. Muito seguida pelo trabalho da Circe Bittencourt, que é alguém muito importante nessa área. A Kátia Abud, a Raquel Gleizer, que o... como é o nome do rapaz, meu Deus? Dantas? Não, olha, outro dia eu vi o nome dele é... um professor da USP também, que era dedicado ao ensino, à questão do ensino.
R: Para mim, praticamente, tudo que foi elaborado na questão do ensino de história. Teve, assim, na minha perspectiva, três pilares importantíssimos, primeiro deles o mais importante, Emília Viotti da Costa. A Emília Viotti da Costa, no meu entender, sabia tudo sobre epistemologia da história, sobre a história como ciência e sobre o ensino de história. Foi fazendo o curso com ela que a minha preocupação com o ensino. A minha ideia de que o ensino seria uma área de atuação profissional importante, se sistematizou e se consolidou. Porque na verdade, a ideia de que o ensino era uma área fundamental me foi fornecida pelo o estágio me feito no colégio de aplicação com a professora Maria de Lourdes Janote, a Dilu. Quando estagiei no Colégio de aplicação, porque quando a gente fazia o curso na USP o estágio era no Colégio de aplicação, nas universidades federais também, quando tem um Colégio de aplicação, esse espaço que é o lugar do estágio. O estágio supervisionado, que no meu entender é a parte mais importante da formação pedagógica de um professor, mas que as disciplinas de didática e tarara, esse estágio feito em uma escola especial, escola de aplicação, é que é fundamental.
R: No meu caso, foi o estágio feito no Colégio de Aplicação da USP, nas classes da Dilu no colégio, e dois professores, o Sérgio e a Janete, no que era o ginásio, que já trabalhava no que era a ideia de uma educação renovada, com os mesmos princípios de Sévres do centro internacional de estudos pedagógicos de Sévres, que influenciou muito a renovação no ensino no Brasil. E, trabalhavam também muito com a ideia do ensino integral e integrado, ensino em tempo integral, ensino integrado, dando origem à concepção, não simplesmente do ensino, como alguma coisa relacionada à pesquisa, mas o ensino tendo como identidade com a pesquisa o fato de ser também produtor de conhecimento. O ensino é um espaço de produção de conhecimento.
R: Tanto quando um grupo de estudantes lá da Universidade Federal da Paraíba, que estavam fazendo estágio supervisionado, me pediram, me encomendaram um texto, eles queriam um texto de como se ensina história. Porque esse era o problema do estágio, como se ensina história, aí eu escrevi o texto, mas dando o título "Como se Estuda História" por que a premissa era, a gente ensina história do mesmo jeito que estuda história. O ensino de história é um estudo de história, feito por meio de uma inter-relação entre dois sujeitos, o professor e o aluno, que rompendo aquele distanciamento que se estabelecia, o professor que sabe o que ensina e o aluno que não sabe. Não, professor e aluno em um processo educacional, que quer dizer conduzindo juntos, de condução junta, dirigido juntos, elaboram o conhecimento nesse formato. Não de uma pesquisa formal, mas de uma atividade que é também de produção de conhecimento, tendo como consequência o fato de que ele necessariamente deve ser temático, corrigindo o que era um vício didático-pedagógico, que era o Ensino programático. O ensino que já partia de um programa, ele já vinha com marcas de condução externa ao aluno. Esse ensino teve que ser superado e substituído pelo ensino temático, que parte exatamente daquilo que o aluno é, daquilo, da situação do aluno, tendo em vista a onde ele deve chegar, como qual será o processo para ele e reconhecer como agente no mundo que vive. Ele se conhecer, conhecer o mundo que vive e trabalhar essa relação, dele agente no mundo que vive. Isso em um trabalho conjunto com o professor, que é o que está lá no meu texto, como se estuda história. É isso, foi isso.
E2: Foi isso, né, professora. E, diante disso, a senhora já sinalizou aí algumas questões, inclusive citando os textos, que são significativos, de acordo com o que nós estamos indagando nessa entrevista. Mas eu queria que a senhora falasse um pouco assim. Mesmo a senhora já sinalizando, falar um pouco das suas orientações, pode nos contar um pouco sobre as suas orientações? Relatando assim as suas ações que você considera significativas na extensão, as ações que você considera significativas nas instituições, associações de classe, a senhora citou um pouco, foi secretária, no sindicato no ANDES, e outras participações em organizações científicas. E, também, se você se sentir à vontade, falar mais um pouco sobre as suas publicações. Já estamos encaminhando para finalização, professora.
R: Olha, eu vou começar pelas publicações. A grande falha na minha história profissional. Poucas publicações. Um dos motivos é pelo fato de que a minha identidade foi sempre de professora. A que está em sala de aula. E, as publicações sempre se voltaram para as pesquisas, para quem estava fazendo trabalho de pesquisa. Eu me lembro, por exemplo, do confronto que eu tive, com uma professora, cujo nome eu não me lembro, quando surgiu o PIBIC, Programa de Iniciação Científica E, que eu achei um absurdo, falei - Como assim Programa de Iniciação Científica? O curso de graduação é um curso de Iniciação Científica. Quem faz o curso de graduação está se transformando em um pesquisador, em um profissional daquela área. Quem está fazendo um curso de história se tornará historiador. Agora, porque separar um pequeno grupo, que, associado a um projeto de um professor, vai fazer iniciação científica? Os demais alunos, os que como uma vez a Claudia, uma coordenadora do curso lá em Patos, brincou. O que acontece com os alunos que não são alunos de programa? Não fazem parte nem do PIBIC, que é o Programa de Iniciação científica, e depois criaram um Programa, e depois criaram nos cursos de licenciatura o PIBID, Programa de Iniciação à Docência, mas se o curso é de licenciatura? Quem se formar nesse curso está credenciado para ser professor. E, quem não tiver feito o PIBID, programa de iniciação à docência, não vai ter a qualificação de professor? Como é que é essa história?
R: Então, eu observei, isso depois que eu me aposentei, eu me aposentei em noventa e cinco. Quando eu voltei a universidade, eu vim a São Paulo, quando eu voltei a ter contato com a universidade. Eu descobri isso, o foco da universidade tinha mudado, o foco que, mal ou bem era o curso de graduação, era por tanto a formação dos alunos, tinha se deslocado para carreira do professor. Quer dizer, passou a importar não tanto os cursos que os professores davam, mas quantos artigos ele publicava, se ele tinha publicado em revistas estrangeiras. O currículo CAPES e CNPQ, passou a ser muito mais importante, que os cursos que ele dava, a carga horária que ele tinha. O desenvolvimento dos trabalhos, ligado a formação do aluno especificamente. Eu achei que isso de certa forma esvaziou, um pouco, os cursos de graduação. Agora para ter algum significado depois da graduação, o aluno tem que necessariamente fazer especializações, aperfeiçoamentos, pós-graduação, estágios não sei onde, parecendo que a graduação em si não completa a formação dele. Claro, nenhuma formação é completa definitivamente, o trabalho intelectual é sempre um trabalho de formação, mas eu achei que houve uma distorção na forma de conceber a formação na graduação e de conceber o trabalho da universidade, em vez de focada nos cursos que formam o profissional, para os programas que separam grupos de alunos em torno de projetos de pesquisa, específicos de professor, que vão resultar em publicação, é bom que se publique mesmo.
R: Mas a primeira vez que eu assisti um Seminário do PIBIC [01:42:46] eu causei uma celeuma, que era o seguinte. Por que no seminário do PIBIC só estavam os alunos que integravam grupos de PIBIC? E, os alunos regulares do curso que não faziam parte de programa nenhum, que não estavam nem assistindo à exposição dos colegas? Teve uma coordenadora, lá que achou que eu estava implicando, com essa “história”, mas me parecia um absurdo. Tem um curso de graduação, desse grupo de graduação tem uns quatro ou cinco grupos de pesquisa. Esses grupos de pesquisa vão apresentar as conclusões dos seus trabalhos de um determinado período, e os outros alunos que não fazem parte dos grupos, nem assistem às exposições dos colegas. Eu achei muito estranho. Agora eu me sei como está, entende? Porque depois da pandemia, passando pelo curso remoto, passando pelo, por esse trabalho aí indireto, nem faço ideia de como é que está.
E1: Continua, continua a mesma história (Risos).
R: Pois é.
E2: Professora
R: Não, eu acho assim, dá formação do professor.
E1: Eu também tinha duas perguntas para perguntar.
R: É, eu acho que existem três coisas que não podem ser separadas. Eu me valho, acho que é Le Goff que disse isso. Há um certo, uma certa fala, um certo pensamento pedagógico, dividindo o estudo em: como estudar, o que estudar e para que estudar. Estabeleceu uma prevalência das coisas, que estão fora do conteúdo, o como e o porquê estudar, quando na minha opinião o centro da formação é o que estudar. O conteúdo contém como ele é produzido e o para que, para quê que ele serve? Uma vez produzido que necessidades ele vai atender. Então, para mim, a centralidade estaria no conteúdo, e não na forma, nas formas de obter esse conteúdo, e nas perspectivas para o aproveitamento desse conteúdo. Tudo isso estaria no próprio conteúdo, como o nome indica, ele é o conteúdo, é isso.
E2: Quer perguntar, Juliana?
E1: Eu ia perguntar para a professora, quais eram as disciplinas que ela lecionou lá na Paraíba? Ela disse que chegou a setenta e seis.
E2: Setenta e oito.
E1: Setenta e oito lá em João Pessoa, como foi essa chegada? Lá em João Pessoa. E, quais eram as disciplinas que ela lecionou.
R: Eu comecei, eu fui para lá para ser professora de história moderna, substituindo a professora Rosa Godoy, porque ia ser coordenadora do NIDIR, não poderia mais dar as disciplinas todas, as aulas todas que dava. Então, eu comecei dando história moderna, mas depois, por conta de um problema de ajuste de horário, eu acabei assumindo a disciplina de introdução aos estudos históricos. E, a rigor, esse se tornou meu campo principal de atuação na vida acadêmica. Introdução aos estudos históricos, que queria dizer a discussão sobre teoria e metodologia da história, foi a área em que eu mais atuei [1:47:25].
E2: Professora, e como foi seu encontro com a professora Elza Nadai, nessa história de escrever livro?
R: Nós, a Elza Nadai e eu, fomos colegas de faculdade. Nós entramos na universidade juntas, e com um pequeno detalhe. É, o vestibular podia ser feito de dia ou de noite, na USP. E, eu e ela fizemos o vestibular à noite, e nós fomos aprovadas, de modo que quando, mas eu fui estudar no diurno. Eu fiz o vestibular à noite, mas fui estudar no diurno.
R: Quando nós começamos a atuar, eu e ela nos conhecíamos, ela foi a primeira professora, a primeira pessoa que eu conheci no curso, e nós trabalhamos o tempo todo juntas. Até que, eu acho que em 1973 estavam discutindo a montagem dos guias curriculares, e, a Elza foi substituir o professor Newton Balzan, lá no setor da secretaria de educação, que estava trabalhando a elaboração dos guias curriculares. A Elza, o Newton Balzan era quem estava fazendo isso, depois ele foi trabalhar na UNICAMP. Então, deixou o serviço lá na secretaria da educação de São Paulo, e a Elza Nadai o substituiu, e me chamou para ajudá-la, a mim e à Ernesta Zamboni. Foi quando então, foi produzido o primeiro guia curricular, que teve uma edição popular no papel jornal, com uma capa verde, que ficou conhecido como verdão nas escolas. E, teve uma edição chique de papel cuchê, toda bonitinha, e como disse a Delma, não a Telma? Não me lembro o nome da coordenadora lá, que esse volume chique era para convencer a UNESCO, era para mandar para a UNESCO, para a UNESCO saber que o Brasil estava fazendo renovação educacional e mandar verba, que eles tinham mandado, era muito, foi muito interessante aquilo. [1:50:03]
R: Mas o que os professores usavam era o verdão. E eu, a Elza e a Ernesta, demos curso de treinamento, fizemos um cursinho de treinamento, para poder, enfim, preparar os professores para usarem um novo guia curricular. E, essa experiência foi muito decepcionante, para nós. Porque a gente descobriu o quanto estava precária a formação dos professores. Para se ter uma ideia, na escola em que eu trabalhei, depois que eu voltei de Aquidauana. Eu fui trabalhar na Universidade Estadual lá. A secretaria de educação, a delegacia de ensino, exigiu a elaboração de um planejamento na escola. E, o diretor da escola, sabendo que eu tinha trabalhado no vocacional, entendia dessa História de planejamento, objetivos e conteúdo, me botou para coordenar essa atividade dos professores, de elaborar o planejamento que a delegacia de ensino estava pedindo. Então, reuniu os professores, eram trinta e quatro professores em uma classe. Aliás, acho que não era só naquela escola. Acho que eram das escolas ali da região. E em trinta e quatro professores, só tinha uma professora, de português por sinal, que sabia o que queria dizer objetivo cognitivos. Um conjunto de professores, que não é que não sabiam quais eram os objetivos cognitivos adequadas para aquele momento, para aquele estágio. Não sabiam o que queria dizer objetivo cognitivos. Porque o planejamento tinha que ser assim, os objetivos cognitivos, os objetivos de atitudes, atitudinais, e depois o processo de avaliação ligado a essas duas coisas, o conhecimento e as atitudes. E, de trinta e quatro professores só tinha a professora de português, que sabia o que queria dizer cognitivos. [1:52:39]
R: Então, o que é bem indicativo de como a formação dos professores tinha ido para o brejo. E, não me parece que tenha havido, sistematicamente, um processo de mudança. A 5.692, que foi a 5.692, é a LDB da ditadura, e que destruiu para trás e para frente. Essa LDB, detonou a antiga escola tradicional, que era centrada no desenvolvimento do conteúdo, e inviabilizou a escola renovada, que era centrada na habilitação dos alunos, dos estudantes. Então ela destruiu para trás e para frente, eu escrevi um artigo sobre isso, sobre a questão disso, de Estudos Sociais.
R: E muito... não sei, falsamente, de forma muito equivocada, adotou a expressão de ensino por área. O ensino por área da 5.692, é uma desqualificação do ensino, da atividade de ensino. Porque eles consideram o ensino por área. Assim, um único professor, dando todos os conteúdos de uma mesma área. Então, história, geografia e quando vier, filosofia, sociologia, também é dessa área, e será dado por um único professor. É o que é pior, este professor formado em um daqueles cursos de licenciatura curta, que formavam o professor para área. Ele não formava o professor de história ou geografia, ou de sociologia, que em conjunto trabalharia em uma área. Ele formava o professor de Estudos Sociais, como formava o professor da área de ciências, como formava o professor da área de línguas. Se você visse os objetivos de cada uma das áreas, do ponto de vista da perspectiva educacional, bastava uma área, uma das áreas, para dar conta daqueles objetivos de formação do aluno. De modo que as escolas poderiam, e eu vi isto, centrar o seu currículo em uma das áreas, e ainda sim dar um certificado de formação para o aluno. Eu vi isso em Coxim, no Mato Grosso. [01:55:59]
R: Mas, foi assim, um, mas essa era a política da ditadura, realmente inviabilizar a educação, inviabilizar a possibilidade de desenvolver a capacidade pensante e crítica dos cidadãos.
R: Quando acabou a ditadura formalmente, aí veio o governo do Sarney, nós lá da Paraíba, muito entusiasmadas, entramos na discussão da elaboração dos novos currículos. E, foi uma decepção total, porque os currículos foram feitos, mas as condições para que as escolas executassem esses currículos nunca chegaram a ser desenvolvidas adequadamente. [1:56:52]
R: As pesquisas, eu fiz uma pesquisa nas escolas lá em João Pessoa, e fora duas ou três escolas particulares, religiosas, as Lurdinas e a outra escola que tinha lá, também religiosa, para as meninas, porque a escola ainda separava, as escolas femininas e as escolas masculinas, e o outro colégio lá que era o dos meninos, que esqueço o nome, que pensaram em utilizar e desenvolver esses novos currículos. Até eu fui chamada justamente para discutir essa aplicação, mas eu pesquisei que eu fiz nas escolas, nas escolas oficiais, nas escolas públicas. Eu pesquisei sete escolas, os currículos, os guias curriculares foram entregues nas escolas, e nenhuma das sete que eu pesquisei, esses currículos nem sequer tinham sido entregues aos professores. Ele ficava lá na sala da direção, com a secretaria. E havia uma determinação da secretaria, - e eu tenho a impressão de que escrevi sobre isso, que a escola tinha autonomia para deliberar sobre a implantação dos novos currículos, e usaram essa autonomia para não implantar, simplesmente, para continuar o velho esquema daqueles programas que todo mundo estava habituado a elaborar, foi muito ruim.
R: Daí que eu acho que ficou do jeito que ficou, quase todos os documentários e comentários que ou ouço, o grande problema que os comentaristas e analistas apontam é que o brasileiro não sabe mais ler e escrever. Os jovens não sabem mais ler e escrever. Não saber ler e escrever significa não saber pensar. Porque na nossa cultura, em que a linguagem tem essa expressão escrita, ela é fundamental para poder desenvolver capacidade de entender, de ver o mundo, de entender as pessoas, de entender a realidade. Eu nem faço ideia, por exemplo, de como está sendo o ensino de história, no conjunto das escolas. Eu imagino que deve estar lá perto do nome, fato, data, como era antigamente. [2:00:00]
E2: Professora, a senhora já sinalizou aí alguns desafios. Seria uma das últimas perguntas antes da finalização, que seria falar um pouco dos principais desafios do ensino de história que a senhora enfrentou. A senhora já sinalizou, e como foi. Ficou faltando um pouco das associações, a senhora falou do ANDES, mas assim da ANPUH, de outras associações científicas que a senhora quiser falar, e aí nós vamos para finalização.
R: Olha, do ponto de vista das entidades, para o ensino de história, ouve duas tremendamente importantes. Uma a SBPC, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Eu participei na SBPC da criação de um seguimento dentro da SBPC, que trabalharia os conhecimentos escolares, a escolarização dos conhecimentos que a ciência produziria. E, foi a partir desse trabalho que se fortaleceu a ANPUH.
R: A ANPUH, que se chamava, quer dizer, ANPUH, quer dizer Associação Nacional de Professores Universitários de História. Ela se destinada a discutir a pesquisa em história, que era considerada um atributo praticamente exclusivo dos professores universitários. Para se contrapor, agora, nós, a minha geração, sobretudo, com o esforço da Déa Fenelon. Nós criamos, dentro da ANPUH, um GT de ensino de história. Um grupo de trabalho sobre o ensino de história, o GTPE, núcleo de trabalho de pesquisa e ensino de história. Começou com a Circe, Elza trabalhava muito, a Déa, a Raquel Gleizer, a Kátia Abud, eu a Ernesta Zamboni, nos integramos neste grupo, que se destinava a discutir e pesquisar o ensino de história dentro da ANPUH. Nós tínhamos espaço dentro dos encontros da ANPUH em que o GT apresentava seus trabalhos e tudo.
R: Até que em um determinado momento, não me lembro a data, ouve a criação da Associação Brasileira de Ensino de História. Eu devo dizer que eu fui contra a criação de uma Associação Brasileira de Ensino de História, porque o que eu achava é que devia se fortalecer o GT de ensino dentro da ANPUH e não separar. E, não criar uma entidade que seria vista como a que discutiria o ensino de história, aí eu perguntava: Separada da pesquisa? Separada da produção do conhecimento histórico? - Então ficaria a ANPUH a associação dos pesquisadores e haveria outra associação que seria a associação dos professores? Eu fui contra, falei contra, votei contra a criação da Associação Nacional de Ensino de História, porque achava que a melhor política seria fortalecer o GT de ensino dentro da ANPUH. Aí me parece, que essa Associação Nacional de Ensino de História, não sei se, se tornou relevante, fez alguns encontros.
R: Passou a ter aqueles GTs, grupos de trabalho de ensino de história, GTPE, que surgiu, parece de trabalho da Ernesta Zamboni. Um trabalho que ela fez em campinas, com as professoras da rede. Ela, em um dos encontros desse GT, ela fez uma sessão, que até ela me chamou para coordenar. Fui eu que coordenei essa sessão, em que professores, professoras, apresentariam o seu trabalho como professora. Quer dizer, não precisava ela separar algum aspecto do seu magistério para elaborar como se fosse um seguimento de pesquisa, não, o que a gente queria discutir lá. É no trabalho regular do professor, normal do professor, o que é que aparece como produção de conhecimento histórico? O que caracteriza esse trabalho como um espaço de discussão de ensino, de discussão da pesquisa, de produção de produção de conhecimento? Eu coordenei esse trabalho criado pela Ernesta, iniciado pela Ernesta, e foi a partir desse trabalho que surgiu o GTPE, grupo de pesquisa e ensino de história dentro da ANPUH. Teve um outro GT também, que aí eu não me lembro bem o que era o outro grupo, a não, era Encontro Nacional de Pesquisadores de Ensino de História, o ENEM.
E2: ENPEH!
R: ENPEH, Encontro Nacional de Pesquisadores de Ensino de História, pois é. Eu participei, eu coordenei essa sessão lá nesse encontro, foi em Campinas, organizado pela Ernesta Zamboni, que tinha por objetivo juntar as duas coisas, os pesquisadores. Mas sobretudo, não juntar os pesquisadores e a pesquisa, mas identificar no trabalho do professor, o trabalho normal, de sala de aula do professor, a construção do conhecimento histórico. Então, foi muito interessante. Como é que está isso agora? Eu não acompanhei mais, agora eu não acompanhei mais, faz desde 2011, que eu vim para São Paulo, por conta do cuidado que tinha que ter com a minha irmã mais velha. E, agora que eu realmente me afastei, acho que em 2013, eu fui em um encontro em Natal, mas acho que foi a última atividade que eu fiz ligada a ANPUH. Então, tenho estado afastada das atividades. Vocês parecem que estão me...
E1: Tentando retomar (Risos). Então, professora.
R: Tentando me tirar do meu.
E1: Não, eu vi até sair uma... vi que saiu uma entrevista da senhora na.
R: A entrevista que eu dei para o Tiago Benfica [02:08:04]
E1: Isso, saiu, não sei se Célia viu, saiu uma entrevista da professora Joana no dossiê novo da Revista História Hoje, da ANPUH, que foi coordenada pelo Warner. Célia, aquela que foi bem comemorada. [Agora eu acho que travou].
E1: Então, como é que ficou? Eu fiz parte da diretoria passada da ABEH, mas eu e a Célia fazemos parte da diretoria atual da ANPUH nacional. Eu sou a segunda secretária, e a Célia, é a tesoureira, mas nós somos também da ABEH. Hoje, a ABEH, que é a Associação Brasileira de Ensino de História, ela trabalha bastante com... Porque foi uma geração que, a senhora está certíssima, foi uma geração que teve o cuidado de não ter essa separação de assim, de separar as forças, porque a maioria aqui vem de sindicato e vem de movimento estudantil. Tanto, eu e Célia nós acreditamos nos movimentos coletivos e a gente sabe que quanto mais dividir as forças, pior vai ser para a gente. Então, a gente está na ABEH, mas a gente é da ANPUH também, então a gente dos dois.
R: Uhum
E1: Mas o professor Cerri foi o primeiro orientando, eu acho de Ernesta Zamboni. E aí, junto das orientandas da Ernesta, a ABEH ficou um tempão sem funcionar, me parece, e há quantos anos, Célia? acho que há quatro anos que foi re...
E2. Retomada.
E1: Retomada.
E2: Se eu não me engano, foi em Pernambuco, ou foi na...foi em Pernambuco.
E1: Não foi em Sergipe. Não. Foi em Mato Grosso, foi em 2019.
R: Humm
E1: A Associação passou um tempo sem funcionar, professora Joana, mas sempre teve. Agora vai ser o décimo terceiro encontro de Pesquisadores de Ensino de História e foi o, esse ano vai ser o décimo terceiro encontro de pesquisadores. E, e não sei quantos do Perspectiva, porque são dois encontros criados. Um foi criado pela professora Circe Bittencourt, e o outro foi criado pela professora Ernesta Zamboni. Então, assim, é esse grupo que caminhou aí com a professora Circe, caminhou a professora Ernesta. Em um certo momento se afastou e depois se aproximou, e a associação ficou um tempo, porque a senhora sabe que tem que ter tempo para a entidade. A burocracia muito grande reergueu a associação e agora, nos últimos quatro anos, conseguiu tirar CNPJ, fazer com que os pesquisadores pagassem anuidade, E, enfim. E hoje a gente tem associado. E, me parece que temos 300 pesquisadores associados a ABEH, entre professores da educação básica e da universidade.
E2: Inclusive uma publicação, uma revista.
E1: Tem uma revista: Palavras abertas, que não segue esse modelo da produtividade, que a senhora falou. Inicialmente, que também foi uma crítica que os professores fizeram, e não segue essa perspectiva. [2:11:46].
E1: Então hoje o Cerri, junto com outras as professoras, que eu também fiz parte, Célia também já fez parte da direção, hoje a gente está na ANPUH, mas a gente já esteve nesse grupo de reerguer, que esse grupo que está sempre na área do ensino, dizendo: Opa! Vamos estar nos dois lugares - discutindo, mas é muito difícil, hoje o campo de Ensino de história tem ainda suas resistências, tem, eu não vou dizer a senhora, eu e Célia a gente não vai mentir que está tudo a mil maravilhas e não está. Melhorou muito da sua geração, o que vocês fizeram para nossa. Digamos, assim que 70% está bem melhor. Hoje, nas reuniões do departamento, eles conseguem nos ouvir, mesmo nós sendo professoras. Eu, por exemplo, eu não sou do departamento de história, e mesmo sendo formada em história, graduada, com mestrado e doutorado em história, como eu disse a senhora. Eu fui orientanda de Rosa, aqui da UFPE, e fiz mestrado na Paraíba. Mesmo sendo, tinha sempre uma piadinha, uma coisa, uma gracinha, sabe? Hoje não tem mais, mas quando eu entrei, que fui da geração REUNI, a 13 anos atrás, a 14 anos atrás, “ave maria”, era um terror. Hoje não, professora, hoje eu vou dizer à senhora que está melhor, mas precisa ser muito...
E1: Uma das coisas do projeto é que a área do ensino de história está vivendo em outra fase. Agora professora, hoje, e Célia pode reforçar. A ideia da associação é em ouvir vocês. Essas mulheres que formaram o campo, é o seguinte: hoje o ensino de história virou a grande merchandising. Todo mundo faz ensino de história. Está gravado, isso aqui, todo mundo faz ensino de história. E, a ideia é a gente quer contar que é um campo que tem um determinado tipo de objeto, e que tem uma história. E que essa história teve início com essas professoras, que tinham uma determinada preocupação, que têm uma determinada história de vida e que viveram determinado período, sabe? Então, por isso o investimento da associação em transcrever, em “aperrear” a senhora, a Circe, a Selva e tantas outras professoras, a professora Rosa.
E2: Ernesta, Kátia.
E1: Ernesta, Kátia Abud. Todas vocês, em não um só encontro, eu já vou dizer, professora, pense em outros momentos para a gente, me dê mais só outra tarde da senhora, para a gente se encontrar, porque todas vocês têm muitas histórias para contar, entende?
R: Olha, eu tenho uma sugestão.
E1: Me fale.
R: A primeira coisa é cobrar da Margarida, a coletânea dos meus artigos sobre o ensino de história [2:15:00].
(Risos)
E1: Ah, vou cobrar
R: E ela disse que ia fazer inclusive um comentário, uma apreciação. Ela me passou a relação dos artigos. Ela tem a relação feita, ela me passou a relação desses 36, 35 artigos, com os títulos de cada um e mais ou menos sobre o que se tratava. Eu posso passar para você, para o seu Zap: essa relação, se interessar. A fase, seguinte será ela fazer uma espécie de apreciação desse conjunto de textos, e organizar uma publicação. Então, estamos às ordens, eu já falei para ela que pode fazer.
E1: A gente vai cobrar, né, Célia? (Risos) [02:15:51]
E2: Vai. E esse momento, professora Joana, já é finalização mesmo. Então, o quê que a senhora está fazendo? A senhora sinalizou anteriormente, dizendo que tem dois temas que gostaria de publicar, um sobre a importância dos homens, da música, da mulher na música. Se a senhora gostou de conversar conosco? Quais são os sonhos que a senhora ainda tem em relação a esse tema, ou a outros que a senhora queira nos dizer? O quê está fazendo hoje, além de estar em São Paulo cuidando da sua irmã? Então, assim, e também sugestões, que a senhora já deu e nós, né, Juliana, já anotamos aqui.
E1: Aqui oh, para cobrar a professora Margarida (Risos)
E2: Exatamente, e assim, diante disso, como a senhora avalia a formação de professores, as principais conquistas. E, que a senhora também já sinalizou. E os desafios que a senhora identifica? E, depois disso, da senhora falar um pouco, considerar um pouco o que foi essa conversa hoje. E, se nós tocamos em algo que lhe lembrou ou que lhe trouxe alguma nostalgia. O que a senhora quiser dizer, a senhora, eu gostaria de ouvi-la, e informar que autoriza essa publicação, essa gravação, esse momento nosso, pode ficar à vontade. [02:17:17]
R: Olha, eu vou começar dizendo que autorizo, eu respondo pelo que eu falo, digamos assim. Mas, do ponto de vista de perspectiva de uma retomada, de trabalho meu na área de história, na área de ensino de história. Eu estou em uma situação muito complicada. Como eu disse, o meu compromisso atualmente é de natureza familiar. Eu moro aqui com uma irmã de 92 anos e um irmão de 86, fez outro dia 86. E, temos o cuidado de uma sobrinha, que foi quem conseguiu botar essa, esse meeting, para eu poder falar com vocês. Mas, eu estou absolutamente restrita a essas atividades. Para eu retomar o meu trabalho, a minha ligação com o ensino de história e a produção de conhecimento. Eu teria que voltar para Paraíba, onde eu tenho a minha biblioteca, os meus textos. Eu tenho muita coisa aqui no meu computador, que de repente eu poderia fazer uma articulação preliminar desses textos, dos textos que teriam a haver com o meu trabalho.
R: Uma perspectiva que eu tenho do ponto de vista de produção de um texto. Eu chamei de “delírios e queixumes” [02:19:02], me foram sugeridos esse título e esse texto, por dois momentos que eu vivi. Um, foi uma Live da Ana Andréia, a Ana Andréia Vieira de Castro, que é professora lá da Universidade Federal da Paraíba. Ela, não sei se ela é professora, nós temos um grupo lá que a gente chama G9-MAIS. Ela é a secretária do G9-MAIS [02:19:31], esse nosso grupo, que são professores e pesquisadores da, professoras principalmente, da Universidade Federal da Paraíba. Quase todo mundo aposentado, todo mundo aposentado praticamente. E, ela fez uma Live, em que ela falou de uma política que deverá ser iniciada em João Pessoa, na Paraíba, de organização de acervos e arquivos, determinando e distinguindo os acervos públicos e os acervos pessoais. Os acervos do pessoal local, e tal.
R: Essa perspectiva me provocou um delírio. Que é, - eu fiz isso no Mato Grosso. Eu inclusive quando ela... fiz isso no contexto da disciplina de introdução aos estudos históricos que eu dava. Um dos itens da introdução aos estudos históricos é justamente a produção e o uso de acervos documentais. Então, por conta dessa disciplina, usando trabalho dos alunos, nós apoquentamos, principalmente, as viúvas, que são as viúvas dos homens importantes, dos homens que tiveram cargo, que são geralmente as maiores proprietárias de acervos. Assim, do que foi prefeito, do que foi vereador, do médico da cidade, essas coisas. E, elas sempre reclamavam de como essa papelada entulhava a casa delas. Então elas cederam essa documentação com maior gosto para nossa biblioteca. Naquilo que a gente chamou de setor de obras raras da biblioteca, que tinha livros e documentos. Eu tenho um catálogo, lá na Paraíba tem um catálogo desses acervos organizados.
R: Então, quando a Ana Andréia falou do trabalho a ser feito lá na Paraíba, meu delírio foi: poxa, eu já fiz isso no Mato Grosso, eu já fiz. E me lembrei do professor Areias, Antônio Salústio Areias, que foi o primeiro secretário da educação do Mato Grosso do Sul, depois que o Mato Grosso dividiu. Que insistia para que eu voltasse para lá, aí ele dizendo que, se eu voltasse para lá, eu seria delegada de ensino e organizaria todo, teria acesso a todo aquele acervo. A tudo aquilo que eu já tinha produzido lá, mas eu não voltei. Falei que não ia de novo sair da beira do Atlântico para voltar para a beira do rio Aquidauana.
R: Mas eu já tinha feito. Existe esse tipo de arquivo, organizando os arquivos dos homens públicos, dos homens que tiveram cargos públicos, mas os arquivos pessoais deles, aquilo que era documento pessoal deles, em contraposição dos documentos oficiais deles, que ainda estão lá na prefeitura, nos arquivos e tá. E, esse foi o delírio que eu tive, eu pensei: Poxa, eu já fiz isso.
R: E o queixume me foi provocado pela leitura da tese da Margarida. Você já leu a tese da Margarida? Então, a tese da Margarida é dividida em duas partes.
E2: É o direito ao passado?
R: Ahm?
E2: Direito ao passado?
R: Acho que é, acho que chama.
E1: É direito ao passado isso.
R: Na primeira parte, ela fala da formação dela, e ela praticamente atribui a formação dela ao fato de ter sido minha aluna. Quando eu li, eu falei - Meu Deus do Céu, a banca examinadora vai querer me questionar. Porque ela me atribui, tanto aspecto na formação dela, falei. A banca vai querer cobrar de mim, algum problema aí. E, na segunda parte, quando ela fala da atuação dela como profissional, eu simplesmente desapareço, falei - Puxa, então eu só fui professora mesmo.
R: O trabalho que a gente fez na ANPUH, juntas. É como se assim, a minha única participação na vida profissional dela, foi como professora dela, nada como colega dela depois, principalmente na ANPUH [02:24:29]. Tanto, que eu não sou citada na bibliografia dela, aí ela disse que na bibliografia não podia me citar, porque na bibliografia só aparece quem foi citado na tese, e ela não me citou na tese nessa parte, só me, não me citou na tese com nenhuma produção, aí eu falei - Eu fiz alguma coisa errada na minha vida profissional. E me lembrei da minha orientadora de mestrado, a professora Fernanda Pacca de Almeida Wright, que eu estava fazendo o trabalho de pesquisa com ela, sobre a história de Aquidauana, que eu poderia bem ter terminado em 74, 75, mas que eu interrompi e acabei não terminando o mestrado com ela, para escrever um livro didático com a Elza. A Elza acabou me convencendo, e eu interrompi esse meu trabalho para escrever um livro didático. E, a professora Fernando dizia assim - Livro didático não dá currículo. Imagina, naquele tempo, o livro didático não era nem considerado produção acadêmica, bem mais tarde que a CAPES e o CNPQ passaram a aceitar o livro didático como produção acadêmica. Naquele tempo, não era, livro didático era livro didático, era coisa de professora.
R: Então, a digamos, existe uma ausência minha no contexto da aí da pesquisa de ensino de história, da pesquisa histórica, pelo fato de que eu fui, sou identificada como professora, sou professora, meu trabalho foi na sala de aula, foi dando aula. E, este trabalho, até o tempo que eu trabalhei, até eu me aposentar em 95. Ele não tinha a mesma expressão que a pesquisa. [02:26:53] A divisão ensino, pesquisa e extensão deixa o ensino na universidade, em um contexto absolutamente secundário, mesmo dentro da universidade. Aqueles professores que não estão desenvolvendo um projeto de pesquisa, só estão dando as aulas deles nos cursos. É como se eles não estivessem fazendo nada que implique em desenvolvimento do conhecimento. Então, daí esse, isso que aconteceu, digamos, na tese da Margarida. Eu sou professora, meu trabalho foi o de sala de aula. Quando eu participei de extensão, também fui dando curso, geralmente a extensão era dando curso de complementação, não era nunca considerado, não era nunca ligado a trabalho de pesquisa.
R: O resultado disso é que eu tenho uma coletânea lá em João Pessoa, em uma caixa desse tamanho.
(A professora Joana indica com as mãos para a câmera o tamanho da caixa à qual ela se refere.)
R: Toda a pesquisa que eu fiz, para o mestrado que eu acabei não fazendo com a professora Fernando Pacca, que é sobre a participação da imprensa na proclamação da república na Paraíba. A atuação dos jornais na propaganda e proclamação da república na Paraíba. A pesquisa está toda prontinha lá, precisaria eu transformar aquilo em um livro, agora nem sei, nem sei se caberia mais. [2:28:40]
R: Eu tinha tido uma oportunidade de fazer em 1985, quando, por conta do centenário lá da fundação, em João Pessoa, foi organizada uma publicação. Tem um artigo meu público lá, ainda nessa coletânea, mas que eu falo dessa possibilidade, do estudo da participação da imprensa na propaganda e na proclamação da república em João Pessoa, mas está lá, tudo para montar.
R: Eu ando, e eu me sinto assim, bloqueada. Eu praticamente não me sento mais nesse computador para escrever e também quase não leio mais. Porque, gastando meu dia com cuidados e afazeres domésticos, quando chega de noite eu quero assistir os quiz na televisão, de que eu gosto muito, e tenho estado mesmo meio bloqueada. Vai ver também que é porque eu estou com um pouco de problema de saúde, uma história de pressão alta que me apareceu, que agora eu estou tratando. Quem sabe, quando eu estiver melhor de saúde, e também eu estou ficando velha, né? Faço 80 anos esse ano, não é brincadeira. [2:30:08]
R: Mas eu espero, ainda, de repente, com essas cutucadas que me dão, de organizar a minha produção, do caso principalmente com relação ao ensino de história.
R: A propósito do ensino, da minha atuação na ANPUH. E, aí foi mais com a Déa Fenelon, no simpósio eu acho que de 81, não ou o de 79, que a gente propôs, não foi o de 81, a gente decidiu em 79 e mudamos o estatuto da ANPUH no 81 na Paraíba, a gente decidiu invalidar, quer dizer, desconsiderar o U da ANPUH. A associação, nós passamos a admitir na ANPUH, os professores que trabalhavam, que não eram professores universitários, que trabalhavam nos outros níveis de ensino. Essa coisa deu uma celeuma danada, [02:31:27] o professor Eduardo d'Oliveira França, em 79, saiu da assembleia, muito bronqueado, porque disse que a ANPUH tinha deixado de existir. Aí aconteceu um, porque não eram mais professores universitários. E aconteceu uma coisa interessante, a gente tinha que mudar o estatuto da ANPUH, e na mudança de estatuto, haveria uma sugestão de que como agora não era mais só de professores universitários, virar Associação Nacional de Professores de História. Havia um grupo que foi contra a integração dos professores que atuavam no ensino secundário na ANPUH, e se a gente mudasse a sigla, manteriam a ANPUH, a Associação Nacional de Professores Universitários de História, como uma entidade reservada, então nós decidimos não mudar a sigla e mantivemos a ANPUH. Por dois motivos, um esse de natureza política, porque de repente nós abriríamos mão da sigla, o outro grupo que tinha sido contra a integração dos professores da escola básica, da educação básica, manteria a ANPUH, como Associação Nacional de Professores Universitários de História. E, depois, o segundo motivo é que ficava muito caro pagar no cartório a mudança da sigla, então nós resolvemos economizar o dinheiro e mantivemos a sigla, mudando o estatuto. Ela se chamava ANPUH, mas pelo estatuto congrega também professores de quaisquer outros níveis de ensino de história.
R: E aí o pessoal que não queria abrir mão da ANPUH fundou a FBPH, Fundação Brasileira de Pesquisadores de História. Você não é de João Pessoa, né, Adriana, Juliana?
E1: Eu sou de Alagoas, só fiz o mestrado lá.
R: Então, você já deve ter conhecido o professor José Otávio.
E1: Não, não conheci, porque foi em 2006.
R: É, não, já tinha todo mundo saído.
R: Então, nós não abrimos mão da sigla ANPUH, para não permitir que esses que só queriam que fossem pesquisadores universitários ficassem. Aí eles criaram a FBPH, fundação, federação brasileira de pesquisadores de história. E, não deu em nada, eu acho que nem encontro, mas eles conseguem fazer, não sei se têm alguma atuação, acho que não têm nenhuma atuação, nenhuma.
E2: Eu também não conheço, foi fundada lá em João Pessoa? Foi, professora Joana? [2:34:40]
R: Ela foi criada, acho, no simpósio, acho que era, foi no Rio? foi no Rio, foi no de 79 e o estatuto foi feito em 81 na Paraíba; Eu e a Raquel Gleizer que fizemos o estatuto, o novo estatuto, para incluir os professores que trabalhavam em qualquer outro nível, desde que fossem formados em história. E, uma ironia da história é que nós sempre tentamos ter a profissão de historiador reconhecida. O historiador é um profissional de história. Nunca conseguimos, o Bolsonaro acabou de aprovar a criação do profissional de história, reconheceu o historiador como um profissional de história, mal sabe ele o que esses profissionais vão fazer com ele daqui a uns tempos (Risos), porque quando os profissionais de história forem escrever sobre a história desse período. Vamos ver o que vai acontecer, mas ironicamente, foi esse presidente que sancionou a lei criando a profissão de profissional de história, historiador como um profissional de história, é isso, meninas [2:36:13].
E2: É isso. Fale, Juliana.
E2: Mas, professora muito, muito obrigada. Estamos encantadas, é muito bom, gostaria de desejar vida longa à senhora.
(Risos)
R: Eu também aceito esse desejo.
E2: Muitos projetos que ainda estão por realizar, e com certeza a senhora vai conseguir aos poucos e será bem-vinda, com certeza.
E1: Oh, professora, é engraçado, a senhora ao mesmo tempo, eu sei que não é comum fazer esse tipo de comentário, mas é interessante, ao mesmo tempo que a senhora é uma referência, é não sei quantas entrevistas. A senhora é sempre citada nos artigos, as suas produções, a senhora diz que não tem produção, tem 35 artigos, é interessante, né (Risos)
E2: Caixas e caixas de material.
E1: Caixas e caixas de material, é interessante, ela mesma diz assim - não, não tenho [02:37:13].
R: O que eu estou falando é da minha identidade, eu ainda sou identificada como professora, a que dá aula, que está na sala de aula.
E1: Ahm (Risos). Mas eu acho que para uma geração, porque para a nossa já tem outra identidade.
R: Claro, claro.
E1: Para nós, é a professora, a pesquisadora, a que tem produção.
R: Que tem os artigos escritos. Quando a Margarida me disse que eram 35 artigos, eu mesma não acreditei. (Risos)
E1: Ah, coisa pouca (Risos)
R: Quando que eu escrevi isso aí, meu Deus.
(Risos)
E2: Vamos tirar uma foto?
E1: Vamos tirar uma foto. Oh, professora, é só lembrar, esse material ele vai ser editado, porque ele vai servir para transcrição das bolsistas do PIBIC que é de uma das professoras, para usar artigos. São 14 pessoas que participam desse projeto, inclusive lá do núcleo da professora Margarida, aqui do Pernambuco, lá da Bahia, Célia, tem gente do Brasil todo participando desse projeto. Né, Célia? Uma hora tem mais tempo, outra, outra, tem menos, mas tem gente do Brasil todo participando. A suas falas da Selva, da Circe, da Kátia Abud e da Ernesta. [02:38:31]
R: É?
E1: E esse mesmo material também é editado. Antes de ser publicado, vai voltar para vocês. Porque ele vai servir de peça para o museu da pessoa [02:38:45] o áudio de você. Alguns textos da história, que pode ser publicado, porque tem histórias, não só essa, mas tem algumas histórias que vão fazer parte desse memorial lá no Museu da Pessoa, que fica aí em São Paulo. Lá tem uma casa física, mas o museu é virtual. Vai ser feita uma exposição, dentro do Museu da Pessoa, acho que até o final desse ano, no mais tardar até o início do ano. Todas as entrevistas que fazem parte desse projeto. Inicialmente, na primeira etapa, anos 80, anos 90, são 12 mulheres, só tem um professor e acho que 12 professoras, que vão ser entrevistadas.
R: Qual é o professor? Vai ver é aquele que eu me esqueço.
E1: O Cerri. Luís Fernando Cerri, ele é o único professor que faz parte dessa geração que é da transição. Aí, depois vem a professora Margarida, a Ana Maria Monteiro, que é uma geração que já foi orientandas de vocês, a gente foram os orientandos de vocês.
R: Está ótimo, está bom.
E1: Eu vou pedir para no três, para agradecer à sua sobrinha, como é o nome da sua sobrinha?
R: Verônica.
E1: Verônica, muito obrigada por nos ajudar, vou deixar registrado aqui a gravação, dizer que sem a sobrinha, sem os netos, sem os filhos, a gente não conseguiria entrevistar tantas professoras maravilhosas.
(Risos)
R: É verdade, é verdade.
E1: Eu vou pedir que vocês fiquem paradas, sorriam e fiquem assim um pouquinho.
R: Mas, a Verônica não está mais. Ah, a Célia.
E1: É a Célia. Fiquem paradas, sorriam para eu tirar uma foto, eu vou contar um, dois, três [02:40:36] A é que alguém [2:40:39]. Um, dois, três e já. Pronto.
(A Juliana Andrade tira foto da chamada, para registrar o momento)
R: Ótimo!
E1: Obrigada.
E2: Obrigada, professora Joana, e conte sempre conosco, viu.
R: Tá, muito obrigada, eu vou passar no seu Zap a relação de textos que a Margarida me passou.
E1: Olhe, e a gente vai falar com a professora Margarida, né, Célia? Professora Margarida, que ela deve ter mil publicações, mas professora, mil projetos para publicar, que ela foi diretora de uma editora lá da Federal do Rio Grande do Norte. - Professora, traga aí que a gente quer ver as coisas da professora Joana.
E1: Mas, sabia que a gente usa, quando quer usar os textos da senhora, a gente vai lá no seu currículo, cópia e cola e bota no Google (Risos). Agora mesmo tem uma dissertação sobre a senhora e a professora Rosa, a trajetória de duas.
R: A trajetória de duas uspianas [02:41:33] na UFPB.
E1: Isso, eu uso na minha disciplina no mestrado, então é a gente vai se encontrando, vai encontrando as suas coisas.
R: Essa história, só vou dar esse último detalhe, essa história a Helena, considerando meu aniversário no dia 15 de outubro, disse que estava fadada.
E1: [02:41:57] fez igual a mim.
R: É. E aí eu disse para ela que 15 de outubro é a data do meu registro.
E1: (Risos) É verdade.
R: Meu pai registrava depois. Eu nasci dia 31 de julho. Ai, eu fui olhar dia 31 de julho, me lembrei que dia 31 de julho é o dia de Santo Inácio de Loyola.
E1: Fundador dos jesuítas.
R: Criou a Companhia de Jesus, que criou o sistema educacional do nosso país. Falei - Não tem jeito, estava escrito mesmo.
E1: Oh, professora, me diga uma coisa, seu pai é de que lugar da Bahia?
R: Caetité, aliás, ele era de Lagoa Real, mas a família depois se mudou para Caetité, tinha. Quando ele veio para São Paulo como imigrante, foi de Caetité, na Bahia.
E1: Conhece Célia?
E2: Conheço Caetité, terra de Anísio Teixeira.
R: De Anísio Teixeira? Ah.
E2: Anísio Teixeira, inclusive, tem um museu, ele nasceu lá, aí os estudos, os nomes das escolas é a terra de Anísio Teixeira. Ele tem muita pesquisa sobre o sertão da Bahia e Caetité.
R: Que interessante. Pois é, eu não conheço Caetité.
E1: Eu também não sabia, agora eu aprendi mais uma coisa.
E2: É um lugar frio, é uma cidade bem interessante, fica perto de Rio de Contas, que é uma cidade histórica assim, com remanescente de quilombos, tem toda uma história naquela região.
E1: É recôncavo, ou ...
E2: Não, é sertão, sertão.
R: Eu fora de Salvador, acho que só conheço Feira de Santana, não tem? A cidade de Feira de Santana?
E2: Tem, Feira de Santana é uma das maiores assim, Salvador, Camaçari e Feira de Santana.
R: Ah. Uma vez eu fiz um trabalho lá em Feira de Santana, acho que teve uma conferência, fiz um trabalho. E eu estava na mesa reparando na plateia. Você tinha assim, gente loira dos olhos azuis, até o preto retinto, preto com diferentes matizes, porque em Salvador é que eu vi como tem preto. Tem o preto, preto mesmo, tem o preto meio amarronzado, tem um preto mais. É uma diversidade fantástica. Aí eu olhei e falei: - Isso é o Brasil, que beleza. Eu acho essa nossa diversidade, o bem mais precioso que a gente tem, precisa aprender a aproveitar.
E1: Esse é o desafio da nossa geração. É fazer com que todas essas diferenças étnicas e todas essas diferenças geracionais, culturais, façam parte da formação. Mas, a gente chega lá, está difícil nesse período [2:44:58] Eita! . Está difícil nesse governo agora, mas a gente vai conseguir, vai fazer bem feito (Risos).
E2: Professora Joana, veja que os parentes da sua família são da região da Chapada Diamantina, fica entre a Chapada Diamantina e tem outras. Então é distante. Rio de Contas também é chapada, então é muito interessante aquela região ali que é depois de Vitória da Conquista, então é seguindo ali. Já chega a fazer parte da Chapada Diamantina.
R: Pois é. Você sabe que a Bahia eu acho que é um outro país, aliás, eu andando por Salvador.
E1: Não diga isso para os baianos não, rapaz, se não eles vão querer pedir a independência (Risos). Não diga para esse povo amostrado não, é igual dizer aqui em Pernambuco, se não eles vão pedir a independência.
R: E, aliás, outro dia, vendo um documentário, a independência aconteceu na Bahia, né?
E2: Exatamente, dois de julho.
E1: Esses pernambucanos, minha gente, vão pedir a independência do Brasil.
E2: Professora, seja bem-vinda à Bahia, se quiser, a gente vai visitar Caetité. Chapada Diamantina, aquela região.
R: Assim que eu tiver a oportunidade, eu vou sim, eu adoro a Bahia, acho realmente.
E1: E a senhora também, quando vier aqui em Pernambuco, em Recife, seja bem vinda, seja muito bem vinda em Recife viu. E, que a senhora viva muitos e muitos anos com essa lucidez, com essa capacidade intelectual grande, e que continue nos ensinando e nos inspirando.
E2: É com certeza, um abraço.
R: Que você seja ouvida pelos anjos benfazejos [2:46:49]
(Risos)
E1: Que os Orixás vão nos proteger.
R: Os orixás? Está certo. [02:46:55]
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