P1 - Certo. Então vamos começar oficialmente com a sua entrevista. Eu vou começar pela primeira pergunta, mais básica: qual é o seu nome completo, o local e data de nascimento?
R - Eu me chamo Gregory Rodrigues Roque de Souza. Esse é o meu nome de casado, né? O meu sobrenome de batismo é “de Melo Silva”. Então, eu tenho o sobrenome… O nome de batismo é Gregory Rodrigues de Melo Silva. E o nome de casado, que é o que eu assino já há sete anos, é Gregory Rodrigues Roque de Souza. Eu nasci no dia primeiro de setembro de 1991. Nasci na cidade de Belo Horizonte (MG), né, na capital mineira. E acho que é isso.
P1 - Qual o nome dos seus pais?
R - Minha mãe se chama Mafalda Rodrigues dos Santos, também com o nome de solteira, já. Os meus pais são separados. E o meu pai chama Robson Antonio de Melo Silva.
P1 - Os seus pais eram mesmo de Belo Horizonte? Ou vieram de outras cidades?
R - A minha mãe é de Ouro Preto (MG), também uma cidade histórica. A minha mãe é nascida na cidade de Ouro Preto. E o meu pai, até onde me consta, é de Belo Horizonte mesmo. Até onde eu saiba. Mas a minha mãe é nascida na cidade de Ouro Preto.
P1 - E qual é a atividade dos seus pais, profissão?
R - Bem, atualmente, eu tenho pouquíssimo contato com o meu pai, né? A gente, basicamente, não se fala muito. O meu pai, que eu saiba, a profissão dele é na área de segurança privada, alguma coisa sobre ser vigilante. Alguma coisa assim. E minha mãe é enfermeira de formação, pós-graduada em serviço de emergência e urgência. E ela trabalha, então, na área da saúde, como enfermeira.
P1 - Você tem irmãos?
R - Tenho, sim. Tenho irmãos tanto por parte de mãe, quanto por parte de pai, né? Temos... Eu tenho uma irmã, duas irmãs por parte de pai. E um irmão por parte de mãe, que, inclusive, mora conosco.
P1 - E qual o nome dele?
R - O [nome] do meu irmão é Wallace Ricardo.
P1 - Eu gostaria que você contasse um pouco sobre a sua...
Continuar leituraP1 - Certo. Então vamos começar oficialmente com a sua entrevista. Eu vou começar pela primeira pergunta, mais básica: qual é o seu nome completo, o local e data de nascimento?
R - Eu me chamo Gregory Rodrigues Roque de Souza. Esse é o meu nome de casado, né? O meu sobrenome de batismo é “de Melo Silva”. Então, eu tenho o sobrenome… O nome de batismo é Gregory Rodrigues de Melo Silva. E o nome de casado, que é o que eu assino já há sete anos, é Gregory Rodrigues Roque de Souza. Eu nasci no dia primeiro de setembro de 1991. Nasci na cidade de Belo Horizonte (MG), né, na capital mineira. E acho que é isso.
P1 - Qual o nome dos seus pais?
R - Minha mãe se chama Mafalda Rodrigues dos Santos, também com o nome de solteira, já. Os meus pais são separados. E o meu pai chama Robson Antonio de Melo Silva.
P1 - Os seus pais eram mesmo de Belo Horizonte? Ou vieram de outras cidades?
R - A minha mãe é de Ouro Preto (MG), também uma cidade histórica. A minha mãe é nascida na cidade de Ouro Preto. E o meu pai, até onde me consta, é de Belo Horizonte mesmo. Até onde eu saiba. Mas a minha mãe é nascida na cidade de Ouro Preto.
P1 - E qual é a atividade dos seus pais, profissão?
R - Bem, atualmente, eu tenho pouquíssimo contato com o meu pai, né? A gente, basicamente, não se fala muito. O meu pai, que eu saiba, a profissão dele é na área de segurança privada, alguma coisa sobre ser vigilante. Alguma coisa assim. E minha mãe é enfermeira de formação, pós-graduada em serviço de emergência e urgência. E ela trabalha, então, na área da saúde, como enfermeira.
P1 - Você tem irmãos?
R - Tenho, sim. Tenho irmãos tanto por parte de mãe, quanto por parte de pai, né? Temos... Eu tenho uma irmã, duas irmãs por parte de pai. E um irmão por parte de mãe, que, inclusive, mora conosco.
P1 - E qual o nome dele?
R - O [nome] do meu irmão é Wallace Ricardo.
P1 - Eu gostaria que você contasse um pouco sobre a sua infância. Quais as lembranças que você tem da infância, da sua casa? Como era a casa? O que você fazia? Como você brincava?
R - Bem, então, te respondendo: as lembranças que eu tenho sobre a minha infância são bem simples, né, mas são bem vivas na minha memória. Desde que eu nasci, pelo menos, na primeira infância, na primeira fase da infância até o jardim, o pré-primário, eu morei com meus pais, num bairro, na cidade de Ribeirão das Neves (MG), numa casa pequena, né? Num barracão, né, que eu acho que com quatro cômodos. Dois quartos, sala, cozinha e banheiro. Eu lembro bem, era ao lado do bar que a minha avó, que a minha bisavó tinha. E era bem ligado, assim, no mesmo terreno, né? Do lado tinha o bar da minha avó; atrás, dentro lá do lote, a casa dela; e a nossa casa do lado. É uma lembrança bem simples. A casa com chão queimado, com piso queimado. Aquele piso, se eu não me engano, o piso era amarelo. Acho que era isso mesmo, era queimado, aquele que a gente usa, normalmente, quando coloca xadrez, né? Uma parte era amarela, outra parte era verde. Era alguma coisa assim. Mas era um lugar bem confortável, até, durante o período em que eu vivi, né, enquanto criança.
P1 - E como era, que brincadeiras você gostava de fazer quando você era criança?
R - Na verdade, eu sempre fui uma criança muito interativa. Então, na verdade, eu sempre brinquei muito com coisas mais lúdicas, sabe, digamos. Eu sempre ganhei carrinho, sempre ganhei esses brinquedos. Mas apesar de eu ter tido uma paixão platônica por um carrinho de pedalinho do “Batman”, que eu me recordo que eu tinha um carrinho de pedal, ele era até bonito, mas eu nunca gostei muito desses brinquedos muito do tipo: ficar brincando de carrinho, ficar brincando de coisas, né, de futebol. Mas me recordo que eu era apaixonado, fissurado por aqueles brinquedos, daquelas coisinhas do Kinder Ovo, aqueles bonequinhos de leão [Coleção Leoventuras, de 1993] que vinham dentro dos Kinder Ovos. Eu colecionava aquilo. Eu me lembro de ter muitos ursos de pelúcia. Recordo muito de brincar com os joguinhos, com esses jogos. Minha mãe sempre incentivou muito os jogos de tabuleiro, essas coisas. Mas nunca fui um garoto de ficar na rua jogando futebol, correndo na terra. Muito, muito difícil. Não por falta de incentivo, viu? Mas nunca fui muito interessado por isso, não. Eu sempre fui criado de uma forma tradicional, digamos, né? A minha família me criou de uma forma muito ‘tradicionalesca’. Com todo o incentivo possível. No entanto, porém, eu sempre tive na minha mente um foco pra coisas diferentes, né? Gostava de assistir filmes, de ouvir música antes de dormir. A minha mãe, eu me recordo da minha mãe colocar aqueles discos, né, no toca-discos, antes de eu ir dormir e coisas nesse sentido. Então, eu sempre fui uma criança ativa; andava de bicicleta, andava de patins, né? Eu me lembro, tenho fotografias disso. Mas nunca fui uma criança ligada a coisas muito, tipo futebol ou coisas parecidas.
P1 - E a sua convivência familiar? Você disse que havia o bar ao lado da sua casa, o bar da sua avó, né?
R - Da minha bisavó.
P1 - É. E, no fundo, a casa dela.
R - Sim.
P1 - Como ______ (áudio falhou) as suas relações familiares? Você tinha proximidade com os parentes, com os avós, os primos?
R - Sim. Eu sempre tive muita proximidade com os parentes, especialmente por parte de mãe, né? A minha proximidade maior sempre se deu por parentes por parte de mãe, a princípio. Porque quando os meus pais se casaram, eles foram morar mais próximos dos parentes da minha mãe. Apesar de morarem no mesmo bairro, tanto os parentes por parte de pai, quanto os parentes por parte de mãe, mas a minha convivência se dava, em sua grande maioria, com os parentes por parte de mãe, né? Morava do lado da casa da bisavó. Viajávamos sempre pro interior, pra uma cidade chamada Bicuíba (MG), que é um distrito pertencente à cidade de Raul Soares (MG), onde tinha... Acho que ainda não tem, ou melhor: hoje em dia não tem mais, acredito. Porque, né, também por causa da pandemia, mas também, com o passar dos anos, foi se perdendo a tradição de se realizar essa festa. Por ‘n’ problemas, tanto políticos, quanto estruturais. Mas era uma festa chamada Festa do Bicuibense Ausente, onde as pessoas que nasceram naquela cidade iam pra lá, pra reencontrar os parentes. Então, todos os anos a gente ia, nós íamos pra lá, pra reencontrar os parentes, também pra se festejar e etc. Então, eu sempre tive contato com primos, com tias. Tanto tias-bisavós, tias-avós, tataravó. Eu me recordo, [que] ainda enquanto criança, a minha tataravó era viva. Nós tínhamos contato com ela. Então, eu sempre tive contato com os meus parentes, né: avô, bisavó, bisavô, tataravô, tataravó. Sempre tive contato, sim. E era assim. Até então, enquanto eu era criança... Eu, como fui o primeiro neto, o primeiro bisneto, né, da família... Fui o primeiro neto da família da minha mãe. Digamos: o primeiro filho da minha mãe [e] o primeiro neto da mãe da minha mãe. Eu fui o primeiro bisneto, o primeiro sobrinho. Então, eu sempre fui, nesse caso, né, nessa geração da minha família… Ou melhor: eu fui o primeiro, né? Depois eu acabei perdendo o posto, com o nascimento do meu irmão. E aí vieram os outros primos e outras coisas.
P1 - Você tinha algum sonho de infância, pra quando você crescesse: “Ah, quando eu crescer, quero ser tal coisa”?
R - Bem, que a minha mãe me conte, ela dizia que eu falava com ela, que eu teria o sonho de ser médico. Mas eu não me recordo disso, não, tá? Eu não me recordo de ter tido algum sonho de: “Ah, quando eu crescer quero ser isso [ou] aquilo”. Eu não me recordo, não. Acredito que... Eu sempre fui uma criança muito dinâmica, então me adaptava muito bem aos ambientes onde eu estava. Mas como eu falo bastante, como gosto muito de falar, eu acredito que sempre tive interesse em estar em algum cargo de liderança, estar em algum lugar que eu pudesse exercer algum tipo de influência, né? Tanto nas brincadeiras da escola, eu gostava de ser o que dava as regras, né, o que comandava a turma. Então eram, basicamente, coisas nesse sentido. Mas não me recordo, tá, de ter tido algum sonho específico: “Ah, eu quero ser isso quando eu crescer”.
P1 - E passando pra sua vida escolar, você se lembra do primeiro dia que você foi pra escola?
R - Não. Não me lembro, mesmo. De verdade. Não me recordo de como foi o primeiro dia na escola, de verdade. É uma memória assim: eu tenho memórias da escola, do pré-primário, né? Eu me recordo da escola, das pessoas, do lugar, da sala de aula com as cadeirinhas azuis — aquelas cadeirinhas de madeira de cor azul —, do lugar onde a gente brincava. Me recordo bem [dessas coisas], mas não me lembro do primeiro dia que eu fui pra escola. Isso eu não consigo me lembrar.
P1 - E quais as lembranças, então, que você tem desse período? Algum professor? Algum acontecimento que você lembra até hoje, desse período inicial de estudo seu?
R - Ah, me lembro bem. Me lembro das festas juninas, que a minha mãe corria atrás das prendas, pra que eu ganhasse a gincana da escola, pra ser coroado rei da pipoca ou rei do amendoim, sei lá como é que é que se chamava. Acho que era Rei do Amendoim, alguma coisa assim. Pra que eu pudesse ganhar o presente da escola. Enfim, eu sempre tive essas memórias bem vivas, né? Até hoje nós temos VHS, aqui no quarto, aquele aparelho, né, de vídeo cassete. Nós temos VHS dessas festas juninas da escola e formatura do pré-primário. E o videocassete ainda funciona. O meu esposo é bem afeito a coisas antigas, então ele gosta muito dessas coisas, dessas memórias bem retrô. Então, aí ele preserva bem esse videocassete que tem aqui. Essas memórias acabam sendo reavivadas sempre que eu tenho alguma vontade de revê-las, porque eu consigo assisti-las ainda, nesse videocassete. Então, eu me recordo bem dessas festas juninas, de brincar. Eu me lembro bem de cantar músicas na sala de aula, no pré-primário, do Timão e Pumba — eu me lembro —, coisas do Rei Leão. Essas memórias são bem vivas na minha cabeça, porque eu sempre assisti muito desenho, sempre gostei muito de ver desenho. E isso até hoje dá pra se perceber pela camiseta [do palhaço Krusty, personagem dos Simpsons], né, pelo moletom que eu estou utilizando. Então, é algo bem vivo ainda.
P1 - E avançando um pouco pro seu ensino fundamental, havia alguma matéria que você gostava mais? Algum professor que te marcou?
R - Bem, no ensino fundamental, podemos dizer, até... Se você fala até a oitava série, digamos, até o nono ano, né, como é chamado hoje, eu me recordo de alguns professores que me marcaram. A primeira professora, que foi a professora da primeira série, né, já no ensino fundamental. Eu me lembro que ela [se] chamava Ângela. Eu me lembro que ela era fumante, tinha aquela voz meio rouca, sabe? Era meio, assim, brava, mas era uma pessoa que sempre me tratou bem. A ponto de eu ir na casa dela, da minha mãe me levar na casa dela, de conhecer a minha mãe, que morava no mesmo bairro. Me recordo de diretora da escola. Me lembro de ter tido uma professora na escola estadual, no ensino fundamental, lá no comecinho, chamada... Tsc... Monica. Era uma professora, uma mulher negra, com os cabelos de ladinho, assim. Tipo o meu, sabe, meio que batidinho. E uma pessoa que era carinhosíssima. E a maioria das professoras pegavam ônibus na porta do bar da minha bisavó. Então, a escola era exatamente na rua da [minha] casa. Ficava o bar da minha avó, a casa, e logo em frente, né, na esquina, assim, coisa de 200 metros, assim, era a escola, né? Acho que não chegava nem a 200 metros, tinha a escola. Então, eu podia ir a pé pra escola, entrar na hora que batesse o sinal. Essas são memórias bem vivas. Agora, já passando por algumas séries, avançando já aí em algumas séries, eu tenho alguns professores que me marcaram. Mas que me marcaram… Por exemplo, eu tive uma professora de Língua Portuguesa, que se chamava Sebastiana. Era uma professora - digamos que com todo o respeito da palavra - meio ‘perua’, assim, sabe? Aquelas professoras que passavam batom vermelho na boca, que gostavam de colocar música. Eu acho que a maioria, ou professor de Inglês ou de Língua Portuguesa, sempre leva um radinho pra sala, né? Aqueles radinhos assim, coloca no canto, pra gente ouvir alguma música. Eu me recordo dela andando pela sala com uma toalhinha na mão, limpando o dente sujo de batom, assim. E aí passando e chamando a gente de: “Vocês são maravilhosos. Vocês são maravilhosos!”. E eu me recordo, bem com aquele exagero, assim, sabe? E me lembro de episódios do tipo: a sandália que ela estava usando - um tamanco -, ter arrebentado a correia, ela ter pegado um grampeador e grampeado o tamanco de novo, pra ela não ter que ir embora ou pra ela não ter que ficar descalça. Me recordo de ter ido na casa dela. Quantas vezes fui na casa dela! Conhecia a família, as filhas. Me lembro que eu emprestei um livro pra ela, que até hoje ela não me devolveu. (risos) Se ela estiver assistindo a essa entrevista: “Não precisa devolver mais, porque já passaram muitos anos. Eu não sei se a senhora ainda tem esse livro”. E era um livro de uma pastora americana, acho que chama Joyce Meyer. O livro se chamava, ou se chama ainda, né, "Eu e Minha Boca Grande!". (risos) Então, eu me lembro desse livro, me lembro de ter emprestado. Me lembro da professora de Ciências, né, na época que a gente ainda chamava de “professora de Ciências”. A professora [se] chamava Maria Carmem, me recordo bem. O marido dela era médico. Ela viajava muito pra fora do país [e] gostava muito de ópera. E eu gostava muito daquele filme "O Fantasma da Ópera". Eu me recordo dela ter trazido, dela dizer que tinha o CD com toda a trilha sonora da ópera, de "O Fantasma da Ópera". E ela, eu me lembro dela ter copiado esse CD pra mim. Acho que eu não o tenho mais, mas tenho essa memória. Aí, pra finalizar, tive uma professora de Geografia. Na verdade, duas, né? Aí, uma no ensino fundamental e a outra no médio. Mas como você não me perguntou da do ensino médio, eu vou ficar só na do ensino fundamental. A professora do ensino fundamental [se ]chamava Tânia. E ela era meio "punk rock", assim, sabe? Gostava de Iron Maiden. Tinha uma tatuagem no braço, assim, acho que era. Acho que o personagem, o mascote se chama Eddie ["the Head"], o mascotezinho amarelinho, assim. Ela usava aquela tatuagem. Mas era tão discrepante, que a gente conversava… Ela era toda "punk rock", mas gostava de assistir os "Backyardigans", no Discovery Kids. Ela falava sobre isso pra gente. E ela falou: “Olha, você podia ver”. Aí eu passei a assistir o Discovery Kids em casa, pra poder ver. Isso, na época, acho que era na sétima série. E ela falava muito sobre os "Backyardigans". Aí, pensa, uma pessoa que é toda roqueira, "punk", "punk rock", lésbica e tal, toda “punkzona”, usava preto, mas adorava assistir "Backyardigans", uma coisa super meio que infantilizada e colorida. Mas essas são as memórias mais gostosas, óbvio. Eu tenho professoras que me marcaram de forma negativa, com uma chatice, com pessoas enjoadas. Mas fora isso, essas são algumas das pessoas que me marcaram bastante, de forma positiva, digamos.
P1 - E a religião já estava presente na sua infância, com a sua família? Ou foi algo que surgiu depois?
R - A religião sempre esteve presente na minha vida. Tanto na infância, quanto na adolescência. E agora na vida adulta, né? Na infância, com a minha família sendo uma família católica, sendo uma família sempre cristã. Sempre me apresentando valores cristãos, me levando à missa, me levando à igreja. Eu tinha, quando mais novo, um desejo de ser padre. Acho que está aí a resposta pra sua pergunta lá do começo: “Ah, o que você queria ser, quando você crescesse?”. Profissionalmente, digamos que não tinha nada em mente, mas depois que conheci o lado mais religioso da vida, eu tive vontade de ser um sacerdote, de ser padre. Tentei conhecer mais as pessoas de dentro das lideranças das igrejas, pra tentar, sei lá, possivelmente entrar num seminário. E acabei não entrando no seminário por causa dos conflitos, né, internos com a orientação sexual. Eu dou aqui um salto um pouco maior pra te explicar, assim. Enquanto jovem que é criança, jovem e adolescente, até parte da minha adolescência, eu era uma pessoa católica, que buscava fazer Crisma. Fiz [a] Primeira Comunhão, mas não cheguei a terminar a Crisma. Mas fiz a Primeira Comunhão. E busquei, de algumas formas, tentar entrar num seminário. Mas aí o conflito com a sexualidade começou a ser mais aflorado, e aí eu passei a buscar uma forma de reorientar a minha sexualidade. Acabei conhecendo uma igreja evangélica. Aí acabei me convertendo, né? Conheci essa igreja evangélica. E aí, só que no final das contas, eu acabei não me mudando. Acabei me conhecendo mais ainda, conhecendo um submundo dentro das igrejas, né? Dentro das igrejas chamadas de igrejas tradicionais, nas quais eu me relacionei com pessoas e fui descobrindo ainda mais a minha sexualidade. E sou o que eu sou hoje, ainda.
P1 - E passando então pro seu ensino médio, né, a gente estava falando sobre os professores que marcaram e aí você disse que tinha também professores que te marcaram no ensino médio. Mas eu queria, também, que você contasse um pouco sobre momentos, não só sobre professores, mas sobre momentos que você lembra até hoje, que são importantes pra você, durante o ensino médio.
R - Bem, momentos que me marcaram mais no meu ensino médio, né, momentos que estão muito vivos na minha memória, são momentos como, por exemplo, a minha descoberta, o meu "outing", né? Digamos que o fato de eu ter saído do armário, as pessoas da escola foram as que ficaram sabendo primeiro do que a minha família, né? As pessoas da escola sabiam que eu era gay, que eu tinha uma sexualidade diferente. E eles souberam antes da minha própria família, né? Então, eu me recordo bem desse "outing". Me recordo de momentos quando - como eu fui, saí fora - eu saí de casa, né, com aqueles primeiros conflitos. As pessoas da escola queriam fazer chá de casa nova, um chá de alguma coisa, lá, pra mim, porque eu estava me mudando. Eu estava indo morar com a pessoa que eu estava me relacionando. E tiveram brigas na escola, porque a direção não queria autorizar a realização. As pessoas queriam levar... Os alunos, né, da sala, queriam levar bolo. As professoras queriam ceder o horário pra realizar, queriam fazer, comprar salgado, fazer as coisas e tal. E a direção da escola deu o caso, esse caso foi parar no colegiado. Foi uma confusão. Mas, no final das contas, o evento acabou acontecendo. A direção... Mesmo sem a autorização da direção, a professora, eu me recordo, a professora de Português do ensino médio cedeu o horário dela, [também] comprou o bolo, deu o bolo de presente - deu o dinheiro pra que eu pudesse comprar o bolo. Levei o bolo. E fizemos. Levaram salgados. E, no final das contas, a direção da escola acabou aparecendo na sala, pra poder comer o salgadinho e o bolo, (risos) desse eventozinho, bem um "petit comité" [pequena reunião], assim, né? Mas acabaram indo, né? Porque, no final das contas, aquela frase que esse menino que fez o vídeo da Pfizer, fala: “Quem é de verdade, sabe quem é de mentira”. Então, é basicamente (risos) nesse sentido, sabe? Mas são memórias muito disso, porque eu sempre fui uma pessoa muito, muito dinâmica. Então, eu tive professora de Geografia no ensino médio, que ela me contava sobre a vida pessoal dela, sobre as desconfianças dela, do filho dela ser ou não homossexual. Ela me pedia aconselhamento pra saber como ela descobria se o filho dela era gay ou não. O meu primeiro contato com a história de Portugal foi por causa dela, porque ela é cidadã portuguesa, os pais dela eram portugueses. Então, o meu primeiro contato com a história de Portugal foi por causa dela. Então, além disso, tive o meu primeiro contato com a vida espiritual, né, com o mundo espiritual, fora do meio cristão tradicional: fui conhecer os centros kardecistas. Ela frequentava um centro kardecista, me apresentou e aí eu acabei conhecendo. Então, no final das contas, a minha vida no ensino médio foi uma vida muito catalisada por pessoas, né? Me deram um pontapé, pra que eu pudesse caminhar e conhecer as coisas mais rápido. Eu acabei me empolgando e conhecendo muitas coisas num curto espaço de tempo: me conhecendo melhor, conhecendo pessoas diferentes, conhecendo um mundo diferente, fora do mundo que muitos jovens têm, que gostam da curtição durante o ensino médio, e seguem com essa curtição durante a faculdade. Eu, basicamente, não. Eu - como tive todo esse conflito de me assumir, ter que sair de casa, viver uma vida de mais responsabilidade -, logo depois de sair de casa, então, acabei vivendo uma vida que... O meu esposo até brinca, né, comigo: “Olha, você não teve infância. Você não gosta de se divertir”. Então, (risos) porque eu sou muito quietinho [e] sossegado. Mas esse é o propósito que eu tenho hoje na minha vida. Não é recuperar o tempo perdido no passado, mas é, no mínimo, tentar tirar um pouco da seriedade. É bem difícil, porque eu me acostumei a ser sério, né, a ser mais fechado. Mas essas são as melhores lembranças que eu tenho do meu ensino médio, sabe? De ter esse contato com os professores, de ter esse contato com a direção da escola. Bater papo com a direção da escola. Na hora do recreio, eu ficava na sala da supervisão batendo papo, tomando um lanche. Essas coisas assim. Nunca fui de ficar no meio dos colegas mesmo, em si, de sentar com os amigos na escola. Então, eu sempre fui diferente.
P1 - E essa escola era qual, que você fez o ensino médio? Ela já era mais longe? Ou era na mesma escola?
R - Não, não. Eu fiz o ensino fundamental numa escola, que é no bairro onde os meus pais moravam, né, onde eu cresci. E o ensino médio, eu fiz parte em uma escola no bairro onde eu já estava morando com a minha mãe, né? Os meus pais já tinham se separado, a gente já estava morando em bairros diferentes. Eu já tinha um irmão, né, que é o que está morando aqui conosco. A gente morava num outro bairro, já em Belo Horizonte, né, na capital. A gente não morava mais na região metropolitana. E ali eu fiz parte do ensino médio. Acabei saindo da escola antes de concluir o ensino médio. E terminei o ensino médio, depois de algum tempo, com o supletivo, né? Aí fiz o supletivo, terminei o ensino médio. E hoje eu tenho, estou na minha terceira graduação. Tenho três pós-graduações, um livro publicado. Então, basicamente, a minha trajetória foi uma reviravolta, né, digamos.
P1 - E eu queria que você comentasse um pouco sobre essa questão do fato de você ter saído de casa no ensino médio. Isso foi com quantos anos? E como você... Quais mudanças que isso promoveu na sua vida, naquele período?
R - Bem, eu saí de casa por uma discussão que eu tive, né, com a minha mãe, quando eu me assumi. Era muito complicado pra ela, ainda, na época, compreender as vertentes, compreender as diferenças, né? Então, eu acabei tendo esse conflito após uma tentativa de suicídio. Tentei o suicídio depois que eu me assumi, tomei uma caixa de remédio controlado. E morava com a minha mãe, né, já nessa época. E eu, se não me falha a memória, estava com os meus quinze pra dezesseis anos, alguma coisa nesse sentido, catorze e quinze anos - entre catorze e dezesseis anos, alguma coisa assim. E essa saída de casa se deu exatamente porque… Eu só vou declinar, assim, as terminologias das brigas, né, que eu tive com a minha mãe. Foi muito complicado. Ela acabou dizendo algumas coisas, dizendo que não queria um filho viado dentro de casa, que ela não tinha criado filho pra ser viado. Isso, né, na época. Hoje a minha mãe mora aqui em casa. Nós moramos, né, com ela. Ela trata o meu esposo melhor do que ela trata os filhos. (risos) E digamos que essa fase foi muito complexa. Então, aí eu acabei saindo de casa, indo morar com a pessoa que eu estava namorando. E tive que tomar as rédeas, né, da minha própria vida nesse início, nesse recomeço.
P1 - E pensando nessa sua saída, você começou a trabalhar com quantos anos? Qual foi o seu primeiro emprego?
R - Eu comecei a trabalhar com quinze anos, ainda. Foi um pouco antes, acho. Se eu não me engano, foi durante... Quer ver? Tsc. Eu fui Menor Aprendiz, acho que com uns catorze anos, né? Porque eu fui Menor Aprendiz [durante] um ano. Foi basicamente um ano antes de eu me assumir. Foi exatamente isso. Eu me assumi, estava trabalhando como Menor Aprendiz. Foi nesse ciclo. Eu estava, era Menor Aprendiz. Eu tinha uns catorze, quinze anos, ali. Era 2006, 2007. Mais ou menos isso. Aí dá pra gente fazer o cálculo, pra saber quantos anos eu tinha, né? E eu trabalhava numa farmacêutica. Eu era Menor Aprendiz numa farmacêutica que tinha, próxima. Eu tinha quinze anos quando comecei a trabalhar, exatamente. 2006. Comecei a trabalhar em maio de 2006 nessa farmacêutica. Eu me lembro de ter levado o meu currículo pra ser Menor Aprendiz. Era próxima da minha casa, né, também. Se eu não me engano, ela [se] chama Athos Farma. - Acho que até já faliu. - E me recordo bem disso. Esse foi o meu primeiro emprego, digamos.
P1 - E você disse que você finalizou o seu ensino médio, depois, por supletivo.
R - Sim.
P1 - Você chegou a parar e depois retornou?
R - Sim. Como eu disse, no ensino médio, parei o ensino médio, né? Eu estava com quinze anos, não estava no ensino médio ainda, né? Eu sou daqueles que é considerado fora de faixa, digamos, né? Eu sou de 1991, só que sou de setembro, né? Então, no período onde [se] faz as matrículas, eu ainda não tinha a idade certa. Então, no final de tudo, eu saí do ensino médio, já estava com quase dezoito, né? Eu estava com uns dezessete anos. E aí fiquei entre os dezessete até os dezoito, dezenove, quase, sem fazer o ensino médio. E aí terminei através do supletivo.
P1 - E, nessa época, você já tinha interesse em fazer algum curso superior? Ou você ainda estava em dúvida? Como você chegou na sua primeira graduação?
R - Ah, a minha primeira graduação foi fruto de duas tentativas interrompidas, né? Eu comecei tentando fazer Pedagogia. Depois tentei fazer Teologia, tranquei. Até que eu cheguei aonde cheguei. Eu fui fazer depois: fiz licenciatura em História [e] bacharelado em Teologia. Foram as duas graduações que eu me arrisquei e fiz ao mesmo tempo. Fiz dois cursos diferentes ao mesmo tempo. Fiz bacharelado em Teologia e licenciatura em História. E hoje, curso Jornalismo. E já tenho as três pós. Mas a primeira graduação em si, mesmo, foi de Pedagogia. Eu sempre tive um pouco de feito, como eu disse, né, pra essa... Eu sempre tive um pouco mais de afeição com essa questão do ensino, da fala. E eu tenho muita vocação, eu acho, pra essa questão do ensino ou até mesmo para o parlamento, né? Eu sou muito envolvido com essas questões de militância de Direitos Humanos, de Direito LGBT. Então, eu acho que isso casa um pouco com o meu desejo da minha formação, desde quando fiz a primeira faculdade, né, a primeira graduação.
P1 - Enquanto isso, como foi caminhando a sua vida profissional? Depois que você foi Menor Aprendiz, né? Depois disso, eu queria que você contasse um pouco sobre as atividades que você teve durante o período, quando você estava fazendo as suas graduações.
R - Então, respondendo a minha pergunta... Ou melhor, a sua pergunta, né? Respondendo a sua pergunta: enquanto eu estava fazendo as minhas graduações, eu passei por "call center": fui operador de "telemarketing" e supervisor de "call center". Eu fui assistente administrativo, trabalhei com nota fiscal. Trabalhei em atacadista. E trabalhei enquanto digitador, que é o meu emprego até hoje, há cinco anos, né? É o meu emprego atual, que é de digitador, numa terceirizada. Presto serviço pra órgãos públicos, né? Eu, atualmente, presto serviço no Detran, pra uma empresa que é terceirizada. Então, todas as minhas atividades foram atividades, digamos, que genéricas, né? Foram atividades genéricas, até eu concluir a faculdade. Eu até consegui lecionar durante um ano, mas ainda enquanto eu estava estudando, antes de concluir a faculdade de licenciatura em História. Mas não cheguei a lecionar após o término das graduações, ainda, né? Não cheguei a trabalhar na minha área de formação ainda. Exceto durante esse período de um ano.
P1 - E eu queria que você falasse um pouco, fazendo um resumo, assim, de cada graduação que você fez: o que você acha que te marcou pra ser quem você é, agora? O que te ficou, dessas três graduações?
R - Bem, na realidade, são duas graduações afins, né? Um bacharelado em Teologia, pela minha vocação religiosa. Eu já fui consagrado pastor, já tive igreja aberta, igreja que acolhe a diversidade sexual, né? Eu participei de programa de TV como debatedor, exatamente pelo fato de ser pastor e ser gay assumido, né? De já ter sido consagrado pastor e ser gay assumido. Então, acho que o bacharelado em Teologia me marca na minha história, pelo fato da minha vocação e meu apreço pela religiosidade como um todo. Acho que hoje eu posso compreender que a compreensão e o carinho pela espiritualidade, pela religiosidade, em si, não se dá apenas no âmbito cristão. Mas ela me traz pra um traço próximo às religiões de matriz africana, às quais eu tenho um amor muito grande. Gosto muito, gosto de estudá-las. As religiões, né, o lado kardecista também, né, da espiritualidade. Então, o bacharelado em Teologia me marca por esse lado meu de grande afeição às questões da vida espiritual. No entanto, a licenciatura em História vem pra uma tentativa de uma formação que pudesse trazer um pouco mais de humanidade ao meu lado religioso, que é a junção do lado mais antropológico, né? Digamos que mais o lado do homem, mais o lado da história real, os fatos, que fazem esse contrapeso no lado da espiritualidade, né? É o que falo sempre com o meu esposo, que quando você faz Teologia, ou você fica ateu, ou você fica muito crente, muito fiel. E quando você coloca um bacharelado em Teologia ladeado com uma licenciatura em História, você é um teólogo e historiador. Então, você tem a oportunidade de confrontar as pregações teológicas com fatos históricos. Então, quando você confronta fatos históricos com, muitas vezes, uma verdade que não é 100% verdadeira, que é verdade pra aqueles que creem nela, mas que a História não confirma aquilo, os fatos não a confirmam, você traz um pouco mais de humanidade, de humanização para o conflito que, muitas vezes, a religiosidade impõe à mente do ser humano. Então, essas duas graduações que eu já concluí, são duas graduações que marcam a minha história tanto de um lado, quanto do outro. E, querendo ou não, o lado da licenciatura está mais atrelado à questão pedagógica, né, à questão de selecionar, me dá também essa marca de eu falar muito, [de] gostar de interagir com pessoas. Eu gosto de gente. Detesto ficar sozinho. Não gosto de solidão. Não gosto de ter que ficar trancafiado em canto nenhum, assim, sozinho. Eu sou que nem aquela, que nem o meme da Nazaré, sabe: “Eu quero sair! Eu quero ver gente”. Mas eu não gosto de ficar... Como é que eu posso dizer? Eu gosto de sair, de interagir, mas eu não gosto de tumulto, não gosto de festa com tumulto. Não gosto de "show" com gente demais, aquela ‘tumultuaiada’, sabe, de gente. Sou muito sossegado. Sou um virginiano com ascendente em gêmeos, lua e ascendente em gêmeos. Então, é um virginiano detalhista, enjoadinho e tal. E o lado mais chatinho do geminiano, né? Daquela coisa de ser o crítico, o que não gosta de gente grudando em mim toda hora, mas gosto de ficar agarrado, né, nas pessoas que eu gosto. Eu gosto, sou super pegajoso com o meu esposo. Ele já é um sagitariano com ascendente e lua em touro, então é mais na dele, é mais reservado. Então, nós temos um certo conflito de eu ser muito pegajoso e ele não gostar muito de quem é pegajoso. Mas, enfim, e hoje eu faço uma terceira graduação, que está em curso, que é a graduação em Jornalismo, que vem com essa, com a minha queda de paraquedas no meio televisivo. Porque, quando eu casei, o meu primeiro casamento - hoje eu estou no meu segundo casamento, espero que seja o último, se Deus quiser, né? Que Oxalá abençoe, minha mãe Oxum também. Que seja o último casamento! Que eu fique velhinho com ele, porque nós já estamos juntos há quase sete anos. - Então, quando eu casei a primeira vez, foi o primeiro casamento homoafetivo da capital mineira. Foi antes da decisão da CNJ [Conselho Nacional de Justiça]. Então, a gente se casou, e foi por uma decisão judicial. A gente se casa, tem uma decisão judicial… A gente consegue essa decisão [e] a gente se casa. E aí isso foi pra mídia, nossa: “O primeiro casamento homoafetivo da capital”. Aí eu fui pra mídia, eu fui dar entrevista em jornal, rádio, programa de TV. Eu não sei se eu já citei, que participei durante seis anos de um programa de debates, aqui na afiliada do SBT, chamado “TV Verdade”. Isso tudo porque, na minha primeira participação nesse programa, foi enquanto o primeiro gay casado da capital mineira e que é pastor, né? Digamos: e que é pastor. Então, era uma novidade: “Nossa, tem um pastor gay! Nossa!”. Isso era, né, pra esses programas, que muitas vezes acabam tentando fazer um pouco de sensacionalismo, pra ser mais popularesco. E aí isso me fez cair de paraquedas no meio televisivo, e eu criei paixão por isso. Eu adoro câmera, dar entrevista. Ontem mesmo eu estava dando uma entrevista pra TV Globo, pra falar sobre um caso, um possível caso de Lgbtfobia, falando sobre ideologia de gênero, que uma escola, um colégio ligado à uma Igreja Batista aqui em Minas, acabou postando um vídeo de resposta ao Burger King, falando que nós estamos querendo destruir a família, que nós queremos confundir a fé e dizer que menino pode ser menina, essas coisas bobas que eles inventam, né, sobre essa falácia da ideologia de gênero. Então, essa minha vivência do meio televisivo me fez tentar criar um canal no Youtube. Eu já entrevistei o Whindersson Nunes, o Pyong Lee, o Rafael Cortez, o Paulinho Serra, essas pessoas, assim. As Irmãs Galvão, aquelas cantoras de músicas sertanejas. E isso me fez ficar apaixonado pela TV. E aí, eu falei: “Bem, eu vou tentar fazer uma faculdade de Jornalismo”. E aí estou fazendo essa, literalmente, por paixão, porque eu me apaixonei pela mídia, pelo fato de gostar de descrever fatos, de escrever, de estar na TV. Então isso, pra mim, acabou sendo uma paixão, né? E aí hoje estou aí. E aí falando, né, fiz as três pós-graduações na área da educação. Fiz docência do ensino superior porque, querendo ou não, é uma forma de tentar ter uma porta a mais aberta no mercado. Fiz Planejamento Educacional e Políticas Públicas pelo fato de eu, hoje, estar ligado a uma ONG, a Aliança Nacional LGBTI+, uma organização nacional, pluripartidária, que lida com Direitos Humanos, que milita pela cidadania da população LGBTI+. Então, ou seja: ter uma forma de ter um conhecimento a mais sobre políticas públicas voltadas ao planejamento educacional. E Psicopedagogia Clínica e Institucional pra tentar também, né, compreender um pouco mais do comportamento dos alunos, né? Como a Pedagogia pode influenciar no crescimento, no desenvolvimento do caráter, da formação psicológica, da formação mental, da formação motora, né, dos alunos. Então, isso tudo é uma forma de somar. Então foi esse, basicamente, um resumão aí, né? Que você pediu pra ser um resumo, mas acabei me delongando. Mas é um resumão mesmo da minha vida de formação acadêmica.
P2 - Você citou que adora se comunicar e tal. A gente viu que você fundou uma igreja, também. Como é que foi essa experiência?
R - Sim, sim. Como eu disse, eu fui consagrado pastor. Então, eu tive a oportunidade e a vontade de confrontar um pouco o sistema, né? De poder tentar mostrar, falar: “Olha, é possível ser gay e ser cristão. É possível ser gay e ser aceito pelo Deus”, que os cristãos dizem que rejeita os homossexuais, as pessoas LGBTIs. Então, esse foi o meu desejo, de poder pregar aquilo que eu acreditava, né? Que não só eu, mas aquilo que me foi apresentado quando me assumi. Eu conheci, quando eu me assumi, uma igreja inclusiva chamada Igreja da Comunidade Metropolitana [“Metropolitan Community Church”], uma igreja que foi fundada lá nos Estados Unidos, pelo reverendo Troy Perry. E essa igreja foi a primeira igreja que eu tive contato com a teologia inclusiva. E aí, a partir disso, eu tendo sido consagrado pastor. Eu fundei, na época, [a] Comunidade Inclusiva Fonte de Água Viva, que nós precisamos mudar o nome dela por um conflito, por uma ameaça de processo que nós sofremos de uma igreja pentecostal do interior de Minas, que tinha o nome de Igreja Evangélica Fonte de Água Viva. Como houve uma repercussão grande na mídia, também saiu nos jornais aqui do estado, que íamos abrir a igreja e tal, então houve um conflito grande por parte dessa igreja, porque mandaram o escritório de advocacia atrás da gente, pra questionar por que nós estávamos usando esse nome. Eles tinham feito depósito, marcado esse nome no Inpi (Instituto Nacional da Propriedade Industrial)... Acho que é no Inpi, se eu não me engano, né, alguma coisa assim. Eu não sei se é no Inpi. E aí eles ainda não tinham o registro da marca Fonte de Água Viva, mas tinham feito o depósito e estavam questionando o uso, que a gente poderia ser processado. Foi uma notificação extrajudicial. E eu, na época, ainda era novo, então pra se evitar transtornos e problemas, acabamos mudando o nome da igreja pra Igreja Apostólica Benção e Vida. Na época, a gente fundou a Igreja Apostólica Benção e Vida, uma igreja que acolhe, ou melhor, que acolhia, porque hoje ela já não existe mais. Existem outras denominações evangélicas que incluem as pessoas homoafetivas, como a Cidade de Refúgio, aí em São Paulo, né, que é das pastoras Lanna Holder e Rosania Rocha. A Comunidade Cristã Nova Esperança, que tem o pastor Justino [Luis], que é também no estado de São Paulo. Se eu não me engano, fica na Amaral Gurgel, a CCNE. Então, nós temos ‘n’ outras denominações. Então, sim, houve, foi uma experiência marcante, uma forma de poder utilizar da minha voz e mostrar pra muitas pessoas que se sentiam rejeitadas no seio das suas igrejas - muitas que cresceram no meio evangélico -, que se sentiam rejeitadas, que se sentiam demônios, que eram taxadas como demônios [e] como pessoas inferiores. E isso, basicamente, foi uma forma de mostrar aquilo que, realmente, a Bíblia fala sobre a homossexualidade, né? A Bíblia não condena a homossexualidade. Então, tanto no contexto com a qual a Bíblia precisa ser interpretada, ou melhor: é no contexto qual a Bíblia precisa ser interpretada, que é o contexto histórico, como eu disse ao Genivaldo, né? O contexto histórico. E ele precisa ser interpretado dentro de um contexto histórico crítico. Porque a Bíblia, na sua forma literal, pode ser arma pra, inclusive, colocar pessoas pra se suicidarem, né? Pra pais venderem filhos, pra mulheres não serem tocadas durante períodos menstruais, dentre outras coisas. Pra não comer carne de porco, pra não comer um camarão. Enfim, pra não usar roupa com dois tipos de tecido, “n” situações. Então, foi uma experiência muito impactante e que me rendeu frutos, né? Essa experiência da formação enquanto teólogo e pessoa consagrada pastor, que crê na teologia inclusiva, que foi a que culminou no meu livro - que é publicado pela Editora Appris -, que chama “A Bíblia Fora do Armário”. Exatamente um livro que conta todos… Que eu tento descrever teologicamente, com uma pitada histórica. Ainda falta. Eu pretendo preparar, ainda, um segundo livro, mas contando o lado histórico, né, da homossexualidade. Mas nesse livro eu explico versículo por versículo da Bíblia, todos os que citam questões LGBTIs; explico tanto a visão teológica tradicional, quanto a visão teológica inclusiva, né? Então, é aquela que acolhe, aquela que condena. Nesses textos, eu busco explicar, através desse livro. Então, essa foi a experiência que eu tive, estando à frente de um ministério, enquanto pastor, essa foi a experiência que mais me marcou, digamos, na minha vida espiritual.
P2 - Em que ano foi isso, mais ou menos?
R - Olha, eu posso pegar o telefone aqui pra poder pesquisar, só pra te falar, assim. Quer ver? Comunidade Inclusiva Fonte de Água Viva. Eu não sei te dizer o ano [exatamente], mas eu posso te dizer, porque eu tenho matérias salvas aqui. Eu tenho matérias salvas aqui, de jornal, sabe?
P2 - Durou bastante tempo?
R - Foi um ano, um ano e pouquinho, sabe? Ó, foi em 2015. Foi em 2015 que a igreja foi inaugurada. Dia dezessete de maio de 2015. Eu achei aqui. Tem matérias no jornal O Tempo, matérias no jornal Super e coisas assim. Tem essas matérias. Então, assim, já tem bastante tempo, né? Hoje, de 2015, né? Nós estamos em 2021. Então, já tem bastante tempo. Eu tinha conhecido o meu esposo nesse ano. Conheci o meu esposo em 2015. Conheci [ele] em 2015 e casei em 2016.
P2 - E como é que você o conheceu?
R - Por causa da visibilidade. Eu participando de programas de TV, celebrando casamentos homoafetivos, ele viu uma publicação minha na internet, me adicionou no “Face” e a gente começou a conversar [e] conversar. Ele já tinha morado na cidade da região metropolitana aqui, junto com os pais. Tinha se mudado pro interior, que é de onde ele nasceu. Ele é nascido em Bom Jesus do Galho (MG), uma cidade também do interior, aqui, de Minas. Voltou pra capital, pra região metropolitana, e a gente passou a se conhecer. E estamos juntos até hoje, graças a Deus.
P2- Você falou que muitos fiéis te procuravam, porque eles se sentiam rejeitados, né? A maioria dos fiéis eram LGBTs? Ou eram pessoas de um âmbito mais progressista, geral?
R - Não. Digamos que - desculpa eu ter te interrompido -, mas digamos que a maioria das pessoas que procuram uma igreja inclusiva são pessoas que são LGBTs, né? São pessoas que são rejeitadas nas instituições religiosas das quais elas fazem parte e acabam procurando um espaço pra elas serem acolhidas. São pessoas que são ou pessoas que se sentem rejeitadas, que já tentaram suicídio, que já passaram muitas vezes por tentativas de reorientação sexual e acabam sofrendo essa rejeição. Então, é a maioria das pessoas que procuravam. Porque, enquanto eu estava no programa de TV, ainda não tinha inaugurado a igreja, né? Quando eu comecei as minhas participações no programa de TV, ainda não tinha inaugurado a igreja. Então, as pessoas começavam a procurar: “Nossa, precisamos de um lugar pra congregar. Precisamos de um lugar pra congregar”. E aí, através desses pedidos, eu estava já no programa, né, de TV e acabamos inaugurando a igreja. E foi a partir dos pedidos, né, das pessoas, que nós inauguramos a igreja, né? Se não fossem os pedidos das pessoas, nós não teríamos buscado uma forma de abrir a igreja. Porque eu, particularmente, sempre considerei o fato, até mesmo na tentativa de encontrarem um lugar… Eu nunca imaginei que fosse pastorear uma igreja, que eu fosse fundar uma igreja, porque dá muito trabalho. E foi esse, foi um dos principais motivos pelos quais a igreja não permaneceu aberta, porque dá muito trabalho a gente ter dinheiro pra pagar um aluguel, né? E é muito difícil a gente conseguir. Foi justamente no período que o país estava enfrentando uma crise. Então, aí as pessoas não estavam em condição de poder ofertar. Eu tenho como crença e como prática não cobrar e não exigir doações de ninguém, enquanto estava à frente de nenhuma igreja, né, de nenhum ministério. Porque eu não acho justo as pessoas tirarem do seu próprio sustento pra darem dinheiro pra igreja. Ah, aí a gente entra numa seara teológica, numa interpretação bíblica de dízimo e de oferta, mas eu acho que qualquer oferta tem que ser espontânea, de coração. Então, de todas as maneiras possíveis que pudesse ser interpretado, eu acabava pagando esse preço. Porque, ou eu… Nós encontrávamos uma forma de manter a igreja em funcionamento, ou nós tínhamos alguma forma de pedir pra que as pessoas doassem. Só que era uma questão, digamos que não uma questão moral, mas uma questão pessoal de acreditar, de interpretação teológica, né, de acreditar nisso.
P1 - Voltando pra questão do programa de TV, Gregory, eu queria que você contasse um pouco sobre essa experiência, que acabou ativando o seu lado pro jornalismo. Como isso aconteceu? E qual foi o período? Você disse que foram seis anos. Mas qual período, mais ou menos, em que você participou desse programa de debates?
R - Sim. Bem, como eu te disse, durante a nossa conversa, acabei caindo nesse programa de TV por causa do meu primeiro casamento, né? Então, no meu primeiro casamento foi o que me abriu portas. Eu fui dar entrevista, primeiro pra uma rádio, depois saiu no jornal. E aí o apresentador desse programa [se] chamava Ricardo Carlini, a gente tem contato até hoje. Eu acabei fazendo grandes amigos na afiliada do SBT. A gente tem contato até hoje com essas pessoas. E ele acabou me convidando, falou: “Olha, eu quero você aqui no programa”. Eu não sei… Quer ver, deixa eu ver aqui. Eu sempre me apego às coisas que estão na internet, porque são as matérias que me dão esse norte, né? Então, foi isso mesmo, [em] 2013. Isso mesmo, foi [em] 2013 o meu primeiro casamento. E aí, a partir disso... Isso mesmo, foi dia 22 de janeiro de 2013. E a gente se casou, né? Foi o meu primeiro casamento. E aí, foi a partir disso. Nesse mesmo ano de 2013, houve o reconhecimento da união instável, né, de pessoas homoafetivas, mas a gente conseguiu se casar antes disso. E aí eu acabei indo parar nesse programa de debates e acabei virando peça de convite. Todas as vezes que tinha alguma pauta voltada pra população LGBTI, acabavam me convidando pra estar lá. Que eu sempre acabava sendo um ponto de polêmica, né? Digamos: um pastor assumidamente LGBTI, que está aqui no programa, uma pessoa que é uma liderança religiosa e que é gay. Então, isso durou até o ano… Até antes da pandemia, que a gente... Algumas questões, acho que eu prefiro não contar, pra não perder as amizades que eu fiz lá, porque acabei dando uma entrevista pra uma outra emissora e, como eu era convidado - não era contratado dessa emissora, né, da afiliada -, me sentia livre pra conceder entrevistas pra todas as outras que assim desejassem. Então, acabou tendo ali um conflitozinho. Eu parei de participar. E, logo depois, o programa acabou saindo do ar, por uma questão da grade mesmo do canal e questões mais técnicas, mais financeiras da emissora, né? Então, durou bastante tempo, né, se você ver: 2013 até o ano de 2019, foi bastante tempo. Eu fiquei.. Eu ia, basicamente, umas duas, três vezes ao mês. Eu estava no programa. Basicamente, duas, três vezes ao mês. Era mais ou menos assim, mas eu sempre estava. Era constante, digamos.
P1 - E eu gostaria que você falasse um pouco sobre a Aliança Nacional LGBTQIA+. Você disse que participa. Eu queria que você explicasse como funciona e qual é o seu papel dentro dessa Aliança.
R - Claro. Hoje, na Aliança Nacional LGBTI+, nós não utilizamos a sigla toda, tá, com o LGBTQIAP+, porque nós consideramos que ser queer é uma teoria, né? Não é uma orientação sexual. Então, nós utilizamos a sigla LGBTI+. A Aliança é uma organização pluripartidária, que não tem bandeira de partido, não tem fins lucrativos. Tem representação em todos os estados do Brasil, inclusive no Distrito Federal. Eu, hoje, estou [nela como] coordenador estadual titular da Aliança, no estado de Minas Gerais. Coordeno a área de comunicação a nível nacional: eu sou o responsável pela área de comunicação. E dou apoio em outras áreas, como coordenar o GT de produção de notas e moções, dentre outras questões que eu acabo dando, ali, um suporte. A Aliança trabalha, geralmente, com alguns pilares, que são os pilares do “advocacy”, que é dialogar com o poder público, que está aí pra buscar, realmente, a garantia e manutenção dos direitos já conquistados, né? A garantia daqueles que ainda não foram conquistados e a manutenção daqueles que já foram conquistados, buscando uma forma de não permitir que haja um retrocesso, pra que nós consigamos lograr êxitos nos nossos direitos civis, né? Nós não queremos nenhum direito a mais, mas apenas direitos iguais e que nossos direitos sejam garantidos. Então, a Aliança tem esse propósito. Não de ser uma organização de assistência social, mas nós, sempre que recebemos alguma demanda, encaminhamos aos órgãos que são responsáveis, ao poder público. Denúncias de Lgbtifobia, nós temos a central nacional de denúncias. Nós encaminhamos essas denúncias que nós recebemos para os órgãos competentes. Nós estamos sempre atuando em cima dos fatos: quando acontece algum crime de Lgbtifobia, algum parlamentar que profere algum tipo de ofensa contra pessoas LGBTIs. Como é o caso que aconteceu com o apresentador, aquele apresentador lá da RedeTV e da TV A Crítica, acho que é o Sikêra Júnior. A Aliança está com um processo contra ele. O Ministério Público do Rio Grande do Sul também está processando-o. Então, a Aliança sempre está trabalhando dessa forma, com o “advocacy”, com formações para pessoas, tanto pessoas aliadas, quanto para pessoas LGBTIs. Essa é a nossa forma de atuação: trabalhar pra construir uma sociedade mais justa, mais igualitária, que valoriza as famílias, todos os tipos de família. Nós, enquanto entidade, valorizamos a família [e] as nossas crianças. Nós acreditamos que a sociedade pode ser uma sociedade mais justa, mais igualitária, que garante os direitos humanos, que luta pela cidadania da população LGBTI+, que faz parcerias pra poder incluir as pessoas LGBTIs no mercado de trabalho, no mercado educacional. Como nós temos programas de inclusão educacional, como o Programa Educacional Brunna Valin, que é uma parceria com o Centro Universitário Araguaia de Goiás e a Aliança Nacional LGBTI+, que a universidade concedeu mais de... Acho que são 100 bolsas de estudo integrais de ensino superior para pessoas LGBTI+. Nós distribuímos algumas, ainda não distribuímos todas, mas a partir de um edital público, pra pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade social, que não têm condições, realmente, de pagar um curso superior. Então, nós tivemos já essa primeira fase. Enfim, o trabalho da Aliança não é ser uma assistencialista, mas é uma organização que busca, exatamente, lutar por esses direitos, da forma que for possível ser feita, né? Então, nós, hoje, somos essa organização que está sempre atuando ou no Supremo Tribunal Federal, com “amicus curiae” (garante a participação de órgãos públicos e entidades da sociedade civil em processos judiciais), como foi o caso da criminalização da Lgbtfobia. A Aliança foi “amicus curiae” nessa ação no Supremo Tribunal Federal, dentre outras ações. Então, nós temos aí um departamento jurídico. Nós temos áreas temáticas, né? Área de HIV, Aids, área de educação, área de matriz africana, gays evangélicos, né? Nós temos pessoas LGBTIs que são evangélicas. Então, assim, nós temos essas áreas todas pra que nós possamos incluir, exatamente, as pessoas LGBTIs nas áreas da vida, né? Numa vida comum, como pessoas heterossexuais vivem.
P1 - Eu achei interessante que me parece que você também tem a questão da liberdade religiosa, né? Você citou várias vezes a questão das religiões de matriz africana. Então, você também, vocês também têm atuações nesse sentido, a Aliança?
R - Sim. A Aliança tem uma atuação, não pra fazer proselitismo religioso, mas para incluir, né, as pessoas, digamos: pra que as pessoas LGBTIs se sintam à vontade e livres pra frequentar, pra se sentirem representadas da forma que elas se sentirem melhor, na religião que elas se sentirem melhor. Então, digamos que a Aliança tem essas áreas, porque nós temos pessoas que estão dentro dessas religiões, que são pessoas LGBTIs e que promovem a inclusão. Então, a Aliança tenta, de alguma forma, promover, ser essa ponte ligando uma pessoa que é LGBTI, que se sente bem como, por exemplo: indo ao terreiro ou indo a uma igreja inclusiva, que ela muitas vezes não sabe como vai, pra onde vai, onde é. Não sabe como, não sabe a quem procurar. Então, a Aliança tenta ser essa ponte, pra mostrar pra sociedade que nós somos pessoas normais, que nós somos pessoas comuns: nós pagamos impostos, temos nossas dores [e] nossos problemas pessoais. E nós também temos fé. Nós não somos pessoas que não têm fé. Nós não somos pessoas ateias. Até o próprio ateu tem fé em alguma coisa que, normalmente, é na ciência, né? Então, nós não somos pessoas sem fé. Nós somos pessoas que, de alguma forma, são ateias, agnósticas, candomblecistas, de umbanda, kardecistas ou cristãs. Mas o papel da Aliança é exatamente esse: promover a inclusão de todas as formas. Então, por exemplo: eu, enquanto estudante de jornalismo, teólogo e historiador, tenho esse desejo de, exatamente, mostrar pra sociedade, mostrar pra todos e pra todas, que é possível viver em uma sociedade plural, em uma sociedade realmente igualitária e mais justa. Então, por exemplo, nós já fizemos “lives” com pessoas representantes de matriz africana nas nossas redes sociais pra falar sobre a inclusão de pessoas LGBTIs nos terreiros. Nós já tivemos “lives” com pessoas que são cristãs pra falar sobre a inclusão de pessoas LGBTIs nas igrejas. Isso vem se repetindo sempre que nós encontramos alguma demanda. Então, é o nosso papel, exatamente, esse: mostrar, é tentar mostrar a vida como ela é, né?
P1 - E voltando um pouco pra sua história pessoal: eu gostaria que você falasse sobre o momento da pandemia e o impacto que isso teve na sua vida pessoal. O que acabou sendo suspenso ou alterado? O que mudou?
R - Não mudou muito, tá, porque eu sempre fui uma pessoa muito caseira. O meu esposo que sofreu um pouquinho mais, porque gosta de um cinema, gosta de sair pra sentar num barzinho com os amigos, gosta de viajar pra casa dos pais dele. Mesmo que durante a pandemia a gente tenha ido um pouco pra casa dos meus sogros, que são pessoas maravilhosas, que eu amo muito, vivem no meu coração. Sou tratado como filho por eles. Então, a pandemia não mudou muito a minha rotina, só me impediu de sair muito pros “shoppings” ou pra coisa assim, mas eu adoro ficar em casa, pedir alguma coisa pra comer em casa. Teve impacto apenas, acho, que no meu peso e no psicológico do meu esposo, porque ele gosta muito de sair, não gosta de ficar trancafiado, ficar quieto em casa, parado. Gosta de sair com os amigos. Ou seja, é um sagitariano, né? Você botar um sagitariano nessa pandemia [dentro de casa] é um conflito. Assim, é um negócio na cabeça do sagitário, [que] deve ficar: “Sai, sai, sai! Barzinho! Nossa, festinha! Nossa, resenha! Carnaval!”. Pensa, a gente estava no carnaval em 2020 . Ele me arrastou, né, pro carnaval. Eu fui com ele, fomos todos os dias do carnaval. A gente saiu na rua todos os dias, literalmente. Todos os dias a gente saiu. Aí chegou 2020... Ou melhor: chegou em março, começou… Fechou tudo! Chegou esse ano, já não tinha mais carnaval. Pensa na cabeça dessa criança de sagitário: “Nossa, não vai sair. Nossa, eu não estou saindo. Nossa, eu não estou fazendo nada”. Aí perdeu o emprego, ainda por cima, né? Ele foi demitido, porque trabalhava no comércio. Pensa, o período dessa pandemia trouxe prejuízos financeiros aqui pra casa. Então houve, exatamente, esses impactos. Agora, no meu peso e no peso do meu esposo, com certeza. A gente está comendo um pouco mais, porque fica mais tempo em casa. Está assistindo mais Netflix, mais filmes. Escovando mais dente, usando Colgate. Colgate, pode mandar as pastas de dente aqui pra casa, especialmente aquela que tem o carvão [ativado], aquele negócio que tem lá o carvão. O saborzinho é bom, que a gente limpa melhor o dente. Eu adoro aquela pasta que tem o carvão, que fica pretinha. Clareia mais os dentes. Já [estou] fazendo o “merchandising”. (risos) Mas digamos que... Ou seja, a gente acaba ficando mais ocioso, né? Nós temos um cachorro, a gente tem um “chow-chow”. Então, a gente tem que sair com ele, né, na rua. Se não fosse o cachorro, pra forçar a gente a andar, a sair na rua, praticamente não sairia, porque a gente ia ficar muito mais, é, trancafiado. Agora, com essa flexibilização, é que as coisas melhoraram um pouco. Mas houve, teve impacto sim. Eu devo ter ganhado alguns quilinhos. E o meu esposo eu acho que sofreu um pouco mais do que eu no quesito psicológico, né, no quesito mental, porque é uma pessoa que gosta mais dessa convivência externa, dessa vivência de pessoas. Apesar de eu ter dito nessa nossa conversa que não gosto de ficar sozinho, mas lido muito bem se eu precisar ficar em casa. Ah, com certeza, eu lido. Nossa Senhora! É um prazer estar dentro de casa, estar quieto, sossegado, não ter que sair pra fazer muita coisa. Se sair, eu já sei aonde que eu vou, o que eu preciso fazer, onde é que eu tenho que ir. Vou, faço [e] volto pra casa. É a melhor coisa. Acho que o melhor lugar, pra mim, é o meu quarto, a minha casa. Eu, digo, as minhas coisas, o meu canto, porque tenho controle da situação. Eu me considero uma pessoa que não gosta de ser controlada. Eu, apesar de ser muito carinhoso, de ceder muito, de dar muito o braço a torcer: faço porque eu quero, não porque as pessoas me obrigam. Porque eu detesto me sentir forçado a fazer algo. Mas, então, acho que eu detestei ser forçado a não poder sair. Porque quando podia sair, eu não saía porque não queria. E aí, agora, fica aquela situação: “Você não pode aglomerar”. Aí eu falava: “Poxa. Agora eu não vou, porque estão falando que não posso”. (risos) Então, fica aquela coisa. Acho que todo ser humano é assim, né?
P1 - É. São as contradições da pandemia.
R - Exato.
P1 - É melhor você [não] sair porque você decidiu não sair, do que porque você é obrigado a não sair.
R - Exatamente.
P1 - E o tempo que você não está ocupado com alguma outra questão mais séria, o seu tempo livre, durante a pandemia, você tem gasto com que tipo de atividade?
R - Comendo. (risos) Comendo [e] cozinhando. Mas, brincadeiras à parte, a gente tem uma coleção de filmes aqui em casa. Essa é uma pequena parte, se vocês estão vendo aqui atrás. Então, aqui nós temos os CDs que o meu esposo ama. Como eu disse, ele é super, hiper, mega retrô. Ele tem “discman”. Ele tem toca-fitas. Aquelas coisas todas, ele tem. Tudo funciona, tudo. Ele tem um aparelho de celular, um “V3”, aquele aparelho antigo, né, o da Motorola, lá dos anos 2000 e pouco. Ele tem isso aqui em casa. Então, aqui ele tem os CDs dele. Aqui em cima, já os “blu-rays”, né, que estão aqui em cima. Então, a frente - depois eu mostro, a gente tem aqui na frente, em cima do “rack” -, acho que nós devemos ter uns duzentos DVDs e séries, “boxes” de séries. Então, a gente assiste muito [serviço de] “streaming”. A gente assiste muito filme. Ele é fissurado com filme de terror, assiste muito filme de terror. Nossa Senhora, é um sacrifício! A gente liga a televisão de noite, ele: “Ai, vou botar um filme de terror”. Outro dia a gente estava maratonando o boneco assassino Chucky [Chucky do filme “Boneco Assassino”]. A gente estava assistindo Chucky, todos os filmes do Chucky. Antes disso, a gente tinha maratonando os filmes dos “Jogos Mortais”, do Jigsaw. A gente estava assistindo todos os filmes da [franquia] “Jogos Mortais”. Então, a gente está usando muito esse tempo, nessa pandemia. Além de colocar os estudos em dia. Ele é estudante de Publicidade e Propaganda e eu estudante de Jornalismo, e a gente acabou... Ou melhor, a gente acaba usando esse tempo tanto pra estudar, como pra colocar as séries em dia, né, essas outras coisas assim. Eu acho que o nosso maior companheiro nesse período pandêmico foi o videogame, que eu gosto mais, mas os “streamings”, os filmes, as séries foram os maiores companheiros. Além da nossa preocupação com a construção da nossa casa. A gente está construindo uma casinha lá no interior, lá perto dos meus sogros, pra gente ter um cantinho pra ficar lá perto deles. Então, eu acho que... Mas digamos que de forma mais direta: nós gastamos a maior parte do tempo passeando com o cachorro e assistindo filme, assistindo série e filme. Enfim.
P1 - Então, a gente está indo pro bloco final da entrevista. Gregory, eu queria te perguntar: primeiramente, quais os seus sonhos pro futuro?
R - Bem, os meus sonhos pro futuro são sonhos que eu prefiro não falar. Não, brincadeira! Eu tenho sonhos pro futuro, que são: ter a minha casa pronta. Apesar de ter uma paciência imensa pra isso. Eu sou muito calmo pra conseguir fazer as coisas. Bem oposto do meu esposo, que é mais ansioso. Mas o meu plano pro futuro é conseguir dar um conforto melhor pra minha família, dar um conforto melhor pro meu marido. Poder levá-lo aos lugares onde ele não foi ainda. Poder apresentar pra ele o país que eu amo de paixão, que é Portugal, que já [lá] vivi durante um ano. Tive que voltar e sinto muita saudade. Então, um dos meus planos pro futuro é ter a minha casa, os nossos filhos… Porque eu quero ser papai, quero que nós tenhamos filhos. Quero ter - aí pego o sonho que é do meu esposo também - mais bichos em casa, ter mais cachorro, gato. Mas ter as nossas coisas, montar a nossa casa da forma que nós queremos. A gente fica sonhando, às vezes, quando vai deitar. Ele fica falando e mostrando: “Ai, que a casa podia ser assim [e] assado. Podia ser assim”. E ele é mais ansioso, né, como eu já disse. Eu sou mais calmo, digamos. Mas dos meus sonhos pro futuro, acho que o principal é esse: conseguir terminar a casa, ter as nossas coisas e ajudá-lo a realizar os sonhos que ele tem pra nós dois. Porque são sonhos que não contemplam só a ele, que contemplam a nossa vida a dois. E é uma vida que já dura quase sete anos. Então, é uma vida que a gente tem que se permitir sonhar juntos e viver os sonhos um do outro, pra que a gente possa realizar. Mas eu ainda quero rodar muito esse mundão e levá-lo junto comigo.
P1 - Esse período que você passou em Portugal, foi algum período de estudos, trabalho?
R - Não. Foi fuga, mesmo. Tinha acabado de me divorciar do meu primeiro casamento, né? Foi o primeiro casamento e também foi o primeiro divórcio homoafetivo do estado. Então, eu tinha separado [e] não queria ficar aqui, queria tentar a vida fora. Larguei tudo e fui embora. E aí, larguei tudo aqui e fui embora pra lá. A minha mãe adoeceu, eu tive que voltar, né? Mas foi um período pra tentar recomeçar. Foi uma fuga, exatamente, da vida aqui, pra tentar dar um “restart” [recomeço] em outro lugar, né? Foi, basicamente, isso. Era uma tentativa de: “Bem, eu quero recomeçar. Quero fazer, começar de novo. Quero botar o pé em outro país e começar as coisas do zero”. Então era essa, basicamente, a minha vontade. Era esse o meu interesse.
P1 - E você tem alguma lembrança marcante desse período? Algo que você lembra até hoje, desse período em Portugal? Desse um ano.
R - Tenho! Tenho lembranças maravilhosas de, pela primeira vez entrar num avião pra viajar pra fora, né, do país. Ter passado mais de seis, sete horas esperando conexão pro voo, andando no Centro de Madrid, sozinho, sem conhecer ninguém, num frio de quatro graus, com uma chuva terrível. Chovia, parava e fazia frio. E eu não tinha levado blusa mais grossa, tinha levado uma blusa fina. Tive que comprar umas luvas. Eu acho que tenho essas luvas até hoje, guardadas aqui, que eu comprei no Centro de Madrid. Eu paguei sete euros num par de luvas, eu lembro, numa loja. Entrei numa outra loja depois, o mesmo par de luvas custava dois euros. Eu lembro disso como se fosse ontem. (risos) Eu lembro de comer um pão de sal com “jamón”, com aquele presunto “parma”, no Centro de Madrid. De chegar em Portugal e não conhecer nada, sabe? Tipo, não conhecer nada. E depois me apaixonar pela Torre de Belém, pelos pastéis de Belém. Andar e tirar fotos ali no Bairro Alto. Conhecer os parques dali, sabe? Poder, sei lá, olhar e ver o povo sentado nas praças, ouvindo fado (estilo musical português). Isso tudo são lembranças marcantes, sabe? A qualidade de vida que se tem lá. Comer bem. As comidas estranhas que muitas vezes eles comem, como a amêijoa, que acho que é tipo um caracol. É alguma coisa assim que eles comem. Fazem feijoada, né, daquilo. Então, assim, são coisas que me marcam muito ainda, que eu tenho essas memórias. Especialmente a TV portuguesa, que eu sou apaixonado por apresentadores de TV português, como o Manuel Luís Goucha. Sou hiper, mega fã do Manuel Luís Goucha. Apaixonado. Assisto quase todos os dias no aplicativo da TVI (Televisão Independente), que é uma emissora de lá. A Cristina Ferreira também, que é uma apresentadora de lá. O Doutor Quintino Aires, que é um psicólogo português, que participava desse programa, de um dos programas lá da TVI, que chamava “Você na TV”. Bem diferente do programa do João Kléber, aqui (risos), que se chama “Você na TV” [também], porque ele simplesmente… Eu acho que ele copiou o nome, quando ele voltou pra cá, porque ele apresentava um programa lá na Record de Portugal. Então, assim, eu amo Portugal. Acho que é o segundo lugar do meu coração. Quiçá se não está no um e meio. Porque, atualmente, com [Jair] Bolsonaro, acho que não dá para ter primeiro lugar, né, o Brasil como lugar preferido, não, mas tudo bem.
P1 - E esse período, você passou em Lisboa mesmo?
R - Não. Eu vivi na cidade do Montijo. Eu vivi na cidade do Montijo, num concelho (parte de um distrito), acho que pertence ao [Distrito de] Setúbal, né? Pertence ao concelho de Setúbal, na região do Montijo. E fica acho que mais ou menos 25 minutos de Lisboa. É só atravessar a Ponte Vasco da Gama. Atravessando a Ponte Vasco da Gama, você tem Seixal, Montijo, aquela região ali.
P1 - E quais são as coisas mais importantes pra você, hoje em dia?
R - A espiritualidade. Não vou chamar de Deus, porque talvez as pessoas que estejam ou lendo, ou nos assistindo, possam compreender Deus de uma forma diferente da forma que eu compreendo Deus. Mas eu acredito que as coisas mais importantes, vêm: a espiritualidade, fé, marido, família. São as coisas mais importantes. O restante... E claro, né, a saúde. Mas o restante a gente corre atrás. Porque eu acho que eu tenho hoje uma família - que, apesar de todos os problemas, de todos os defeitos que possam ter – que me acolhe. Eu moro hoje com a minha mãe e com o meu irmão. Estou construindo a minha própria família, que eu falo com o meu esposo, a minha família é ele, é ele e o cachorro, que é o Taurus, o nosso “chow-chow”. Então, eu falo que, assim, a minha família é ele. O resto é parente: é a minha mãe, meu pai, minha avó. Mas eu estou construindo a minha família, né? Eu pertenço a uma família, mas eu estou construindo a minha família, né? É uma nova geração. É uma nova forma de viver, um novo contexto. É assim que eu estou construindo. Então, é uma nova existência, né, digamos, [de] uma nova geração, com novas influências. Então eu acho que, basicamente, esse é o sentido.
P1 - Então, como última pergunta: Gregory, o que você achou de contar a sua história pra gente?
R - Olha, eu achei muito gostoso. Me senti muito à vontade com as perguntas. Perguntas que são simples de serem respondidas, que me lembram de coisas boas da minha vida [e] me fazem relembrar momentos especiais da minha história. Então, eu gostei muito de conversar com vocês. Eu acho que conhecer histórias de pessoas trazem boas influências, fazem com que muitas pessoas que possam ter alguma experiência parecida com a minha, possam se sentir representadas aqui, através da minha fala, através da minha contação de histórias. Que não são estórias, são histórias, porque elas realmente aconteceram. Então, digamos que foi um momento muito especial pra mim, viu? De verdade.
P1 - Então, em nome… Pessoalmente, foi realmente uma entrevista muito boa, gostei muito. E também em nome do Museu da Pessoa, a gente agradece a sua participação. Muito obrigado.
R - Eu que agradeço, Genivaldo. Muito obrigado a você. Muito obrigado a Grazielle. Muito obrigado à produção que está aí, né, na técnica. Muito obrigado mesmo pelo convite, pelo interesse de vocês em ouvir a minha história, em me entrevistar, em saber um pouco desse menino de 29 anos, quase “trintando”. Lá em setembro, dia primeiro, faço 30. Então, dizem que depois dos 30, os anos passam mais rápido, a gente nem vê, né? Passou dos 30, quando você vê, já está com quase 40, né, 40 e poucos. Então, eu me sinto muito honrado por esse espaço. Espero que muitas pessoas se sintam representadas através da minha história. Muito obrigado.
[Fim do depoimento]
Recolher