P/1 – Então, Célia, pra começar eu queria que você me dissesse o seu nome completo, o seu local e a data de nascimento.
R – Meu nome é Maria Célia da Silva Lima, eu nasci em Macaé, Estado do Rio de Janeiro, no dia, na minha identidade ta sete, mas que meu pai errou, mas é 8 de dezembro de 1952.
P/1 – Qual é o nome dos seus pais?
R – Meu pai chamava, por erro da pessoa que o registrou, ele teria que ser Afrânio, virou Arfano porque botou o ‘r’ no lugar errado, então é Arfano da Silva Lima, e minha mãe Selenciana da Silva Lima.
P/1 – O que é que eles faziam?
R – Minha mãe era dona de casa e meu pai trabalhava na Rede Ferroviária Federal lá em Macaé.
P/1 – Como é que você descreveria eles, o que você poderia falar sobre o seu pai, sobre, como que você, qual a imagem que você pode dar pra gente deles?
R – Bem boa porque nós somos em dez filhos, oito vivos, dois morreram pequeninhos, Sônia e Aílton, e, enfim, um homem lutador, minha mãe também junto com ele e me tenho, e nesses oito que somos vivos tem um casal de gêmeos, então minha mãe muito, uma mulher, nossa mãe, uma mulher muito valente. Que me sendo uma pessoa, um funcionário da Rede Ferroviária Federal, semianalfabeto, analfabeto, foi se alfabetizar com quase 45 anos, a gente já era, a gente já sabia ler e escrever e ajudava papai, mamãe já sabia um pouco mais. Mas duas pessoas maravilhosas,ele um pai exemplar, tudo que sabemos hoje foi a educação deles dois, enfim, pessoas bem legais, infelizmente minha mãe faleceu muito cedo, eu estava com 19 anos quando a minha mãe faleceu, e o meu pai ainda viveu bastante, graças a Deus, depois morreu aos 75, teve um derrame, mas todos juntos. E, enfim, tivemos uma vida eu acho que bem boa, bem bacana, que papai era presidente de clube, montava bloco, escola de samba, aqui não se falava em escola de samba, mas tinha os blocos. Ele tinha uma coisa muito engraçada, que todo carnaval ele montava uma mulinha, sabe as mulinhas que tem no Maranhão, lá em Macaé tinha isso o carnaval de rua, e dentro de uma mulinha enorme alguém ficava ali, né, embaixo daquela mulinha e a gente corria atrás e ela vinha, a gente tinha medo, corria. E daí ele, dentro era muito engraçado que tinha umas prateleiras assim e ali eles botavam as bebidas, então: “A mulinha ta com sede, vamos parar”, aí os donos ali daquela mulinha entravam e enchiam, bebiam e saiam, a mulinha saía correndo e brincava. Ele era presidente do clube e a minha mãe montava blocos, então as recordações e tanto o meu pai, a família de minha mãe muito pequena, mas a família do meu pai, também oito irmãos, então era muito grande, praia, sou de Macaé, tem praia. Mamãe organizava passeios pra ir pra Rio das Ostras, pra Búzios, pra Cabo Frio, a gente enjoava da praia em Macaé e eia pra lá, aí era um caminhão, botava todo mundo na carroceria, o caminhão de amigo, levava comida, aí passava o dia na praia. A mamãe fazia uma coisa bem interessante que era um buraco na areia, quer dizer, a água, óbvio, não podia botar muito lá dentro do mar porque depois perdia, mas botava mais, botava uma pedra, aí quando ia almoçar botava ali dentro aquele litro de sangue de boi, que não tava com vinho, mas tinha Ki-Suco, aí botava o Ki-Suco ali e enterrava, então a água batendo ali, ficava tudo geladinho na hora do almoço, ai, que recordação boa que eu tenho daquilo.
P/1 – Isso na sua infância, né?
R – Isso foi na minha infância, seis.
P/1 – Quantos anos?
R – Olha, eu lembro bem das coisas a partir de cinco anos, antes tenho um pouco, já fiz de tudo pra lembrar, lembro muito vagamente, mas isso ainda de cinco, seis, sete, oito, dez, 11, entendeu, vai embora, toda essa, aí eu sabia, a percepção de agora, já compreender, entendeu, ele recebia, que era uma coisa que eu amava, contava com aquilo, todo Dia de Reis chegava, que Macaé era uma cidade muito pequenininha, uma cidade muito simples, a gente andava de bicicleta, a empresa maior que tinha em Macaé era a Rede Ferroviária Federal, entendeu, nego, e o restante vivia de peixe, vivia de sair pra pescar, entendeu, então era difícil, e, enfim, era tudo...
P/1 – Você falou que foram, são dez irmãos que você tinha.
R – Somos oito.
P/1 – Oito irmãos.
R – Vivos.
P/1 – Você é a mais velha, do meio, como é que é?
R – Tem a Selma Mina, a mais velha, que tem 66 anos, eu, aí Selma, meu irmão Afrânio, que aí virou o nome certo, não ficou Arfano, então tem a Selma, tem o Afrânio, que tem 62, tem eu, que tenho 60, a minha irmã Iara, que tem 58, é tudo um ano e meio, dois, depois da Iara vem o Zeca, que é Natalino, aí é Natalino José, porque nasceu no dia de natal, aí é o Zeca, 56, aí Cláudia e Claudete, os gêmeos, 54, e a Cleuza, caçula, 52, são os irmãos, cinco mulheres e três homens.
P/1 – Além dessa, passeio na praia, o que mais você lembra, assim, que costumava fazer com os seus pais, com seus irmãos?
R – Ir pro clube era uma coisa que a gente amava, ir pescar, porque o meu pai tinha o hábito de pescar no fim de semana, ele pegava o carro com os amigos, passava de sábado pra domingo pescando, viravam noite, então eu adorava quando ele levava a gente, era uma coisa bem boa. E pescava também em Macaé, na praia lá, pescava, era uma coisa que eu curtia muito, mas as coisas das festas, ir pra casa da minha avó era uma coisa que a gente amava, na semana santa a gente dormia todos esses dias, quinta, sexta, sábado e domingo, na casa da minha avó. Que a minha mãe faleceu meus avós ainda eram vivos, entendeu,meu vô era jardineiro, então ele morava numa casa no centro da cidade, que hoje é um posto de saúde, eles moravam nessa casa e meu vô era o jardineiro da praça, que a gente tinha uma preguiça, que era nossa amiga, a gente dava comida e ela descia e pegava, entendeu, demorava dois dias, mas ela vinha e pegava e a gente cuidava disso. Então meu vô naquela casa que tinha todas as frutas, a gente pulava de cima do pé de cajá em cima do, porque o terreno que batia quando o meu vô era de uma torrefação de arroz, e aí a palha caía no quintal no meu avô, que ele pedia, então a gente pulava no meio daquela palha, gente, era muito bom. E na semana santa então era uma coisa especial porque não podia varrer casa, não podia falar palavrão, isso era uma coisa que a gente lembrava muito, e se um irmão, porque aí vinham os primos também, não era só nós, eram os outros primos também e daí dormia todo mundo assim nos colchonetes no chão, um casarão de cinco metros de pé direito, aquela coisa bem bacana. E se um irmão falava palavrão, corria, contava pra vó, e tinha uma coisa que eu lembro, que eu gosto de lembrar disso, que o meu pai, minha mãe, todo mundo organizava e tinha uns carrinhos de mão de madeira, que ali papai botava arroz, feijão, tudo pra poder ajudar a minha avó lá na alimentação, entendeu, porque papai recebia. Outra coisa que marca, né, na vida da gente, vinha uma caminhonete ou uma carroça de cavalo trazer a comida que comprava na cooperativa da Rede Ferroviária, então era 50 quilos de arroz, olha que loucura gente! Cinquenta quilos de arroz, 50 de feijão, 50 de farinha, 50 de não sei o que lá, fardo de carne seca, latas de leite, não sei o que, que tinha, a comida, porque fazia arroz, feijão, almoço e janta, almoço e janta, entendeu, então era muita boca pra comer, né, e isso era uma coisa também que eu lembro, de chegar aquela carroça com a comida. E papai, isso era descontado do salário dele, minha mãe, por sua vez, para que a gente pudesse ter as coisas na escola, que estudava no liceu que fazia parte da Rede Ferroviária, a minha mãe lavava roupa pra hotel, minha mãe juntava comida pra engordar porco, porque aí no natal matava e vendia. Nós tínhamos fogão de lenha, essa banha que a gente tirava conservava a carne seca, fazia defumo, defumava todas as carnes, as lingüiças, tudo ali naquela cozinha, então a vida, eu acho que foi vida de rei porque temos todos boa saúde, graças a Deus, e acho que foi tudo essa alimentação de comer o ovo do quintal que a galinha punha, comer uma alface, uma carne de coelho, uma carne de jacaré que ele trazia, e hoje,podia comer, agora não pode mais, eu nunca comi porque eu tinha, me dava um negócio, mas, enfim, eles comiam, né, era uma coisa mais natural do que é hoje. E vinha, quando papai ia pescar, porque a gente tava lá atrás na pescaria, vinha nos arrastões todo tipo de peixe, e a gente ria muito porque vinha naquele saco de 50 litros, 50 quilos, cheio de peixe no domingo de tarde, e vinha um peixão chamado mussum, que era uma cobra desse tamanho, preta, que eles diziam que a carne era deliciosa, mas eu também não comia. Eu preparava, que aí eu que tomei conta da minha casa no falecimento de minha mãe, então a gente botava a cinza que tirava do fogão de lenha e aquela pele saía inteirinha assim, quando passava a cinza, interessante, tudo coisa de cidade, da roça mesmo.
P/1 – Tudo o que você falou foi com seus irmãos, né, e amigos de infância?
R – Ah, tinha muito, os parentes que moravam próximos, eu morava na rua que hoje é Antonio Alves Ferreira, mas a nossa rua era Travessa A, Travessa B, Travessa C, nossa, mãe, eu era moleca e eu fazia o diabo, eu tinha meu buraco de jogar bola de gude, mamãe vinha, me dava uns cascudos porque eu ficava arriada, de calcinha aparecendo, tinha que botar um bermudão pra não ficar expostas. Nossa, brigava com os moleques por causa dos meus irmãos, eu fui danada, eu não sei como é que eu virei o que eu sou hoje, que eu acho que eu (risos), mas era todo mundo junto. Engraçado, né, eu, aí venho trabalhar em televisão, quando papai tombou a nossa casa velha pra fazer a nova que tá lá até hoje, essa casa permanece, um pouco dividida, mas permanece, eu fazia teatrinho. Então construindo a casa, então tinha uma, construindo essa parede aqui e fazia, e tinha o buraco da janela, e aqui a outra parede, isso no quarto, e a porta aqui, que saía pra sala, então sobe, os tijolos, quando chegava numa altura, eu criei ali uma sala de espetáculo, que a escada saía de lá pra cá e aqui embaixo eu fazia pirueta de maiô, gente, e cobrava pra fazer.
P/1 – Você tinha quantos anos nessa fase?
R – Oito, nove, entendeu, foi quando começou tudo.
P/1 – Certo, e isso tudo em Macaé?
R – Tudo em Macaé.
P/1 – A família sempre foi de Macaé?
R – Sempre, todos, todos, mas tinha os parentes no Rio, que era outra coisa marcante também da infância, eu só fui andar de ônibus aos 18 anos pra ir pra o Rio porque, como papai trabalhava na Rede Ferroviária, nós tínhamos duas maneiras de viajar no trem noturno que era a coisa mais fantástica, ia papai, mamãe e os oito filhos. Então tinha um passe que você não pagava nada se você programasse a sua viagem, e tinha a requisição, que se você pedisse em cima da hora tu pagava uma taxa muito pouca, íamos no trem noturno, que era uma viagem agradabilíssima, nós dormíamos, acordava, que saía de Macaé 11 da noite, chegava no Rio às oito da manhã, tchi que tchi, e lá ia, e lá ia. Mamãe levava maçã, que dizia que a maçã matava a sede e a gente comia maçã de noite, de madrugada: “To com sede, morde uma maçã”, aí, gente, era muito bom, muito bom.
P/1 – Chegando no Rio quais eram os programas?
R – Aí ia pra casa da tia, que é outra coisa interessante porque hoje tem muito pouco disso, minha tia mora, o apartamento ta lá, mas ela mora em Minas com o filho, irmã do meu pai, ela morava numa casa de cômodos, onde era um quarto, todo mundo dormia ali, o banho era no corredor do lado de fora e a cozinha comunitária. O marido chofer de táxi, ela cuidando de três filhos homens, até que ele foi juntando, juntando, ainda tinha um tio que morava junto, que também trabalhava na Telefunken, como motorista do diretor principal e até que compraram um apartamento e a gente ia pra essa casa, que era tudo o mesmo. E o outro tio, onde eu fui morar depois, que a gente dividia nessas duas casas, que era o tio Argeu, irmão de meu pai também, irmão dessa tia, Amélia, que a gente dividia, ele era zelador de um prédio e tinha residência no último andar, então se dividia. Era tão maravilhoso porque a gente via a baía de Guanabara, entendeu, de lá de cima, era super bom, e durante o dia a gente podia passear ali porque não tinha carro, porque ali era um lugar de burburinho no fim de semana, não no final de semana, entendeu, então era muito bom pra aprender a dirigir, andar de bicicleta, então a gente dividia entre essas duas casas que eram também lugares que ia pra tirar férias, entendeu, no Rio de Janeiro.
P/1 – Entendi, e você falou muito da casa do seu avô, né, o quintal, mas e a sua casa mesmo, como é que era?
R – Também, nossa casa, uma casa muito grande, porque esse monte de filhos, né, e era uma casa também ótima porque nós tínhamos, até cavalo tinha no nosso quintal, então nós plantávamos, papai plantava, papai era uma pessoa que gostava de ta mexendo, dois belos pés de carambola que era tudo na nossa vida, subir, fazer casinha lá em cima, um pé de cajá que chega entornava de tanto cajá, dois pés de abacate que era outro deslumbre, que o vento batia, ele batia na telha, a gente tinha medo e: “Ai, que medo”, mas sabia que era o abacate, mas era tudo pra fazer aquela bagunça, né. Mas, ai, uma casa, tanto que hoje mora nessa casa duas irmãs que são separadas, em cima mora um tio com a esposa, onde era a casa da minha irmã mais velha, e no quintal o meu irmão tem a casa dele, enorme também, com a esposa e dois filhos, três filhos, só que dois ainda moram com ele.
P/1 – Mas você tinha um quarto só pra você, como é que funcionava?
R – Não, um quarto só das mulheres e o quarto só dos homens, a casa tinha o quarto de meus pais, o quarto das mulheres, o quarto dos homens, sala de jantar, sala de receber, que falava, que era outra sala, dois banheiros, a cozinha, a sala de, onde nós comíamos, e lá fora tinha a outra...
INTERRUPÇÃO
P/1 – Vamos ainda continuar aqui na infância, e ainda em relação aos seus pais, quem é que mandava em casa, como é que funcionava essa coisa da autoridade?
R – A minha mãe, minha mãe, a gente, quer dizer, lá naquela época o pai dava o salário na mão da mãe pra ela administrar e ela administrava bem, bem direitinho porque tudo corria muito bem, com uma vida bem simples também, onde tudo era muito regrado, tudo muito certinho, não podia passar daquilo, as coisas eram bem administradas por ela com certeza. Papai trabalhava, ela também trabalhava em casa cuidando dos filhos e eu penso também, nego, que a minha mãe, como viveu 49 anos só, ela viveu pra ter filhos e cuidar de casa, ela não fez outra coisa, entendeu, então ajudou muito, entendeu. Porque quando ela morreu minha irmã Cleuza, de 52 que tem hoje, tinha 11 pra 12, e aí a gente que, aí nós que criamos as irmãs, entendeu, mas ela que era a administradora.
P/1 – Você teve algum tipo de formação religiosa?
R – Sim, sou católica apostólica romana e participante.
P/1 – Em casa era assim também, os irmãos?
R – Também, também, fizemos primeira comunhão, fizemos catecismo, tudo, tudo, eu hoje onde moro tem a igreja, eu freqüento, vou na missa e participo de todas as atividades da igreja.
P/1 – Vamos falar agora da escola, qual é a primeira lembrança que você tem da escola?
R – Ai, gente, você acredita que, se for falar da escola, eu tinha um professor, eu me lembrei de um professor de Geografia que eu fui apaixonada por ele e depois eu descobri que ele era gay, mas ele não mostrava que era gay e ele era tão educado, assim, tão bacana que, nossa, mãe, apaixonada por aquele homem, mas eu já tava na escola normal, entendeu, me veio mais na escola. Também no liceu era maravilhoso, tem uma coisa bem engraçada, que minha irmã foi embora, hoje é quinta, minha irmã foi embora, minha irmã Iara, isso faz parte da infância que pulou, eu era muito colada com a Iara, muito, aniversário de Iara a gente tinha que ta, a roupa de Iara tinha que ser igual a minha, parecia gêmeas. A mamãe, meu cabelo era aqui nas costas, o da Iara, mamãe pra pentear nosso cabelo demorava horas, porque papai não deixava cortar, eu só usei calça comprida com 18 anos, eu só tirei sobrancelha com 18 anos, meu pai era muito radical nessas coisas de, namorar de mão dada, um dia pegou dando um selinho, eu apanhei por causa disso, então era muito rígido o meu pai, né. Mas a Iara era uma, era uma, eu e ela era muito colada, tanto, aí ela lembrou agora, ela entrou na escola um ano antes porque senão eu não ia, então ela teve que entrar um ano antes pra poder eu ir pra escola, eu lembrei disso há cinco dias atrás, que ela contou e me lembrei disso. E depois eu, não sei porque, eu, no outro ano eu fui pra outra sala e não deu jeito, eu tive que ir pra sala dela, atrasei um ano porque eu não me separava da minha irmã, era muito louco isso também, nós duas éramos muito juntas, em casa também, nossa! E minha irmã Selma era mais velha, né, então, e não tinha Cláudio e Claudete ainda, então nós, porque eles, apesar de eles serem dois anos, mas eles, a gente vai crescendo, fica uma diferença, né, e acabou que eu colei com ela e foi bem, a nossa vida foi bem legal, as duas juntas, porque, enfim, a identidade foi com essa irmã e até hoje ainda é um pouco, mas parecíamos gêmeas porque tudo tinha que ser igualzinho porque senão chorava. No carnaval, eu me lembro tanto de uma roupa de baiana que a mamãe, baiana de listras azul marinho, eu e a Iara,e aí nós tínhamos um saquinho aqui bem bonito de renda com confete e serpentina e outro saquinho era com lança-perfume, que a gente jogava nos outros assim pra correr, hoje cheira lança, mas era só pra jogar: “Ai, que medo”, entendeu, mas era só pra brincar, entendeu, então eu e Iara tudo bonitinho, igualzinho, muito doido também.
P/1 – Mas o que mais da escola, os colegas, professores?
R – Aí na escola, por exemplo, ai, uma coisa ótima que eu acho da escola que é, eles, a gente fazia, eu aprendi a bordar, eu aprendi a costurar, eu aprendi a pintar, tudo isso na escola, no liceu ensinava tudo, era aula que a gente tinha pra aprender, entendeu. E isso eu acho que foi uma coisa de muita valia pra gente porque, nossa, como eu podia ajudar a minha mãe, como, então era um, era diferente da escola formal, vamos dizer, onde eu fui depois, que era lá no Cecília Meireles e depois eu fui pro Luiz Reid. Lá no liceu não, no liceu você, toda quarta-feira a gente cantava o hino nacional e cantava o hino da bandeira, puxava, hasteava a bandeira, isso tudo era muito, tudo que marcou muito lá no liceu, como professoras maravilhosas que nós tínhamos, então foi muito, muito, muito bom naquela escola também. Lá pela primeira vez eu vi um filme que, outra coisa que marca também, né, a gente vai falando, vem na cabeça, do, um filme pra época, depois que a gente vem trabalhar em televisão que começa a avaliar, sobre a pessoa que fumava, então era um pulmão preto, aquilo me espantou de uma maneira, que eu vendo aquilo, ainda virei fumante, pra desespero, né, mesmo lembrando isso na vida a gente ainda. Nessa escola também tinham uma coisa bem legal, que o caderno eu escrevia, to aqui na carteira, né, eu escrevia com o caderno virado assim de lado, eu não levei, eu acho que eu não levei, não bateram na minha mão, mas botavam um percevejo aqui, outro aqui, outro aqui, outro aqui pra eu poder escrever reto assim, nossa, como eu sofri com isso! Que aí quando ela não via eu tirava, meus cadernos era tudo: “Enquanto você não escrever direito vou prender”, aí prendia, as professoras, pra poder você, hoje tenho uma letra bonita, acho então que valeu por isso, mas eram professoras também que você conhecia todas, você passava na rua, tinha orgulho da professora lhe cumprimentar, entendeu, porque a escola era o ponto máximo. Hoje eu trabalho com educação, freqüento escola, acabei de chegar agora de Serra Negra, que tá lá numa conferência dos índios, pros índios, uma conferência sobre educação indígena, e a gente fica vendo as coisas, eu vim avaliando lá atrás quando eu estudei, esse respeito pelo professor, hoje a gente vê no noticiário, aluno bate no professor, o aluno faz o capeta com o professor, o professor virou. Não tinha isso, nossa educação era: “Professora Maria do Carmo, como vai a senhora?”, era quase que eu tava vendo ali uma entidade, uma coisa, sei lá o que, era um super respeito, era uma coisa maravilhosa que a gente tinha, entendeu. E lá em Macaé, por ser uma cidade pequena, a gente tinha isso, tinha dois clubes, entendeu, onde todo mundo se conhecia e, dois não, tinha quatro, mas a gente freqüentava mais esses dois, então era, nossa, muito bom, muito bom, tudo muito correto, meus pais, os avós, meus tios, os primos, todo mundo vivia meio junto, enfim, quando juntava a família toda, e praticamente juntava quase todo fim de semana. A tia Ita, tudo parte do meu pai, né, tinha seis, tem seis filhos, todos vivos, faleceu um só, e morava na mesma rua, então aí, quando ela foi morar nessa rua, aí mesmo que era um deslumbre, então tivemos todo tipo de brincadeiras, todo tipo de... Papai quando não tinha dinheiro, ele, pra comemorar aniversário, oito filhos, tinha vezes que dava, que não dava, e não tinha filho todo, assim, aniversário todo mês, mas quase que todo, quem tem oito filhos, né, o ano tem 12 meses, oito ele tinha que bancar, mas três eram, eu e Zeca em dezembro, eu lembrei agora, Cláudio e Claudete, Cleuza, os gêmeos e a Iara em maio. Mas se ele não tinha dinheiro era muito bom, gente, ele levava, saía do trabalho cinco horas, ó, era tudo tão próximo que você ouvia o horário do, sete horas da manhã, óóóóó, né, ouvia a hora de saída do almoço, a volta do almoço e no fim do dia o povo saindo da Rede Ferroviária, óbvio, eu morava não bem próximo, mas era uma coisa que você tava lá no centro da cidade a gente ouvia, que o vento trazia o eco. Então já sabia que o pai tava saindo do trabalho, então o papai trazia maria mole, coração de batata doce, coração não sei o que, mariolazinha, amendoim e comemorava nosso aniversário papai, mamãe e nós, os filhos, cantava parabéns e comia aqueles docinhos, ficávamos felizes. Adorava chegar o natal, nossa, nosso sapato tudo na janela esperando chegar o presente no outro, todo mundo queria dormir, escurecia, ia pra cama, pra poder no outro dia ta lá a boneca, o que fosse, papai fazia muito carrinho pra gente, brinquedinho, mamãe fazia boneca de pano, que muitas vezes não tinha dinheiro pra comprar. Então era muito bom porque tudo isso eu vivi, e eles faziam isso de uma maneira normal, então a molecada toda na rua, cada um tinha a sua boneca das meninas, os meninos seu carrinho, ou que fazia de lata ou que fazia de madeira, fazia rodinha de madeira, o furinho no meio, ia embora, meus irmãos todos tiveram, cavalo no fundo de quintal, pegava carrapato, nossa, foi corretíssimo.
P/1 – Nessa época você achava que ia ser o que quando crescesse?
R – Professora ou advogada, que eu falava ‘adevogada’, aí virei professora, mas dei aula seis meses e falei: “Não é minha vida”, aí que lembrei de minha mãe: “Essa cidade não é pra você”, ela faleceu em janeiro, em setembro eu fui morar no Rio de Janeiro, e daí sim minha vida profissional começou porque em Macaé não dava pra gente, depois meus irmãos,eu fui levando um por um, mas, enfim, eu fui a que, a primeira a ter coragem. Quando eu saí de Macaé tu crê que parecia que eu tava indo pra uma guerra, pra um, ia morrer, todo mundo pendurado no ônibus chorando, eu ia morar duas horas e meia, três de Macaé pro Rio, quando eu pedi pro meu pai pra morar no Rio meu pai disse: “Minha filha, como é que você vai abandonar a sua casa, deixar seus irmãos?”, eu falei: “Papai, eu não vou abandonar, eu vou estudar, eu vou ter outra vida”, entendeu, e morreu em paz porque a filha dele só deu orgulho, entendeu, enfim.
P/1 – Mas vamos falar um pouco mais de quando a sua mãe faleceu, como é que foi, você tinha quantos anos?
R – Eu tinha 19.
P/1 – E como é que foi?
R – Violentíssimo, violentíssimo, porque nossos avós por parte de pai já eram falecidos quando nós, quando eu nasci, acho que até a minha irmã Selma, a mais velha, e daí, enfim, você perder logo mãe, entendeu, e minha mãe essa mulher danada que era, uma mulher que, outra coisa, se o cara, em Macaé não tinha, os meus irmãos Cláudio e Claudete, os gêmeos, quando o Cláudio nasceu nós, todos nós nascemos com parteira, Dona Maria Antônia, uma única parteira. Aí o Cláudio nasceu, uma hora depois, eu me lembro, tiraram a gente do quarto correndo que a mamãe tava passando mal e a Dona Maria Antônia foi ver, tinha outro bebê, que era Claudete, não tinha, como é? Ultrassom pra, entendeu, eles têm 54 anos, então tinha outro bebezinho desse tamanho, então o médico falou: “Vai morrer”, a vizinhança inteira deu cobertor, parecia um ratinho, aquele monte de cobertor, eu me lembro dessa cena, é a que tem melhor cabelo, melhor dente, danada, vai em tudo quanto é baile, entendeu, a Claudete, Cláudio tem dois metros, ela tem um e meio, entendeu, nasceu uma hora depois. E aí você vê minha mãe tendo filhos, um ano e meio, dois, outro filho, outro filho, e ela, e daí meu irmão Zeca e ela ia fazer, ele faria 15 anos no dia de natal, ela tava preparando o almoço, que ele já trabalhava, e tava convidado, tinha convidado os amigos do trabalho, os moleques como ele, pra almoçar em casa no dia de natal, esse meninos iam participar do almoço de natal em casa. Preparamos na véspera, passou a noite de natal linda, maravilhosa, no dia de natal, na hora desse almoço a minha mãe sentiu uma dor de cabeça, mas uma dor de cabeça tão violenta que ela meio que bambeou e aí já passou o dia péssima, no fim do dia a gente levou no hospital e eu acompanhei, por algum motivo eu que fui com o meu pai. E daí ela falou, o médico receitou uma injeção e voltamos pra casa, ela falou, foi muito louco porque minha mãe enorme, quase dois metros de altura, a mamãe, ela falou: “Ai, eles deram a injeção eu senti melhorar”, como se a injeção entrasse assim no corpo e aliviasse a dor de cabeça, isso ficou 25 até o dia 31. Nós fomos na noite do dia 31, no réveillon, quando nós chegamos em casa, tipo cinco horas da manhã, dia clareando, ela tava passando mal, levamos pro hospital, aí ela faleceu no dia primeiro, com 49 anos, entendeu. Então isso foi, nossa, mãe, imagina a gente que não, perder mãe, entendeu, e mãe que você ta vendo uma mãe nova, uma mãe super disposta, com tudo em cima, sem o menor problema, eu ia falar antes, ela, se o cara passava mal mamãe ia na ambulância levar pra Campos, se era conhecido, óbvio, parente, mamãe era mulher de entrar na ambulância: “Eu to indo pra Campos, cuida aí, to indo pra Niterói”, porque não tinha hospital, entendeu. Então uma mulher que a minha cidade parou quando a mamãe morreu e eu não consegui (pausa), foi uma coisa meio (choro), com certeza eu sou uma pouco dela, entendeu, eu, a Rita que me conhece, ela me conhece um pouquinho só, mas eu tenho certeza que se minha mãe, se hoje ela estaria, se fosse viva era uma velhinha. Ai, mas foi a frase dela que mudou a minha vida, entendeu, pra eu poder tomar outros rumos, ajudar a minha família, ajudar meus irmãos, mas tudo passa, passou, a gente lembra com saudade, enfim, porque...
P/2 – A juventude você passou em Macaé?
R – Até os 19.
P/1 – Como é que era ser jovem em Macaé?
R – Ai, muito bom, muito bom porque o Fluminense, o clube, imagina você com 16 anos, Beatles, eu sou roqueira, eu gosto de rock, né, então, Led Zeppelin, tudo isso a gente ouvia na domingueira no Fluminense, então era bom demais da conta, então era uma época, de frente ao Fluminense, tá lá até hoje uma, tem uma praça enorme, então se reunia todo mundo ali naquela praça. E o interessante que a gente não tinha, não tinha maldade, entendeu, não tinha droga, não tinha, o máximo que a gente bebia era cuba libre de verdade, aí o meu irmão Zeca no dia de natal, como tínhamos dispensa em casa, a gente procura Zeca uma vez, procura, procura, não acha Zeca, ele tomou um litro de licor, que em Macaé tem a fábrica de licor, fábrica Lince. E o dono até eu e ele que batizamos o meu primeiro sobrinho, que é Leonardo, que tem 40 anos, e a gente comprava esse licor, até hoje eu vou a Macaé, trago pras pessoas aqui em São Paulo, meu irmão tomou um porre, a gente achou ele caído, rindo dentro da despensa, então a gente tomava era isso, licor doce que depois vomitava, era um horror, mas, enfim. Mas, então, mais nova você ia pra domingueira, entendeu, e papai sempre no controle, que nunca deixou de ter, aí eu fugia muito, muitas vezes, ele pensava que eu tava na casa da outra irmã, eu trocava de roupa dentro do carro, que a minha irmã já era casada, trocava de roupa, a roupa, eu ficava o dia inteiro me esfregando nele pra ele achar que eu tava dormindo, meu pai usava dentadura, aí quando ele virava assim a gente já sabia que ele tava no milésimo sono, a gente vazava, eu ia, ai, gente, como a gente era doida! Um dia eu tomei uma surra porque meu irmão teve que fechar a porta dos fundos e eu não pude entrar, eu tive que bater na porta ali, como é que eu ia ficar no meio da rua? Apesar de ter quintal, eu podia dormir até na área, mas eu fiquei com medo, eu tomei uma surra, barbaridade, porque, nossa, com namorado então, como eu fugia, eu fui bem danada, gente, fui muito danada, mas porque tinha essa infância, casa de vô, casa. Eu tinha uma tia que morava no único morro, que não era morro por ser morro, não, era uma montanha, ia pra casa dessa tia com estilingue, eu não comia passarinho, mas eu matei um monte passarinhozinho pros meus irmãos, porque eles eram muito danados. Mas lá também era um lugar maravilhoso, tia Lili se maquiava muito, danada, hoje eu fico pensando naquela época, ela era namoradeira, tinha um marido, hoje que eu sei que ela traía ele, mas a gente amava aquela tia, que tia danada era aquela. E dali você saía da casa dela, descia esse morro, saía na praia de Imbetiba, onde é o lugar mais maravilhoso lá em Macaé, hoje não é mais porque a Petrobrás tomou conta, entendeu. Mas, por exemplo, tinha o carnaval no Fluminense, era o carnaval mais famoso, muita gente ia do Rio de Janeiro porque falava também que Macaé tinha muita mulher, então os homens tudo iam pra lá, a gente adorava, nossa, carnaval era a coisa mais maravilhosa em Macaé, que a gente, todo mundo curtia, então tinha blocos, bloco de piranha. Então você numa cidade pequena, o povo de Campos vinha pra Macaé porque Macaé era um agito, era um agito bom por ter essa praia dentro da cidade, isso facilitava muito, tudo rolava em torno da praia, se desfilava, ah, muito bom, então era uma infância perfeita, eu digo.
P/1 – Você falou rapidamente do namoro, né, como é que foi o seu primeiro namoro, como é que era essa?
R – O primeiro homem que eu beijei na minha vida foi Jerry Adriani, o cantor, dentro do cinema, que a gente conhecia o Argeu, que era um surdo mudo, que foi outra pessoa que participou da nossa vida, freqüentava a nossa casa, dormia, ele era surdo e mudo e tinha um defeito no olho e não tinha um dedo, negro, negro, mas uma pessoa queridíssima que ajudou até, cuidava da gente, era muito bacana. E ele ia dormir no cinema porque ele morava no cinema, e o Jerry Adriani e Wanderley Cardoso foram cantar lá, menina, o quarto meu e da, meu e das minhas irmãs, das três, eu, que era a Selma, eu e Iara, era tudo de Jerry Adriani e Wanderley Cardosos, eu era Jerry Adriani, tudo de foto, todo tipo, era uma coisa impressionante aquilo. E aí eu fui ver o show do Jerry Adriani e aí o Argeu disse que ele saía pela porta, entrou pelas portas do fundos, saía pela porta dos, quando o show acabou, o Jerry Adriani se despedindo, eu corri, o Argeu levou a gente lá por trás, aí ele saiu, eu pá, dei o maior beijo na boca. E depois, eu já trabalhando, teve um show no Rio no Teatro Nossa Senhora da Paz, talvez, não vou me lembrar, Jovem Guarda, eram homens que imitam, ele, o cara até hoje imita Wanderléa, não sei o que, fez o show da Jovem Guarda e Jerry Adriani foi ver e lá estava eu, Frida, porque eu trabalhei na TV Globo muitos anos, Frida é uma produtora de elenco. E saímos dali, fomos jantar e o Jerry Adriani foi também, a Frida contou pra Jerry Adriani e pra mulher dele que chama Elisabete, eu morri de vergonha, eu já era, eu falei: “Ai, Jerry”, ele: “Mas que coisa maravilhosa saber disso”, entendeu, então foi o primeiro homem que eu beijei. Mas aí eu namorei, fiquei noiva desse primeiro namorado, foi onde eu perdi a virgindade, mas depois ele me deu, nessa praça em frente ao Fluminense, ele tinha desmanchado comigo, eu já tinha enxoval pronto pra mim casar, com letrinha, ‘m’ ‘c’, eleja morreu, que Deus o tenha num belíssimo lugar. Mas ele me deu um soco que quebrou meu dente porque eu fui dançar com um cara, entendeu, mas ele tava dançando com uma mulher também, e o cara que eu tava dançando era tudo pessoa conhecida, ele sabia quem era, aí ele: “Ah, vamos na praça”, eu fui na praça, começamos a discutir, ele me deu um soco, meu pai queria matar ele, foi um, gente, você não sabe o que foi, meu pai saiu com o revólver pra matar, ah, aí eu desmanchei dele, acabei com ele, entendeu, e foi esse namorado. Mas era namoro mesmo de namorar, sentar dentro de casa com pai, com mãe, com irmão, tudo isso eu tive, a minha irmã Selma então foi pior, a mais velha, porque era uma mesa, a gente tinha que fazer o dever na hora que ela tava namorando, era ela e o Manuel, ela é casada até hoje com o Manuel, que é um português, ficava eu, Iara, Selma e Manuel namorando, papai ali, mamãe aqui, papai cochilava que só e mamãe bordando, eu e Iara fazendo o dever de casa, não tinha sofá, aí dava a hora, Manuel ia embora. Tão casados até hoje, quase 50 anos esse dois, já bebeu pra caramba, já deu um monte de BO, mas, enfim, hoje recuperou, graças a Deus parou de beber, hoje é uma pessoa querida, mas também já, enfim.
P/2 – O Jerry Adriani, que música que você gostava dele, teve uma que te marcou?
R – Ah: “Querida, quero lhe dizer que toda a minha vida entreguei a você”, eu imitava ele, era muito bom, gostava de tudo, mas essa era uma música que eu adorava, ficava imitando, Rita Pavone, ih, imitei muito, que eu tenho pintinha, tinha mais. Na escola outra coisa que me enlouquecia, porque me chamavam de banana pintada na escola, eu tinha sete, oito anos, que eu era banana pintada porque eu tinha pintinha, que minha mãe me levava na praia e me botava num, como fala, como dizia? Embaixo da peneira porque aí eu só queimava os pontinhos, olha que filha da mãe, aquilo me matava. Uma coisa que eu ia falar, fazia exame, que eu falei que bordava, a gente fazia exame de fezes, de urina, tudo na escola, e aí um dia um veio que eu tinha bichinho, fiquei uma semana, quase um mês sem ir na escola, que eu achava que eu tinha uma doença, sete, oito anos, achava que, mas todo mundo tinha verme, eu achei que eu era a única, eu fugi da escola, foi triste, mas, enfim, isso foi a infância, né, que era bem bom.
P/1 – Você falou, quando a sua mãe faleceu você que acabou então assumindo a casa.
R – Assim, Selma já era casada e daí tinha a Iara, que era solteira, a Claudete que era solteira, Cláudio já era nascido, Cleuza já era nascida, todos nós, então eu fiquei ajudando, eu que cozinhava, que lavava, passava, estudava de noite, entendeu, ajudando o meu pai a criar a Cleuza principalmente, aí depois, mas eu fiquei, nem fiquei um ano porque em setembro, em 12 de setembro de 72, no mesmo ano que a minha mãe morreu, eu peguei um ônibus, fui morar no Rio de Janeiro, entendeu. Então, mas toda semana eu tava lá, eu ajudei bastante, ajudei criar, eu mandava dinheiro, era todo um, entendeu, a gente, enfim, até trazer todo mundo pra morar comigo no Rio de Janeiro, todo mundo, cada hora vinha um, entendeu, cada hora vinha um pouquinho, meu irmão morou comigo oito anos, enfim.
P/1 – Mas como foi esse processo de você decidir e negociar com o seu pai pra ir pro Rio?
R – É porque, assim, eu não queria mais ser professora, entendeu, eu fui ser professora porque minha irmã era professora, e em Macaé era assim, ser professora, casar virgem, com a lona pingando, eu não tinha esse, sabe, eu não tinha esse perfil, não era eu, não era eu, nego, tanto que eu perdi a virgindade antes de me casar, entendeu, porque não, e fui perder já com 19 anos, não perdi com 13, 14, 15, não, mas eu não queria, aquilo realmente não era pra mim, entendeu. Então eu pedi pro meu pai, foi difícil, ele deixou, e aí eu fui morar na casa dos tios, que foi pior porque eu fui ser empregada doméstica, até eu desgrudar desses tios foi difícil, foi difícil, eu morei quase um ano com eles e era empregada, eu tinha tanto problema de dente, que eu lembro disso, que os dentes e a boca inchava e eu não podia. Até que eu comecei desgarrar, fui trabalhar na, vender livro de inglês e de francês, de alemão e francês, depois fui trabalhar numa empresa que vendia flanelinha dentro da Loja Americana pra limpar óculos. E foi aí que um dia eu fiquei tão ofendida com esses tios, numa semana santa eu queria ir pra lá e eles não queriam que eu fosse pra Macaé, era a única oportunidade que eu tinha de ficar quatro dias com a minha família, né, e eles queriam que eu ficasse em casa com o meu tio porque minha prima ia ficar com o noivo, eu ia ficar pra tomar conta, eu falei que não, que era o único momento que eu tinha, eu trabalhava lá muito, eu esfregava chão, ai, um horror. Aí eles não, ficaram putos e eu fui pra Macaé e contei pra todo mundo, contei pro meu pai, contei pros meus irmãos, aí o meu pai mandou meu irmão Afrânio vir comigo e eu: “Pronto, acabou, você não mora mais no Rio de Janeiro, volta pra sua cidade, você não foi pra lá pra ser empregada de irmão meu”. Aí eu fui me despedir dessa tia Amélia, ela falou: “Você não veio pra o Rio de Janeiro pra voltar derrotada, coe vai ficar aqui até o fim do dia, esperar meu marido chegar”, que era o tio Alberto, que Deus o tenha e aí o tio Alberto aceitou que eu morasse com eles, eu dormia na sala. Ela disse pra mim: “Você vai morar aqui seis meses com a gente”, ela tinha três filhos: “Você vai morar seis meses aqui, depois de seis meses você tem que tomar teu rumo senão, aí sim, se você não se encontrar você volta pra Macaé”, e aí eu falei: “Ok”. Seis meses se passaram, um dia eu acordo de manhã, ela falou: “Você vai num lugar comigo ver um lugar pra você morar”, ela morava em Santa Teresa, na Santa Cristina, é uma subida, ela morava ali, nós descemos quatro casas, cinco, atravessamos a rua, ela falou: “Aqui”, descemos uma escadaria, viramos, abriu uma porta, tinha uma janela, aqui abria a porta, entrava, era o quartinho que eu ia morar. Eu não acreditei naquilo, depois de viver num puta casarão, com tudo de fruta em Macaé, eu falei: “Meu Deus do céu”, aquilo me apavorou, e na casa do tio também, o tio mandar, esse tio que me explorou, você fica, eu falei: “Meu Deus do céu, é aqui que eu vou morar”. Aí cheguei nisso, enfim, a gente vai falando, quando eu fui morar com a tia Amélia esse tio, o Valter, que também já é falecido, o tio Valter falou, e aí eu continuei trabalhando em coisas, essa loja, na Loja Americana, aí eu virei supervisora dessa empresa de flanela, tal, daí eu peguei e fui pra, tio Valter falou: “Por que que você não procura AértonPerlingeiro”, que é uma pessoa da nossa cidade, ele é de Macaé, a família dele tem ruas lá em Macaé: “E vê se ele não arranja um emprego pra você”. Nego, a coisa foi tão certeira, que eu fui praquela Página Amarela lá, AértonPerlingeiro Publicidade, achei o telefone, Rua Hilário de Gouveia, fui lá, ele muito safado, que Deus o tenha também, já via uma menininha de 20 anos, toda bonitinha, corpinho bonitinho, blá, blá, blá, um mês depois a menina que trabalhava na recepção eles tiveram que demitir, aí pronto, me adotou, nunca mais saí de televisão. Ele tinha o programa, ele tinha uma agência de publicidade, que ele alugava o horário na TV Tupi, entendeu, e eu comecei lá como recepcionista, eu chegava às oito horas da manhã, limpava o banheiro, limpava o escritório, quando ele chegava às nove o café tava prontinho, quentinho, eles entravam pro escritório, eu ia pra recepção, atendia as pessoas e atendia. Ali ele produzia o programa que ele exibia, que era todo sábado na TV Tupi, e dali eu fui galgando, de recepcionista virei assistente do escritório, virei assistente da secretária, virei assistente de produção, até virar a diretora de produção do programa, que já comandava o programa com ele. Saía na Revista Amiga, que era muito bacana, meu pai dobrava a revista que atrás da primeira página da revista tinha uma tira que era eu dando o prêmio a essa garota AP Show, que eu falei da fotografia, aí papai parava, te conhecia: “Já viu minha filha essa semana”, todo orgulhoso. E o interessante era eu, porque eu ia toda semana pra Macaé, nessa época eu tive que fazer terapia porque imagina uma menina que sai do interior de Macaé, andava de bicicleta, cidade que não tinha farol, cai no Rio de Janeiro, vai trabalhar numa televisão, não é verdade? Então, e eu dependia muito da minha irmã Iara, eu usava uma roupa e levava pra Macaé, porque eu ganhava roupa, se ela não gostava eu devolvia, escolhia outra, olha a dependência, e aí eu fui até fazer terapia, fiz um ano de terapia, resolveu minha cabeça, nunca mais, foi tudo, essa doutora foi linda porque ela conseguiu me enquadrar, entendeu. E aí eu chegava em Macaé, óbvio que eu queria ir pra festa com elas, aí chegava no clube: “Olha ela, olha ela”, tudo, que tinha acabado de ver o programa, então era bem legal, eu curtia isso, era muito bom, quer dizer, então daí a minha vida profissional começou, foi aí dentro. Eu fiz uma coisa, posso falar?
P/1 – Pode, claro.
R – Na TV Tupi o programa do Aérton acabou, que a Tupi ia fechar, o Aérton saiu antes, ele fez mil e tantos programas, e daí eu trabalhava, saí e eu já era conhecida lá dentro da Tupi e o, um dia um cara me chamou e diz: “Ah, você vai sair do programa do Aérton”, não, não, eu pedi demissão do programa do Aérton porque eu fui chamada por essa produtora que era a Power, pelo Viseu, pra trabalhar com ele fazendo o Programa Abertura, que foi uma coisa que vocês viram na faculdade. O Programa Abertura foi na época da abertura política desse país, entendeu, e era do Fernando Barbosa Lima, onde vocês viram na faculdade o Glauber Rocha feito louco gravando, falando, falando do Severino, falando, isso eu estava ali atrás da câmera dirigindo o Glauber Rocha, foi um dos programas mais maravilhosos que eu fiz na minha vida. Então dali do Aérton eu fui pra Produtora Power com o Viseu fazer o Programa Abertura, daí acabou, porque era na Tupi, aí a Tupi fechou, a Tupi fechou, eu fiquei na produtora, aí eu fiquei fazendo comerciais, foi longos anos de comerciais, entendeu, trabalhando como todo o tipo de diretor, falei do Seu Manga, que foi fantástico todo o período que eu fiquei com o Carlos Manga e tantos outros, entendeu. Daí da Power eu fui pra TV Globo, pra Globotec, aí fiquei muito tempo também porque eu trabalhava, a Globotec era uma house da TV Globo, então eu fiz...
INTERRUPÇÃO
P/1 – Célia, eu queria na verdade que você falasse um pouco mais sobre essa sua experiência com o Glauber, não só com ele, eu acredito que você deve ter tido contato com outras personalidades, né?
R – Sim, sim, esse período, enfim, no programa do Aérton já era uma coisa maravilhosa, né, porque era o único programa onde recebia realmente os atores e personalidades, que eu ligava e todos aceitavam ir ao programa porque era o único programa que as pessoas podiam ir pra falar da sua peça de teatro, pra falar do seu filme, pra falar do seu livro. Então eram poucas as pessoas, aliás, não me lembro de quem recusou ir ao programa, então na foto que eu mostrei pra vocês eles têm, era uma mesa onde ali tavam vários convidados, entendeu, então era muito, era um programa bem bacana, onde eu tinha uma ligação muito grande com todos eles. E o Aérton tinha uma coisa, que todo sábado quando acabava o programa às quatro e meia ele convidava alguns atores e levava pra um café, um lanche na casa dele, e era sempre muito bom porque lá se conversava muito, batia muito papo, e ali a gente convivia com os atores. Eu pude ver coisas maravilhosas porque eu, por trabalhar na televisão, e principalmente no Almoço com as Estrelas, eu tinha entrada livre em todos os teatros, em todos os espetáculos, então o que você pode imaginar dos anos, de 73 pra cá eu vi, entendeu, eu tive essa honra, Deus me deu esse prazer de eu poder trabalhar com isso e eu poder participar dessas coisas, entendeu. E daí do Aérton, que eu fui, fiquei na própria TV Tupi fazendo o Programa Abertura, que tinha, era o Glauber, era o Ziraldo, era o Villas-Bôas Corrêa, era, o Roberto D’Ávila morava em Paris e lá ele entrevistava várias pessoas, quem eram essas pessoas? Os políticos que tavam exilados lá, de Brizola pra todos que você puder imaginar, então ele entrevistava, me mandava lata de filme, eu revelava e botava no Programa Abertura, todo domingo às sete horas da manhã, porque um dia eu atrasei, Fernando Barbosa Lima passava na minha casa na Rua Belfort Roxo num carro Puma amarelo, eu entrava naquele carro, a molecada, meus amigos tudo chegando da balada me via, ficavam tudo gritando, me sacaneando, mas o Seu Fernando já sabia disso, ele também faleceu no ano passado, uns dos melhores diretores que eu tive. E ele me levava pra Tupi, dali nós ficávamos até às sete da noite, nós editávamos, porque no sábado eu já montava o programa e aí é que era o perigo, quando chegava o Glauber Rocha, gente, eu gravava com o Glauber três fitas, enquanto eu gravava vinte minutos com o Ziraldo, que dava o recado dele rapidamente. Célia, era uma socialite maravilhosa, Célia Portela, adora, chiquésima, Vivian Nabuco, ex-mulher do dono do Bradesco, só essas socialites que participavam do programa, e a gente ia entrevistar as pessoas na casa delas, elas levavam os convidados pra casa delas, então elas tinham o seu espaço, cada uma dessas pessoas, e o Glauber tinha o dele. Um dia o Glauber ia lançar o filme do, que ele tinha a Marina, o nosso pintor, a Marina Montini era uma que falecida, gente, só to falando de morto, a Marina Montini era modelo dele, Di Cavalcanti, Di Cavalcanti que fazia as mulatas?
P/1 – Sim.
R – E ele fez o filme do Di Cavalcanti e a família proibiu, então nesse dia o Glauber seria o personagem do programa, então a Vivian Nabuco ia entrevistar o Glauber Rocha, cara, quando eu chego, ele tinha uma produtora no, tinha uma produtora na Urca, que era assim, ó, tipo aqui, saía dessa porta da produtora pro fundo, no fundo da produtora, era uma casa, gente, aqui era a pedra do Pão de Açúcar, pra você ver onde o Glauber estava, a pedra, o Pão de Açúcar monstruoso, fiz duas ou três entrevistas, ele com o braço aberto ali, feito um louco ali falando, era muito bom. E aí chego eu na produtora um pouco antes, tava do lado, a TV Tupi do lado, que a produtora dele é na rua, perto da casa do Roberto Carlos, aí: “Não vou gravar, não vou gravar, não vou gravar”, eu falei: “O quê?”, “Ela está vindo com o exército, o exército”, eu digo: “Que exército, Glauber? A Vivi tá vindo pra fazer a entrevista hoje”, “Não”. Olha, isso deu um buxixo que eu tive que ligar a Fernando Barbosa Lima, tentar acalmá-lo pra ele poder vir, porque ele já tava num processo, porque eu sempre digo e quero defender aqui que Glauber, eu nunca vi, durante quase dois anos que eu trabalhei eu nunca vi Glauber Rocha cheirando maconha, cheirando cocaína, todo mundo dizia que Glauber morreu, não, Glauber tava muito além do jardim, a inteligência dele matou ele, entendeu, porque ele, o que ele via aqui ele já tinha previsto lá na frente. Se você pegar um Programa Abertura hoje do Glauber e ver você vai ver que eu to falando a pura verdade, muito inteligente, a inteligência dele matou ele, entendeu, porque era uma pessoa preocupada, uma pessoa ativa, então era demais gravar com ele, demais, demais, demais. Eu, ele morou em vários lugares que eu fui gravar, eu adorava quando ele morava na rua, embaixo do Morro Dona Marta exatamente, esqueci o nome da rua, e ali era uma outra produtora, quando ele saiu da Urca foi pra ali, cara, ele botava o Brizola, todo mundo, aí a gente fazia a chamada: “Hoje, Glauber Rocha com Brizola”, aí aparecia o Brizola, que era o Brizola da parada, entendeu, que trazia as brisas pra todo mundo. E o Brizola entrevistado: “Brizola, fale aí” e o Morro da Dona Marta, ele mandava o Toni, que era o câmera: “Feche no morro”, aí o cara fechava no morro, voltava pra cara do Brizola, e tudo muito close, se vocês lembram, era tudo muito close, que ele queria a câmera na cara, ouvindo, gente, era muito bom. Então tava três, quatro, cinco fitas de uma hora, e pra editar pra tirar um trechinho? E quando ele ia pra Tupi de manhã? Ninguém trabalhava porque ele chegava às sete horas: “Fernando, hoje eu preciso montar a minha matéria”, Seu Fernando dizia: “Não, pelo amor de Deus, Glauber, você vai me enlouquecer” e blá, blá, blá, mas, olha, foi, nossa, foi bem legal fazer este programa, foi uma coisa que eu tenho o maior prazer. Imagina receber material, Brizola falando em Paris e eu revelar esse filme, cara, olha a importância, entendeu, a importância desse no país, a gente pode mostrar, e daí veio a abertura, que foi a coisa mais maravilhosa. Então nós editávamos o dia inteiro de domingo, cinco horas da tarde entregava pro sonoplasta sonorizar, dez e meia da noite o programa ia pro ar. Uma vez aconteceu de falecer, isso foi uma doideira, o programa prontinho, recebemos uma ligação tipo cinco horas da tarde, minto, o Fernando e o Barbosa Lima tinham ido embora pra casa, eu estava sonorizando com o sonoplasta, recebo, não, aí a televisão correndo: “O que que foi?”, “Morreu fulano de tal”, morreu, pô, eu tenho que lembrar o nome dele, o Ministro da Justiça, cearense, o programa todo era em cima dele, o programa todo era em cima dele. Seu Fernando teve que voltar pra TV, nós tivemos que remontar o programa em menos de duas horas, uma hora, o programa que você levou o dia inteiro pra montar, pra fechar, Castelo Branco, Castelo Branco, ministro, não, Castelo Branco foi o nosso presidente, ai, gente. Enfim, o programa teve que ser remontado em duas horas pra gente poder não botar um programa errado no ar, e me lembro que o programa fechou com o rosto dele, então o Seu Fernando foi fechando, foi fechando, tudo preto, tudo preto, tudo preto, tudo preto, ficou a tela preta e acabou o programa e a gente conseguiu fazer mesmo com pouquíssimo tempo, foi um trabalho também árduo nesse programa, entendeu. E daí do Programa Abertura, que acabou porque a Tupi fechou, eu fui pra produtora, da produtora eu fui pra TV Globo, da TV Globo, lá na Globotec eu fiz, que era uma house praticamente, a gente fazia todas as aberturas das novelas lá na TV Globo, com todos os diretores que vocês possam imaginar nós rodamos. E era uma produtora, por ser da TV Globo todo mundo queria produzir lá, né, então a gente fazia 30, 40 comerciais por mês, porque eu podia ta filmando, eu podia ta gravando em VT, filmando no norte, no sul, equipe aqui, lá, e eu coordenava, era muito bom, era muito bom. A TV Globo foi outra fase linda, linda na vida e quando eu saí da Globotec eu fui pra Tycoon, que foi outro grande prazer, a Tycoon depois virou uma produtora que foi alugada pra TV Globo, acho que ainda tem a Tycoon, muitos anos, muitos programas do Chico Anísio foram rodados ali, gravado ali. E aí eu fui pra Tycoon com o Paulo Lomba e o Cyll Farney, tive o prazer de trabalhar com este grande ator, irmão do Dick Farney, e foi lá que eu trabalhei com o Carlos Manga, como assistente de direção dele, depois diretora de produção, e lá eram comerciais, comerciais, comerciais todo tempo, todo tempo, todo tipo, ganhei muitos prêmios fazendo comerciais. E quando saí de lá eu, por algum motivo, não, o Seu Manga saiu e me levou pra Blow-up, uma ótima produtora, uma produtora de filme maravilhosa, que tem até hoje, e lá eu fui ser assistente do Seu Manga, depois fui ser produtora porque tinha a Márcia Burguer que era assistente, voltou. Mas nesse período da Tycoon, desculpe, entre, porque agora eu vi a localização, entre a Tycoon e a Blow-up, a Márcia Burguer, que era uma grande produtora paulista, diretora de produção maravilhosa, quem me botou no cinema, me chamou pra fazer a Escola Atrapalhada dos Trapalhões, que foi com a Angélica e com o Supla, os meninos, e Os Trapalhões, óbvio, Gugu e os meninos lá que tem o Rafael Ilha, o...
P/1 – Dominó?
R – Não, que o Rafael, coitado, esse menino que tá aí sofrendo, fazia muito filme dos Trapalhões eles também, esse grupo desses meninos, e aí eu fiz esse longa metragem, consegui entrar no cinema, foi o meu primeiro longa metragem, foi maravilhoso, lá com a RA, que é Renato Aragão Produções, foi lindo. Era, o diretor era o Del Rangel, na época era o marido da Regina Duarte, o Del é sobrinho do Renato Aragão, então ele que dirigiu esse filme, não por isso, porque já era um diretor conceituado dentro da TV Globo. Então a RA era em frente ao Aeroporto de Jacarepaguá, hoje não tem mais nada disso, porque ali era um pântano, foi aí que o Renato comprou lá em Vargem Grande, que hoje é a Record, que ele depois vendeu pra TV Record. Aí fiz esse longa lá com a direção de produção eu, olha, foi tudo tão assim, louco, porque só tinha uma vaga de assistente de produção nesse longa, eu fui conversar com a Sara Silveira, que hoje é a maior diretora de produção desse país, todos os longas metragens premiados é Sara que tem aqui em São Paulo, e a Sara falou: “Ó, eu gostei de você”, fiz uma entrevista com ela antes, contei tudo. Ela falou: “O que acontece, eu vou fazer o merchandising desse longa e eu não entendo nada disso e se você vier pra cá eu te dou uma porcentagem de tudo o que eu faturar e você é assistente minha”, eu falei: “Perfeito”, ganhava uma mixaria, mas só do que eu ganhava, porque a gente chegava com o material do Renato Aragão em qualquer cliente era porta aberta, ele tinha o maior número de assistências, de pessoas vendo os filmes dele nesse país, ele tinha um portfólio de apresentação maravilhoso, então em todo o lugar que eu chegava porta aberta, porta aberta, porta aberta, entendeu. Então aquilo ali, a água que eu botei lá dentro, todos os cadernos da Melhoramentos, os lápis, tudo o que eu botei dentro dessa escola, que era a Escola Marista São José lá na Usina, no Rio de Janeiro, tudo aquilo eu tinha dinheiro, a gente ganhava em dinheiro, era nossa, a comissão da Sara e eu. Rolou até, foi quando a Zélia travou nosso dinheiro, meu dinheiro tava todo no overnight, aí o Renato Aragão pagou a merchandising a Sara em dinheiro e ela me deu o dinheiro, foi aí que a gente conseguiu viver alguns meses, e já estávamos começando a Escola Atrapalhada Dois, parou porque o dinheiro foi todo trancado, entendeu. Depois eu sou convidada pela Sara em 97, eu já aqui em São Paulo, não, eu lá, aí vim fazer a Hora Mágica com ela em São Paulo, foi aí que eu reencontrei o ex-marido que morei, que namorei com ele nos Estados Unidos, depois nãnãnã, e a vida deu a volta e foi indo. Mas aí saí da, do Renato Aragão, fui pra Blow-up, e aí fiquei picando em algumas produtoras, outras produtoras, perdão, saí da Tycoon, né, e fui pra Blow-up, é isso, e lá na Tycoon era o Cyll Farney e o Paulo Lomba, que era o, o Paulo é sobrinho do Seu Manga, entendeu. Então foi uma fase também linda, muito boa na vida profissional, e dali fiquei trabalho aqui, trabalho acolá em produtoras, fui, fui, até que decidi morar nos Estados Unidos e aí...
P/1 – Como é que foi isso?
R – Decidi porque já tava com vergonha, com vergonha de na Blow-up o Frank ganhou o filme, um filme, aquele filme da Esso que tinha aquele tigre, o diretor, o tigre e o diretor de fotografia vinham dos Estados Unidos, aí o Frank falou pra mim, aí foi uma comemoração na produtora porque ele ganhou junto a mais três ou quatro produtoras lá no Rio, ele ganhou a concorrência, a proposta dele foi a melhor. Ele chegou pra mim e falou: “O filme é teu”, aí eu dei os parabéns pra ele, ele falou: “Legal, muito obrigado, tal, e o filme é seu, você tem o inglês na ponta da língua, né?”, eu falei: “Não”, “Não?”, eu falei: “Não sei falar nem ‘no’, que dirá inglês”, “Como, Célia, você não fala inglês?”, aquilo foi a primeira vergonha, depois começaram a ter vergonhas. Fui chamada pela equipe do Babenco pra ser produtora de alimentação lá no meio do mato, era meu sonho, Babenco tava arrebentando naquela época, não fui porque eu não falava inglês, aí eu falei: “Não, agora, Senhor Manga”, eu estava na Blow-up: “Estou indo embora do Brasil estudar um ano”, ele olhou pra minha cara, disse: “Eu não acredito”. Eu era assistente dele, fazendo só filme massa, só filme maravilhoso, ele falou: “Não acredito”, eu falei: “Vou, ou é agora”, porque eu tinha ido as férias no ano anterior na casa do Ivan, que era um maquiador, que Seu Manga só rodava os filmes dele com o Ivan maquiando e fazendo o cabelo, o Ivan deu a doida, um gay maravilhoso, foi morar nos Estados Unidos. Acabou que eu fui morar com ele anos depois, ajudei até montar o salão, refiz sofá com, reestruturei porque eu meto a mão em tudo pra fazer mesmo, então, e acabei morando com ele lá, o Seu Manga trocava o dia do filme se o Ivan não pudesse, esse maquiador, ele que fez todo o Viva o Gordo do Jô Soares, mudava de personagem, o Ivan é que maquiava, fazia toda aquelas caras, aquilo tudo do Jô. E aí eu tinha um ano antes estudado com, passei as férias lá com o Ivan e ele falou: “Vem morar aqui, boba”, me convidando: “Vem pra cá trabalhar comigo” e até que quando eu comecei a passar essas vergonhas por não falar inglês eu falei: “Vou” e aí foi que eu fui morar nos Estados Unidos. Morei com o Ivan trabalhando no salão dele, ele só abria o salão às quatro da tarde, então pra mim era perfeito, ficava até 11 da noite, que eu estudava até as duas numa cidade do lado, que eu pegava o ônibus, era 20 minutos, e lá, neguinho, e lá que o bicho pegou porque lá eu fiz, só não me prostitui, mas tudo o que eu pude fazer pra ganhar dinheiro e me manter durante quase quatro anos. Depois foi quando, tem uma parte horrorosa da vida que eu limpando casa, aí o que aconteceu? Quando eu deixei o Ivan eu fui limpar casa, limpava casas dos grã-finos lá com as mulheres brasileiras, que tinham as suas companhias, e eu limpava casa, entendeu, deixei de morar com o Ivan, aluguei um apartamento, um basement, eu morava num basement. Até que o irmão do Ivan brigou, os dois brigaram, ele veio morar comigo, porque eu ganhava 800 por mês, 800 dólares e pagava 500 de casa, então eu tinha que fazer baby siter de madrugada, era um horror, eu praticamente trabalhava pra me manter e foi aí que eu, aí saí do salão, fui limpar casa, limpei muito. Até que uma das amigas que limpava casa comigo foi morar na Flórida, em Pompano Beach, e trabalhava numa lavanderia em Boca Raton, e nós éramos muito amigas, Cristina, e aí ela falou, me ligou um dia: “Quer vir aqui, tem vaga na lavanderia, quer vir morar aqui?”, eu falei: “Mas vou total”, aí que me mudei pra Flórida e daí fui trabalhar na lavanderia. Trabalhava empacotando as roupas passadas, botando lá, se passa uma camisa social tinha que botar papel de seda, assim, todo, eu fazia isso, recebia roupa suja, etiquetava, consultava os bolsos, se tinha dinheiro botava num saquinho, te juro que muitas vezes eu não tinha dinheiro pra comer e peguei dez dólares. Mas eles davam gorjeta, por isso que eu deixei de pegar, porque eles davam de gorjeta, tinha, cheguei a pegar 400 dólares dentro dos bolsos, e era muito arriscado porque eles podia fechar a lavanderia, dizer que o empregado roubou, entendeu, então a gente tinha muito medo, principalmente porque eu era ilegal. Então nessa lavanderia foi lindo também, que foi, o cara era casado com uma brasileira, então tratava a gente muito bem, ali eu passei uma vida bem bacana também, adorava trabalhar lá e lá eu passeava muito porque o meu dinheiro dava, eu viajava, eu ia, vinha pra Nova Iorque na casa dos amigos.
P/2 – Você foi pra ficar um ano, ficou quatro por que, você já tinha aprendido inglês, por que você decidiu ficar?
R – Porque comecei a trabalhar, comecei a trabalhar, ganhar dinheiro, aí tudo muda, tudo muda, você começa a fazer amigos, já virei sócia do Lions Club, fazíamos festas maravilhosas, passeios maravilhosos, aí arranjei namorado, nega, abri conta em banco, a gente fala lá que abriu conta em banco não volta tão cedo. Então a vida começa a mudar, tu monta a sua casa, fica feliz, aí traz amigos, porque lá a vida é essa, é amigo no fim de semana fazendo churrasco, entendeu, ou viajando, indo pra outros, parques, que no verão é maravilhoso, entendeu. Então vivia uma vida muito boa também lá nos Estados Unidos porque não me permiti sofrer, porque isso, tive amigas que estudavam, que aí eu estudava, né, na escola que eu estudava, que era uma brasileira filha de americano, a mãe brasileira, o irmão do Ivan, o Emílio, por exemplo, seis meses era secretário da professora porque tinha 21 anos, falava inglês em dois minutos, entendeu, eu demorei um pouco. Mas lá tinha meninas de 18, de 19, 20 anos aprendendo inglês e todas gogo, muitas meninas que cheiravam cocaína, bebiam pra poder subir, dançar e deixar os homens tocar pra botar uma nota de um dólar, isso era uma parte bem, bem triste que a gente via lá porque eu via amigas de chorar, de sofrer: “Porra, vou ter hoje que cheirar esta merda”, eu dizia: “Mas por que você não larga? Vai limpar casa comigo, cara”, “Ai, mas até, você ganha 200 dólares por semana, eu ganho mil, mil e 500”, entendeu, então era um problema grave isso. E lá muito bom porque vinha pra Nova Iorque, eu não tinha o que fazer ia pro cassino o fim de semana, adorava jogar no cassino, e não tinha o que fazer ia pra parques, como eu já falei, lá tudo era bom pra você ir de fim de semana, entendeu, lá tem diversão a todo tempo, entendeu, então era muito bom e eu realmente não me permiti sofrer, não fui pra lá pra isso, não tenho. A minha família no Brasil, meu Deus do céu, eu só de imaginar que eu podia tá traindo a confiança de todos eles aquilo já me arrebentava, deu poder imaginar, fui convidada muitas vezes pra dançar, eu tinha 38 anos, hoje eu tenho 60 anos, meu parceiro, eu com 38 eu, me desculpe a falta de modéstia, mas eu não aparento que tenho 60 anos, todo mundo fica impressionado, então eu vou na onda das pessoas, mas imagina eu com 39.
P/2 – Você tinha planos de voltar?
R – Tinha, em um ano.
P/2 – Aí você acabou ficando quatro e por que você decidiu voltar?
R – Porque eu vim ao Brasil no carnaval e aí fiquei três semanas, quando eu voltei a passagem era Rio, Orlando, Miami, então fazia o check in em Orlando, quem ia pra Orlando ficava em Orlando, quem era Miami volta pro avião e já descia em Miami sem check in, assim foi feito, meu passaporte, passaporte tirado na Polícia Federal, o meu passaporte estava com validade até, isso era março, quando eu voltei, o meu passaporte tinha março, abril, maio, maio vencia. Eles já me deram seis meses pra ficar, mesmo vendo, me deram seis meses pra ficar, eu tinha uma mala e uma bolsa de mão, aí abre a sua bolsa, não abre a minha, abre a dele, não abre a dela e assim vai, abriu a minha, pediu pra abrir minha bolsa, eu botei na bancada, o salão enorme, sai daqui dos guichês de imigração e vai, a esteira tá lá na frente. Veio minha mala, tirei, botei na bancada, abri, quando eu abri minha mala sobre a minha mala tava a minha agenda e aí ele tava olhando assim, né, aí eu falei: “Deixa eu abrir”, aí eu pop, aquelas duas coisinhas que trava aqui em cima, eu pop, abri, e aí a minha agenda correu, correu e caiu no chão, caiu no chão com todos os papéis que se vocês olharem a agenda de hoje é idêntica, me corre assim. E o homem, que era um cubano o filho da mãe, me ajuda a pegar a papelada, a primeira coisa que ele pegou foi uma nota fiscal de um supermercado do lado da minha casa em Pompano, ele falou: “O que que essa nota tá fazendo aqui?”, eu devo ter ficado branca, e eu respondi: “Não sei”, ele disse: “Como a senhora não sabe?”, eu olhei bem pra cara dele, falei: “Um momentinho, onemoment, please”, falei em inglês, já tava funicada, eu falei: “Um momentinho”, enfiei a mão, já peguei meu talão de cheque cor sim, ou não sei o que lá, falei: “Fui ilegal no seu país, to voltando para pegar minhas malas e minhas coisas e voltar para o Brasil”. Ele olhou pra mim e disse: “Muito obrigado pela sua sinceridade, mas a senhora vai acompanhar aquela policial”, eu fiquei 24 horas presa, tive quatro horas de depoimento e não me deixaram, o avião ficou uma hora me esperando e não me deixaram entrar, não me deportaram, cancelaram o meu visto. Pra eu fazer xixi, pra eu fazer número dois eu tinha que bater na porta, era uma sala que ia daqui até ali, desse tamanho aqui, aqui tinha uma coisa de cimento comprida que você podia deitar se quisesse, desse lado de cá uma pia e um vaso sanitário, se eu fizesse qualquer coisa eu tinha que avisar, não tinha descarga, cai direto,porque você pode vomitar, ta com jóia, com pedra preciosa no estômago, pode ta com algum objeto na vagina, vai fazer xixi ou cocô vai cair e lá embaixo é peneirado, passei por isso. Eu chorei 24 horas, eu tinha a única coisa, esse sapato eu não ficaria porque tem cadarço, tira o sapato, tira o cadarço, te devolve o sapato, o cinto tira, isso não teria porque eu posso me enforcar, e me deram o jornal O Globo pra eu ficar lendo, eu sabia todos os apartamentos no Rio de Janeiro vendendo, alugando, separado, kitnet, eu sabia tudo e chorava, e chorava. Falei por telefone com o namorado que eu tinha na Flórida, que até febre por causa desse filha da mãe eu tive, o povo me esperando em Miami, eu não chegava, me botaram no telefone com o advogado, que ele disse que eu fiz a melhor coisa, contar a verdade, contei quatro horas de depoimento, tudo em inglês, eu falei: “Meu Deus, eu não preciso disso, mas agora é enfrentar”. Voltei no outro dia, 24 horas depois. Fiquei menstruada porque fiquei tão nervosa, a mulher ia no banheiro, sabe o banheiro, quando eu ia no banheiro porque eu fiquei menstruada, banheiro que tem a porta e aqui tu tem aquele buraco, o pé da mulher era dentro assim, gente, aí eu falei pra ela: “Se a senhora ficar aí eu não vou conseguir fazer nada aqui”, aí ela se afastou, eu que pagava minha comida. E aí 24 horas depois lá por dentro, sem ninguém me ver, ninguém é exposto, eu voltei pro avião, voltei pro avião, meu lugar era separado de todos e eu fumava e fumava ainda no avião, né, e quando chegou, aí eu troquei de lugar, enfim, isso Orlando, quando o avião chegou em Miami eu fui chamada pelo alto-falante, tive que me apresentar ao policial e depois cheguei no Brasil, no Rio. Meu irmão me esperando no Rio, depois de ter falado com todo mundo pelo telefone em Miami, todo mundo já sabia o que tinha acontecido, avisaram minha família, meu irmão foi me esperar no Rio, não vim no carro do meu irmão, vim no carro da Polícia Federal, quando eu chego lá tudo em inglês, saí dos Estados Unidos com os caras já com o computador. Eu chego lá na Polícia Federal na Praça Mauá no Rio eles carregando máquina, eu tive que traduzir tudo porque eles não sabiam: “Mas a senhora vai ter que falar tudo porque, ó, ninguém sabe ler inglês aqui”, meu irmão lá fora me esperando, passei tudo isso, ok, vim embora, o cara depois me chamou: “Depois vem aqui que eu faço outro passaporte pra senhora”, entrando no Brasil. Aí, nego, deu a doida, deu a doida, eu pagava dez mil dólares, daí o que fosse pra voltar minha casa lá, linda, eu queria voltar, queria voltar, queria voltar, aí o Paulo Lomba e a Iracema me chamaram pra ir lá na Tycoon conversar com o Eduardo Figueira, que era o gerente de produção na TV Globo, que ficava sediada na Tycoon, pra eu ser produtora do Malhação. Aí eu fui lá, já baixando a bola, eu morando na casa do meu irmão, querendo ir pelo México, entrar pelo rio cheio, que era rio cheio de cocô, querendo coiote levar, eu já, meu irmão arranjando dinheiro, eu enlouqueci minha família, enlouqueci minha família, deixei minha família em pandareco. Aí vou lá conversar com o Eduardo Figueira, quando eu chego lá eu falo: “Eduardo, o que eu vi era assistente de produção”, eu falei: “Eu não posso voltar atrás, eu não posso”, ele falou: “Você é assistente”, não, ele falou: “O cargo que eu tenho é assistente, você foi assistente do Manga, cara, como é que eu vou botar você de assistente de produção”, aí eu falei: “É, né”, mas eu precisava, eu tinha, que, sabe, eu vou aceitar pra... Ele falou: “Mas olha só, você conhece o Daniel Filho?”, eu falei: “Sim, de televisão, né”, “Nunca trabalhou com ele?”, eu falei: “Não”, aí ele virou, falou assim: “Vamos fazer o seguinte, topa bater um papo amanhã com o Euclides Marinho, que é o sócio do Daniel? Porque ele ta produzindo, o Daniel não ta mais na Globo, você deve saber”, eu falei: “Sei”, “Daniel ta produzindo Confissões, não quer fazer? Ir lá bater um papo, eles tão precisando um diretora de produção”. Moral da história, no outro dia eu fui, parecida com Maria Carmem Barbosa, Daniel me adorou, Euclides Marinho me adorou, o Zelito Viana, porque eles tinham a produtora Dez, Daniel, Euclides, e ‘z’ de Zelito Viana, que é o pai do Marcos Palmeiras, irmão do Chico Anísio o Zelito, né, e aí eu fui diretora de produção do Confissões e eu fiz o Confissões, depois Daniel... Aí baixou o facho de voltar pros Estados Unidos, mandei dar tudo o que eu tinha lá, só mandou documentos e minhas fotos, minha amiga que tava dividindo o apartamento comigo, e eu desisti dos Estados Unidos, aí eu voltei pro, aí Daniel foi convidado pela TV Globo pra voltar pra TV Globo, aí ele disse: “Eu volto, mas eu volto com o meu projeto”, que era “A vida como ela é” em cinema, aí a Globo aceitou, aí ele levou todos nós, a equipe de cinema junto. E aí fizemos “A vida como ela é”, depois disso, depois da Vida, no período do Confissões eu fiquei namorando um ano o Carlos, porque aí o que que aconteceu? Eu lá nos Estados Unidos limpando casa, fazendo as ondas, quando eu namorava, porque quando eu fui pra lá eu morava em New Jersey numa cidade chamada Kearny, onde eu morava, e aí eu conheci o Carlos num programa que eu ia ser a diretora de produção, eu ia produzir e editar o programa, que era pra comunidade brasileira com um cara brasileiro que ia botar no canal a cabo, e eu conheci o Carlos. Gente, quando eu vi o Carlos foi muito engraçado que eu já peguei ele me olhando esquisito, a reunião acontecia, ele seria o câmera porque ele era câmera na TV Globo lá em Nova Iorque, trabalhou 16 anos lá, muita coisa que vocês viram aqui era o Carlos que mandava pra cá com, era ele, o Orlando e o Paulo Zero, os três câmeras, Carlos Magalhães, Paulo Zero e Orlando Moreira que tá lá até hoje. E aí eu conheci o Carlos, três dias depois eu já tava dando pro Carlos, eu apaixonei pelo Carlos, e namorei o Carlos três meses, depois nunca mais, porque ele viajava muito, e aí eu me mudei pra Flórida e acabou que eu não vi o Carlos, passaram-se quatro anos, Carlos me achou no Brasil e eu me casei com ele e fiquei 15 anos casada com ele, acredita que louco que é a vida. Foi aí que eu saí do Confissões, saí da “Vida como ela é” na TV Globo, a Sara Silveira me liga me oferecendo pra eu fazer o longa metragem do Guilherme de Almeida Prado com ela aqui em São Paulo, o Carlos tinha vindo, isso em 97, em 96 eu estive, passei aqui em São Paulo novembro e dezembro com o Carlos no apartamento dele, porque depois de quatro anos eu vi o Carlos, eu o recebi dia dois de novembro no aeroporto, ele ficou comigo no Rio no meu apartamento, que foi uma fase péssima, eu tava sem trabalho, a Zezé D’Alice, que é uma maravilhosa mulher na minha vida, a primeira técnica de som do Brasil, deixou eu morar de graça na casa dela e o Carlos quando veio dos Estados Unidos me visitou e ficou, dormiu comigo uma noite lá na casa da Zezé. E aí isso foi novembro, dezembro, quando foi janeiro eu fui convidada pra vir fazer o longa metragem, aí eu vim morar na casa do Carlos, aí fiquei morando um ano, aí acabou o longa em maio, Carlos lá no Estados Unidos, a gente fazia umas coisas erradas que era uma pirataria, que a gente gravava as novelas e ele vendia lá na produtora dele. E daí eu fiz o longa, depois viajei pra Malásia, que aí eu comecei a me apresentar em São Paulo nas produtoras, fui em três produtoras, a primeira me chamou, que foi a produtora, a TV1, do Sérgio Motta Mello, aí eu fui lá, era pra eu ir pra Malásia fazer um documentário pra Odebrecht, foi a coisa mais maravilhosa. Aí fui pra Malásia, de lá, eu to lá me ligaram, eu tinha que ir pra Johanesburgo pra depois ir pra Botswana na África do Sul, eu sei que eu fui pra Malásia, fiz o documentário da, já morando em São Paulo no apartamento do Carlos e o Carlos na produtora lá nos Estados Unidos, ele morava lá e eu aqui, e aí eu fiz esse belíssimo trabalho pra Odebrecht lá na Malásia, viajei, fui pra Ilha de Bornéu, foi lindo, eu fiquei um mês. De lá fui pra Johanesburgo, lá resolvi documentação, depois peguei um carro, fui pra Botswana fazer também, porque na Malásia era uma obra que era uma hidroelétrica que a gente foi filmar, eu andei de helicóptero, foi chocante, lá no meio da selva, foi linda a viagem, deu tudo certo, e depois fui gravar uma barragem também feita pela Odebrecht em Botswana, então eu fiz porque tava mudando o portfólio da Odebrecht e aí eu fui pra uma parte, outros foram pra outra parte, foram pra Lisboa, foram pro Mar do Norte, foram pra Miami, cada equipe fazendo uma coisa. E aí voltei desse trabalho, em dezembro voltei pros Estados Unidos, consegui o visto, foi difícil, mas eu dei uma sorte danada que vale a pena contar isso, quando, foi no ano que o Clinton veio ao Brasil, aí o consulado ficou 20 dias fechado e eu de medo, porque eu ia virar sócia do Carlos, ia viver com ele, era o meu casamento, eu tinha que viver com ele nos Estados Unidos, a vida dele era lá, aí eu pedi através do despachante pra poder ter o visto. Aí o Clinton veio, foi uma agonia porque não abria o consulado enquanto, aí o homem foi embora, demorou mais uma semana até que abriu, eu fui chamada pra um entrevista, cara, tu não acredita, meu coração veio na boca, a entrevista não vai dar certo, o meu casamento vai acabar, vou pro consulado, chego lá, to lá na coisa, me chamam, aí tá aqui aquele guichê, o gringo lá do outro lado, eu do lado de cá. Aí: “Seu nome?”, “Maria Célia da Silva Lima, nascida em Macaé, Estado do Rio”, “Ah, Macaé? Eu dei aula em Campos”, ah, já dançou, aí começou, pá, eu digo: “Tu sabe que macaense não gosta muito de campista, né”, ele disse: “Eu ia pras baladas tudo em Macaé”, eu falei: “Ih, ganhei”. Hoje o Leandro e Evandro, Evandro tá hospedado em minha casa, que são premiados, Leandro e Evandro, Leandro é o mais velho e o Evandro, são técnicos de som de “Tropa de elite”, acabaram, ta no ar “As três Teresas”, que acabaram, ficaram hospedados, você vê, o mundo dá volta, eles moraram oito anos comigo, eu só fui morar nos Estados Unidos quando a minha irmã já estava com o segundo marido, enquanto ela não tava fixa eu não conseguia ir e ajudei a criar esses. Chego no consulado o cara, aí comecei a conversar com o cara falando de Macaé pra ele, tal, aí ele: “Você já foi aos Estados Unidos”, aí começou a perguntar, eu respondi tudo: “teve em que lugar?”, e eu com medo do BO passado, de dar problema, eu falei: “Ai, meu Deus, ajudai, ajudai”, ele pergunta, pergunta, eu respondo, pergunta, eu respondo, ok. Aí eu esqueci, não sei se eu esqueci, não me lembro, mas acho que o nervoso foi tanto que eu não falei da Flórida, ele virou, falou assim: “Mas você teve na Flórida”, eu falei: “Ai, é, é tanto lugar que a gente tem pra conhecer, eu tive no Flórida também”, porque foi na Flórida que deu o problema, né, mas na hora apagou, gente, da minha cabeça, eu falei: “É, tive lá também, fiquei lá um pouco, tal”. Quando ele pega o meu passaporte que tava na frente dele simplesmente ele faz assim, vai abrindo, aí a última página, quando ele vira assim, ta escrito ali: “Para a querida Célia um grande beijo, Pelé” (risos), ele olhou, mostrou pro consulado inteiro, eu não acreditei, Pelé me salvou. Aí eu falei: “É que eu fui pra Malásia e tava o Brasil jogando sub-20 e o Pelé que deu o troféu, pior que deu pros argentinos, quem ganhou foi os meninos argentinos e eu tava lá e daí ele pegou, autografou, eu não tinha papel”, aí ele mostrou pra todo mundo, ele falou: “Ai, tá bom, então, ó, sobe e paga lá a taxa, tá tudo certo”, o Pelé me salvou, eu fui pros Estados Unidos pela segunda vez. Aí pronto, quando eu cheguei lá me chamaram, me seguraram mais, mas eu fui toda munida de tudo, o Carlos tinha uma produtora Desert Sun nos Estados Unidos, ele que ia ter 50 por cento do trabalho, era com ele, o Edmir que tinha uma produtora lá no Rio, irmão do Ednei Silvestre, me deu um documento, era pra Copa de 98, eu tava dizendo que eu tava indo lá entrevistar brasileiro pra fazer, tudo mentira, tudo caô, mas levei. Aí cheguei lá com toda essa documentação, com fita, eu tinha vindo da viagem, meu passaporte todo carimbado de Malásia, isso e aquilo, toda metida, eu digo: “Chegar lá vão falar que eu sou uma mulher viajada”, deu tudo certo, e lá a gente tem um texto que é bem interessante, saiu do aeroporto ninguém mais acha, que aí pra achar vai demorar, entendeu. E aí fui ser sócia do Carlos na Desert Sun, aí, neguinho, a gente dirigia, a gente produzia, todos os filmes, comerciais pra comunidade brasileira, aí vivi três anos com ele, que isso foi até o ano 2000, já casada com ele, morava numa casa maravilhosa já em Western, New York, igual Rio, Niterói, eu to aqui na minha cidade na beira do Rio Hudson passeando com a minha cachorra e Manhattan do outro lado do rio. Então vivi bem nesse período, numa casa maravilhosa, a gente ganhava razoável, e aí no ano 99 a TV Globo botou lá a TV a cabo e o cara que comprou os direitos da Globo Internacional era quase colado, a mesma cidade, e nós fazíamos as nossas piratarias com as coisas da TV Globo. Então a gente resolveu vender tudo e no ano 2000, no dia 5 de janeiro de 2000 a gente mudou pra São Paulo, passamos o ano novo no Rio, aí teve uma chuvarada, caiu tudo da Dutra, a gente não pode vir e no dia cinco, até hoje eu moro em São Paulo, entendeu, aí fiquei casada até, tem um ano e meio que eu to separada, mas o marido é amigão. E aí viajei um monte também trabalhando aqui no ano 2000, fiz um monte de coisa e agora trabalho na TV Cultura, já indo pra 13 anos, fazendo um monte de coisa no começo, mas agora já to há quase dez só na área de educação, entendeu, então contei tudo, fui falando.
P/1 – Você não teve filhos?
R – Não, não tive filhos, quer dizer, não me casei, tive alguns namorados, foi bom, mas não tive filhos, sou tia, mais tia, hoje sou tia-avó de quase 15 sobrinhos-netos, apaixonada por todos eles, entendeu, tenho uma vida bem, uma relação bem bonita com toda a minha família, todos nós, ou eu to lá ou eles estão aqui. Tenho sobrinhos que trabalham no cinema, a minha sobrinha é produtora, tenho esses dois sobrinhos que são técnicos de som já premiados no “Tropa de elite”, em vários filmes do Walter Salles, “Eu, tu, eles” Evandro fez, agora o “Faroeste Caboclo” que ta no ar, Leandro foi o técnico de som, tudo que eu ajudei a criar. A outra irmã Iara morou comigo um período também, então a vida foi indo, foi indo, as coisas acontecendo, né, e tenho um irmão que é músico que é bem legal, toca em plataformas lá em Macaé, ele e a mulher dele, que por um acaso chama Sonia Braga, então esse irmão Afrânio, ele é músico, então natal, ano novo, carnaval eles vão pra lá porque os caras ficam lá dentro da plataforma e aí eles levam alegria, bem bom. Uma outra irmã trabalha, a Iara já é aposentada, a Selma ainda, já tá aposentada, mas ainda trabalha com educação na Secretaria de Educação em Macaé, Zeca já tá aposentado, Cláudio mora no Rio, tem um táxi, Claudete trabalha numa academia, dentro da lanchonete dessa academia, tudo lá em Macaé, e a Cleuza é gerente de uma loja lá em Macaé, era produtora, que é mãe de Leandro e Evandro, enjoou e não quis mais, voltou pra Macaé. Cláudio, esse meu irmão taxista, tem um único filho que é Henrique, amanhã toca aqui em São Paulo, ele é músico junto com um DJ, com um outro rapper, o Felipe Red, já ta um pouco famoso, o Leandro também dirige um pouco, o Leandro to produzindo pra ele um clipe aqui em São Paulo de um rapper chamado Renan Samam e eu to produzindo pra eles, ali nas folgas faz, o Leandro acabou o filme, voltou pro Rio, tá rodando lá, depois volta pra cá. E aí a vida vai tocando, né, a gente vai levando isso dos 19 até agora, e já trabalho, vou fazer 42 anos agora em setembro que eu trabalho e nunca mudei de profissão, sempre foi isso, o tempo inteiro, o tempo inteiro ligada, a única coisa que eu não fiz relacionada foi rádio, mas muito longa, quer dizer, longa metragem, muitos comerciais, televisão, muitos programas, nossa, mãe! Fiz coisas, assim, bem bacanas, bem bacanas, vivi uma época linda aonde eu passei realmente, um grupo maravilhoso em Copacabana que chamava “Unidos por acaso”, éramos quase 70 pessoas, passeávamos juntos, tudo, foi outra fase também muito boa, dos 20, 21, 22, 23, com essas pessoas, todos pessoas sadias, entendeu. Final de ano, todo dia 31 a gente fechava em frente ao Bar Cabral, já na praia em Copacabana, a prefeitura cercava, a gente passava o ano novo ali com toda a família, todos faziam isso, como fazem até hoje, então a gente vivi ali, era um, ai, nossa, muito bom.
P/1 – Quais são os seus sonhos hoje?
R – Nego, olha só, você veja, né, eu pensei que eu fosse ficar casada com o Carlos pra sempre, infelizmente não deu certo por alguns motivos e eu sou sagitariana, sagitariano adora viajar, adora ta solto, e não foi fácil eu ter um casamento e manter 15 anos, entendeu, e também eu já me casar com quase 45, quando eu fui viver com o Carlos, e mandando no meu nariz, eu que decidia a minha vida, ajudei meus irmãos todos, então você ter um marido pra dar obrigação, dar: “Ai, vou fazer isso, fazer aquilo, não pode isso, pode aquilo”, é complicado, entendeu, e pra mim foi muito pela minha idade quando eu fui viver com ele. Mas eu pensava em viver casada com ele pra sempre e acabou que não deu, mas os meus planos realmente, eu to com 60, né, e agora eu virei funcionária da TV Cultura, que até então eu era pessoa jurídica e isso eu agradeço a Deus porque você como pessoa jurídica, eu dei a sorte também de ficar esse tempo todo na TV, que já estou, mas eu podia não ta, né, então eu fui freelancer muitos anos, né. Todo esse período de TV Globo, tudo era freelancer, eu não era funcionária mais quando eu voltei dos Estados Unidos, e daí eu digo que foi uma benção eu hoje ter uma carteira assinada, eu poder ter um plano de saúde, porque com a minha idade antes de eu ser funcionária eu já pagava quase, pra mim e pro meu marido, quase 700 reais, entendeu, de plano de saúde, não podia ter um monte de coisa, hoje eu tenho. Então eu penso em trabalhar mais dois, três anos e babado, eu já posso me aposentar, entendeu, e daí vou morar no Rio, que é isso que eu quero, e vou fazer projetos selecionados, que eu pego um projeto três meses, quatro meses e pronto, e depois fico sem trabalhar, entendeu, porque não, não vou dizer que eu joguei dinheiro pela janela, mas eu fiz tudo o que eu queria fazer na minha vida. Então eu não tenho um apartamento, então agora eu vou comprar um porque com a carteira assinada também a vida facilita, né, e é o que eu vou fazer agora, comprar um apartamento e estourando quatro anos, trabalhar mais esses quatro anos e depois viver no Rio, brincar com meus sobrinhos-netos, curtir, cada hora nasce um, entendeu, então tenho um monte de sobrinho que daqui a pouco vai dar filho aí, vai dar sobrinho. Então é isso o que eu penso e morar no Rio porque aí eu to perto de todo mundo, entendeu, meu irmão tem uma casa, um apartamento maravilhoso, os sobrinhos tão comprando casa, então a vida lá vai ser mais confortável, eu digo, porque o que eu sinto falta de lá é a praia, como eu sinto falta de poder andar no fim do dia, pegar uma bicicleta, ir na lagoa, aqui a gente não tem nem tempo pra isso, entendeu, acaba que não dá, o trânsito aqui é muito louco. Eu agora me separei, né, eu moro a duas praças da TV Cultura, eu já procurei um lugar exatamente pra eu poder ter essa qualidade de vida, eu vou a pé de manhã tomando o meu iogurte, comendo a minha banana, é isso porque senão é muito complicado e eu de verdade, querido, to cansada, viu. Eu viajei domingo, fui pra, eu e a Rita nos metemos de fazer caldinho na festa junina do nosso condomínio e quinta, sexta, sábado e domingo trabalhamos, sábado trabalhamos muito, aí domingo fui pra Serra Negra comer kibe de van, quase quatro horas de viagem porque para, vê futebol, vai, aí o hotel lá é grande, anda pra caramba, aí eu volto, domingo vou trabalhar outra vez. Então não dá mais o pique, sempre fui muito danada, eu viajei muito, conheço muitos países, tudo de viajar, não só, graças a Deus, pela minha profissão e graças a Deus também pelo meu trabalho, e o que eu quero agora é viajar, é isso o que eu quero, eu quero, adoro, sagitariano gosta disso, cada hora ta num canto, cada hora ta com a bolsinha arrumada já pra, então é isso o que eu imagino agora pra o futuro, entendeu.
P/1 – Vou fazer agora a última pergunta. Como foi contar a sua história pra gente?
R – Ai, gente, adorei, adorei, adorei porque lembrei muita coisa, pensei muita coisa pra esse meu livro, vocês não sabem, porque quando eu estive aqui pra visitar a primeira coisa que eu fiz, eu falei: “Eu vou me inscrever pra vir aqui falar da minha vida”, porque nós gravamos aqui o nosso programa, o núcleo de vídeo veio aqui, então, e desde aquele vídeo que a gente, que eu penso nisso, entendeu. E quando eu vim aqui visitar vocês eu falei: “Pô, é tudo, é isso que eu quero realmente”, lá atrás já tinha pensado, mas daí vai, envolve as coisas e faz uma coisa, faz outra e acaba esquecendo, esquecendo não, vai jogando pra frente, mas eu já tinha o maior interesse por esse espaço, já conhecia o espaço. Eu acho que é um trabalho maravilhoso que vocês fazem aqui porque eu gosto, eu já falei pra vocês que eu gosto de, ia muito pro cassino, eu adoro jogar em loteria, eu jogo quase todo dia, eu tenho um dinheiro reservado, que não é muito que eu não sou rica, pra jogar, e eu tenho certeza que eu vou ganhar. Então é uma outra coisa pra quando, daqui a quatro anos, eu fazer biografia, isso que eu quero dirigir na minha vida, se eu já tiver ainda condições, assim, de poder viajar, de poder não ta uma velha, a gente não sabe o dia de amanhã. Mas é uma coisa que eu quero fazer porque, porque a gente, hoje, eu com a minha idade, eu digo lá pro meu pessoal na TV que é tudo jovem, eu digo pra eles: “Gente, eu não sou a mais sabida, a vida me ensinou, eu não me formei em faculdade nenhuma”, eu quando fui tirar a minha DRT, que eu entreguei, porque a TV Cultura exigiu, senão eu não trabalhava lá. Quando eu cheguei no sindicato a mulher queria me dar sete DRTs, porque uma pessoa que chega com uma carteira profissional de 1972 até agora, o cara ela fica tudo, quer dizer, sendo freelancer, aí a cena humana, então eu podia ter sete DRTs e também não pagar pra ter ou não ter porque eu sou da época que não tinha essa formação, como muitos jornalistas não tem o seu registro, por quê? Porque se formou antes, foi o meu caso, entendeu, então essa coisa de você saber da história e nosso país, eu quis, graças a Deus, eu já falei, tive condições de conhecer países com histórias vivas, histórias vivas, histórias maravilhosas que o seu povo fala dela com orgulho, a gente aqui não tem isso, a gente aqui não tem isso, eu lamento profundamente. Eu chego nas escolas pra gravar, eu, tem hora que eu até paro, eu digo: “Vão me chamar de chata” porque eu dou cada, eu falo tanto, eu ensino até como fechar a garrafa pra não ocupar espaço, garrafa PET, porque essas crianças de hoje tem que saber isso, e isso aqui é o resgate da memória da gente, isso é de extrema importância nesse país que esquece a memório. O que que tá adiantando toda essa revolução que tão fazendo? Por que que eu agora tenho que pagar o filha da mãe que foi lá e me quebrou o, que me pichou o ônibus? Não concordo com o ônibus caro, não, que eu pago, agora não to pagando, mas tem três meses que eu não pago condução, mas se eu esqueço o meu cartãozinho em casa eu tenho que pagar porque os caras reclamam quando eu mostro a identidade, então o cara vai lá, me quebra a Paulista inteira, me quebra o ponto do ônibus, faz, não tá certo, a reivindicação, eu queria ir pra lá, agora, andar na Paulista tranquilamente, sem receber uma pedrada na minha cabeça, entendeu. Então é disso que eu reclamo, é disso que eu falo do Facebook, as coisas que eu reclamo no Face, ele é uma arma e eu vou entrar no Face agora falando, a de hoje, eu to gravando, então é tudo o que eu vejo durante o dia que me alegra ou que me entristece, entendeu, porque estamos um pouco perdidos. E o resgate da memória, o povo saber quem foi, o que foi que aconteceu nesse país, o porquê esse país é o que é, porque que temos analfabetos, só falando na memória, só contando a história, e tendo que ir pra escola, tendo que ser alfabetizado, tem que ser educado porque senão não vai dar jeito. A gente que viaja, que tem uma melhor vida, teve o melhorzinho na nossa vida, vê isso fora desse país, é tudo com muito respeito e nós aqui não temos, você vê, começa sábado a Copa das Confederações, olha a tragédia que tá essa nossa cidade, olha a tragédia que foi hoje de manhã com esse trem parado, entendeu. Então, nego, só na memória e botando na cabeça do jovem e botando na cabeça da criança o que é a memória do país que ele vive, ele tem que amar essa país porque senão vai tudo pro beleléu e não adiantou nada, vamos fechar a porta e tirar, esse vem, o outro fica, esse vem, e construir um novo Brasil. Certo, meu benzinho?
P/1 – Certo. Célia, muito obrigado.
R – Imagina, de nada.
Recolher