P1- Cido, bom dia. Obrigado por ter aceito o convite do Museu, da Fundação. Inicialmente, vou pedir para você repetir pra gente o seu nome, local e data de nascimento. R - OK. Eu me chamo José Aparecido Gonçalves, todo mundo me conhece como Cido, sou natural de Ipameri, estado de Goiás. P1 – Você poderia registrar pra gente o nome dos seus pais? R - Meu pai, José Gonçalves Paulino. Minha mãe, Maria Pedroso Gonçalves. P1 – Qual era a atividade profissional dos seus pais? R - Meu pai tinha fazenda, era fazendeiro. Minha mãe, do lar. Dentro da tradição das famílias goianas. P1 – Não fugia à regra? R - Não foge. P1 – Qual a origem da sua família? Ela sempre foi de Ipameri ou veio de algum lugar? R - De Ipameri. Sempre de Ipameri. P1 – Seus avós também? R - Meus avós, meus pais. P1 – Quantos irmãos? R - Três irmãos. P1 – Você poderia dizer o que cada um está fazendo por aí? R - Nós temos diferenças extremamente assim, visíveis. Eu tenho meu irmão mais velho que é, hoje, reformado do exército. Meu segundo irmão mexe com administração, e eu mexo com movimento social. P1 – Bem distinto. R - Extremamente distintos. A forma de ver e de lidar com a sociedade? P2 – Cido, quando você era adolescente, criança, tinha alguma influência pra você seguir alguma profissão, seguir algum caminho profissional? R - Eu acho que desde criança, eu tive uma inquietude muito grande em relação à realidade social econômica. Me incomodava muito a diferença entre as camadas sociais. Eu lembro de um fato interessante agora, com essa pergunta: quando eu tinha sete anos de idade, uma vizinha muito pobre, ela espancava muito os filhos. E numa dessas situações, eu, com sete anos, peguei o menino, depois de uma situação de espancamento, levei escondido da minha mãe para o médico mais bravo da cidade. O médico nos atendeu e depois nos levou pra casa com essa criança. Eu...
Continuar leituraP1- Cido, bom dia. Obrigado por ter aceito o convite do Museu, da Fundação. Inicialmente, vou pedir para você repetir pra gente o seu nome, local e data de nascimento. R - OK. Eu me chamo José Aparecido Gonçalves, todo mundo me conhece como Cido, sou natural de Ipameri, estado de Goiás. P1 – Você poderia registrar pra gente o nome dos seus pais? R - Meu pai, José Gonçalves Paulino. Minha mãe, Maria Pedroso Gonçalves. P1 – Qual era a atividade profissional dos seus pais? R - Meu pai tinha fazenda, era fazendeiro. Minha mãe, do lar. Dentro da tradição das famílias goianas. P1 – Não fugia à regra? R - Não foge. P1 – Qual a origem da sua família? Ela sempre foi de Ipameri ou veio de algum lugar? R - De Ipameri. Sempre de Ipameri. P1 – Seus avós também? R - Meus avós, meus pais. P1 – Quantos irmãos? R - Três irmãos. P1 – Você poderia dizer o que cada um está fazendo por aí? R - Nós temos diferenças extremamente assim, visíveis. Eu tenho meu irmão mais velho que é, hoje, reformado do exército. Meu segundo irmão mexe com administração, e eu mexo com movimento social. P1 – Bem distinto. R - Extremamente distintos. A forma de ver e de lidar com a sociedade? P2 – Cido, quando você era adolescente, criança, tinha alguma influência pra você seguir alguma profissão, seguir algum caminho profissional? R - Eu acho que desde criança, eu tive uma inquietude muito grande em relação à realidade social econômica. Me incomodava muito a diferença entre as camadas sociais. Eu lembro de um fato interessante agora, com essa pergunta: quando eu tinha sete anos de idade, uma vizinha muito pobre, ela espancava muito os filhos. E numa dessas situações, eu, com sete anos, peguei o menino, depois de uma situação de espancamento, levei escondido da minha mãe para o médico mais bravo da cidade. O médico nos atendeu e depois nos levou pra casa com essa criança. Eu sempre tive essa, sempre fui uma pessoa muito inquieta. Sempre movimentei muito, observei muito. Acho que isso. P2 – Tinha alguém em quem você se espelhava? R - Minha mãe sempre foi uma referência muito forte pra mim, de mulher forte. Eu perdi meu pai muito cedo. Quando eu perdi meu pai, eu tinha um ano e pouco de idade, não me lembro em nada dele. E aí eu acho que tive uma relação muito mais de perto com minha mãe. E ela sempre foi uma mulher muito forte. Casou pela segunda vez, mas ela meio que é a matriarca da família. E eu acho que sempre me espelhei nela. Minha mãe tinha objetivos claros, postura muito direta e estratégia muito definida pra poder resolver as questões de educação dos filhos, de limitar, de estabelecer limites. Ela sempre foi sempre como um certo mito pra mim, foi a grande inspiradora para o que eu sou hoje. P1 – E como que foi a infância em Ipameri? R - Muito simples. Uma cidade pequena, sem muitas alternativas. O máximo que eu consegui era brincar e estar na escola. No período de férias, minha casa tinha regras: se você fosse aprovado, poderia ir pra casa dos avós. Se não fosse aprovado, teria os três meses de férias em casa, sem poder sair. Então eu tive uma educação meio rígida. P1 – Como era o grupo de amigos, lá? Como era a diversão da turma da cidade? R - Na minha época, a gente brincava muito nas ruas, brincava de queimada; brincava de bete, que é aquela coisa de você botar uma bolinha pequena e atirar alguma coisa na bola e correr, e cruzar; piques. Bola nunca foi meu forte, nunca gostei muito desse tipo de esporte; brincadeiras entre amigos. P1 – Você comentou comigo que ficou em Ipameri até 1979. Você estudou lá o ensino médio, tudo. R - Estudei. P1 - Como que foi isso aí? R - Eu, com 15 anos, fiz meu primeiro enfrentamento familiar. Meus irmãos só começaram a trabalhar depois que terminaram o ensino médio. Eu, com 15 anos, resolvi que queria trabalhar. E fui trabalhar informalmente, num boteco, de vender verdura. Isso foi um negócio interessante que eu lembrei agora com a sua pergunta. E minha mãe ficou muito chateada, brigava muito, porque achava meio estranho ter um filho trabalhando. Mas pra mim foi uma experiência muito legal, porque eu aprendi a me manter. A não ficar dependendo da mesada de final de semana, mesada de final de mês. Eu tinha minha grana e fazia dela o que eu queria. Acho que foi um desafio muito interessante. Esse enfrentamento foi bom, porque me fez assumir, compreender essa coisa de se sustentar, de ter autonomia, de ter minha auto-suficiência garantida, reconhecendo que ela só vem a partir do trabalho. P1 – E Ipameri tem um quartel lá, bem grandão. Você chegou a servir, se apresentou por lá? R - Meu irmão mais velho, ele fez concurso pra sargento, depois seguiu carreira do exército. E nessa época você tinha duas opções: Ou fazia concursos, para o Banco do Brasil, que era a grande questão, ou fazia concurso para o Exército Brasileiro. E eu não fiz nem uma coisa, nem outra. Mas o exército era uma referência forte. Como meu irmão já estava na hierarquia do exército, eu consegui não servir o exército. Eu me utilizei dessa situação, porque não tinha nada a ver comigo. Achava aquilo um absurdo. E nessa época eu já começava a ler outras coisas, tinha outras referências. Eu me lembro que eu, na minha adolescência, o segundo marido da minha mãe, que também era do exército, com meu irmão, tinha ido pra aquela ação em Xambeuá, no norte de Goiás. E me lembro dos comentários de que eles estavam enfrentando os “comunistas que assassinavam os trabalhadores e as crianças”. Aquela história mesmo de que eram bandidos e comiam gente. Me lembro disso, mas não entendia muito o que isso significava. Meu irmão retornou antes do final dessa ação, porque ele foi contaminado, picado por um mosquito e teve que voltar. Meu padrasto continuou. Anos depois, quando eu me tornei militante numa proposta mais de esquerda é que eu entendi o que foi o Xambeuá enquanto espaço de resistência popular, de enfrentamento da ditadura militar. P1 – Depois que você termina a escola, o ensino médio, como que fica? R - Eu sempre fui muito de assumir desafios novos, nunca tive muitas raízes, assim. Então, eu acho que quando eu terminei o ensino médio, achei que Ipameri era pequeno pra mim. Eu queria uma outra experiência e aí resolvi que queria mudar pra Uberlândia, que queria estudar, trabalhar. Fui pra Uberlândia, mas cheguei e prestei um concurso pra Prefeitura Municipal de Uberlândia, e passei no concurso e não fui estudar. Porque eu tinha adquirido de uma certa forma minha autonomia financeira. Só voltei a estudar quando eu cheguei a um determinado momento de... Eu comecei como auxiliar de escritório, passei por várias etapas na Prefeitura de Belo Horizonte, quer dizer, Uberlândia, e cheguei à tesouraria da prefeitura. De repente perdeu o sentido. Eu larguei tudo e fui ser Frade Franciscano, morando numa periferia da cidade que não tinha água, não tinha luz, no meio de uma comunidade extremamente pobre, com um grupo de frades que vieram de Belo Horizonte pra Uberlândia e trouxeram essa experiência. Acho que eles conseguiram chamar a atenção da juventude pra olhar de maneira diferenciada pra essa realidade de miséria e de pobreza. Eu conheci eles na igreja em que eu participava. Da igreja eu participava, eu fiz adesão à vida franciscana e foi uma experiência muito bacana, muito bonita. Acho que me fez ser o que eu sou hoje. P1 – Só pra registrar, você vai pra Uberlândia em 79? R - Isso. 79. P1 – E fica na Prefeitura trabalhando até 80...? R - 83. Aí saio da prefeitura e entro na ordem franciscana. Vou pra uma cidade do interior, de 20 mil habitantes, onde a base do trabalho eram os assalariados do campo, trabalhando no corte da cana ou na colheita do algodão. Eu fui dar aula numa escola pública. Depois, dando aula nessa escola pública, conhecendo os filhos dos bóias-frias, conhecendo os bóias-frias, eu experimentei o trabalho de bóia-fria por um tempo. E experimentando o trabalho de bóia fria eu comecei um trabalho de organização desses trabalhadores rurais, assalariados do campo. Começamos a perceber que eles não tinham apoio nenhum sindical, do sindicato da época. Tinha uma mesma pessoa que já estava no sindicato dos trabalhadores há 25 anos. Nós resolvemos organizar esses trabalhadores, criar uma oposição sindical. Eles conseguiram, numa segunda tentativa de um processo eleitoral de nível local, ganhar um sindicato que estava há 25 anos controlado por uma mesma pessoa e que resguardava muito mais os interesses dos grandes produtores do que dos assalariados do campo. P1 – Como é essa experiência? Você sai de casa pra trabalhar em Uberlândia e de repente vira frade. Pode contar um pouco pra gente? Como foi esta experiência religiosa? R - Minha experiência religiosa, acho que ela veio muito porque eu conheci esses frades e me identifiquei com o projeto de vida deles, que era abrir mão de uma convivência bem estruturada e experimentar o chão mesmo do povão. Aquilo me chamava muito à atenção, porque tinha frade era engenheiro, tinha frade que era economista. Chegaram de Belo Horizonte e deixaram tudo mesmo. Vivendo a experiência da vida franciscana mesmo, de hábito, no meio do povão, numa comunidade que a gente não asfalto, não tínhamos água, não tínhamos luz. Experimentando o que era vida do povão. E isso me chamava a atenção. Eu ia pra casa desses frades, o povo chegava, rezava junto e iam pras suas casas. E eles irradiavam uma alegria muito grande, vivendo numa condição de pobreza muito grande. Isso me chamou a atenção. Eu fui percebendo que a minha luta, minha busca de galgar espaço profissional, de poder, foi perdendo o sentido. E eu descobri na simplicidade um sentido muito mais profundo da minha existência. Imagina: eu comecei como auxiliar administrativo da prefeitura de Uberlândia e de repente cheguei à tesouraria dessa mesma prefeitura. Largo tudo isso e vou viver numa periferia que não tinha nada. Então, isso apontou pra mim uma descoberta enorme de um novo sentido pra minha própria vida. Claro que minha família ficou frustrada, desesperada com essa tomada de decisão. Porque todo mundo gosta disso. Você começa, vai galgando seus espaços e quando chega lá no top tem que praticamente consolidar sua vida profissional e econômica. E quando eu cheguei a isso, abri mão de tudo. Aí minha mãe chamou meus tios, se reuniram os tios, meus irmãos e eu: “tudo bem. Vocês ficam aí reunidos, mas eu vou ser frade franciscano”. E fui. (RISOS) P1 – Você ficou na ordem até que ano, nessa experiência? R - Fiquei na ordem até 1989. Os dados, eu não tenho, mas é mais ou menos isso. Na ordem foi uma experiência muito interessante, porque a ordem franciscana tinha a sua origem no sul da Itália, em Salerno. E os frades vieram pro Brasil, pro Triângulo Mineiro com uma visão teológica muito européia. De repente chegou pra Uberlândia alguns jovens de Belo Horizonte que tinham uma formação e uma militância política muito interessante e foram acolhidos dentro dessa congregação e começaram a revolucionar a prática desses frades. Alguns aderiram e outros não. E aí, nessa minha experiência já de vida franciscana, nós começamos a cobrar da ordem franciscana de que a espiritualidade franciscana nos convocava a cada vez mais abrir mão das estruturas paroquiais e assumir uma convivência ao lado do povo pobre. E alguns frades diziam que isso não era papel do religioso. O religioso tinha que rezar para que as coisas pudessem melhorar, buscar através da espiritualidade um ideal de vida franciscana. E nós dizíamos que nós nos fortalecíamos dentro desse ideal de vida, à medida que a gente sentia cada vez mais próximo de nós essa realidade de pobreza, de luta por qualidade de vida, de luta por direitos. Isso nos fazia mais fortes na vida franciscana. Chegou um momento em que os frades também disseram pra nós: “vocês tem que fazer uma opção entre a vida religiosa e a militância política”. E a gente achava que aquilo não era uma militância política. Eu já estava trabalhando com os assalariados na oposição sindical. Eu saía com o carro da congregação à noite, com os sem terras e a gente vistoriava as fazendas da região, vendo se tinha alguma fazenda passiva de ser ocupada por quem não tinha terra. Descobrimos que tinha, fizemos uma primeira ocupação de terra no pontal do Triângulo. Foi extremamente violenta, porque naquele mesmo período estava se criando em Uberlândia a UDR, que era a união ruralista, onde se reuniam os mais conservadores proprietários de terra e criadores de gado. Em meio a isso, nós conseguimos fazer a ocupação. Fomos extremamente reprimidos pela tropa de choque, com jagunços de fazendeiros. E eu, frade, lá, em meio a tudo isso. E aí congregação achava que nós não podíamos, que estávamos fazendo luta política. E a gente achava que nós estávamos, na verdade, conquistando um direito elementar pra mudança de vida das pessoas. Imagina a vida de um assalariado do campo, um bóia-fria, que levantava às três da manhã, preparava sua comida. Às cinco da manhã já estavam subindo nos caminhões sem nenhuma proteção. Retornavam pra casa no final da tarde. Eu tinha alunos que trabalhavam o dia inteiro e quando chegavam na sala de aula dormiam. E eu achava que tinham mais é que dormir mesmo, porque depois de uma vida dura como aquela. E a gente começou a discutir que caminhos pra mudar essa realidade. E aí a gente descobriu o seguinte: ou eles têm a propriedade da terra ou vão continuar a vida inteira nessa condição. E começamos a apoiá-los pra isso. Chegou um momento em que a ordem nos impôs uma escolha: ou vocês ficam com a ordem franciscana ou vocês ficam com o movimento social. Aí, eu novamente recomeço do nada. Eu opto por ficar com o movimento social e abro mão da vida franciscana. Mas mantenho uma relação muito boa com os frades até hoje. Nós temos uma relação de amizade muito grande. E aí eu assumi nessa época o trabalho da comissão pastoral da terra. P1 – Dentro da própria igreja você conseguiu um espaço? R - Sim, sem dúvida. A gente já tinha conseguido esse espaço e o fato de deixar de ser religioso, até porque enquanto religioso nós tínhamos construído uma comunidade que não era uma comunidade de religiosos. Nós tínhamos conosco vários estudantes de direito, estudantes de agronomia, que acreditavam na causa e já apoiavam. Eu fui pertencer a essa comunidade de leigos e continuei o trabalho. Não mais como frade, mas coordenando a comissão pastoral da terra daquela região. Fazendo a organização dos cortadores de cana, dos apanhadores de café e de algodão. E ao mesmo tempo organizando o movimento dos sem terra pras ocupações, que nós fizemos várias naquela região. P1 – Como foi sair da vida religiosa? R - Eu acho que pra mim foi um momento difícil, porque quando eu optei por abrir mão da minha vida profissional com uma boa remuneração, quando eu já estava à beira da tesouraria da Prefeitura de Uberlândia, eu imaginava: vou viver agora com muita simplicidade, cada vez mais próximo da vida dos pobres, interpretando uma teologia que quer a liberdade, a libertação das pessoas. E de repente a instituição me veta. Num primeiro momento foi meio que frustrante. Mas ao mesmo tempo, eu senti que a minha saída acabou provocando um debate profundo na congregação. Que era necessário viver a vida religiosa, franciscana, num contexto de América Latina, de Brasil, considerando a trajetória dos filhos dessa terra. Então, eu acho que foi uma contribuição. Minha opção de saída acabou mexendo também com a estrutura da vida religiosa, que tinha uma visão muito pautada pra dentro da instituição. E até hoje tem frades que continuam trabalhando com os sem-terra. Então, acho que eu fiz um papel. P2 – Vamos fazer um salto, porque a gente quer focar mais a questão da Asmare. Como se dá sua ida pra Belo Horizonte, como se dá esse envolvimento com o movimento social de lá e o começo da Asmare? R - Quando eu trabalhava com a CPT, num desses processos de ocupação de terra, nós tivemos que vir pra Brasília, fazer uma ocupação do Congresso Nacional, pra ter a garantia da liberação da terra. Aí eu conheci, fomos atrás da Cáritas brasileira pra nos apoiar nesse processo de ocupação daquela Praça dos Três Poderes. Na época, eu conheci o Padre Marino, que era o coordenador nacional da Cáritas e ele se aproximou muito de nós. Todas as vezes que nós vínhamos com o movimento à Brasília, a Cáritas era a nossa grande parceira. E Padre Marino me convidou, numa dessas minhas vindas pra Brasília, pra criar o regional da Cáritas Brasileira em Minas Gerais e a sede seria Belo Horizonte. Assim, eu fui pra Belo Horizonte, saí da CPT, fui trabalhar na Cáritas Brasileira. Chegando em Belo Horizonte, conheci uma religiosa, que até hoje nós trabalhamos muito juntos, Irmã Cristina Bove, que fazia um trabalho muito interessante com a população de rua e os catadores de materiais recicláveis, rompendo com aquela visão muito conservadora entorno dessa população, de que eram pessoas mendigas, marginais, lixeiros. Elas olhavam pra aquelas pessoas como pessoas que prestavam um trabalho relevante pra comunidade, pro Poder Público. Mas que não tinham nenhum reconhecimento. E era necessário fazer alguma coisa pra que elas saíssem dessa situação de mendicância e tivessem os seus direitos reconhecidos. E foi aí que eu me aproximei da realidade tanto dos moradores de rua, quanto dos catadores de Belo Horizonte. Num primeiro momento, eu fiquei muito assustado, porque você viver num país como o Brasil, num estado como Minas Gerais, numa capital como Belo Horizonte, e perceber que as pessoas sobreviviam nas marquises, que as pessoas sobreviviam dos restos que a sociedade produzia. E tratando da mesma forma que a sociedade tratava os rejeitos, também tratava aquelas pessoas. Isso me assustou muito. E a gente via no interior dos catadores e dos moradores de rua uma promiscuidade muito grande, porque a vida já não tinha mais sentido. Nós percebemos ali que o lixo e as pessoas eram tratados da mesma forma. E aí eu me senti desafiado a mais uma vez a compreender melhor aquele mundo. Que submundo era aquele? E assim eu acabei estabelecendo uma relação com os catadores. P2 – E como se desenvolve o processo de trabalhar com eles? R - Aí foi muito interessante. Porque essas religiosas também, elas não tinham uma intenção muito grande de fazer o trabalho voltado pra dentro da instituição religiosa. Elas começavam a pegar pessoas que eram sensíveis a essa causa e discutiam a realidade com essas pessoas e fazia abordagem de rua. Mas, nada muito formal. Tudo muito no campo da informalidade. Elas diziam: “nós temos que nos tornar amigos dessas pessoas”, porque essas pessoas já perderam muito e qualquer um que tenta se aproximar, elas fogem, porque têm medo de perder o que sobrou, que é o lixo. P2 – Pouco. R - O resto. E foi muito interessante, porque nós íamos pra rua e, às vezes, a gente chegava perto de um ponto onde tinha uma turma de catadores que já tinham coletado o material e já estavam fazendo a triagem, a gente chegava e começávamos a triar com eles aqueles materiais. Perguntar como era a vida, o que eles faziam. A gente percebia um certo pânico nos catadores: “quem são essas pessoas?” “Por que estão aqui?” “Por que estão mexendo nas nossas coisas?” Mas com o tempo a gente foi conquistando, firmando laços de amizade, conquistando essas pessoas. E depois de um ano, dois anos de intervenção, nós conseguimos organizar um núcleo de catadores, na região central de Belo Horizonte, no Hipercentro. E em maio de 1990, depois de uma série de mobilizações, de enfrentamentos, nós fundamos a Asmare. P2 – E como se deu esse processo de criação da Asmare? R - A Asmare foi fundada com 20 catadores, depois de muita... A pergunta é muito interessante, porque me remeteu a um fato. Nesse período, a prefeitura tinha realizado uma dessas operações higienizadoras, de limpar o centro da cidade. E retirou todos os moradores de rua, todos os catadores de papel dessa região do Hipercentro. Um dia nós chegamos e não tinha ninguém. E nós descemos à procura das pessoas. E encontramos os catadores na via expressa. E descobrimos que ao lado da via expressa tinha uma área que pertencia à Rede Ferroviária. Nós entramos nessa área com os catadores e constituímos ali um núcleo de resistência. E hoje é a sede da Asmare. E desse núcleo de resistência, nós começamos a fazer abordagem de rua e levar esses catadores para este espaço de repente, quando a sociedade percebeu, o poder público percebeu, nós tínhamos ali uma turma enorme de catadores num processo de organização. E que já estavam ocupando aquela área como um espaço de trabalho e de moradia. Porque até então eles sobreviviam nas malocas, triando e morando. P1 – E como que é a vida do catador, o que significa ser um catador para a gente entender melhor? R - O catador, sobre a minha ótica, sobre o meu olhar, significa o sujeito que perdeu tudo, mas que tem uma capacidade muito grande de resistir, um amor muito grande pela vida e que foi capaz de transformar aquilo que a sociedade descarta e joga fora num instrumento de preservação da própria vida. E ele instituiu um valor econômico sobre aquilo e ao mesmo momento ele acabou instituiu outros valores que hoje a sociedade tem clareza que preserva a vida de todos nós. Mas pra mim o catador é essa figura que passou por um processo de perda total e que transformou o lixo num instrumento de defesa da própria vida, na busca de constituir uma possibilidade de continuar sobrevivendo. Pra mim é exatamente isso. E é muito interessante a gente perceber que os catadores, eles não tinham, até essa época, nenhuma consciência da importância do trabalho que eles faziam. Tanto é que mesmo fazendo esse trabalho de alta significância, de relevância muito grande tanto pro poder público quanto pra sociedade, eles aceitavam as intervenções violentas. E cada vez eles fugiam para cada vez mais distante do espaço urbano. O que nós conseguimos fazer foi mostrar pra eles a importância do trabalho. Eles resgatarem a auto-estima primeiro, depois resgatar a cidadania e perceber que tinham direitos... P1 – Que eles faziam parte.. R - Sim, os catadores já faziam parte nesta época. Que eles tinham direitos, que o trabalho que eles faziam provocava uma economia significante aos cofres públicos, e, relação ao custo de pessoal, ao custo de infra-estrutura, de caminhões de manutenção, essas coisas todas. Portanto, eles tinham direitos que deveriam ser negociados com a Prefeitura de Belo Horizonte. Assim, nós começamos um processo de organização, as negociações começaram e nessa área que eles ocuparam, nós conseguimos fazer com que em 1992 a prefeitura construísse o primeiro galpão da Asmare. P1 – E o que é Asmare? Como ela surge? P2 – O que quer dizer Asmare? R - Asmare, na verdade é uma sigla que veio como conseqüência de uma articulação entre os catadores de Belo Horizonte e a Copamare de São Paulo. São Paulo é uma experiência que precedeu a Asmare. Essas mesmas religiosas que trabalhavam em Belo Horizonte, tinham um outro núcleo delas que trabalharam com a formação da Copamare de São Paulo. Os catadores de São Paulo vieram nos ajudar, mostrar que era possível viver de forma diferente do que eles viviam. E no processo de discussão de como seria a organização, os catadores de Belo Horizonte definiram que gostariam de ter uma associação. E aí, nós fizemos um concurso de nomes pra saber como essa associação ia chamar. Eles deram o nome de Asmare. A sigla não tem muito a ver com o nome que é Associação dos Catadores de Papel e Papelão e Material Reaproveitável de Belo Horizonte, isto é a Asmare P1 – Como surge então? Você falou assim, mas como é que surge de fato a Asmare como instituição? R - Ela surge com 20 catadores e a partir do momento em que esses catadores conquistam esse espaço e estabelecem uma nova forma de relacionamento com o poder público, a Asmare começa a ter uma adesão significativa de outros catadores que começam a perceber que saindo dessa situação de fragmentos humanos na cidade e se integrando, eles, enquanto grupo, passam a ter uma visibilidade maior. Essa visibilidade provocava conquista significativa. Eles começam a sair da mão dos atravessadores que até então os tratavam como escravos. Os catadores, na verdade, ainda são tratados na perspectiva do trabalho escravo. Em muitos lugares, o atravessador retém os documentos do catador e oferece um carrinho pra ele coletar os materiais na rua, mas impõe sobre os catadores a necessidade de entregar todo material naquele espaço. E quem determina quanto que vale o trabalho dele é quem fornece o carrinho. O catador, na sua grande maioria, nunca mais consegue obter de volta os seus documentos pessoais. E sem isso, eles ficam totalmente controlados pelos atravessadores. Essa é uma realidade nacional. O surgimento da Asmare em Belo Horizonte começa a mostrar pros catadores que tem uma outra lógica possível, que teria uma outra lógica possível, que é a lógica da organização, do resgate da auto-estima, da valorização profissional. E aí eles conseguem conquistar muitas coisas interessantes. Primeiro foi o galpão, e romper com essas ações higienizadoras da prefeitura. Em 93, com a frente BH Popular, e o Patrus enquanto prefeito, então a Superintendência de Limpeza Urbana convoca os catadores pra fazer uma discussão. Eles saem da condição de perseguidos e passam a condição de aliados da prefeitura. Amplia a área da Asmare, estabelece um convênio financeiro pra manutenção dessa infra-estrutura. A Asmare dá um salto pra quase 120 associados. Depois, nos quatro anos de gestão ela chega a quase 300 associados. Ela amplia também, e num certo momento ela começa a se elitizar, começa a se sentir muito poderosa e aí nós tivemos que fazer todo um trabalho de resgate pra ela se manter comprometida com a luta do povo da rua. Nós desenvolvemos um projeto de pesquisa em Belo Horizonte pra ver quais as possibilidades que nós teríamos concretamente de diversificar as ações da associação. Foi um fato muito interessante. Nós descobrimos que Belo Horizonte tem uma grande vida noturna. As pessoas saem do trabalho a partir das quatro, seis da tarde e vão pra happy hour, projetos de fim de tarde, botecos, tomar cervejinha e comer torresmo com mandioca, carne de sol e essas coisas todas. E a pesquisa apontou que nós poderíamos montar esse tipo de negócio. E nós nos perguntávamos: Como montar um espaço desses com uma população de rua, que tem muitas vezes como instrumento de resistência a pinga ou a droga? Mas como nós nunca olhamos de forma moral pra essa situação, a gente sempre entendeu que a pinga e a droga na rua era um instrumento de resistência e é compartilhada entre todos que vivem nessa dureza de ter a marquise como seu espaço de trabalho e de moradia. Muitas vezes a pinga na rua, ou a dependência ou a droga, ela alivia o sujeito. Faz com que o sujeito dê conta de sobreviver a uma situação de tanta exclusão. E ela é como que uma hóstia consagrada: todos que fazem parte daquele núcleo compartilham. Se tem uma garrafinha só, aquele que tem a garrafinha compartilha dela com todos os seus companheiros de maloca. Nós começamos a perceber o sentido místico mesmo e até de espiritualidade daquela partilha. E foi muito interessante que nós resolvemos: “então, vamos começar a diversificar as ações da Asmare.” Então nos resolvemos assim: “Vamos montar uma casa de shows, onde os moradores de rua capacitados, vão trabalhar de garçom, de copeiros”. Aí criamos o Bar Reciclo. Foi uma experiência super interessante. Nós montamos um galpão com uma decoração toda feita de materiais recicláveis. Desde o portão de entrada até todo interior desse espaço. E a cidade inteira começou a querer ver que bar era esse. E a gente começou também a trabalhar com o conceito do samba, porque o batuque sempre foi um instrumento de resistência do povo da rua. Sempre debaixo de um viaduto você tem a pinga e o batuque armado, todas as tardes ou todo final de semana. Então, valorizando a cultura do samba, nós construímos um galpão onde a base da arte seria a cultura musical do samba. E em torno do samba, nós teríamos a cidade observando que nem tudo o que ela trata como lixo é lixo. E em torno dos materiais recicláveis tinha uma população inteira que sobrevivia disso. Então, o Reciclo foi também um espaço de reconstituição do imaginário social em torno do lixo e ele funcionou como um espaço publicitário. Hoje o Reciclo é um point da vida noturna de Belo Horizonte, nós recebemos um prêmio da Revista Veja no ano passado regional como a melhor casa de música ao vivo. Nós temos um público hoje na casa de quarta, quinta e sexta-feira que vai de 400 a 520 pessoas. O público é a classe média alta de Belo Horizonte, são universitários a base de público da nossa casa. Num primeiro momento os nossos garçons terminavam a noite chapados, quer dizer, os restos que sobravam, eles... E nós fomos tentando entender que era muito fácil colocá-los pra fora, mas era necessário mostrar pra eles que ali era o espaço do resgate da dignidade. Era o espaço da oportunidade de uma forma de sobreviver no mundo. Tivemos a paciência de deixá-los permanecer no espaço mesmo com todas as dificuldades. Hoje nós temos o Antonio, que é o garçom mais velho da casa, o que nos deu mais trabalho, ele trabalha cantando a noite toda e sem colocar uma dose de qualquer coisa de álcool na boca. E todos. Nós temos um chefe de cozinha especializada, um maitré de salão e toda turma que funciona na casa são de ex-moradores de rua, numa relação de extrema fraternidade com o público da casa. Todo mundo que vai lá sabe que a casa pertence a Asmare. E ela está numa região que não é a região nobre da cidade, que não tem outras casas de diversão. P2 – Onde? R - Fica no Barro Preto, em frente a Asmare. Então as pessoas saem da zona sul, descem pra Barro Preto pra freqüentar a casa de show Bar Reciclo. E agora nós estamos inaugurando, possivelmente até o final do ano, na zona sul o Reciclo 2. Que está levando a experiência da população de rua pra um trabalho de troca com a zona privilegiada da cidade. São formas que nós encontramos de romper como preconceito. Acho que a sociedade está cansada de ser chamada pra reuniões, pra seminários pra debates. Nós percebemos que a partir de um espaço de prazer, você poderia estabelecer uma rede enorme de apoiadores a essa causa. E foi o que aconteceu. P1 – Os freqüentadores se vinculam de alguma maneira. R - Hoje, o administrador, é um jovem recém-formado que começou a freqüentar o Reciclo e que por trás do reciclo tinha uma causa. Hoje ele está lá administrando o Reciclo com os jovens, filhos dos catadores. Nós temos o produtor, que também é um jovem que começou freqüentado a casa e que hoje está lá fazendo a produção da arte que sustenta o bar, com os jovens filhos dos catadores, formando Djs, essa coisa toda, pra animação dos shows da casa. Então, por trás do Bar Reciclo, hoje nós temos um grupo enorme de agentes voluntários que respaldam esse trabalho com os catadores e os ex-moradores de rua. P2 – Me fala uma coisa, Cido. Em relação à conscientização do papel deles como catadores na questão da preservação do meio ambiente. Como que fica? R - Então, hoje, os catadores, eles têm uma visão muito clara do papel deles. Acho que a Asmare conseguiu proporcionar isso. Eles sabem da importância econômica do trabalho que eles prestam. Qualquer catador sabe que 50 quilos de papel preserva a vida de uma árvore e ele fala isso com a auto-estima muito de pé, eles têm muito orgulho de falar isso. E hoje eles têm uma relação muito forte com a comunidade, porque dão conta de fazer esse diálogo com a comunidade. Tanto é que em torno da Asmare, conquistado pelos próprios catadores, nós temos uma média de 9.000 doadores. Que vai desde condomínios, escolas, passando por grandes empresas. Nós temos núcleo de catadores hoje trabalhando dentro de multinacionais, fazendo a coleta seletiva. O material já sai de lá todo prensadinho direto pra ser comercializado. Eles têm acesso. Eles conquistaram uma nova forma de relação a partir do trabalho deles. P2 – Dessa conscientização. R - É um negócio muito interessante. Mas, a sociedade conduz o sujeito a um processo tão violento, que de repente ele se sente meio que bicho humano num ambiente urbano. E eu estou falando isso porque há umas duas semanas, eu vi um depoimento interessante... P2 – A gente estava falando da questão da exclusão. O que leva uma pessoa a ir viver na rua? Quais são os laços que se rompem? R - Nós observamos uma variedade de motivações ou de desmotivações que as pessoas vivem pra poder chegar às ruas. Mas na sua grande maioria, são as pessoas que passam por um processo de perda total. E a última coisa que eles perdem é o espaço, seu habitat e a rua acaba virando esse habitat. Mas é muito comum as pessoas que vêm pra Belo Horizonte com aquele ideal de que na cidade grande vai ter uma vida melhor. E quando chegam na rodoviária, quando vão atravessar a rua da rodoviária, eles sofrem o primeiro assalto, perdem a sua documentação e dali mesmo já começam a vida na rua. E isso não tem retorno. É uma situação. As pessoas vêm com um sonho muito grande de uma vida melhor e deparam com uma vida muito mais difícil do que a vida vivida no interior. Outros que a família mesmo não deu conta de conviver, são dependentes químicos, e passou por um processo de exclusão familiar. Outros que, às vezes, vêm para Belo Horizonte pra trabalhar durante a semana e retornar nos finais de semana. E que depois não dão conta mais de retornar, acabam assimilando essa cultura da própria rua. E tem um elemento muito importante, que eu acho, que os catadores colocam, moradores de rua, que é que a rua tem um espaço de muita dureza, muita frieza. Mas a rua permite ao sujeito que ele conquiste algo que a sociedade não permite que é a liberdade de escolha. Ele é livre entre aspas, mas tem essa liberdade de não viver sob o controle do processo produtivo, de não viver sob o controle da família. Isso é muito interessante. Tanto é que nas experiências de trabalho dos catadores organizados, se nós não tivermos a abertura de valorizar a tecnologia por eles apropriada e quisermos impor o nosso modelo no processo produtivo, todo mundo vai embora das estruturas. Nós temos catador dentro da Asmare que viveu a vida inteira puxando carrinho descalço na rua e que se você for colocar um equipamento de proteção ao sujeito pra gerar uma qualidade melhor de trabalho, você expulsa esse sujeito do processo de trabalho. Imagina um sujeito que trabalhou descalço por mais de 20 anos, você vai colocar uma bota pra proteger o pé desse sujeito, você reprime esse sujeito e ele não dá conta nem de andar. Então a gente tem que dar conta de observar essas diferenças todas e essa trajetória toda, até pra você não excluir e reprimir esse sujeito de uma possibilidade que antes da nossa chegada ele já tinha conquistado. E o que nós conseguimos fazer foi qualificar. Então o que eu acho que o que eu estava dizendo e que agora me lembrei é que a sociedade vai impondo sobre uma camada social um processo de exclusão tão grande, que de repente o lixo e essas pessoas têm o mesmo significado pra sociedade. E isso a gente observa de que maneira? Quando nós somos convidados – porque nós estamos trabalhando em vários municípios – e num primeiro momento quando o convite vem do gestor público, eles nos convidam pra implantar um programa de coleta seletiva pra gerar trabalho e renda pra desempregados. Aí nós perguntamos: “mas não tem catador na sua cidade?” “Não, aqui não tem catador”. E quando nós chegamos vemos catadores na rua, no lixão. Você começa a observar, a situação de exclusão é tão grande em cima dessas pessoas que elas não são nem percebidas. E aí você tem que fazer todo um trabalho de sensibilização pra que esse direito não seja transferido pra outros. Tem que fazer todo um processo com o gestor público, com a comunidade pra valorizar e a gente vai mudando essa realidade. P2 – E a conscientização com a pessoa que está do outro lado, com o consumidor que descarta as coisas? Você está falando e me veio o filme Ilha das Flores, que acho que pra uma classe mais culta circulou muito esse filme, criando uma conscientização. Como é essa conscientização pro outro lado da rua e do lixo? R - Eu acho que, na minha experiência de trabalho com os catadores, eu acho que a imagem do catador, do morador de rua, na medida em que ele resgata sua auto-estima, que ele começa a perceber a importância do que ele faz, ele consegue tocar no coração da comunidade. Tanto é que as coletas seletivas, quando elas são feitas instituição: pelo estado, prefeituras, elas não funcionam, porque a sociedade não acredita. Quando você faz uma coleta seletiva incorporando os catadores e fazendo do catador o agente mobilizador, a cidade inteira participa. Porque ela vê um significado no gesto de separar o lixo daquilo que não é lixo. É o gesto de ajudar o outro a crescer. Porque ao mesmo tempo que a sociedade não tem tempo de olhar para o que está em volta, até porque hoje todos nós temos que ter um ou dois trabalhos pra garantir a nossa sobrevivência. Muitas vezes a gente nem consegue perceber que do nosso lado tem pessoas numa situação muito pior que a nossa, porque vivemos num corre-corre, no desespero que o ambiente urbano coloca sobre nós. Ao mesmo tempo que essa comunidade é tocada, e esse toque é dado de maneira subjetiva, é dado no coração dela, ela começa a dar um sentido de separar o lixo do que não é lixo. É o sentido de combater a marginalidade e a violência urbana. Hoje nós temos na Asmare pessoas que, se não tivesse a Asmare, possivelmente estariam na rua assaltando relógios de qualquer um transeunte pra garantir a sua sobrevivência. Entre o seu relógio e a garantia do almoço dele, o que é mais importante? A resposta é muito óbvia pra todos nós. Acho que isso é muito interessante. Há pouco tempo atrás, uma dessas pessoas que trabalham no Fórum, como que chama, Oficial de Justiça, ela passou no bar à noite e fez um depoimento muito interessante numa conversa informal conosco. Ela disse que a Asmare está ali há 16 anos e que ela trabalha naquela região há 30 anos, vai aposentar agora. E ela consegue observar nitidamente que desde o processo de criação da Asmare até agora, quanto que a Asmare contribuiu pra combater a violência naquela região. E que ela hoje transita ali sem medo nenhum e que antigamente tinha muito medo de transitar naquela região. Percebe isso? Então muitas vezes o que as pessoas não têm é oportunidade. Se elas não têm oportunidade, o mínimo que elas têm pra poder se garantir elas têm que buscar. Isso é muito interessante e acho que é um dado bem bacana. P1 – Quantas pessoas trabalham hoje na Asmare? R - A Asmare hoje tem 250 associados. Entre esses associados, nós temos os catadores tradicionais, nós temos ex-moradores de rua, que fazem a triagem da coleta mecanizada, ex-moradores de rua que trabalham nas oficinas de reciclagem artesanal e nós temos ex-moradores de rua que trabalham na casa de shows, no Bar Reciclo. P1 – Você falou da casa de show que é uma das atividades culturais da Asmare. E também tem o Festival Lixo e Cidadania. Como que é isso? R - A Asmare ela tem uma relação, ela virou um projeto. A Asmare não é um projeto dos catadores. A Asmare é um projeto da cidade de Belo Horizonte, porque a Asmare conseguiu estabelecer com a comunidade uma forma prazerosa de discutir uma questão que ninguém gosta de discutir que é a questão do lixo. Lixo é uma coisa que a partir do momento em que eu coloco na porta da minha casa, não querem nem saber o que acontece depois. E o fato da Asmare existir e fazer teatro, fazer batucada, fazer carnaval, fazer festival, fez a sociedade de Belo Horizonte perceber que o lixo tem que ser tratado de outra forma. Então a Asmare foi um instrumento fortíssimo na criação de uma nova consciência na geração dos resíduos. Não no sentido apelativo, ou fazendo uma apologia ao consumismo. A Asmare sempre chama a atenção para a política dos três Rs: nós podemos reutilizar muito mais, reaproveitar muito mais, pra depois chegar à reciclagem na coleta seletiva. E a cidade tem essa consciência hoje. A Asmare tem uma rede de 9000 pessoas e nessa rede tem pessoas que colocam o reciclável dentro do carro e fazem questão de levar na Asmare. Nós temos condomínios que o síndico organiza o condomínio inteiro e o teatro da Asmare vai lá, discute com os servidores com a comunidade toda que vive lá, e dá um sentido para a coleta seletiva e o condomínio passa a zelar por esse trabalho, porque ele sabe que destino que ele vai ter. Isso também acontece em grandes empresas, e por aí vai. Então eu acho que o grande trabalho que a Asmare fez foi estabelecer uma nova forma de diálogo com a coletividade. Onde o prazer faz parte também dessa participação. A Asmare não faz reuniões, não faz grandes seminários. Faz teatro, festival, a Asmare faz mobilização na rua, faz carnaval de rua e a Asmare com isso criou uma nova consciência ecológica na cidade de Belo Horizonte. E no estado, talvez no país. P2 – Está ampliando. Eu ia falar dessa ampliação. Como surgiu a oportunidade de participar do prêmio de tecnologia social da Fundação Banco do Brasil? R - Então, a Fundação Banco do Brasil, eu tenho observado, nós conhecemos a Fundação já há algum tempo, mas nesses últimos quatro anos a Fundação tem exercido um papel muito interessante no fortalecimento dessas experiências de tecnologias populares, que ela chama de tecnologia social. De valorização. E que essa valorização tem propiciado incremento também dessas possibilidades. Então a Fundação Banco do Brasil fez um trabalho de levantamento da experiência da Asmare e percebeu que ali tinha uma tecnologia altamente sustentável e nos convidou a sistematizar nossa metodologia pra que ela pudesse se disseminar com mais velocidade em Minas Gerais e no país. Foi aí que começou nosso contato com a Fundação Banco do Brasil. Mas daí surgiu um elemento muito interessante nessa nossa parceria com a Fundação que foi o desafio de romper um novo limite. Porque até então nós acreditávamos que os catadores poderiam coletar, triar o seu material e abastecer a indústria recicladora. E essa experiência das tecnologias sociais da Fundação Banco do Brasil trabalha com conceito de domínio de cadeias produtivas. E aí veio a Fundação com essa proposta de ampliar nossa parceria, pra que nós pudéssemos construir com os catadores de material recicláveis, organizados num sistema de rede de associações e cooperativas, a possibilidade de eles terem o domínio da cadeia produtiva no setor de reciclagem. E nós estamos em fase, numa parceria com a Fundação Banco do Brasil, de colocar em operação uma unidade de processamento do plástico, propiciando aos catadores organizados nesse sistema de rede, de terem o domínio da cadeia produtiva dos materiais recicláveis. P2 – Qual o valor agregado nisso? R - É interessante. Até então, os catadores eram meros fornecedores da matéria prima pra indústria recicladora. Eles agora chegam ao processo da industrialização. Vão agregar no mínimo 200% sobre o ganho deles enquanto produtores de matéria prima. Melhoria extremamente significativa. E ao mesmo tempo o grande salto que a Fundação está permitindo nesse apoio a esse segmento é constituir políticas públicas de fomento, de incentivo, pra que eles possam ir além de meros fornecedores dessa matéria prima. A grande expectativa que eu tenho nessa parceira com a Fundação Banco do Brasil é exatamente isso: de sermos capazes de construirmos indicadores de resultados, que possam ser utilizados pela política pública no sentido de propiciar a esse segmento o domínio de cadeia produtiva em todas as regiões brasileiras. P2 – Está começando com plástico? R - Nós começamos, a partir de um estudo de viabilidade econômica, nós priorizamos o plástico, até pela sua capacidade de geração, e ao mesmo tempo por ser um mercado ainda pouco explorado na reciclagem. P2 – Por quê? R - Porque o papel e a sucata, já tem uma tradição maior na reciclagem. E o plástico no Brasil pelo menos ainda é insipiente a experiência em reciclagem. E é um mercado muito aberto ainda e a geração é muito maior desse resíduo. P2 – Porque tradicionalmente o que a gente vê são as pessoas se preocupando com latinha de alumínio e com papel. R - Tanto é que os catadores não são conhecidos como catadores de materiais recicláveis. Na sua grande maioria são reconhecidos como catadores de papel, pela própria tradição. Tem uma demanda maior. A latinha hoje virou uma espécie de filé. O Brasil é hoje um o maior produtor dessa matéria prima. E aí, coloca dados meio que contraditórios: o Brasil é o maior produtor dessa matéria prima, os catadores são os principais responsáveis pelo fornecimento dessa matéria prima. No entanto, eles vivem na sua grande maioria na condição de total miséria e exclusão. Daí a importância dessa parceria que nós estamos fazendo com a Fundação Banco do Brasil, de apontar pra possibilidade de eles terem o domínio da cadeia produtiva. Porque na verdade mantém a indústria de reciclagem em ascensão, no entanto entre a indústria recicladora e os catadores tem um esquema de atravessadores que inviabiliza a sustentabilidade desse segmento. P2 – A possibilidade de se eliminar esse atravessador e potencializar o ganho é um ponto? R - Sem sombra de dúvida. Essa experiência nossa aponta pra essa possibilidade. Ela concretiza aquilo que ainda era algo que nós supúnhamos enquanto possibilidade. Hoje é concreto. A unidade está pronta, ela está respondendo as últimas condicionantes ambientais, nós estamos negociando o capital de giro pra abrir. E ela vai apontar pra essa possibilidade concreta dos catadores num sistema de rede dominarem a cadeia produtiva e romperem com esse núcleo de atravessadores que fica com o lucro desse segmento. P2 – Antes desse trabalho com a cadeia produtiva, teve a participação do prêmio de tecnologia social de 2001, que foi o primeiro reconhecimento. Você se lembra, foi no prêmio, tinha duas coordenadoras que acompanharam a Maria Cristina e a Maria das Graças. É isso? R - Sim, a Maria Cristina é a religiosa que começou esse trabalho em Belo Horizonte. E a Maria das Graças, conhecida como Dona Geralda, ela é coordenadora da Asmare. Elas foram lá receber esse prêmio. E nesse momento a Fundação Banco do Brasil também nos convocou pra sistematizar nossa metodologia pra disseminar esse modelo de organização dos catadores. Hoje nós estamos fazendo isso em parceria com a Fundação Banco do Brasil em três capitais brasileiras: Porto Velho, Fortaleza e João Pessoa, na região norte-nordeste, que é uma região de extrema miséria, pouco desenvolvida ainda. Nós temos também hoje, em Minas Gerais, nós estamos atuando em mais de 40 municípios, com apoio da Fundação Interamericana, que é uma organização ligada à Igreja Católica. Já constituímos um movimento nacional dos catadores, que está negociando políticas públicas com os governos municipais, os governos estaduais e o governo federal. Então, hoje acho que tem um resultado bem relevante. Os catadores hoje não são mais vistos como mendigos, marginais, já têm um reconhecimento. Já estão na CBO inclusive. Acho que eles só conseguiram um novo olhar da sociedade, porque eles conseguiram se olhar de maneira diferente, conseguiram se valorizar. Primeiro veio deles pra depois vir desses agentes externos, essa realidade. P1 – Como se dá basicamente essa parceria com a Fundação Banco do Brasil? O que ela dá especificamente e o que ela apresenta e o que pede de troca nessa relação? Ela apóia financeiramente ou ajuda a sistematizar? R - Eu observo que a Fundação Banco do Brasil, nesses últimos tempos, ela vai muito além de financiamento a projetos. Eu vejo nos técnicos da Fundação um interesse muito grande por fortalecer essas cadeias produtivas, integrando essas categorias que estavam confundindo terapia ocupacional com geração de trabalho e renda. Acho que a Fundação Banco do Brasil soube fazer essa leitura muito bem feita nos últimos tempos. E ela canalizou seus investimentos não pra fortalecer as terapias ocupacionais, mas pra fortalecer a qualificação profissional, o domínio das cadeias produtivas, que acabam gerando autonomia a esses sujeitos. Esse foi o grande salto. E a Fundação não só trabalha financiando, ela tem uma vivência, acompanha muito de perto o desenvolvimento dessas experiências. Por exemplo, no nosso trabalho em Porto Velho, João Pessoa e Fortaleza, não só os técnicos da Fundação acompanham muito de perto como eles têm provocado esse acompanhamento da própria instituição Banco do Brasil. Eu tenho certeza que quando a Fundação faz isso ela quer também instituir dentro do Banco do Brasil uma nova política de fomento, uma nova política de investimento a esses novos processos produtivos que têm como base uma nova forma de lidar com a economia que acima de tudo se compromete com a inclusão dos trabalhadores. Acho que essa tem sido a grande experiência da nossa parceria com a Fundação Banco do Brasil. P2 – Quem são os técnicos que você tem contato lá na Fundação? R - Desde o presidente que é o Jaques Pena, passando pelo Almir Paraca, que hoje saiu da Fundação porque assumiu um novo apelo no mandato legislativo, o Jorge Streit, a gente conversa com todo mundo. Acho que a Fundação não tem muita formalidade hoje, admiro muito isso. Você acessa muito fácil o presidente da Fundação, você acessa muito fácil o Jorge Streit que tem a responsabilidade de cuidar do setor de projetos, o Fumio que também é ligado a projetos. Quer dizer, a Fundação está muito aberta, a muito fácil acessar a Fundação hoje. Ela está muito próxima da realidade de exclusão social, buscando a inclusão através da formatação dessa rede de parcerias. P2 – Falando de uma coisa mais leve: tem algum caso mais pitoresco dessas visitas, contatos, que você se recorde? R - No último festival, nessa nossa busca de colocar mesmo, porque a gente tem muita pressa de fazer que esse domínio da cadeia produtiva de fato aconteça. Nós estamos já há dois anos elaborando projeto, implantando a infra-estrutura, comprando equipamentos, mas a gente esbarra muito com a burocracia do Estado. E nós não queremos trabalhar na informalidade. Nós queremos responder a todas as condicionantes ambientais. Nós queremos que a unidade de processamento abra, não como essas indústrias fazem: elas abrem, destroem o ecossistema e depois migram de lugar. Nós queremos instalar a ETE, queremos fazer a reciclagem da água que nós utilizamos. E corremos, corremos, corremos e chamamos a Fundação pra participação no festival que nós iríamos colocar já a indústria em funcionamento. E quando o pessoal chegou pra visitar a indústria pra vê-la em funcionamento, ela ainda não estava em funcionamento. E aí estava o Jorge Streit e um outro técnico da Fundação que não me lembro nesse momento. E nós começamos a ser questionados por pessoas que não tinham muito, que estavam lá mais por curiosidade. E no meio do questionamento, o Jorge, achei interessantíssima a postura dele, ele tomou a palavra e disse: “Olha, esses empreendimentos vão por etapas e a Fundação tem isso muito claro. Nós estamos incentivando, mas sabemos que cada etapa tem que ser vivida em profundidade. As respostas têm que ser dadas”. E pra nós foi muito importante. Nós percebemos que a Fundação vai muito além do financiamento, ela tem clareza de processo. Ela quer que a coisa realmente dê resultado. Nós ficamos “e agora, vamos perder o apoio da Fundação”. E de repente em meio ao público todo a Fundação toma a palavra e diz: “nós entendemos porque a coisa toda não está em funcionamento”. P2 – É parte do processo. R - É parte do processo. P1 – Como você avalia o trabalho da Fundação Banco do Brasil pro nosso país? R - Eu torço pra que ela continue desenvolvendo. Primeiro, que ela continue olhando pra realidade com esse grau de profundidade que ela conseguiu olhar. Então, a Fundação Banco do Brasil, ela percebe que em torno do crescimento globalizado tem populações inteiras vivendo no limite da exclusão social. E que é preciso ir além dos programas compensatórios. É preciso incluir essas populações na perspectiva ou nas políticas de desenvolvimento. E o caminho que a Fundação adotou a meu ver, eu estou falando como agente externo, foi o caminho de sistematizar essas experiências, mas também não ficar só na sistematização. Sistematizar para ver como melhor contribuir pra que elas cheguem a dominar as cadeias. Mas não é só dominar cadeias produtivas. Como que essas experiência podem apontar pra o Estado Brasileiro o desafio de investir através de políticas de incentivo e fomento. Eu acho que a Fundação tem conseguido coisas muito interessante, que a Marina Silva, Ministra, colocou no nosso último festival: eventos como aquele, apoiado pela Fundação e outros, coloca pro Estado Brasileiro um constrangimento ético. Que desafia o Estado Brasileiro a constituir políticas públicas capazes de incorporar essas populações no desenvolvimento macro da nação brasileira. Eu acho que é isso. P1 – Nessa relação com a Fundação, o que você aprendeu com ela? R - Eu aprendi que é possível ir além do sonho. E aí eu vou falar de uma maneira mais subjetiva, porque faz parte do meu ser. Até um tempo atrás, eu sonhava que um dia os catadores pudessem ter uma indústria própria. E a Fundação nos ajudou a concretizar esse ideal, esse sonho. Então ela nos faz crer que onde tem participação, organização, é possível concretizar ideais, transformando esses ideais em projetos, em infra-estruturas concretas, em processos produtivos possíveis. P1 – Você podia traduzir a Fundação Banco do Brasil em algumas palavras? R - A Fundação Banco do Brasil está conseguindo efetivar na sua prática essa concepção de desenvolvimento sustentável, porque ela consegue incorporar a questão social, econômica e ambiental. Sem isso não acredito na sustentabilidade do desenvolvimento. P2 – Cido, você acha que ficou faltando alguma coisa? R - Não. Eu nem agüento falar mais. P2 – Então, as duas últimas perguntas. A Gente está fazendo essa entrevista por conta de registrar a tua experiência dentro das cadeias produtivas e do seu trabalho na Asmare pro livro dos 20 anos da Fundação. O que você achou de ter passado esse tempo com a gente, recuperando algumas histórias que você não lembrava mais? Como você avalia esse momento? R - É interessante, porque eu pensei nisso quando você estava preenchendo a ficha. Nós vivemos num mundo onde temos que corre tanto e às vezes tem tantos apelos em volta de nós que não temos tempo de rever nossa própria trajetória de vida. Eu acho que me emocionei aqui quando eu descobri nesse levantamento da minha própria vida que desde pequenininho alguma coisa me incomodava e eu sempre tive o desejo de ir além. Eu acho que esse momento aqui me fez ver isso. Foi bacana. Foi emocionante pra mim mesmo, pensando agora, perceber nesse resgate da minha própria história que eu não me alienei. A minha história de vida não me permitiu alienar-me da própria realidade em que eu vivi. Eu percebi agora que sempre agi buscando ir além dos limites estabelecidos. E eu pude perceber isso agora na minha retrospectiva de vida, quando eu fui preencher essa ficha. Acho que foi muito bacana isso. P2 – Que bom. Em nome da Fundação Banco do Brasil e do Museu da Pessoa a gente agradece demais você ter vindo até aqui. Obrigado mesmo. R - OK. Agradeço mesmo. Obrigado.
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