Histórias de Consumo Consciente
Depoimento de Ricardo Voltolini
Entrevistado por Lila Schneider
São Paulo, 01/11/2016
Realização Museu da Pessoa
PCSH_HV549_Ricardo Voltolini
Transcrito por Mariana Wolff
MW Transcrições
R – Depois a Rosana nasceu em 1970 e a Renata em 1975, então todos vieram mais ou menos no mesmo tempo. Enfim, também é uma convivência… a minha convivência maior sempre foi com o meu irmão, né, que ele era mais próximo da minha idade, enfim, eu também tinha as brincadeiras de menino, né, vivia uma divisão maior naquele tempo, você brincava mais, futebol era uma coisa de menino, então ir para a rua, brincar. Ai quando veio a minha primeira irmã, eu já tinha seis para sete anos e eu lembro que eu funcionava um pouco como assistente da minha mãe para cuidar da minha irmã, embora eu não gostasse muito daquela atividade, devo confessar, mas ajudava a minha mãe a cuidar e quando veio a minha outra irmã, ai em 75, eu já tinha 11 anos, eu já tava… eu ainda era criança, né, hoje seria um pré-adolescente, mas também já não gostava tanto da ideia de ficar em casa, eu sempre fui muito de abrir a porta de casa e ir para a rua, então, a rua era um habitat mais interessante para mim do que a minha casa, então, a convivência maior foi com o meu irmão, né, porque a gente compartilhava das mesmas brincadeiras e a gente é praticamente contemporâneo, a diferença de idade é muito pequena, então me lembro mais das brincadeiras com o meu irmão do que… e com essa minha primeira irmã era um pouco papel de assistente da mãe ao cuidar. Quando veio a quarta… a segunda irmã, o último filho, ai eu tava meio que curtindo o bebê, então era uma brincadeira de pegar o bebê no colo, eu já entendia melhor o que era aquilo e não tinha tanto o papel de cuidar, então era mais divertido, eu só brincava, só… então foi mais legal.
P/1 – E essa história de sair para a rua, brincar, vocês tinham amigos da rua? Como que era a rua, o bairro?
R – Sim, sim. Muitos amigos na rua. Acho que era um tempo interessante porque na verdade, a rua era uma extensão da casa das pessoas e não havia uma ruptura quando você fecha a porta, é a minha casa e dali para fora é a rua e a rua era o território de ninguém, não era. Porque eu lembro que nos vários lugares onde eu morei, havia uma relação muito clara com os vizinhos e dos filhos com os filhos dos vizinhos a tal ponto da gente almoçar na casa de um, tomar o café da tarde na casa do outro, eventualmente, jantar na casa… então era uma pequena comunidade e as portas não eram, exatamente, limites, né, então a gente convivia muito de um ir para a casa do outro e tinham festas e era bastante divertido, mas a rua era um espaço democrático também porque tinham menos carros, então por exemplo, a gente conseguia jogar bola na rua, né, então conseguia montar travessinha, né, com chinelo e correr na rua, quando o carro vinha, eventualmente, ele passava a cada dez minutos, 15 minutos, passava um carro, a gente parava, saía para a calçada, deixava o carro passar e voltava a jogar bola, como se nada fosse, então a rua sempre foi um habitat natural, assim, eu não consigo me lembrar da minha infância sem me lembrar das ruas, das brincadeiras de rua, das amizades feitas com a vizinhança e como a escola era uma… as escolas da minha infância eram muito próximas da minha casa, também tinha convivência com os amigos da escola, então eram os vizinhos, aqueles sete, oito que moram muito próximos de você e mais os amigos da escola que moravam próximos, na rua de baixo, na rua de cima, então havia uma convivência maior. A despeito de eu ser uma criança introvertida e tímida, né, mas tinha uma boa convivência.
P/1 – E qual era o bairro?
R – Em Santo André, Vila Helena, é um bairro que ainda tem, ainda existe com esse nome, não mudou. Em São Bernardo, um bairro chamado Nova Petrópolis.
P/1 – Com que idade você se mudou?
R – Eu nasci em Santo André e me mudei de Santo André com dez anos. Com dez anos eu fui para São Bernardo e em São Bernardo, eu fiquei dos dez aos 25 até casar.
P/1 – E o quê que te levou a… por que a família se mudou?
R – Trabalho. O meu pai mudou de empresa, ele mudava muito de empresa, né, e eu lembro que ele foi para uma empresa grande em São Bernardo, a Brastemp, hoje Whirlpool e era uma oportunidade muito boa de trabalho para ele, ele achou interessante e achou que era melhor morar mais perto do trabalho, não que de Santo André até o local de trabalho fosse muito longe, olhando hoje, eu digo que acho que ele gastaria talvez uns 40 minutos de carro, né, mas ele achou que era melhor mudar, ficar mais perto. E o meu pai tinha um pouco isso também de tentar mudar a vida, mudar os ares, conhecer outros lugares e tal.
P/1 – E quando você era pequeno, já tinha alguma ligação com reciclagem, já tinha uma preocupação com resíduos, a comunidade já pensava nisso?
R – Nenhuma, não é uma preocupação do meu tempo. A gente não aprendia isso na escola, não se discutia isso em casa, tinha uma preocupação que me acompanhou durante muito tempo, acho que me acompanha até hoje com a história do não desperdício, mas com o lixo, com reciclagem não, porque não era uma preocupação, passava muito longe das preocupações, agora, a questão do não desperdício era importante primeiro, porque era uma casa com muita gente e o orçamento curto, então, o desperdício era antiético, era feio você desperdiçar, então a gente aprendia desde cedo a não deixar comida no prato e isso realmente, tinha uma represália forte quando acontecia de deixara comida no prato ou desperdiçar alguma coisa.
P/1 – Vocês faziam brinquedos ou compravam prontos, criavam alguma coisa?
R – O meu avô e o meu pai herdou um pouco essa habilidade dele, tinha habilidades manuais, assim, de mexer com madeira, com… tinha habilidade de construir coisas. Eu me lembro do meu avô construindo pequenos brinquedos, carrinhos. Meu pai acho que já estava… já tinha menos tempo, então acho que ele dedicava o tempo que ele tinha, ele trabalhava muito… então, ele chegava do trabalho, ele dedicava o tempo dele a estar com os filhos, a brincar, jogar bola e tal. Então não me lembro de construir muito, embora ele tivesse bastante habilidade para fazer isso, mas acho que já era o tempo de comprar os brinquedos, já ia para a loja e comprava.
P/1 – E você queria ser o que quando crescesse?
R – Olha, essa é uma pergunta que outro dia eu tava me desafiando a lembrar, eu estava num grupo de coaching de trainees de uma empresa e propus um desafio lá para os meninos e meninas e estava tentando me lembrar. Eu acho que tinha uma projeção muito clara que não era minha, era do meu pai de ser médico. Não era minha, exatamente, eu acho que era vontade do meu pai e acho que ele foi desde pequeno, me catequizando, tipo assim: “Olha, profissão legal, olha que bacana, ser médico, que legal, o seu nome eu tirei de uma novela de rádio que tinha um médico que chamava”, então tinha uma grande vontade dele que eu me tornasse médico, que até me levou a fazer Medicina, inclusive, a entrar na faculdade de Medicina. Mas não fazia, eu já tinha optado por não fazer, mas eu queria mostra que podia entrar e dizer: “Não quero fazer, prefiro fazer a outra, prefiro fazer Jornalismo”, mas eu acho que assim, como eu era muito tímido e muito introvertido, fora das brincadeiras, a minha vida era muito ler e imaginar. Eu lembro que eu era um cara imaginativo, eu tinha uma imaginação muito fértil, eu imaginava histórias e eu contava as histórias para mim mesmo, eu criava personagens e ai, a ideia de escrever já começou a vir logo depois, um ou dois anos depois de eu me alfabetizar, porque eu me lembro que eu tinha dez, 11 anos, eu já estava em São Bernardo quando eu tive a ideia de escrever o meu primeiro livro, minha primeira história que eu não lembro mais, outro dia, eu tentei lembrar e não consegui lembrar o quê que era essa história. Eu me lembro que eu tinha um amigo da escola que desenhava. Então, eu fiz o texto e ele desenhou e ai, a gente montou uma historinha, mimeografou e vendeu. Então, com 11 anos, eu era um pouco escritor e um pouco empreendedor, já tinha ali dias sementes, né? Depois, eu lembro que um pouco mais tarde, voltou a história de escrever, voltou a história de escrever livro, então isso nunca me abandonou e acho que isso foi fundamental quando eu fiz a opção para o Jornalismo, porque eu tinha a pressão doméstica por fazer Medicina, que era o projeto dos meus pais, no meu e ai, eu decidi quando eu estava no terceiro ano do Ensino Médio, eu decidi que eu queria fazer Jornalismo, na verdade, eu fui influenciado pelo Heródoto Barbeiro que foi o meu professor no Colégio Objetivo e decidi fazer Jornalismo por conta disso. Mas eu acho que talvez se eu tivesse que pensar numa… o quê que eu queria ser quando crescer, escritor, talvez. Acho que isso já estava lá comigo, de alguma maneira.
P/1 – E o que você lembra da escola da sua infância?
R – Eu me lembro de ser um aluno médio, nunca o primeiro da classe, eu era o primeiro da classe em redação, sempre, o que confirma a tese de que escrever podia ser um caminho, mas eu não era nem de longe o melhor aluno, mas ficava ali numa curva de médio para cima. Eu sabia das minhas limitações, eu acho, por ser um cara muito introspectivo e eu sabia que eu tinha que ralar mais que a média para aprender. Então isso foi um aprendizado bem precoce, esse, né, de entender que opa, eu preciso realmente estudar mais, eu preciso me dedicar mais. Eu não lembro, honestamente, em Santo André, eu não lembro da escola como sendo uma experiência divertida. Em São Bernardo eu lembro, ai eu já tinha dez, 11 anos, eu já conseguia entender um pouquinho melhor. Em Santo André, eu lembro da escola como algo que me tirava da rua, entendeu? Eu preferia estar na rua, mas eu tinha que estar na escola, então era uma coisa chata, não era atrativo para mim a escola, eu já tinha um pouco uma tendência ao autodidatismo, porque eu aprendia mais fácil lendo sozinho e pesquisando do que ouvindo professores me ensinar, né? Então, acho que eu preferia ler do que ir para a escola, ou preferia jogar bola do que ir para a escola. Ai, quando eu fui para São Bernardo, talvez, por eu já ter formado um grupo melhor e ter professores, também, acho que melhores e mais estimulantes, eu comecei a gostar um pouquinho mais da escola. Mas escola nunca foi o lugar que eu gostasse tanto.
P/1 – E falando em professor, teve algum professor que te marcou?
R – Teve. Teve. Claro que para um escritor não podia ser um professor de Matemática ou um professor de Física, foi um professor de Língua Portuguesa e Literatura, que na verdade, um Cesar, aliás, falecido, já descobri que faleceu há alguns anos, mas ele foi não só inspirador para mim, mas para uma geração de pessoas, porque depois, eu comecei a ver que aqueles meus colegas que eu fui encontrando pela vida tinham virado jornalistas, cineastas, escritores, roteiristas, publicitários. Então, ele despertou numa geração de pessoas o gosto pelo texto escrito. E esse cara foi marcante para mim porque enfim, para um escritor, alguém que fala: “Esse texto é legal, Machado de Assis é legal, olha que legal”, ele me fez encontrar, descobrir autores que eu não conhecia e ler com um incrível prazer, porque até então, o ler para mim… eu gostava de escrever, mas ler era uma atividade imposta pela escola, quando era imposta pela escola era muito chato, então não tinha prazer nenhum, eu lia rápido, lia para gravar as histórias e fazia provinha que tinha na sequência. Mas esse professor foi um ponto fora da curva, ele me ensinou a gostar, a enxergar isso com paixão.
P/1 – Ainda mais pela sugestão de livros…
R – E pelo cuidado com a Língua Portuguesa, eu gostava da Língua Portuguesa e gostava das palavras, assim, dos significados, esse mundo de significados das palavras era, às vezes, mais interessante para mim do que o mundo que eu vivia lá fora, por ser tímido, introvertidão, ficava na minha, a rua e a brincadeira era a minha maneira de me socializar, mas era muito fechado, né? E olhar os textos e mergulhar nos textos era uma forma de viajar e viver em outros mundos.
P/1 – E como que você ia para a escola?
R – A pé.
P/1 – A minha pergunta… se você puder sempre incluir a minha pergunta…
R – Eu ia para a escola a pé, sempre, tanto em Santo André, quanto em São Bernardo, porque eu morava relativamente, perto, né, então não fazia sentido não ir a pé.
P/1 – E daí, você fez o ensino médio…
R – Ai foi o salto importante na minha vida e muito traumático, porque até então, eu vivia numa comunidade pequena, bem provinciana em São Bernardo em que eu conhecia todo mundo e todo mundo me conhecia. E eu tava ali, mais ou menos, no nível socioeconômico das pessoas com quem eu convivi, tinha, eventualmente, aquele que é o mais rico e tal, que o pai é um empresário, ou um executivo da Volkswagen, que em São Bernardo tinha muito disso, mas a maioria era gente como eu, então eu não conseguia ver desigualdade, distanciamento social, não era uma preocupação para mim, como não era a preocupação para mim a convivência com pessoas mais pobres também, para mim era normal. Então, tinha amigos muito pobres e amigos mais ou menos como eu e era normal, mas ai, como o projeto do meu pai era que eu fizesse Medicina, um dia eu cheguei para ele e falei: “Olha, eu não vou fazer Medicina nunca, né, porque assim, saindo de escola pública em São Bernardo, isso aqui é disputadíssimo”, e eu não era o primor da inteligência para sair e conseguir uma carreira… ficar em São Bernardo e sair e fazer Medicina. Ai, o meu pai falou: “Bom, e ai? Então você vai desistir?”, falei: “Não, não vou desistir, mas eu preciso de uma formação melhor” “E o quê que é uma formação melhor?” “Eu tenho que ir para São Paulo, tenho que buscar um colégio importante, um colégio que me dê base”, e ai na época, o colégio que se apresentou como o melhor colégio, ou pelo menos, o que eu identifiquei mais rapidamente foi o Objetivo, Colégio Objetivo, na Paulista. Mas era um… você imagina, para uma família classe média baixa, morando em São Bernardo, parecia outro mundo São Paulo, assim, era como se eu tivesse que pegar um avião, um trem até eu chegar lá, era tudo longe. Hoje, olhando, eu acho bobo, ingênuo, eu acho perto, mas era muito longe, tudo. E muito caro tudo, também, né? Eu lembro que o meu pai falou: “Então, você vai lá, você pega ônibus e tal e vai ver quanto custa esse negocio”, e ai, eu fui. E nossa, para ir já foi uma coisa… eu me perdi, você imagina! Moleque, 14 anos, era mais criança do que adolescente ainda, né, eu tava jogando bola na rua e ai, eu fui, eu lembro de ter ido, perguntado, voltado e dito para o meu pai: “Olha, custa tanto”, meu pai batia a mão na cabeça: ‘Como é que eu vou pagar isso ai?”, falei: “Bom, não paga, né, não tem jeito, se não tem como pagar, não paga”. Ai, ele se esforçou, fez um esforço pecúlio e pagou, mas só que assim, você sai de uma situação em que você tá numa escola com pessoas iguais e vai para uma escola em que você não é igual, ali a desigualdade ficou clara para mim, eu era o pobre. Eu era o classe baixa, né, tanto no jeito de se vestir, e aquilo ficou muito claro, né, ficou claro porque eu sofria bullying, inclusive, né? Então, tiravam sarro da minha roupa, tiravam sarro do meu sapato, do meu tênis, porque era uma turma cujos pais podiam pagar por roupas de marca e a minha família não podia pagar. Isso foi ruim para mim porque foi o primeiro choque, foi cruel assim, esse impacto. No primeiro ano, mas no segundo ano, eu já transformei aquela… o que era para mim a falta em abundancia, porque ai eu fiquei muito concentrado em estudar, né, já que o mundo era inóspito, vamos estudar, eu tô aqui para isso e eu fiquei muito bom nesse negócio de estudar, porque ai eu comecei a me dedicar muito, o que não me impossibilitou também de criar relações, eu também tinha os meus grupos e jogava bola, me divertia, mas era um outro mundo pra mim, não era o meu mundo. Eu me sentia melhor no meu mundo que era: já que eu estou aqui para isso, então, se eu tenho que ser um estudante, eu vou ser um estudante profissional, vou me dedicar firmemente a isso e foi isso que me ajudou, inclusive, a ter uma… eu acho que tive ali no Objetivo uma evolução no ponto de vista intelectual assim, grande, eu sai uma outra pessoa, né, entrei um caipirinha e sai um sujeito mais civilizado.
P/1 – E nesse período, depois do Objetivo, como foi que você resolveu fazer sua formação? O quê que você decidiu?
R – O Objetivo foi interessante, porque chegou no terceiro ano, eu já tava… foi quando eu comecei a ter aulas com alguns professores notáveis e notáveis assim, celebridades, gente que a gente ouvia no rádio ou via na televisão e ai um deles foi o Heródoto Barbeiro. E ai, na época, eu fazia o jornal do Objetivo e o Heródoto um dia falou pra mim: “Meu, o que você vai fazer mesmo?”, falei: “Medicina” “Não tem nada a ver, faz Jornalismo, é a sua praia, você é bom nisso, você escreve bem pra caramba, vai fazer Jornalismo, por que Medicina?”, ele questionava: “Você gosta disso? é o que você quer fazer?”, ai essas indagações todas foram me levando a consciência de que eu não queria aquilo, efetivamente, era mais um projeto do meu pai e eu estava ali para cumprir um projeto do meu pai e não tinha me dado conta disso, de que não era a minha grande motivação. Ai, no terceiro ano, eu prestei um exame vestibular pra Medicina em Londrina, depois eu prestei exame vestibular para Medicina no final do ano para o começo do ano, mas ai eu já tinha decidido que eu queria fazer Jornalismo, então prestei em duas faculdades de Medicina, para passar e dizer: “Olha, passei e não quero” e em duas de Jornalismo, que era a ECA e a Metodista. Metodista, inclusive, eu fui me inscrever no último dia, que a minha mãe me lembrou: “Olha, hoje é o último dia da Metodista, você não quer se inscrever? Porque é aqui do lado de casa”, preocupação de mãe, que era do lado de casa. E eu não tava nem pensando na Metodista, eu estava preparado para entrar na Medicina, falei: “Vou entrar na ECA fácil”, né? E ai, prestei, entrei nas de Medicina e eu lembro bem que a ECA demorava um pouco mais o resultado e a Metodista saiu antes e eu tinha passado bem na Metodista e tal. E ai, a minha mãe: “E ai, você vai fazer o quê?”, eu falei: “Mãe…”, esse era um bom argumento para ela, “… a ECA é de graça. Então, se eu me preparei isso tudo, eu quero a USP, não quero nada menos do que isso e eu vou esperar sair o resultado”. Ai, tinha uma coisa, um descompasso ali entre a Metodista e o resultado da ECA, se eu não me matriculasse, eu perderia o direito, eu abriria mão do direito da Metodista e tinha uma data. Eu estava tão confiante que eu falei: “Não, não vou nem me matricular, eu entrei na ECA, não tenho dúvida” e mais uma vez, a minha mãe com o seu pé no chão, falou: “Vai lá, se matricula. Isso é pouco dinheiro…”, sei lá, seria 100 reais, se não der, não deu, enfim, você vai para a ECA, melhor”. Ai, eu fiz a matricula e a ECA saiu três dias depois e eu lembro que era uma coisa mais ou menos assim, eu não sei se eram 40 vagas ou 60, mas eu lembro que vamos supor que fossem 40, eu não me lembro exatamente, mas a minha posição era 41º, teoricamente, eu não estava na primeira lista, mas ai eu liguei para a mulher da ECA e falei: “Eu sou 41º…” “Fique tranquilo, você já tá dentro, normalmente, tem 10% de evasão, é praxe, todo ano tem, então, fiquei tranquilo” “Porque eu já fiz a minha matricula e tal e vai até começar as aulas, já” “Fique tranquilo”, ai eu falei: “Mas em quanto tempo eu vou saber?” “Em uma semana você já sabe disso”, ai passou uma semana e ninguém desistiu naquele ano (risos) e acabei fazendo Metodista, que para mim foi legal também ter feito, porque enfim, construí ali boas amizades, foi interessante. Acho que do ponto de vista prático, para a minha formação, não teve nenhum prejuízo até porque eu também não assisti aulas, então, eu não assistiria aulas na Metodista ou na ECA, daria na mesma, né? Foi ai que eu fui para a Metodista e comecei a minha formação em Jornalismo. No primeiro ano, eu fiquei encantadíssimo, falei: “Nossa, estou no meu mundo, me achei”, era Antropologia, Sociologia, eu tava vibrando, Filosofia, eu tava vibrando com aquilo. E eu era o primeiro aluno que era mais atento, pedia para ler um livro, eu lia cinco. Eu tava empolgadíssimo com a Metodista. No segundo ano, ai o entusiasmo despencou de 100 para dez…
P/1 – Por quê?
R – Porque eu comecei a ver algumas disciplinas práticas, a desconfiar muito da qualidade dos professores, eu fazia questionamentos para os quais eu não tinha resposta e aquilo me deixava intrigado: “Esse cara, no mínimo, se ele não tem a resposta, ele deveria me ajudar um caminho para a resposta”, e acho também que eu me desapeguei um pouco do grupo, né, a minha relação com o grupo passou a não seu uma relação tão próxima. Eu era tido como… eu e mais uns quatro como os intelectuais da turma e era uma turma que tinha artista, músico, maconheiro, tinha todo mundo e pouca gente levava aquilo a sério, assim, assistia as aulas, a diversão das pessoas era ficar na praça lá no campus, ouvindo música, tocando violão, fumando um baseado, mas ninguém entrava em sala de aula, né? E acho que eu fui perdendo um pouco do… ai me deu uma saudade do tipo: “Seria tão bom se eu tivesse fazendo Medicina, né? Com gente compenetrada e tal…”, não tinha muito… meu mundo parecia não ser ali, mas eu já estava fazendo Jornalismo e eu queria realmente ser jornalista. Ai, eu tinha um grupo de pessoas, o grupo com o qual eu convivia, mas eu comecei a ficar extremamente rebelde, eu sempre tive, segundo minha mãe, minha mãe gosta de lembrar, os meus picos de rebeldia, assim, né? Mesmo quando eu era tímido e introvertido, eu tinha os meus picos de rebeldia de questionar professor, né, de questionar pai e mãe em regras e eu acho que na faculdade, essa rebeldia veio com muita forca até que chegou um momento em que eu falei: “Eu não preciso de nenhum professor, quer saber? Qual o trabalho? Tá ai o trabalho”. Ai, tinham uns vagabundos que sempre tem e no Jornalismo tinha mais, a quantidade era maior de vagabundo que eu falava assim: “Posso fazer o trabalho com você ai?” “Dá teu nome, vai, que eu sei que você não vai fazer trabalho nenhum, dá teu nome, teu número e toca tua vida”, ai eu ia, às vezes, eu e um ou dois amigos, fazíamos os trabalhos, entregava e a gente tinha as notas mais altas, né, o que reforçava para todo mundo a ideia de que a gente era um bando de intelectual e não sei o que, né, que se acha melhor do que todo mundo. Então, a faculdade para mim foi o primeiro ano, muito intenso; o segundo ano até a metade, mais ou menos, ai eu entrei numa espiral de: vou até o quarto ano aqui, mas vou fazendo o suficiente para me formar. E foi ai que eu comecei a… eu já gostava de ler, li muito, estudava todos os clássicos. Então, o professor dava Sartre para ler em Filosofia, eu lia Simone Beauvoir e mais uns dez franceses. Então, eu tinha essa coisa de mergulhar mais profundamente sem que o professor me tivesse que pedir, não era o que valia para a prova, era o que eu queria pra mim. Então, eu me formei com louvor como o melhor amigo da turma, o que me deu o direito de escolher qual era o curso que eu queria fazer, porque tinha o curso Abril, curso Folha e o curso Estado e eu tinha que escolher, né? E eu pude escolher o curso Abril que foi o inicio da minha carreira profissional.
P/1 – Daí, continuando…
R – Ai eu fiz… entrei na Editora Abril, isso foi 1986, 87 desculpe, eu me formei em 86, vale dizer também que eu já trabalhava com o Jornalismo, tá, acho que eu esqueci de contar esse pedaço da história…
P/1 – Paralelamente a faculdade?
R – É, no segundo ano, no primeiro não, porque eu tava… era tudo tão intenso pra mim que eu não queria nem trabalhar, eu tava empolgado com a Sociologia, Antropologia e Filosofia, mas no segundo ano, até para… o meu pai pagava a faculdade, né, até para ajudar, eu falei: “Eu vou trabalhar”, e também para pegar experiência. Mas enfim, imagina, já se paga pouco o jornalista hoje, o jornalista começando a carreira… eu lembro que o meu primeiro trabalho foi… eu comecei por cima, já, eu comecei como crítico gastronômico da “Gazeta de São Bernardo”, tenho que falar que não era da “Folha”, era da “Gazeta de São Bernardo”, mas enfim, era divertido, eu exercitava texto, ai eu comecei a entrar nas outras funções do jornal, porque era um jornal de bairro, você subia e discutia com o editor o quê que ia ter e ai, eu propunha fazer coisas, o editor: “Toca o bonde ai, que você tá com energia para fazer, não custando para mim, toca a vida”. E ai, eu fiz “Gazeta de São Bernardo”, depois eu fui pra “Gazeta da Vila Prudente”, só grandes veículos, né, assim, poderosos. E ai, no quarto ano, eu já comecei a fazer crítica de teatro infantil para a “Folha da Tarde”, para… qual o nome daquela revista de moda francesa legal?
P/1 – Vogue?
R – Vogue. Pra Vogue, fazia crítica de teatro para Vogue, crítica de teatro infantil para a “Folha da Tarde”, e nesse interim, ali no segundo ano até o quarto ano, além deste trabalho, eu vivia a minha segunda experiência como empreendedor, acho que isso é importante dizer porque já me acompanhava desde aquele primeiro livrinho que eu fiz com aquele amigo aos 11 anos, que a gente mimeografou e vendeu. Eu e dois amigos daquele grupo dos intelectuais resolvemos criar um jornal infantil. Por que um jornal infantil? Boa pergunta, não sei, não me lembro bem a motivação. Na época, eu escrevia textos para crianças, tal, testava muito escrever para crianças e fiz um curso na ECA também de produção cultural para criança, mas esses meus dois amigos não tinham nada a ver com esse universo e vieram comigo. Mas a gente tinha uma ideia por trás e ali, eu descobri um negócio importante sobre mim que a ideia era a seguinte: a gente queria fazer um jornal que respeitasse a inteligência da criança, então, era ter a criança como um leitor e ter as suas necessidades respeitadas e valorizadas e não a criança transformada num adulto em miniatura. Essa era uma discussão, uma tese que estava por trás do negócio e ai, nos esforçamos para montar isso, tinha que criar uma empresa e eu já tinha idade suficiente, mas os meus dois amigos tiveram que ser emancipados pelos pais porque eles não tinham 18 anos, então, eu já tinha, né? E ai, criamos uma empresa para fazer um jornal chamado “Brincando de viver”, que era um jornal que tinha essa pegada, né, de ser mais inteligente ou fazer uma comunicação mais bacana. Milagrosamente, isso durou dois anos, acho que durou dois anos também porque… enfim, a gente não tinha grandes ambições financeiras e fazíamos o suficiente para a coisa dar certo, né? E ali, eu descobri um negócio muito importante sobre mim que também já era uma semente da infância, qualquer trabalho que eu viesse fazer na vida, tinha que ser para mim uma causa ou ele tinha que ter causas ou ele não faria muito sentido para mim. Então, o jornal infantil era uma causa naquele momento. Ai, o jornal foi capengando, porque você imagina, a gente ia escrever, fazer, diagramar, vender o jornal, arrumar anuncio, então, tinha que escrever, uma hora estava escrevendo, a outra hora estava na Nestlé pedindo publicidade, né? mas a gente conseguiu manter até dignamente o negócio, a experiência, até que quando a gente se formou, a gente ainda tinha a empresa aberta e esses dois amigos meus disseram assim: ‘não sei quanto a você, mas eu tô zarpando, já tô indo aqui, vou trabalhar na Abril”, o outro: ‘Eu já tô com uma proposta do “Globo”, eu vou embora”, então encerramos a empresa e ai, cada um seguiu o seu caminho. E o meu primeiro caminho, minha primeira porta profissional oficial foi Editora Abril, revista “Playboy”. Foi muito legal, foi muito divertido, eu fiquei alguns meses como trainee, do curso Abril, você pulava para algumas redações, ai eu vi que eu não teria vida longa na “Playboy”, um dos editores me chamou um dia e muito educadamente falou: “Você é um cara muito legal e tal, som que não é teu mundo esse daqui, né? Você é mais petista, tal…” era outra coisa, jogo de golfe, fazenda dos Diniz, é outra praia, né? Era um cara muito legal, assim, foi até uma conversa divertida, que o cara estava me dispensando, mas de um modo muito divertido, ele mesmo falou: “Tem mil revistas aqui na Editora Abril que você pode trabalhar, você tem talento, você escreve bem. Sobe um andar, vai falar com o Juca Kifouri ai, eu ligo para ele lá, falo de você. Você não gosta de futebol? Vai cobrir o futebol, pô, tem mais a tua cara. Isso aqui é um mundo muito gourmetizado, muito chique pra você”. Ai, subi, e fiquei na revista “Placar” mais um ano e pouco até ser chamado, porque eu tava ali, estava legal, estava divertido, cobria futebol, mas assim, eu tenho um espirito muito inquieto, né, então, um ano já fazendo aquilo, todo domingo indo cobrir o jogo de futebol e todo jogador de futebol fala a mesma coisa sempre, começou a não ter graça aquilo, foi perdendo a graça. E ai, eu recebi uma proposta pra ir para o “Jornal da Tarde” para fazer um negócio que eu amava, que era Artes e espetáculos, e falei: “Bom…”, nem pensei, tanto não pensei que o salário era menor e eu… acho que foi a única vez na vida que eu pulei de um lugar para o outro para um salário menor, né? E ai, foi uma experiência divertida, lá fiquei um ano também e ai, mais uma vez a inquietude, né, eu olhando aquilo, falei: “Esse “Jornal da Tarde” acho que não vai muito longe”, né, porque uma hora manda embora alguns aqui, outra hora, mandam embora alguns, mas era um tempo que eu gosto de lembrar porque era um tempo que você conseguia escrever uma matéria de uma página inteira, formato standard, então, eu lembro que as melhores entrevistas que eu fiz na vida, eu fiz no “Jornal da tarde”, porque tinha espaço e eu exercitava muito texto e tal e também fugia da minha caipirice, porque eu tinha que entrevistar grandes nomes, para mim, era… Jô Soares, Roberto Carlos, sei lá, passei uma semana mergulhado com Gerald Thomas vendo como é que ele encenava a trilogia Kafka, né? Então era uma experiência para um rapaz recém formado muito interessante, era um privilegio. Mas ai passou um ano, eu recebi uma proposta, estava namorando já para casar, né, recebi uma proposta da “Folha” e ai, baixou o espirito da minha mãe, né, tipo proposta três vezes mais, você tem que ir, tem que pensar na sua carreira, no seu futuro e ai, eu fui para a “Folha” para cobrir futebol, então, voltei para futebol de novo, mas ai numa condição de repórter diferenciado, cobria coisas legais que eu gostava de fazer e fui. E ali, peguei o processo de implantação do manual da “Folha” que foi um grande aprendizado. Convivi com grandes jornalistas que eu tenho para mim, até hoje como referências, tipo Matina Suzuki, Leão Cerva, jornalistas importantes que me ajudaram na minha formação, o próprio Otavio Frias Filho, mas ai deu três anos, eu não aguentava mais, eu já tava… trabalhava de domingo a domingo, com folgas quinzenais de segunda-feira, então, a vida tava ficando muito chata e ai, eu resolvi… eu já tinha… o espirito empreendedor já gritando, falando: tenta vir, tenta uma coisa diferente. Me deu vontade de voltar a estudar porque eu achei que… eu já tinha a sensação de que curso de Jornalismo tinha sido meio assim, passou muito rápido e eu não levei tão a sério, como eu dizia: “Eu quero, realmente, fazer um curso superior”, eu achava que aquilo não tinha válido e ai, eu resolvi sair e assim, sempre na contramão, né, uma outra tendência minha, sempre desafiando uma lógica de bom senso médio, né, porque eu sai da Folha para casar, eu tinha um mês de férias e mais três acumulados. Ai eu cheguei para o meu diretor e falei: “Olha, eu quero os quatro” “Não, de jeito nenhum isso é impossível” “Não, esse é meu direito, eu já tô aqui há três anos, eu não tiro ferias”, e tinha essa coisa de achar normal que jornalista podia fazer isso. Eu falei: “Não, eu quero o meu direito e eu preciso descansar”, ai reclamei tanto que o cara topou e me deu. Ai, eu casei, lua-de-mel, fiquei mais um tempo lá botando as coisas em ordem em casa, voltei e pedi demissão. Obviamente que isso não foi uma decisão aplaudida por sogro, sogra, mãe, pai e todo mundo achou que eu tava completamente louco, né? “Mas o quê que você quer fazer? Como abre-se mão de uma carreira? Você tá começando. Você tá na “Folha de São Paulo”, você tá cuspindo no seu destino”, então eu ouvi todos os dramas e assim, não foi uma decisão aplaudida e ninguém falou assim: “Nossa, como ele é corajoso”, todo mundo falou assim: “Nossa, como ele é burro, como é que ele vai fazer um negócio desses e tal?”, e ai, eu resolvi criar a minha própria empresa e na origem da minha empresa, já tinha trabalhar com comunicação e marketing institucional, eu queria, na verdade, não vender produtos, porque não gostava da ideia de trabalhar para vender produtos, eu queria vender ideias. De novo, a coisa da causa, né, e eu achava que tinha um monte de causa sem pai e sem mãe no Brasil e eu queria pegar algumas delas para trabalhar e ai, muito… acho que tem um pouco a ver com sorte, mas tem um pouco a ver também com você perseguir, né, eu sempre fui muito obstinado de ir atrás e perseguir e eu lembro que assim, no segundo ano… primeiro ano foi uma lástima que confirmava todos os piores prognósticos de pai e mãe, avô, avó, tia, todo mundo na falava: “O Ricardo não tem jeito, pois é, não tem jeito, sempre assim, ele larga as coisas, como é que vai largar uma carreira? Pois é, estudou quatro anos, não quis fazer Medicina, abriu mão de Medicina para fazer essa droga de jornalismo e agora, abre mão, não entendo o Ricardo”, então era uma coisa de meio o incompreensível ser Ricardo Voltolini. E ai, no segundo ano, as coisas começaram a mudar, porque ai eu tive um primeiro grande cliente que foi o Senac e ai, a minha escalada, a minha ascensão como consultor do Senac foi meteórica assim, porque eu comecei fazendo um trabalhozinho pequenininho para uma unidade na Vila Prudente e em seis meses, eu já era consultor do Senac todo para as áreas de comunicação e marketing institucional e ai, a grande virada da minha vida foi no próprio Senac, quando um dia eu tava lendo algumas coisas sobre terceiro setor e ai, eu lia e falava: “Puxa, cara, isso é legal, isso vai acontecer no Brasil”, porque não estava acontecendo no Brasil, não se falava disso ainda e eu fui mergulhar e ler o que estava saindo lá fora e pesquisar e ver e ai, eu fiquei até curioso de fazer um curso na Johns Hopkins sobre terceiro setor e aquilo virou uma obsessão para mim, porque tinha a ver com causa, tinha a ver com coisas que eu acreditava e eu falava: “Eu quero participar da construção desse negócio aqui, porque eu acho que tem muito trabalho a se fazer. Qual é o meu trabalho? Eu não sei, eu vou usar as minhas habilidades de comunicador e ver como é que eu posso ajudar esse negocio”. E ai, foi o tempo que a Dona Ruth Cardoso começou… criou uma lei, um marco do terceiro setor, o assunto começou a andar e um dia eu tava numa reunião de diretoria do Senac e conversando com o diretor, falei… porque o assunto era obsessivo para mim, falei, o cara não entendeu nada do que eu falei: “Mas o quê que é isso, ai, efetivamente? Tem a ver com setor terciário?”, eu falei: “Não, não, é outra coisa, é um conjunto de organizações sem fins lucrativos, não é o primeiro, não é o segundo”, expliquei o que era o primeiro, o que era o segundo e ai, o diretor presidente do Senac tava na reunião e estava ouvindo, ai chegou, se aproximou: ‘O quê que é isso? Eu tô ouvindo esse negócio do terceiro setor, me conta melhor”, ai eu falei o que era, ele falou: “Esse trabalho a gente já faz aqui”, ai mostrou lá uma unidade que tinha, eu falei: “É, de fato, essa unidade se aproxima muito do que seria um modelo do terceiro setor”, ai esse diretor era muito intempestivo e ele tomava decisões muito rápidas, sem pensar às vezes, e ele pegou e já transformou um dos diretores em gerente dessa unidade e falou: “Olha, eu quero você como consultor disso ai, ajuda esse cara a montar esse negócio ai”, tudo no ar, assim, tudo meio solto. E ai que eu comecei a fazer um trabalho de gestão de terceiro setor. Foi o meu primeiro… eu diria que a primeira… o primeiro grande movimento que eu fiz no sentido de construir a carreira que eu tenho hoje, porque na verdade, à época, a gente tá falando de 94, 95, isso era uma grande novidade, o Senac foi um protagonista dessa discussão e eu tava no centro dessa discussão. Então, eu ajudei, de alguma maneira, a construir uma visão de terceiro setor mais profissional, mais organizado, olhando para resultados, então, eu capacitava pessoas para gestão, para marketing, para comunicação. E ali eu conheci boa parte das pessoas que depois seriam importantes na minha carreira. Então, pessoas que criaram esse negócio no Brasil. Foi uma oportunidade única, né, e super privilegiada também, porque eu era um consultor de uma organização importante no meio de um projeto importante, no nascimento de uma discussão importante no Brasil. Então, eu tirei proveito disso, né, minha carreira rapidamente cresceu. Ai, minha mãe, meu pai começaram achar: “Pô, ele não é tão louco assim, pode dar futuro esse negocio”. Todo mundo começou a olhar e ver que fazia sentido embora eu tivesse como tenho até hoje uma dificuldade muito grande de explicar para a minha mãe o que eu faço. Às vezes, ela não entende, ela só pergunta se é legal, eu falo: “É, tá dentro da lei”, mas ela não entende exatamente o que eu faço e por isso que até hoje, para ela eu sou um jornalista, que é o que ela consegue entender. Mas ai, o meu trabalho de gestão de terceiro setor foram dez anos trabalhando com isso e entre os resultados que eu gosto de comemorar, está o de eu ter participado direta ou indiretamente da formação de mais de 40 mil gestores de organizações de terceiro setor. Foi lá que eu conheci a Karen, enfim, conheci centenas de pessoas que estavam no terceiro setor que estavam começando trabalhos importantes e eu estava ali também, eu era um protagonista, não era nem coadjuvante porque eu estava numa organização grande e importante. Ai, eu vi que eu dominava bem essa linguagem do mundo social, mas dominava bem a linguagem do mundo empresarial e ai, eu resolvi que eu tinha que fazer… uma causa interessante seria fazer a ponte entre um e outro para que os recursos de empresa pudessem vir para as atividades do terceiro setor. Ai foi um período que eu comecei a trabalhar com investimento social privado, ai rapidamente isso era quase que uma consequência natural migrar para responsabilidade social empresarial e depois, para sustentabilidade. Então ai, a partir de 93, eu acho que a minha carreira tem uma linearidade e uma coerência até espantosa para uma pessoa como eu. Até então, era tentativas e vai para cá, vai para ali, faz isso, faz aquilo, escreve sobre arte, sobre moda, sobre futebol, mas era enfim, o inicio de uma carreira que eu mesmo interrompi. Mas ai a partir daquele momento com a empresa, passa a ser uma sequência de gestão de terceiro setor, investimento social privado, responsabilidade social e agora, sustentabilidade empresarial. Então, tem uma lógica ai, já são 20 e poucos anos de lógica na construção de uma carreira.
P/1 – E você na época do Senac, você foi buscar conhecimento? Você fez cursos ou como que você foi aprendendo?
R – O tempo todo. Assim, mais uma vez o autodidatismo teve um peso muito grande, eu decididamente, tenho uma facilidade para aprender sozinho, é uma habilidade, mas eu fiz vários cursos, né, eu fiz cursos… comecei a participar de movimentos também internacionais, ai eu ia muito a congressos, fiz um curso na Johns Hopkins, fiz… na verdade, eu tinha círculos muito interessantes de atuação que me proporcionava essa aprendizagem, né? Então assim, de curso formal, mesmo, na minha formação, eu tenho uma especialização em Turismo Sustentável, que mais uma vez, eu só fiz porque num dado momento da minha carreira, isso eu não falei também, eu dirigi a Cidade da Criança e o Conjunto Vera Cruz em São Bernardo. Eu não gosto muito de falar dessa experiência porque foi um ano e pouco da minha primeira e última experiência politica em gestão pública. Eu não gosto da gestão pública, mas eu fui ali porque era uma… estava no momento de entressafra, eu tava já querendo sair do Jornalismo, querendo experimentar novas coisas e ai, veio um convite muito inusitado de um ex professor da Metodista dizendo: “Assumi a Secretaria de Educação de São Bernardo”, acho que era a primeira administração petista em São Bernardo “E a gente tem vários equipamentos aqui, eu quero dar uma outra cara, um outro significado e eu sei da sua ligação com produção cultural para criança, eu te queria aqui”. Ai, eu fui viver essa experiência, mas assim, essa experiência foi legal para me ajudar a entender melhor, depois eu fiz o turismo sustentável, foi mais ou menos ali. mas de formação, eu fiz várias pequenas especializações curtas e a mais importante foi um MBA em gestão na FIA, na FIA-FEA, era FIA-FEA, então. Mas eu sempre fui um autodidata e uma coisa legal, assim, que eu aprendi bastante escrevendo também. Então, eu mais escrevi do que frequentei salas de aula, digamos assim.
P/1 – Então, a ideia sustentável, você podia falar um pouquinho dessa formação e quando se formou?
R – Ela começa, oficialmente em 93… a ideia sustentável começou efetivamente em 1993 com uma proposta de ser uma empresa prestadora de serviços de consultoria em comunicação organizacional e marketing institucional. isso durou mais ou menos um ano, porque ai veio a primeira grande causa que eu já falei que foi a de gestão de terceiro setor. Ai foram dez anos metido com isso e trabalhando de 15 a 16 horas por dia. Eu lembro bem, mas com muita intensidade e com muito resultado, também. Depois veio investimento social privado na sequência. Quando eu digo veio, eu rompi o… assim, eu deixei de fazer, eu trabalho com o terceiro setor, foi uma opção, né, eu fiz a transição já para investimento social privado, mas eu já não atuava como eu atuava, achei que dez anos estavam mais do que suficientes para mim e eu já tava vislumbrando outras maneiras de trabalhar, não só com gestão do terceiro setor. Ai, eu ajudei a criar alguns institutos e fundações, a revisar planejamentos, foi uma época bem legal essa também e ai, eu fui trabalhar com movimento de responsabilidade social que tava naquela época ganhando força no Brasil. Então, eu acho que a minha entrada nessa discussão, 98. Eu lembro bem porque foi o ano de criação do Instituto Ethos, então foi o ano que eu começo a trabalhar objetivamente com responsabilidade social empresarial. E o interessante é que as mesmas pessoas, os mesmos protagonistas desse movimento são os que estavam lá no movimento do terceiro setor, o Oded Grajew, Ricardo Young, Guilherme Peirão Leal, Luiz Ernesto Gemignani, os mesmos que tinham criado fundações importantes como Fundação Abrinq, né, os lideres eram os mesmos também, porque eu lembro de Wellington Nogueira dos Doutores da Alegria, que até hoje tá ai. Então, tinha ali um grupo de lideres que também muito inconformados com a realidade brasileira e querendo encontrar respostas para alguns dos nossos problemas deram inicio ao movimento mais consistente de terceiro setor no Brasil, a organização de uma rede de terceiro setor. Ai, esses inconformados viram que esse trabalho estava relativamente construído e começaram como a maioria deles vinha do mundo empresarial, eram empresários, né, eles começaram a pensar: ‘como é que as empresas podem produzir de um jeito mais responsável ou menos inconsequente?’, e ai, eu entrei nisso também porque eram as causas que eu também perseguia, então, quando eu tava em terceiro setor, eu pensava: ‘como é que empresa pode se relacionar com terceiro setor? Como é que eu faço esse recurso que tá aqui migrar para cá? Para compensar, de alguma forma, o impacto negativo que a empresa gera na sua ação?’. Em 98, eu achei que o discurso, a tese que mais refletia esse meu pensamento era de responsabilidade social empresarial estava começando no Brasil, então, os primeiros momentos dessa discussão são momentos muito marcantes para mim, que eu lembro que eu queria… eu ia a empresas e queria falar de responsabilidade social empresarial como eu enxergava, como eu tava vendo e eu queria mostrar que aquele conceito era um conceito de gestão de empresas, mas obviamente, as pessoas não estavam preparadas para esse discurso e ninguém enxergava isso, por mais eloquente que eu fosse nos meus argumentos, ninguém enxergava isso. Então ficava com uma sensação estranha de que era uma espécie de ser extraterrestre que desce à terra com a missão de salvar o planeta com o dinheiro das empresas. Então, invariavelmente, as perguntas eram: “Muito legal isso que você acabou de falar, mas cá pra nós, assim, você é um cara legal, tô vendo, você é um cara do bem, tá querendo fazer bem feito, mas cá pra nós, o que isso tem a ver com negócios?”, era meio que… eu era visto como um profissional meio poeta, meio romântico, tentando fazer uma mudança, um mundo empresarial tão duro, tão cruel, tão focado em lucros, de repente vem um cara com um monte de ideias que parecem não ter conexão com isso, a impressão que eu tinha era que no fundo, o cara queria dizer: “Vá abraçar uma arvore, não dá esse teu discurso não faz o menor sentido”. E era um tempo de pouquíssimos clientes, por isso que eu ainda mantive o meu trabalho de investimento social privado até… para poder sobreviver, né, porque tinham poucos clientes no Brasil, então eu lembro que tinha a Natura, e logo depois começou o Banco Real, mas eram as duas empresas, assim, que conseguiam entender esse discurso e onde você tinha trabalho para fazer, porque nas demais, se ninguém entendia o que você estava dizendo, não podia contratar o teu trabalho, né? Mas aquilo foi ganhando forca, o conceito foi pegando corpo e já… estamos falando de 98, no inicio do ano 2000, 2002, 2003, eu já começo a perceber uma mudança importante, o tema vai saindo de uma… saindo do porão e vai vindo para a sala de estar e começa a ser discutido. Então, isso obviamente, o meu trabalho ganha muita forca, então aquelas mesmas empresas que… eu percebia até um certo sorriso irônico aqui, quando eu falava alguma coisa, alguém sorria e pensava: ‘deixa o menino terminar de falar, não vamos interrompê-los para não parecer deselegante, mas quanta bobagem, né, ele não sabe nem o que é uma empresa, tá querendo reformar o mundo, né? Aqueles mesmos interlocutores já começam a te contratar.
P/1 – E o quê que fez mudar isso, o Ricardo? A própria consciência empresarial?
R – Eu diria que a consciência empresarial. Eu continuei fazendo o meu trabalho, mas eu gosto de não ter a pretensão nunca de achar que… claro, a gente vai se melhorando, né, você vai melhorando o seu argumento, você vai apurando a sua abordagem, isso tudo você vai amadurecendo e vai descobrindo jeitos melhores de vender aquela ideias, né, mas eu acho que a própria consciência, as empresas foram percebendo que não tinha muito jeito e ai, acho que tem um marco que é 2007, que eu acho que é o grande marco dessa discussão, pra mim também é um grande marco, que é quando os cientistas do IPCC vêm a público pela primeira vez para associar a intervenção humana ao aquecimento global. O quê que eu percebo ali? Tudo que estava meio enroscado nas empresas, né, que iam num ritmo lento, aceleram. É como se: opa, espera ai, é a ciência que tá dizendo, não é mais um achismo, é: ou a gente muda ou a gente vai perecer; ou a gente descobre formas melhores de fazer negócios ou a gente vai acabar destruindo as condições da nossa própria existência do planeta. Eu percebo que ali tem um marco importante. Para mim também é um marco importante, porque a partir daquele momento, o nosso trabalho de consultoria ganha uma força muito grande, que até então, a gente não tinha. Como eu te falei, a gente atendia algumas empresas e com um trabalho muito pequeno, muito pontuais. Mas a partir daquele momento, ganha uma força grande, né? Acelera-se a urgência e ai, acho que é o momento… eu diria que a gente… se a gemente tivesse que dizer: “A gente começou em 98, mas em que momento você acha que nasce para o mundo para este trabalho?”, eu diria que é 2007. Então, de 98 a 2007, foram enfim… tinha uma pequena consultoria, respeitada, alguns clientes, mas não era… não dava para dizer: “A gente tem muito trabalho, esse tema é valorizado”, não, eu senti até alguma nostalgia dos tempos do terceiro setor e “Pô, isso era mais respeitado do que isso”, mas na verdade, fui entendendo que tinha um tempo, mesmo. E alguém já disse isso, eu nunca lembro quem disse, portanto, eu vou atribuir a um anônimo, já virou publico, né, mas quem tá na vanguarda é muito solitário, sempre. O visionário é um sujeito solitário, que ele enxerga alguma coisa que ainda ninguém enxergou e se ele quer construir isso, no meu caso, viver daquilo profissionalmente, ele vai ter que entender e ter um momento de transição, né, não vão ter clientes, telefone tocando a cada uma hora com um projeto novo. Não, era alguma coisa que eu tava ajudando a construir e ai, a partir de 2007, a gente realmente ganha maturidade, vira uma consultoria importante na área e ai, ajuda muito o fato de já estar há nove anos com a bandeirinha. Ai é que o aspecto do visionário tem um peso, porque como você já está no cenário há mais tempo que a maioria das pessoas, então, você já estudou mais, você já avançou mais, você já fez mais relações, então, isso tudo começou a pesar a favor.
P/1 – E as empresas têm real interesse em serem sustentáveis?
R – Eu acho que sim, eu diria assim, claro, quando você diz as empresas, se agente falar 100% das empresas, não, acho que não, por várias razões e a maioria dessas razoes é ilusória, bobas, assim, não fundamentadas, não informadas, mas eu acho que se você pegar um extrato específico que é… as empresas lideres dos seus segmentos, eu acho que sim, eu acho que elas já avançaram o suficiente para entender que quando a gente está pensando em um novo jeito de pensar e fazer negócios, já não é apenas um exercício altruísta, e tem um pouco de egoísmo também, né, porque a empresa tem essa: se eu não agir dessa maneira, eu mesmo, empresa, tô colocando em risco as condições para eu manter a minha perenidade. Não tem perenidade sem recurso natural, não tem perenidade sem o mínimo de justiça social, não tem perenidade se não tiver um clima controlado, equilibrado, então as empresas vão percebendo isso, porque elas fazem planejamento de longo prazo e nos planejamentos de longo prazo, a questão da sustentabilidade ou da insustentabilidade começou a entrar como cenário. Então, eu diria que essa é uma das discussões que eu mais faço quando eu ando por ai, pelo Brasil, que é tentar dizer as pessoas, porque na verdade, é assim, existe uma coisa chamada imaginário coletivo, sobre o qual não temos muito controle porque ele é imaginário e ele tá… como se fosse um conjunto de pessoas, como se fosse um cérebro só e nesse cérebro só houvesse uma série de ideias justas ou não a respeito de empresas. No imaginário coletivo, empresa não tá no lado bom. Se você pegar ainda alguns segmentos empresariais, eles, além de não estarem do lado bom, estão do lado pior, né, vistos como destruidores, capitalistas selvagens, comedores de criancinhas e maltratam a natureza, tudo que é ruim tá ali, mas tá assim, sem muita informação, né? E as pessoas vão reproduzindo o que o imaginário coletivo vai dizendo para elas, então, assim, bombeiro é legal, empresa não é legal. médico é legal, empresa não é legal. Politico é tudo uma droga… então, o mundo começa a ficar branco e preto e esse raciocínio branco e preto é o meu pior inimigo, porque na verdade, as pessoas não enxergam as diferentes matizes de cinza e principalmente, não se informam a respeito. Vou dar um exemplo clássico que eu conheço de perto. Até hoje aparece, se você for na internet e jogar m nome de… não vou mencionar oi nome de empresa aqui, mas qualquer nome de empresa ligada a chamada fast fashion, posso garantir para você que na pesquisa de internet entre as três primeiras notas virão relacionando essa empresa com o trabalho escravo. Ok, ai quando você vai olhar o fato em si, mas ai quando você começa a entrar no fato em si, você descobre que tem empresas cujo fato aconteceu em 2002 e até hoje, o fato já tá esclarecido, resolvido, a empresa já tem compliance, já… enfim, até porque você tem que ter um prejuízo grande de imagem para a empresa e ela é a primeira interessada em resolver, normalmente, é com terceirizados que acontece, como eles terceirizam muito… 2002, nós estamos em 2016, essa empresa já resolveu esse problema, já criou instituto, já tem trabalho, já tem politica de sustentabilidade, já tá fazendo e tem alguém achando ainda e achando para valer que o presidente da empresa é um cara que fica sentado na mesa dele contando quantos escravos ele vai ter e ai, é isso que eu chamo de imaginário coletivo, qual a chance que você deu para a empresa se redimir? Que é assim, nenhuma empresa quer ter seu nome associado… nenhuma empresa séria quer ter o seu nome associado a trabalho escravo, nenhuma! Eu desconheço, né, tem que ser um doente, sei lá, um maluco completo para imaginar que o cara se diverte contando escravos na linha de produção, né? Mas tem gente que acredita nisso ainda, né? Outro dia, estava almoçando… então, 2002, eu tô em 2016 e eu tava almoçando ali num restaurante legal, num shopping, uma rapaziada de 25, 26 anos, toda engravatada, ai um deles menciona o nome de uma empresa, por acaso, a primeira envolvida com esse tipo de denuncia no Brasil, quer dizer: “Não, por isso que eles são ricos”, quer dizer, a única razão é essa, porque eles exploram… então, esse raciocínio maniqueísta é um grande desafio a ser vencido porque ele tá presente em várias discussões, como por exemplo, acontece um problema como ocorreu recentemente com a Mineradora São marco e ai, você vai ter gente e eu enfrento isso em plateias, pessoas que dizem isso: “Toda mineradora é um mal, um câncer dos tempos modernos”, ok, então tá, proponho uma discussão: “O que colocamos no lugar do minério de ferro?” “Não, porque a ciência pode pesquisar materiais substitutivos” “Pode, é um fato. Hoje, diz ai o quê que a gente pode fazer, porque eu também acho mineradora um porre, mas me diz ai, porque a rigor, eu preciso de minérios”, se você pensar sua vida tá cercada de minérios, eu tô sentado numa cadeira que tem minério, quando eu pego o meu celular, tem minério e se eventualmente, eu precisar de uma UTI, tá cheio de minério ali. Eu não vou reclamar de nenhuma mineradora se eu precisar de uma UTI. Eu não consigo enxergar o minério no dia a dia e nem consigo imaginar que aquilo né importante para a minha vida, mas ele é, ele tá presente e para eu ter um elemento substitutivo, tem que ter pesquisa, desenvolvimento e esse elemento substitutivo, ele tem que chegar para mim com um custo que eu possa pagar. Por isso que tem mineradoras, só por isso, porque senão, teria sei lá, xyzoras, eu não sei qual é o próximo elemento substitutivo, mas as coisas são feitas de coisas, portanto, se um dia não precisarmos de minérios, algum elemento substitutivo vai haver. E ai, eu começo a propor uma discussão mais passional, primeiro, eu desarmo, descontruo o argumento e ai, começo a dizer assim: “Bom, talvez fosse o caso de pensar, já que a gente não vai conseguir escapar do minério, como é que pode se minerar de um jeito menos impactante para a sociedade, para o meio ambiente”, enfim, acho que essa é a discussão e a tendência dessa discussão é ficar num campo muito radical de opiniões radicais que não são opiniões que constroem nada, são opiniões que destroem muito e acho que talvez, a melhor experiência, assim como eu aprendi organizações como o Green Peace, acho que também aprenderam, né? Quando você vê o modus operandi do Green Peace quando eles nasceram e compara com os de hoje, hoje o Green Peace é muito mais de composição do que de oposição. Ele entendeu que não adianta, é legal, teve o tempo de eu me colocar na frente dos arpões, dos barcos e dizer: “Olha que legal. Mas agora eu preciso compor mais”, e talvez esse seja o desafio mais importante do trabalho que eu faço no dia a dia, é mostrar que é possível um outro jeito de pensar em fazer negócios com ética, com transparência, com responsabilidade, com integridade, com respeito ao outro e com cuidado com o meio ambiente. Aliás, essa é uma definição perfeita do que seria sustentabilidade para uma empresa hoje. E se a empresa fizer desse jeito, ela já tá sendo mais sustentável do que ela foi um dia e isso para todos nós só vai trazer resultado positivo. Mcdonalds tá ai também para provar, né, as empresas como de fast food são talvez… estejam entre as empresas mais combatidas do planeta, duvido que haja… e talvez as de transgênico, né, acho que depois de Mcdonalds, talvez Monsanto, né, empresas mais combatidas, mais duramente agredidas e questionadas . Elas foram buscar outros caminhos também, né? Então tem um jeito de fazer diferente.
P/1 – Você podia falar um pouco sobre a plataforma de liderança sustentável?
R – Sim. Eu acho que a plataforma… então lembra que eu contei na minha história… a plataforma de liderança sustentável, ela tem para a minha carreira um peso tão importante quanto o marco de 2007, quando a empresa dá um salto, quanto a minha entrada no campo da responsabilidade empresarial em 98, quanto a minha entrada em 94 na gestão de terceiro setor, ela tem um peso de um marco e por que um marco? Porque em 2009, eu já tava há 11 anos trabalhando com responsabilidade social empresarial. Eu já tinha alguns clientes legais e eu lembro que eu encaminhava proposta de trabalho para esses clientes e essas propostas ficavam na etapa um, às vezes, tinham seis etapas. E o cliente realizava a primeira etapa e parecia já: “Olha, tô satisfeitíssimo, tá muito bom isso aqui, eu nem imaginei que eu fosse fazer essa mudança”, eu olhava para aquilo e pensava: ‘mas que mudança? A gente nem começou a fazer mudança. Como é que essa empresa tá tão satisfeita? Não é possível que ela não tenha uma ambição maior, eu não tô propondo algo para terminar na etapa um, tô propondo algo para começar na etapa um’. E aquilo me gerava um pouco de frustração porque eu pensava: ‘eu não tô conseguindo ir até o final com o meu trabalho. Meu trabalho é assim, é como se eu fosse um dentista que faz um primeiro atendimento e descobre que você tem nove dentes que precisam ser tratados e ai, você vem a primeira vez, eu trato o primeiro e você diz: Já tá bom, hein! Muito obrigado, eu já tô me sentindo melhor, eu olho no espelho, a minha boca já tá mais bonita, não dói mais nenhum dente, muito obrigado”’, mas ai olhar e falar: “Espera ai, não acabou o tratamento”, enfim, era o que eu ouvia e aquilo começou a ficar frequente, chegando a um ponto que eu comecei a pensar e essa foi a primeira vez que eu pensei: ‘qual é o meu legado? O quê que eu quero deixar com este trabalho que eu faço há tanto tempo?’, porque não é só um trabalho de consultoria, lembra o que eu te falei, o trabalho pra mim é uma causa, então eu não trabalho porque eu sou obrigado trabalhar, não trabalho para, exclusivamente, ganhar dinheiro e pagar as contas. Eu trabalho porque o meu trabalho pode transformar, é nisso que eu acredito. Então, eu me senti me enganado um pouco. E ai, eu chamei a minha equipe e disse: “Olha, a gente precisa tentar entender porquê que em algumas empresas a sustentabilidade avança mais do que em outras?”, e quando digo avança é deixa de ser um conjunto de projetinhos, porque isso qualquer empresa tem e entra na estratégia, mudando o jeito de pensar e de fazer negócios. Esse era o meu dilema. Eu olhava para as empresas e na minha análise parecia não ter nada a ver com aquilo que a gente acha que tem a ver, dinheiro, porte, não, não parecia ter a ver. Ai, o que fizemos? Uma pesquisa com 50 lideres empresariais para tentar entender porquê que avançava mais em umas e menos em outras e ao final, a gente chegou a um estudo que apontou cinco fatores comuns nas empresas que avançavam mais e o mais importante desses fatores comuns era presença de uma liderança forte sentada na cadeira de CEO de presidente, que era um apaixonado pelo tema. Isso é que fazia a diferença, não era dinheiro, não era a estrutura, não era ser nacional ou multinacional, nada disso, era isso, era convicção de fazer e poder de fazer. Ai eu pensei: ‘puxa, se esse negócio de liderança é tão importante assim, eu vou me envolver numa aventura que é tentar entender como pensam, agem, tomam decisões e em que valores acreditam lideres desse tipo’. Claro que esses lideres não estão dando em arvore, né, então tinha que escolher, eu fiz um trabalho de seleção e ai, produzi o meu primeiro livro chamado “Conversas com lideres sustentáveis”, esse livro é de 2010. Quando eu tava terminando o livro, eu tive uma sensação, um insight muito interessante de que eu tinha um conjunto de histórias ali muito legal, mas que um livro seria um instrumento insuficiente para fazer essas histórias ganharem corpo e disseminação e ai, eu convidei alguns dos lideres que estavam lá para virem comigo em alguns encontros regionais em que eles contariam as suas histórias no objetivo ou na missão de inspirar outros lideres a agirem da mesma maneira. Então, a minha ideia era… é a ideia do livro, originalmente, mas essas histórias ao tão legais que eu quero mostrar para uma nova geração de lideres que é possível ser bem sucedido e sustentável e que não existe nenhuma incompatibilidade, pelo contrário, entre ter lucro e ser sustentável, né? Bom, bonito no papel, como fazer? Alguns lideres toparam, vieram comigo, a gente começou a fazer encontros e ai, eu vi que eu tinha uma missão muito pequena, porque eu não achava que era um assunto que ia atrair tanta gente. Eu achava que iria ter alguns grupos de pessoas interessadas e os primeiros eventos, eles vieram com tanta gente, um público tão jovem, tão interessado naquilo, que eu pensei: ‘nós temos uma… isso não é um evento, isso é um movimento, é o peso de um movimento’. Mas é claro que sendo uma empresa pequena, como é que eu articularia um movimento grande? Ai, eu comecei a pensar neste… no que era um evento de um ano em algo mais longo, que teria cada ano um tema e a cada ano, eu convidaria dez presidentes para integrarem a plataforma a partir de um tema novo e assim, nasceu a plataforma Liderança Sustentável. Mas a grande resposta para aquela minha dúvida de como é que eu faço essas histórias chegarem a um maior número de pessoas veio com o insight de um comunicador que eu sou na origem. Linguagem audiovisual, redes sociais, é este mundo novo que está surgindo, este mundo me traz possibilidades que eu não teria há 15 anos atrás. para eu contar a história desses lideres, eu teria que somar as audiências de todos os eventos físicos que eu pudesse fazer e obviamente, eu não conseguiria arrastar esses presidentes comigo para muitos lugares, né? O que eu fiz? Usando a metodologia… inspirado na metodologia do TED, eu comecei a definir encontros em que eu chamava esses presidentes, eles têm 12 minutos para contar as suas histórias, suas histórias viram uma vídeo-palestra que depois, é disseminada pelas redes. E hoje, essas vídeo-palestras, são mais de 70, já foram vistas por 1.800 mil pessoas. A gente já fez 300 encontros regionais, a gente já falou para 90 mil pessoas presencialmente. Todos esses números são muito maiores do que eu imaginei há cinco anos atrás, quando a gente começou e agora, a plataforma virou um movimento de verdade, com gente espalhada pelo Brasil e pessoas que disseminam esses conteúdos pelo interesse de ver ou de contribuir para a formação de uma geração de lideres mais sustentáveis. Então, já são seis livros, portanto, seis temas indo para o sétimo, agora, mais de 70 presidentes integrados e o movimento tá ai, firme e forte, mesmo sendo tocado por uma empresa pequena.
P/1 – Quais são os valores de um líder ser sustentável?
R – Um líder sustentável, ele tem seis competências que o distinguem de um líder convencional. A primeira delas é que é um líder que acredita e prática no dia a dia da gestão os valores que estruturam o conceito de sustentabilidade, que para mim, são cinco: ética, transparência, diversidade, respeito ao outro e cuidado com o meio ambiente. Tudo que você falar em sustentabilidade hoje se encaixa num desses cinco temas. O líder sustentável é alguém que entende isso, valoriza isso, mas acima de tudo, pratica isso no dia a dia da gestão. Então, não é aquele cara que desliga o botãozinho do individuo quando entra na empresa, né, é aquele cara que é do mesmo jeito, ele acredita nesses valores e na hora de tomar decisões, ele considera esses valores. A segunda competência tem a ver com a capacidade que esse individuo tem de criar sinergia e mobilizar recursos e pessoas em torno de ideias de sustentabilidade. Normalmente, um líder sustentável é um pregador de sustentabilidade, é um assunto que ele gosta, que tá no dia a dia dele, tá na agenda dele, que ele leva para as reuniões, que ele mostra para as pessoas, ele convence as pessoas de que aquilo é importante. A terceira característica é coragem para tomar decisões que às vezes, vão contra a lógica convencional, resiliência para encarar as muitas adversidades que virão e coerência entre o que diz e o que faz, que sem coerência, não consegue convencer ninguém de que aquilo é legal. A quarta competência é entender quais são os grandes temas de sustentabilidade do seu negócio, que tem a ver com os impactos, colocar isso no centro da gestão, na estratégia, identificar os benefícios, enxergar oportunidades e inovar para melhorar e já tem um bocado de lideres legais fazendo isso no Brasil, embora a maioria das pessoas nem saiba que isso tá acontecendo. Quinta competência, todas elas são igualmente importantes, uma visão sistêmica e uma noção de interdependência acima dos lideres convencionais. Então, são lideres que enxergam todos os impactos do negócio, enxergam de um modo amplo e conseguem perceber que qualquer um desses impactos aqui, por menores que sejam, vão prejudicar a vida de quem tá próximo, mas também a vida de quem tá longe. Então, eles conseguem ver que a gente tá num mundo interdependente, tudo e todos estamos interligados e o meu impacto não prejudica só a minha comunidade, ele prejudica o mundo, o planeta. E a última é lideres sustentáveis são jardineiros, sobretudo, eles não são militares, não são lideres no sentido do comando militar, são jardineiros, eles criam as condições nas suas organizações para que outros lideres sustentáveis brotem e floresçam. Então, eu definiria um líder sustentável a partir dessas seis competências.
P/1 – E tem alguma experiência mais significativa, assim, de uma empresa que você testemunhou negócios sustentáveis?
R – Tem vários. Vários, porque na verdade, assim, como a gente trabalha com story telling, o que não falta são histórias legais e mobilizadoras, mas tem uma que eu gosto muito que é de um líder da plataforma, chamado Paulo Nigro, ele foi presidente da Tetra Pak, de embalagem, hoje ele tá no Aché Laboratórios. Ele é um líder muito carismático e muito empolgado com o tema, é aquele líder que eu chamo de brilho no olho, né, quando ele vai falar no tema, ele se transfigura, ele vira uma outra pessoa. E ai, contou uma história que tá no primeiro livro que é uma história que eu reproduzo muito do que seria, por exemplo, você colocar valores no centro de decisões empresariais. Em 2009, a Tetra Pak se viu como todos nós no olho de uma crise internacional, foi aquela crise financeira começada nos Estados Unidos e ai, crise, some o dinheiro da praça, recessão no mundo todo e obviamente, as empresas brasileiras também sentiram isso, não foi uma marolinha como queria dizer o nosso ex-presidente, foi uma crise mesmo e ai, num dado momento dessa crise, Tetra Pak também estava envolvida nessa crise, obvio e ai, chega o principal executivo do meio ambiente da empresa e diz: “Paulo, temos um problema”, ele falou: “Bom, temos vários problemas, mas qual é o problema de sustentabilidade que você quer dizer que nós temos?” “A ideia é a seguinte, a gente criou uma rede de catadores de embalagens nossas, capacitou essa rede, tirou os caras da rua, que eram aqueles caras que moram na rua, capacitou, organizou esses caras em cooperativas e hoje, eles conseguem ter um rendimento super digno para alguém que até pouco tempo atrás, morava na rua. Só que assim, eles precisam vender o papel. Nessa crise, eles não vão vender, não tem mercado, porque na verdade, você imagina, como o papel é uma commodity, cai o preço da commodity papel, papel reciclado desaba, né? Perde o preço total. Então assim, se eles não venderem, não só eles têm problemas, nós também teremos um problema porque todo nosso discurso de sustentabilidade se estrutura em torno da ideia de ampliarmos o potencial de reciclagem das nossas embalagens, já que esse é o principal problema desse setor. O que fazer?” Paulo falou: “Bom, você tem uma sugestão? Você tem uma solução para o problema? não me ocorre nada”, ai esse executivo falou: “Olha, o que me ocorre, a única que me ocorre É uma solução custosa, que é a seguinte, quando você não vende um produto agrícola por exemplo, o quê o produtor faz quando o preço tá ruim? Estoca. Segura”, para o preço voltar a melhorar, senão, o cara vai queimar toda aquela produção e aquilo não paga nem o custo que ele teve. Acontece com soja, café, milho, enfim, ai o Paulo Nigro diz: “Bom, temos uma solução cheia de problemas, o primeiro problema, tem um custo. Segundo problema, isso não é decididamente o nossos negócio, o nossos negócio é fabricar embalagem. Terceiro, não sei o tempo que essa crise vai levar, portanto, uma dose de incerteza brutal, além de eu não saber quanto vai custar. Quarto, não tá no meu orçamento, portanto eu não sei nem da onde eu vou tirar esse recurso para fazer. Ou seja, temos um grande problema aqui e quinto, claro, minha cabeça fica a prêmio, né, porque se tudo isso aqui der errado, como é que eu vou convencer os suecos de que isso aqui era importante?”, ai ele parou, pensou e no dia seguinte, ele deu uma resposta para o executivo que era: “Vamos estocar”, e assim foi por um período de quase um ano e tal e aquela estocagem foi fundamental para a cooperativa não se desmantelar, para as pessoas se manterem unidas e trabalhando. Bom, ai eu perguntei, falei: “Paulo, o que te levou a tomar essa decisão? Porque ela não é uma decisão dentro da curva, ela é fora da curva, qualquer líder convencional que eu conheço tomaria uma decisão baseada na dimensão econômica, crise, um mundo de incertezas, como é que eu vou fazer isso aqui? Isso é totalmente fora da curva, nenhum líder…”, ainda brinquei com ele: “Nenhum líder que eu conheço faria isso, o que te levou a fazer?”, resposta, e essa é uma resposta de líder sustentável: “Não dormiria à noite tranquilo se no pior momento, naquele em que os nossos parceiros – assim, que ele chama – catadores de ouro precisaram de nós e nada fizemos por eles”. Ai, eu olhava e pensava assim: ‘é muito simples essa frase, mas essa frase carrega em si uma dose de altruísmo que é absolutamente incomum no mundo empresarial, não é uma decisão dentro da curva, nenhum líder convencional tomaria porque envolve risco, custos e incertezas e líder empresarial detesta custos, riscos e incertezas, mas o cara toma a decisão baseado num princípio cristão, né, porque o principio é de eu preciso ajudar, eu preciso estar presente, eu no posso estar ausente e a visão era: eu tenho que apoiar, eu tenho que estar junto, né? Então, essa é uma das muitas histórias que a gente conta que mostram como é que você pode conciliar virtude com interesse, que não é uma tarefa muito simples no mundo empresarial, mas que vale a pena… me dá uma sensação boa saber que tem gente nas empresas pensando assim.
P/1 – Você percebe então uma mudança no perfil do consumidor de quando você começou a trabalhar para agora?
R – Sim, é uma mudança no perfil, a percepção do consumidor sobre o tema sustentabilidade avançou muito, mas eu acho que o muito que avançou ainda é insuficiente. É uma constatação que eu já fiz em vários artigos que escrevi, lendo e interpretando pesquisas, não são muitas, mas as pesquisas disponíveis mostram que o consumidor brasileiro, se comparado a um consumidor europeu, ele tá muito distante do que a gente poderia classificar como um comportamento de consumo consciente. As pesquisas que eu mais respeito nessa área são de uma organização chamada Marketing Analysis com uma outra organização internacional chamada GlobeScan que fazia um comparativo mundial. No Brasil, o capitulo foi feito pela Marketing Analysis que já tá meio velha, que é de 2010, se não me falha a memória. Mas eu duvido muito que tenha evoluído mais do que aquilo que tava lá. Em 2010, a pesquisa já dava conta de que no Brasil pouquinho menos do que dois em cada dez consumidores, 1.8, 1.9 consumidores entre dez consideram fatores de sustentabilidade na hora de escolherem uma empresa, a ponto de premiar uma marca que seja mais responsável e punir uma marca menos responsável. Na média dos europeus são oito entre dez, então ai tem um gap grande, que eu atribuiria a algumas questões: qualidade de educação básica, no Brasil, nossa educação básica é muito ruim, as pessoas não leem rótulos, não sabem o que estão comprando, em regra geral, são muito desinformadas sobre tudo, não só sobre empresas responsáveis ou não. Isso ainda não é um valor para a nossa sociedade como é para os europeus, mas por que isso é um valor para os europeus e não é para os brasileiros? É porque isso não tá num projeto de país, entendeu? Os europeus têm um compromisso de mais de 30 anos com o, Protocolo de Quioto, 30 anos trabalhando o mesmo tema, né, botando na educação das crianças, na escola básica, discutindo na mídia, mudando atitudes de como tirar as embalagens, como mudar embalagens, como reduzir embalagens, como desenvolver produtos menos impactantes. Tudo isso é criando uma cultura e as pessoas vão valorizando isso socialmente. No Brasil, isso não acontece, né? No Brasil, é uma decisão de algumas empresas, as mais conscientes, mas você não tem aqui uma pressão para que isso aconteça. Eu não vejo… eu vejo escolas ocupadas, pessoas nas ruas questionando a opção A ou a opção B, politica eleitoral, mas eu não vejo ninguém questionando se uma empresa produz de um jeito menos impactante ou mais impactante. E tem uma outra coisa que tem a ver com a nossa cultura além disso, de não estar entre os nossos valores, uma outra questão importante que é no Brasil, nós somos muito mal acostumados, a gente lida no Brasil com a ideia da abundancia e não da escassez e para mim, a ideia de escassez é altamente educativa. A abundancia é péssima do ponto de vista pedagógico. Se você for a um shopping center, você vai observar, o que e uma cena comum numa praça de alimentação. Você vê a mamãe comprando… ela tem três filhinhos pequenos e ela vai num fast food da vida e compra o maior sanduiche, o maior pacote de batata frita e o maior refrigerante para os três. Esse não é o raciocínio da minha mãe, de 30 anos atrás, 40 anos atrás. O quê que vai acontecer presumivelmente? Nem o maiorzinho vai comer tudo, quanto menos o pequeno, então, o que sobrou ali na verdade dá uma quantidade de dois lanches, dois refrigerantes e duas batatas fritas. A minha pergunta é: por que a mãe comprou três? Não teria sido mais inteligente comprar um ou dois e dividir? Não, mas compra três. Considerando que ok, se você não comer, não comeu, deixa ai e depois, vai ter uma senhora que vai limpar e vai jogar tudo isso no lixo. A gente tem uma ideia de abundancia ilusória sobre água no Brasil. Eu aprendi na escola, lá atrás, que água é um recurso que jamais faltaria no Brasil, a palavra “jamais” foi colocada. Hoje, a gente tá vivendo uma situação de escassez. Os momentos que a gente mais aprendeu no Brasil, que mais evoluiu do ponto de vista de consumo consciente foram os momentos de escassez, que ano são comuns, é isso que nos atrapalha. Um momento de escassez importante, altamente pedagógico aconteceu em 2001, crise de energia, apagão. A gente viveu uma série de apagões no Brasil. E ai, o governo veio a público para pedir às pessoas, implorar, né, não foi pedido, foi implorar para as pessoas que elas economizassem energia. Então, se você tem quatro lâmpadas, tira duas. Usa menos o chuveiro, porque o chuveiro é intensivo no uso de energia elétrica e por i vai. Naquele momento, se você lembrar, algumas pessoas lembrarão disso, foi o momento que surgiu no Brasil o selo Procel de eficiência energética. O Inmetro criou um selo que vinha em todos os equipamentos elétrico-eletrônicos para medir o nível de eficiência energética. Quando começou, tinha a setinha vermelha, amarela e verde e ai, as pessoas mais inteligentes, informadas olhavam aquele selinho e diziam: “Não, eu quero esse mais verde aqui”, pagavam um pouco mais pelo produto, mas sabia que ele era menos impactante porque ele economizava energia. O quê que aconteceu nesse período? O selo Procel, hoje, se você observar, não tem mais vermelho, ninguém produz mais no vermelho, por quê? Porque a indústria descobriu que se você tem que produzir bem, vamos produzir bem, por quê que eu vou produzir uma porcaria do ponto de vista de eficiência energética se o meu concorrente já fez um negócio melhor e o preço é igual? Hoje, uma empregada doméstica consegue olhar para o selo Procel e entender muito rapidamente porquê que é importante a eficiência energética. Aprendemos com isso, mas porque vivemos um momento de escassez. Quais são os momentos de escassez que a gente vive no Brasil? Muito poucos, Falta comida pra gente? Não. Falta água pra gente? Em circunstâncias especificas. Não falta muito pra gente, né? Os japoneses, pra mim, são um exemplo totalmente oposto do que eu tô dizendo, eles têm uma expressão que é típica da cultura deles e não tem uma tradução especifica que é “Mottainai”, Mottainai era uma prática que a minha mãe já fazia sem saber que ela era uma prática milenar ou talvez secular no Japão e que é o seguinte, como eu sou um país de recursos escassos, como é o Japão, o Japão não tem nada de recurso natural, nada, é só a inteligência das pessoas que moram lá, né, que sabem criar do nada. Mas como não tenho muita coisa, eu tenho que valorizar tudo que eu tenho e eu não posso, por exemplo, deixar nada no prato, porque não faz sentido, não tem… por quê que eu vou deixar? E a expressão Mottainai é isso, seria alguma coisa como o não desperdício e que qualquer criança japonesa sabe o que significa. Mas a criança brasileira não sabe o que significa. Então, a criança brasileira, embora ela tenha mais informação do que a criança que eu fui, né, da minha geração e até de uma ou duas gerações depois, ela também ainda tem a informação errada. E ela tem uma informação que vai… que é mandada para o racional dela, né, para o lado direito do cérebro. Mas ai, ela vive, na verdade, numa sociedade em que não tem escassez, é tudo abundante, né? Eu lembro que uma vez, eu montei uma palestra que eu fiz em algumas escolas que era muito divertida, eu fiz porque a minha filha me provocou, eu fui fazer na escola dela e depois, eu achei divertido fazer, que era: “Por que eu preciso mais do que um tênis Nike para viver?”, e era curioso porque eu contava isso e os jovens adolescentes falavam: “Mas tio, eu quero ter mais do que três tênis”, eu dizia: “Por quê?”, e a resposta porque não tem nenhum fundamento prático, eu quero porque eu quero, porque eu acho legal, porque eu não quero repetir o modelo, mas tudo isso é produto de uma cultura que empurra o brasileiro de modo geral e eu não tô falando só de classe alta, não. É geral. Empurra o brasileiro para um consumo mais perdulário de tudo, de água, de energia, de produtos. Aqui, na verdade, o objeto de consumo de classe média baixa é tênis, sempre foi, tênis de marca. Um tênis que no shopping custa 500, 600 reais e que um menino de favela muito dificilmente conseguiria ter, né? Não fosse botando todo o salário que ele ganha no primeiro mês ou no segundo no tênis ou pagando o tênis em 20 vezes ou roubando o tênis do menino de classe média alta. Então, acho que ou a gente muda a nossa visão de país e começa a valorizar ou a gente vai ter mais uma geração perdulária, né, porque assim, eu não vejo… eu tô realmente pessimista em relação e eu sou um cara otimista em regra geral, mas eu não sou muito otimista quando eu vejo o espaço que é conferido ao tema dos discursos de lideres políticos e eu não tô vendo que isso vai melhorar, porque na verdade, não tô vendo que em 2018, esse tema ganhará uma expressão maior do que ele teve agora ou do que ele teve em 2010 que eu lembro que… 2010 foi interessante porque todos os candidatos estavam com os seus discursos prontos: educação melhor, saúde melhor, melhorar economia e ai, apareceu a Marina Silva com o discurso de sustentabilidade, o que obrigou todos os outros a colocarem nos seus programas, mas assim, me parece ainda, aquilo que eu faço porque é remédio amargo, eu tenho que tomar porque se eu não fizer, eu não vou parecer moderno e eu tenho que parecer moderno. A questão é: eu acredito naquilo, efetivamente? Eu acredito que aquilo é um valor? Eu não vejo que a questão de sustentabilidade tá colocada num projeto de país do tipo: que país nós queremos ser? A gente tem tido o azar de nos últimos anos de ter uma visão muito mais centrada em projetos de poder do que em projetos de país, então, acho que o salto só virá quando a gente colocar esse tema e ai, a experiência europeia acho que é a mais ilustrativa no projeto de país que queremos, né? Nesse país em que queremos viver, qual é o espaço que consumo consciente vai ter? O quê que eu tenho que fazer para que as pessoas sejam consumidores conscientes? Tem muito trabalho para ser feito, ainda.
P/1 – Na tua visão, como que essa mentalidade pode ser transformada? De que forma pode conscientizar crianças, pode conscientizar políticos?
R – É, eu não sei se eu tenho uma resposta, essa é uma pergunta de difícil resposta, mas eu diria assim, eu aprovo todos os movimentos de incluir sustentabilidade no currículo escolar, desde que isso não seja visto como a disciplina chata que: “Agora é aula… tinha aula de Educação Física, agora é aula de… ai, que porre, vai vir aquela professora chata para falar que a gente tem que plantar a arvorezinha e não pode comer no Mcdonalds”, entendeu? Se for por ai, nós não vamos avançar. Então, é incluir na educação, mas não como algo chato e restritivo e ai, é um grande risco de que isso aconteça, mas como algo cool, bacana, legal, como projeto de um mundo melhor para viver, como uma coisa certa a ser feita, como aquilo que vai nos trazer enorme beneficio para todos nós. Acho que esse é um passo importante. Colocar, fazer com que políticos pensem nisso, eu acho que o politico é um bicho muito oportunista em regra geral, ele observa o que as pessoas querem, o que tá no discurso e ai, acho que o marketing, se chama marketing politico, eu prefiro dar o nome de marketing eleitoral, para mim faz mais sentido, mas o marketing eleitoral é um prestador de serviços grande que é pegar o tema que as pesquisas qualitativas mostram que é o tema legal e incorporar no discurso do candidato. Se você fizer isso hoje, qual é a tendência? Não tá no discurso do cidadão comum ou ele não é visto como prioridade, então não vai aparecer nas pesquisas qualitativas e a chance é de que o politico não veja isso como algo importante. Eu acho que a gente já teve até algumas mudanças importantes, mas eu queria até pegar como exemplo, a ideia, o projeto do prefeito de São Paulo atual de aumentar as ciclovias. Não é uma ideia do tipo ovo de Colombo, basta observar o que tá sendo feito no mundo, né, as capitais todas no mundo estão resgatando esse modal de transporte, ele humaniza a cidade, faz bem para a saúde e tal, uma série de coisas, o prefeito fez isso, não fez da forma mais adequada, é um fato, né, teve muitos problemas na implantação do projeto, houve um certo açodamento, do tipo: “Vamos acelerar o processo, senão, não termina antes da próxima eleição”, que a nossa lógica é um pouco isso, agora, enfrentou muita resistência, né? E as resistências vêm das pessoas que vivem numa cidade voltada para o carro, para o transporte individual, mas teve a coragem de fazer, teve a coragem de propor e assim, quando você começa a conversar com as pessoas, os usuários acham muito legal e os não usuários não acham ruim, apenas questionam ou criticam a maneira como foi feita, né, não dá para ter uma ciclovia passando na porta de uma escola, coisas do gênero, debaixo de um viaduto. Erros de projeto feito às pressas. Agora, ninguém questiona que isso é legal para uma cidade. Já tem ai, um modelo de cidade, né, tô vendo já nas plataformas dos novos prefeitos de Salvador, o de Vitoria, todos falando: “Vamos forrar de ciclovia a cidade”, né? Era uma ideia até um certo ponto ingênua que enfrentou muita resistência em São Paulo e agora, começa a ser vista como algo legal para humanizar as cidades. Eu acho que em consumo, talvez, a gente precise de outras medidas que não só as educativas. Eu sempre acho, assim, tô repetindo o que eu ouvi de um grande especialista, mas é a minha visão também, eu acho que a gente deposita demais expectativas no consumidor e acha que o consumidor se aponta a mudar, se aponta para fazer um movimento de pressão que vai mudar a maneira que as empresas produzem. não é isso que tá acontecendo, as empresas estão mudando a maneira de produzir por consciência, não estão esperando essa pressão, até porque há quanto tempo a gente tá esperando essa pressão? Eu trabalho com o tema desde 98, tô esperando desde 98, não tá acontecendo. E eu não tô vendo essa pressão acontecer o ano que vem ou no próximo ano. Então, eu acho que a gente deposita expectativas demais. Talvez, governos devam também criar politicas públicas que estimulem as empresas a produzirem de um modo mais sustentável ou pagando menos imposto, por exemplo, tributando menos. E deixar que… eu acho que o processo do consumidor é muito mais lento, ele não virá nessa geração, talvez precise de umas três gerações, desde que a gente faça tudo certinho, esteja no dia a dia das escolas, esteja no dia a dia das pessoas, seja uma prática mais comum.
P/1 – E quais são as coisas mais importantes para você, hoje?
R – Amplamente?
P/1 – Amplamente.
R – Eu diria que do ponto de vista profissional, para mim tá muito claro que aos 52 anos e tendo feito tudo que eu já fiz, às vezes, eu sempre olho para tudo que eu já fiz e eu imagino que é bastante coisa para uma pessoa, uma trajetória profissional. Eu acho que é assim, a minha grande preocupação nesse momento é o legado do meu trabalho, é o legado de conhecimento que eu já acho que é um legado consistente, mas mais do que o legado de conhecimento, é o legado das realizações para fazer a agenda de sustentabilidade avançar no Brasil. Por exemplo, trabalho há muito tempo com conhecimento, mas o quê que o meu conhecimento tem… em que ele tem ajudado a por exemplo, melhorar o nível de consciência do consumidor? Muito pouco, porque enfim, eu tenho os meus limites, não consigo chegar a todos os consumidores, mas eu quero usar o conhecimento, a experiência e a trajetória e a capacidade de influenciar para ver se eu consigo ajudar em acelerar essa agenda do Brasil nos próximos anos. Então, tudo que eu tenho pensado no escritório hoje de projetos novos são projetos extremamente grandes e impactantes, não tem mais nenhum projeto em que eu queira me envolver que não tenha essa característica, porque ai, a minha preocupação profissional hoje é legado, é o que eu deixo de legado e tem que ser um legado que mude a vida das pessoas e não um legado para ser reconhecido daqui a 60 anos: “Um dia teve um cara chamado Ricardo Voltolini que fez isso, fez aquilo e fez aquilo outro”, mas um legado que mude já… eu quero ver a mudança em vida, não quero ver o reconhecimento pós mortem, eu quero ver isso acontecer. E do ponto de vista pessoal, eu acho que eu busco cada dia mais uma integração daquilo que eu sou com as causas que eu defendo, então como eu disse, para mim o trabalho não é um trabalho, o trabalho é uma causa, então preciso de forte envolvimento para funcionar. Se não tiver envolvimento, eu pulo para outra causa. Neste momento, eu tô querendo ser apenas mais um sujeito integrado, que consegue viver bem, respeitando os seus limites, as suas crenças e convicções, mas tentando fazer sempre algo mais do que aquilo que tá fazendo, o que em alguns momentos, enlouquece a minha equipe, lá, eles ficam sempre esperando qual é a próxima, né? E quando eu digo que tem uma boa ideia, eu já nem sei se eles ficam felizes ou eles ficam com medo do trabalho que vai dar essa boa ideia, mas eu acho que hoje eu tô… acho que para mim, a ideia de felicidade tá muito ligada ao que os gregos chamavam de areté, que é cumprir um propósito, então eu já entendi qual é o meu propósito e eu quero cumprir ele bem. Então, isso pra mim, vai me dar uma noção de que minha existência fez algum sentido e que ela foi útil de algum modo.
P/1 – E como é que foi contar a sua história aqui?
R – Pois é, curioso que eu estava pensando nessa pergunta, eu não sabia que você ia fazer essa pergunta de como foi contar a minha história aqui, mas curioso que nas ultimas três respostas para você, eu comecei a pensar que essa pergunta viria e assim, primeiro, eu queria te dizer quão estranho foi para um contador de histórias dos outros contar a sua própria história. pensando bem, eu acho que eu nunca tinha vivido essa experiência, ela foi inusitada pra mim, eu fui percebendo enquanto eu contava quão inusitada era e agora, no final, eu fui também me dando conta de quão bacana é isso, né? Talvez tenha materializado, consolidado na minha percepção da importância do Museu da Pessoa. Eu tinha um ideia de que era importante, mas eu não tinha vivido essa ação de contar a minha história e acho que isso foi ficando cristalino para mim, nos últimos dez minutos, assim, como é legal contar isso e talvez, a gente não tenha nenhum momento específico na vida para fazer este… esta história aqui em alguns minutos. Então, diria que foi uma experiência bem legal, bem bacana assim, acho que foi gostoso contar a história, foi legal.
P/1 – Tem alguma coisa que você não falou e que gostaria de falar?
R – Nossa, eu acho que eu falei muito, até, né? Eu contei bastante coisa, eu acho que talvez, eu não contei um pouco… ao falar essa história do legado, a ideia de legado antes para mim era muito abstrata, né, e eu lembro da primeira definição de sustentabilidade, não sei se você conhece, mas a primeira definição de sustentabilidade, quando pela primeira vez aparece esse nome, ele aparece num documento de 1987 assinado pela ex-Primeira Ministra da Dinamarca Gro Brundtland e esse documento chama-se “Nosso Futuro Comum”, é um documento muito propositivo de um mundo melhor, de um planeta melhor e pela primeira vez, aparece o conceito de desenvolvimento sustentável como algo que respeita as três dimensões: a econômica, ambiental e a social. Isso é de 1987. E ao longo, portanto, bem antes de eu começar a trabalhar com sustentabilidade e ao longo dos anos, eu venho trabalhando por acreditar nisso como uma… por crença, talvez por fé, porque é muito abstrato tudo isso a rigor, eu sei que isso faz bem para todos nós, mas é abstrato. A ideia de sustentabilidade ficou menos abstrata com o nascimento do meu neto. Isso é um fato que precisa ser registrado na minha história, porque pela primeira vez, aquela conversa… na verdade, eu não falei qual era o conceito, o conceito era desenvolvimento sustentável é um desenvolvimento que permite que produzamos e que consumamos hoje sem desgastar as condições e os recursos para que as próximas gerações também produzam e consumam. Então, tem ai uma… um conteúdo subliminar de ética, né, esse é o certo a se fazer, é o melhor a se fazer e o contrário seria o pior a se fazer, mas para mim era muito abstrato, agora quando nasce um neto, você tem ideia do que é a próxima geração. Quando nasce o filho, não, você tá muito envolvido com o filho, normalmente, o filho vem quando você tá mais jovem também. Quando você tá mais jovem, você tá vivendo a tua vida sem pensar muito, sem pensar em legado, legado é aquilo que você constrói no dia a dia. Quando vem um neto, a ideia das próximas gerações fica muito concreto, acho que a ideia do neto transformou o que era um conceito muito abstrato num conceito muito concreto para mim. Hoje, para mim o legado é deixar, é fazer com que o meu trabalho contribua para melhorar o mundo em que o meu neto vai viver, porque ele tá com três meses hoje, né? Nós estamos em novembro de 2016, então eu quero que nos próximos 20 anos, 30 anos, a gente tenha conseguido mudar mais substancialmente algumas coisas que ainda não mudamos. Obrigado.
P/1 – Obrigada.
R – Obrigado pela oportunidade.
FINAL DA ENTREVISTA
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