P - Bom, para começar, gostaria que você se identificasse: nome inteiro, local e data de nascimento. R - Bom, eu sou natural do Rio de Janeiro, nasci no Engenho Novo, em 23 de outubro de 1948. Completei 50 anos em 1998, foi comemorativo, fizemos uma festa lá no Play, onde foi convidada toda a minha equipe. É uma data que realmente não se faz duas vezes, nem os 100 anos, que é difícil chegar, só os nossos antepassados, né? Entrei na Rhodia... P - Seus pais eram do Rio? R - É, meu pai era do Rio de Janeiro, minha mãe também, só que pela parte de mãe eu sou descendente de italianos, sou neto de italiano, né, família Salomoni, apesar de eu não levar esse sobrenome. E meu pai também é do Rio de Janeiro, militar, coronel do exército, reformado, da infantaria. Herdei lá uma arma alemã, mas eu não gosto particularmente de armas, então ficou lá na casa dele, que ele tem em Visconde de Mauá, Itatiaia, né? Apesar da minha mãe ser separada dele, eu convivia com os dois. Perdi minha mãe agora há um ano e meio, né? P - Quantos anos você tinha quando seus pais se separaram? R - Ah, eu devia ter uns três anos de idade. P - Você tem irmãos? R - Eu tinha um irmão, faleceu vai fazer 12 anos, morreu com 40 anos. José Maurício Carvalho de Abreu, stress, fumante, gordo, quer dizer, somatório, o dia-a-dia, né, coração, infarto... Mas ele relaxou, porque ele estava muito stressado com... Foi propagandista, foi representante também. P - Da Rhodia? R - Não, o primeiro laboratório dele foi o Sarsa, que foi o Silva Araújo, que vai pertencer à Rhodia agora futuramente, do Grupo Hoechst, Merrell. HMR, não? Ele trabalhou no Sarsa, depois na Johnson, e depois num laboratório pequenininho, um tal de Purdui. Chegou a trabalhar na distribuidora, e depois comprou uma farmácia em Jacarepaguá. Mal de propagandista. Ou acaba numa distribuidora, ou é dono de farmácia. Mas aí ele voltou a jogar, corrida de cavalos, pôquer,...
Continuar leituraP - Bom, para começar, gostaria que você se identificasse: nome inteiro, local e data de nascimento. R - Bom, eu sou natural do Rio de Janeiro, nasci no Engenho Novo, em 23 de outubro de 1948. Completei 50 anos em 1998, foi comemorativo, fizemos uma festa lá no Play, onde foi convidada toda a minha equipe. É uma data que realmente não se faz duas vezes, nem os 100 anos, que é difícil chegar, só os nossos antepassados, né? Entrei na Rhodia... P - Seus pais eram do Rio? R - É, meu pai era do Rio de Janeiro, minha mãe também, só que pela parte de mãe eu sou descendente de italianos, sou neto de italiano, né, família Salomoni, apesar de eu não levar esse sobrenome. E meu pai também é do Rio de Janeiro, militar, coronel do exército, reformado, da infantaria. Herdei lá uma arma alemã, mas eu não gosto particularmente de armas, então ficou lá na casa dele, que ele tem em Visconde de Mauá, Itatiaia, né? Apesar da minha mãe ser separada dele, eu convivia com os dois. Perdi minha mãe agora há um ano e meio, né? P - Quantos anos você tinha quando seus pais se separaram? R - Ah, eu devia ter uns três anos de idade. P - Você tem irmãos? R - Eu tinha um irmão, faleceu vai fazer 12 anos, morreu com 40 anos. José Maurício Carvalho de Abreu, stress, fumante, gordo, quer dizer, somatório, o dia-a-dia, né, coração, infarto... Mas ele relaxou, porque ele estava muito stressado com... Foi propagandista, foi representante também. P - Da Rhodia? R - Não, o primeiro laboratório dele foi o Sarsa, que foi o Silva Araújo, que vai pertencer à Rhodia agora futuramente, do Grupo Hoechst, Merrell. HMR, não? Ele trabalhou no Sarsa, depois na Johnson, e depois num laboratório pequenininho, um tal de Purdui. Chegou a trabalhar na distribuidora, e depois comprou uma farmácia em Jacarepaguá. Mal de propagandista. Ou acaba numa distribuidora, ou é dono de farmácia. Mas aí ele voltou a jogar, corrida de cavalos, pôquer, essas coisas, e começou a degringolar. Então, aquilo foi um somatório, o cigarro, o dia-a -dia, a obesidade, então, ele infartou e relaxou, porque ele começou a sentir dor de manhã, e só foi procurar o médico às 7 horas da noite. Então a área isquemiada estava muito grande, não teve jeito. Para a minha mãe foi um baque danado, era o meu irmão mais velho, mas é a vida, né? P - E onde você morava na sua infância? R - Eu nasci no Engenho Novo, morei lá um período. Meu pai era militar, viajava, eu com dois anos morei em Guaíra, lá no sul, perto das cataratas. Da minha infância eu não lembro muita coisa, não. Engraçado, né, tem gente que lembra. De infância, assim, eu tenho passagem, de comentário, mas lembro que convivia muito, eu me dava bem com pai e mãe, apesar de serem separados. Não afetava em nada. P - Eles eram rigorosos? R - Meu pai era mais rigoroso. Minha mãe era de falar, mas sempre aliviava. Eu tinha um gênio meio difícil, também, eu era carne de pescoço. P - O que você fazia? R - Assim, coisa de garoto, entendeu? Gostava muito de jogar bola, mais basquete, pela altura, não era muito futebol, não. Meu filho atualmente é que gosta muito de futebol, mas parou. Porque não tem peixe, morre pagão. Eu jogava bola de gude, soltava pipa, como toda a criança normal, né? P - E escola? R - Olha, eu era meio rebelde na coisa de estudo. Eu gostava muito de matar aula, de soltar pipa, faltei em muita aula. Mas depois engrenei, e inclusive hoje eu até me senti um pouco prejudicado. Na época em que iniciei na Rhodia, a Rhodia não gostava que estudasse, que ia atrapalhar, e eu interrompi a faculdade e não terminei. Hoje, não sei nem se tenho paciência de voltar. P - A Rhodia não dava incentivo? R - Não, naquela época, não. No início eles não gostavam. 1975, eu entrei na Rhodia, dia 1 de abril de 75. Dia da Mentira; única coisa que foi verdade foi que ingressei na Rhodia, né? É o que eu estava te falando. Passar 24 anos - que eu vou completar agora na empresa, dia primeiro -, é uma vida, né, a gente tem orgulho de trabalhar numa empresa. P - Você ficou morando nessa casa de infância quanto tempo? R - Eu morei uns... desde... Eu o nasci no Engenho Novo, na Condessa Belmonte, fui para Guaíra, depois retornei para ali, fiquei mais uns três anos, vivi um bom período no Grajaú... P - Seus pais já estavam separados? R - Já, quando voltamos já estavam separados. Morei uns 12 anos no Grajaú e depois o restante passei a maior parte na Tijuca, né? Morei na Lúcio de Mendonça, até meus 18 anos. P - Como era o Rio de Janeiro nessa época? R - Oh, aquela época do bonde, tem umas passagens legal. Aquela turma de bagunça, de garoto, de jovens, 17 anos... Um período lá, não sei o que houve que minha mãe mudou para Marzibar, pertinho da Lúcio de Mendonça, nós moramos numa casa ali. Marzibar 1001, eram duas casas iguais. Casa 1 e casa 2. Aquela turma de colega ficava duvidando: "Pô, quero ver tu jogar ovo lá no bonde." Jogava ovo no bonde. P - Da casa 1 ou da casa 2? R - Não, da minha casa, jogava o ovo no bonde, mas não ficava ali na porta, senão o cara... Jogava ovo dentro do bonde, pegava naqueles cara de terno, uma sacanagem, né? E a gente saía correndo. Aquela época também de um trambiquezinho de leve, um trambiquezinho, troço besteira, né? Porque você vivia duro, não trabalhava, então, chegava no bar: "Pô, me vê um Hollywood aí." Eu observava a geladeira lá no fundo, aí o cara: "Pô, agora vê um guaraná bem gelado." O cara ia buscar o guaraná e eu já estava na outra esquina. Não tinha dinheiro para comprar cigarro, entendeu? Golpe de garoto jóia, né? Fora as listas que a gente fazia de festa que não tinha, para poder arrumar dinheiro para ir para o cinema fim de semana (risos) para namorar, né? Mas a gente organizava, na juventude de 15, 16 anos, muita festa junina, na própria Lúcio de Mendonça, onde a gente morava, era uma festa tradicional lá na Tijuca. Depois a gente começou a conviver com o pessoal da Morais e Silva, ali pertinho, perto do... Não sei se você conhece a Tijuca. Conhece? Então, a gente tinha aquele grupinho, começamos a organizar as festas na Morais e Silva, e elas começaram a ficar tradicionais lá na Tijuca. P - É mesmo, o que tinha na festa? R - As barracas tradicionais de pescaria, de bola nas latas, quadrilha, música ao vivo, tudo, para o pessoal dançar. Todo mundo ficava aguardando aquela época de junho, julho. Então, foi uma infância legal. Apesar de eu ter meu irmão, naquela época, a gente não saía muito junto, cada um tinha a sua turma, cada festa a gente estava junto, mas não saíamos juntos. Diferença de um ano e 11 meses, mas a gente saía para jogar. Quando tinha 18 para 19 anos eu também joguei pôquer, mas isso na época em que eu era solteiro, depois eu larguei, não era viciado. Gostava, mas corrida de cavalo, como ele jogava. Eu nunca fui viciado. P - Ele já jogava na época? R - Já, jogava em corrida de cavalo. E é um jogo que não leva a nada, é um jogo roubado, que o próprio jóquei pode puxar, né, está o favorito lá, ele joga até no outro. Jogo de bicho, eu nunca gostei, entendeu? E corrida de cavalo, a minha experiência foi muito pequena. Jogava assim aqueles bolos de bookmaker, né, que quem fazia mais ponto, ganhava. Se você ganhasse, tudo bem, ganhava dez reais, falando do dinheiro de hoje, se lembrar do dinheiro daquela época, você não sabe se era cruzeiro, dez mil réis, ou o que era. (risos) Então, mas nunca fui de viciar, como ele era. O que levou ele para o buraco foi até o jogo, né? Então, me orgulho de trabalhar nessa empresa e, da minha vida, desde que eu comecei a trabalhar, em 1969... P - Que idade você tinha quando arrumou seu primeiro emprego? R - 69, eu tinha 20 anos. 20 para 21. Comecei no Banco Boa Vista, que era da família Guinle. Fui caixa. P - Como você conseguiu esse emprego? R - Olha, foi um colega de infância também. O nome dele era Hélio, e o apelido era Hélio Morcego, que era um escurinho. Eu estava trabalhando no Boa Vista... E eu comecei a namorar a minha atual esposa, que era de Rio Bonito, no estado do Rio de Janeiro, né, caminho de Araruama, fica a uma hora e pouco do Rio, e eu conheci em Maricá. Foi amor de carnaval. Eu conheci ela no carnaval em Maricá, em 1967, vim a casar no dia 22 de maio de 71. Então, ela é mais velha que eu oito anos, hoje está com 58, eu estou com 50. Esse negócio de idade não quer dizer nada, né, você vê aquele artista da televisão, o Marcos Frota, casado com uma garota... O cara tem quase 50 anos a garota tem 21 ou 22 anos. Tem 20 anos de diferença. Ele tem 42, parece, e ela 21, uma coisa assim. Eu vivo muito bem, tenho um casal de filhos, meu filho hoje está com 26 anos, beirando os 27, e minha filha tem 20 anos, se formou professora. Fez vestibular, passou para comunicação e marketing, né, e o meu maior orgulho de estar nessa empresa é que meu filho hoje trabalha na Rhodia, né? P - Mas vamos voltar um pouquinho. Lá no banco, o que você fazia? R - No Banco Boa Vista eu entrei em agosto de 69, trabalhei na matriz, no repasse, que é onde você aprende a contar o dinheiro, lá no buraco, mesmo, lá em baixo, no subsolo, e lá eu aprendi a contar. A gente chamava aqueles pacotes de notas de mil cruzeiros, naquela época, de fofoca, que aquilo tinha um cheiro... Acho que eu tenho o nariz entupido até hoje daquele cheiro ruim de dinheiro velho, pô, era terrível, nota de mil cruzeiros... Contar aquele pacotão, contar no dedo, mesmo. Hoje eu vejo os caixas de banco, eu conto melhor que esses caras. Porque o nego não tem... Por exemplo, ele entra hoje como caixa executivo, entra no fogo, na fogueira, vai para o caixa e não sabe nada, não faz um treinamento, sabe? Ele aprende ali, mexer no computador, a pagar, mas contar dinheiro, o cara fica contando assim, sabe? Aí, eu conto olhando, é... Eu dou um vareio nesses caras, tanto é que inclusive, a nossa experiência era tão grande, eu fiquei quatro meses na matriz aqui na Candelária, né, ainda é ali a agência central, e depois fui para a agência de maior movimento no Rio de Janeiro, que era a agência Cinelândia. O nosso gerente na época, eu fui de 69 para 70 para lá, quando nós fomos tricampeões, em 70, acho que você devia estar nascendo. Se é que já estava nascida, acho que nem estava nascida em 70 (risos). Agência de maior movimento, maior muvuca mesmo, o gerente lá era Melo Sabugosa. Família Sabugosa, riquíssima em Portugal, inclusive até depois vieram a falecer uns parentes dele, ele herdou uma herança fabulosa, e ele veio a ser gerente da Vistacredi, que era a financeira do Banco Boa Vista. Ele saiu da gerência da agência e assumiu um cargo de chefia. Cara com grana para caramba. Então, eu fiquei ali de 69 até 72, final de 72. Aí, eu fui convidado, por um amigo da minha esposa, que era gerente do Bamerindus, me convidou para ganhar X+ Y do que eu ganhava no Boa Vista, e para depois assumir cargo de chefia, era um elemento de confiança dele. Pô, eu relutei para caramba. Ele disse: "Não, vem morar aqui perto da gente." Ele morava em Icaraí. Pô, você vê. Só que eu fui, acabei aceitando. P - Você estava com que idade? R - Estava na faixa dos 23 anos. Eu aceitei e fui, né? Só que eu quebrei a cara. Sorte que eu fui morar em Boa Esperança com o meu sogro, porque aquele salário que ele tinha me prometido... Eu perdi dinheiro, não em termos do ganho, mas ele me dava por fora, então, não aumentava o meu fundo de garantia. Vamos dizer que eu ganhasse 500 mil, ele me dava por fora, mas não compensava, porque não entrava na hora de, por exemplo, 8%, se fosse ganhar mil reais, que ele me prometeu, ele me dava 500 por fora, e 500 do banco. Então, caiu para 50% a arrecadação do meu fundo. Eu fiquei lá, ralei para caramba, fui tesoureiro, mas aí, com o advento da saída dele... A agência terrível também, a Visconde de Uruguai, eu acordava... Fiquei lá 11 meses, um ano. Mas era bravo, porque eu tinha que pegar o ônibus, passava 5 e 15 da manhã, para chegar em Niterói às 7 e 10, mais ou menos, e sair disparado igual um maluco, porque a rodoviária era ali perto, e não tinha ônibus, porque era na Visconde de Uruguai, a agência do Bamerindus. Eu tinha que sair disparado, a pé, né, chegava suadão já no banco, um calor desgraçado. Porque, naquela época, abria a agência 8 horas, mas quando não abria, que começou a abrir às 11, ou às 10, você trabalhava interno. Tinha que estar lá às 8 horas da manhã. E, para voltar para Boa Esperança, eu tinha duas opções: voltar às 6 e 15, ou 7 e 25, para chegar às 9 da noite lá. Pô, eu nunca conseguia pegar o de 6 e 15. Tinha um monte de coisa para fazer. Teve uma época em que fiquei estressado, cansado mesmo. Tinha época que chegava e não queria nem jantar, não agüentava. Estava morto. Era o dia todo, né, a tensão de dar 8 caixas do banco, uma agência brabíssima, né? Para ganhar o dinheiro do INPS fazia uma fila imensa, né, então nessa época ralei muito. Meu irmão já era propagandista, ele trabalhou primeiramente nas Lojas Americanas, depois veio a ser propagandista do Sarsa, como te falei. Aí comecei a dar uma futucada, ver se ele arrumava, e ele conseguiu através do Bira, do falecido Bira, que foi muito meu amigo, que trabalhou com a gente aqui na Rhodia. Eu ingressei no Pinheiros, quer dizer, desse meu primeiro emprego, Boa Vista, eu pedi demissão, que eu não consegui ser mandando embora, os caras me queriam lá. No Bamerindus eu não consegui também, e tive que pedir demissão (risos). Nos três empregos que eu tive, em todos os três tive que pedir demissão. Aí, eu fui convidado para o Pinheiros-Sintex Brasil, Divisão Pinheiros. Depois houve a fusão com o Laboran, né, depois da minha saída, e hoje vai ser Rhodia também, porque a fusão... P - Você tinha 24 anos? R - Tinha 24 anos. P - Que foi esse amigo do seu irmão que arrumou... R - Depois que eu ingressei no Pinheiros... O nosso escritório era na Coronel Cabrito, em São Cristóvão. P - Que foi para ser propagandista vendedor? R - Propagandista, vendedor, cobrador. O PVC, naquela época o PVC. P - O que você fazia naquela época? Você lembra de algum produto? R - Lembro, lógico. Eu lembro. Meu setor era da Glória ao Leblon, por dentro e por fora, até a Rocinha. Grande para caramba. Eu ia da Glória, Largo do Machado, Laranjeiras, Ipanema, Copacabana, Leblon, até o morro da Rocinha, lá dentro. Era um setor grande para caramba. Então, a gente fazia propaganda, 30%. Mais de 70 % de venda, porque era muita farmácia. Então, a gente tinha o carro-chefe, que era o Naprosin, que existe até hoje, depois vinha o Flanax, que era... um é sódico, e outro é cálcico. O sódico era o Naprosin, depois lançou o Flanax, que era o cálcico. E lembro também do lançamento do Topsin, que era uma pomada. Inclusive a gente fez uma música, o lançamento foi lá no hotel em Nova Friburgo, e fizemos uma musiquinha de carnaval que era assim: Topsin, Topsin, Topsin é assim que a vovó passava. Pô, tinha uns caras inspirados na época. Então, era interessante. P - Como você abordava o médico? R - Naquela época a gente era meio cru. A gente não tinha um treinamento muito adequado, fazia as reuniões, mas não era um negócio tão exigido. A gente era decoreba, né? No início, no meu tempo, era um negócio papagaio. Então, você não tinha muito a parte técnica. Você conhecia o produto superficialmente, não profundamente, como a gente tem hoje, curso de treinamento, reciclagem, isso e aquilo, que você hoje conversa com o médico de igual para igual sem precisar puxar uma peça. Você tem a peça como apoio. Por exemplo, a gente está lançando um conceito agora de analgesia pré-impetigo. Tudo bem, você começa a manusear para poder ter apoio, muitas vezes o professor da anestesiologia não gosta e a gente conversa. Fala das características do produto, onde vai agir, inibindo o receptor n-metil despartado--???, e batendo papo. Você tem aquilo como apoio. Mas você tem que conhecer onde ele age, o que ele faz, posologia, analgesia. Pré-imptil é o que? Antes da incisão, você fazia 15 minutos antes, entendeu? Então, voltando à época do Pinheiros, foi uma época legal, e a gente tinha um plano, até nós ganhamos uma polaroid agora, e me lembrei daquela época. Porque a gente tinha uma cota para cobrir e, vamos dizer, a gente fazia uma previsão para farmácia X e vender 50 Naprosin. Aí, se a gente triplicasse aquele pedido, o cara ganhava uma máquina de calcular, e se a gente quadriplicasse, ganhava uma polaroid. Aquelas polaroids não eram iguais às de hoje, né, aquilo, depois de três meses, sumia, e a foto ia clareando. (risos) É, mas é mesmo, hoje em dia você vê, pô, perfeição. Essa que nós ganhamos, ainda hoje quando eu fui pegar umas fotos que minha esposa separou, minha filha tinha posto um filme na máquina, tinha batido uma foto, ficou perfeita. Uma comadre nossa que estava lá, ficou legal. Você vê uma daquela antiga, não deve ter mais nada, deve ter sumido tudo. 25 anos contados, só está o papel. Aí, o que aconteceu? A minha esposa é professora, ela entrou para Escola Noel Rosa em 1973, em Vila Isabel também. Ela trabalhou lá muito tempo e aí conheceu uma colega que o marido dela trabalhava na Rhodia, o Jorge, que veio a ser o meu primeiro gerente na Rhodia. Ele soube da vaga e perguntou se interessava, a minha esposa comentou com a Nilza, que é a esposa do Jorge, que eu era propagandista do Pinheiros, e comentou: "Será que ele não quer ir lá? Tem uma vaga na equipe do meu marido." P1 - Mas você estava pensando em sair? R - Não, mas é o tal negócio, né? Quando você inicia na propaganda, o teu sonho é sempre crescer e ir para uma empresa em que lutou há 24 anos e para mim é a segunda família, né? Porque você passa mais tempo dentro da tua empresa, apesar de a gente trabalhar externo, mas a gente convive mais com os colegas no dia-a-dia do que dentro de casa, que você vai mais para dormir, né, e fim de semana. É a tua segunda família. Então, hoje, se eu disser para você que amanhã se eu sair da Rhodia e não vou sentir, claro que eu vou sentir. Pô, passei a metade da minha vida dentro da empresa. É o meu quarto emprego, e do Pinheiros eu pedi demissão também. P - Você nunca sacou o fundo de garantia? R - Não, eu saquei. Mas eu vou te contar a passagem. Mas aconteceu o seguinte. Em 1975 surgiu o convite, e estava para vir a fusão, já. Pô, qual era a do meu gerente lá do Pinheiros: "Não, dá uma segurada que nós vamos cortar e a gente manda você embora." Passei nos testes, era Passos o nome dele. P - O que tinha tido, teste? R - Você fazia os testes, prova de conhecimentos, entrevista, falava com o gerente... Porque tinha o gerente regional, mas tinha os dois assessores dele, que eu não me lembro agora o nome do cargo, o Fontenele deve ter falado, não me lembro bem o nome do cargo, era o Jobrar e o Elomar , que eram tipo assistentes do Passos, né, do falecido Passos. Então, a gente passava por aquele crivo, tinha teste psicotécnico... Sabe que eu nem lembro se fiz na época? Teve, sim, teve. Era até uma firma que fazia. Então, eu pedi demissão lá. Aí, quando eu soube, 20 dias depois, houve a fusão do Pinheiros com o Laboráfico, ficou Sintex Brasil Divisão Pinheiros. Então, o que aconteceu, pelo amor de Deus, o ... não falou nada. Aí, o que eu fiz? Eu pedi liberação de um dia e fui a São Paulo falar com o Maurício, que era o gerentão: "Pô, Maurício, pedi demissão tem 10 dias, minha mãe foi operada, estou no perigo, preciso daquele dinheiro, libera aí o meu fundo." E, aí, liberou. Peguei o meu fundo de garantia. (risos) P - E a mãe estava a perigo ou era papo? R - Nada, operou nada. Foi conversa fiada. Coisa de carioca para poder pegar o dinheiro, né? A gente tem que inventar uma historinha triste. (risos) Entendeu? E aí eu consegui tirar o dinheiro, e os outros eu tirei também. Do Boa Vista e do Bamerindus, que eu arrumei um advogado: "Dá um jeito lá de sacar." Eu dei 10% para ele, saquei, e usei o dinheiro. Não tenho mais resíduo nenhum. Mas foi bom, porque mexeu tanto no dinheiro. Você vê, viração de moeda, cruzado, e não sei o que, foi descapitalizando, quer dizer, eu toda a vez que eu posso mexer, eu mexo. Sempre abati na prestação, naquela época se quitava um apartamento com o Fundo de Garantia, o que tinha um imóvel. Em que ano foi? 80. Era o meu primeiro imóvel, foi lá na Boca do Morro do Cachoeirinho, um conjunto perto do Marcílio Dias Muniz. Eu quitei esses imóvel, morei lá uns dois anos, barra meio pesada, criança pequena, depois resolvi alugar lá, aluguei para um colega da Rhodia, o Irineu. Eu era o maior incentivador para o cara comprar um apartamento: "Pô, você está pagando aluguel." Apesar de ele ser meu inquilino, né? "Tu tá pagando aluguel rapaz. Aí mesmo no conjunto, você procura que vai encontrar." Hoje ele é proprietário, mora lá até hoje. Ele já saiu da Rhodia, está na Martins. Aí, eu fui morar de aluguel na Morais e Silva, numa casa que pertence a uma falecida amiga da minha mãe. Ela morava embaixo e eu morei em cima. Retornei, né? Porque quando eu casei, eu morei ali. Eu morei um ano em Niterói, ali na Marechal Deodoro, no centro, em 71. Em 72 eu vim morar na Morais e Silva, na Oto de Alencar, transversal da Morais e Silva. Cheguei, fiquei apertado, morei uns tempos com a minha mãe, um ano e pouco, entrei para Rhodia, em 74 eu já estava morando na Morais e Silva, na Oto de Alencar de novo. Em 75 morei na rua Uruguai, num conjunto, morei uns quatro anos, aí veio aquela onda de denúncia vazia, eu alugava um apartamento, a mulher me meteu uma denúncia vazia, vamos dizer, pagava 100 reais de aluguel, uma hipótese, como dinheiro de hoje. Eu propus a ela aumentar 20%, que foi mais ou menos a minha média de aumento, ela não aceitou e me meteu a denúncia vazia. Eu tinha três meses para sair. Nessa época eu consegui comprar um imóvel, primeiro imóvel, que foi um estímulo para mim. Vivi tão apertado que aí comecei a fuçar daqui e dali, entrei para uma cooperativa e comprei esse imóvel. Vim a quitar em 1979, 80, com esse dinheiro que eu juntei, arrumei com a minha madrinha mais uma graninha, e comprei uma casa em Saquarema, que hoje o Artur, um colega nosso, diz que é a mansão do Dick, né, ele me chama de Dick Vigarista, safado. Aí, a casa não era de laje, é uma casa de telha pintada, né? Comprei essa casa em 88, vai fazer 11 anos. E foi interessante essa compra. Porque nós fomos ver uma casa lá no Boqueirão em Saquarema, e gostamos da casa, que era apertadinha, dois quartos, e na volta a minha esposa tinha um primo que morava nessa rua Rio das Flores, em Saquarema, e fomos lá, numa época até de Páscoa, mais ou menos em abril. Aí nós passamos lá para ver como é que estava, comentamos com ele que estávamos comprando uma casa no Boqueirão, e: "Pô, porque não falaram, essa casa aqui do lado estava para vender." Quando nós olhamos: "Pô, deixa dar uma olhada." Ficamos doidos pela casa. Cinco quartos, quer dizer, uma casa simples, não tinha laje, a outra tinha, mas era o ideal, a família da minha mulher é muito grande. Ligamos para o cara, o dono, que era filho do Ari Barroso. O cara era meio maluco. Flávio Rubens Barroso, Ari Barroso era aquele da gaitinha, da aquarela brasileira, né; ligamos para o cara e ele estava dormindo. Isso num sábado. E eu desesperado, temendo que estivesse vendida. Não me lembro se era 500 mil cruzeiros, e eu tinha assim por volta de 430 mil cruzeiros, estava faltando 70 mil, que eu arrumei emprestado. Essa minha madrinha. Ai o que aconteceu? Eu liguei 4 horas. "Pô, o cara vai dormir o dia todo?" Aí, 5 e pouco eu consegui falar com o cara, que já estava apalavrado com uma outra pessoa. Aí falei: "Seu Flávio, aqui é o Marco Aurélio, primo do Nelsinho, seu vizinho aqui de Saquarema. Estou sabendo que o senhor está querendo vender a casa." "Não, mas já está vendida." Aí ele disse que era de porteira fechada, né, sem tirar nada. Com tudo dentro. Mas ele disse: "Então, vamos fazer o seguinte - estava vendendo por 450 - você me dá 500 mil." E eu disse: "O que é isso?" Mas fiquei de ver. E me virei e fechei com ele. Mas aí eu fiquei preocupado. O cara era cheio de manias, não andava de carro, só de ônibus, eu ofereci uma carona, eu morava na Barra, me propus de apanhar ele na cada dele, e ele disse: "Não, não gosto muito de andar de automóvel." E eu disse: "Pô, esse cara roeu a corda com o outro, vai roer comigo também." Aí, marcamos 11 horas, e ele nada de chegar, levamos uma canseira, o cara chegou uma hora e meia atrasado, mas chegou, né, acabamos comprando. Agora teve uma passagem interessante... P - Mas nisso você já estava trabalhando na Rhodia? R - Já, 78 já... P - E na Rhodia você começou trabalhando como propagandista? R - Como PVC. P - E você trabalhava em que região? R - Aqui mesmo. Na região do Rio, Região 4. Só que o escritório era na Senador Dantas. P - Copacabana, Ipanema... R - Não, não. Região 4 era centro da cidade mesmo. Não sei se era 4 na época. Atualmente é 4. Eu fazia centro da cidade. Ali a Rio Branco, a Presidente Vargas, e essas ruas internas todas, Ouvidor, Buenos Aires, fazia o Hospital do Carmo, fazia o Hospital Traumato-ortopedia. P - E fazia consultório também? R - Consultório, naquela época era consultório. "Com licença doutor." P - Como era a abordagem? Quais eram os produtos? R - A gente trabalhou muito com o Vogalene, que era antihemético. O Nootropil, que era o carro chefe na época. Eu não lancei Nootropil, porque foi lançado em 73, e nós fizemos o relançamento do produto em 76. Fontenele no depoimento dele deve ter dito, né, que o Nootropil, no lançamento, chegava a se falar quase uma hora, o médico não queria ouvir, mas o cara ficava tão embasbacado com a mensagem, que era um negócio sensacional. Atuava no neurônio, a casa de força da célula, é um negócio bacana mesmo, um produto em que o neurologista não acreditava, mas receitava porque sabia que todo mundo estava usando. Não acreditava mas prescrevia. O neurologista era meio cético, né? P - Por que ele não acreditava? R - Ele achava que não dava resultado, mas ele usava. Porque era coisa do momento, né? Realmente, não era um produto que fazia efeito a curto prazo. Era um negócio que você começava a ter resultado a partir de 35 dias, 40, você começava a sentir a melhora. Aumentava a libido, principalmente no paciente idoso, a memória realmente melhorava, o estresse, aquela coisa toda, né, do dia a dia. Atuava lá na casa de força da célula, no neurônio, na mitocondria, né? Era um estudo bacana, rapaz, um negócio profundo, você tinha que conhecer para caramba para falar aquilo para o médico. P - Qual o treinamento que você teve? R - Eu não peguei o lançamento, né, eu já peguei um relançamento, e tinha que estudar o produto todo, saber de cabo a rabo onde agia, no espaço intercináptico de um neurônio. Entendeu? Um troço profundo. P - Não tinha material para vocês utilizarem? R - Tinha. Monografia, a literatura era enorme, por isso que eu estou falando, rendia. Você ia, começava, se alongava, o cara perguntava uma coisa, e você ficava de bate papo só no diálogo, né, não era papagaio, naquela época você já tinha que ter conhecimento. Então, era uma grande diferença do Pinheiros para uma Rhodia, porque você já vai mais profundo no estudo do produto, conhecer mais profundamente. O papagaio era decoreba. Você pegava o plano de ação e pá, decorava. P - Quando você saiu do Pinheiros, a Rhodia já se diferenciava? Você escutava falar alguma coisa? R - Eu acho que a Rhodia já era diferenciada em relação ao Pinheiros. Era, sim. Porque não era entre os quatro primeiros, mas era entre os 12 primeiros. Era um laboratório conceituado, já tinha um respaldo... Rhodia francesa, a Escola Americana, também. Merrell, outros laboratórios, a Roche, acho que é alemã, se não me engano, a Hoechst também alemã, e tinha laboratórios que eram mais bem vistos, então, você ia trabalhar num Millet Roux, numa Rhodia, num Sarsa, Merrell, também, naquela época na Hoechst. Era um laboratório que quando eu tinha assim por volta de uns 14 anos, eu balancei. Eu fui trabalhar na Praça Saens Peña, fui convidado, e eu só não fui porque foi em detrimento da saída de um colega, que era meu amigo. Quando me disseram que ele ia sair, eu me desculpei e não aceitei. Porque eu estava trabalhando. E ele estava lá havia pouco tempo. E eu não saí, e graças a Deus estou aqui, e estaria na Rhodia novamente, né, com essa fusão que vem aí, entendeu? É um negócio gozado, né, o mundo dá muita volta. Você quer que eu conte a passagem, o negócio da casa, um negócio interessante que aconteceu? P - Pode contar. R - Então, o cara falou que não ia tirar nada. Não, primeiro ele disse o seguinte: "Eu vou tirar a televisão." Era uma televisão colorida grandona, acho que era 24, 21, não sei, aquele móvel de madeira, trambolho, inclusive, né? "Ah, pode tirar, não tem problema." Tinha duas estantes, ele ia tirar uma, e ia tirar mais um outro bagulho, uns livros que ele tinha, né? Aí, ele deu uma dúvida lá, na hora que foi fazer a escritura, disse que não ia tirar mais nada. "Então tá bom." Aí, num fim de semana, nós fomos lá, a caseira ligou um dia dizendo que a ex-mulher do cara, a mulher que viveu com ele, foi lá, arrombou a casa, arrancou o portão, levou o portão, levou a televisão, levou a estante e foi embora. Levou... Era advogada. Eu liguei para ela e passei-lhe o maior sabão. "Olha, sabe que a senhora fez invasão de domicílio? Eu comprei o imóvel, a senhora já sabia? Se a senhora tivesse ligado para mim e me pedido as coisas - porque ele tinha falado que ia tirar - se você tivesse me pedido, eu deixava. Mas fazer o que você fez? Você, como advogada, sabe que eu poderia meter uma ação contra você." Passou uns tempos, aí, naquele tempo era um fusquinha o carro da Rhodia. E a gente tinha por hábito botar um segredo de combustível no piso, que cortava o combustível. Se o ladrão entrasse, você apertava, ele andava com o combustível que estava no motor, mas cortava na borrachinha em baixo. E nesse dia estava eu, minha esposa, minha filha era pequena... P - A Rhodia dava o carro para trabalhar e você usava... R - Usava fim de semana. Foi mais ou menos em 82, já tinha uns quatro anos a casa, né? Aí a gente bateu numa poça dágua e com o impacto cortou a borrachinha, abriu lá embaixo, e o combustível não ia para o motor. Então, ficou vazando. Aí, eu imaginei que fosse aquilo, apertei para não perder o combustível. Nem sei, né, não entendia nada daquilo e fui me meter a mexer naqueles troços... Chovia, né? Estava uma amiga da minha mulher, minha garota e minha mulher. Aí, eu falei para elas: "Vou fazer sinal, vocês pegam um ônibus, eu fico aqui, você avisa lá." Porque o meu cunhado mora em Bacachá, que é segundo distrito de saquarema, e eu pedi para avisar, para elas irem de ônibus e avisarem meu cunhado, que entendia, por favor, voltar para me ajudar. E eu ficaria ali. Mas aí, ficamos fazendo sinal e parou uma Fiat mais na frente, o ônibus parou, próximo. Elas falaram: "Não, vamos pegar carona." "Não, o cara vai se mandar quando a gente chegar perto." Ai, o cara veio dando marcha a ré. Resolvemos ir no carro. Aí, o cara: "Você vai para onde?" "Vou para Saquarema." "Eu também vou para Saquarema." "Será que você podia levar elas, a minha filha e a bagagem? Eu vou ficar aqui esperando o meu cunhado." Ele disse: "Não, o senhor vai ser assaltado aí, vem com a gente, pega tudo e deixa o carro aí." Nós fomos, começamos a conversar. Eu falei que tinha comprado a casa na avenida Saquarema, no 1207. "Pois é, aquela casa era da minha mãe." "Da sua mãe?" Pô, o cara era o filho da dona. Eu esculhambei com ele dentro do carro dele. "Pô, você teve coragem de ir na minha casa, arrancar meu portão, levar minha televisão? Pô, que história é essa? Tua mãe foi errada para caramba." (risos) Esse mundo é muito pequeno, eu esculhambei com o cara dentro do carro dele. "Fica pela carona?" "Fica pela carona." Tem uns troços interessantes. Bom, mas voltando à Rhodia, né? P - Naquela época, como o médico recebia o propagandista? R - Tinha médicos e médicos. Tinha uns que gostavam da propaganda, e outros que recebiam para não ficar desatualizados, mas não gostavam. Ficavam ali, olhando para você, mas você percebia que o cara estava distante, e de repente estava pensando no que vai fazer no fim de semana. Porque realmente, 20, 30, você aturar propagandistas e um monte de papagaios na tua frente, porque se o cara perguntasse alguma coisa, era tudo decoreba. Mas ele recebia realmente para ficar atualizado. Porque se ele não recebe uma propaganda, se ele não vai participar de um congresso, ele vai ficar totalmente desatualizado, não é verdade? Então, acontecia esse lance. Você sentia. A Rhodia criou uma ficha num certo período - não sei se foi, deixa eu ver, 1981 -, uma ficha de segmento. Onde você tinha todos os dados do médico, desde o CRM ao endereço da residência particular, telefone da residência dele e o hobby, um negócio muito importante, que era um quebra-gelo. Então, o que o cara gostava de fazer? Pô, gostava de jogar tênis, gostava de cinema, colecionava arma. Então, a gente começou a se modificar em relação às demais propagandas, negócio bacana, e você fazia um quebra-gelo. O cara atendia 15 propagandistas, 15 colegas na tua frente. Você, em vez de entrar com uma propaganda, você ia logo no hobby do cara. Olhava a ficha antes: "Doutor, e aí, vai jogar aquela partida de tênis nesse fim de semana?" E, nas entrelinhas, você falava do Profenid, entendeu? Você quebrava aquele gelo. O cara está lá, já está de saco cheio de ouvir 15 falando de remédio, né, aí você vai, e pergunta sobre o que ele gosta de fazer: "Vai jogar esse fim de semana? Vai lá para tua casa lá em Araruama? Vai pescar?" Entendeu? Então, você quebrava aquele impacto, o cara estava lá, preocupado, uma sexta-feira, de saco cheio, a sala de espera cheia de pacientes, e 10 propagandistas dentro da sala dele para falar com ele, e ele já não agüentando mais, e aí você vinha, e você já era recebido diferenciadamente. Porque você criou uma imagem diferente perante o médico. E acho que dali, também, não sei se alguém já fazia, mas eu acho que se começou a observar a mudança na propaganda de outros laboratórios também. Houve uma mudança assim, bacana, né, eu acho que deixou de ser aquela do tagarela, do papagaio, de ficar enchendo o saco, e você se aprofunda mais. P - "Com licença, doutor."(risos) R - (risos). "Com licença, doutor." P - Você falava "Com licença, doutor"? R - Não, nós da Rhodia, mesmo na época do papagaio, a gente identificava o médico pelo nome. Você não era repetitivo. Era um negócio que o nego enchia o saco. Era ponto, vírgula, e tinha que saber tudo decorado, mas tinha que saber o nome do médico. Se falasse doutor, o cara te chamava a atenção. Doutor Sérgio, doutora Milene, doutora Rosana. Então, você identificar o médico era importante. Você não esticava a mão para o médico. Se ele esticasse a mão, você passava a pasta para mão esquerda, apoiava, pedia licença, e se ele esticasse a mão você... Entendeu? Você não dava a mão. P - Por isso você tinha treinamento? R - Não, não é isso. É uma orientação de você não ficar dando a mão para o médico. Já era diferente, em alguns aspectos. Tinha nego que ia chegando e esticando. Às vezes, se esquecia, também. Mas você já procurava identificar o médico, e é verdade. (risos) Vê aí, pergunta. P - Que produtos que mais marcaram você na sua trajetória de lançamento? R - Pô, o Nootropil, apesar de que eu peguei o relançamento. O Profenid, um produto sensacional para se trabalhar. O Clexane, no momento atual, arrebenta, vende muito. Os três, para mim, são o carro chefe. Piportil L4, que é um produto para psiquiatria, que é difícil trabalhar. Um negócio mais direcionado para o médico de maluco mesmo, que o psiquiatra é o médico de maluco mas é também o clínico de maluco, né? Então, eu tinha por hábito de... Não, mas é verdade. Porque o cara podia ser doido, mas ele sentia dor de barriga, dor de cabeça, então, eu, por exemplo, tomava por base que eu tinha que fazer a propaganda dos produtos direcionados para grade dele, mas ao mesmo tempo falar da parte clínica. Falar de um Dienterol, que era um antidiarréico, na época, um remédio hormonal, um para dor de cabeça, o próprio Profenid, que ele era o prescritor da linha para o paciente psiquiátrico. Agora, era uma canseira, né? Se você chegasse lá, por exemplo, ele atendia em hora cheia . O paciente de 3 horas. Você chegou 3 e 2, e ele acabou de entrar; ou você vai para outro e volta antes das 4, se não você vai ficar 50 minutos esperando. Mais um maluco na sala esperando ser atendido. (risos) Então, é preferível dar uma volta, se não você... P - Ficava conversando com a secretária? R - Ou isso. Mas você tinha um roteiro, uma meta para cumprir de visitação. Então, você ficava no mesmo prédio, porque você procurava programar, depois que você conhece o setor, você costumava programar dentro do próprio prédio, adequando os horários, né? Então, você saía, ia visitar lá em cima. O outro dizia: "Oh, o fulano está atendendo lá." P - O outro propagandista? R - Já dizia: "O fulano já chegou lá, já está atendendo." Você sabia. "Eu estava falando com o fulano lá de baixo - dizia para ele -, tem quatro lá, desce, porque não tem muito como, não." Tem cara que dá o recado rápido e já está preocupado em ir lá para o outro. P - Quer dizer, tem uma relação de solidariedade? R - Exatamente. Aí, eu falava: "O siclano não veio, está de férias." Ou: "Hoje não vai atender propaganda, está atrasado, atolado." P - Você foi propagandista-vendedor-cobrador dessa região centro, depois você fez o que? R - Eu fiquei de 75 a 80 no centro, aí fui trabalhar em Jacarepaguá, fiquei lá de 80 a 82, foi um setor maravilhoso de trabalhar. P/ 1 - Qual a diferença do primeiro? R - A diferença é que aqui era ralando, né, mais estressante. Porque aqui, por exemplo, você não podia ir no carro toda a hora. Você vinha com a pasta cheia de medicamentos e uma sacola. No início, você não tem muito conhecimento, você tem que andar com os dois, né? De terno, porque eu peguei a época de terno, Fontenele deve ter relatado isso, um calor escaldante, você de terno... P - E você tinha o carro da Rhodia? R - Não, naquela época não, naquela época era o meu carro. Porque existiam carros da Rhodia, e muita gente com carro próprio, mas com toda a despesa paga; pagava o seguro, pagava o seguro obrigatório, pagava tudo, pneu, né? Só que o carro era teu. Aí, depois, começou a aumentar a frota, e hoje todo mundo tem carro da empresa. E eu saí, e em 80 fui para Jacarepaguá, foi um setor maravilhoso em relação ao centro, que eu te falei, que era muito mais estressante, muito mais corrido, você trabalhava a pé, porque você tinha que parar o carro num lugar e ficar o dia todo trabalhando a pé. Mas você fazia amizade com o porteiro, deixava a sacola lá, que era amostra para você trabalhar de tarde, para arrumar a pasta de novo. Parava 11 e 30, meio-dia, para almoçar, porque tinha que parar e programar. Tinha médico que começa às 13 horas, né, ou você pára às 11 horas, almoça, o médico te atendia ao meio-dia. Esse era brabo. Tinha médico que só atendia ao meio-dia, meio-dia e meio, então acabou. Você sacrificava, às vezes, algum dia da semana. Não eram todos, mas é brabo. E tinha médico que atendia às 19 horas da noite, como já visitei muitos. Eram dois, três, mas tinha. (risos) Era um dia da semana que você se sacrificava mais. Aí fiquei dois anos em Jacarepaguá, era uma mudança radical, apesar de ser muito mais longe para mim, na época eu morava...80, morava na Tijuca. Então, era mais longe, mas era um setor maravilhoso, o médico te recebia de uma outra maneira, as distâncias eram maiores, e você ia de carro. Lá você saía para ir tomar café com o cara, a clínica era mais popular, aqui era uma clínica mais concentrada, muita gente, né, o cara não tinha tempo para te dar a atenção devida. Apesar de que tem o nosso amigo Carlos Augusto aqui, um cara com que eu me dava muito bem, né, tinha uns caras mais amigos, mas lá o relacionamento era outro, o cara podia sair para tomar um café, que às vezes tinha mais um paciente na sala e ele saía no intervalo, e não era tanta quantidade de propagandista, era um ou dois, que o cara, às vezes, estava lá na Taquara e eu estava lá na Freguesia, eram distâncias maiores, então os roteiros eram mais abertos. Era mais tipo um setor de viagem, talvez um setor de viagem fosse até melhor. Os caras que fazem setor de viagem devem ficar maravilhados. Eu nunca gostei, nunca trabalhei em setor de viagem. Nem quero. P - E qual era a periodicidade, por exemplo, com que você visitava o médico? Você deixava um material hoje para ele... R - Mensal. Voltava só no outro mês. P - Para fazer o quê? R - A não ser que dentro do ciclo houvesse tempo hábil para você retornar no mesmo mês, se o cara fosse importante, valia a pena uma revisita. Fazia um reforço, que a gente chamava de revisita. Aqueles caras importantes que você tivesse tempo hábil... Vamos dizer, o ciclo era 20 dias, você chegou no 18o dia, se tem tempo hábil de voltar nos caras mais importantes, que prescrevem o teu produto, você voltava naqueles. P - E como era medido o seu desempenho? R - Aí era feita uma avaliação, e teve épocas em que a gente não participava dessa avaliação. E naquela época, tinha também um relatório mensal de propaganda, venda, e coisas que acontecem. Tinha que fazer aquele relatório, o que você fez durante o mês, pegar material da concorrência para mandar para matriz, dar sugestões, era um negócio interessante. Tinha gente que não gostava de fazer, não. (risos) Mas era um negócio obrigatório, diferente. P - Você estava falando, ia numa primeira vez no médico para falar de um remédio. Você levava o material de divulgação, material também para ficar com ele? Como é que era? Porque também tem os brindes, né? R - Ah, lógico. Usava como apoio. Porque, depois de uma certa época, a gente criou uma maneira diferenciada de não ir dando amostras. Fazer um direcionamento. Muitas das vezes, você pegava um Nootropil e dava para um cara que, às vezes, ele não estava precisando. Ele aceitava, mas... Era melhor você fazer a propaganda dos produtos e perguntar, daqueles produtos propagados, qual interessava para ele. E você direcionava para uma outra solicitação. Por exemplo, estava você, aí oferecia os produtos de que lhe falei, e você dizia: "Não, só quero o Ronal." Aí, chegava para mim e pedia o Nootropil. Eu já tinha na pasta, não dei para você, eu podia alocar uma quantidade maior para ela, que precisava Nootropil para mãe dela. Então, a gente começou a se preocupar também em fazer um direcionamento numa época posterior. Depois de certo tempo de experiência, você começa a alocar melhor o teu material. Dá um brinde, dá para um e não dá para outro. Apesar de que procurava também ter o conhecimento do setor, porque se começar a dar para um e não dar para o outro, você está, um dia o cara se encontra, trabalha no mesmo hospital, pô, um negócio desagradável, né. O brinde você normalmente dá. Eu nunca fui de ficar segurando para dar para colega. O cara pede, tem uma quantidade grande, é lógico, é troca de gentileza, né, que você faz o relacionamento também com os colegas da rua. Porque o teu gerente não é o teu gerente. Teu gerente era o corrigedor de relatório, e tal, mas quem vê o teu trabalho é o colega, né, que amanhã vai te convidar para você trabalhar com ele, numa empresa maior, como aconteceu do Pinheiros para ir para Rhodia. Apesar de não ter sido no campo, mas o meu trabalho já era visto. Fui convidado para outros laboratórios. Hoje não, porque já estou com 50 anos (risos), mas mesmo assim, o trabalho, principalmente direcionado a uma linha hospitalar, uma linha oncológica, é muito mais bem visto, que é uma linha mais direcionada, um trabalho mais cobrado. Porque o consultório você não tem como saber se o médico tal, lá da Praça Saens Peña, está prescrevendo teu produto. Porque a receita, às vezes, o cara mora em Copacabana, vai se consultar na Saens Peña, e não compra o remédio ali, vai comprar em Copacabana. Não tem como mensurar. Já num hospital, não. Você tem que fazer o trabalho e tem que ter o retorno. Você tem que padronizar o teu produto lá. Então, você trabalha 10 anos no hospital do câncer, e não padronizei nada lá, pô, não estaria mais na Rhodia hoje. Você é muito mais cobrado, mas é um trabalho muito mais gostoso do que "Com licença doutor." P - Mas aí você foi para Jacarepaguá. Você fazia hospital, médico... R - É, normalmente, você aloca a parte de hospital, até falei para você que seria melhor para mim de tarde, porque de manhã é quando dá o maior rendimento do hospital. Hoje trabalhei até com o Sérgio, que é o gerente de produto do Profenid V, Nubain e Flagil. Então, a parte da manhã é muito melhor, e a parte da tarde, a gente vai também visitar os médicos, mas procura conversar com a enfermeira, vai na farmácia, vai na parte de compra para ver se tem alguma coisa, pagamento, acompanhar lá pagamento. A gente procura alocar a parte da manhã dentro do hospital. E você tem mais opção, no consultório você rala para caramba. O trabalho hoje é mais cansativo. P - Em Jacarepaguá você fazia tudo isso? Você ficou quanto tempo? R - Não, mas eu não era hospitalar, eu fazia hospital de manhã, mas a nível de ambulatório, não de subir no hospital, fuçar tudo. Hoje você tem que ser rato, como a gente fala, rato de hospital, conhecer tudo, desde o faxineiro até o segurança, entendeu? E aí, numa foto dessa aí, o Alexandre, que fazia a Praça Saens Peña, foi mandado embora. Era da equipe do Fontenele. E eu em Jacarepaguá era da equipe do Schneider. Eu comentei com um cara da Lilly, Mazzei, o nome dele. E disse: "Mazzei, pô, eles vão me botar na Praça Saens Peña." Eu morava na Oto de Alencar, na Tijuca, pertinho, né? "Agora, se for uma determinação, eu vou ter que ir, se for um convite eu não vou, não." Porque eu adorava Jacarepaguá, estava adaptado lá, saí do centro, ralei cinco anos no centro da cidade, 75 a 80, estava dois anos lá, conhecia todo mundo, pô, dono de farmácia ali era meu amigo. Eu comprei uma Brasília, naquela época que você podia fazer consórcio, que teve uma época ruim de fazer consórcio, um período aí, em 76 eu fiz um consórcio. União, tirei uma Brasília zero, 78. Naquela época eu trabalhava com o meu carro, eu vendi minha Brasília para um dono de uma farmácia, meu amigo até hoje, a Farmácia Santa Luiza, na Freguesia. O relacionamento era muito chegado, dono de farmácia, o próprio médico, e foi o maior baque. Quando o Delair, que era da minha equipe, disse assim: "Pô, você vai para Tijuca, heim?" "Vou nada, cara, se for convite, não vou .Se for determinação, não tem jeito." Mas ele já sabia. Devia ter ouvido falar, algum bizu, estava na cara. Mas eu fiquei seis anos na Praça Saens Peña. Me adaptei, pertinho de casa, fiz bom relacionamento ali, os médicos, quando eu saí de lá, principalmente o Emiliano Lugarin, que era um clínico, e algum médico mais chegado que me identificava pelo nome, Abreu da Rhodia, e muita gente que trabalhou depois de mim lá, ele sempre pergunta por mim. Eu já estava no hospitalar, e fui pro hospitalar em 88... P - Você foi fazer o que no hospitalar? R - Só específico de hospitais. P - Que área você fazia? R - Centro da cidade e Botafogo. Eu faço ainda. Hospital do Câncer, e as outras duas unidades, Hospital de Oncologia, que é na Rodoviária... P - Aí você ficou de 88... R - Até agora. Em hospitalar, exatamente. E Luisa Gomes de Lemos, que é em Vila Isabel, que é outra unidade do Inca, né, que dá um apoio em casa, também, para os pacientes com câncer. Faço o Instituto de Hematologia, que é na Frei Caneca, faço a massas falida do estado, que é a rede estadual, Getúlio Vargas, Carlos Chagas, as Secretarias de Estado. P - Mas aí é por licitação, né? R - É, aí é concorrência. E faço alguns hospitais particulares, o Samaritano, o Bota Fogo, a Clínica Bambina, e mais dois hospitais, o Pró-Cardíaco, e São Miguel. P - E tem algum caso pitoresco? R - Ah, isso tem, está na memória, aqui. Já estava rebuscando. É, tem passagens interessantes. Num consultório, aqui no centro da cidade, ainda em 1978 mais ou menos, estava o falecido Anélio Pinto Ribeiro, que era um angiologista. Era um andar quase todo, umas quatro salas, o cara morava em Santa Tereza, tinha o carro do momento, que era um MP Laffer, era gente boa para caramba. Estava eu, o Jorge, que era o meu gerente na época, o cara do Aché, o gerente dele, que era meio maluco, e um outro propagandista de que não me lembro agora. Aí, servia água, cafezinho, e o cafezinho vinha naquelas xicrinhas, que vem a louça solta, né, aquele negócio de inox. E o café estava ruim nesse dia. E o maluco do gerente do Aché disse: "Pô, que café filha da mãe de ruim." Pegou o café e shuu, jogou pela janela, e saiu a louça junto, né? (risos) "Pô, está maluco, cara, e agora?" Ele ficou com a alça na mão e o pires. "E agora?" (risos). Pegou tudo e jogou pela janela. A mulher quando veio buscar: "Não, não tomei café, não." Ficou com aquela cara de babaca (risos). Teve uma vez, também, a gente estava num consultório médico... Pô, essa aí também foi gozada, foi braba. Nós estávamos num consultório num edifício da avenida central. Não me lembro do nome do médico agora. Era um ginecologista, eram dois ginecologistas. Tinha um cara de um laboratório pequeno, o cara era meio débil mental, não é possível falar o que ele falou ali. Estava eu, o Jorge de novo, esse cara, e mais um outro colega, e tinha uma senhora, e a atendente. Uma música ambiente, e o cara me solta essa. Eu não sei se era paciente, ou transação do médico, tinha muita intimidade com ele, o colega vai e me solta essa: "Pô, essa musiquinha ambiente, mulher bonita, só falta o uisquezinho aqui e tirar para dançar." Pô, falou isso, pô, a mulher quando entrou falou para o médico e ele ligou para o laboratório do cara... P - Você deu risada na hora? R - Não, não. Eu cutuquei o meu gerente: "Pô, esse cara é doido, heim?" E depois a atendente me falou que o cara ligou e ele dançou. O cara falar um negócio desses, o cara é meio débil mental. Você ficava na sala, às vezes a porta ficava aberta e a gente ficava mais na porta para não ficar lá dentro e não incomodar. E o maluco vai e fala um negocio desse. Outra coisa que a gente reprovava era ficar com o pé na parede, no corredor mesmo, é postura. E tem uma outra passagem interessante, essa já foi na Praça Saens Peña, e foi um negócio engraçado. A menina lá de Salvador veio para o Rio, e ela tinha me pedido até para ver um apartamento para ela alugar agora nas férias, em dezembro, e aí ela falou que não me ligou porque ficou na casa de um tio, e esse tio dela foi propagandista e trabalhou comigo na praça Saens Peña. E é bem mais velho do que eu, hoje deve ter uns 65, por aí. E ele trabalhava na Merrell, que hoje vai ser Hoechst, né? E ele era tio dela, e comentei a passagem que aconteceu para ela, né, um lance interessante. Tem um urologista e ginecologista nesse consultório, na Pereira Santos, em cima da Sloper, e a atendente também trazia uma água geladona mesmo. Um dia de muito calor, tomei a água, e ele: "Oh, me dá um copinho de água para mim também." Ela foi lá pegar, veio com um pirezinho, ele pegou, quando ele botou a mão no copo e foi beber, o fundo do copo saiu com o calor da mão dele, o fundo do copo saiu e ele se molhou todo. Em vez de ele se levantar logo, a gente morrendo de rir, e o cara paradão que nem uma múmia. E daqui a pouco ele se levantou, se sacudiu e começou a rir, e eu contei para ela.(risos) Ele tinha já uma dificuldade de visualizar, usava aquele oculinho, ficava olhando dentro da pasta, mas esse lance nós morremos de rir. O fundo do copo saiu com o calor da mão dele. É a mesma coisa quando você pega uma cerveja muito gelada, você bota a mão e ela congela. Mas tem umas passagens gozadas. P - Teve alguma assim com médicos? R - Não, tem uma passagem também engraçada, na praça Saens Peña, um ortopedista, na Conde do Bonfim 232. O nome dele era Ciríaco Vilarde. A mãe dele não gostava dele. Então, ele botava na porta do consultório C. Vilarde. Mas tem colega que é muito sacana, né? Tinha um cara novo lá da Sintofarma, ia visitar ele, nós tínhamos um grupo de quatro ou cinco. Aí, chegou e falou para o colega da Sintofarma: "Olha, não chama ele Vilarde, que ele não gosta. Chama ele de Dr. Ciríaco." Eu fiquei na minha. O cara era otário, né, chamou ele de Ciríaco. O cara ficou p. da vida. Era meio careca, ficou vermelho, quando ele puxou o visual para falar, ele disse: "Meu filho, não tenho tempo para perder, não. Quer fazer o favor de se retirar? Fala do teu produto aí rapidinho e sai." Porque o cara não suportava o nome dele. Agora, a mãe dele não gostava dele, botar o nome de Ciríaco (risos) é sacanagem. Brincadeira Isso aqui foi assim que eu entrei, isso foi em 76 essa reportagem aqui da Fatos e Fotos. Você chegou a ver naquela hora o retrato, né? O retrato que te mostrei. Eu estava sentado, esperando. Só que a revista minha mulher jogou fora no ano passado. Ela botou aqui: na praça Saens Peña, mas não foi não, isso foi na Rio Branco 156, também. Essa menina aqui era a atendente, a Lurdinha, estava sentada aqui, cabeluda... P - E você conversava com os pacientes? R - Batia papo, conversava com a Lurdinha, gente fina para caramba essa menina. E você pode ver, ele trabalhava na Policlínica Geral do Rio de Janeiro, ele tinha um consultório e um colega dele, Carlos Augusto Dias, e um outro médico, não me lembro o nome dele. Era legista, mas clínico também. Gente muito boa esse cara. Eu estava aguardando e a reportagem da Fatos e Fotos estava lá. Ela aqui se enganou, botou Praça Saens Peña, mas não é não. Esse aqui é o Delair, que foi para Vitória, que era da nossa equipe, esse era o nosso gerente da hospitalar na época, esse cara já saiu, essa menina saiu também, o Luciano está lá ainda, o Paulella, essa garota saiu... A maioria aqui já saiu, essa Marie voltou para França, a Milene continua, o Luiz saiu, esse cara é supervisor, esse saiu, esse continua, uma turma boa aí, esse é gerente também, esse é o Marcelo. Foi na época do Clexane. P - Nesse período que você ficou na Rhodia, quais foram as maiores mudanças da característica, do perfil, da habilidade que o propagandista vendedor tinha que ter? R - É, foi exatamente essa passagem que eu te falei. De papagaio, de decoreba, para uma adaptação que você tem maior conhecimento, isso você adquire até com o tempo mesmo. Quando você entra dá a impressão de que é um negócio muito difícil. Mas com o desenvolvimento da própria vivência você vai aprendendo, sobre a concorrência, produtos concorrentes, por exemplo, do Profenid, do próprio Nootropil; eu lembro que teve um ano em que o laboratório lançou um produto concorrente do Ronal, que era o... esqueci agora, era um nome inglês, também era ácido acetil salicílico tamponado, né, eles não tiraram férias, porque nós estamos em falta com o Ronal, que eles lançaram na nossa falha. Eles lançaram o produto em dezembro, era o Andrômaco, estou tentando lembrar o nome. Agora me falhou, 50 anos, tem que dar um desconto (risos). Então, negocio interessante, da própria concorrência, do marketing, né, então essa mudança foi exatamente do conhecimento, do treinamento, do desenvolvimento do representante Rhodia. P - Mas naquela época não era exigência ter nível universitário? R - Não, tanto é que na época a Rhodia não gostava até que estudasse, nesse período de 75, 78, tanto é que eu tranquei a minha matrícula na faculdade. P - Faculdade do quê? R - Eu estava fazendo Comunicação, Administração... Comecei Comunicação, depois passe para Administração. E hoje já é quase uma exigência o cara ser formado, na grande maioria dos laboratórios pedem nível superior. 70%, talvez até mais. P - Na área de farmácia? R - É, na área biomédicas, alguns laboratórios até biologia, nessa área mesmo. Agora, alijou muita gente. Porque talvez não esteja formado, ficou mais restrito. Mas hoje todo o mundo tem faculdade, né? Quem não tem, fica um pouco alijado. P/1 - Você chegou a utilizar, por exemplo, alguns desses materiais? Aquele do impressionismo, dos franceses, aquela coleção de arte? R - Você fala daquelas gravuras? Rosa e azul? De Renoir.. P - Tinha também aquele jogo da memória... R - Do Nootropil? Eu peguei ... Eu ganhei, mas não cheguei a trabalhar, porque eu não lancei. O jogo da memória... Interessante. Aquelas figuras iguais que você tinha que memorizar, eu não cheguei a distribuir, mas eu ganhei. P - E como era a reação dos médicos a esses, outros brindes que não eram tanto de informação? R - O médico é receptivo para qualquer tipo de brinde. Você pode dar uma canetinha com ponta quebrada para ele. (risos) Ele quer é ganhar alguma coisa. Ele gosta de qualquer tipo de brinde. Tinha uma canetinha do João Teimoso, lembra? Ficava assim para cima, pô, aquele brinde marcou época. Era o remédio milagroso, eu falava com o professor na Policlínica Geral do Rio de Janeiro, aqui no centro: "Pô, esse remédio é milagroso, meu filho" - o cara me sacaneava porque ele não alterava quando estava normal, aumenta o fluxo biliar quando está diminuído e diminui quando está aumentado. "Pô, milagroso." E a substância de 250 miligramas de derivados nitrogenado, que é o popular fel da terra, né, dos nossos avós. Então, ele faz tudo ao mesmo tempo, né? Não altera quando está normal, aumenta quando está diminuído e diminui quando está aumentado. Pô. P - Bom mesmo. R - E um negócio também que acho que teve uma falha do Marketing, foi quando lançamos um produto para cardiologia, que não era uma linha específica da Rhodia, que foi o Sectral, e que se quis criar uma terminologia para cardiologia de betamoderador, quando o termo é betabloqueador. Pô, foi pro buraco. A Rhodia não tinha nem histórico de linha cardiológica, e vieram com um trabalho de um fulano lá de betamoderação. Betabloqueador é betabloqueador. Não queira criar... Mas mudou muito. O marketing da Rhodia hoje é mil. Estamos lançando agora um conceito de analgesia pré-empetiva no pré-operatório com Profenid V, hoje mesmo o próprio gerente saiu comigo. Um troço sensacional. O Clexane, baixo peso molecular, está arrebentando; por falar em premiação, eu, por exemplo, sou chamado de pé quente, ganhei todos os prêmios da Rhodia. P - Quantos prêmios você ganhou? R - Que eu me lembre, né, de 94 para cá, ganhei uma TV Semp Toshiba de 21. P - Mas por que você ganhou essa televisão? R - Não, isso aí, não estou lembrado dessa premiação. Mas em 95 eu ganhei um Corsa, que foi o melhor desempenho na região. O Fontenele não ganhou porque teve gente que não acreditou naqueles questionários, não fazia, e ele foi prejudicado, porque não ficou com a pontuação. P - Você coordena uma equipe? R - Não, não. Sou representante. Todos os caras que ganharam o Corsa foram promovidos. Eu fiquei na minha. Mas eu não esquento a cabeça, não, com promoção. Para mim a melhor promoção é ver meu filho trabalhando na empresa, na linha oncológica, vai fazer um ano agora em abril. Me surpreendeu. P - Ele é propagandista? R - Ele é propagandista. Da linha de câncer, que o Wladimir convidou, porque conhecia o trabalho, e eu nem acreditei. Pensei até que fosse lobby, é. Que eu nem sabia que podia trabalhar filho. Mas, como era uma linha diferenciada, ele acabou entrando. E agora mesmo, nessa reunião em que nós participamos lá em Limeira, o Heraldo veio, estava no barzinho tomando uma cerveja, teve um grito de carnaval, você deve ter ouvido falar, né, e ele veio falar do desempenho dele. Pô, tem escola, isso para mim foi a maior promoção, isso que estou te falando aqui, né, de ter ele na Rhodia, de seguir uma escola que, realmente, 24 anos, o que eu pude passar para ele eu passei, as coisas boas, o que é ruim a gente joga fora. (risos) Então, quer melhor promoção que isso? Quanta água eu vi rolar, quanta gerência eu já passei. P - O Corsa era? R - O Corsa era o seguinte: ganhava o melhor representante de toda a região, tanto linha hospitalar quanto linha normal, que tivesse, que era tipo um leilão. Então, tinha uma pontuação. Deixa eu ver se eu tenho aqui. P - Desde quando foi instituído esse prêmio? R - Esse prêmio foi no ano de 95. O desempenho foi em 95, tinha os questionários... P - Mas desde quando existe esse negócio na Rhodia, de ganhar um prêmio? R - Sempre teve. De 94, quando teve a TV. Mas o do Corsa foi o seguinte: era o desempenho dos testes, que você tinha a pontuação, a cobertura de estimativa de visitação, somatória de tudo, e o desempenho nas reuniões, vendas. Eu, por exemplo, em 1990, fazia o Pedro Ernesto, eu não faço mais, é o Artur, eu fiz a maior venda Brasil de Peflacin. Naquela época estava a novela Pantanal, lembra? Nosso gerente era Mário Lobo, que hoje está na Eurofarma. Então, tinha, não sei se era um sapatão ou um veado na novela, chamado Loba, não me lembro bem o nome, e essa venda, a gente fazia o relatório, e foram 700 caixas de Peflacin, foram 350 injetáveis e 350 de comprimidos. E normalmente, no hospital, a denominação é por unidade farmacêutica, por comprimido, então a gente falava que eram sete mil unidades farmacotécnicas do produto. Foram 350 de cada. E cada caixa era com 10, então foi a maior venda do Brasil, acho que ninguém conseguiu atingir essa venda depois desse ano de Peflacin. São nove anos para trás. Nós ganhamos um jantar, eu e minha mulher, no Baby Beef, lá na Barra, ela até colocou aqui. P - Quando você ganhou o Corsa? R - O Corsa eu ganhei em 95 e recebi em agosto de 96, mas foi essa do leilão, que você ia recebendo uns cupons, e tinha até um martelinho do leilão, que você recebia e você ia fazendo a pontuação. P - Aruba o que foi? R - 96, foi por desempenho também. Aqui da região fui eu e o Fontenele. Passamos uma semana em Aruba em 96, com a esposa, tudo pago. Eu fiz 25 anos de casado no período. Fiz minhas bodas de prata lá, comemorei lá. Nota 1000, né? P - Você tem alguma técnica, alguma manha de abordagem? Quais as suas características? R - Olha, eu sempre procurei manter um diálogo, conhecer o produto, saber e fazer um bom relacionamento com o médico, e mostrar agressividade na hora de falar o nome do produto, você dar maior ênfase, para o cara assimilar, falar sempre a marca, repetir Profenid o máximo de vezes possível. Você fala de uma característica: "Ah, Profenid é indicado para analgesia pós-operatória, pelo fato de ser um excelente analgésico, Profenid V, o senhor pode usar na posologia um frasco ampola a cada 12 horas, o senhor pode fazer na pré-anestesia, 15 minutos antes da incisão, o senhor faz um frasco ampola de Profenid V..." E com isso você está repetindo o nome do produto e o cara está gravando. Então, da equipe que hoje está conosco aqui, todo o mundo trabalhou comigo, o Fontenele dizia: "Trabalha com o Abreu, mostra para ele." Na hora de treinar, por exemplo, a garota agora treinou essa analgesia do Profenid, que nós estamos vendendo um conceito, né, de uma nova indicação, para criar alguma coisa, o marketing bolou, e realmente tem atividade e, pô, ele disse para mim: "Dá uma puxada na garota de Vitória para exigir mais dela, para mostrar para ela como fazer." Então, na hora de trabalhar, eles sempre... todo mundo... O Wladimir, que hoje é gerente, trabalhou comigo, o Artur, o César, Ricardo, não me lembro, mas todo mundo passou na minha mão antes ir pro campo. Então, você se sente até orgulhoso de ver o colega desenvolver, e dia-a-dia da história da Rhodia a gente participa, é legal. Apesar de eu não ter sido promovido, quer maior promoção do que estar aí, né, 24 anos numa empresa não é qualquer um que chega. P - De quanto em quanto tempo normalmente surge um novo produto e vocês têm que começar uma nova forma de divulgação? R - Normalmente, anualmente sempre surge. Às vezes passa um ano sem lançar nada, mas prevê uma nova apresentação,. Por exemplo, o próprio Clexane, nós lançamos na profilaxia de 20 ou 40, passamos uns três anos, passamos para o tratamento, as apresentações 60, 80, 100, que está vendendo muito bem, aí o direcionamento, que o tratamento da trombose já instalada e o direcionamento também para o tratamento da angina instável; estão criando nichos, né? P - Infarto agudo do miocárdio não Q? R - Viu como ela gravou? Qualquer dia vai ser propagandista da Rhodia (risos). P - Papagaios (risos). R - Não, o Clexane é um estudo bacana de coagulação. Mas esse negócio do carro, era um leilão, era ao nível do Brasil, a gente foi para Embratel, foi por desempenho anual, mas ia pro leilão, você juntava aqueles pontos, tinha as equipes, o cara que estava disputando comigo era o Eimar, que era da minha equipe, e a Ana, da linha open care, né, que também estava com uma pontuação boa. Mas, pela classificação das regiões, a gente sabia mais ou menos como é que estava; por exemplo, vamos dizer o sul, São Paulo capital foi o primeiro lugar, com pontuação tal, a Região 4, aqui, foi terceiro lugar, com pontuação tal, mas tinha um Corsa para cada região. Um Corsa para um GD, que é um gerente distrital, e outro para um representante. E todos os que ganharam o Corsa... A Daisy foi promovida, o Betão está aqui também, foi promovido, o Luciano também ganhou, e eu ganhei também. E no outro ano foi a viagem a Aruba. E esse ano nós vamos para o Clube Med em Itaparica. Passar uma semana lá, no dia 6 de março. Aí, vai a equipe toda. Foi uma premiação pela venda, nós atingimos todos os objetivos do ano. P - Na verdade, essa premiação é um tipo de promoção. Acabaram-se com as promoções, mas você é premiado? R - É um cumulativo. Uma premiação do ano todo. Você tem aqueles objetivos. Então, se você chegar... Você tem um fixo mais o prêmio, 2.100 mais 600 de prêmio mensal ou 700. Em dinheiro. E mais o top prêmio que é bimensal. Por exemplo, nós agora na reunião ganhamos 2.390 de top prêmio. Cada um. Recuperando o que nós perdemos e ganhamos do mês. E a superação, que nós atingimos o maior objetivo, acima de 140% tinha direito à viagem ao Mediterranée, nós ganhamos de São Paulo. E se fosse a premiação desse ano no ano passado, que ia ser um cruzeiro pelas ilhas do Caribe, que vai ser esse ano agora de 99, e nós vamos ganhar de novo. (risos) Com certeza. É um negócio muito gostoso você desenvolver e ser premiado. P - E nessa sua trajetória de vida, existe alguma coisa que você mudaria, se pudesse? R - Não, acho que eu faria tudo novamente, e procurar lapidar até mais alguma coisa, alguma falha que eu tenha tido ou tenha deixado passar. A gente procura sempre. Eu acho que nesse ramo, na vida, a gente está sempre aprendendo. Por mais que você ache que sabe tudo, você não sabe nada. Está sempre aprendendo. Essa foi sempre a minha norma. Eu acho que você sempre aprende, em qualquer nicho de mercado. Na área de advocacia, engenharia, e a vivência é o dia-a-dia. E a gente aprende com um colega, às vezes um cara mais novo traz uma amostragem do que ele fez, você pega um negocinho que ele falou, que você achou interessante, você aproveita aquilo. Você vê, tem um camarada aqui da Sandoz, um tremendo profissional, e interessante. Antigamente, você se preocupava até na maneira de colocar a amostra em cima da mesa do médico. Então, ele procurava colocar... Por exemplo, Nootropil. Você dava quatro caixinhas para o médico. Ele botava não uma em cima da outra, mas da maneira que ele visualizasse quatro vezes o Nootropil, entendeu? Isso era um troço dele. E essas coisas você procura copiar, detalhinho, às vezes sem importância, mas o cara está vendo quatro vezes o nome na frente. Esses toques a gente via no dia-a-dia. Você passava a fazer porque achava interessante aquilo. Coisas que você ia aprendendo na vivência. Não era o laboratório que passava, era prática dele. Isso você vai adquirindo no campo. Quando você está fora, quando eu era bancário, pensava que esses caras não faziam nada. Só via os caras parados no ponto de encontro. Nada. Você rala para caramba. Você, às vezes, está ali, tem três pessoas esperando o médico, e eles já pensam que vai demorar mais por causa da gente. P - Tem caso de reclamação de paciente? R - Falava: "Estou com pressa e você não vai entrar na minha frente, não." Pô, quantas vezes. P - E você não falava nada? R - Não, não falava nada. Falar o quê? "Pô, tudo bem." Mas se ele chamasse, aí eu nem olhava para cara dela, porque dava vontade de rir. Fazer o quê? Bater de frente com a paciente, dar uma de mal educado? Ainda hoje eu estava com o Sérgio, a mulher lá que trabalha na farmácia, Regina, que sabe tudo, estoque, pô, a mulher parece que tem dia que dorme de calça comprida. Vai fazer o quê? Pega de ovo virado. "Pô, Regina, tudo bem, eu vou embora, depois eu volto aí." Uma vez ela virou para mim e disse: "Vou acabar com esse monopólio da Rhodia." Assim, sem mais nem menos. "Que é isso, Regina? Tá tudo bem? Tchau, depois eu volto aí." Vou me queimar com ela, ficar batendo de frente com ela? (risos) Mesma coisa com os clientes. Se for esperar todo o mundo ser atendido, você não vai visitar ninguém, ia visitar um médico por dia, né? Porque em alguns países você paga a consulta. Dizem que na França parece que o propagandista paga para divulgar. Eu não sei se é o tempo, ou paga a consulta. Mas ouvi comentário que paga. Não sei como eles levam isso. Acho que é meio conversa. Já pensou, se eu for fazer cinco contatos, cinco consultas por dia? Não procede... Não acredito. P - E você ficou amigo de algum médico? R - Ah, tem muito médico com que eu convivo, que é amigo. No próprio HTO mesmo, eu tentei colocar o filho desse médico no laboratório, hoje ele é propagandista, entendeu? Doutor Jorge Amorim Gonçalves, um cara que ralou também para caramba, ele se formou depois de velho, ele era vendedor de peças de automóvel. Você começa se aproximando, se você fica 10 anos no mesmo setor ele já conhece você como Abreu, né, Abreu da Rhodia, se o cara me chama de Rhodia eu fico meio assim. Mas o cara acaba se familiarizando, chamando você pelo nome, Abreu da Rhodia, e fica aquela marca, e você vai conhecendo desde o faxineiro até... P - Você tem amigos de outros laboratórios? R - Colega, né, mas amigo, de freqüentar, uns dois ou três. É mais colega. Propagandista também fala muito. É muito fofoqueiro. (risos) P - Quanto ao seu relacionamento com as farmácias. Porque quando você fazia a parte de consultório... R - Nessa época a gente fazia pesquisa em farmácia, vendia na farmácia. P - Material de propaganda era mais para o médico? R - Na farmácia a gente fazia venda, então, ia procurar ver, por exemplo, lançava Nootropil. Vendeu 24 Nootropil lá, e a gente ia procurar acompanhar o desempenho da venda, de quantos saíram naquela semana, quem foi que receitou, se aproximava mais do balconista para ele anotar quem estava prescrevendo, para você ver quem realmente estava mentindo. Porque você sabe quando o médico está mentindo, você sente. E aí você começa a pesquisar por ele. "Pô, doutor, em que casos o sr. está usando Profenid?" Ele diz: "Ah, estou usando..." Para se livrar de você. "Em que caso o sr. está usando?" O cara pensou, mentira, não está usando. "Qual a posologia que o senhor está usando?" Aí o cara... Sabe, você sente. É a vivência. P - Teve algum médico que disse "não quero falar com você agora", que interrompeu no meio? R - Tem aquele médico que também prova o remédio. Ainda ontem eu estava falando, por exemplo, estávamos lançando Subtosan aqui na Policlínica do exército, aqui no centro, o cara experimentava nele mesmo. Maluco. Tomava para experimentar. Sei lá, de repente ele era cardíaco. Se ele tomava é porque era cardíaco. P - E teve algum assim, tipo: "Agora você sai da sala", e você acabou brigando? R - Não, não. De brigar mesmo... Mandar sair não, só dizer que não podia atender naquela hora, e você tinha que segurar. Agora, cancelar médico você cancela. Você vai lá, volta lá, e o cara não... Então, ele não está a fim de receber propaganda. O cara tem que ter paciência para ser propagandista. Não é qualquer um que aguenta ficar 40 minutos esperando o médico, e aí o cara diz: "Pô, chegou um paciente passando mal", aí tu fica mais 40. E aquele dia que você tem que ficar até 7 horas da noite para falar com aquele médico que só chega a essa hora? Hoje em dia não, você já faz um trabalho mais diferenciado, trabalha com a cabeça, dentro do hospital você tem que falar com quem decide, quem estiver você fala. Você não vai ficar ralando procurando um residente. Você vai procurar um cara que decide. Um chefe de clínica, às vezes nem é ele que decide, é o staff dele, às vezes é um residente que é importante até para desenvolver o trabalho junto a ele, né, isso tudo você tem que descobrir, os nichos dentro do hospital. Tem que descobrir ralando, quem decide, quem faz isso, quem faz aquilo... Isso que a gente chama de rato de hospital, você tem que conhecer de tudo um pouco. P - Há quanto tempo você está trabalhando nos hospitais em que trabalha hoje? R - Por 10 anos. P - A tendência é que cada propagandista freqüente os mesmos lugares para se tornar conhecido? R - Ah, com certeza. O próprio farmacêutico do Inca, naquela época era o dr. Julio, que hoje ele está na esterilização, e a dra. Ilva, que é a farmacêutica. Ele dizia: "Pô, você não precisa nem trabalhar mais aqui, Profenid você vende aqui igual água." Pelo contrário, eu acho que quanto mais você ficar falando com os caras, mais o produto vai ser usado. Você vê, a última venda agora foram 28 mil caixas de Profenid. São 280 mil comprimidos. No ano passado... P - E quais são as principais características da região que você cobre, essa que você está há 10 anos, se você tivesse que caracterizar a região? R - Como caracterizar? P - Características, assim, a maioria é hospital privado... R - Não, o Inca já é um hospital público federal, a maioria é público, né, eu tenho cinco hospitais particulares, eu faço a rede estadual, são quatro hospitais, três do Inca, federal, sete, e o Hematologia é misto, tem a fundação, como o Inca também tem uma fundação, mas a verba é do estado. É estado também a Hematologia. P - E como é esse trabalho no hospital público, uma vez que é feita tomada de preço? R - Concorrência ou tomada de preço. P - E como você participa? R - Você acompanha, procura ver na pedra, que a gente chama de pedra, no edital, vai ver se tem o teu produto. A pedra é lá, você tem um quadro, né, com todas as TP - tomadas de preço - que vão ter. Agora está sendo um negócio anual, uma concorrência grande no Inca, onde está lá heparina de baixo peso molecular. Existem três, que é o Flagmin... entram três na concorrência, é enoxiparina, dalteparina e a nadroparina, que é a Fraxiparina da Sanofir, e o outro do Flagmin é da Farmácia UpJohn. P - Ganha quem tem menor preço? R - Menor preço. P - Independente dos efeitos? R - Não, porque as características são semelhantes, mas não similares. P - Mas o fato dela ter sido a primeira a ser reconhecida... P - É, a primeira aprovada pelo FDA, né, e pelo Ministério da Saúde, e o FDA nos Estados Unidos. Mas o problema é que o outro tem as mesmas indicações, agora eu estou tentando ganhar no parecer técnico. Eu perdi no preço para a Fraxiparina 06, que eles botaram lá em baixo, porque eles quase não vendem, eles vendem a de 03, vendiam muito, depois do advento do Clexane, quer dizer, era um monopólio, não tinha mais ninguém. Quando a Rhodia entrou, começamos a dividir, não dividir, eles estavam ainda durante um ano com uma margem boa, mas depois a gente começou a dividir, e agora nós somos maioria na grande maioria dos hospitais. Eles botaram lá em baixo. Uma seringa que custa 20 reais eles venderam a 4,70. Eu tentei pedir o parecer técnico, pela característica diferente de UI, a deles é diferente, na hora que transforma para UI cai para uma dosagem, mas aí eles não deram. Tive a orientação de pedir o laudo técnico. Não o laudo técnico de lote, o laudo técnico de atividade. P1 - Orientação da Rhodia? R - Não... A gente vai descobrindo. Se eu tiver o laudo técnico do meu lá, mostrando a atividade anti 10 A e anti 2A e ele não tiver, eu posso ganhar porque eles não tem. Aí vai para o parecer técnico da própria farmacêutica. Se ele não tiver o laudo técnico lá eu vou ganhar no laudo técnico. Ele ganhou no preço, mas ele perde no laudo técnico. Ela vai dar o parecer técnico favorável ao meu, porque eu tenho o laudo técnico do produto. É um negócio de que eu estou correndo atrás desde o ano passado, que a Rhodia não me mandou e eu quero que mande agora. Que eu sei que eu vou perder. P - Não é interesse dela? R - Ah, sei lá. Não sei o direcionamento. Não, de repente passou despercebido, empurraram com a barriga, o nego esqueceu o papel, não sei qual o motivo. Então, eu insisti, eu preciso ganhar porque agora é uma quantidade grande, são duas mil seringas, são 200 caixas de Clexane de 40 ou de Flaxparina ou de Flagmin, e são 3500 de 20. De 20 eu ganhei, tanto é que agora vem um emergencial de 90 caixas. Já mandaram para aí. São 3500, são 350 caixas com 10 seringas. Esse eu ganhei no preço. São 4,21, assim foi 50% de desconto. Ela custa 8,42... P - E aí o hospital paga diretamente para Rhodia, você não interfere mais, você não cobra mais? R - Eu acompanho o pagamento. Vejo na relação de pagamento do Banco do Brasil e vou me informar na ordem bancária. Hoje mesmo eu vi uma duplicata que foi paga lá de dois mil e pouco, de Narcan. P - E no caso de não ser pago? R - É difícil. Pode atrasar, mas não... O Ministério da Saúde normalmente está pagando em dia. Então, esse trabalho você tem que acompanhar. Não tem jeito. Tem que ver tudo, desde o início da TP, até... P - Tem que acompanhar o processo de licitação? R - Tem, você tem que acompanhar o edital, a documentação, na hora de abrir você tem que estar lá, mas normalmente no Inca o documento é aberto e a concorrência é feita no mesmo dia. Tem hospital que é muito grande, ele abre num dia os documentos mas depois é que vai ter a concorrência. Primeiro eles vão ver quem está classificado, quem foi desclassificado por falta de documento... P - Há algum tempo atrás você estava falando que, quando você entrou, você acabou tendo que trancar a faculdade. Depois, com essa mudança de perfil, eles se interessam que as pessoas tenham... O quanto a Rhodia investe no treinamento e na reciclagem de quem já está há mais tempo? R - Ah, sim. A gente teve um curso de reciclagem agora no final do ano. Foi uma turma, se não me engano, em maio, e o restante vai ser agora em dezembro. Foi legal isso, porque é bom dar uma recordada. É importante essa reciclagem. Apesar de que o produto é mais recente, a gente está sempre atuando com ele, mas é bom. P - E tem muita troca de informações? R - Ah, tem. Inclusive tem aqueles quadros de sucesso que a pessoa vai lá e conta como fez, isso tudo é vivência, coisas que a pessoa faz e você não fez, você absorve e guarda aquilo para você também aplicar no campo. Então, você tem até que parabenizar o colega. Valorizar o cara. Porque você ser reconhecido só, acho que você tem que também reconhecer o dos outros, uma medida justa. P - E você foi contar algum caso de sucesso? R - Não, quem foi contar dessa vez um caso de quase sucesso, foi sugestão do próprio, foi o Artur, que a gente chama de Dick. Contou um lance de uma concorrência na Marinha, ele viu na hora que estava faltando um documento, e ele conseguiu um time para vir aqui, alegou que o estacionamento estava vencendo, que tinha que vim repor o negócio, e como era aqui perto, ele veio aqui, pegou o documento, conseguiu botar por baixo do outro lá e... (risos) Entrou e ganhou a concorrência. Então, foi legal. Ele que inventou: um caso de quase sucesso. (risos) P - Para encerrar, queria saber se você tem um grande desejo, ou quer deixar registrado alguma coisa que a gente não tenha perguntado? R - Desejo o que, em relação à Rhodia? P - À vida. Aos dois. R - Olha, eu gostaria de encerrar minha carreira dentro da Rhodia, e eu gostaria de quando encerrasse a minha carreira, de propor a eles que me dessem uma parceria. Eu ter uma representação da Rhodia, porque acho que pelo o que eu me dediquei, queria montar uma distribuidora de produtos, de remédios, vender Rhodia. Eles podem dizer sim ou não. P - E isso é comum? Isso existe? R - Não sei. Não conheço nenhum caso. Na época que acontecer, talvez eu vá propor. Tentar. Pelo couro que eu deixei, pelo que dediquei, acho que é um merecimento, não mereço? A gente tem que tentar.(risos) Por que não? P - E o que você achou de ter dado esse depoimento? R - Achei legal. Nota 10, gostei muito, achei muito bacana. Valeu. P - Foi muito esclarecedor, animado, foi bem legal. R - Fui muito prolixo? (risos) P - Não, está ótimo.
Recolher