IDENTIFICAÇÃO Meu nome completo é Dante Enedino Funari di Lucia, eu nasci em Pelotas, no Rio Grande do Sul, no dia nove de março de 1938. FAMÍLIA / PAIS Meu pai era Victorio Funari di Lucia, minha mãe Enedina dos Santos Funari. Os meus avós por parte de pai eram Tomás Funari, italiano, e Ermínia Funari. Por parte de mãe, era José Funari e a minha avó Firica Funari. Porque o meu avô, por parte de mãe, era irmão da minha avó por parte de pai, eles eram italianos. Perdão, deixa-me fazer uma retificação: Zeferina Funari. É que o apelido era Firica. Minha família veio por volta de 1894, mas alguns depois voltaram, retornaram à Itália, mas, outros ficaram aqui. Naquela época, minha mãe dizia que eles falavam que iam fazer a América, quando vieram para cá. Os meus avós, na Itália, e, depois, meu pai, eram ligados à construção civil. Naquela época, existia uma atividade chamada de estucador. Esses prédios todos trabalhados, com bichos, com coisas trabalhadas em cimento, eles eram especializados nisso. O meu avô por parte de pai se radicou em Bagé e trabalhava na construção civil. O meu pai seguiu os mesmos passos do pai dele e trabalhava também na construção civil, só que ele era construtor, na cidade de Bagé e depois em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Eu tenho seis irmãos, quer dizer, nós éramos seis, comigo, pelo primeiro casamento do meu pai. A minha mãe faleceu 48 horas depois que eu nasci, ela morreu de parto. Então, o meu pai casou novamente e teve mais dois filhos do segundo casamento. Eu e todos os meus irmãos fomos criados por uma tia, irmã do meu pai. Ela criou todos, eu desde que nasci e os outros também, que nasciam e iam para a casa dela. INFÂNCIA Eu fui criado em Pelotas até os 12 anos de idade. Naquela época, Pelotas era a segunda cidade do Rio Grande do Sul. Nós tínhamos uma casa muito boa, foi meu pai quem fez, bem no centro da cidade. Estudei em escola pública e...
Continuar leituraIDENTIFICAÇÃO Meu nome completo é Dante Enedino Funari di Lucia, eu nasci em Pelotas, no Rio Grande do Sul, no dia nove de março de 1938. FAMÍLIA / PAIS Meu pai era Victorio Funari di Lucia, minha mãe Enedina dos Santos Funari. Os meus avós por parte de pai eram Tomás Funari, italiano, e Ermínia Funari. Por parte de mãe, era José Funari e a minha avó Firica Funari. Porque o meu avô, por parte de mãe, era irmão da minha avó por parte de pai, eles eram italianos. Perdão, deixa-me fazer uma retificação: Zeferina Funari. É que o apelido era Firica. Minha família veio por volta de 1894, mas alguns depois voltaram, retornaram à Itália, mas, outros ficaram aqui. Naquela época, minha mãe dizia que eles falavam que iam fazer a América, quando vieram para cá. Os meus avós, na Itália, e, depois, meu pai, eram ligados à construção civil. Naquela época, existia uma atividade chamada de estucador. Esses prédios todos trabalhados, com bichos, com coisas trabalhadas em cimento, eles eram especializados nisso. O meu avô por parte de pai se radicou em Bagé e trabalhava na construção civil. O meu pai seguiu os mesmos passos do pai dele e trabalhava também na construção civil, só que ele era construtor, na cidade de Bagé e depois em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Eu tenho seis irmãos, quer dizer, nós éramos seis, comigo, pelo primeiro casamento do meu pai. A minha mãe faleceu 48 horas depois que eu nasci, ela morreu de parto. Então, o meu pai casou novamente e teve mais dois filhos do segundo casamento. Eu e todos os meus irmãos fomos criados por uma tia, irmã do meu pai. Ela criou todos, eu desde que nasci e os outros também, que nasciam e iam para a casa dela. INFÂNCIA Eu fui criado em Pelotas até os 12 anos de idade. Naquela época, Pelotas era a segunda cidade do Rio Grande do Sul. Nós tínhamos uma casa muito boa, foi meu pai quem fez, bem no centro da cidade. Estudei em escola pública e depois fui para a Escola Técnica de Pelotas, fazer o curso industrial básico. Em 1952, minha mãe me trouxe para o Rio. Houve problemas com a família lá em Pelotas e ela foi obrigada a vender a casa e vir trabalhar no Rio de Janeiro, em 1951. Em 1952, ela foi me buscar e eu vim morar com ela aqui. Nós fazíamos todas as coisas de cidade do interior. Naquela época, por exemplo, ninguém tinha carro, era muito raro. A nossa casa era boa, era uma casa grande, meus irmãos brincavam no jardim, na rua. Na rua em frente, não passava automóvel. Entre 1943 e 1944, meu pai estava muito doente e foi recomendado pelo médico que ele se afastasse da cidade. Ele dizia que não gostava de despedir um empregado, um pedreiro, então ele levantava e ia de madrugada para a obra para consertar ou para refazer uma coisa que ele não gostou, e isso agravava o estado de saúde dele. Naquela época, eram muito comuns os problemas pulmonares. Então, minha mãe comprou uma chácara nos arredores da cidade, para que ele fosse morar lá, para afastá-lo daqui, só que ele faleceu antes. Então, nós fomos para essa chácara, ficamos lá um tempo, em 1944 nós viemos para a cidade. Mais tarde, o meu irmão mais velho – não é bem o meu irmão mais velho, é um irmão de criação, filho dessa tia que nos criou – se meteu em alguns negócios em Pelotas, um restaurante, uma boate, um negócio assim. E a época não era para aquilo, coisa muito cara, fora da realidade, e aí a minha mãe achou que o nome dela valia mais do que aquilo, então ela resolveu vender a casa, pagar todas as dívidas. Devido a esse problema da boate, do restaurante, como eu era o mais moço, praticamente fui mais sacrificado, porque o pessoal trabalhava de noite e eu dormia durante o dia, eu era pequeno, estudava de manhã. Confesso que eu não era um bom aluno, porque fiz o primeiro ano primário num colégio de freiras e eu não gostava muito da freira. RELIGIÃO Eu morava perto da Catedral de Pelotas e a freqüentava com alguns colegas da minha idade. A gente não ia tanto por religiosidade, mas freqüentava. E depois nós fomos ser sacristãos, o padre nos convidou e nós fomos. Inclusive, eu me lembro que dois desses colegas meus acabaram virando padre, foram para o seminário, se formaram. EDUCAÇÃO Depois que houve esse problema com o meu irmão e a minha mãe vendeu a casa, nós fomos morar numa outra casa que era do meu pai, em que ele morava com a segunda esposa, que também já tinha casado novamente. Ficamos lá um ou dois anos, aí já mais afastados da cidade, e ela resolveu vir para o Rio, em 1950, 1951. Ela era enfermeira. Eu fiquei em Pelotas e fui morar com meu irmão. Meu irmão mesmo, mais velho, que havia casado há pouco tempo. Fui morar com ele porque eu havia passado para a Escola Técnica de Pelotas. Cursei o primeiro ano na Escola Técnica de Pelotas e aí ela veio me buscar, eu vim transferido para a Escola Técnica Nacional. Nessa época, minha mãe trabalhava no Colégio Nova Friburgo, da Fundação Getúlio Vargas. Inclusive tinha até conseguido uma bolsa de estudos para mim. Mas, para poder ir para o colégio de Nova Friburgo, eu ia perder um ano de Escola Técnica, que, na época, correspondia ao primeiro ano ginasial ou industrial básico. Ela achou que não era conveniente perder um ano e por isso eu fiquei no Rio estudando na Escola Técnica e ela morando em Friburgo. Eu fiquei na casa de uma família amiga dela; aliás, ela era madrinha de casamento, madrinha de uma das filhas, a família era de Pelotas também. Eu fiquei morando um ano com eles, depois fui para a casa de uma prima em Jacarepaguá. IMAGEM DA PETROBRAS Eu vim para o Rio em 1952. Em Pelotas, alguma coisa que se ouvia falar ou se escutava eram aqueles negócios de “petróleo é nosso”, aquele movimento para a criação da Petrobras. Até a criação da Petrobras, com a Lei 2004, eu era menino, não tinha nenhuma participação, a gente escutava só falar, mesmo porque, em Pelotas, não havia nenhum tipo de movimento de qualquer atividade petroleira, o negócio vinha da Bahia, vinha do Rio de Janeiro. MUDANÇA PARA O RIO DE JANEIRO Eu vim estudar na Escola Técnica Nacional, no Macaranã. Naquela época, a gente entrava na escola às oito horas da manhã e saía às cinco horas da tarde. Tomava café da manhã e tinha aula de manhã, depois almoçava na escola, tinha aula de oficina, às quatro e meia tomava café da tarde e ia embora para casa. Numa determinada época, eu morei na escola, junto com um irmão, que já faleceu, mais velho do que eu, que veio também da Escola Técnica de Pelotas. Só que ele já estava no curso técnico e eu estava no industrial básico. E a escola mantinha um alojamento – não era internato – para aqueles alunos que vinham do interior. Tinha muita gente de Goiás, Mato Grosso, e nós moramos lá um ano, dois anos. Minhas relações eram normais, tinha amigos, colegas. Quando saí de lá, fui morar no Flamengo, onde minha irmã alugou um apartamento. JUVENTUDE Naquela época, eu acho que era mais difícil para a gente se divertir; quer dizer, não era mais difícil, era o divertimento da época. Não tinha muito dinheiro, ou quase nenhum, para divertimento. Morei muito tempo só eu e a minha irmã, que trabalhava e sustentava o apartamento com o que ela ganhava. Depois, esse meu irmão que morou na escola veio morar conosco e depois a minha mãe também. Era um apartamento pequeno, de quarto e sala, na Rua Silveira Martins, no Flamengo. Ela trabalhava, cuidava de pessoas doentes, essas coisas, e sempre tinha algum dinheirinho. O nosso programa era um programa de rapazes daquela idade. O programa era conseguir uma festa para ir no fim de semana, um aniversário ou um baile, ficava lá jogando sinuca, ia à praia. Morava próximo à praia, não existia ainda o Aterro do Flamengo, então a praia era ali perto. Programa de jovem, rapaz, era isso, mas também não tinha muito mais coisas, porque ninguém tinha carro. Depois começou a aparecer lambreta, essas coisas, mas não tinha dinheiro pra isso. LAZER / ESPORTES Praticava esportes. Eu fui sócio da Associação Cristã de Moços, disputei prova de natação, de water-polo, cheguei a ganhar torneios. Com 17 anos, eu já tinha saído da escola, fui fazer o serviço militar, me apresentei como voluntário na Aeronáutica e fui para a Base Aérea do Galeão, onde fiquei três anos. Eu servi na Companhia de Polícia da Base, então praticava esportes, dava serviço, foram três anos da minha vida como soldado na Base Aérea do Galeão. MÚSICA Eu sempre gostei, de samba, por exemplo, dessas coisas. Mas, na época da juventude, foi quando surgiu o rock, Elvis Presley, eram músicas de sucesso no momento. Não gostava muito, eu sempre gostei de música popular brasileira. Quer dizer, não era contra, nem a favor, mas nunca fiz parte daqueles grupos de rock. JUVENTUDE / ROMANCES Eu acho que era um pouco mais difícil do que hoje, pois os recursos eram muito diferentes. Hoje a vida do jovem é normal. A gente assiste diariamente na televisão, comentários, “namorado leva namorada para casa, os pais concordam, acham até que é melhor, porque é menos perigoso”, “a namorada leva o namorado para casa”. Naquela época, não tinha nada disso. Por volta de 1970, houve a grande evolução, a grande libertação da mulher, que foi a pílula. Então, era difícil, a gente namorava escondido. Hoje todo mundo tem carro, tem motel em tudo quanto é lugar, naquela época não tinha, era proibido, quando ia para algum lugar era escondido, com medo da polícia, tinha que fazer ficha, não sei o quê. E depois, na época que eu fiz serviço militar, aí saía, andava nessas pracinhas fardado e namorava, paquerava num baile, na praça. Soldado tinha muita facilidade de conseguir doméstica. Mas era uma coisa normal, da época. O meu primeiro namoro, o mais sério, eu namorei uma moça, chamava-se Terezinha, ela era de Campos e a família morava num subúrbio. Nós ficamos algum tempo namorando e minha mãe não gostava muito dela. Porque nessa época eu havia parado de estudar. O sonho da minha mãe era eu voltar a estudar e me formar. Os mais velhos já estavam formados e tal, e uma amiga da minha irmã teria dito para a minha mãe que a Terezinha disse que eu ia mostrar como eu não deixava mais ela e não voltava a estudar. Não deixar mais ela até que a minha mãe não deu muita bola, mas não voltar a estudar era uma inimizade para o resto da vida. Isso não era verdade, não tinha nada a ver. Não sei por que essa moça foi dizer isso. EDUCAÇÃO Eu parei de estudar porque, quando saí da Escola Técnica, eu fui fazer o Serviço Militar. Aí era mais difícil conciliar Serviço Militar com trabalho, com estudo. E também com colégios autônomos, colégio pago. Então, eu parei um bom tempo de estudar. Minha mãe não tinha preferência, ela queria que eu me formasse. Eu tinha um irmão, que já faleceu, o Ermírio, que veio para o Rio e também fez o Curso Técnico na Escola Técnica e se formou em Engenharia Mecânica. Então, o xodó dela era o Ermírio, porque se formou. Tinha outro irmão, que ficou em Pelotas, o Tomás, que se formou em Agronomia e depois em Economia. A minha irmã só veio a se formar muito tempo depois, quando minha mãe, inclusive, já havia falecido. Eu retomei os meus estudos, me formei, eu sou advogado. INGRESSO NA PETROBRAS Depois que eu saí da Aeronáutica, eu tinha que começar a minha vida propriamente. Era uma época em que não tinha nenhuma profissão, não tinha nenhum conhecimento. Então, era aquele negócio, era auxiliar de escritório, era corretor, vai vender imóvel, vender terreno, vender não sei o quê. Nunca vendi nada, não consegui fazer nada, não é? Eu ingressei na Petrobras. Quando eu ingressei na Petrobras, aí minha vida mudou. Eu estava procurando um emprego, a Petrobras era nova também. Praticamente tudo na Petrobras se resumia no Edifício Barcelos, ali no número 534, da Avenida Presidente Vargas. Minha mãe tinha vindo do Sul, porque ela foi a passeio, passar um período na casa dos meus irmãos, então ela veio me ajudar a procurar um emprego. Meu irmão, que morava junto, também reclamava que eu não estudava, que eu não trabalhava, aquela coisa. Nós fomos até um cartório, na Rua do Rosário, e ela encontrou um amigo que foi tesoureiro no Colégio Nova Friburgo, Fundação Getúlio Vargas, na época em que ela trabalhou lá. Eram conhecidos de longa data e ela perguntou se havia alguma possibilidade de trabalhar no cartório. “Não, aqui os escreventes são juramentados e datilógrafo de cartório é altamente especializado. Então, não tem. Mas a Petrobras está abrindo, está começando e na Petrobras tem o Maia, que também foi do Colégio Nova Friburgo. Quem sabe você não vai conversar com o Maia, ele está lá na Presidente Vargas, 534.” E nós fomos, no mesmo dia. Eles se reencontraram – inclusive, minha mãe foi a parteira dos dois filhos dele – e ele disse: “Olha, a Petrobras agora é só concurso. Não tem nenhum concurso aberto. Aqui na cidade, auxiliar de escritório tem muito pouco, mas a refinaria está começando a fazer concurso para atividade operacional. Já houve concurso para instrumentista, para técnico de instrumentação, houve concurso para ajudante de operador de processamento, ajudante de operador de utilidades e vai haver concurso para ajudante de operador de transferência e estocagem. Deixa eu ver, espera um minuto.” Aí, pediu licença e se retirou. Qaundo voltou, ele disse: “Olha, conversei lá com o pessoal, vamos abrir a inscrição para transferência e estocagem. Você vai ser o número um. Pronto.” Aí me trouxe um formulário, eu preenchi e entreguei: “Agora você vem de vez em quando aqui, para saber o andamento, quando vai se realizar o concurso.” E eu fui algumas vezes, até que um dia a pessoa que me atendeu disse: “Olha, acabou tudo aqui, não tem mais nada. Agora é no Centro de Treinamento da Reduc.” Na época, estava saindo de Refrio (Refinaria Rio de Janeiro) para Reduc, e estavam criando o Centro de Treinamento lá. O chefe do Centro de Treinamento era o Dr. Armando Avelar Torres. Então, eu fui à Reduc para saber se tinha alguma novidade e tal, e encontrei um rapaz, meu colega, que serviu comigo na Aeronáutica. E ele conversando comigo: ”Você está desempregado?” Eu disse: “Estou” “Tem vaga aí na vigilância, mandaram um vigilante embora antes de ontem. Vamos lá que eu vou arranjar um negócio, você vem trabalhar aqui.” E me apresentou para o chefe da vigilância. Eu conversei com ele, expliquei da Aeronáutica, o que eu fazia e tudo, ele mandou que eu fizesse uma prova. Eu fiz a prova e, uma semana depois, fiz exames médicos e comecei a trabalhar. Mas isso foi por um mês, um mês e pouco, porque logo em seguida fui chamado para fazer o concurso para operador. Nós fizemos um concurso na Escola Técnica, eram muitos candidatos para 28 vagas, e eu fui o 11º classificado. Mas foi um drama, porque o manual do pessoal dizia que para o sujeito trocar de função tinha que ter, no mínimo, dois meses na função e eu não tinha os dois meses. Tive que apelar para todo mundo, até que consegui, com a condição de que eu faria o curso e só ficaria se fosse bem classificado. Então, dali eu fui para Cubatão, fazer o curso na RPBC. Nós morávamos em Santos, numa pensão no Gonzaga; naquela época, não tinha hotéis. Éramos 86 bolsistas da Petrobras morando na pensão. Ingressei em 1960. CURSO DE FORMAÇÃO EM CUBATÃO Eu entrei na obra, como vigilante, no dia quatro de agosto de 1960 e no dia 15 de outubro nós embarcamos para Cubatão. Aí ficamos morando lá, na Nova Pensão São Francisco, na Rua Floriano Peixoto, no Gonzaga, nº 86. Nem preciso dizer que dava polícia, dava o “diabo” lá, porque eram 86 rapazes morando numa pensão. No dia que eu cheguei, num sábado, o ônibus que eu fui só tinha dois lugares e o resto foi num ônibus contratado. Quando eu cheguei na pensão, a dona me disse: “Eu espero que vocês sejam melhores do que os que estão aí. Porque só tem maluco.” Era cantoria, o pessoal chegava de madrugada, batia porta, gritava, porque trabalhava em turno. Eles apelidaram o dono da pensão de Gavião, aí chegava: “seu Gavião, dona Megera”, fazia aquele barulho, acordava todo mundo. A pensão era nossa, só tinha gente da Petrobras. Só o pessoal da Refinaria. E, no final do ano, nós retornamos para o Rio. Passado o período das festas de Natal e Ano Novo, nós iniciamos a operação da parte prática que já tínhamos treinado na RPBC. CENTRO DE TREINAMENTO DA RPBC As coisas eram muito diferentes. O Centro de Treinamento da Refinaria era um barracão de madeira fora da área, próximo aos tanques de cru, e lá tinha um único funcionário que fazia faxina e servia cafezinho. Os engenheiros que deram treinamento para nós eram daqui do Rio. O Dr. Lisboa foi o chefe, depois passou para Humberto Loureiro, Jonas Boechad, Heitor Augusto de Moura Estevão, eram todos da Reduc. E tinha outros que eu não recordo o nome agora. Inicialmente, nós íamos de manhã cedo e voltávamos de tardezinha, almoçávamos na Refinaria, tendo aula o dia todo e prova no dia seguinte, de manhã cedo. Era um negócio meio apertado porque tinha uma média mínima de sete, de modo que quem tirasse menos de sete poderia ser desligado. E, depois de algum tempo, encerrou a parte teórica e vieram dois supervisores da Refinaria para dar o treinamento prático – primeiro era o treinamento teórico da atividade e depois a prática. Aí nós entramos em turno, trabalhávamos em turno, éramos 28 divididos em quatro grupos. Era turno de oito horas, naquela época, era muito forçado, como nós éramos do Rio: “Não, carioca não é de trabalhar, não sei o quê.” Então, a gente acabava de fazer um serviço, vinha um outro: “Psiu, vem comigo, vem fazer não sei o quê.” Voltava, vinha outro. Mas foi bom. Nós voltamos para a Reduc e no dia 15 de fevereiro eu fui demitido da obra de construção da Refinaria Duque de Caxias, eu e mais dois colegas. O resto do pessoal foi admitido no dia 15 de fevereiro de 1961, na função de ajudante de operador, transferência e estocagem. REFINARIA DUQUE DE CAXIAS Antes era Refrio, Refinaria Rio de Janeiro. Foi o primeiro nome que surgiu, inclusive, havia placas com a Refinaria Rio de Janeiro, depois é que foi dado o nome definitivo, Refinaria Duque de Caxias. Era uma situação muito difícil, dia de chuva não entrava ninguém da Refinaria, nem viatura, nem nada, porque atolava na lama. Tinha uns tratores espalhados pela área para retirar as viaturas atoladas na lama. Saiam turmas de trabalhador braçal lá para o fundo da área para abrir valas para drenar, porque era tudo mangue. Eu nunca vi, mas eles diziam que, às vezes, não vinham todos, iam dez, voltavam nove, um ficava enterrado na lama. Isso é o que diziam, eu nunca vi. O Posto Médico da Refinaria era separado alguns quilômetros da Refinaria, lá fora, num barracão de madeira. Atrás do barracão, fizeram outras duas salas, que eram o Centro de Treinamento. E mais longe, fora da Refinaria, foi alugado um restaurante, um negócio de madeira em que nós íamos almoçar, de ônibus. Quer dizer, em dia de sol, a comida ficava marrom, mas não era canela, era poeira mesmo Porque os carros passavam, era uma poeira Então, foi uma época muito difícil, a Refinaria ainda estava em construção, teve unidades que só ficaram prontas muito depois e nós entramos em turno naquelas condições. Tinha condução para irmos almoçar, a princípio era um “papa fila”, passava na Praia do Flamengo, eram aqueles ônibus grandões. Depois, nós já éramos tratados com certos benefícios, porque éramos da Refinaria, éramos operadores e o resto do pessoal não, então já tinha um ônibus melhor para a gente ir para a Refinaria e depois de tarde para voltar, e ele ficava lá para circular para levar a gente para dentro, para a área, para estudar aquelas tubulações, alinhamentos, tanques, aquela coisa toda. E depois, nós entramos na fase de pré-operação da refinaria, uma fase muito difícil, não tinha luz lá na área, não tinha casa de controle, não tinha nada, era um lampião grande, um ventilador... nem, o ventilador veio depois quando veio a luz e foi muito difícil. Não tinha água para tomar banho, eu tomava banho com garrafa de água mineral. A refinaria tem umas casas de material para combate a incêndio, então, por exemplo: na minha área é Casa11, era na segunda rua, nós ficamos lá durante muito tempo. E em baixo da casa passava um valão grande. Então o pessoal descia ali e ficava jogando água com garrafa de água mineral. Depois um colega nosso arranjou uma mangueira e puxou, foi uma mangueira com água e aí botava aquela mangueira para a gente tomar banho. De madrugada, era aquele mosquitinho maruim, era insuportável, porque, se fechasse a casa o calor era insuportável por causa do lampião, se abrisse a casa os mosquitos invadiam... Eu muitas vezes fiz relatório andando pela área, porque não conseguia parar. Então pega o livro, botava aqui, ia fazendo o relatório e andando na área. Foi muito difícil, foi uma época muito difícil. RPBC / PRÉ-OPERAÇÃO Nós entramos em torno de julho de 1961, e eu acho que em agosto entramos na fase de pré-operação. Depois fizeram as casas de controles e nós já começamos a receber petróleo, o tanque 111 foi o primeiro tanque a receber petróleo. 1961, final de 1961. E já começamos a receber petróleo, entrar em fase de pré-operação, as unidades também, aí as coisas foram melhorando, foram tomando um destino mais certo. Em volta da Refinaria; digamos assim, de dentro da Refinaria para fora, do lado esquerdo era um canal, Rio Sarapuí, se eu não me engano. E do lado direito tinha um canal que ligava; um canal artificial, que ligava a casa de força ao mar, de onde era retirada a água para a refrigeração das unidades e do lado passava uma estrada, chamava-se Estrada da Fabor, onde foi construído no final da estrada a fábrica de borracha sintética. Por essa época, 62, 63, por aí. HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Tinha eu e meu amigo Manoel (Leite do Nascimento), que até entrou comigo e um dia nós chegamos para trabalhar e o relatório, tinha na ordem de serviço, tinha uma ordem para, numa determinada hora da noite, duas, três horas da manhã, fosse fechado o tanque 110, que era o último tanque da área, porque ele estava drenando, estava cheio de água e estava drenando. Então quando foi na hora nós fomos para lá, a pé, pela rua, não tinha luz, não tinha nada, só lanterna. Quando nós atravessamos para ir para o rio, aquela plataforma que tem em frente ao dique do tanque: “E agora, como é que eu vou chegar lá no tanque?” A água cobria tudo. Não tem como chegar, porque andar por cima da tubulação é muito perigoso porque a gente não enxerga a tubulação. Então o resultado, eu disse: “Ô Manoel, tu segura a lanterna aí, que eu vou tirar a roupa e vou a nado.” E eu tirei a roupa, o parceiro segurou o macacão e eu pulei na água e fui nadando até o tanque e lá nós fechamos a válvula do tanque e voltei nadando. Era o único jeito de chegar lá o tanque, porque não tinha como chegar. Uma outra ocasião, logo que o tanque 111 recebeu o primeiro petróleo, de dia, mais ou menos às 11 horas da manhã, tinha que medir o tanque, medir a altura do tanque, medir a água no fundo do tanque, tirar a temperatura, tirar amostras, colocar aquele material todo numa caixa e eu fui medir. Quando eu subi dique que eu desci correndo assim, eu consegui andar uns cinco passos e atolei na lama até aqui. E aí fiquei lá tentando sair, porque quando eu forçava um pé, o outro enfiava mais. Aí fiquei até que alguém me socorresse, porque eu não ia conseguir sair. Mas isso não era uma coisa assim, mais ou menos comum, porque a Refinaria ainda estava no início. COTIDIANO DE TRABALHO Passamos a ter alguns benefícios. Fizeram as casas de controle para a transferência, tinha luz, tinha um ventilador, tinha banheiro. Tinha melhor condição de trabalho. Só. A desvantagem eram os lanches, nós não íamos ao refeitório, a gente recebia lanche e não tinha , era comum de outras Refinarias, na RPBC também era a mesma coisa. As coisas já eram quase definitivas, que só deixaram de ser definitivas agora, com as novidades, com as condições novas que foram feitas na Refinaria. JORNADA DE TRABALHO Inicialmente, tinha turno de sete às três, e de três às 11, e de 11 às sete. Então isso o ano todo; por exemplo: no Natal, o grupo que estivesse saindo no dia 25, quando a gente acertava para a gente poder sair mais cedo um pouco, para dar tempo de chegar em casa e o grupo que entrasse, entrava mais cedo para não sacrificar os dois. E era comum, no Natal, Ano Novo a gente se reunia, fazia uma ceia, cada um levava uma coisa, e ninguém reclamava, era normal. A Empresa às vezes melhorava o lanche, eu acho, nesse dia ninguém dava nem “bola” para o lanche, porque cada um levava alguma coisa. Depois nós passamos para o turno de seis horas. Aí passou de seis às 12, 12 às 18, 18 às 24 e de 24 às seis. O LIMITE DOS TANQUES Nós tínhamos um tanque com os costuradores do lado, e esse tanque começou a vazar no misturador. E a manutenção só permitia, não podia consertar porque só se entrasse dentro do tanque. E eles não tinham como entrar porque o tanque, no mínimo, tinha meio metro de petróleo. E um engenheiro que era o nosso chefe, veio na área e disse: “Dante, você “topa” entrar nesse negócio?” Eu disse: “Eu entro” E abriu os tanques, botamos o equipamentos de segurança e eu entrei no tanque com petróleo até aqui em cima do joelho, para tirar uma peça que havia caído lá dentro. Outra coisa, quando eu comecei a trabalhar, quando a Refinaria começou a trabalhar, os tanques de petróleo armazenavam 217 mil barris de petróleo cada tanque. Os tanques grandes lá no fundo da área. Era 217 mil barris de petróleo. A orientação que nós tínhamos era que, quando o tanque atingisse 2,20 metros, trocar por um outro, para evitar que houvesse algum problema na unidade de cru. E aquilo ficava na minha cabeça. Toda vez que eu tinha que trocar um tanque de 2,20 metros, são 14, são 28 mil barris de petróleo que a gente está perdendo de espaço no tanque. Aí fui, algum tempo fui, até que um dia eu cheguei para pegar à meia noite, o meu colega que estava saindo, disse: “Dante, manda o teu pessoal para a área, porque vai trocar agora. Já está em torno de 2,10 metros, 2,20 metros, vai ter que trocar.” E eu falei: “É hoje” Aí mandei chamar: “Vai lá para a área, manda o cara embora e vamos fazer esse negócio.” Eu já tinha combinado com meu sub-chefe e aí nos fomos, controlando, com lanterna, um em cima do tanque medindo, olhando. Era no “olhômetro”, olhando o manômetro da bomba, para ver o ponteiro. Quando foi às três horas da manhã, o engenheiro coordenador chegou para buscar o relatório e me perguntou: “Que horas trocou o tanque?” “Eu falei: “Não trocou” “Então, com quantos metros está gente?” “Essa hora deve estar com 1,50 metro , mais ou menos.” Aí ele deu um pulo assim, falou: “Ó, a responsabilidade é tua Eu falei: “Eu não estou dizendo nada” Aí foi, nós começamos a ficar com medo, de acontecer alguma coisa; aí trocamos com 1,40 metros e poucos. Um outro grupo viu aquilo, trocou com 1,20 metros. E, quando aconteceu, as mesmas coisas nós levamos, até 87 centímetros. O chefe da divisão reunião, deu um elogio para o pessoal e disse: “- Olha, vamos parar em um metro. Porque senão vocês vão parar a Refinaria, porque está havendo disputa e vamos parar em um metro.” A partir daí, nós ganhamos uma quantidade de espaço muito grande nos tanques. REDUC O tanque daquela época mudou muito comparado com o de hoje. Quer dizer, mudou. A Refinaria, eu trabalhei nas três áreas, mas na área de cru hoje tem os tanques 101 à 110 foram retirados e no local onde existiam esses tanques, foram construídos pequenas unidades de processamento de lubrificantes. Isso eu vi agora quando visitamos a Refinaria. E os tanques do lado direito, que eram tanques de teto fixo, quer dizer, fechados, foram transformados em tanques de teto flutuante, ou seja, é um tanque que o teto flutua sobre o produto, o teto sobe e desce de acordo com o nível do produto. Isso é utilizado, é mais caro o tanque, o custo é muito mais elevado, mas ele é utilizado para evitar a perda por evaporação, porque não há espaço livre, o teto está sempre apoiado em cima do produto e aí ele pára antes do teto encostar no fundo. Ele tem umas bases antes ele para aí. E flutua em cima, fizeram tanques desse tipo na área de cru. Antigamente era só tanque de gasolina que era assim, tanque de nafta, essas coisas, hoje tem tanque de petróleo também desse tipo. A Refinaria, nós estivemos lá agora, eu estava falando para ela que a Refinaria ofereceu toda a primeira quarta-feira do mês tem um churrasco, lá na Ambep [Associação dos Mantedores Beneficiários da Petrobras], no Serdis, dos aposentados. E no mês de novembro a Refinaria participou e ofereceu uma homenagem a primeira turma de operadores de transferência e estocagem, que eu fui. Nós ganhamos umas camisas o emblema da Petrobras e tudo, uma placa e fomos passear dentro da Refinaria, de ônibus...Antigamente era mais romântico, hoje está muito moderno. Por exemplo, as casas de controle não existem mais, é uma casa de controle só para todo mundo, todo mundo com computador na frente, não tem mais aquilo que existia antigamente, é tudo automatizado e tal. Realmente é o progresso, não pode ser diferente. Mas antigamente, sei lá, vibrava mais com o negócio, porque tudo dependia da gente, você não tinha recurso automatizado nenhum. Era tudo no olho e na mão, e era assim, principalmente nas áreas de equipamentos automáticos e tudo, e os que tinham não havia confiabilidade, você acionava um equipamento e ia lá na área para ver se ele abriu ou fechou, porque antes ninguém confiava que ele fosse funcionar. Por exemplo, na Reduc, havia um sistema de medição de tanques da Ilha D´Água, eles tinham um painel, que através daquele painel eles teriam condições de ver se os tanques da Reduc estavam abertos ou fechados e a medição, o nível dos produtos do tanque. Nunca funcionou aquilo. Houve, inclusive, acidente por causa daquilo, em razão desse painel, o pessoal da Ilha D´Água fazia determinadas operações, pensando que a Reduc estava com o tanque aberto e com a medição, e que na realidade, ia estourar a linha, porque aumentou a pressão e a linha estourou. E aquilo nunca chegou a funcionar. Hoje eu acredito que deve ser mais confiável, porque tem computador e tem esse negócio todo. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Eu entrei em 1960, 1961, digamos assim, nós passamos como ajudante de operador, uma função extinta. No final de 62 eu fui operador, em 63 eu fui a operador chefe. Existia um plano de carreiras: ajudante de operador, operador, operador sub-chefe, operador e supervisor. Eu só não fui operador sub-chefe, porque nós fomos as primeiras turmas, então alguém tinha que ser promovido. A nossa turma foi a primeira a ser promovida, eu fui ajudante de operador, depois fui operador e depois fui operador chefe. Nessa época, as promoções eram por indicação da chefia. Nós tivemos sorte porque vieram muitos operadores da RPBC; operadores de processamento e também de utilidades. Inclusive na área de utilidade veio gente da Marinha, veio gente de outras... contavam na época, eu não posso garantir porque era o que a gente escutava. Que esse pessoal de transferência e estocagem da RPBC, por exemplo, teriam pedido alguma vantagem maior do que os outros ganharam para vir para cá, porque senão eles não vinham. Porque eles não confiavam que nós tivéssemos competência para dar partida na refinaria. E o Dr. Armando Torres, reuniu a nossa turma e perguntou: “Vocês têm condições de dar partida?” “Claro” E então veio muito pouca gente, só os supervisores. Nós começamos, era encarregado de área, o outro era sub-encarregado. Com o tempo, um ano, nós fomos promovidos a operador e aí com o tempo, foram as promoções definitivas. Então, eu fui operador-chefe em 63, em pouco tempo. Nem sub-chefe eu não fui. IMAGEM DA PETROBRAS A Petrobras já era um bom emprego, muito bom. Minha mãe ficou feliz, a Petrobras sempre foi um excelente emprego. CONSTRUÇÃO DA REDUC Tinha muita gente, porque havia as empreiteiras que trabalhavam nas obras, construtoras como a Foster Willian, que era responsável pelo projeto, mas nós não tínhamos nenhuma intervenção nisso, nessa parte não. A Refinaria chegou a ter mais de três mil homens trabalhando só na obra. Inclusive ali do lado da refinaria tinha um portão e a seguir tinha uma espécie de uma Vila onde tinha tudo: casa de jogo, boate. Aquele pessoal de obra que vinha e moravam em pensões, que moravam por ali. Mas a nossa parte foi completamente diferente. Na minha área tinham os chefes de setor, tinha o engenheiro-coordenador e tínhamos nós, que éramos operadores e que operávamos cada área... tinha área intermediária, área de cru, área final e ali, trabalhava com soda cáustica, trabalhava com flare, aquele negócio que tem aquela chama. Mas, quase todos tinham sido estudantes, quase todos vinham, inclusive, na minha turma tinha muitos ex-cadetes da Escola de Aeronáutica, tivemos um problema qualquer lá na Aeronáutica e foram desligados. E a Aeronáutica fez um acordo com a Petrobras se eles se submeteram a um concurso junto, com a minha turma. Então, muitos da minha turma eram originários da Escola de Cadetes da Aeronáutica. TRAJETÓRIA /REFAP Eu cheguei a operador-chefe, aqui na Reduc. E permaneci na Reduc até 1968. Em 1968 eu fui convidado, indicado por um colega, eu fui convidado pela Refap para ir trabalhar em Porto Alegre, porque eu sou gaúcho, minha esposa na época era gaúcha também, era de Caxias do Sul, casei aqui no Rio, mas com uma gaúcha. Então eu fui para Porto Alegre. A Refap estava em obra e eu fiquei fazendo a parte de pré-operação da Refinaria, na atividade de transferência e estocagem só tinha eu, depois é que chegaram alguns aqui do Rio, da RPBC. Dei treinamento para o pessoal da primeira e segunda turma da Refinaria, depois dei treinamento também para a primeira e segunda turma do Tedut, do Oleoduto lá em Tramandaí, e fiquei até final de 1969. Eu tive problemas de família em Porto Alegre, não me adaptei bem à Cidade. A Refinaria era pequenininha, a gente vinha de uma Refinaria grande para uma refinaria pequenininha que não acontecia nada. Então eu comecei a tratar da minha vida para voltar para o Rio. REFINARIA ALBERTO PASQUALINI Era uma refinaria começando, uma refinaria pequena, quer dizer, mas já em condições muito melhores do que a Reduc. A Refinaria já estava com a parte estrutural bem mais adiantada, ruas calçadas, iluminadas, o prédio da administração estava pronto, restaurante pronto, funcionando. Eu não posso dizer em relação a Regap, mas a Refap foi construída na mesma época da Regap, e a projetista foi a Islan, empresa italiana. Então, na Refap, aconteceu um fato interessante: quase todo o pessoal da obra era contratado, mesmo na parte de administração, tinha pouca gente da Petrobras. Tinha um cidadão lá, chamava-se José Zinhago, era um trabalhador braçal, que entrou no início da obra, contratado. E um dia precisaram de mais um braçal e ele disse: “Não, pode deixar que eu trago um aí.” Não sei se foi estimulado por quem, ele botou uma firma e começou a trazer gente para trabalhar na obra, contratado da firma dele e se tornou uma firma grande na época. Quase todo mundo era empregado do Zinhago. Quer dizer, o pessoal da Refinaria só começou a ser admitido e tudo, depois que a Refinaria estava pronta. Quando nós chegamos lá, que estava ainda em fase de obra e ia iniciar ainda a parte de pré-operação. A Refinaria já estava estruturalmente pronta, os prédios prontos, a superintendência lá em cima do morro, o restaurante, a entrada da Refinaria, os prédios, almoxarifado, essas coisas todas já estavam prontas, luz, água, tudo diferente de outras unidades. Aí foram sendo dispensados os contratados e admitidos aqueles que se submeteram ao concurso e que foram aprovados. O primeiro a ir foi o Glauber Gurgel Valente. Foi ele, inclusive, que me indicou. E depois fui eu. E eu passei um bom tempo sozinho lá, depois foram outros colegas nossos daqui, dois da Bahia e outros de alguns da RPBC. REFINARIA / TREINAMENTOS A RPBC, quando nós começamos, era a maior Refinaria do Brasil. Tinha a também Rlam, que era pequena. Então a Reduc usou para treinamento a RPBC, mas depois disso a Reduc deu os seus próprios treinamentos e a Refap também. Alguns da Refap treinaram na Refinaria Ipiranga, em Rio Grande, vieram para a Reduc treinar alguns daqui. Aliás, foram até a Bahia também, porque a Rlam era a única refinaria que tinha a unidade de tratamento e craqueamento térmico. Então, para a unidade de craqueamento da Refap, eles foram treinar na Bahia também. Aí acabou esse problema de treinamento só na RPBC. VOLTA AO RIO GRANDE DO SUL Eu montei uma casa lá. Naquela época era muito difícil, porque eu cheguei em Porto Alegre no início ou no final do ano. Acho que era início do ano, e o tal do povo gaúcho adora praia. Nós chegávamos e não tinha lugar, não tinha casa para se alugar, porque todo mundo estava na praia. Eu fiz um contato com aquelas locadoras, e também ainda tinha negócio de quem aceitava carta de fiança da Petrobras, quem não aceitava. Chegou ao ponto que até o pessoal na Refinaria dizia: “Ó, fala com o Dante...” Quando vinha alguém de fora, então: “Fala com o Dante que ele diz quem é que aceita, quem não aceita, essas coisas.” Mas eu tive problemas lá, com a Cidade também, porque é completamente diferente, é um povo diferente, bairrista. Embora eu seja gaúcho também, mas é um povo bairrista, lá é o Internacional, o Grêmio e mais nada. E eu tive problemas. Quando cheguei em Porto Alegre, uma cunhada minha que havia se separado do marido, estava com seis filhos, não tinha nada, resolveu ir lá na minha casa me fazer uma visita; não saiu nunca mais Ficou um ano. Tinha ido tomar um café e não saiu nunca mais. Eu tinha dois filhos pequenos, e depois o frio, as condições de trabalho, quer dizer, condições de trabalho que eu digo é em relação ao frio, aquela coisa toda. E eu comecei a pensar em voltar para o Rio. VOLTA AO RIO DE JANEIRO Eu trabalhei como supervisor na Refap, depois que nós entramos no turno, coordenador era o Engenheiro Ralph Jancke, trabalhava. Eu me dava muito bem com ele que, inclusive, depois, foi indicado para ser chefe superintendente do Tedut, lá em Tramandaí. E ele me disse: “Olha: eu vou para lá. Se, quem indicou for o superintendente, o Dr. Maurício (Augusto), eu não aceito.” Porque eles vinham brigados desde a Bahia . “Se não, eu vou para lá. E procura o teu lugar. Qualquer proposta que você aceitar eu cubro, para você ir para Tramandaí.” Mas eu não queria ir para Tramandaí de jeito nenhum. E aí fiquei lá até final de 1969. Aí, eu já tinha vindo ao Rio, já tinha tentado aqui com a Reduc. No final de 1969 o Decom criou uma divisão nova, aliás, uma superintendência nova, que era Sudist - Superintendência de Distribuição. Inicialmente foi Didist - Divisão de Distribuição, depois Serdis – Serviço de Distribuição e depois Sudist. O primeiro superintendente da Sudist foi o Dr. Flávio Magalhães Chaves, e ele soube que eu queria sair de Porto Alegre. Então ele me chamou lá na sala dele e disse: “Olha, eu vou para o Rio porque vou ser superintendente de distribuição. Me lembrei de levar o Glauber (Gurgel Valente) e você. O Glauber já foi, você, quer ir?” Respondi: “É só o que eu quero, é isso, é ir embora daqui.”E ele: “Então, eu vou para o Rio, vou entrar de férias e daqui a um mês tu me procura.” E assim eu saí da Refap e me desliguei dessa área de refinaria e vim para o departamento comercial. Fui trabalhar na Rua do Acre, no Disgua - Distrito da Guanabara. DISGUA – DISTRITO DA GUANABARA Sai de uma Refinaria e vim para o Disgua, mas eu sempre estive ligado à atividade operacional. Inclusive, quando vim ao Rio e fui entrevistado pelos gerentes do Disgua e pelo gerente adjunto, eu viria para a área de manutenção, mas um outro chefe de setor de operações soube que eu vinha, me conhecia de nome, e fez questão que eu fosse trabalhar com ele. E aí eu fui trabalhar. Em pouco tempo, eu me re-adaptei bem. Eu fiquei um bom tempo como encarregado da área de provimento, transporte marítimo na Baía de Guanabara, e depois fui dar partida na base de Vitória, na Bavit. Fui convidado para ser chefe da base de Vitória. No Disgua o trabalho era mais de escritório. Alguma coisa de fora, principalmente na área marítima. Nós tínhamos um serviço em Arraial do Cabo, duas vezes por mês iam navios da Fronape para Arraial do Cabo, para levar óleo para a Companhia Nacional de Álcoois e para uns tanques da Esso. Isso era um serviço que requeria um cuidado muito grande, porque os oleodutos estavam todos estragados, tudo furado. Uma vez, num domingo de manhã, a linha furou em frente a igreja. Tivemos que abrir uma porta no fundo para o pessoal sair da missa, porque a frente da igreja ficou toda inundada de óleo, em Arraial do Cabo. Depois isso passou para o Detran e eles reformaram. E nós tínhamos aqui na Baía da Guanabara as entregas por barcaça, Milagres, que era para a Rede Ferroviária, para atender a Rede Ferroviária, descarregava no Cais do Porto, também péssimas condições, tudo podre. Isso era da Shell, que depois resolveu não operar mais e ofereceu a Petrobras, mas a Petrobras também não quis ficar e a Rede Ferroviária passou a criar tanques em cada local onde ela fazia os abastecimentos. Aí passamos a entregar por caminhão. E operávamos com os clientes aqui, da Baía de Guanabara, que mandavam óleo para Vitória. Eu fazia essa atividade toda operacional. TRANSFERÊNCIA PARA VITÓRIA O primeiro chefe da Base de Vitória foi Paulo Brandão. Eu fui lá para dar partida, receber o primeiro navio, toda essa atividade. No segundo navio, também, eu fui lá para dar partida e algum tempo depois o Paulo resolveu voltar para o Rio, porque parece que a esposa dele não se adaptou bem lá. E aí o chefe me convidou se eu queria ir para Vitória: “Pôxa, já vim do Sul agora... Mas vou” Falei em casa: “ Vamos?” “Vamos” E aí eu fui para Vitória e fiquei dois anos na Base, em Vitória. Era uma Base grande, uma das maiores do Brasil, com atividade rodoviária, ferroviária e marítima, dentro das instalações da Companhia Vale do Rio Doce e fiquei lá até que fosse criada a Petrobras Distribuidora. Eu morava em Vila Velha, já fora da Ilha, e diariamente eu ia para a Base, de manhã. Eu tinha um carro da Petrobras, que eu dirigia e eu era o chefe da Base, da parte operacional, administrativa, tudo. Na época, foi muito difícil também, porque naquela região da Companhia Vale do Rio Doce só tinham quatro linhas de telefone, que eram da Vale. E a Vale cedia duas para a Petrobras, mas uma para área cidade e a outra podia fazer interurbano. Então era assim, eu chegava na base de manhã, falava com a secretária: “Pede uma ligação para o Rio” E ela dizia: “Ó, tem seis horas de demora ou tem cinco horas de demora.” Quando era no final da tarde, saía a ligação, e aí a gente ficava: “Ehhhhh? ...fala alto, não estou escutando nada, fala alto Então, deixa para amanhã” E o nosso contato era esse. Mas foi uma fase muito boa. CIDADE DE VITÓRIA Ela era boa, porque Vitória só tinha uma ponte ligando com o Continente, na entrada da Cidade, tinha uma ponte pequena na saída. Então não tinha assalto, não tinha roubo, não tinha nada, porque era só fechar a ponte e o sujeito não tinha como sair, tá entendendo? Olha, eu trabalhava na base, eu tinha um movimento muito grande na base, um movimento de, o quê? Sete milhões, eu não me lembro, diários. BASE DE VITÓRIA A Base era dentro do terreno da Companhia Vale do Rio Doce, lá em Tubarão. E nós construímos. Havia um quebra-mar em frente ao píer de graneleiros e ali naquele quebra-mar foi construído o píer de petroleiros. A gente faturava, estava dizendo, nesta época, cerca de sete milhões de cruzeiros ou cruzeiro novo, não me recordo agora exatamente. Eu fui ao Banco Real, conversei com o gerente que era conhecido nosso e disse: “Olha, eu não vou mandar todo dia o dinheiro, você faz o seguinte: você manda buscar.” Então, todo dia às 18 horas ia um sub-gerente num fusquinha, com a pasta, ia lá na base, reunia o dinheiro todo, botava e ia embora. Na Sexta-feira, ele telefonava antes, perguntava se alguém ia querer dinheiro para ele levar. Nunca ninguém roubou nada, nunca mexeu em nada, nunca tivemos problema. A CORRESPODÊNCIA SECRETA Eu tinha uma correspondência aqui com o Rio, correspondência normal, através de Fis, de CIs. Uma FI é uma Folha de Informação. CIs era Circular Interna. E tinha a Confidencial, uma que era Secreta; essa era a mais cuidadosa. Então, creio que em 1971, princípio de setembro ou final de agosto, eu recebi um telefonema daqui do Rio dizendo que no malote do dia seguinte chegaria um envelope secreto. Era para eu receber o malote, fechar a minha sala toda, abrir o cadeado e tirar o envelope, e depois entregar para a secretária distribuir o resto da correspondência. E naquele dia o malote atrasou, fiquei preocupado... Bom, mas finalmente ele chegou. Eu abri e havia uma informação, dizendo que os setores de segurança da Petrobras e do Brasil, o SNI e aquela coisa toda – isso foi no período revolucionário – obtiveram informações de que estavam sendo programadas atividades terroristas na área de Tubarão e na área da Bavit, que ficava dentro de Tubarão. Pediam que eu tomasse as providências. Bom, eu peguei a carta, botei no bolso, fui lá para o Porto de Tubarão, onde carrega o minério. O superintendente do Porto era o responsável pela segurança da área toda, era o engenheiro Pacheco. Eu entrei na sala dele e disse: “Pacheco, estou com problema” Ele disse: “Eu também Tu recebeste uma carta assim, assim, assim?” “Recebi.” “Eu também recebi.” O que nós vamos fazer? A segurança da base era ele quem fornecia, era contratada. E ele me cobrava o salário do pessoal da Petrobras. Então ele me disse: “Dante, essa segurança, você sabe, é todo mundo desarmado. Eles só usam cacetete. E é tudo bandido, se a gente botar uma arma na mão deles, eles vão matar a gente. Então, procura o que você puder e eu também. Me comunica o que arranjou, que eu também vou te comunicar.” E assim nós iniciamos naquela semana, trágica. O SNI tinha um escritório no Centro de Vitória. Eu fui lá, mas só tinha um cara sentado numa mesa, ele disse: “Pois não” Foi todo mundo para Brasília, agora eu resolvo tudo.” Era um contínuo, eu acho. No Quartel de aprendiz de marinheiro, o Comandante gentilmente me levou até a porta, passou uma tropa de grumetes, ele disse: “Ó, tem esses garotos aí, se quiser levar esses garotos, eu mando tudo para lá.” No Exército, foi a mesma coisa: “Só tem recruta que não sabe fazer nada. Quer levar?”. Na Polícia Federal, o Delegado me disse: “Fica de olho, hem Fica de olho Qualquer coisa me avisa, porque eu não tenho viatura para isso, nem gente para fazer isso. Então, fica de olho. Se descobrir alguma coisa, me telefona e tal, que a gente tenta mandar alguém lá.” Resultado: eu só consegui alguma coisa com a Polícia Militar, que forneceu quatro homens com a condição de leva-los, dar comida e de madrugada ir lá acorda-los também, porque eles também não iam ficar acordados. E assim nós passamos o período de Semana da Pátria. Graças a Deus, ninguém estava querendo fazer nada e não aconteceu nada. CIDADE DE VITÓRIA Naquela época, Vitória só tinha um guarda de trânsito, era o “Armando Marques”. Era um escurinho, Armando Marques é um juiz de futebol que tinha aqui, muito conhecido. Aliás, ele até é da CBF, atualmente. Então ele ficava no trânsito e apitava no revolver. Ele tirava o revolver e fazia assim: Xuiiiii Aí o carro parava, ele sentava no capô do carro, fazia e gesticulava e tal. Juntava gente na rua para ver o Armando Marques, era o único guarda de trânsito que tinha. Era uma Cidade pacata, onde não acontecia nada de violência. Hoje, Vitória está com um índice de violência altíssimo. Eu fiquei dois anos em Vitória, numa Base muito boa. Era uma base moderna e grande, ela foi construída principalmente para atender a Companhia Vale do Rio Doce e Companhia Ferro e Aço, de Vitória, Cais do Porto, clientes de interior, fábricas de interior, cerâmicas e tudo. Lá, permaneci por dois anos, até a criação da Petrobras Distribuidora. ABASTECIMENTO A NAVIOS [Departamento Comercial / Divisão de Abastecimento a Navios] O meu cargo era de confiança, eu era chefe da base, era cargo de confiança. Quando a Petrobras Distribuidora foi criada, eu ainda fiquei algum tempo, mas o gerente do Distrito da Guanabara – porque nós éramos subordinados ao Distrito da Guanabara – o Wilson Berbara, veio do Rio Grande do Sul e disse que ele tinha uma pessoa de confiança dele para ser o chefe da Base. Aliás, ele esteve lá e eu disse para ele que como o cargo era de confiança, estava à disposição dele. Então ele achou por bem botar o meu assistente operacional, Geraldo Mesquita. Tudo bem É comum na vida da gente, quem tem um cargo de confiança é assim mesmo. Nessa época, estavam acontecendo as primeiras crises de petróleo no mundo, não é? Então, o Tomás Azevedo, me telefonou para vir conversar. Ele tinha sido o meu gerente aqui no Rio, no Disgua (Distrito da Guanabara), e queria que eu viesse trabalhar com ele. Depois que o Geraldo assumiu a Base, eu vim e aconteceu o seguinte. GFAPF Existia uma divisão que era do CNP (Conselho Nacional do Petróleo), mas administrada pela Petrobras, que se chamava GFAPF – Grupo de Financiamento de Óleo Combustível de Alto Ponto de Fluidez. Ou seja, o petróleo baiano é de base parafínica. E o óleo combustível, extraído do petróleo baiano é de alto ponto de fluidez. É um óleo que necessita de uma temperatura alta, porque em temperatura ambiente, ele fica duro, como se fosse graxa de sapato. E é um óleo de baixíssimo teor de enxofre, por isso ele era caro. Mas que tem que ter instalações apropriadas para poder manusear esse óleo, porque senão ele esfria. Então, o GFAPF não só projetava a instalação, como financiava indústrias de pequeno porte, que quisessem trabalhar com o APF, que era mais barato, inclusive. Eles faziam o projeto de caldeiras, essas coisas todas e depois vendiam o óleo; o preço era bom. Eu participei de diversas visitas à clientes da área de Vitória. inclusive levava para pagar o custo deles da obra, levar projetos que vinham do Rio, só que eu não tinha nada que ver com esse negócio, na base eu não tinha nada com isso. Em 1973, com a crise de petróleo, esse óleo encareceu muito. Porque, como ele era de baixíssimo teor de enxofre, ele era muito caro e passamos a exportar. A Petrobras passou a exportar esse óleo, até que se inverteram os papéis. Só podia trabalhar com esse óleo quem tivesse realmente necessidade, por exemplo, cerâmicas, indústria de azulejos, porque o enxofre do óleo prejudicava a coloração do azulejo. Quando a gente vê os azulejos com as pontinhas assim, aquilo é enxofre. Só essas indústrias podiam trabalhar com APF e o resto ia ser exportado. Em troca, a Petrobras importou muito petróleo de alto teor de enxofre, que era o óleo mais barato, porque o preço do petróleo é calculado pelo teor de enxofre; grandes quantidades de óleo de alto teor de enxofre. Inclusive, vinham navios, que ficavam aqui fundeados como tancagem flutuante. E não tinha para quem vender esse óleo. Pegavam um navio, enchiam de óleo combustível de alto teor de enxofre, botava para viajava o mundo todo, voltava e ninguém comprava. Porque o teor de enxofre era muito alto. Nessa época, o Presidente da Petrobras era Shigeaki Ueki. Ele convidou Mario Azevedo, que foi meu o chefe, e eles conseguiram, através da CNP (Conselho Nacional do Petróleo), uma autorização para exportar esse óleo como combustível para consumo de bordo do navio, que se chama de bunker. Para navios nacionais em viagem internacional e para navios a estrangeiros. Foi a primeira atividade no Brasil e de venda com preço livre. Então a gente calculava o preço em Roterdã e nos principais portos e calculava o preço de reposição no Brasil, porque nós éramos importadores. O nosso preço era livre, eu mesmo negociava com os armadores por telefone, um dólar a mais, um dólar a menos e tal, para vender. E com isso nós implantamos essas atividades no Brasil todo. A princípio era só a Petrobras. DINAV – DIVISÂO DE ABASTECIMENTO A NAVIOS A princípio, fui para a Divisão de Abastecimento a Navios, que no início ainda ficou com o nome de GFAPF, porque extinguiram o GFAPF e no lugar dela entrou Divisão de Abastecimento a Navios, a Dinav (Divisão de Abastecimento a Navios). Então eu fiquei com a atividade operacional, viajei o Brasil todo, todos os Portos do Litoral, visitando todos os Portos, vendo as instalações, a atividade foi crescendo muito, vendo as instalações, vendo a tancagem, dando treinamento para o pessoal e nisso eu fiquei até me aposentar, vinte anos, mais ou menos. HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS No início, era só Petrobras que abastecia os navios, como eu disse. Mas a Esso e a Shell começaram a pressionar. Eles tinham clientes internacionais, contratos com brokers internacionais, que mandavam os navios para abastecer aqui no Brasil e não podiam, porque era só Petrobras. Então, a Petrobras pediu ao CNP (Conselho Nacional do Petróleo) para fazer uma concessão e a Esso e a Shell passaram a fazer essa operação, mas controlada pela Petrobras. Nós dávamos o preço que eles podiam vender, as quantidades. Depois a gente repunha porque eles ganhavam uma comissão na venda, e nós cobrávamos uma taxa operacional quando usavam os nossos terminais. A Petrobras tinha o controle completo. Um navio carregado de minério – eu não me recordo o nome desse navio, porque ele carregou minério em Tubarão – quando chegou no Litoral de Maceió, ele parou com defeito de máquina, não tinha como chegar lá, ele estava a um metro do fundo. Se fosse rebocado, qualquer coisa, ele encalhava e depois não ia ter como sair. Então eles apelaram a Petrobras, pedindo ajuda e para mandar diesel para o motor auxiliar deles, para eles poderem sair até onde pudessem encontrar um Porto que tivesse socorro para a máquina que estava quebrada. E eu fiquei encarregado de fazer isso. Foi uma dificuldade terrível. Como é que eu vou conseguir? Aí eu consegui. Na época, o Depro (Departamento de Produção), Depera (Departamento de Produção e Exploração), essa área de Exploração e Produção, tinha um rebocador, um supply-boat, que ia para o Norte, para o Nordeste, vazio. “Então, faz o seguinte: vocês vão levar cinco mil toneladas de óleo diesel, descarregar nesse navio, depois debitam para o Decom o custo da viagem, porque rebocador supply-boat vinha vazio. E nós fizemos isso; o supply -boat foi, atracou a contra-bordo do navio, descarregou o óleo, conseguiu a viagem dele. O navio foi embora. Passado alguns dias, mandou dizer que não ia pagar porque não tinha recebido aquela quantidade, que eles haviam até assinado um comprovante de recebimento. Aí depois, uma troca de correspondência com os armadores, eles queriam discutir isso no Tribunal de Haia. Aconteceu que o navio entrou no Triângulo das Bermudas e afundou por lá, nunca mais nós tivemos notícias do navio. Nunca mais se teve notícias. Ele afundou no Triângulo das Bermudas, que tem muito navio afundado para lá. E nós nunca mais tivemos notícias no navio. VIAGENS PELA DINAV Nessas viagens de um Porto para o outro, eu ia de avião. Por exemplo, geralmente, eu corria toda a Costa brasileira, fazia isso duas vezes por ano. A Marinha de Guerra brasileira é abastecida pela Petrobras Distribuidora. Mas os navios da Marinha americana, que vêm ao Brasil para treinamento aqui na América do Sul, só eram abastecidos por nós e eles usavam o óleo Marine Diesel Oil, que seria o óleo diesel, com oito a 10% de óleo combustível. Normalmente, eles entram pelo nordeste, Fortaleza, Recife, Salvador, Rio de Janeiro e às vezes Santos ou Rio Grande. Então, por onde eles entrassem, dependendo da programação da Marinha, eu ia esperá-los no primeiro porto que eles entrassem. Eu ia de avião, combinava com a unidade próxima, por exemplo, em Fortaleza, com a fábrica de asfalto, Asfor, e programávamos todo o abastecimento. Eles chegavam, atracavam, e eu estava na operação. O pessoal de operações abastecia, media, aqueles “troços” todos, faturava e eu ia a bordo, levava a fatura e eles me pagavam. Aí eles saíam de Fortaleza, vinham para Recife. Eu pegava um avião e vinha me encontrar com eles em Recife. E assim eu vinha. Muitas vezes eu cheguei aqui no Rio, na mala com um cheque de um milhão de dólares. Exerci essa atividade de 1972 a 1988. Eu fiz os manuais de abastecimento, eu dava treinamento para o pessoal, comprava o material. A área operacional era toda comigo. Então era só navio estrangeiro, navio nacional era com a Petrobras Distribuidora. PORTOS E TERMINAIS Quando a gente pegava só a parte de vistoria, treinamento assim, passava dois, três dias em cada Porto. Às vezes, quando mudava muito de repente não sabia nem o número do apartamento que eu estava, de tanto trocar de hotel, ia até Manaus e às vezes voltava parando de Manaus para cá também. Quando nós entramos na atividade, quando a Petrobras resolveu fazer isso, começar de baixo: Rio Grande não tinha nada. Tinha uma tubulação para o gás, que era da Refinaria Ipiranga, para fornecer óleo para a Marinha do Brasil. E na Base onde a Petrobras operava junto. A Petrobras Distribuidora operava junto com a Ipiranga, na quarta seção da barra, não tinha nada, nós tivemos que montar a unidade misturadora. Havia um aparelho americano, importado, que tinham medidores, um sistema de mistura, que dosava a quantidade de óleo diesel e de óleo combustível, produzindo uma mistura dentro daquelas especificações. Então nós tivemos que equipar o Porto de Rio Grande, e o de Paranaguá também não tinha nada. A princípio nós alugamos um fundo de uma sala da Texaco e ali se fazia pouca coisa. Quando a Petrobras assumiu o Porto de Paranaguá, nós fizemos tubulações novas, botamos válvulas misturadoras e conseguimos uma casa dentro da base, uma sala onde ficou o nosso escritório. Santos também não tinha nada. Lá na Alemoa, aliás, no Terminal Saboó, tinha umas linhas muito velhas que ainda eram do tempo em que a Refinaria recebia petróleo por ali. Também teve que reformar tudo e trabalhar lá no terminal novo, no Saboó. Aqui no Rio de Janeiro existia uma tubulação até o armazém 18, mas toda podre. Então foi tudo abandonado e nós passamos a trabalhar com barcaças, chatas-tanque, provenientes da Ilha D’Água. Vitória foi o primeiro porto de que se falou em fornecimento de combustível para navio. Eu estava lá na Base, quando o Shigeaki Ueki foi lá visitar. Eu mostrei as instalações e ele disse para mim o seguinte: “Gastaram uma fortuna para construir essa Base e agora estão economizando 500 reis para poder fazer uma atividade que dá dinheiro.” E, por incrível que pareça, foi um dos últimos portos que foi equipado. TRAJETÓRIA / DINAV Foi essa Divisão – que era uma Divisão nova – que fez todo trabalho e essa montagem de colocação de dutos, de instalação pela a Costa brasileira. Alguns portos trabalhavam com barcaças. Isso começou no ano de 1972, e eu inaugurei a Divisão. Eu fiz até o Manual de Abastecimento para distribuir em todos os Portos. E assim nós fomos. Quando raptaram o Embaixador americano aqui no Rio de Janeiro, eu estava na Fronape, resolvendo um problema. Mandaram me buscar correndo para ir para a Ilha de Santa Cruz, onde havia uma quantidade de Navy Special; um óleo especial da Marinha, para poder carregar a esquadra, porque a esquadra toda estava vazia, não tinha uma gota de óleo. Foi uma noite toda levando gente, carregando... Houve todo um movimento por causa do seqüestro, que ficou por conta da Petrobras. Naquela época não era Distribuidora, ainda era Petrobras. HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Eu cheguei em Fortaleza para fazer Operações Unitas. Os navios estavam atracando, os navios americanos e os navios brasileiros. Mas não tinha óleo da Fábrica de Asfalto, só tinha um pouquinho, um restinho de óleo que poderia ser utilizado num navio americano, mas não tinha óleo diesel. E estava chegando um navio da Fronape com óleo diesel para abastecer a Cidade. Para tudo, abastecer os navios, abastecer a Cidade, Corpo de Bombeiros, tudo isso. Mas não tinha espaço para ele atracar, o navio estava lá fora. Então eu fui à Capitânia dos Portos, conversei com o Capitão, expliquei e ele disse que “de jeito nenhum”, que eles não iam tirar os navios brasileiros, e nem “fazer uma gaveta”, quer dizer, tirar os navios, botar um a contra-bordo do outro para deixar o petroleiro entrar no meio. Ele disse que aquilo era um vergonha para o Brasil, uma vergonha para a esquadra brasileira, não sei o quê, mas não faria de jeito nenhum. E eu disse: “Mas o Senhor tem que deixar porque senão ninguém vai receber óleo, a Cidade está seca.” “Bom, que o Senhor vai deixar, ah, vai, porque não há outra saída.” E ele: “Não, de jeito nenhum, não sei o quê..” Eu fui para o Hotel, liguei para o meu chefe aqui no Rio e disse: “Mário, está acontecendo isso, isso, isso, isso. Tem que acionar o Departamento de Transporte da Petrobras e o Ministério da Marinha, porque ele não quer deixar. Eu sei que houve um movimento aqui, um movimento em Brasília. Quando eu cheguei de manhã na beira do cais, eu era o cara mais procurado. O guarda me gritou: “Dante Eu aconselho o Senhor não entrar aqui no cais hoje.” E eu: “Por que?” “Porque o Capitão dos Portos está louco aí lhe procurando.” Aí quando eu cheguei próximo ao Capitão, ele: “Não, porque não sei o quê, porque você não precisava dar chave de galão...” Eu disse: “Mas eu avisei ao Senhor ontem” “Não, mas eu ia pensar.” “O Senhor não disse que ia pensar não, o Senhor disse que não ia fazer.” E ele: “Ah, de madrugada o Ministro me telefonou e mandou eu tirar os navios e botar ai.” Depois, ele me convidou para almoçar no dia seguinte, ficamos amigos e tal, porque era realmente uma necessidade. Mas, de vez em quando, a gente passava por essas histórias nesses portos. Então, quando eu vim de Vitória para trabalhar na Dinav (Divisão de Abastecimento a Navios), eu fiz o vestibular para Direito; no primeiro até, eu não tinha horário, eu não tinha ponto, eu conversei com meu chefe, que ele deixasse eu freqüentar umas duas aulas de manhã cedo, quando precisasse de mim para viajar eu viajaria e assim completei o primeiro ano, depois fui transferido para a noite e aí me formei em Direito, à noite. Realizei o sonho da minha mãe que já tinha falecido há muitos anos, trabalhei algum tempo depois que me aposentei... APOSENTADORIA Me aposentei em 1988. Eu me aposentei só que tive um problema na minha vida. Em 2002 eu passei mal, fui a um hospital e a indicação era colocar uma ponte de safena. Eu me internei no CardioBarra, fiz a operação e, uma semana depois, eu fui para a casa, bem. Mas, dois dias depois, eu comecei a sentir febre, dor, e voltei para o hospital com uma infecção hospitalar. Passei quatro meses internado, quase morri. Isso mudou a minha vida toda. Agora é que estou me restabelecendo. TRAJETÓRIA / ADVOCACIA Depois da aposentadoria continuei trabalhando. Tenho um escritório, e trabalho como advogado. Nunca usei o Direito como meio de vida, por exemplo, eu me dediquei muito à área de Direito Penal, eu gosto muito. Eu fiz muito júri comutativo. O Etevaldo Junior mandava me chamar: ‘Tem um cara para ser julgado aí, está sem advogado, quer fazer?” Eu fazia assim mais porque eu gosto. Não tenho feito. Depois da operação eu não fiz mais. Talvez volte a fazer. LAZER / CAMINHADAS Eu ainda sinto um pouco, quando eu caminho muito. Eu ainda canso um pouco, a respiração fica meio ofegante. Eu estou saindo aos poucos. Aí fico vendo televisão, essas coisas. Caminho um pouco, moro num condomínio lá na Barra. Gosto de futebol, dessas coisas. FAMÍLIA / FILHOS Estou casado, me casei de novo. Tenho dois filhos do segundo casamento. Um rapaz tem 19 anos e o outro tem 13. E do primeiro casamento eu tive dois filhos, um casal. O rapaz mora nos Estados Unidos, mora Beverly Hills, na Califórnia, e a menina é contadora, está casada e mora aqui no Rio. Já tenho netos. Desse filho que mora nos Estados Unidos, ele tem um casal. Tem o Vinícius, porque o nome do pai é Marcos Vinícius. E a menina é Isabela, inclusive, ela está aí passando uns dias. Ela tem quatro anos, e fala português e inglês. E, da minha filha, eu tenho o Ricardo, que é o nome do pai também, o outro é Alan e a mais nova, que tem um ano e pouco, é Rebeca. Do segundo casamento, eu tenho o Rafael, com 19 anos, e o Leonardo, que tem 13. Talvez o meu filho mais moço trabalhe na Petrobras, talvez. O mais velho não. O mais velho está fazendo Educação Física. E até ontem nós fomos assistir o encerramento de um curso de teatro que ele está fazendo lá no Retiro dos Artistas. E ontem terminou uma parte, aí fizeram uma peça lá e ele trabalhou lá. O sonho dele é ir com o outro irmão nos Estados Unidos. O meu filho que mora nos Estados Unidos tem Academia de Jiu-jitsu lá. Então o sonho dele também é ir para lá com o irmão. Planos, a gente tem sempre. Mas a idade também vai chegando e a gente não pode se aprofundar em muitos planos... Eu acho que fiz tudo que eu gostaria de fazer na minha vida. Um sonho que eu tenho hoje é ver esses dois meninos formados e realizados. Fora isso, não tenho alguma coisa que me faça brigar ou lutar. Pode aparecer alguma coisa na minha vida, mas já estou com 66 anos. AVALIAÇÃO E eu acho que eu tenho mais ou menos realizado... Dentro da Petrobras, quando eu me aposentei eu estava no último nível, na última letra de nível médio, sempre fui muito bem conceituado em todas as unidades onde eu passei. Trabalhei em todas as bases em Portos. E uma coisa que eu queria fazer, foi reunir a minha turma, eram 28 quando nós entramos na Petrobras. Mas nove já morreram. Então não conseguimos localizar todo mundo, fizemos um almoço. Agora, a Reduc fez um almoço também, deu uma placa para cada um, camiseta. Eu não sei se tenho vontade de voltar a trabalhar. Principalmente, na área marítima, já me convidaram, eu andei trabalhando...Eu era Advogado de uma Empresa e depois eu cheguei até ser Presidente do Sindicato deles, aí caí fora, porque não era meu ramo, não valia a pena continuar. Eu acho que a gente deve fazer aquilo que gosta, não é? Não gosta, não adianta. PROJETO MEMÓRIA PETROBRAS Eu tenho um amor muito grande pela Petrobras. Eu acho que tudo que tenho na vida, eu devo a Petrobras. Evidentemente, consegui com o meu esforço, com o meu trabalho. Mas tudo que a Petrobras precise e eu puder participar ou ajudar, eu estarei sempre à disposição. A Petrobras faz parte da minha vida. Gostei muito da entrevista de vocês. Estou sempre à disposição para o que vocês precisarem e quiserem.
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