P/1 – Norma, boa tarde primeiro.
R – Boa tarde.
P/1 – Você podia falar para a gente o seu nome, a data de nascimento e o local?
R – Norma Rodrigues Silva, o que mais?
P/1 – Data e…
R – A data é 3 de abril de 1938.
P/1 – E onde?
R – São Lourenço.
P/1 – São Lourenço, Minas, né?
R – Minas.
P/1 – Você sabe também isso do seu pai?
R – Como do meu pai?
P/1 – Nome e local de nascimento.
R – Antônio Amâncio Rodrigues, ele fazia aniversário em 30 de maio, só não sei a data.
P/1 – O nome do seu pai é?
R – Antônio Amâncio Rodrigues.
P/1 – Ele nasceu onde?
R – Em São Lourenço.
P/1 – São Lourenço também. E a sua mãe?
R – Também em São Lourenço.
P/1 – Qual que é o nome inteiro dela e data de nascimento.
R – Mariana Soares.
P/1 – E ela nasceu em que dia, você se lembra?
R – Ai, o aniversário da minha mãe eu esqueci. Ah, 3 de março.
P/1 – E você sabe como que os seus pais se conheceram?
R – Meu pai roubou a minha mãe do marido dela, tá entendendo? Ai, ela teve eu e o Ailton, o meu pai. Se separaram depois, o Ailton morreu. Ai ficou eu só de filha dela, mas ela tinha outros filhos, que eram… precisa falar o nome?
P/1 – Pode ser, se você quiser.
R – Era o Zinho, o Jorge e a Teresinha, eu era a bastarda, tá entendendo? Meus avós me odiavam da parte de mãe, né, por causa do meu pai. E o que mais você quer saber?
P/1 – Como é que foi isso que o pai roubou…?
R – A minha mãe era casada com outro homem e ai, eles começaram a namorar e ficaram amantes e aí ele roubou ela, fugiu com ela, por isso que os meus avós maternos não gostavam de mim. Quando eu ia lá na casa deles, do avô e da avó, chamavam avó Maria e avô João, ela falava assim: “A diaba já está vindo para comer”, porque eu ia para comer mesmo (risos), só isso, né, está bom!
P/1 – Fica à vontade. E você sabe de onde veio o seu pai e sua mãe, antes de se conhecerem? A origem da família deles?
R – Ah não sei, não sei. Sei que o meu pai morava com a minha avó, minha vó Ripa, né? Ai, minha avó Ripa que me… depois que eles se separaram, aí minha avó Ripa que ficou cuidando de mim. Era muito malcriada, era uma capetinha. Então é isso, não sei mais o que falar.
P/1 – Não, fique à vontade. Como é que era o seu pai com você?
R – Meu pai… olha, eu não convivi com o meu pai e minha mãe. Meu pai trabalhava em São Paulo, minha mãe no Rio de Janeiro e eu lá em Minas, de casa em casa. Eu vivia na casa dos vizinhos, tá entendendo? Essa família do seu Zequinha e dona Celina, meu pai pagava pensão, não era pensão naquele tempo, falava outro nome e meu pai mandava o dinheiro para eles lá e a Dona Celina jogava no bicho e gastava o dinheiro. Aí, eles começaram a me maltratar, não bater em mim, não, não, mas não me dava leitinho à noite, que as meninas tomavam na canequinha com farinha. Para mim não dava porque o meu pai não mandava o dinheiro da pensão. Aí, um dia o meu pai foi em São Lourenco, ele descobriu que mandava o dinheiro, mas a Dona Celina falou que jogava no bicho. Aí, eu não quis ficar mais lá, eu fui morar em outro lugar, lá com o meu tio também, não deu certo… eu fui criada assim, sabe, cada dia na casa dos outros.
P/1 – E por que o seu pai… por que isso aconteceu de você ser criada com…?
R – Porque o meu pai não deixava eu viver com a minha mãe, eu tinha loucura para viver com a minha mãe, sabe, mas ele não deixava, porque ela não agia bem, tá entendendo? Naquele tempo tinha muito preconceito, né? Aí, eu fui morar com a minha mãe quando eu peguei o Totonho, aí que ele deixou eu morar com ela, mas não deixava, não.
P/1 – Sua mãe morava onde?
R – Em São Lourenco. Aí ela foi morar em São Lourenco por causa de mim e do Totonho, que eu era uma criança, né?
P/1 – Antes, morava só você em São Lourenço com essa família…
R – É, e depois, eu fui morar com a minha mãe.
P/1 – E como que era a sua mãe?
R – Minha mãe era boazinha, eu gostava dela, eu amava a minha mãe. Amava muito ela. Só que ela não me criou, nem ela e nem o meu pai. Os outros que me criaram, mas eu era feliz, eu andava de bicicleta, eu estudei, fui expulsa da escola, ai meu Deus, eu era terrível! Que mais você quer saber?
P/1 – Como que era a casa da família que você foi criada?
R – A casa do seu Zequinha era bem no alto, lá em cima! Tinha uma ladeira para subir lá e eu era muito levada, eu parecia menino. Uma vez, eu fui na matinê e vi uma bailarina pulando assim, cheguei lá da matinê… eu dormia na caminha lá junto com as meninas, aí eu dei aquele pulo assim, perna aberta, arrebentei toda a cama, foi a única vez que o seu Zequinha me bateu, que eu quebrei a cama e ainda me machuquei, porque eu era muito levada.
P/1 – Você morava com as filhas dele?
R – Morava. As meninas eram um terror! Elas judiavam de mim, sabe? Elas ganhavam presente no Natal e eu não. Natal era assim, elas ganhavam boneca, aquelas bonecas de massa, de antigamente, eu era doida por uma dela. Só que o meu pai, depois que passava o Natal, ano novo, que ele trabalhava aqui, aí que ele ia lá e levava o meu presente, mas aí não tinha graça, eu queria ter as coisas junto com as meninas, né? Mas ninguém me dava nada. Mas eu era feliz, sei lá eu…
P/1 – Do que você brincava nessa época? O que você fazia que você gostava assim?
R – Jogar bolinha…
P/1 – De gude?
R – Bolinha de gude, eu era boa. Se eu perdia as bolinhas, eu batia e tomava (risos), pular corda, brincar de pique… uma vez eu estava… foi depois que a minha avó morreu, eu tenho trauma até hoje, eu morava com a minha avó e meu pai, antes da minha avó morrer e a casa era comprida assim, sabe essas casas compridas? E o meu pai me acordou para falar para mim que a minha avó estava morrendo e eu era muito malcriada com a minha avó, eu era. Ele falou: “Levanta para ver a sua avó que ela está morrendo”, eu não entendia nada, eu era uma criança. Aí eu levantei, lhei para a minha avó, ela parecia aquelas escravas, sabe, era bem pretinha, aquele cabelo ruim assim, branquinho. Ela estava fazendo careta e eu fiquei olhando assim, fiquei morrendo de medo, ele mandou eu beijar a mão dela e pedir perdão para ela. Nossa! Isso pra mim foi um trauma pro resto da minha vida. Fiquei com muito medo, muito, muito, muito… e eu não queria mais ver ela e ele obrigava eu ver ela lá no velório, não se faz isso com criança, mas não tinha nada…
P/1 – Com quantos anos você foi morar com a sua mãe?
R – Com a minha mãe eu fui morar acho que eu tinha uns 12 anos, que foi quando eu peguei o Totonho.
P/2 – Quem era Totonho?
R – O que eu adotei, peguei ele, que estava doente com a cabeça grande, tinha problema, ele era especial.
P/1 – Conta um pouco para a gente essa história, quando é que você achou ele, o quê que aconteceu?
R – Eu cheguei na casa dele, ele estava num berço…
P/1 – A casa dele, onde que era?
R – Bem velhinha, bem velhinha!
P/1 – Mas onde? Em São Lourenço mesmo?
R – Em São Lourenco, na Sete Casinhas, estava no berço com a cabeça grande, bem grandona, o corpo fininho, bem magrinho e cheio de piolho, bicho, ferida, mosquito, não era piolho, mosquito em cima dele. Uma garrafa verde de leite e um bico vermelho. Ai, minha mãe falou… falei com a minha mãe… ah, que eu ouvi no centro, né, que iam jogar o menino fora, esqueci disso, aí a minha mãe falou: “Não, não vamos levar esse menino, não, ele está morrendo, olha como é que ele está”, aí eu falei: “Não, nós vamos pegar ele, a senhora me ajuda?”, ela fazia tudo pra mim porque eu fui morar quando o meu pai deixou, né, então… aí, criamos o Totonho. Levamos ele no médico, Doutor Prazeres falou que ele ia morrer, se não morresse naquela época, bebezinho… e fomos criando, fomos cuidando dele, tudo, ele era especial, escola especial e eu amava muito esse menino, muito! Tinha paixão por ele. Depois, me casei, não tive filhos, não engravidei. Separei do meu marido, então o Totonho era como o meu filho, né? Aí ele morreu. Aí eu fui no viaduto para me matar. Aí as policiais femininas me levaram para o Pátio do Colégio e conversaram comigo, e conversaram e conversaram, falaram e falaram, falaram para eu arrumar outra criança, pegar outra criança. Aí eu fui em São Lourenco para ver lá na Sete Casinhas com a minha mãe e o meu padrasto, aí tinha a Priscila, mas eu queria um menino branco de olho azul igual o Totonho, que ele era loirinho. Aí eu já estava com o menino para trazer para São Paulo, uma mulher saiu lá do fundão lá, com uma pretinha bebezinha dentro de um saco, com uma camisetinha assim, não me esqueço, era de rosinha com bordado assim, à mão, fez bainha assim. Pretinha. Aí eu olhei para aquela criança, a mulher falou assim: “Olha, ela…”, ela estava parece que com três meses, acho que eram três meses, “Ela toma água com açúcar porque não tem dinheiro para comprar leite para ela e ela está com desidratação, eu não tenho como dar remédio para ela”. A mãe falou para mim: “Norma, você vai pegar outra criança doente? Ela vai morrer Norma” “Vamos levar mãe, paciência, vamos levar ela”, viemos embora. Antigamente, a gente andava de trem, aí eu quis vim embora para trazer a menina com medo da mãe querer pegar a menina outra vez, mas ela não ia pegar, mas eu tinha medo. Ela chamava-se Neuza, a Priscila, Neuza. Aí nós viemos de trem, os passageiros falaram: “Essa menina vai chegar morta em São Paulo”, eu falava: “Não vai chegar morta, não vai”, aí chegamos em São Paulo, eu já era babá da Mônica, tinha gêmeas também, eu já tinha bastante roupinha para criança, que a minha patroa deu, a mãe da Mônica. Cheguei na casa dessa minha patroa, que eu trabalhava com ela, sempre, trabalhei minha vida toda com ela, ainda criei as gêmeas dela. Aí levamos ela no Hospital Matarazzo, Doutor Clauss que chamava um senhorzinho, examinou ela, falou: “Ela está desnutrida…’, tinha tudo, tava com tudo e deu remédio e eu cuidando dela, cuidando, cuidando e ela ficou uma menina linda, gordinha. Você sabe que eu ia para praia, que eu ia com as crianças, né, as gêmeas, a Mônica e a Priscila, onde eu ia eu levava ela e eu vestia ela de shortinho assim, sabe, antigamente era… como é que chamava? O sapatinho delas? Conguinha, com meia assim, três quartos, sabe? Era muito lindo. Aí nós saímos eu, as gêmeas, a Mônica e a Priscila e uma vizinha nossa lá do apartamento. Aí a mãe da Monica estava junto, todo mundo que passava perto da Priscila mexia com ela: “Que menina linda”, e não mexia com as gêmeas. Ai a Neide falou: “Norma…”, Noma, me chamava de Noma: “Noma, de agora em diante, você vai vestir as gêmeas igual a Priscila”(risos), aí foi isso. Foi muito bom, foi crescendo, amor da minha vida.
P/1 – Deixa eu voltar um pouquinho na época quando você tinha uns 12 anos, para te perguntar como que era o Totonho, personalidade dele.
R – Ele era um amor de pessoa, mas ele era muito nervoso, muito nervoso, muito, muito. E a gente já sabia, estava acostumada com ele desde bebezinho, né? Morreu com 16 anos. Ele morreu… você me perguntou lá, foi a época que o homem foi para a lua, que ano que foi?
P/1 – Anos 70, eu acho.
R – Foi essa época mesmo que o Totonho morreu. Então, na minha ignorância, eu achava que o homem ia chegar na lua e ia achar os mortos lá e eu achava que ele ia achar o Totonho (risos), mas eu ainda não tinha a Priscila. Aí a Priscila substituiu o Totonho. O mesmo amor que eu tinha por ele eu tinha por ela, só que eu perdi os dois, né? Só que a Priscila viveu mais tempo comigo, que me deu essa jóia ai para mim, deixou para mim.
P/1 – Um pouquinho antes do Totonho, como é que era a escola? Qual foi a primeira escola que você frequentou?
R – Eu estudei em colégio bom lá em São Lourenço. Eu estudei no colégio de freiras, mas as freiras me expulsaram porque eu era terrível!
P/1 – O que você fazia?
R – Eu era muito moleque, nossa (risos)! Aí fui para a escola pública, Grupo, que falava. Tinha um… vou te contar… vou contar a história do Ismael para ele. Tinha um tal de Ismael, isso na escola, eu devia ter… já tinha o Totonho, ele punha… as meninas usavam saia, né, ele punha o espelhinho assim no sapato e punha de baixo assim para ver a calcinha das meninas, eu falava para ele: “Ismael, o dia que você fizer isso, eu vou te arrebentar”, passou, um dia ele fez. Eu segurei os trem dele lá, eu não sei não o que… deu até polícia, passaram um telegrama para o meu pai para ele ir lá em São Lourenco para resolver o problema, fui expulsa, ninguém mais me queria na escola (risos), que lá tinham duas escolas, ai meu Deus do céu! Esse Ismael, eu não sei não, viu o quê que aconteceu com ele, que eu não lembro.
P/1 – E como é que era São Lourenco naquela época?
R – São Lourenço na época em que eu morava lá era uma maravilha! Agora mudou, está lindo lá. Eu fui lá uma vez, mas não conheço mais ninguém lá, todo velho que eu olhava: será que era meu amigo? Não, não, nunca mais voltei também. Não tenho mais família lá, morreu todo mundo. Ai, eu vim para São Paulo.
P/1 – Quantos anos você tinha?
R – Não, minto! Não, tem a fase do Rio de Janeiro. Eu morei muito tempo no Rio de Janeiro com a minha mãe e o outro marido dele, Israel.
P/1 – Saiu de São Lourenco e foi para lá?
R – Fui para o Rio de Janeiro, fiquei lá.
P/1 – Depois do Totonho ou não?
R – Junto com o Totonho, o Totonho quando eu era moleca. E nós ficamos lá morando lá, na casa da Cida, minha prima. Que mais?
P/2 – Como é que vocês viajaram nessa época?
R – De trem, tudo de trem. Morei em Volta Redonda, Barra Mansa, no estado do Rio, Paty do Alferes, Brás de Pina, morei no Morro da Catacumba com a minha mãe e o Israel e o Totonho. A minha mãe carregava água, pegava água lá embaixo para levar lá em cima, não tinha banheiro, não tinha nada e eu dormia com a minha mãe, lá era um barraco, na Lagoa Rodrigues de Freitas, em Copacabana. Eu deitada, eu via tudinho, até o Cristo, sabe? Mas era legal, foi uma época também bem ruim, viu, que a minha mãe não trabalhava, o Israel era pedreiro, tinha dia que não tinha serviço, sei que ai, eu vim morar em São Paulo com o meu pai e minha madrasta, odeio a minha madrasta, odiava ela. Aí, São Paulo, depois eu voltei para Volta Redonda, foi ai que eu conheci o meu marido, que eu casei com ele.
P/1 – Mas no Rio de Janeiro, você estudava lá?
R – Não. Daí eu nunca mais estudei. Eu estudei num colégio que o meu pai pagou, mas depois eu fui embora para o Rio com a minha mãe e aí parei de estudar, não quis saber mais de estudar, não. Eu queria ser artista de circo, ou então, jogadora de vôlei, que eu jogava muito bem vôlei, levantar bola, que eu era baixinha, mas meu pai não deixou. Eu cheguei a fugir da casa do tio Zé Maria para eu trabalhar no circo, mas eles não quiseram me levar porque eu era de menor (risos).
P/1 – Isso foi quando?
R – Eu era pequena, nossa. Eu ainda não tinha o Totonho não, quando eu fugi. Foi depois que a minha avó morreu.
P/1 – Foi em São Lourenço, ainda?
R – Foi em São Lourenço, que eu não queria ficar lá com a Dona Cerminia e não queria ficar com o meu tio, arrumei uma trouxinha, fui lá para o circo, mas eles não quiseram me levar. Tá vendo? Era para ser uma atriz (risos), ai, ai.
P/1 – E vocês se mudaram muito no Rio de Janeiro, foi isso?
R – Moramos muito tempo lá, em Brás de Pina, na Parada Angélica, Paty do Alferes…
P/1 – Mas tudo na cidade do Rio?
R – Tudo no Rio, tudo Rio e o meu padrasto cuidava de um sitio, era gostoso lá no sitio, muito bom.
P/1 – Vocês se mudavam por causa do seu padrasto, foi isso ou não?
R – Não, não, o meu padrasto que arrumou esse serviço para ele, para cuidar do sitio. Minha mãe também ajudava, eu não fazia nada, ficava com o Totonho brincando com os cachorros, porque os patrões do Israel compravam leite condensado para fazer leitinho para os cachorros, gente comia todo leite condensado, até hoje eu adoro, ai meu Deus, foi bom.
P/1 – O que você fazia lá no Rio de Janeiro?
R – Eu fui trabalhar uma vez com o patrão do meu padrasto, Doutor Manuel, em Copacabana, eu dormia numa cama que agora, depois que eu fui entender na vida, era uma cama hospitalar, assim, na sala. Eles punham a cama lá na sala para eu dormir. Quando foi uma noite, eu acordei com o Doutor Manuel mexendo comigo. Aí, eu falei com o meu padrasto, deu uma encrenca danada. Meu padrasto quase matou esse homem, me tirou de lá na hora, né? Mas não aconteceu nada, ele só mexeu comigo lá. Aí, depois, nós fomos para onde? Aí o Israel teve que sair do sitio por causa disso, tá entendendo? Que era o patrão dele que foi mexer comigo, e ele era responsável porque eu era de menor. Aí nós não tínhamos onde morar e a minha mãe arrumou um barraquinho no Morro da Catacumba, lá no Rio de Janeiro. Foi aí que nós fomos morar lá, não tinha banheiro, não tinha nada. Às vezes, não tinha nem comida para comer.
P/1 – Você gostava de fazer o que no Rio de Janeiro, nessa época?
R – Eu não trabalhava, não sei o quê que eu fazia. Não sei, não, não lembro. Ah, eu trabalhei num ateliê sim, de costura. Aprendia costurar…
P/1 – Com quantos anos?
R – Eu já era mocinha, já. Aprendi a costurar, chulear, fazer essas coisinhas, não cortar, porque eu não sei e nem gosto, não suporto costura! Trabalhei num ateliê lá. Depois, nós fomos para a casa da… ah, nós fomos para Volta Redonda, minha irmã ficou doente, aí minha mãe foi cuidar dela e das crianças dela, isso mesmo. Aí eu cuidava da casinha que a minha mãe arrumou e a minha mãe cuidava dos netos dela. Aí o meu cunhado foi mexer comigo também na cama. Quando eu falei, falaram que eu que estava dando bola para ele, a errada era eu, né? Aí o meu pai foi lá e me trouxe para São Paulo para morar com a minha madrasta. Já era mocinha, já.
P/1 – Você tem quantos irmãos?
R – Era o Zinho, Teresinha, o Jorge, três. Comigo quatro.
P/1 – Eles não moraram com você?
R – Não, não. Eles, não. E é isso. Que mais você quer saber, meu filho, fala.
P/1 – Quando você foi para São Paulo, você se mudou com o seu pai, foi isso?
R – Mudei com o meu pai.
P/1 – Então, você deixou a sua mãe…
R – Deixei minha mãe lá no Rio, ai depois, ela veio para São Paulo, aí eu conheci o meu noivo em Volta Redonda, ele também veio para São Paulo, meu pai casou ele, ele e eu. Deu tudo para ele casar comigo, para não me perder, porque eu era uma mocinha, ele tinha medo. E eu não gostava…
P/1 – Antes disso, você foi para Volta Redonda, é isso?
R – Fui para Volta Redonda.
P/1 – Só para entender a linha do tempo…
R – Fui para Volta Redonda morar com a minha mãe e lá com a Teresinha, para ela cuidar dos netos dela.
P/1 – Entendi. E como é que você conheceu o seu marido?
R – Passei na rua assim, ele era muito bonitinho, carioca, olhos verdes, moreno, lindo. Ai meu Deus, a gente faz cada besteira (risos). Aí nós viemos para São Paulo, o meu pai deu até a cueca para ele casar, foi, festa… você sabe que eu estava falando para Mariana, no meu casamento, eu não ganhei nenhum presente, não ganhei nada, agora ganha tanta coisa, né? Nossa! Eu também não tinha enxoval, só tinha uma camisolinha…
P/1 – Ants dele você teve algum namorado?
R – Não, não. Eu tinha o Xandre meu primo. Esse aqui de São Paulo, que eu amava, né? Acho que foi o único homem que eu amei na vida, também, O Alexandre, mas eu ia casar com ele. Eu morava na Parada Angélica, lá no sitio, já estava com tudo arrumado para casar. Ele foi lá pra gente marcar a data, e falou para mim que tinha ido para cama com a minha madrasta. Naquele tempo eu era tão bobona, eu não sei, sei lá, aí ele foi embora, dei tchau no trem, fiquei chorando porque eu amava ele. Mas eu não entendi aquilo. Aí o meu pai foi lá para combinar, me dar dinheiro para eu comprar roupa, alguma coisa para eu casar, né, eu caí na asneira de falar para o meu pai, falei: “Pai, o Xandre veio aqui e falou que dormiu com a Teresa”, nossa, nisso o trem chegou. Meu pai falou: “Você esquece o seu primo, que se você não esquecer ele, você esquece que eu sou seu pai”, eu nunca mais vi o Alexandre, nunca mais. Chamava ele de Xandre, lindo, ele era português, filho de português, lindão, cabelo maravilhoso. Eu era doida por ele. E aí eu me desiludi, aí você sabe quando eu fui ver o Xandre? Quando a minha prima, irmã dele, a Hilda estava no hospital, ruim, para morrer. Quando eu fui lá, eu saí do serviço, eu já trabalhava com a Neide, sabe, sempre trabalhei de babá, sempre cuidando dos outros, eu cheguei lá no hospital, tinha um senhor assim, conversando com a minha prima, aí eu falei: “Oi Hilda, como é que você está?”, ela falou: “Oi prima, você não vai dar um beijo no seu primo?”, eu olhei para ele e falei: “Esse o Xandre?” (risos), mas não teve nada, a gente se cumprimentou, tudo, nem tocamos no assunto, nada. E a minha madrasta é viva até hoje. Eu me dou com ela, a gente nunca mais tocou nesse assunto.
P/1 – Isso foi antes do seu casamento, foi isso?
R – Depois do meu casamento.
P/1 – Depois do seu casamento?
R – É, eu me separei… não! Casei, vivi três anos com o Élcio, ele ficou noivo perto da minha casa, na Água Fria, eu morava na Água Fria, na Casa Forte, ele ficou noivo. Aí o meu pai mandou a gente para Volta Redonda, arrumou uma casa lá para nós, que eu morava com a minha mãe e os meus irmãos na Água Fria e ele não trabalhava, vagabundo. Aí fomos lá para Volta Redonda e ele aprontando, aprontando, aí o meu pai foi lá e falou: “Norma, não tem jeito, vou mandar dinheiro para você e você vem embora para São Paulo”, aí mandou o dinheiro, eu vim embora e deixei ele lá e me separei. Vivi três anos com ele.
P/1 – Em Volta Redonda?
R – Em Volta Redonda.
P/1 – Nisso, o Totonho já…
R – O Totonho estava com a minha mãe. Eu trabalhava para ajudar o Totonho, dava tudo para o Totonho, roupa, até mini bateria eu comprei para ele.
P/1 – Ele gostava?
R – Nossa, ele adorava.
P/1 – Do quê que ele gostava?
R – De bater, tocar, guitarra, essas guitarrinhas, né?
P/1 – Gostava de música, né?
R – Gostava e se estivesse vivo, ele ia ser um músico. E chega…
P/1 – E você foi para São Paulo? Foi isso?
R – Voltei para São Paulo, foi aí que eu fui trabalhar com essa mãe da Mônica, que eu estava procurando emprego, queria doméstica porque não sabia fazer nada. Aí eu morava na Casa Forte e já estava separada do meu marido. O meu irmão, o Zinho falou assim… eu ouvi ele conversando com a minha mãe e outro irmão meu: “E a Norma não vai trabalhar não? Só come, não vai trabalhar?”, eu fiquei muito magoada, sabe, porque eu estava lá dois dias só. Nisso, bateram na porta lá embaixo, que a gente morava num lugarzinho, não era prédio, não, era uma casa lá no alto, bateu palma, era a mãe da Neide, que é mãe da Mônica, perguntando da Dona Clementina, eu falei: “A Dona Clementina não está”, que era vizinha nossa, aí eu falei assim: “A senhora quer que eu dê o recado?” “Eu queria… estou arrumando uma pessoa porque a minha filha está grávida e ela precisa de uma pessoa para ajudar ela”, eu falei: “A senhora não me quer, não?”, aí ela falou assim: “Você quer trabalhar?”, eu falei: “Quero”, ela falou: “Então vamos lá conversar com a minha filha”, cheguei lá, ela morava… a Neide morava na Cantareira, no prédio Vera Lúcia. Aí ela me contratou, só que eu falei: “Eu tenho que dormir, porque eu não tenho casa para morar, quero dormir no emprego”, ela falou: “Você não liga de dormir na sala?”, eu falei: “Não, não ligo”, e nós pegamos uma amizade que nós parecíamos duas irmãs, sabe, e ela estava grávida da Mônica, quem deu o primeiro banho na Mônica fui eu, que também amo essa menina, amo demais! As gêmeas já é outro tempo. Então, eu fiquei lá trabalhando com a Neide a minha vida toda, não era registrada, não tinha 13º, não tinha férias, a Mônica era tão apegada a mim que às vezes, a Neide me dava uma folga pra eu ir ver a minha mãe e o Totonho, quando eu estava chegando em casa, daqui a pouco, a Neide com o fusquinha dela, buzinando que a Mônica tava com febre, ela ficava doente (risos), aí eu tinha que voltar para trabalhar, né? Tempo bom que não volta mais.
P/1 – A Neide morava onde em São Paulo?
R – Lá no Edifício Vera Lúcia, na Cantareira.
P/1 – Isso foi mais ou menos em que ano, a senhora se lembra?
R – A Mônica nasceu… a Monica está com 50 anos, né?
P/1 – Em 65.
R – Mas a Neide foi minha irmã, minha mãe, tudo para mim, me ajudou muito. Quando ela tinha dinheiro para pagar, ela pagava, quando não tinha, me dava uma roupinha, me dava dinheiro para comprar cigarro. Eu gostava muito de dançar. Eu não tinha roupa, ela me dava roupa dela que no servia, para mim, né, Mama?
P/1 – E o que você gostava de fazer nessa época aqui em São Paulo?
R – Como assim?
P/1 – Quando você trabalhava com a Neide.
R – Gostava de dançar.
P/1 – Dançar?
R – Dançar, Dona Iremina ficava com as crianças para eu ir dançar.
P/1 – Você dançava o quê?
R – Eu dancei no Paulistano, nossa, Som de Cristal, Cartola… gostava, eu era bonita, eu era chique, só usava salto assim, agora… (risos).
P/2 – Como era a cidade naquela época?
R – A cidade, antigamente, eu falo aqui para essas minhas netas, elas não acreditam, aqui não tinha sol, era garoa, muita garoa. As mulheres eram muito chiques, andavam de capas, aquelas guarda-chuvas lindos, não é do seu tempo também. Era muito bom São Paulo. Não tinha sol aqui, era só uma garoa, né? Agora está tudo mudado.
P/1 – Você gostava de ir ao cinema também?
R – Não, cinema não gostava não, eu acho que eu tinha trauma, que eu queria ir na matinê, depois eu não podia ir porque tinha que dar o dinheiro para o Totonho, então não sou chegada a cinema. Nem na televisão, eu gosto de assistir filmes.
P/1 – E como que eram essas matinês?
R – Lá em São Lourenço, era seriado. Passava no domingo, passava uma parte, sempre terminava naquela parte que o mocinho estava morrendo e tal. Quando era no outro domingo, a gente ia, ai começava aquela parte que terminou, que agora não existe mais isso, né? Mas a gente ficava doida para chegar domingo para ver se morreu ou não.
P/1 – Tem alguma história dessa época com a Mônica, com a Neide que você guarda muito contigo?
R – Tem assim, a Neide me ajudou multo com o Totonho, com a Priscila também ela me ajudou muito. Ela foi uma mãe para mim, sabe? Mas eu também fui para ela, que eu cuidava das filhas dela com todo amor, que amo até hoje, né? Foi bom.
P/1 – E essas gêmeas que você falou, quem são elas?
R – Ana Paula e Ana Claudia, que eu amo também, mas a Mônica foi a primeira, né?
P/1 – Elas são irmãs mais novas da Mônica?
R – É, mais novas.
P/1 – Filhas da Neide, também?
R – Da Neide.
P/1 – Como é que foi cuidar delas?
R – Foi bom. Eu cuidava delas, das gêmeas, da Priscila que era pequenininha, a Mônica já era maiorzinha. Ficava em Guarujá muito tempo, eu era preta, preta, preta. Ficava na praia. Eu detesto praia até hoje por causa disso, ficava naquele sol quente lá, mas tinha que ficar com as crianças, né? Ai, conheci o Renato. Esse marido meu, ex. Taxista. Ele não era ruim, não foi um homem ruim para mim, nada, mas ele era um homem muito exigente, sabe esses velhos exigentes? Teve um dia… nós estávamos namorando… vou contar a história dos outros filhos meus. Estava namorando com ele, quando foi um dia, eu trabalhava ainda na Neide, a Mônica já estava mocinha também. Aí, num dia primeiro de janeiro não sei de que data, ele chegou em casa, lá na minha casa. Ano novo, dia primeiro, eu estava até com visita lá. Aí ele falou: “Norma, vai lá no meu carro para pegar o cigarro para mim?”, achei esquisito, eu falei: “Nunca mandou fazer isso, não sou empregada dele, nem nada”, era apenas namorada. Quando eu cheguei lá, tinham três crianças: uma pequenininha, o outro maiorzinho e o outro maior. Eu fiquei: “O que é isso? O quê que vocês estão fazendo aqui?” ”Eu quero o meu pai”, eu falei: “Teu pai?”, peguei a menina pequenininha que estava chorando, que é essa caçula, Renata, peguei ela no colo, peguei a mão do Ricardo, o Alex já andava direitinho, já era mocinho e levei lá para dentro. Eu falei: “Renato, o quê que é isso?”, eu tava com visita, a gente não podia conversar. Ele falou: “Eu trouxe eles para passar o fim de semana com a gente”, eles nunca mais saíram de casa, você está entendendo? Eles foram com a roupa do corpo. Eu vestia a roupa da Priscila neles, shortinho assim, né? Mas os vizinhos me ajudaram muito, sabe, me ajudaram muito, deram roupinha pra eles, calçados, tudo. Ai, eu criei os três filhos dele já marmanjos. Nos separamos 35 anos por causa de um filho dele. Eu dei preferência… ele foi preso e quando ele saiu da prisão, ele não tinha para onde ir, eu falei: “Renato, o Alex vai ficar aqui, não vamos abandonar ele” “Não, não vamos abandonar, não”, mas ele não gostou do filho, muito exigente o Renato. Aí, eu aceitei o Alex em casa, aí a nossa briga foi essa. Aí, ele foi embora pra casa da mãe dele e mora lá até hoje, nós somos amigos, ele é um amor de pessoa. Ele saiu de casa, depois o filho também foi embora, está vendo? Eu não queria ficar uma velha sozinha, mas acabei ficando, né? Não, não falo isso? (risos)
P/1 – Você ficou 35 anos casada com ele?
R – Trinta e cinco anos.
P/1 – Com a Priscila e mais os três filhos dele?
R – Os três filhos dele.
P/1 – Vocês moravam onde?
R – Onde eu moro ainda.
P/1 – Santana, né?
R – É, há 60 anos, já.
P/1 – Como é que é essa casa de Santana?
R – Uma casinha bonitinha (risos), bem arrumadinha, tudo. Agora, eu crio os netos, né? Minha filha sai de manhã para trabalhar, só chega à noite.
P/1 – E nesses 35 anos, você estava trabalhando de babá?
R – Trabalhei no André Luiz 11 anos…
P/1 – O que é o André Luiz?
R – Casas André Luiz, você nunca ouviu falar?
P/1 – Não.
R – Criança especial, tudo… a gente não pode falar retardado, que não… especial, trabalhei lá 11 anos, aí me aposentei, saí de lá para a minha filha trabalhar, a mãe da Mariana. Mas aí eu não aguentei ficar em casa, comecei a cuidar de idoso. Cuidei de bastante idoso. O último é do Doutor Jozar, trabalhei com ele quatro anos, cuidando dele, lá na Bela Vista. Eu amava o Doutor Jozar, ele morreu. Mas aí a minha filha morreu, eu tinha que cuidar da Mariana, não porque ela era criança, porque ela estudava, só eu e ela em casa! Aí, eu saí de lá, depois de seis meses, ele morreu, senti muito, chorei. E trabalhei até os 74 anos.
P/1 – Cuidando de idosos no…?
R – De idosos, cuidei dele, cuidei de outros também, cuidei de gente com Alzheimer.
P/1 – Voltando um pouquinho, como é que foi trabalhar na Casas André Luiz? Como é que era o trabalho lá?
R – Foi a época mais feliz da minha vida, ali a gente aprende tanta coisa! Ali não é a gente que ajuda eles, eles que ajudam a gente. Vocês nunca ouviram falar disso? Da Casas André Luiz? Já viu, né? Lá é um… nossa, lá, a gente dá valor ao que a gente tem aqui fora. Eles ensinam a gente a viver. Chamam a gente de tia, de mãe. Trabalhei lá 11 anos, eu adorava trabalhar lá, mas saí, pedi a conta.
P/1 – Tem alguém que você… alguma amizade que você fez lá, que você carrega até hoje?
R – Fiz muitas amizades lá, mas você sabe que quando a gente sai do serviço, parece que some todo mundo, né? Sumiu todo mundo, não tenho mais comunicação com ninguém lá da Casas André Luiz.
P/1 – Tem algum caso que te marcou lá de dentro? Alguma pessoa que você cuidou?
R – A gente cuidava de um monte de criança. Cada berçário tinha 15, 20 crianças, então a gente amava todos eles. Eles eram como filhos da gente.
P/2 – Eram só crianças?
R – Eles são crianças… são mentalidade de criança, mas adultos. Tinha um menino lá, como é que chamava? Coronel! Ele era um toquinho pretinho, assim, desse tamanho, velhinho, carequinha, ele chamava a gente de “Preto”, pajem, preto, porque a gente era pajem lá, sabe? Agora não, agora são enfermeiros que estão cuidando das crianças lá. Se eu chegasse perto dele, uma pajem preta, ele vomitava, ele tinha nojo de gente preta e ele é pretinho, tadinho, deve até ter morrido, já.
P/1 – Como é que foi cuidar desses idosos?
R – A gente pega muito amor, depois morre e a gente sofre muito! A gente sente que a gente acostuma, pega amor, então é assim.
P/1 – De quem que você cuidou nessa época?
R – Olha, eu cuidei de tanta gente! Dona Cida, Dona Elza, quem mais? Dona Maria… e não sei mais, Doutor Jozar que foram quatro anos.
P/1 – Quem era o Doutor Jozar?
R – Doutor Jozar, ele era da Aeronáutica, 90 e poucos anos ele morreu. Eu ia ficar com ele na Aeronáutica quando precisava, sabe, dormia com ele, cuidava dele, ele falava que eu era a segunda mãe dele, todo dia vinha com uma aposentadoria maravilhosa. Aí, meu Deus, coitado, morreu e deixou tudo aí.
P/1 – E o seu… o Alex, né, que você falou, o que aconteceu que ele… se você quiser falar.
R – Ah, foi briga, sei lá, sei que ele ficou preso três anos, mas agora está trabalhando, mudou, melhorou.
P/1 – Isso foi em que ano, que vocês se separaram? Que teve essa briga?
R – Olha, acho que eu sou separada dele acho que faz uns seis anos. Mas a gente se dá, ela vai na minha casa, eu vou lá na casa dele, lá.
P/1 – Vocês conversam muito?
R – Conversamos, a gente se dá, só que nós somos como irmãos, né?
P/1 – E como estão os seus filhos, hoje?
R – Cada um cuidando da sua vida. O Alex, o Ricardo, a Renata mora comigo, depois que eu perdi a Priscila, aí eu chamei ela para morar comigo, eu estava sozinha. Aí, eu chamei o pai dela também para morar com ela, cuidar dela, né?
P/1 – Quem que mora na sua casa hoje, então?
R – Eu, a minha filha caçula, o marido dela e dois filhos, uma menina e um menino. Vitória, Douglas, o marido é Nildo e ela é Renata. E eu.
P/1 – E aquele pessoal das fotos que você mostrou pra gente?
R – Nunca mais soube. Da família que eu morei?
P/1 – É.
R – Nunca mais soube deles.
P/1 – Também os amigos da Casas André Luiz, também?
R – Não sei mais, porque a maioria morava lá em Guarulhos, e eu moro aqui em Santana, então…
P/1 – O que você gosta de fazer por lá, assim?
R – O que eu gosto de fazer? Eu gosto de bagunça. Eu gosto de som, gosto de dançar (risos). Eu sou uma mulher muito alegre, quando quero também, porque quando eu não quero…
P/2 – Como que era o bairro quando se mudou…?
R – O bairro. O bairro é Bairro do Cocho. Quando nós mudamos… minha mãe mudou para lá, lá não tinha asfalto, não tinha nada! Era um assim, um bairro que tinha pouquinhas casinhas, sabe? Eu trabalhava em Santo Amaro já com a Neide, eu vinha sozinha. Pegava táxi e ia lá em cima, porque lá não descia onde eu morava, não descia táxi porque não tinha asfalto e taxista tinha medo, porque lá dá medo mesmo, é uma entrada assim, é mato de lá, mato de cá e tem aquela rua lá embaixo, eu morava lá no fundão. Agora, é asfaltado tudo, mas antigamente… mas é um lugar muito gostoso, não tem poluição, tem bicho, tem macaco, a gente acorda com os pássaros, né? Macaco por cima da casa e lá é isso ai.
P/1 – Você tem quantos netos hoje?
R – Só do Alex, eu tenho 13.
P/1 – Treze?! (risos)
R – Cada um com uma mulher.
P/1 – E você cuida mais diretamente da Mariana, é isso?
R – É a Mariana, só. A Mariana é minha preferida. Eu amo todos eles. Já os filhos do Alex já são pais já, tudo criado já. A Vitória é pequenininha, 11 anos. Está quase do tamanho da Mariana. E é isso.
P/1 – Queria perguntar para vocês, vocês têm alguma pergunta para fazer?
R – Acho que já chega, né?
P/1 – Ia te perguntar, tem alguma coisa que você queria falar pra gente e eu não perguntei para você, ou algo que você queria deixar em depoimento?
R – Em depoimento?
P/1 – Isso.
R – Eu vou falar uma coisa, não sei se vocês vão gostar, eu amei vocês. Amei mesmo! Vocês são uns amores. Eu achava que eu ia ficar com medo, falei: “Ai, meu Deus”, estava nervosa demais, ao contrario, estou calma.
P/1 – Por que você achou que você ia ficar nervosa?
R – Porque assim, você é um doce (risos), ele é meigo para falar com a gente, tem paciência, né? Eu não aguentaria. Você é casado?
P/1 – Não.
R – Faz bem (risos), mas eu gostei muito de vocês. Só isso.
P/1 – Quero te perguntar quais são os seus sonhos hoje.
R – Ah meu filho, não tenho mais sonho, não, viu? Meu sonho mesmo? É ver minha neta bem, porque ela só tem eu e o pai dela. Os outros meus netos têm pai e têm mãe, tudo. Ela é só eu e o pai dela. Então, eu quero ver ela bem, me preocupo, ela é meu bebê, né filha? Isso ai é o amor da minha vida, quero ver ela bem, estudando do jeito que ela é estudiosa.
P/1 – Para terminar, uma ultima pergunta, como é que foi dar o seu depoimento aqui no Museu? O que você achou?
R – Foi bom, né? Foi bom, eu vim por causa dela, ela que me obrigou a vim, que eu não queria vim, não. Foi bonito, Mari? Tá contente? Então, tá.
P/1 – Tá certo então. Com isso, a gente agradece você.
R – Ah, graças a Deus!
FINAL DA ENTREVISTA
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