Depoimento de Leovegildo Motta
Entrevistado por Valéria Barbosa e Claúdia Leonor
Residência do entrevistado
São Paulo, 08 de novembro de 1994
Transcrita por Rosália Maria Nunes Henriques
P - Bom, eu queria que o senhor começasse falando o nome do senhor, o local e a data de nascimento.
R - Leovegildo Motta, nascido a 12 de junho de 1924 na cidade de São Paulo.
P - O nome do seu pai?
R - O meu pai era Licínio Motta e minha mãe Florinda Caligaris Motta, nascidos não lembro a data, a data eu não me lembro, ela escapa.
P - Não tem problema.
R - Minha infância, eu nasci no Belém, passei boa parte da infância, até os nove anos estudava no Coração de Jesus, Sagrado Coração de Jesus, aquela época era interessante, se tomava, com oito anos eu tomava um bonde na Rua dos Italianos sozinho, na Avenida Celso Garcia e ia até o Coração de Jesus que era no Bom Retiro, é. Depois, mudei aqui para o Cambuci, depois para a Aclimação, onde eu passei até os vinte e tantos anos, depois eu passei, fomos morar no Jabaquara, morei lá uns 18 anos e voltamos novamente para aqui, para esse apartamento que estou atualmente.
P - Seu Motta, vamos voltar um pouquinho?
R - Vamos.
P - É, como é que era o tempo de escola do senhor lá no Coração de Jesus?
R - O Coração de Jesus que eu me lembro para começar, o meu, eu senti muito, depois de um ano lá dentro no colégio, que meu pai não tinha condições de pagar aquele colégio para mim, porque 50% das pessoas ou mais tinham vindo de carro e eu naquela época pegava bonde, era um dos melhores colégios de São Paulo. Foi daí que com 12 anos eu achei que eu precisava ajudar a trabalhar e nasceu a idéia de eu ser um office-boy à noite, que eu recolhia os decretos-lei assinados pelo governo de São Paulo e levava para o Diário Oficial. Lá eles, eles reproduziam para o jornal, linotipo e eu pegava as cópias e levava para os principais jornais de São Paulo, do estado.
P - Como é que surgiu essa...
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Entrevistado por Valéria Barbosa e Claúdia Leonor
Residência do entrevistado
São Paulo, 08 de novembro de 1994
Transcrita por Rosália Maria Nunes Henriques
P - Bom, eu queria que o senhor começasse falando o nome do senhor, o local e a data de nascimento.
R - Leovegildo Motta, nascido a 12 de junho de 1924 na cidade de São Paulo.
P - O nome do seu pai?
R - O meu pai era Licínio Motta e minha mãe Florinda Caligaris Motta, nascidos não lembro a data, a data eu não me lembro, ela escapa.
P - Não tem problema.
R - Minha infância, eu nasci no Belém, passei boa parte da infância, até os nove anos estudava no Coração de Jesus, Sagrado Coração de Jesus, aquela época era interessante, se tomava, com oito anos eu tomava um bonde na Rua dos Italianos sozinho, na Avenida Celso Garcia e ia até o Coração de Jesus que era no Bom Retiro, é. Depois, mudei aqui para o Cambuci, depois para a Aclimação, onde eu passei até os vinte e tantos anos, depois eu passei, fomos morar no Jabaquara, morei lá uns 18 anos e voltamos novamente para aqui, para esse apartamento que estou atualmente.
P - Seu Motta, vamos voltar um pouquinho?
R - Vamos.
P - É, como é que era o tempo de escola do senhor lá no Coração de Jesus?
R - O Coração de Jesus que eu me lembro para começar, o meu, eu senti muito, depois de um ano lá dentro no colégio, que meu pai não tinha condições de pagar aquele colégio para mim, porque 50% das pessoas ou mais tinham vindo de carro e eu naquela época pegava bonde, era um dos melhores colégios de São Paulo. Foi daí que com 12 anos eu achei que eu precisava ajudar a trabalhar e nasceu a idéia de eu ser um office-boy à noite, que eu recolhia os decretos-lei assinados pelo governo de São Paulo e levava para o Diário Oficial. Lá eles, eles reproduziam para o jornal, linotipo e eu pegava as cópias e levava para os principais jornais de São Paulo, do estado.
P - Como é que surgiu essa idéia? O pai do senhor era jornalista?
R - Meu pai era jornalista e ele conversando comigo ele me dizia que a dificuldade é, porque cada jornal mandava um funcionário buscar no Diário Oficial que era na Rua da Glória, e os jornais eram mais afastado, e ficar à disposição até que o governador mandasse os decretos para lá. Então, conforme o governador, as suas ocupações, conforme a folga do governador, Adhemar de Barros, por exemplo, só mandava depois das dez, 11 horas da noite, então, tinha um problema, ele deu a idéia: Se juntasse uma pessoa para fazer a distribuição. Daí eu falei: Bom, eu vou. Ele me deu, me deu o nome de cada pessoa para procurar nos jornal, Estado, Correio Paulistano, Fanfula, Folha da, Folha da Manhã, Gazeta, Diário Associado, Diário de São Paulo, eu fui procurar cada jornal e propus. Eles aceitaram imediatamente, então, de cada jornal eu recolhia uma importância, e que naquele tempo dava para pagar o colégio e ainda sobrou, comecei a ver que sobrou, pude me vestir muito bem, estudar, e ainda deixava um dinheiro em casa. Foi realmente uma idéia do meu pai que eu executei e fiquei durante uns seis anos com esse... o único problema é que eu gostava muito de dançar e daí não podia, né? No sábado assim era um baile, eu ia pegar o baile meia-noite, uma hora, que eu chegava no baile, porque era a hora que eu acabava de fazer a distribuição, eu, garoto de calça curta até os 15 anos, ainda andava pela cidade de madrugada, muitas vezes o guarda civil chegava para mim: Ô, garoto, o que estais fazendo aí na rua? Aquele português: O que estais fazendo na rua? Estou trabalhando seu guarda. Eu vou para a rua andar com você, para te acompanhar. Ele me levava, fazia a volta comigo pelos jornais e me levava até a Praça da Sé, onde eu pegava o ônibus para ir para casa. Esse é um fato que me marcou muito a minha infância, e a satisfação de ver uma idéia fácil de cumprir, que a gente chegava no jornal nove, nove e meia, 10 horas, e 11 e meia, entre 11 e meia e meia-noite já tinha o meu serviço, fosse feito e ganhava mais, ganhava muito bem. Eu ganhava é, talvez uns 50% do que o meu pai ganhava no jornal trabalhando, e ele trabalhava em dois, três jornais para poder tirar aquele salário, eu com aquela idéia dele, que pus em execução, tirava um, era muito bem remunerado, me ajudou bastante a minha família toda no estudo.
P - Que rua que o senhor andava, assim, à noite, em São Paulo?
R - Como é?
P - Que rua que o senhor percorria, como é que era São Paulo à noite?
R - Ruas? Ah, era uma delícia; né, você, você não tinha problema de andar preocupado, não tinha. Andava tranqüilo pelas ruas. Eu saía da Rua da Glória, ia na... O Dia, tinha O Dia, a Folha de S. Paulo, Folha da Manhã que era o nome da Folha da Manhã, que era na Rua do Carmo, antiga Rua do Carmo, hoje tem outro nome, depois eu atravessava o viaduto e eu ia, ali era o Estado de S. Paulo naquela ladeira, daí eu ia para a rua, ia para o Largo São Bento, Rua Libero Badaró, Correio Paulistano, atravessava o Viaduto do Chá, ia na Gazeta, que era na Cásper Libero, descia na Rua do Seminário, que era o Fanfula, ia na Conselheiro Crispiniano que era o Diários Associados e daí eu voltava, não, Diários Associados era o último, que eu percorria, da Rua da Glória à Rua 7 de Abril. Eu voltava para a Praça da Sé, onde eu pegava o ônibus, era uma caminhada, viu, uma boa caminhada, mas tranqüila, tinha as boates naturais naquele tempo que eram, que tinham os, como é que se diz, os bares da noite, eu conhecia aquele pessoal, os cantores da noite existiam, mas não, com uma classe, completamente diferente do que é hoje, um pessoal muito respeitador, tranqüilo mesmo, tranqüilo mesmo. Aquilo era uma gostosura, e sábado a gente encontrava maior movimento, né, mas a responsabilidade era aquela, feriado era só domingo que não, mas sábado, feriado, carnaval tinha os decretos lançados pelo governo, que não se emendavam os feriados como se emendam hoje, né?
P - O senhor lia alguns desses decretos, o senhor lembra de algum decreto importante?
R - Não, eu não lia não, não tinha, não tinha. Era um decreto-lei que era chamado naquela época, mas normalmente eram nomeações e eu não tinha curiosidade de, eu gostava muito de ler. Com 12, com 12 anos eu ganhei o Tesouro da Juventude e aos 14 anos já tinha lido umas três vezes todos, todos os 18 de livros do Tesouro da Juventude, eu gostava muito de ler, mas os decretos não, viu, eram assuntos que fugiam completamente à minha curiosidade.
P - Seu Motta, nessa época, como é que o senhor fazia com o trabalho e com a escola?
R - Era fácil porque eu estudava pela manhã, entrava às 11 e meia no colégio e saía às quatro e meia da tarde, e o trabalho era à noite só, então eu tinha tempo de estudar. De manhã levantava, acordava cedo, tinha tempo de estudar, preparar a lição, trabalhar, voltava quatro e meia e ainda dava um tempo de brincar um pouco, ainda ver, na esquina, ver a tropinha, troça de amigos e depois a gente, dava tempo ainda de tranqüilamente ir trabalhar porque era nove e meia, dez horas.
P - O senhor falou das brincadeiras. Que tipo de brincadeira que era?
R - Bom. Vamos dizer hoje, que chamam de paquera, né, a gente chamava de flerte naquele tempo, era ficar na esquina, sendo que 12, 13 anos a gente já ficava na esquina porque as meninas também saíam nas portas, ficavam sentadas nas portas e a gente passava pelas portas, olhava, né? Aquela brincadeira inocente mas muito gostosa, muito, a gente chamava de flerte, e a gente, era o bairro principal, aqui já, morando já no Cambuci, tinha, no Largo do Cambuci tinha, como tinha no interior, em São Paulo também tinha o passeio à noite das meninas, né, elas giravam no sentido do ponteiro do relógio e a gente girava o contrário, né? Era assim que a gente flertava, no Cambuci, na Avenida Lins de Vasconcelos, aí que era um, era muito, muito gostoso, certo, a brincadeira na rua, da noite, brincava de mano a mula, como é que era outra brincadeira? Eu não me lembro das palavras e o nome da brincadeira, o mano a mula era outra que era muito... Ah, o pegador, acusado, escondia: "Acusado atrás daquele poste." Aquela brincadeira na rua à noite, de lampião ainda, isso eu estou me lembrando agora, quando morava no Brás, de lampião ainda, lampião aceso brincando até, até... Mas era sagrado: às oito horas a gente parava e ia para dormir, que dormia cedo, né, porque o lampião nove horas, dez horas apagava todos os lampiões, vinha aquele homem com um chapeuzinho, apagava todos os lampiões de gás, então essa infância eu me lembro bastante. E brincadeira de rua, empinar papagaio, aquelas brincadeiras, jogar bola, bolinha de gude que não se vê mais hoje, jogava muito aquilo se jogava. Eu era, eu era viciado naquilo, ganhava, eu enchia caldeirões de bolinha de vidro, é. Então meu pai não podia comprar, eu queria ganhar, fui numa oficina mecânica e descobri aquelas bolinhas de aço e até a garotada perceber que eu jogava com bolinha de aço, e que eu dava uma esticada, entrava e quebrava a bolinha de vidro dos outros e quando quebrava eles pagavam dobrado, tinham que pagar duas bolinhas para mim: Que bolinha é essa? E eu quieto, depois eles descobriram que a bolinha era de aço e a deles era de vidro. Então, essas brincadeiras realmente, que hoje não se vê mais, né, há muitos anos que eu não vejo isso.
P - Seu Motta, e no Sagrado Coração o senhor teve algum tipo de educação religiosa, como era?
R - É, era uma educação religiosa, dependia muito dessa educação ser mais dura ou menos dura do diretor. Teve uma época que era, chamava-se, eu me lembro que, eu não me esqueci, Edgard de Souza, era um padre muito avançado para aquela época, ele, como ele ensinava religião de um maneira muito agradável, mas muito agradável. Ele era obrigado a ir na missa todo o domingo, era missa, às seis ou sete horas e tinha a capela para os alunos que era a Capela Dom Bosco, onde cabiam, era enorme a capela, cabiam perto de 800 alunos e era obrigado, quem não fosse naquele, quem não fosse domingo na missa perdia, era marcado falta um dia de aula, e ele, mas a turma faltava, a turma ia na capela e depois fugia só para carimbar a caderneta, presente, depois dava um jeito e fugia. Ele liberando realmente ele conseguiu muito maior número de pessoas por essa liberdade: Não, vem quem quer, só que depois nós vamos ter uma partida de futebol, vamos inventar uma brincadeira qualquer, não é?" Então, com essa, depois veio um padre muito mais severo, Padre Arcanjo, que derrubou completamente toda essa liberdade, obrigava, queria que todo mundo beijasse a mão quando entrasse no colégio, e rapazes já com 18, 19 anos já no quinto ginasial tinham que chegar beijar a mão, e o Coração de Jesus tinha perto de 2.500 alunos, sendo que 800 eram internos e perto de 300, assim, eram semi-internato, vinha de manhã e saía de tarde e o resto era horário só das 11 às quatro e meia. Então, o padre ficava na porta e todo mundo beijando a mão, mas beijava mesmo, tinha que beijar a mão dele, não era só fazer a menção de beijar. Então na parte, agora, o ensino era muito puxado, era puxado, tinham sabatinas mensais. Era um ensino puxado, mas puxado mesmo, né, muito rigoroso, a média era cinco e, mínima média, e se no conjunto de toda matéria fosse cinco não passava, tinha que ter três, quatro matérias acima de sete, o estudo era puxado, o Coração de Jesus era puxado.
P - O senhor lembra de algum professor, assim, que ficou mais marcado?
R - Ah, lembro, lembro, e como lembro Lembro de um. Lembro de vários, lembro um era Padilha, vocês devem ter conhecido foi muito famoso aqui no futebol, federação. O tio dele era professor de geografia e justamente no quinto ano ginasial eu não aceitava ter que beijar a mão, eu achava que eu já era o dono do mundo, que beijar a mão, eu não beijei mais, então, o padre Arcanjo, ele não podia me suspender porque eu estudava muito, eu era muito, eu não era muito inteligente, eu era esforçado. Eu levei dez anos no Coração de Jesus brigando com dois, dois colegas, um era um italiano, outro era um judeu, eram superinteligentes, não escreviam nada na classe, só ouviam, mas isso foi inteligência. Eu não, precisava escrever tudo, estudava, eles estudavam uma hora, eu precisava estudar três, mas eu, então eu tinha muita força de vontade, eu levava, levei os dez anos brigando com esses alunos, se eles eram os primeiros, eu era o segundo, estava sempre ali, nos últimos quatro anos ginasial eles, mas não conseguiram mais me pegar porque eu estudava quatro, cinco vezes a mais do que eles. Então esse padre, como não podia me reprovar por média, ele começou a me suspender, cada vez que eu não beijava a mão, ele me suspendia: Você vai para casa, dois dias suspenso. Então, chegou numa tal, faltava um mês para terminar o ano, ele me obrigava, eu não queria ficar, não podia ficar na classe, era obrigado a ir para o recreio, porque no recreio ele ficava olhando para mim se eu fazia alguma coisa, e os colegas todos sabendo disso eles faziam uma roda em volta de mim para ninguém chegar em mim. (tosse) Eu chegava, eu chegava, os colegas me rodeavam eu ficava, ficava sentado, ficava ali sentado no chão e eles rodeavam, e tinha esse padre, esse professor se prestou para que padre Arcanjo, no dia do exame faltasse para que o padre Arcanjo ser o examinador, para ele poder me reprovar, me segurar, e como ele não conseguiu que eu fizesse o exame, ele queria pelo menos me segurar de segunda época, porque ele sabia que, desde o segundo ano ginasial, eu ia ser oficial da Marinha, que eu ia ser oficial da Marinha, mas é que o exame da Marinha era de, em janeiro, e a segunda época que era em fevereiro, então ele me, o professor Padilha, o Padilha não, Padilha era o sobrenome dele, de geografia faltou e o padre Arcanjo foi substituir, e numa hora em que eu estava escrevendo normalmente, ele falou: O senhor está copiando, colando. E me tirou a prova. (risos) Me tirou a prova e daí, isso é uma coisa, padre Arcanjo, não me diga de anjo, de anjo não tinha nada, era terrível, e o professor Padilha que ficou marcado porque ele se prestou para isso. Chegou na segunda época, eu prestei exame de segunda época, tirei toda a papelada de transferência, entrei no colégio quando estava cheio o pátio, o pessoal fazendo, fazia, naquele tempo fazia-se uma preparação para entrar, fazer o ginasial, ginásio, do primário para o ginásio prestava-se um exame, tinha uma... o pátio estava lotado, tinha lá mais de 800 alunos no pátio, eu entrei no pátio e quando eu vi o padre Arcanjo eu falei: Vou te quebrar a cara. E saí correndo atrás dele, porque ele ia subindo a escada para a capela, eu segurei a batina dele, rasguei a batina dele, ele ficou de calça e camiseta só, e eu dei um tremendo soco nele, mas dei o soco e saí correndo porque daí começou. Perto dali tinha uma polícia e começou policial a correr atrás de mim, uma pá de policial, mas eu conhecia o colégio já tudo, entrava para um lado, saí para outro, eles não conheciam também muita, e ainda passei na mesa do diretor, na mesa desse diretor joguei tudo no chão, passei a mão assim, e joguei tudo, tinteiro, tudo no chão, passei a mão assim, entrei na igreja Coração de Jesus, saí para o sacristão, daí fui para a cozinha do internato, que lá tinha um buraco, onde era cozinha do internato, que jogavam madeira para o fogão a carvão, jogavam depois a madeira e tinha um buraco assim que saía na rua, eu "tum", emboquei no buraco e saí na rua e nunca mais voltei. (riso) Voltei só no barzinho que tinha aí, chamava-se, da Flávia, uma velhinha, Flávia, ela servia o chocolate para nós, o café. Deixei os papéis lá, voltei depois, uma semana ou duas para buscar os papéis para pegar a transferência e me matricular noutro colégio, que foi o Anglo Latino.
P - Vamos dar uma paradinha para o senhor tomar água. Senhor Motta, aí o que é que aconteceu que o senhor saiu, o senhor tinha um sonho de entrar para a Marinha, né?
R - Certo.
P - E o que é que aconteceu com esse sonho, qual foi...
R - Em virtude de não... ter perdido o exame, estava me preparando há três anos, eu fiquei desnorteado, parei de estudar, parei de estudar, mas depois, antes que começasse o ano letivo, eu resolvi fazer o colégio porque precisava três anos de colégio para cursar uma outra faculdade. Eu comecei a fazer os três anos de colégio, fiz, daí resolvi: Bom, vou ser engenheiro. E prestei exame na Politécnica, entrei, mas era dificílimo, todo mundo, já era uma barbaridade, a Politécnica era um por 80, um por cada 100, para 100 vaga, uma vaga era 100, 80 alunos, 80 concorrentes, eu larguei: Meu negócio não é engenharia. Eu fiquei acho que uns seis meses: Meu negócio não é engenharia não. Engenharia Naval, naquele tempo não tinha Engenharia Naval, eu falei: Não, eu não vou ser engenheiro não. Aí parei, parei e comecei a trabalhar, comecei a trabalhar, mas depois eu vi que eu tinha uma tendência para organização, organizar as coisas, muito organizado, minhas contas particulares, e tudo, era muito organizado, gostava de mexer com papel. Eu resolvi: Eu acho que, eu gosto. E comecei a ver negócio de papel, trabalhar com papel, mas ainda não tinha Administração. Depois de alguns anos, eu devia talvez já estar com uns, eu não sei quando é que começou, mas eu já devia estar com uns 26 anos, por aí, quando começou a primeira escola de Administração em São Paulo que era a dos padres, que hoje me parece que chama Esan, ficava lá na Rua São Joaquim. E eu fui lá, trabalhava e lá não tinha curso noturno mas eu, com as minhas idéias eu comecei a mexer, e como tinha jornal, algumas pessoas que fazem jornal, comecei a mexer os pauzinhos. Formei um grupo de alunos, de 20 pessoas já com a idade, para fazerem um curso de Administração, mas fora do horário normal, e falamos com o reitor da universidade lá, ele topou, ele fez umas classes que funcionavam três vezes por semana, funcionava à noite, e depois sábado e domingo nós tínhamos aula, sábado e domingo o dia inteiro. Mas só que a nossa classe era uma classe fechada porque todos nós já trabalhávamos, todos nós éramos, o pessoal que entrava era tudo ainda garoto de 17, 18 anos, nós já estávamos tarimbados, com vinte e tantos anos. Então, tornou-se uma classe especial e conseguimos também naquela oportunidade no Ministério da Educação que em vez de fazer quatro anos, fizéssemos em três anos, e fizemos a faculdade em três anos. Assim, foi uma classe sui generis, diferente, com três anos, e passamos depois no último ano, nós começamos a dar aula para nosso período nós dávamos aula para as classes mais inferiores, que começou o primeiro ano. Mas nós prestamos exame, já começamos, e em seis meses passamos já para o segundo ano, e daí me formei em administrador de empresas, que até hoje ainda faço esse trabalho, assessoria.
P - Senhor Motta, e nessa época o senhor trabalhava com o quê?
R - Nessa época eu trabalhava, quando eu comecei a fazer administração?
P - É. Ou o senhor teve antes alguma outra atividade?
R - Não, tive atividade, tive, aí você vê desde os 19 anos trabalhava em porto de areia, que eu falei, extração de areia, tudo, mas nessa oportunidade eu trabalhava já...
P - Era na Eron já, né?
R - Devia ser, não, com 25 anos não, com 25 anos eu devia estar ou despachante, coisa que o valha por aí, viu, é. Eu não me lembro bem, mas devia ser o despachante.
P - Era, depois que o senhor saiu do jornal. Bom, senhor Motta, o senhor trabalhou um tempo no, pegando os decretos e levando para os jornais, né?
R - Certo.
P - Depois, o senhor começou a trabalhar com porto de areia, o que é que o senhor fazia?
R - Porto de areia, para vocês terem uma idéia, eu saía do Jabaquara às três horas da manhã, pegava o primeiro ônibus que era o ônibus que saía do Jabaquara e ia pegar os motoristas para levar para trabalhar, então eu saía junto com esse ônibus para chegar na Praça da Sé. Na Praça da Sé eu ia, com o bonde, eu ia até lá a Sorocabana, pegava o primeiro trem que ia para Quitaúna levar os soldados, para mim chegar no porto de areia às seis horas da manhã, que era em Osasco. Eu descia no porto de areia, na estação de Osasco, andava sete quilômetros para chegar nas margens do Rio Tietê, onde tinha esse, descoberta de areia, que a gente chamava, e daí, chegava, fazia extração de areia, de pedregulho, e extraía com dragas, jogava em barcos para, e os caminhões que ficavam em construções.
P - Qual era a função do senhor?
R - A minha função, eu tinha um padrinho que tinha muito dinheiro, e ele me viu com vontade de trabalhar, ele me pôs como sócio. Sócio não, eu era, eu era um gerente, gerenciava o negócio, mas ele entrou com o capital que era alto, ele com um italiano, chamava-se Vicenze Piccioni, que é pombo em italiano, só que esse Piccioni não entendia de areia e depois de seis meses ele fugiu com o dinheiro e com o carro. Até que o meu padrinho tinha posto, e me deixou com um monte de dívidas, e eu fui ameaçado, fui amarrado num castanheiro, tem uma, tinha uma chácara que dava castanhas lá, uma portuguesa, fui amarrado pelos operários que com faca disseram: Ou você nos paga ou nós te matamos aqui. Eu fui conversando com eles e mostrando, se me matasse não recebiam, se me deixassem vivo eu pagaria, mas fiquei muito desanimado, ia toda manhã. Eu sabia que tinha areia lá mas eu não sabia sondar, fazer uma sondagem onde tinha areia, eu estava sentado embaixo do castanhal quando eu comecei a ver umas formigas carregando um grãozinho amarelo, eu falei: Mas isso é areia. E fui seguindo as formigas, fui vendo que elas trouxeram um monte delas, e era areia mesmo. Eu fui seguindo de onde que elas vinham, e daí peguei uma enxada e comecei a bater, depois de quatro, cinco enxadadas eu vi que ali tinha areia, não precisava nem pôr a draga, tinha areia, areia de barranco que a gente chamava, aí eu falei: Bom, agora eu estou salvo, né? Aí eu comecei a tirar areia ali, chamei os empregados: Vou tirar a areia com vocês. E tirar areia e vender areia de barranco, era uma areia amarelada que servia para reboque, não para acabamento, para assentar tijolo, tudo servia, mas não para acabamento. Mas embaixo daquela areia eu descobri uma mina que tinha, tinha mais de seis metros de areia, embaixo, a três metros de profundidade, dava areia que... E daí eu consegui pagar sozinho, fui pagando todo mundo, paguei empregado, paguei as dívidas todas, mas meu padrinho estava na Europa, foi já uns dois anos para Europa, ficou viajando, eu, daí cansado, fiquei muito cansado, sozinho, garoto ainda, 19 para 20 anos. Eu falei: Eu vou parar com isso, porque eu sozinho eu não agüento. Eu saía às três horas, passava, saía, saía de lá vinha para o escritório, batia duplicata, tudo isso, eu era, eu era aquele que dava o córner e corria para o gol para cabecear, mas ainda saía, saía do escritório seis, sete horas na Praça da Sé. Vinha aqui para ali, já namorava, para ver minha noiva, minha namorada, jantava geralmente na casa dela, ia, oito horas eu precisava estar em casa, oito e meia, nove horas no mais tardar para levantar às duas e meia, três horas. Então está bom, ficou, era muito puxado, eu fiquei uns três anos assim mas uns dois, três anos sem agüentar, daí chegou meu padrinho eu falei: Eu não agüento mais padrinho, essa vida não dá para mim mais não. E resolvi, vendemos o porto de areia. E eu passei daí, montei nesse mesmo prédio que meu padrinho tinha escritório eu montei um escritório de despachante no trânsito, e eu, eu e um outro rapaz que a mãe dele era funcionária do, chamava-se DSV, Departamento de Serviço de Trânsito, a mãe dele era alta funcionária, então nós tínhamos facilidade em conseguir carta rápido, não com trambicagem não, mas rápido os papéis, licenciamento, eu criei já um serviço à domicílio, ia pegar carta, para tirar carta, licenciamento, eu ia na casa dos clientes buscar, dos Matarazzo, dos Crespi, eu ia na casa deles buscar, eu criei um serviço à domicílio, eu era um despachante.
P - Eles que telefonavam, como é que era?
R - Eu telefonava, oferecia o serviço, depois eles mandava que eu fosse falar, falar com o mordomo, com a secretária, com, eu fui, mas aí eles começaram a conversar muito comigo porque eles viram que era um: Como é que você? Por quê? Eu preciso criar cliente, eu falei. Mas felizmente eu comecei, a realmente ganhar muito cliente, comecei a ser copiado por outros despachantes, o (Pedransque?) que era o despachante que era o mais antigo de São Paulo, era enorme esse escritório, ele começou a fazer isso também. Mas, infelizmente, meu sócio faleceu, faleceu uns meses depois que nós tínhamos escritório, chamava-se naquele tempo pneumonia galopante, que era uma tuberculose na realidade, e ele faleceu em poucos meses, então eu fiquei desanimado, a mãe dele ficou muito mal, também eu. Daí eu parei, fechei o escritório de despachante, daí eu, despachante, para onde eu fui?
P - Posto de gasolina?
R - Ah, daí eu fui, eu fui convidado por um alto funcionário do Palácio da Justiça, era o comprador do Palácio da Justiça, Dipp Salém, Rolando Dipp Salém, que ele queria comprar um posto mas ele não podia tomar conta do posto. Eu conhecia ele porque eu fiz um serviço de despachante para ele, ele falou: Eu preciso de um camarada sério e trabalhador, é o que eu preciso: de você. Eu falei: Tudo bem, vamos para lá. E ele comprou um posto, era bandeira Atlantic, era um dos grandes postos de São Paulo, era um posto que naquele tempo tinha já seis bombas de gasolina e duas de óleo diesel, e na Rua Lapa, esquina, não, na Rua Clélia, esquina com Cipião, na Lapa, e aquela rua era saída para o interior, e o posto era, foi, tinha sido construído por dois senhores de muita idade, eles não tinham prática, e uma freguesia, muito poucos fregueses, eu vi, eu vi a possibilidade de pegar freguesia de caminhão, é quem vai sair de estrada: Eu vou me dedicar aos caminhões, aos caminhoneiros. Então, eu me dedicava a caminhão. Comecei a fazer clientela de caminhão, aquilo em poucos meses, seis meses eu passei para 150 mil litros de gasolina, óleo diesel, para você ter uma idéia o que é isso, até hoje uma boa galonagem para um posto atual vender, 150 mil litros por mês.
P - Inclusive naquela época?
R - Naquela época. Eu comecei a vender, o posto era uma coisa. A Atlantic ficou tão entusiasmada que ela chegou a me dar oportunidade de comprar gasolina, porque você comprava assim: você pedia gasolina hoje, no dia seguinte de manhã estava lá, você precisava pagar, antes do camarada descarregar você precisava pagar, o americano era, ali não tinha, pagava antes de descarregar gasolina, se não tinha dinheiro não descarregava. Ele começou a me dar gasolina, eu pagava no dia seguinte porque ele ficou tão, tão entusiasmado que ficaram, e aí e ali eu...
P - O senhor falou de pagamento, né, no caso com fornecedores, e como que era a clientela, os fregueses?
R - A clientela, eu procurei me dedicar mais a caminhão, caminhoneiro que ia para estrada, porque o particular tinha pouco carro e eram muito exigentes, e o caminhoneiro já era mais assíduo, eu, naquele tempo não tinha, não usavam cheque, era dinheiro. Mas eu comecei a criar com muito caminhoneiro um vale que eles pagavam na volta que recebiam o frete. Então, realmente eu vendi, mais do que eu só vendia um posto que era na estrada, chamava-se Posto Paraná, era na estrada, já na saída que ia para a estrada do Paraná, era o único posto que vendia mais do que eu, gasolina. Eu entrei como empregado lá com a promessa: Se você pagar a dívida em dois anos, fazia sociedade. E de fato em um ano e seis meses nós pagamos o posto, daí o Dipp estava satisfeito, só que eu também eu não agüentava, eu saía do Jabaquara também para chegar às seis horas, e chegar em casa nove, dez horas da noite. Quando às vezes faltava o guarda eu passei, passava duas, três noites, duas, três dias trabalhando dia e noite sem dormir, tomando Pervirtin, que era uma bolinha naquela época para agüentar trabalhar. Daí me deram sociedade, mas eu pedi: Ó, vamos por um sócio, né? Puseram um outro sócio que dividia comigo o trabalho, ia muito bem. Mas eu tirei umas férias, daí mudou, foi a primeira rua de São Paulo que mudou a mão.
P - A Rua Clélia?
R - A Clélia, a Clélia passou a ser mão de subida, a saída para estrada passou descida, então a minha clientela, caminhoneiro, acabou. Passava para duas, uma quadra lá trás, eles não podiam, era muito difícil fazer manobras nesses caminhões, eles não faziam, então eu passei, de 100 eu voltei a vender vinte e poucos mil litros por mês, daí, nós começamos, eu falei: Vamos trabalhar agora com carro de praça, né, particular, carro de praça. Aí meus sócios, aí não achavam, não queriam ser, usar uma série de desonestidades, começaram a querer viciar a bomba, entendeu? Eu, tinha óleo que era tudo importado, mais fácil de apertar uma latinha e trocar por óleo de lata, por óleo de litro que custava menos da metade. Eu não, falei: Não, eu não faço isso, e nem vocês fazem que eu daí saio. Mas eu, daí eu tinha mudado para uma rua perto, a uns 100 metros, 50 metros do posto. Eu desconfiei, desconfiei que eles faziam isso, eles estavam isso lá quando eu não estava no posto, só podiam fazer à noite, então eu fiquei de noite numa casa em frente olhando. Eu vi eles, os meus dois sócios, fazendo isso. De manhã não tive dúvida, abri o cofre, falei: Eu não sou mais sócio daqui. A minha sociedade era 200, 200 contos, minha parte da sociedade. Aí ela estava na maternidade para ter os meus filhos gêmeos, meus filhos, eu nem sabia que eram gêmeos, meus filhos, para ter o meu filho. Eu fui abrir o cofre, eu me lembro o valor porque ficou gravado. Eu falei: Olha, aqui tem oito mil e, não me lembro quebrados, oito mil e poucos cruzeiros, é com esse que eu saio. Mas a sua parte vale tanto. Eu falei: Eu não quero saber, é com isso que eu saio agora do posto. E saí, porque se abrissem: "Isso é óleo Vedol, esse óleo aqui você lubrificava, eu vi você às tantas horas fazendo isso, eu saio agora. E saí, saí de lá e fui para maternidade. Eu falei: Vou ficar contigo uma semana aqui de férias vendo o meu filho nascer, tenho dinheiro para pagar, então, não vai faltar. E fiquei de fato, fiquei quatro ou cinco dias com ela na maternidade quando nasceram meus filhos gêmeos. Mas quando eu saí de lá eu já tinha convite, eu nunca parei um dia, tinha sempre algum convite já.
P - Senhor Motta, para aumentar essa clientela de caminhões e depois tentar pegar mais clientes de praça que mudou a rua, o senhor fazia algum tipo de publicidade?
R - Não, não, era promoção que a gente chama de serviço de boca a boca, um ia lá e falava: "Olha, vai lá no, vai lá no Léo", que eles chamavam Léo nesse tempo, "vai lá no Léo que ele tem cafezinho." Eu dava cafezinho, e dava lanche, e às vezes saíam e falavam: "Olha, minha mulher vai ter filho, ela vai telefonar para cá, você me avisa?" Então eu fazia uma prestação de serviço para todos os caminhoneiros, todo cliente do posto que ia viajar, eles sabiam que lá eles podiam contar comigo que eu ia, se a mulher telefonasse quantas vezes precisava, tinha um farmacêutico muito amigo em frente, mandava pegar um táxi e levar até lá, buscar a mulher na maternidade, uma série de coisas de serviços que eu prestava, para filho doente, transportar do hospital para casa. Eu, eu não era a idéia, eu gostava, achava que podia ajudar com isso, né, e os caminhoneiros viajavam, deixavam família aí, ficavam satisfeitos, sabiam que tinha alguém que se preocupava. Através de uma série de expedientes dessa natureza é que eu fui ganhando uma clientela, fui ganhando um nome de bom, ganhando de honesto, eles sabiam que eu não deixava roubar na bomba, ali era sagrado, enfim, uma série de expedientes dessa natureza que eu fui ganhando a clientela, só trabalho, trabalho, trabalho. O burro é o meu símbolo, é o trabalho que eu acho que vence, até hoje achei, até hoje eu acho que o trabalho dobra, vence, não precisa ser desonesto, trabalha que o patrão reconhece, eu acredito nisso até hoje.
P - O senhor desfez a sociedade então, depois?
R - Daí desfez a sociedade, eu fui para a maternidade, quando, daí eu fui para a, para o...
P - Para a firma de instalações?
R - É. Aí veio um convite através de uma pessoa que eu conheci na Lapa também, ele falou: "Olha, o meu, tenho um cunhado ou primo, eu não me lembro bem qual era a afinidade, que está precisando de alguém para tomar conta da loja, de uma empresa de instalações elétricas e hidráulicas, você é organizado e tudo isso." Aí eu fui para lá, chamava-se, na Praça Marechal Deodoro, chamava-se J. Reinaldo Lima, ele fazia instalações elétricas e hidráulicas, mas não vendia material. Então começamos, fui aprendendo aquilo, fui organizando aquilo, tinha engenheiros, tinham muitos operários, tinham. Os maiores construtores naquela época eram o Pacheco Fernandes de Dantas, uma empresa grande de construção, Morse Berenback, que era, um deles era Dino Morse, que era o dono da Drogasil também, tinha uma empresa de construção, a Adolfo Lindenberg, hoje ela é mais uma revenda de prédios, naquele tempo era construtor, uma das três maiores construtoras, e nós fazíamos muito serviço para eles, geralmente mais para... residência muito pouco só se fosse muito grande a residência, mas não para prédios. E aí eu comecei, também eu falei: "Nós temos aqui um armazém aqui na Praça Marechal Deodoro fechado, cheio de material, porque não vamos vender esse material?" "Ô, então você faz." Então, eu organizei uma loja com todo o mostruário para vender, para vender material, então, em vez de ter o depósito fechado, passamos a ter um depósito aberto na frente e depósito atrás, a loja na frente e o depósito atrás, e começamos a vender material elétrico, material hidráulico. E fizemos uma freguesia, era pegado, não me lembro o nome, mas logo depois de uns anos juntou a essa Tapeçaria Donatelli que até hoje existe, a primeira loja deles foi na Praça Marechal Deodoro, vizinho comigo, e daí eu fiquei muitos anos. Aí tem um particular muito interessante, nós fizemos...
P - Brasília?
R - É, Brasília, Brasília estava começando e, rapaz, Chico Fernandes Dantas foi que começou a erguer o Catetinho, que era a casa de madeira, que eu vi depois pronta, dormi lá, onde o Juscelino Kubitschek dormia, e nós fomos para lá, eu fui para lá para fazer instalação elétrica lá, e depois começamos, começou Brasília e começou. O primeiro que se ergueu foi o Palácio da Alvorada, depois foi o Hotel Nacional, é, nós começamos, os primeiros prédios que foram construídos, quem fez a parte elétrica fomos nós, e Pacheco Fernandes que começou as construções, Lindenberg também, o Morse Berenback, quase todas foram para lá.
P - E o senhor foi com a família?
R - Não, não, eu fiquei aqui, fiquei aqui, fiquei aqui. Eu mandava material, eu mandava os empregados para lá e fui, eu fui algumas vezes, quer dizer, eu fui com avião, às vezes ia de avião, um teco-teco, ia de ônibus, de carro, depois de avião teco-teco, cheguei a dormir no Catetinho, e para ter uma idéia, nós chegávamos, chegou a mandar para Brasília até tijolo, tijolo porque não tinha, não tinha estrada nada, era tijolo que se mandava para lá.
P - Por avião?
R - É, por avião, avião, mas tudo por avião, o nosso material por avião, motores enormes de quatro, cinco cavalos mandavam tudo de avião, instalações, todas as instalações do Palácio da Alvorada, do Hotel Nacional, que eu me lembro, eu não me lembro qual foi de dois ministérios, que foram os dois primeiros ministérios que foram feitos lá. Nós também fizemos o serviço de instalação.
P - Seu Motta, como é que todo esse material era embalado para ir de avião para lá?
R - Ah, era, a embalagem era fácil porque o avião era lotado por material de construção, então, a gente tinha umas caixas de papelão, às vezes tinha umas caixas que era um produto, não era isopor, não existia, nem forro de plástico, nada. Era uma caixa com um tipo de fibra que eu não sei o que é, quem fornecia essas caixas era a Light, a Light tinha essa embalagem, e a gente pedia emprestado para eles e punha o material lá e não precisava escrever não porque geralmente um eletricista, um funcionário ia junto com o material, né? Embarcava no aeroporto de Congonhas que era a terra, tinha pista, tudo de terra, e ia lá para Brasília com esses, com Douglas, que era esses aviões, esses, transporte, tinha transporte e de passageiros nessa época. Uma viagem desse Douglas levava, para Bahia nessa oportunidade levava cerca de seis a oito horas para chegar na Bahia, ia pousando, só em Minas, em Minas Gerais a gente pousava em uns quatro ou cinco aeroportos, a gente ia assim pingando, pingando, até chegar em Brasília.
P - E por que é que o senhor resolveu sair da...
R - Dessa aí eu fiquei quase uns dez ou 12 anos por aí, porque daí nós, a firma cresceu muito, mas ela não cresceu o suficiente que nós precisávamos para dar aos engenheiros também. Doutor Carlos Vieira, como sócio, perdeu a conta só de projetos que nós pagávamos para fora, e passamos a fazer os projetos com o doutor Carlos Vieira, e ele, ele era moço, e eu também, queríamos crescer, só que o dono da loja, o Reinaldo, ele gostava mais de fazenda, de vacas, era tudo, a família dele era de Franca, e o irmão dele era, chegou, era ministro da Justiça, secretário, foi alto, alto funcionário da Justiça de São Paulo, e foi para o governo federal, e nós tínhamos chance de crescer, ele não queria crescer, ele, estava bem para ele, porque tinha eu que tomava conta, o engenheiro lá, também uma pessoa fantástica, meu amigo até hoje, e ele vinha aqui e ia para Franca ver as vaquinhas sossegado e não queria crescer. Então eu falei: "Olha, não vai dá para ficar aqui com, ganhando isso aqui." Porque a família tinha aumentado, e eu falei: "Não vai dar." Aí apareceu um convite através da, a minha esposa já trabalhava na Avon, era um marido de uma promotora da Avon, que ele era vice-almirante na Marinha, e ele, a Cida falou com ela, ela falou: "Não, eu vou falar com... Eu não me lembro o nome dele, e ele: "De fato, vai lá, faz uma entrevista comigo no laboratório." Eu passei então a uma multinacional entrando pela mão dele. Ele fez uma entrevista, fui entrevistado por outros, mas logo saiu que ele não era do ramo de Administração, e daí, eu entrei numa multinacional, numa multinacional onde eu aprendi realmente, aprendi muito, aprendi, mas aprendi muito mesmo, eu aprendi, tudo diferente, né, muito organizado, muito, o que era, como é que se administrava um negócio.
P - Qual era a multinacional?
R - Era, era a Vick Farmacêutica, depois ela foi comprada, a Vick Farmacêutica comprou o Laboratórios do Moura Brasil, que até hoje tem o colírio Moura Brasil aí, ainda existente, e depois a Vick e o laboratório Moura e a Vick foram comprados pela Merrell, que era naquela época o maior laboratório dos Estados Unidos. Em todas essas junções aí, mais ou menos uns três anos, é, precisou, a administração foi sendo, foi sendo unificada e eu, e muitos funcionários foram mandados embora. E para gerenciar, eu ia ser gerenciado por um gerente de Porto Alegre no qual eu não tinha, era uma pessoa amoral para mim, era amoral completamente. Eu não aceitei, eu falei: "Não, ele não pode, não pode ser o meu gerente, eu não vou aceitar." Foi um rebu, eu não era um funcionário importante, mas eu era muito querido, primeiro pelo que eu já narrei, depois na convenção de duas semanas mais ou menos que eu estava funcionário da empresa, essa multinacional teve uma convenção de vendas para o lançamento de produto no Rio. Eu era analfabeto em propaganda de pai e mãe, mas me convidaram porque eu devia conhecer a matriz, todo funcionário precisava conhecer a matriz, e eu não, fui, todos eram nível diferente, eu não era gerente ainda, mas eu fui convidado pela diretoria de, e eu fui com o gerente de São Paulo, e lá todo o Brasil lá, lá o presidente, nessa reunião, quer dizer, um lançamento importantíssimo, uma empresa de propaganda das mais famosas daquele tempo lá, ia lançar o produto. Eu sentado, e o pessoal começava a brincar porque eu não falava, eu não entendia, estava há 15 dias atrás na empresa, não conhecia ninguém, fiquei quieto, primeiro dia, segundo dia, oito, dez horas mais ou menos, eu não falava uma palavra, o pessoal de vendas muito extrovertido todos conversando, todos entusiasmados, mas eu olhava para alguma coisa que chamava a atenção: "Mas não está certo." Aquilo eu não sabia bem o que era, mas já no terceiro dia, que era o último dia, na parte da manhã e na parte da tarde ia ter um churrasco, um almoço qualquer e o pessoal ia sair para vender os produtos que eles tinham feito o lançamento, então, mais ou menos próximo do almoço eu falei, levantei a mão: "Eu peço a palavra" Foi uma zoeira só: "Ele fala. Ele fala" Aquela brincadeira toda, eu falei: "Olha, como é que vocês chamam aquele negócio, aquele desenho lá, aquele desenho?" "Ah, logotipo, logotipo." "Está errado, o vértice está voltado para cima quando o da empresa é voltado para baixo."
P - Eu queria só que o senhor me explicasse o logotipo. Era o logotipo da Vick?
R - O logotipo era o da Vick Farmacêutica, o logotipo era um triângulo com o vértice voltado para baixo e a base para cima, em todo, em todos os produtos que estavam lançando, eles tinham feito anúncios em jornais, tudo, revistas, tudo os rótulos, tudo pronto, estocados já, estocaram com rótulos tudo para ser despachado, eles tinham feito o vértice com o triângulo voltado para cima. O logotipo, inverteram o logotipo, e daí foi um silêncio que eu chamo até hoje, foi um silêncio tumular, que eu nunca vi igual. Naquela alegria ficou por alguns minutos um silêncio que, eu falei: "Falei alguma besteira." Um silêncio tumular mesmo. Daí, passado outra vez, um ou dois minutos, um minuto, o presidente da empresa que tinha vindo dos Estados Unidos, aquele, muito arrastado: "Mister Motta, faz favor." Eu pensei comigo: "Pronto, agora ele, ele vai me virar um tapão no ouvido aqui, vai me expulsar." Ele puxou o distintivo de ouro dele que tinha, que era o emblema, o triângulo branco com o vértice voltado para baixo, tirou com o pegador de ouro mesmo e falou: "Olha, isso aqui a gente ganha quando faz 25 anos de empresa, mas você fez por merecer isso garoto." E me pôs o distintivo. Então, com isso eu fiquei muito visado, muito marcado na empresa, por isso que eu ganhei realmente uma notoriedade na empresa, fiz uma carreira rápida lá. O presidente vinha, fazia questão de conversar comigo, eu era um funcionário, um auxiliar de gerente ainda, era auxiliar administrativo nível um, mas eu reportava diretamente a um gerente administrativo, a um gerente de vendas eu reportava, Francesco Coppola, um homem que também me ensinou muito, uma sumidade, falava cinco, seis línguas, era uma sumidade esse camarada, me ensinou muito na vida, eu acho que o único cara que me ensinou na vida foi ele, o resto eu tinha que arrancar, aprender. Aprendi muito no laboratório mas eu é que precisava procurar, alguém me ensinar não, eu tinha que cavar mesmo, e ele me deu, então essa, esses, eu passei uns três anos mais ou menos na Vick, eu marquei muito, quando da minha saída que eu pedi demissão, pois eu não tinha um posto muito importante, mas eu era muito querido na empresa. Era tanto que eu recebi uma carta do presidente da companhia, mister Queen, pedindo que eu retardasse a minha saída por 15 dias até ele ter tempo de chegar aqui no Brasil que ele queria conversar comigo. E ele veio, ele estava na Colômbia, não sei onde ele estava, ele veio para cá e queria saber porque eu ia sair e eu falei porque, eu falei: "Porque o Sandoval não pode ser, ele é amoral, não serve, não vou aceitá-lo como gerente, ele pode ser até profissionalmente um bom profissional mas não aceito, não aceito." Ele insistiu muito comigo: Mas, isso é político, é só por uns tempos, Motta, esse lugar é teu, mister Motta, esse lugar é teu." "Não, eu não vou, eu não vou agüentar esse homem, não pensa que eu quero o lugar dele, Queen, põe outro qualquer no lugar dele, mas põe um camarada, põe um profissional, um camarada íntegro, que eu possa aceitá-lo como chefe." Eu não aceitava, como eu falei, eu não aceitava injustiça, eu era muito, não é que eu era moralista, mas eu era, eu achava que não devia, o homem não devia fazer determinadas coisas, e, e resolvi sair, e saí mesmo, ele pediu para mim que eu ficasse mais uns tempos até arrumar um lugar, agora eu falei: "Fico, mas eu sou empregado da Vick Farmacêutica, eu não vou ser empregado, eu não vou ser registrado com carteira assinada pelo Sandoval, não vou ser." Eu fiquei num andar, alguns meses num andar inteiro sozinho com uma mesa, sozinho, e toda a administração no andar de baixo, por uma questão de, não sei, se ele era louco, amoral, não sei, era, eu era assim e ainda sou assim, eu achava que tinha que ser daquele jeito, e daí ele falou: "Estou liberado, treinei uma pessoa e saí." Saí. Quando eu já saí eu tinha um convite do gerente, um gerente, esse Francesco Coppola tinha sido gerente meu no laboratório e estava trabalhando na Eron, e ele me convidou para ser assistente dele. Aí que eu comecei a minha carreira na Eron, como assistente, aí eu fiquei como assistente dele acho que um ano mais ou menos, ele me ensinou muita coisa até a ação, trabalhava em bolsa, bolsa de ações, que para mim era um bicho de sete cabeças, procurou me instruir. Se eu tivesse seguido o conselho dele talvez eu fosse milionário porque ele era, ele ganhou dinheiro na bolsa, rios de dinheiro, rios de dinheiro, eu, não era meu, eu achava que era um jogo aquilo, não interessava, e ele, eu comecei na Eron. Eu era, sempre eu era muito insatisfeito, eu era, eu queria sempre mais, queria sempre mais trabalho, então eu procurava trabalhar mais, e sempre levantei muito cedo, então quatro e meia, cinco horas eu estava trabalhando porque tinha muito serviço e eu ia, e comecei realmente a me destacar, pelo esforço, trabalho, comecei a destacar. Daí me ofereceram uma gerência que eu recusei porque o Eron, o presidente da empresa me ofereceu a gerência eu recusei porque eu falei: "A gerência é muito pesado, eu não estou preparado para isso, eu vou ser engolido, eu não tenho, eu não estou ainda preparado." Não tecnicamente, eu falei: "E não estou preparado, experiente, eu vou lidar com gente muito mais velha do que eu, muito mais escolada." Mas aí o cara: "Mas o senhor, você pode perder a oportunidade da tua vida." Eu falei: "Não faz mal, eu prefiro perder a oportunidade e esperar." De fato eu esperei mais um ano, depois que ele, aí novamente veio o convite: "Você quer ser gerente da Erontex em São Paulo?" Aí era um cargo maior, eu falei: "Agora quero." Na época eu fui gerente para ser, da administração central que era, porque tinha loja de departamento, loja de tecido, tinha, como é que é? Tinha indústria têxtil em Itaquaquecetuba, fabricava tecido, era um grupo forte, e eu fazia parte da administração desse grupo todo. Me tirou então para ver, e guiava, para dirigir, ser gerente em São Paulo do departamento da Erontex.
P - A Erontex era antiga, de que época?
R - Era antiga, era uma venda domiciliar de porta em porta que vendiam carnê, foi o primeiro carnê que apareceu em São Paulo, baseado mais ou menos no estilo das Cestas Amaral, sabe, Cestas Amaral, que o pessoal pagava para retirar cesta de Natal no fim de ano, não tinha prêmio, não tinha nada. E o Erontex, ele pagava durante 12 meses e no final de 12 meses ele retirava um corte de tecido com dois metros e oitenta, que era para fazer o terno, tradicional terno de dois metros e oitenta, e aí dava prêmio, dava carro, começou o programa de televisão, programa de prêmios, tudo. E São Paulo, para vocês terem uma idéia, em São Paulo era o maior departamento do Brasil, eu tinha 600 vendedores, 600 vendedores, esses vendedores eram divididos em equipes e cada equipe tinha de oito a dez vendedores que saíam nas kombis com roteiro para vender de porta em porta nos bairros, carnê Erontex, e esse departamento é que eu fui para dirigir. Era na, o nosso departamento era na Rua General Jardim. Lá eu realmente montei o departamento, até o desenho do escritório, mesas, divisórias, o depósito de tecidos que ele tinha, o depósito de tecidos ele tinha, abrigava naquela oportunidade perto de oito mil peças de tecidos, porque precisava ter um estoque porque você não sabia a quantidade, sabia mais ou menos a quantidade de carnê, que não tinha computador. Você tinha tudo a mão, tudo era controlado, o pagamento por fichários, picotava com o furador que tem em estrada, estrada de ferro que picotava, aquilo que controlava os pagamentos dos carnês. Então...
P - Seu Motta, e que bairros os vendedores percorriam e quem era a clientela?
R - A clientela era mais classe B e C certo, classe A, aquilo era um, como até hoje, era uma, como se diz, era um, era estigma aquilo, só para classe B e C, e geralmente a compradora era mulher porque quem estava em casa era a mulher e ela comprava muito escondido do marido. Comprava escondido porque o marido era, então ela, quando o marido, chegava no fim do ano ganhava um corte de tecido: "Olha, isso é para fazer um terno." Daí ele gostava, quando ganhava um prêmio, daí ele queria receber o prêmio, aí ele, mas muitos carnês, aí os maridos chegavam a rasgar o carnê quando descobriam que a mulher tinha comprado. A grande compradora era a mulher.
P - E o pagamento dos carnês como é que era feito?
R - Eles eram feitos através de banco e eram feitos nas lojas, no Brasil inteiro tínhamos todas as lojas, principais capitais, né? Então era feito, editoras, as lojas, os bancos, e já naquela oportunidade, vocês vêm hoje que o Sílvio Santos fala: "Paguem o carnê e tal." Eu, naquela oportunidade fui ao governo federal pedir uma autorização, porque os bancos seguravam muito o dinheiro, e às vezes eu não podia vender em determinada cidade do interior ou do Brasil, Brasil afora por quê? Porque nem todos os bancos recebiam o carnê, então, eu via a minha venda limitada, eu queria vender mais ainda. Então eu fui ao governo federal pedir autorização para que os Correios recebessem. Eu estou falando de 25 anos atrás, para o Correio recebesse, mas eles não permitiram que o Correio recebesse, e nem vendesse, eu queria que vendesse o carnê e recebesse o carnê, mas eles não permitiram. Naquela época também o Correio não era privatizado, não era, era só o governo, depois foi, hoje já tem, é, ele é privatizado, hoje os empresários...
p - Franquias, né?
R - É, hoje é um tipo de franquia, não sei se, como é feito isso, eu sei que hoje, sei que existe. Porque tem um colega meu que tem, franquia, franqueado então, né, franchising. Então eles, naquele tempo não, né, então hoje facilitaram muito, então hoje o cara faz isso e hoje está quase sendo uma renda, às vezes até mais superior que até o próprio Correio, está atrapalhando, eu sei que está atrapalhando até o serviço do Correio. Eu próprio vi no interior, andei há pouco tempo, fui no interior, eu queria fazer um correio sedex para São Paulo, eu precisei aguardar uns 20 minutos para ser atendido, porque naqueles 20 minutos ele não selou uma carta nada, ele ficou vendendo telesena, e recebendo e tudo para depois me atender, então o serviço do Correio passou ali a ser secundário.
P - Seu Motta, como é que era o sorteio dos prêmios, como é que fazia isso, essa entrega...
R - O sorteio, eram feitos, a pessoa comprava o carnê e tinha um cupom. Esse cupom ele, quando pagava, era retirado, ele fazia o primeiro pagamento, ele retirava esse pagamento e a gente recolhia ou ele mandava pelo Correio, ele vinha e a gente colocava numa urna. Umas urnas que eram programas ao vivo na televisão, eram urnas, ficaram sendo gigantescas e eu realmente não achava, eu não achava justo que pegasse só determinado, vamos supor, dez, 20 mil cupons para pôr, para sortear, eu queria todos os cupons no palco, mas foi se tornando uma coisa absurda porque era tanto cupom, em torno de milhões, nós tínhamos 12,500 mil clientes no Brasil, em São Paulo, então era uma grande maioria, talvez, quatro, cinco milhões, três milhões, nem sei eu. Era uma urna, que eu me lembro até hoje, ela tinha mais ou menos uns cinco, uns cinco metros de comprimento por um metro e meio de diâmetro, o motor era 12 cavalos para girar aquela urna, tudo cheio de cupom. E aquilo semanalmente a gente precisava mexer com todos aqueles cupons para ver os que já estavam vencidos, né, o carnê tinha 12 meses, aquela urna era virada e as moças, eu não me lembro o nome que se dava naquela época, ao vivo era o programa, retirava nas varas, metiam a mão lá e tirava o cupom. Então a gente chamava o cliente, ia na casa do cliente para saber se o carnê estava em dia, e se o carnê não estava em dia ele não tinha direito, daí ele ia para o programa, ele ao ar no programa, ele ganhava um prêmio só de ter sorteado, ele ganhava um prêmio, televisão, geladeira, liqüidificador, variados prêmios, e daí no programa ele concorria a prêmios, prêmios maiores, carros Galaxie, Simca Chambord, era um carro da época, e aí com, a gente fazia, vários, vários tipos que não fogem, até hoje é, quadros, só que hoje é por computador. Naquele tempo não, era tudo manual, eram, os apresentadores eram o Blota Júnior, o J. Silvestre, o Paulo Autran, Bibi Ferreira chegou a apresentar o nosso programa. Isso foi no sorteio através de quadros, quadros com números, com letras, que letra, e atrás do quadro tinha um prêmio ou então tinha num quadro par, par ele perdia, então ele ia tirando os cartões, ele ia tirando até chegar no simples, tirava o carro levava o carro na hora. Apartamento, casa, a pessoa escolhia a casa, no valor que a gente determinava e fazia o sorteio, isso na televisão e ganhava, tinha um sorteio também pela loteria federal, na última loteria federal de cada mês era sorteado o número e todo carnê que tivesse aquele número, tinha várias séries 99.999 cada série, carnê, tinha a série A, série B, série C e cada, a gente fazia, vamos supor, a gente fazia série, série máxima, aquela série máxima vendia durante meses, a gente vendia 200 mil, 350 mil carnês por mês. Então se vendia duas, três séries num mês, então às vezes, três, quatro vezes a gente mudava de série, trevo da sorte, planos é, como é que é, Erontex nacional, mas eram os nomes que tinham escolhido assim.
P - O pagamento era mensal?
R - Era mensal, mensal, todo mês, 12 meses.
P - Eu queria que o senhor falasse da televisão, que dia que era o programa?
R - O programa ao domingo, o programa era domingo por alguns motivos: primeiro porque era mais barato, o horário era mais barato, e segundo a própria televisão não tinha audiência no domingo de tarde, então havia interesse em saber números de clientes que a Erontex tinha e o próprio Baú da Felicidade também. Então eles tinham interesse em carrear esses clientes para levantar o nível da televisão, o nível não, a audiência, era feita aos domingos por esse motivo, e era a oportunidade de a dona de casa estar mais sossegada, ver o programa, começava geralmente duas horas da tarde, uma da tarde. Eram duas horas, três horas de programa que eles faziam. E tinha sorteios dos mais variados, por exemplo, Erontex bate a sua porta, é o que hoje fazem até hoje caminhões, a Erontex bate a sua porta, a gente ficava uma semana antes anunciando as equipes Erontex, nós vamos fazer um sorteio domingo no bairro tal, na cidade tal, e as equipes iam vender, e no domingo de manhã ia uma pessoa da confiança da gente, batendo nas casas: "Tem carnê Erontex? Não, então a senhora acaba de perder de ser premiada." Quando tinha o carnê, se estava em dia, se estava o carnê em dia, então, aí, ela ganhava um prêmio, ganhava um prêmio então na televisão, mas só que não existia essa, ainda, depois é que veio pegar esses canais retransmissores, canais retransmissores. Ele se comunicava por, pelo telefone: "Estou aqui na cidade tal na rua não, mas quando a cidade era mais distante, na cidade tal, São José do Rio Preto na rua tal, número tanto, fulano de tal ganhou, tem o carnê em dia." Então aparecia o nome, né, a gente fazia uns cartazes aparecia o nome, aquela brincadeira de auditório, dia de domingo, no domingo seguinte o ganhador aparecia no programa para ganhar casa ou apartamento. É como é hoje, só que ela, não tem muita novidade, não se cria muito, não existe realmente, nesse campo não modificou muito é o mesmo, mesmo sistema, só que muito mais moderno hoje, né, com muita mais, mais possibilidade de execução. E dava-se mais prêmios e era um negócio muito sério, que não havia porque não ser honesto, se fosse desonesto era ser burro, que se vendia tanto e se ganhava tanto dinheiro que era uma estupidez, né, deixar de dar o prêmio. O que era um carro? Eu comprava, eu fazia contratos com as empresas e comprava de 15, 20, 30 carros. Galaxie, eu comprava uma dúzia de Galaxie, tinha que comprar uma dúzia de Galaxie, do Zarif, hoje o maior vendedor Ford do Brasil ele é, o Zarif, eu comprava...
R - Desculpe, o senhor tinha o carnê da Erontex?
P - Não, eu não podia ter, não, não podia, nem tinha e nem comprava. Depois a minha esposa depois que eu saí da Erontex ela comprou, mas eu não tinha não, na época nem podia ter, e o funcionário não podia ter o carnê, de jeito nenhum, era proibido, se pegasse o funcionário com o carnê era mandado sumariamente embora, era despedido sumariamente, por motivo de honestidade para não ficar, né, não era permitido não. Existia, às vezes, muitas pessoas que eram mesmo sorteadas e não tinham pago o carnê, então isso aconteceu dezenas de vezes e a pessoa procurar um gerente de banco para, porque como o programa era domingo ou a loteria era sábado e não tinha pago, ele precisava pegar um gerente de banco que carimbasse com a data de sábado ou sexta-feira o carnê dele que ele tinha pago, então existiu muitas. Em Minas, o Vidal, o Vidal que depois, existiu um gerente de um banco, Banco da Lavoura de Minas Gerais tinha um trambicagem, nós pegamos, e assim aconteceu também em São Paulo na Votorantim, na cidade de Votorantim, era uma mulher que ganhou, de Sorocaba, ela deu o carnê para o genro pagar e o genro não pagou e era alto funcionário da receita, chamava-se posto fiscal naquela oportunidade era de Sorocaba, ele era chefe daquela, alto funcionário lá, e não pagou. E ele, e a gente, quando saiu o sorteio tinha, em cada cidade tinha os agentes que eram pessoas nossas, ou eram empregados ou era gente autorizada nossa, procurou, não encontrou, fugiu, telefonou de madrugada: "Motta, três horas da manhã, não encontro lá, sumiu, encontrei a ganhadora, mas o carnê está com o genro, está com o genro dela e ele sumiu." Eu falei: "Tem, tem trambique aí, eu vou para aí." Peguei o carro e fui para lá, e fui amanheci já lá atrás do camarada, e de fato ele estava na casa do gerente e já tinha carimbado o carnê e que os bancos obrigatoriamente não fechavam, às vezes, eles abriam em cidades pequenas, eles abriam às vezes de sábado para receber dos fazendeiros, tudo. E eu fui, fui atrás dele até que eu peguei, mas ele já tinha o carnê carimbado, mas eu apertei o gerente, o gerente falou: "Não." Aí o gerente ficou cheio de medo, aí e eu apertei o camarada e aí ele, foi triste, muito triste, triste porque o camarada confessou e chorava feito, foi obrigado a confessar, eu falei: "Eu sou obrigado a ir na polícia, né?" Ele falou: "Não, não vamos... " Isso aconteceu muitas vezes, muitas vezes por esse Brasil afora.
P - Seu Motta, e o senhor supervisionava também quando os funcionários colocavam as fotos no carro, o que é que o senhor fazia?
R - É, tinha, o programa era ao vivo, quer dizer, então, a gente tinha que fazer tudo na hora, no programa, e nesses quadros que tinham o prêmio a gente tinha que colocar o carro, o carro, no quadro, o par, e onde estava o par, onde estava a geladeira, onde estava a televisão, indicando, e aí não, não estava, não estava, era pessoa de confiança. Então, quem colocava em São Paulo era eu e nas filiais eram o gerente da filial. Mas a gente pegava, eu peguei uma vez aqui no, era Tupi, no Sumaré, o teatro lá era, tinha o quadro, então eles punham um tapume em volta para gente chegar, e chegava lá punha o carro em determinado lugar e ninguém sabia, às vezes nem eu sabia, porque o envelope, misturava o envelope e punha lá, numa hora eu estou lá assim, eu vi, olhando assim eu vi eu vi um brilho assim, eu olhei para cima e peguei a turma lá na treliça, lá em cima acho que uns 20 metros de altura, lá sei eu, com um binóculo ali para ver onde eu ia pôr o prêmio. Então tinha muito desse negócio. Naquela, também na cabine, não troca, quer trocar isso, troca um sapato furado por uma geladeira? A pessoa na cabine não ouvia, né, não ouvia e eu peguei algumas vezes no interior, cidades do interior e fora de São Paulo também o responsável da emissora de televisão ele fazia sinal com a música: "Quando der um toque assim mais forte é para dizer sim, quando der dois toques é para dizer não." Então tinha todas essas maladragens, né?
P - Seu Motta, fala sobre, teve uma gincana em Porto Alegre que a Eron promoveu?
R - Essa foi uma, foi uma, esse trabalho de gincana, é muito difícil isso, formava-se equipes, equipes e determinados, davam determinadas tarefas para as equipes fazer, vai buscar espada, aquela bobagem toda, né? Mas nós, o Walter Foster é que foi como homem de televisão para dirigir essa essa promoção em Porto Alegre, mas quando nós chegamos em Porto Alegre nós sentimos que o clima estava de uma euforia: "Mas isso aqui vai estourar, isso aí vai ter gente, meu Deus do céu." Eu comecei a tomar algumas providências, mas o pessoal não acreditava, eu falava: "Precisa da polícia, precisa pôr policiamento, vai ter muito tráfego." "Mas não, dia de domingo rapaz." Mas no fim ele precisou correr, porque foi um, era equipes de oito, cada equipe para chegar nas tarefas, então ele dava a tarefa e tinha que sair e levar, levar a tarefa, e ela começou a ser feita dentro de um teatro mas o número de pessoas querendo assistir e o balbúrdio era tão grande que fomos obrigados a transferir para uma praça pública isso. E foi realmente, terminou às dez horas da noite mas moveu, mas mexeu com Porto Alegre que foi uma coisa, uma barbaridade, uma barbaridade de promoção, eu acho que foi a maior promoção que fizemos com sucesso que, de vendas e de público, de toda televisão, televisionada aliás, que nós tivemos em Porto Alegre, mas foi muito trabalhosa, muito trabalhosa, para ser, nós pusemos o prefeito, o governador da cidade para eles, não pessoas nossas pegarem o prêmio, né, eles é que examinavam se estava de acordo, nós não entrávamos, entrávamos só com a promoção, mas os fiscais eram o pessoal da cidade, confiança dos homens públicos da cidade, um grande evento esse.
P - Senhor Motta, na época que o senhor estava na Eron como o senhor teve a idéia de fazer o CDI?
R - Fazer?
P - O CDI que vendia.
R - Não, essa idéia não foi minha, essa foi do Eron. O CID, que ainda existe hoje a empresa, CID, vende calçados, vende cama, mesa e banho. O CID nasceu de uma idéia do Eron de fazer as indústrias vender mais barato, diretamente da indústria para o consumidor. Então, ele montou o CID, era Centro, eu não me lembro agora o nome, estava escrito ali, era Centro...
P - Da Indústria...
R - Centro, Indústria, eu me lembro CID, era Centro Industrial de Distribuição, Centro Industrial de Distribuição. Aí então as indústrias punham o seu produto, tecidos, confecções, cama, mesa e banho e era um tipo de banca de feira mesmo, banca assim com um, era um armazém que tinha na rua, na Barra Funda, na Avenida Pacaembu e descendo na São João do lado direito, eu ia falar, lá não é São João é General Olímpio da Silveira, lado direito. Era o galpão, um depósito lá de sacarias, era enorme, devia ter seguramente, devia ter perto de uns 800 a mil metros quadrados, era enorme, então punha banca, um cavalete, negócio de banca, de feira, punha um monte de roupa, não tinha luxo nenhum, mas era barato, e foi um, para esse evento foi convidado alguns ministros, político, foi um grande, uma grande, uma grande promoção em São Paulo e ficou famoso. E foi aí, o Eron conseguiu, começou a pedir para abrir de domingo de tarde o comércio, ele pedia autorização, a autorização davam para ele abrir domingo de tarde, à noite, e não era tempo, fora do Natal, tudo, tal o número de pessoas que ia para comprar, e era barato mesmo, porque a gente não comprava das indústrias, elas davam em consignação para a gente, mas o que se aumentou de produção é um coisa, tão fácil, que diziam onde se produz vende barato e era isso, diretamente da indústria, mesmo, mas lá era diretamente da indústria mesmo, era a fábrica que vendia lá, as indústrias que queriam participar podiam entrar lá.
P - Como é que era a clientela do...
R - Daí era tudo viu? A classe A que ia muito, viu, daí a classe A ia mesmo, viu. Ia a classe A, B e C, ia todo mundo, viu, porque tinha tecido tudo por, as indústrias, Artex, Teka, tudo de cama, mesa e banho estavam tudo lá, e tecido, Santa Branca, Santa Isabel, tudo que era indústria de tecido que ia, confecções, a José Paulino queria ir lá porque sabia que vendia, vendia mesmo. Então lá ia todo mundo, lá ia as madames de carro, carro de motorista, tinha estacionamento, e ele tinha um espírito tão avançado que ele sentiu a necessidade de ter um estacionamento para facilitar o cliente, ele abriu um estacionamento, já tinha um estacionamento, deixou um espaço para a pessoa estacionar, coisa que depois foi uma necessidade do supermercado, a área de estacionamento é maior do que a área de venda, né? Já naquela época não era assim, mas ele fez um estacionamento para carros e tudo. Depois uns tempo eu já tinha saído da empresa e ele vendeu o nome, vendeu o nome do CID, era, o que ele investiu nesse nome, ele só não vendeu o nome da Erontex, o nome Erontex ele tinha registrado em todas e possíveis categorias na carta de patentes, tecido, qualquer coisa e tal está registrado, todo mundo queria o nome Erontex, bolo da felicidade, era um nome que está vendido para o país inteiro, né? Então esse ele não vendeu, era o orgulho dele, não vendeu, teve ofertas, várias, ele não vendeu o nome, acabou com a empresa mas não vendeu. Uns quatro anos depois que eu saí, ele fechou a empresa, foi fechando a empresa, não por minha causa não, foi porque ele não era o homem, ele não soube escolher os homens, né, eu que estava, estava cansado de lutar contra a maré, né, gastar mais do que, de propaganda do que a venda.
P - Ele apostava muito no marketing, né?
R - Ah. Naquele tempo não tinha esse nome de marketing viu? Ainda não tinha esse nome, não era assim. Mas ele era, era um homem de promoção, ele achava que a promoção, que era uma área de marketing que se fala hoje, mas ele achava que a promoção então era um negócio, a propaganda, a promoção, aparecer, então tudo que era oportunidade ele não deixava de aparecer, né, mas isso custava muito dinheiro, né, e ele também tinha muita vontade de aparecer nas colunas sociais, aí é difícil, viu, aí ele não conseguiu. Gastou com colunista social. Ele gastava, todo mês vinham buscar a caixinha deles lá, aparecia em todo que era coluna social mas, podia aparecer na coluna social, mas ir na sociedade ele não conseguia não.
P - Senhor Motta, nessa época todos os funcionários parece que recebiam um corte de tecido, qual era?
R - Não, esse não era os funcionários, era o próprio presidente da empresa que tinha uma, achava que os funcionários tinha que se vestir, os gerentes dele, e ele então dava, como tinha indústria de tecido, cada novo tecido que ele lançava ele, para os gerentes e para a diretoria ele dava todo mês ele dava dois, três, quatro cortes de tecidos. E mandava um alfaiate que já tinha na empresa, mandava o alfaiate lá no escritório tomar a medida da gente, então a gente tinha dois, três ternos, quatro ternos, todo mês. Eu cheguei a ter acho que mais de 120 ternos, não tinha mais onde pôr terno, ele queria que fizesse o terno, eu tinha que pôr os ternos para aparecer na reunião, daí usava o terno uma vez passava cinco, seis, sete, oito meses depois para botar aquele terno, né, ficava com o terno. Então, era um capricho dele, que a gente andava realmente bem vestido. Também pudera: dava o tecido de graça, camisa era fácil comprar, né, a camisa e a gravata, e só se usava camisa e gravata, né, terno completo.
P - Bom, e aí o senhor trabalhou na Erontex até quando?
R - Eu trabalhei na Erontex, eu tinha duas coisas, o dia que eu chegar ao topo de uma empresa, presidente, eu paro de trabalhar, e eu, aí tinha atingido o máximo e depois, desgostoso porque chegava no fim de ano nunca tinha dinheiro para distribuir para a diretoria, para os meus gerentes de prêmio e tudo porque era investido muito em propaganda, e eu, um pouco cansado disso pedi demissão, pedi demissão. Eu fiquei dois anos, ele rasgou umas oito cartas de demissão minha, eu entregava a carta, ele rasgava, eu falava: "Você vai perder tempo porque eu vou entregar outra." Depois até que eu entreguei uma, eu registrei uma carta no cartório, o cartório foi entregar para ele, essa ele não pôde rasgar, essa ele teve que pegar a carta, porque a carta, aí ele pediu que eu ficasse: "Você fica mais seis meses?" Eu falei: "Fico, até o senhor arrumar outro homem e ver, que eu treino outro homem para pôr no meu lugar, substituir, é só treinar outra pessoa e põe, mas eu vou sair." E ele me ofereceu um cheque: "Olha, pega esse cheque." "Não, eu não quero esse cheque, não é por dinheiro, seu Eron, eu saio por princípios." E fui ficando meio assim, ele foi me levando dois anos, daí nos últimos seis meses eu falei: "Dia 15 de agosto." Eu não me lembro de que ano, o ano não, dia 15 eu marquei: "Dia 15 de agosto senhor Eron, daqui a 30 dias eu saio da empresa." Aí ele tratou de arrumar, aí ele escolheu algumas pessoas que não eram bem qualificadas para o trabalho, foram infelizes na forma de remuneração, e começou realmente a empresa, muito dos gerentes, todos os gerentes do Brasil inteiro, eu acho que 90% eram funcionários que eu que tinha levado para gerência, eu tinha treinado, tudo, e eles começaram a sair. Eles queriam fazer, queriam que saísse de uma vez, eu falei: "Não não, não façam isso, a empresa não tem culpa, eles ficam." Aí foi cortando, foi cortando, eles foram saindo, ele foi se desgastando. Aí, então eu saí, saí mas: "Eu vou trabalhar por conta própria, vou fazer assessoria." Então me ofereceram ser sócio de uma indústria de pesca, eu fui lá para o canal da Bertioga fazer sardinha, filés de anchova e sardinha enlatada e por lá fiquei também dois anos, passei de, para um ramo completamente diferente, mas eu sabia administrar, e no meu caso era saber administrar, e o que eu gostava, né? Daí eu fiquei dois anos e pouco, mas também saí e organizei tudo, mas não queriam crescer, eu queria exportar sardinha e a anchova, queriam exportar mas não queriam, era muito trabalho não queriam fazer isso, eu falei: "Eu tenho vontade de crescer." Aí eu saí. E daí realmente eu larguei tudo e comecei a fazer assessoria de empresa, que é o que eu faço até hoje, organizar empresas que estão com problemas de estrutura, quer financeira, quer de pessoas, de, quer funcional, problemas funcionais, tudo...
P - Qualquer tipo de empresa?
R - Ah, qualquer tipo porque eu trabalhei em tantas que eu não tenho coisa, até pouco tempo eu entrei numa, numa aí, numa indústria de laticínios, de muzzarela, de queijo, porque tinha visto isso aí entrei, em Guarulhos. Fiquei lá um ano e pouco para organizar a empresa, eles têm uma indústria lá em Minas, não lembro a cidade, é longe daqui, são 600 quilômetros daqui, uma cidadezinha lá, deve ser muito bonita, me disseram que era muito bonita. Era para eu ir lá mas não tive coragem de ir, e eles tinham venda de atacado aqui e varejo em Guarulhos, firma grande, muito forte, fiquei um ano lá organizando, trabalho de queijo, então a administração ela muda, banco de sangue, como é que se administra sangue? Organizei banco de sangue em hospital.
P - O senhor organizou?
R - Organizei o banco de sangue de São Paulo. Era responsável naquela época, há uns oito anos atrás por cerca de 80% do sangue de São Paulo, não existia ainda os hemocentros que é do governo, não existiam ainda, só eram particulares. E o banco de sangue de São Paulo era responsável por 80% do sangue de São Paulo, foi uma época muito gostosa, eu trabalhei com um nível de pessoal médico, todos os médicos, foi uma época muito gostosa para o banco de sangue, tudo novo para mim, uma vez, quadro triste, de sangue, tudo mais, quadro novo, né, muito interessante, então não tinha, para mim não teve problema de produto. Eu me adapto a qualquer tipo de produto e a facilidade, porque gosto, né, precisa gostar do que faz, gostando é fácil, né?
P - Tem algum ramo que o senhor goste mais de trabalhar dando consultoria?
R - Não, geralmente eu gosto de coisa nova, para mim, sendo novo está bom. Eu nunca administrei esse produto, para mim quanto mais, eu não tenho trabalhado nele, eu gosto mais, apesar da experiência, eu prefiro uma coisa nova para aprender mais, com toda a idade que eu tenho eu gosto de aprender, gosto de ver, produto novo, né? É sempre um novo desafio, é sempre uma coisa nova, quanto mais idade, você precisa mais ter esse desafio porque senão se acabar o desafio e sobrar o quê? A vontade de viver? Então a gente vai perdendo, precisa ter um estímulo, né, a família, os netos, os filhos é um estímulo, é tudo criado. Cada um no seu caminho, então a gente indica os netos, a gente gosta muito, as netas principalmente, a minha netinha, eu sou louco por neta mulher, queria uma filha mulher, Deus não quis, e foi minha mulher, as minhas netas são o meu xodó. Então eu gosto desse desafio precisa alguma coisa na vida para se pegar, então eu gosto de pegar no serviço, gosto de trabalhar em produto. Fui trabalhar em propaganda como eu fiz agora. Fui montar empresa de propaganda e promoção que era coisa nova para mim também, devo agora iniciar uma montagem de uma produtora de vídeo que também, aliás, eu até trabalhei em vídeo, produtora de vídeo eu trabalhei, fiquei um ano também numa produtora de vídeo organizando ela, que é difícil, o pessoal aí, os free-lancers que eles chamam, os câmera-man aí, os diretores de fotografia, diretores, eles são complicado, viu, porque não querem, porque não querem: "Bom, eu preciso, você almoçou, eu preciso de uma nota para te pagar." "Ah não." "Ah, que não?" Quando eu entrei lá até maço de cigarro era vale, então eu cheguei ao cúmulo de numa documentação de caixa em um mês, encontrar dez documentos vales, o resto era papel, mas qualquer papel, papel higiênico eu não encontrei, mas tudo que era papel, maço de cigarro, pacotes de cigarro, vale, almoço, gasolina, mas nem de gasolina pediam nota entendeu? Era um troço, até pôr na cabeça desse pessoal que é necessário, foi muito gratificante porque depois eles viram, eles começaram a ver depois de uns meses que todos esses benefícios revertiam para eles bem, eles deixavam de receber, o dono da empresa ficava enroscado que prometia pagamento e não podia pagar porque faltava documentos, não avisava ao Contas a Pagar que tinha que emitir o cheque, e com a organização eu comecei a falar: "Vocês entregam uma nota para mim cinco dias depois vocês podem receber, senão estiver pronto vocês me avisam, porque alguém vai, eu corto a cabeça dele." Aí começou realmente o pessoal chegar lá e "tum", quinto dia estava o cheque pronto, aí eles começaram a ver que realmente estava revertendo aquela, toda aquela minha, a minha ranhetice, vamos chamar assim, estava revertendo em benefício deles, né?
P - Seu Motta, o senhor assim com tantas experiências diferentes, o que é que o senhor acha que mais modificou no comércio nesses anos todos até hoje?
R - Sem dúvida nenhuma a propaganda, né, principalmente televisão, e a evolução que teve o próprio, o próprio empresário de criar, desses, criar promoções, criar prêmios, criar estímulos para se vender, naquele tempo era tudo, nem se fazia isso, hoje se faz. Então eu acho que mudou muito foi isso, mudou muito foi isso, e o próprio, e o balconista também, o balconista daquela época, ele era treinado, era treinado, mas treinado mesmo, ai daquele balconista, que a Rua Direita era esculhambada que não tivesse, não cumprimentasse o cliente e não forçasse a venda. Ele era treinado, ele era treinado rigorosamente para atender a clientela, hoje é tão grande acho que a necessidade de balconista que não há tempo para isso, cresceu tanto a cidade que não há tempo. Então hoje você encontra muito balconista bom, encontra, mas encontra muita, muito mal atendimento. Então o atendimento de uma certa maneira eu acho que não é tão atencioso, tão delicado como era naquele tempo, mas realmente o que mudou para mim foi, substancialmente, foi a promoção e propaganda que, que mudou, os meios de comunicações deram uma evolução para o comércio, para todo o ramo de negócio, comércio também, muito grande.
P - Seu Motta, e assim, o que é que o senhor mais gosta de comprar, assim, como cliente, o que é que o senhor mais gosta de comprar?
R - Ah, eu sou comprador de tudo, mas o que eu mais gosto de comprar é roupas para mulher. Eu, quando noivo, quando fiquei noivo, durante talvez uns 40 anos, noivo, casamento e tudo, eu, minha mulher nunca mais comprou nada para ela. Eu comprava tudo, eu trabalhava em loja de departamento, tinha facilidade e vivia no centro, tinha muito comprador, trazia novidade, então eu acho que eu fiquei um, eu fiquei uns dez anos, acho que todo dia eu levava um presente para minha mulher, todo dia, eu me lembro até hoje, quando eu entrei na loja Cisne que era na Praça do Patriarca, se existe hoje eu não sei ainda, eu entrei lá e estou falando mais ou menos de uns 30 anos atrás, eu entrei na Cisne e falei: "Eu quero comprar calça." A moça olhou para mim: "Mas aqui só vende roupa de mulher." Mas calcinha para mulher, a moça fugiu da minha frente. Precisou vir uma senhora que devia ser a gerente chegar: "Pois não." Eu falei: "Eu quero comprar calcinha para a minha mulher. "Qual é o tamanho?" Naquele tempo não era médio, grande. Porque não era lycra, era de seda ou era de, eu falei: "É 36, 38." Ela mostrava: "Então eu vou levar esse sutiã, esse aqui, quero esse aqui." Combinação entendeu, então eu comprava até isso, comprava e levava para ela, e gostava, saía mais louco para comprar coisa, eu era um inveterado. Ela depois de casado, noivo conversava com ela e ela ficava, ela chegava a chorar na loja, porque eu não, eu chego numa loja até hoje eu gosto, eu vejo aquilo é aquilo: "Qual é?" "É aquele que eu quero. "Quanto é?" "Tanto." Eu não posso pagar. Mas se eu posso pagar aquilo, se também não é aquilo eu não levo outro, não adianta, aquele que eu gostei é aquele que eu levo, e muitas vezes, há pouco tempo atrás, entrei na loja no Shopping Ibirapuera, ela foi comprar uma bolsa, eu falei: "Deixa que eu escolho." Eu fui na Corello e ela queria a bolsinha eu vi, eu falei: "Não, aquela bolsa branca, aquela é bonita." Eu falei então, agora, aquela, a hora que ela perguntou o preço, a moça falou, eu não me lembro quanto, mas era um preço caro, assustador, ela jogou a bolsa em cima da balconista e saiu chorando da loja, eu fiquei na loja, peguei a bolsa, comprei a bolsa, embrulhei, tudo, quando a encontrei, ela no corredor chorando, mas chorando de soluçar. "Ah, mas por que Cecília?" "Essa bolsa não, comprar essa cor, imagina que preço." Então eu realmente sou um grande comprador principalmente para roupa de mulher eu gosto demais de comprar roupa de mulher, vestido, tecido, então, era louco para tecido, né, confecção eu comprava e tinha um bom gosto, ela sabe disso que eu tinha muito bom gosto.
P - Seu Motta, tinha alguma coisa que o senhor não gostasse ou não gosta de comprar?
R - Ah, supermercado, quer me, quer esculhambar com a minha vida, vai comprar em supermercado, aí acabou comigo, viu? No começo ainda eu ia porque era rápido, era fácil comprar, não tinha muita gente, não tinha fila, mas agora já não, eu não, é muito, mas é muito, e não é só cansativo como é cacete certo. Agora se eu entrar e for pondo no carrinho o que me dá vontade daí eu gosto, mas comprar para minha mulher não dá, ela começa olhar preço e marca e olhar, daí não dá não, então eu, hoje só vou ao supermercado por causa da saúde dela que também não pode e eu compro, às vezes para três, quatro meses e se o dinheiro dá, eu compro para três, quatro meses, para voltar, pôr em casa e ficar sossegado, né, para não ter que voltar no supermercado. Feira, feira então, nem por decreto, viu?
P - Não gosta de feira?
R - O medo meu era isso, quando eu me aposentasse amigo meu me dizia: "Olha Motta, você vai se aposentar, você não quer mais trabalhar conosco, mas não vai fazer a feira, hein?" Eu falei: "Ah, mas não vou mesmo rapaz, não vou porque não gosto, não tolero feira." Apesar de ter ido algumas vezes com ela, por ser obrigado, por não estar bem de saúde eu vou, mas não tolero viu, eêa, eu saio da feira que, azucrinado.
P - Seu Motta, e como é que o dia-a-dia do senhor hoje? O senhor continua trabalhando em casa?
R - Eu faço, ou eu faço assessoria, 90% do trabalho eu faço em casa, os mapas e controle eu trago para casa, eu examino, dou novas idéias de organizações, faço. Dou uma olhada, uma vez por semana ou vou nas empresas, dou uma olhada, geralmente vou de madrugada, quatro, cinco horas para a empresa também porque duas, três horas eu paro para não pegar trânsito, mas eu faço mais serviço em casa, o meu dia de trabalho. Agora diversão é andar no parque, eu vou andar, nadar, eu gosto muito de nadar, apesar de gordo e tudo, eu ainda nado muito, gosto de nadar, nado bem ainda, e as minhas netinhas, como eu disse, a minha netinha Taís e a Nayara, que são as duas, as duas rainhas da minha vida, são as mulheres da minha vida, já que sou casado há quarenta e tantos anos e nem sei, já perdi a conta, viu, 45, 47 E ler, gravar vídeo, sou, sou vidrado em gravar vídeo, orquestra sinfônica, jogo, esporte, gosto de gravar filme, esporte e música, o resto não. Não gosto de programa, programa de auditório, isso eu não consigo ver.
P - Seu Motta, para gente ir terminando a entrevista, o que é que o senhor, o senhor mudaria alguma coisa na sua trajetória de vida? O que seria?
R - E, eu tenho pensado realmente com 70 anos, por que eu não fiquei rico, trabalhando tanto quanto eu trabalhei? Pode ter gente que trabalhou igual a mim mas mais eu duvido, mas eu duvido mesmo. Eu trabalhei sempre, um mínimo de 12 horas porque os primeiros chefes que eu tive falavam para mim: "A nossa obrigação nós já fizemos, trabalhamos dez horas, agora quem quiser trabalhar mais pode." Então comecei assim, então eu sempre trabalhei, a minha média horária era 14 horas por dia, então eu me pergunto: "Puxa vida, eu acho que eu errei em alguma coisa." Eu, alguns meses atrás eu falei com os meus filhos: "Olha meus filhos..." Num dos jantares que fizeram em casa eu falei: "Olha meus filhos, eu não sei se é hoje, se eu tivesse que voltar atrás não mudaria a minha vida, eu não sei se, ser tão honesto como eu fui, ser tão "caxias", eu não paguei um prêmio muito alto." Mas depois eu refletindo eu falei: "Não, eu podia até ganhar dinheiro sendo desonesto, não precisava ser desonesto, sendo um pouco maleável." Algumas empresas que falavam vamos fazer esse negócio sem nota. Eu não, já estou saindo, já estou saindo da empresa. Reinaldo de Lima, já estou saindo Reinaldo, aqui é com nota, tudo com nota, compra com nota, tudo com nota, é princípio de vida." Então, eu podia ser um pouco maleável, talvez tivesse enriquecido, mas, realmente eu acho que é uma coisa que vem de infância, é um negócio que vem por dentro, é uma escola em que você aprendeu, mais da mãe do que do pai. Eu acredito que a mãe é que traça, para mim, o caráter da criança, eu acho que infelizmente eu não mudaria, viu, porque eu construí uma família. Riqueza eu não tenho, mas tenho uma família, tenho quatro filhos que realmente são homens, que casaram, as mulheres às vezes não se dão, mas eles se reúnem, se reúnem desde que eram solteiros, se reúnem uma vez por mês os quatro, num jantar, num coquetel para trocar idéia entre eles, problemas que possam haver entre eles. Eles hoje estão com 40 e, o mais velho com 44 anos, o mais novo com 32, eles se reúnem os quatro, uma vez por mês ou num restaurante ou no escritório deles, ou no apartamento, na casa deles é difícil, sempre fora, as mulheres não participam dessa reunião, e nem pai nem mãe, nem sei o que tratam, eu sei que um troca idéia com o outro: "Eu tenho um problema assim." E um ajuda o outro, então isso é muito gostoso, é muito gratificante ter quatro filhos desse quilate. Então eu, eu acho que dificilmente eu acho que mudaria, sabe, eu sou gratificado com isso.
P - O que é que o senhor gostaria de realizar ainda? Qual o sonho do senhor?
R - Bom, o sonho que eu não realizei, não caberia a mim, caberia a Deus, ter uma filha mulher não tive, e o outro seria ter uma casa de campo e uma casa de praia, ou de campo ou de praia, se os dois também possível, e isso aí eu fui incentivado por um diretor de empresa que perguntou para mim: "O que você gostaria de ter na vida." Eu falei: "Eu quero ter uma casa ou no campo ou na praia." "E os dois?" "Se for possível os dois." Ele respondeu: "Você compra o terreno, que o resto eu faço." E eu comprei o terreno, comprei um terreno em Campos do Jordão, três mil e seiscentos e poucos metros num pico, num morro, uma coisa fabulosa, levei anos indo de madrugada sentado vendo o amanhecer, entardecer, comprei e, comprei um terreno também em Suarão, perto de Itanhaém, eram duas ruas tinha 100 de frente por 50 de, 100 de fundo por 50 de frente, fiz até projeto da casa. O melhor projetista de casa fez isso aí, eu paguei 20 mil, 20 mil cruzeiros por projeto. Isso eu estou lhe falando também não, eu acho que uns 25 anos, estava na Eron, eu comprei mas não veio o resto, esse realmente foi uma, foi uma desilusão na minha vida, e eu não consegui construir. Então eu não, não, depois acabei vendendo para investir na educação dos meus filhos, mandei eles estudar no exterior, eles foram estudar no exterior, Estados Unidos, Alemanha. Eu investi tudo, vendia, e investi nos meus filhos, mandei todos eles estudarem e se formarem bons profissionais, então realmente essa foi uma coisa que gostaria de ter realizado, mas agora meus filhos vão completar isso para mim, vão comprar, eu vou para o interior ou vou para a praia.
P - Seu Motta, e para terminar eu gostaria que o senhor falasse assim, o que o senhor achou de ter passado essa hora com a gente, registrando a sua experiência de vida, deixando...
R - Olha, para mim, eu realmente eu peço desculpas, porque eu não sabia que era fazer uma tomada externa, quando eu liguei lá. É porque eu não saio de casa, não saio. Saio de casa para ir na firma, da firma eu volto e só, não vou batizado, casamento, não vou, não saio de casa, então eu falei: "Fazer a entrevista em casa, eles são mais jovens venham aqui, eu faço a entrevista quantas horas quiserem." Mas eu não esperava que tinha que fazer essa tomada externa, então eu aproveito para pedir desculpa à equipe e agradecer. Eu hoje estava muito triste, amanheci tão triste, mas depois umas dez, 11 horas eu falei até para Ci: Ci, não dá para cancelar essa entrevista? Eu não estou bem hoje, eu não estou disposto." Eu falei: "Vou tomar um comprimido que eu tomo à noite, vou tomar até, não estou, eu estou triste." E você vê que eu não estou assim agora, então, maior do que o meu próprio semblante, diz da alegria de estar conversando com vocês, eu gosto muito de moças, de mocidade, eu gosto de conversar com gente moça, então, realmente é gratificante, se sai ou não sai no Museu eu não estou nem importando, não é que eu não dou importância ao Museu, dou. Mas eu, para mim isso aqui já é gratificante, eu ter transmitido a vocês toda uma vida de trabalho, de um trabalho gostoso, feito com satisfação, de problemas que tem sempre, já para mim é o bastante, viu, nem que não saia nada para mim só o contato, esse convívio com vocês foi muito gratificante, muito gratificante mesmo. Hoje eu estou satisfeito, de uma tristeza eu vinha, fiquei numa alegria muito grande, não me apareceu não, em ter esse contato com vocês viu? E a Márcia, através da Márcia ter proporcionado esse trabalho maravilhoso, o rapaz ali ficou sentado mais de uma hora tentando a luz que apaga a luz, que acende e nunca sei lá, uma paciência de Jó, eu sou, a todos vocês eu é que agradeço, agradeço sinceramente. É muito gostoso, é muito gostoso, tomara esse trabalho frutifique porque outras pessoas poderão ter essa alegria que eu estou sentindo hoje certo, é uma satisfação muito grande.
P - Nós é que agradecemos.
R - (choro) Eu sou muito emotivo.
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