Memórias do Comércio da Zona Cerealista
Depoimento de Vitor Angelo Luchetti
Entrevistado por Lucas Torigoe e Felipe Rocha
São Paulo, 11/04/2016
Realização Museu da Pessoa
MCZC_HV08_ Vitor Angelo Luchetti
Transcrito por Mariana Wolff
MW Transcrições
P/1 – Seu Vitor, fala pra mim o seu nome completo, o local e data de nascimento.
R – Vitor Angelo Luchetti, nasci na rua Benjamim de Oliveira, 270, Brás.
P/1 – Você nasceu em casa?
R – Os nove irmãos nasceram em casa, quando eu nasci, a parteira falou para o meu pai: “É homem”.
P/1 – Qual que é o nome do seu pai?
R – Carlos Luchetti.
P/1 – Ele nasceu quando e onde?
R – Meu pai nasceu no dia 13 de… dia de Santo Antônio é 13 de julho, né? Treze de julho de 1897 em São Joaquim da Barra, aliás em Pirassununga.
P/1 – Interior?
R – É. Foi criado em São Joaquim da Barra.
P/1 – Entendi. E a sua mãe, qual que é o nome dela?
R – Minha mãe é Olímpia Mortolussi Luchetti, nasceu em Veneza, na Itália.
P/1 – E como é que eles se conheceram?
R – Se conheceram que meu avô veio pra cá, né, veio para São Joaquim da Barra e se conheceram lá e casaram, acho que até fugiram, não sei…
P/1 – Por quê que você acha que fugiu?
R – Porque meu pai na época era considerado boêmio, né? Meu pai e o pai do Rolando Boldrin eram carne e unha, os maiores bailarinos de São Joaquim da Barra. Minha avó não gostava do meu pai.
P/1 – E a família do seu pai é de origem italiana, né?
R – Meu pai, é. Você quer saber outra que eu vou te falar?
P/1 – Conta.
R – O Papa Montini era primo do meu pai, primo irmão.
P/1 – Papa Montini? Quem que é ele?
R – Eu não me lembro o nome que deram, ele tinha outro nome, mas não lembro o nome. Era primo irmão do meu pai, saiu a reportagem até no jornal de São José do Rio Preto. Mas falaram da minha tia, irmã do meu pai.
P/1 – Entendi. E o quê que ele fazia?
R – Quem?
P/1 – Esse Papa?
R – Foi um dos melhores Papas que teve.
P/1 – Ah é?
R – Não igual a esse aí. Esse aí tá sendo bom. Que mais?
P/1 – Mas a sua família por parte de pai veio da Itália quando foi, você sabe? Por quê que veio?
R – Chegaram acho que no século 18. Meu pai era do século 18, 1897.
P/1 – Entendi e eles vieram de lá para fazer o quê?
R – Agora, quando o meu avô veio, pai do meu pai, eu não sei. O pai da minha mãe eu sei que ele veio lá por 1911, 1912, por aí.
P/1 – Todos da região de Veneza?
R – Isso.
P/1 – Por quê que eles vieram para o Brasil? Você sabe o quê que aconteceu?
R – Não sei. Os pais, antigamente, eram mais fechados.
P/1 – Não falavam nada, né? Entendi. Aí, eles se conheceram, os seus pais e como é que era São Joaquim da Barra?
R – São Joaquim da Barra é uma das cidades mais atrasadas do interior.
P/1 – Como é que e lá?
R – Tem o coreto, tem o lugar, tem a praça, mas eles não querem crescer, é que nem mineiro. Mineiro não quer crescer. Quer ficar só naquilo lá.
P/1 – E eles se casaram lá e vieram para São Paulo? Como é que foi?
R – Eles fugiram. Vieram casar em São Paulo. meu pai e minha mãe. Tiveram nove filhos.
P/1 – Tudo aqui no Brás?
R – Tudo na rua Benjamim.
P/1 – Que é essa que a gente tá, né?
R – É. Onde nasceu a mãe do Luiz, pegado, nasceram os meus três irmãos mais velhos.
P/1 – E como é você nessa escadinha, você é o do meio, mais velho, mais novo?
R – Eu sou o sexto.
P/1 – E seus irmãos, como são, mulheres?
R – Tinham cinco irmãs, morreram três, morreu um irmão.
P/1 – Hoje? Ou morreram na época?
R – Já morreram faz tempo, faz uns par de anos. A minha irmã mais velha, se tivesse viva hoje, teria 91 ou 92 anos.
P/1 – E como é que era? O pessoal nascia em casa? Fazia o parto em casa, é isso?
R – Era tudo em casa. Não tinha hospital.
P/1 – Como é que era a sua casa aqui na Benjamim?
R – Minha casa? Minha casa era uma casa simples. Tinha o salão de barbeiro do meu pai na frente e tinham dois quartos, três quartos tinham. Em um dormia minhas irmãs, no outro, dormia a gente e no outro, dormiam meu pai e minha mãe.
P/1 – E ficava no fundo da barbearia, então?
R – Isso, para trás. Primeira coisa que tinha, tinha o quarto, depois tinha a sala e no fundo, tinham mais dois quartos. Um meu pai que construiu.
P/1 – O seu pai, desde cedo, ele era barbeiro?
R – Meu pai carpiu o café com sete, oito anos, depois foi ser barbeiro. Meu pai era um barbeiro fino.
P/1 – Ah é?
R – Meu pai atendia a elite, ele tinha o salão aí na rua Benjamim.
P/1 – E quem que ele atendia lá que você se lembra?
R – Se eu não me engano, o avô daquele advogado que aparece na Cultura, o Dante Delmanto. E tinha gente importante que vinha com o meu pai, mas eu não lembro. Só lembro que o meu pai falava muito do Dante Delmanto, que era uma pessoa maravilhosa.
P/1 – Você cresceu na barbearia do seu pai, então, né?
R – Praticamente, até os sete anos, eu vivi na rua, né? Com sete anos, eu fui trabalhar, já.
P/1 – Mas como é que foi esse tempo na rua aí, que você falou?
R – Ah meu, só brincadeira. Jogar bola de borracha, bola de meia, bola de pano. Aí apareceu a bola de câmara, né, a gente brincava na rua e às vezes, o bigolin saía para fora, a gente tinha que parar o jogo para colocar o bigolin para dentro.
P/1 – Vocês jogavam onde bola, aqui?
R – Eu joguei… eu fui varzeano, joguei em São Vito, União do Brás, Santa Terezinha, Boca Junior, modéstia a parte, dizem que eu era bom, agora, não sei. Não posso falar nada, se eu falar…
P/1 – Você jogava em que posição, geralmente?
R – Quarto zagueiro ou lateral esquerdo.
P/1 – E você tinha algum ídolo assim, nessa época, que…?
R – O maior ídolo que eu tinha chamava-se Luís Trochillo.
P/1 – Jogava onde, ele?
R – No Corinthians, Luisinho, um dos maiores jogadores que eu vi jogar. Agora, tinha o Garrincha e o Pelé, o resto…
P/1 – O quê que tinha no Luisinho que você gostava tanto?
R – Que ele era corintiano.
P/1 – Só isso?
R – Não. Jogava muito, era corintiano e tinha amor pelo clube.
P/1 – Entendi. Agora, você jogava na rua também aqui?
R – Na rua não. Na rua quando era pequeno, depois, em várzea, em campo. Uma vez ou outra, a gente arrumava na rua Jaguari, mas poucas vezes, a maioria era na várzea, mesmo.
P/1 – Como é que era a rua quando você era criança? Como é que era essa rua?
R – Aqui? Eu lembro… eu vou explicar. Eu nasci na época em 36, né, em 39, estourou a Guerra e como começou a faltar pão, leite, açúcar, farinha, essas coisas, a gente tinha que correr atrás porque nós éramos em seis irmãos, né, eu era o pequeno, o mais novo. O meu pai me acordava às duas horas da manhã e eu ia com ele nas filas das padarias, das mercearias para comprar tudo racionado, farinha, açúcar, tudo racionado. Não era a criança que é hoje, que a criança que nasce hoje já nasce falando, né, eu acho que eu abri os olhos depois de um ano. Eu era meio bobão, né, três ano, o que vai fazer? Então, é isso aí.
P/1 – Como é que foi na Guerra, você se lembra como é que era?
R – A Guerra, tinha dia que tinha o __00:09:50___ durante o dia, tinha que fechar tudo, fechar as portas. Sae tivesse na rua, você tinha que se deitar no chão.
P/1 – Sério?
R – É. E antes, teve a revolução do Prudente de Moraes, né, e o meu pai, acho que em… não sei em que ano, eu sei que ele teve que ir rastejando da rua Benjamim até a estação da Luz para pegar o trem para ir para São Joaquim da Barra. Rastejando.
P/1 – Por medo do quê? De bomba?
R – É.
P/1 – Eles chegaram em que ano aqui no Brás? Desculpa.
R – Quem?
P/1 – Seus pais?
R – Meu pai é brasileiro. Minha mãe não sei…
P/1 – Não, não, no Brás, eu digo. Em que ano eles chegaram no bairro do Brás? Você lembra?
R – Acho que o meu pai deve ter vindo para cá na faixa de 21 a 22 ou 1923.
P/1 – Entendi. O quê que ele contou para você de como que era assim?
R – Ele não falava nada. O meu pai, quando ele conversava com a minha mãe, eles conversavam em dialeto veneto, é o dialeto mais difícil italiano. Eu não entendia nada.
P/1 – Com vocês ele conversava pouco?
R – Comigo, ele chegava, dava conselho. Aí um dia, ele chegou pra mim, eu tinha dez anos, ele me pôs a mão no ombro e falou… eu tava aprendendo já a profissão, ele falou: “Filho, eu vou falar uma coisa pra você uma vez só, não vou falar mais. Presta atenção. Jogador, politico e ladrão não têm vergonha na cara, mas se você um dia tiver que confiar em alguém, você confia no jogador e no ladrão”. Eu tinha dez anos. Isso faz 70 anos.
P/1 – O senhor se lembra até hoje disso?
R – Não esqueço. O que ele falou é verdade. E o meu pai não era estudado, não, meu pai era… não teve estudo, não. Ele aprendeu com a vida. Meu pai sempre foi um homem bom, trabalhador, nunca deixou faltar nada para os filhos. Agora tem uma coisa, né, na época da Guerra, quando tinha a Guerra, não tinham frutas, não era qualquer um que podia comprar. A nossa sobremesa quando tinha o Natal, era paçoca, minha mãe mandava eu comprar o amendoim, a gente abria o amendoim, ela fazia paçoca. Ela botava o amendoim num guardanapo, batia com o martelo e punha um pouquinho de açúcar, era a nossa sobremesa.
P/1 – Nossa!
R – E tem mais. Na época que eu fui no grupo, não tinha merenda, não.
P/1 – No grupo escola?
R – É. Não tinha merenda, não. Se quisesse, tinha que levar de casa e não era qualquer um que podia levar.
P/1 – Era bem difícil, então?
R – Era bem difícil. Agora, isso aí é um barato, isso aí é um negócio gozado. Tinha um senhor no grupo que vendia amendoim. Quando ele não fazia o amendoim doce, o amendoim normal, né, se comprava uma canequinha, custava um tostão, se você encontrasse um amendoim com cinco grãos, ele dava mais, quando ele não tinha o amendoim de casca, ele botava num saquinho e tinha… botava uns prêmios dentro, entendeu? Se você abria e tinha um papelzinho, você pegava outro (risos).
P/1 – E você pegava muito?
R – Uma vez eu ganhei. Agora, várias vezes, o amendoim de cinco grãos, eu… porque você pode procurar amendoim de cinco grãos que você não vai achar não, é difícil, viu? (risos).
P/1 – Era difícil, mas você brincava bastante, né?
R – Na rua, toda noite
P/1 –Toda noite?
R – Na rua, toda noite a gente brincava. Na rua, porque na época, não tinham os carros que tem agora. E os carros naquela época de quando eu era pequeno, era tudo na base de gasogênio.
P/1 – Gasogênio?
R – Eram dois tambores desse tamanho assim, que ficavam na bunda do carro, atrás.
P/1 – E aqui não passava caminhão, não, nessa época?
R – Passava bonde. O bonde virava aí na rua do Lucas, descia a Paula Souza, entrava na Benjamim e virava a rua do Lucas.
P/1 – Você se lembra bastante dele?
R – Não. Não, porque parece que quando eu tinha dois anos, parece que tiraram.
P/1 – Mas aqui não tinha carroça? O quê que tinha?
R – Carroça! Carroça era uma atrás da outra, só carroça com cavalo. Tinha as carroças do Matarazzo, os cavalos que puxavam as carroças dele deviam pesar na faixa de uns 800 quilos, cada um, aqueles cavaloes grandes, as patas deles eram…
P/1 – Você achava bonito?
R – É, a gente achava bonito, vai fazer o quê? Era novidade. Naquela época, não tinha as novidades que tem hoje, não. Hoje, é tudo fácil. Outra coisa, essa gripe que tea dando agora aí, como é que é?
P/1 – H1N1.
R – É fichinha perto da gripe espanhola que deu aqui.
P/1 – Ah é?
R – É. Na gripe espanhola, os caras morriam, os caras jogavam em cima da carroça para levar para enterrar.
P/2 – Onde enterravam?
R – Onde enterravam eu não sei, mas eu sei que o meu pai contava que jogavam uns cinco em ciam da carroça. Morria gente adoidado com aquela gripe espanhola, lá. O quê que você espera do Brasil? O Oswaldo Cruz, há 105 anos atrás, acabou com a dengue. Hoje, os caras aí não conseguem acabar, fazer o que, né? Aparece de tudo aqui.
P/1 – Agora, como que era o Brás no todo aqui, nessa época, assim?
R – O Brás era paz e harmonia. De vez em quando, acontecia uma briga e quando acontecia uma briga, aquela montoeira de gente (risos), mas muito difícil A gente se dava bem, tinha amizade, um gostava do outro que nem irmão, uma beleza. O Brás era uma beleza. A rua Benjamim era uma rua maravilhosa. Tinha espanhol, italiano, português, depois, começou a vir japonês. A gente se dava tudo bem, não tinha problema nenhum.
P/1 – Que outras ruas que tem aqui?
R – Tinha a rua do Lucas, rua Assunção, Monsenhor Andrade, Correia de Andrade, tinham umas vilas, travessa Lameirão também é muito antiga, esse shopping que tem aí… o shopping do japonês, shopping das madeiras que fala, era do Matarazzo. O nome da firma era Maria Ângela. E o Matarazzo foi um homem que eu acho que no Brasil, não apareceu igual. Se você não soubesse fazer nada e ia pedir emprego para ele, ele te dava o emprego: “Quer trabalhar?” “Quero” “Então, tudo bem, pode vim”. E teve muita gente que se beneficiou dele, do que ele fez. É um homem… você sabe que chegaram para ele, eu soube disso, o cara quis fazer propaganda da firma dele e ele falou para o cara assim: “A minha firma não precisa de propaganda, tem o meu nome”.
P/1 – Só isso? Que mais que ele tinha aqui no Brás?
R – Xi… o Matarazzo era para ser um dos homens mais ricos do Brasil, a família. Tinha prédios, você conhece a Monsenhor Andrade, esquina com a coisa? Aquilo era tudo dele, aquilo lá. Na rua Eurípedes, era quase tudo dele. As propriedades eram tudo dele.
P/1 – Mas o quê que ele fazia lá? Tinha indústria, tinha o quê?
R – De tudo. Óleo, farinha, macarrão, Petybon… e ainda tem Petybon, não tem?
P/1 – Você chegou a ver ele algum dia? O seu pai falou dele, assim?
R – Não. Ele vinha de domingo de manhã na Maria Ângela e o avô de uma moça que eu fui inquilino ia abrir a porta da Maria Ângela para ele olhar, de domingo de manhã, mas nunca vi ele. Nem filho, ninguém.
P/1 – Você já me contou que tinha o sino dos moinhos, né?
R – Não, tinha a sirene, né, que tocava às onze e meia, tocava de manhã, às onze e meia para turma sair e acho que meio-dia e meia, uma hora para a turma voltar para trabalhar. E depois, acho que tinha de tarde, também, só que eu não lembro a hora.
P/1 – Como é que era essa sirene? Tocava e…?
R – Tocava. A gente ouvia tudo. Dava para ouvir tranquilamente. Agora, já não dava para ouvir muito, porque tô meio surdo…
P/1 – E como é que era a Zona Cerealista nessa época? Você se lembra?
R – Teve uma época que tinham poucos armazéns, depois que começou a vir o feijão, na esquina da rua do Lucas até a rua Santa Rosa, eu calculo que tinham mais de 200 chapas carregando sacos lá. Era saco de feijão que entrava e saía ali, não parava. E na rua Santa Rosa tinha arroz também, feijão, tinha o Nestor Pereira que vendia de tudo. O que eu lembro é isso aí.
P/1 – E a carga vinha como?
R – De caminhão. A rua Benjamim ficava inteirinha cheia de caminhão descarregando e carregando. Isso aqui é proveniente dos carros que paravam na porta do salão que eu trabalhava, que tinha gente que deixava o motor ligado e aquela fumaça fedida e aquele boom, isso aconteceu comigo e os meus dois irmãos têm problema de audição tudo por causa da poluição sonora.
P/1 – Nossa. Era alto mesmo, então, o barulho?
R – É. Incomodava e muito e se você fosse reclamar, tinha que sair briga.
P/1 – Você falou que saía briga no Brás, né?
R – De vez em quando tinham umas brigas.
P/1 – Você lembra de alguma que marcou assim, que foi grande, assim?
R – Eu vou contar uma aí, mas eu não sei se vai valer a pena.
P/1 – Conta pra gente.
R – Tem um chapa, ele passou a mão numa mulher aí, ele tava carregando, descarregando, a hora que ela passou, ele passou a mão nela. Aí, eu vi a mulher atravessar a rua, ir na farmácia e ela voltou. Aí ela ficou na porta do salão. Eu vi depois, né, ela botou a gilete aqui, a hora que o cara foi jogar o saco, ela… a hora que ela viu aquilo, aquele negócio branco que saiu de sangue… aí, ela apanhou de pau aí. Briga mesmo entre o pessoal daqui, não tinha. Não tinha briga. O resto era essas coisas…
P/2 – Você falou dessa diversidade que tinha aqui de italianos, espanhol…
R – Tinha.
P/2 – Eles eram todos comerciantes? O quê que era?
R – Olha, é gozado isso. Os italianos tinha uns que trabalhavam numa coisa, mas os espanhóis eram tudo com sacaria, saco de… ficaram tudo bem de vida com isso, todos. Sacaria vazia.
P/2 – Falou dos japoneses também…
R – Japoneses. Mas japonês já era diferente. Eles começaram muito a ir para feira, mercado da verdura. No Mercadão mesmo por aqui, pouca gente e todos que trabalharam no Mercadão, que montaram banca no Mercadão, ficaram tudo bem de vida.
P/1 – E os portugueses?
R – Italianos, mas de outros lados, não italianos daqui, italianos de outros lugares.
P/1 – E os portugueses?
R – Os portugueses era muito com bar. Português trabalhava muito com bar, padaria, bar, padaria, bar. Dificilmente se metiam em outra coisa. Sabe por que eles trabalhavam em padaria e bar? Pra não ter tempo de sair.
P/1 – Por que isso?
R – O que vinha era lucro, entendeu?
P/1 – Agora, tinha carnaval aqui, também?
R – Nossa! Tinha a turma dos fantasiados aqui. Era um grupo de uns amigos meus na faixa de umas 12, 13 pessoas, se vestiam de mulher, tinha o corso, não sei se vocês sabem o que é corso? Não sabem, né?
P/1 – Um carro, né?
R – No carnaval tinha o corso, era só os carros, eles vinham… os carros andavam a um por hora e vinha tudo quanto era carro, tudo na paz, não tinha buzinaço, não tinha nada, era só chamado de corso, tinha pessoal que dançava na rua, o frevo, a marcha.
P/1 – E tinha a festa de São Vito, já?
R – A festa de São Vito existe há muito tempo.
P/1 – Como e que era na época? Vocês iam?
R – Era na rua… antigamente, era rua Alvares de Azevedo, hoje é Poliana Mare, tinha umas barracas, tinha… era muito bom. Agora, tem a quermesse da rua, mas aquilo não é quermesse. O espaço de rua tem 40 barracas, naquela época, devia ter cinco ou seis, só. Não dá nem para andar na rua.
P/1 – Como é que foi o grupo escolar, assim, onde que era?
R – O grupo escolar era na Rangel Pestana. Grupo Escolar Romão Puiggari. E tinha um túnel, a gente chegava por baixo do túnel e saía n porta do grupo, não precisava atravessar a Rangel pestana.
P/1 – Ah é?
R – É. Agora, tiraram, né? A turma começou a mijar e cagar lá, então, ficou um fedor filho da puta e eles tiveram que fechar.
P/1 – E como é que era a escola?
R – Era boa. Só que o estudo era dois mais dois, quatro mais quatro, cinco vezes nove. Conta de menos, conta de mais, tabuada e leitura. Eu era bom em leitura. Eu podia ser alguma coisa se eu tivesse estudado.
P/2 – O senhor gosta de ler, seu Vitor? Tem o hábito?
R – Eu sei muita coisa na vida por causa disso, porque lá no… você quer ver? Em 1954, eu fui para o Exercito. E eu vou falar um negócio para vocês, o negócio era tão difícil, tão difícil, que eu não conseguia comer dentro do quartel. Eu fiquei um ano e pouco lá, eu não me arrependo, eu até gostei, eu aprendi muita coisa, a respeitar as coisas, mas no começo, o pãozinho que eles davam no café se jogasse na cabeça de alguém, matava. Pãozinho de um mês, essas coisas. Eu tô falando sem medo de errar, se tiver alguém que quiser tirar satisfação, que venha, porque eu não vou poder provar. Eu sai do Exercito em 55, fiquei um ano e pouco. Eu era núcleo base, soldado bom e a única coisa que eu não gostei foi só isso. Um dia, fui dar serviço no HM, chegou a hora do lanche, né, aí eu falei para um amigo meu assim: “Ari, eu vou comer lá na lanchonete”, ele falou: “Que nada, Vitor, vamos comer aqui, você vai ver a diferença da comida daqui e daquela que nós comíamos lá”. Eu passei meus maus, eu passei. Eu tive uma infância maravilhosa, mas difícil. Quer ver uma coisa? Vou contar um negócio aqui que vai ficar até meio mal. Eu estava apreendendo a profissão, eu nem sabia… cortava umas barbinhas, mexia num cabelo, meu irmão terminava. Aí, apareceu a televisão. Isso eu me orgulho. Não devia contar, mas me orgulho de contar. Meu pai já tava no empório, eu tinha 14 anos, comprei uma televisão para a minha mãe, com o dinheiro que eu ganhava de caixinha. A televisão se chamava Windsor e na rua Benjamim tinha só um cara que tinha, o Ivo Noal, pai do Ivo, era o maior bicheiro de São Paulo. É mole? Catorze anos, hein? Eu gostava da minha mãe, maravilhosa mulher. Eu tive uma família boa, graças a Deus! Tenho um sobrinho que tem 68 anos. Ele é quase mais velho que a minha irmã mais nova (risos).
P/1 – Como é que foi com essa TV aí, vocês assistiam o quê?
R – Na época, era o canal quatro, passava a novela “O Direito de Nascer” (risos). Antes tinha a época do rádio, não sei o que Leite, eu não me lembro o nome dele, ele fazia “O Crime não Compensa”, então, a gente só ficava ouvindo ele todo dia “O Crime não Compensa”. Acho que os crimes compensam, viu, porque o que estão cometendo de crime aí e não acontece nada, tá compensando pra tudo!
P/1 – E como é que era esse programa “O Crime não Compensa”? Ele falava o quê?
R – Era um crime, ele comentava um crime e no fim, o cara ia preso e aí, ele falava: “O crime não compensa”. Agora, tinha outra, os bicheiros, os bicheiros que iam em cana ficavam presos, mesmo. Hoje, os bicheiros vão em cana, saem na mesma hora, entendeu como é que é? Agora, não tem mais nada, a polícia não dá mais em cima e nem nada, então… o bicho continua rolando. Sete extrações por dia, precisa ter dinheiro bastante para acompanhar essa porcaria, aí.
P/1 – Você gostava de ouvir rádio, ouvir música também?
R – Eu vou contar pra você, eu sou chamado de uma enciclopédia da música antiga brasileira. O que eu conheço de música antiga. A música moderna, eu não conheço nenhuma, porque rap pra mim não é música. Conheço um pouco. Samba de breque, samba, canção, Nelson Goncalves, Francisco Alves, Orlando Silva, Gilberto Alves, Silvio Caldas, isso aí eu sou bom.
P/1 – Quais sambas que você mais gosta, então?
R – O samba que eu mais gosto são os sambas antigos, samba tipo de samba canção.
P/1 – Sei. Mas tem alguma que vem na cabeça que você gosta mais?
R – Tem uma que eu gosto mais: [cantando]: “Debaixo daquela jaqueira, que fica lá no alto, majestosa, de onde se avista a turma da mangueira quando se engalana com as suas pastoras, formosas. Foi lá, quem é que diz que o nosso amor não nasceu? na tarde daquele memorável samba, eu me lembro, tu estava de sandália, com seu vestido de malha no meio daqueles bambas. Nossos olhares cruzaram e eu pra te fazer a vontade, tirei fora o colarinho, passei a ser malandrinho, nunca mais fui a cidade pra gozar do seu carinho na tranquilidade. E hoje, eu faço parte da turma, no braço trago sempre o paletó, um lenço amarrado no pescoço, eu já me sinto outro moço com meu chinelo charlo, até faço valentia no samba de harmonia”. Bonito! Agora, vou cantar uma, a primeira música que o Nelson Goncalves gravou. Foi proibida. [Cantando]: “O Brasil tem muito doutor,
muito funcionário, muita professora,
se eu fosse o Getúlio,
mandava metade dessa gente pra lavoura. Mandava muita loura
plantar cenoura
e muito bonitão
plantar feijão
e essa turma da mamata,
Eu mandava plantar batata.”. É isso aí que é o Brasil hoje, só tem vagabundo. Na politica, não tem uma pessoa que presta, uma! Eu falo. E o PT, os caras que defendem o PT, eu quero que eles venham aqui em São Paulo e vão nas lojas, vão nos supermercados, vão no mercado para ver se a situação tá boa, porque um deputado do PT, quanto ganha por mês? Mais de 30 paus, para eles tá uma maravilha, agora, para quem ganha um mil reais, mil e quinhentos, que nem no meu caso, eu tenho que pagar mil e cem de plano de saúde, na crise que tá, pra mim, tá ruim, entendeu? Então, isso aí.
P/1 – Agora, que outras músicas você gosta bastante, assim? Tem alguma música que te marcou algum período da sua vida, um caso, ou uma data? Que outras músicas…
R – Eu gosto de tudo quanto é… por exemplo, eu sou fã do André Rieu, eu tenho todos os DVDs dele e tem duas cantoras que me deixaram voltar a gostar de música, se chama Carmen Monarca e Carla Fioretti, são brasileiras. Atualmente, eu só assisto André Rieu na televisão, os programas de televisão para mim são muito fracos, eles não querem passar coisas para velhos, querem passar coisas só para mocos, tem coisas que os velhos não assistem. Então, música mesmo, é Boemia, essas coisas são maravilhosas, Boemia eu cheguei a cantar num taxi dancing. Eu tava meio…
P/1 – Como é que é essa música aí?
R – Boemia?
P/1 – É.
R – [Cantando]: “Boemia, aqui me tens de regresso e suplicante te peço a minha nova inscrição. Voltei, pra rever os amigos que um dia eu deixei a chorar de alegria, me acompanha o meu violão. Boemia, sabendo que andei distante sei que essa gente falante vai agora ironizar. Ele voltou, o boêmio voltou novamente, partiu daqui tão contente, por que razão quer voltar? Acontece, que a mulher que floriu meu caminho de ternura, meiguice e carinho, sendo a vida do meu coração. Compreendeu e abraçou-me dizendo a sorrir: ‘Meu amor você pode partir, não esqueça o seu violão. Vá rever, os seus rios, seus montes, cascatas, vá sonhar em novas serenatas e abraçar seus amigos leais. Vá embora, pois me resta o consolo e a alegria de saber que depois da boemia é de mim que você gosta mais’”. É feia?
P/1 – Não.
R – Fala!
P/2 – Não, é bonita.
R – Bonita, né? A música brasileira só perdia para as italianas. E olha, tinha música brasileira melhor que as italianas. As músicas de hoje pra mim não quer dizer nada, o que deu alguma coisa quando saiu foi o Roberto Carlos. O Agnaldo Rayol, Roberto Carlos, Agnaldo Timóteo, esses caras. Agora, esses de agora pra mim, não quer dizer nada, não gosto de nenhum. Nem ouço.
P/1 – E o Adoniran Barbosa, o senhor gostava?
R – [Cantando]: “O Arnesto nos convidou pra um samba, ele mora no Brás. Nós fumos, não encontremos ninguém. Nós fiquemos com uma baita de uma reiva, da outra vez, nós num vai mais. Nós não semos tatu! No outro dia encontremo com o Arnesto, que pediu desculpas, mas nós não aceitemos. Isso não se faz, Arnesto, nós não se importa, mas você devia ter ponhado um recado na porta” Adoniran Barbosa.
P/2 – Pessoal aqui do bairro cantava bastante, seu Vitor?
R – Eu acho que na outra encarnação, eu devia ser cantor, porque falavam que eu cantava bem, né, agora… tem uma coisa, eu não abri a voz aqui, não. Eu só dei um chamego, lá, não abri a voz, mas tinha muita gente que gostava de cantar aqui, músicas, músicas. Essas músicas agora… músicas antigas eram bonitas. Eu sei uma letra, não vou cantar aqui não, eu sei uma letra do Orlando Silva, chamada “A Rosa”, tem 16 estrofes de quatro versos.
P/1 – Sabe tudo de cabeça?
R – Eu sei!
P/1 – Tá querendo cantar, né?
R – Não, não. Não vou, não. Muito puxado, tem sobe e desce. Orlando Silva para mim foi o maior cantor que apareceu no Brasil.
P/1 – Ah é?
R – Agora, eu vou falar uma do Francisco Alves, vocês são paulistas? Paulistanos? Vamos lá: [cantando]: “São Paulo São, estrela do céu, de minha pátria, revelaste ao Bandeirante audacioso o segredo do Brasil maravilhoso. São Paulo das lutas de liberdade, nos campos ou na cidade, na Capital, no sertão. São Paulo, braço rijo, pulso forte, defendeste até a morte a nossa Constituição. São Paulo sem preconceito de raça, sem preconceito de cor, povo simples, mas viril. São Paulo, meu coração está batendo ao mundo inteiro dizendo: São Paulo é o coração do Brasil”.
P/1 – Agora, se você tivesse que cantar uma música para lembrar do Brás, qual que você cantaria?
R – Naquela época, tinha o realejo, você conheceu o realejo? Sabe o que é realejo?
P/1 – Não, o quê que é?
R – O realejo é uma caixa de música que vinha com o papagaio. Então, para eles ganharem dinheiro, eles botavam umas frases e você dava um dinheirinho e o cara falava para o papagaio: “Dá um número de sorte para ele”, isso acabou tudo, era tudo alegria. Acabou tudo.
P/1 – E você sempre gostou de futebol, seu Vitor?
R – Sempre gostei, joguei até os 40 anos.
P/1 – Quarenta anos?
R – Na várzea. Nunca fui profissional, nem nada, fui varzeano. Não me gabo de nada, não sou melhor do que ninguém, porque se eu fosse profissional, eu podia ter falado que fiz alguma coisa, mas nunca fui. Então: “Aquele cara era bom de bola”, era bom de bola mas não foi profissional, então…
P/1 – Mas teve algum jogo que te marcou, que você jogou, algum lance, alguma coisa assim?
R – Fomos jogar contra a Portuguesa e o cara falou pra mim assim: “Ih, você é lateral esquerda? O ponta direita vai acabar com você”, aí quando acabou o jogo, ele veio me convidar para ir jogar no time dele.
P/1 – O quê que aconteceu no jogo?
R – O cara não viu a bola, acabei com o jogo. não levei a bola pra casa, mas se eu tivesse levado a bola, tinha acabado antes, mas não levei, joguei até o fim.
P/1 – Você era de fazer gol?
R – Não. Só defesa. Na época, quem jogava na defesa, dificilmente, fazia gol. Só se fazia gol de falta. Os defesa não saiam, quem saía eram só os atacantes.
P/1 – Mas você já fez gol na várzea, já?
R – Muito pouco, muito pouco.
P/1 – Mas como é que foram esses gols aí, você se lembra de algum assim?
R – Teve um aí que se eu contar, isso aí precisava ser televisionado para ver. Peguei uma bola, corri pelo meio do campo, joguei para o ponta e sai correndo. Aí, o ponta cruzou e na corrida, eu acompanhei a bola, quando os caras da defesa vieram, eu bati de calcanhar, passei por cima deles com a bola e entrei de bola e tudo.
P/1 – Golaço então!
R – Pô, tinha um cara que jogava no São Paulo, o Zé Maria, ele saiu… ele jogava… ele veio correndo, ele me levantava (risos).
P/1 – Mas assim, a sua família sempre foi corintiana, todo mundo?
R – Minha mãe era Palmeiras…
P/1 – E aí?
R – Tinha uma irmã Palmeiras, minha mãe era italiana, tinha que ter alguém que puxasse sardinha para ela, né?
P/1 – Mas e ai, como é que surgiu o Corinthians no meio, aí? Se a sua mãe era palmeirense, como é que era?
R – Ah, eu não falava nada, porque naquela época… eu ia assistir jogo do Corinthians e do Palmeiras, eu ia com sete, oito palmeirenses assistir jogo, mas nunca aconteceu nada, não. Nem briga acontecia, nada. A gente nem discutia, não é que nem agora que os caras se matam por causa disso aí. Isso aí, naquela época não tinha isso.
P/1 – Mas você ia muito no estádio para ver o Corinthians jogar?
R – Ia. Teve uma época em que eu ia quase todos… depois, eu parei, nunca mais fui. Aí, eu me lembro que eu tinha deixado de ir em 67, eu fui ver Corinthians e Santos, fazia dez anos que o Corinthians não ganhava do Santos, aquele dia nós ganhamos, com o Pelé e tudo, nós ganhamos. Dois a zero, Flavio e Paulo Borges.
P/2 – Jogão?
R – Pô, que jogaço!
P/2 – Onde foi o jogo? Foi no Pacaembu?
R – Pacaembu.
P/2 – Como que era ver jogo no Pacaembu?
R – A gente, às vezes, ia de caminhão, ou às vezes, pegava o ônibus ou às vezes, ia a pé. Eu cansei de vir a pé do Pacaembu até o Brás. Descia a avenida Pacaembu, saia, vinha pelo Mercadão, passava e vinha pelo Brás, vinha a pé.
P/1 – É uma andada, hein?
R – É. A gente tinha saúde pra isso, porque nossa brincadeira era salto em extensão, mãe da rua, cruzado, jogar bola na rua, dar volta no quarteirão, pular de um na mula, o cara ficava assim, a gente ia pulando no meio da rua, tinha muito preparo físico, mesmo sem fazer ginástica. A mocidade era maravilhosa, não tinha… era tudo amigo, não tinha esse negócio. Agora, tinha uma coisa, né, na rua Benjamim tinham três turmas, tinha a turma perto da Monsenhor Andrade, a minha turma e a turma da Santa Rosa, tinham três turmas. Mas não tinha briga, não. Mas se a gente passava, eles ficavam meio cabreiros.
P/1 – Quem que era a sua turma? Quem que compunha? O pessoal?
R – Graças a Deus, em frente minha casa, tinha cinco famílias, do lado, tinha mais cinco. Ih, tinha bastante amigo, muita gente. Tinha muita gente, geralmente, tinha família de nove, dez filhos. Agora, hoje é diferente, né? Hoje, não tem mais aquela confiança, aquela amizade que nem tinha antigamente.
P/1 – E como é que era o Mercadão na época?
R – Olha, eu sei que esse Mercadão só perde para o Mercadão da Espanha. Porque em matéria de coisa boa que nem tem no Mercadão, meu, sensacional, né? Só que precisa ter cacife [para segurar, né?
P/1 – Mas você ia quando você era criança, você ia lá também?
R – Não.
P/1 – Não ia muito?
R – Não ia, porque eu já não gosto de ir agora, que às vezes, eu preciso ir e eu não gosto de ir porque para atravessar é muito difícil! Eu vou a pé, não sei guiar, não tenho carro, entendeu? Então, eu vou falar uma coisa pra vocês, o Mercadão tem um lugar que vende a ricota que se chama Roni. Se vocês comerem um canelone de uma ricota que vocês compram fora, é um gosto. Se vocês comprarem e comerem o canelone com a ricota do Roni, você vai ver a diferença.
P/1 – É muito diferente?
R – Nossa! Mas não tem nem comparação. A ricota do Roni, pra mim, é nota mil.
P/1 – Como é que fica?
R – Eles vendem pacote de meio quilo, um quilo, assim. E é barata. Não sei agora, que faz tempo que a minha mulher não faz, mas muito bom. Antigamente, também tinha uma loja que fatiava frios, que beleza, você ia comprar salame, mortadela, cortavam fininho, era uma delicia! Agora acabou.
PAUSA
P/1 – E ser barbeiro, como é que você aprendeu?
R – Eu aprendi olhando, né? Naquela época, não tinha escola, não. O único lugar que… escola pegava as bexigas, você tinha que por espuma em cima da bexiga e passar navalha sem estourar a bexiga (risos). Porque naquela época, barbeiro não usava gilete, era só navalha, né? E a maquininha era manual. Eu tenho uma lá no salão, te mostro (risos).
P/1 – E você estourou muito balão?
R – Mas vou te falar uma coisa, é uma profissão boa! É uma profissão que dificilmente te falta um trocado no bolso. Mas agora, o modernismo acabou comigo, eu não gosto de cortar cabelo dessas modas, aí. Eu acho muito feio os cortes de cabelo, agora.
P/1 – Mas você estourou muita bexiga?
R – Não, eu nunca fiz. Tinha gente que fazia, eu nunca fiz. Tinha cara que sentava na minha cadeira, que queria me ajudar a eu aprender. Teve gente que dava a cara, esses que davam a cara, nunca aconteceu nada. Agora, o cara quando tinha medo, e se fosse fazer, você ficava com medo também e acabava acontecendo alguma coisa.
P/1 – E foi difícil aprender o oficio?
R – É difícil Cortar cabelo não era fácil, não. Primeiro cortar cabelo, você deixar escada, os cortes de cabelo não podiam ter escada.
P/1 – O quê que é escada?
R – Esses cortes de cabelo que usam agora, os modernos, na minha época, se o cara usava esse cabelo, a gente já sabia que era cortado em casa, era o pai que passava a máquina e ficava aquela coisa feia lá. E a molecada gosta, vou fazer o que, né?
P/1 – Mas quanto tempo você ficou olhando? Você ficou olhando o seu pai fazer?
R – Três, quatro anos. Aí, comecei a fazer alguma coisinha, aí fui pegando, pegando, pegando. Mas se você não ficar só nisso aí, eu saía de vez em quando, ia cortar cabelo em algum lugar diferente para pegar o jeito do cara que já era mais traquejado e com isso, fui me aperfeiçoando mais.
P/1 – Com quantos anos você começou a ver?
R – Dezesseis anos já tinha uma boa clientela.
P/1 – Ah é?
R – Meu pai deixou muito cliente para mim, né? Meu pai, meu irmão. Meu irmão trabalhava também.
P/1 – De barbeiro?
R – É. Meu irmão era o único da família que estudou. Era desenhista mecânico e formado em Geometria. Foi trabalhar de barbeiro, ficou de barbeiro e depois, foi trabalhar com o meu pai na mercearia e ficou lá.
P/1 – Seu pai abriu uma mercearia depois?
R – Na esquina da Benjamim com a rua da Alfândega, onde é a lanchonete, lá. Meu pai em 1949, acho que comprou aquilo. Depois que ele operou a catarata, ele parou.
P/1 – Não podia mais cortar?
R – Não é mais igual, né? Capacidade dos antigos perto de hoje é completamente diferente. Meu pai com uma vendinha daquela, ele deixou uma propriedade em Guarulhos de mil e quatrocentos metros. E quem vivia? Minha mãe, meu pai, meus três irmãos, minhas irmãs, eu não, eu era separado. Eu vivia do que eu ganhava.
P/1 – Como que era essa mercearia dele? O quê que ele vendia?
R – Tudo. Só que perdemos duas, né? Meu pai perdeu duas e eu perdi o salão na enchente de 66.
P/1 – Ah é?
R – Acabou tudo!
P/1 – Nossa!
R – Perdeu arroz, feijão, açúcar, o que tinha lá dentro foi tudo de embrulho. E as cadeiras que eu tinha no salão também acabou, entrou um metro e sessenta e pouco de água.
P/1 – Como é que foi? Conta pra gente desse dia, como é que foi?
R – Isso aí foi o Adhemar de Barros, o ABC ia inundar, ele teve que abrir as comportas e a água veio por baixo. Aqui nesse pedaço deve ter chegado dois metros de água. Todo mundo perdeu tudo, todo mundo. Ninguém… todo mundo perdeu.
P/1 – Os armazéns também?
R – Tudo, tudo. Os armazéns foi tudo de embrulho, arroz, feijão, batata, se você visse as pilhas de mercadoria que ficaram empilhadas no meio da rua… tudo estragado, cebola, batata, arroz, feijão, tudo!
P/1 – Deve ter ficado um cheiro ruim, né?
R – Nossa mãe do céu! Nem fala no cheiro! Horrivel.
P/1 – E você tava onde quando começou a encher? Você tava em casa quando você viu isso aí?
R – Se eu te contar, eu morava na Mendes Caldeira. Aí, minha mãe me chamou: “Vitor vem cá”, quando eu olhei que eu vi aquilo, eu não acreditei. Aquele mundaréu de água. Quer dizer, na Mendes Caldeira não encheu. Agora, eu e o meu irmão mais velho que morreu, nós ficamos dois dias e duas noites limpando o armazém do meu pai e a minha barbearia, tirando óleo que entrou, aquela coisa… dois dias e duas noites, tudo na base do conhaque, ficava no meio daquela água, graças a Deus, não me aconteceu nada. E eu não sou de beber, não.
P/1 – Mas perdeu tudo, tudo?
R – Tudo, tudo, tudo. Começou do zero de novo.
P/1 – Nossa. E como é que foi para começar do zero? Pegou o empréstimo, você, como é que foi?
R – Meu pai? Meu pai não, meu pai comprou na raça. Não pegou nada de ninguém, não. Meu pai começou na raça. Começou um pouquinho, um pouquinho, graças a Deus, foi tudo bem depois.
P/1 – E se levantou de novo?
R – Ah sim! Pra ficar rico não dava, né, família era muito grande, né? Não dava pra ficar… mas deu para viver. É que nem eu, hoje, eu trabalho pra comer, só, porque se eu for querer guardar dinheiro, não dá não. Na atual politica que tá aqui no Brasil, não dá para guardar dinheiro, não.
P/1 – O seu pai morreu com quantos anos e quando?
R – Cento e um. Meu pai morreu em 78. Presta atenção nos números, meu pai morreu em 1978, ele nasceu em 1897, são os mesmos números. Minha mãe morreu em 1970, 66 anos. Morreu nova.
P/1 – Como é que foi isso aí?
R – Minha mãe morreu… ela tinha problemas de coração, teve derrame. Coisa triste.
P/1 – Você gostava muito dela, né?
R – O cara que não gostava da minha mãe não gostava de ninguém (risos), mulher boa demais. Tá louco! Gostava de ajudar os outros. Minha mãe, de vez em quando, jogava no bicho e dificilmente ganhava, quando ela ganhava, praticamente o que ela ganhava, ela dava de caixinha pro…
P/1 – Como é que foi, assim, passar da infância para a adolescência? Começou a namorar? A sair?
R – Não.
P/1 – Não?
R – Eu era muito acanhado. Tinha muita moça que tirava linha comigo, mas a gente precisava chegar e pedir para namorar e eu tinha vergonha de chegar.
P/1 – Por que você tinha vergonha?
R – Eu não sei, ué. Fazer o quê? Eu tô sendo sincero.
P/1 – Eu só tô perguntando, só…
R – Depois eu fiquei cara de pau, né? Quando era pequeno…
P/1 – E como é que as meninas davam linha? Como é que era isso? Você tava lá…
R – A gente olhava, só.
P/1 – Só olhava?
R – Só olhava. Só olhava. Olhava, as vezes, tinham umas que pensavam que a gente era… “Dou bola pra aquele cara e aquele cara não vem falar comigo”, hoje não, hoje a mulher já chega e fala, né? Antigamente, não tinha… antigamente, tinha que chegar na moça e pedir para namorar. Hoje já é diferente, você já vai direto para o hotel com ela, naquela época, não tinha isso não.
P/1 – Como é que vocês se encontravam com as meninas? Era baile, era o quê?
R – Não, não. Não ia em baile. A gemente ia na avenida Rangel Pestana, tinha um… como fala? Ficava tirando linha, mas as meninas passando, a gente ficava parado na porta do cine Piratininga, tinha dos dois lados, tinha a sapataria, tinha a Lojas Americanas na Rangel Pestana, perto da linha do trem, a gente ficava por lá. Só isso, mas também nunca namorei ninguém lá, não. Nunca namorei ninguém, não. Eu namorei pouco, nunca fui de namorar, fui muito gandaieiro.
P/1 – Ah é? Que ano você ficou gandaieiro, assim?
R – Até os 39 anos, depois eu casei.
P/1 – E você saía, você ia para onde?
R – Ia para as bocas, né?
P/1 – Como é que era isso daí?
R – Major Sertório, avenida Ipiranga, eu ia muito em restaurante comer, restaurante bom e tinha na avenida Ipiranga tinha um… chamava Salada Paulista, o cara que montar uma salada paulista hoje igual aquela, fazer as coisas boas que aqueles caras faziam lá, ele fica milionário em seis meses.
P/1 – Era bom?
R – Nossa, se era bom! Eu cheguei a comer 13 sanduiches de salsicha lá. E não tô mentindo, não. O pão derretia na boa, a salsicha era uma maravilha. Os caras que estavam comigo não acreditaram (risos). “Vamos rachar a despesa”, eles se arrependeram (risos). É velho, eu tive infância. Eu tive. Bolinha de gude, eu tive…
P/1 – Que mais você comia que era legal nessa época, onde você mais ia comer?
R – Olha, eu gostava muito do croquete que tinha lá na Salada Paulista. Era bom demais! Croquete de carne que eles faziam, nossa! Mesmo a salsicha era completamente diferente das de hoje. Completamente diferente.
P/1 – E você saía pra ouvir… você ouvia samba quando você saía, é isso?
R – Ah sim! Ia em taxi dancing, às vezes, tava a Ângela Maria, às vezes, tava o Nelson Goncalves, a gente ia assistir o show. E Taxi dancing é o seguinte, você tem que pagar pra dançar. Era por minuto. Dez minutos era tanto… tinha gente que dançava um hora e ia o salário do mês (risos).
P/1 – Ah era assim?
R – Hoje não tem mais taxi dancing, né?
P/1 – Onde que era?
R – Tinha na… eu acho que na rua Vitória, tinha na avenida Ipiranga, na avenida Ipiranga tinha o Chuá, o Maravilhoso, o Cuba eu não lembro o nome da rua, tinha o Salão Verde, tinha umas boates, também. Cabaré, né? Guarani, Imperador…
P/1 – Você ia nessas boates também?
R – Eu ia.
P/1 – Como é que era? Você gostava?
R – As boate era… pode falar? As boates tinham só mulher para fazer michê, entendeu? Estavam lá para fazer um programa, para ganhar uns trocos.
P/1 – Entendi. E foi até os 40 anos, assim?
R – Trinta e nove. Espero que a minha mulher não veja isso.
P/1 – Eu vou perguntar do seu casamento, já, mas eu queria perguntar, por exemplo, chegou o seu Gulhelmo, que bateu aqui na janela, né, você cortava o cabelo dele, também? Também fazia a barba?
R – Corto ainda.
P/1 – Ainda corta? E de quem mais da zona cerealista assim, que você corta? Que você conheceu?
R – Eu cortei de muita gente, eu corto de um dos donos da casa Flora, do Leonel, do JMG, mas morreu muita gente minha, não tenho muito cliente mais, não. Morreu muita gente. A maioria dos meus clientes são todos aposentados, morreu muita gente, perdi muitos amigos que morreram.
P/1 – E esses comerciantes falam com você dos negócios, de como é que tá indo?
R – Falam. Tá uma porcaria. Eles falam. Tá uma porcaria, mesmo.
P/1 – Mas e antes, como é que era?
R – Antigamente, eles não falavam, não. Na época boa… só falam quando tá ruim, né? Vai gastar o que ganhou, né? Para manter.
P/1 – Mas dizem que o senhor cortou o cabelo de todo mundo aqui do…
R – Bastante! Muita gente. Teve uns que ficaram, teve outros que não gostaram, procuraram outro lugar, mas isso é normal, isso acontece. Você já pensou se só eu soubesse cortar cabelo? Não ia dar tempo nem de eu respirar, né?
P/2 – O senhor tem algum cliente marcante, assim? Algum cliente frequente?
R – Eu tenho um garoto que veio cortar o cabelo comigo, ele era para ser agrimensor, aí ele foi trabalhar na Kodak e ele foi subindo e continuou vindo cortar comigo. Aí, ele ficou gerente geral da Kodak do Brasil e vinha cortar cabelo comigo. Agora, ele aposentou e trabalha para a Kodak e ainda vem cortar cabelo comigo. Eu tenho cliente que eu corto cabelo há 68 anos.
P/1 – Me fala um que é antigo, então. Um cerealista que você corta há muitos anos.
R – Cerealista?
P/1 – É, que trabalha aqui.
R – Tem o Nelson Castanho. Morreu muito, a maioria daqueles ceboleiros, batateiros morreram todos. Eu tenho certeza que estariam comigo, hoje.
P/1 – Mas eles conversam muito com você? Você sabe muito da vida deles? Vocês são amigos?
R – Não. Particular, eu costumo não entrar. Converso, comercio, negócio do Corinthians, Palmeiras… com a vida privada deles, eu não… cada um tem a sua, cada um sabe o que se passa dentro da casa.
P/1 – E o quê que você acha de cortar o cabelo do avô, do pai e do filho? Às vezes, acontece, né?
R – Já teve muitos! Agora, não tem mais. O que eu tenho agora é uma pequena parte do que eu tinha de cortar cabelo. Se eu conseguisse cortar 100 cabelos por mês, dava pra viver bem.
P/1 – E como é que o senhor faz? Como é que é o seu estilo de cortar cabelo e fazer barba?
R – Social. Cabelo social e barba, eu sou bom. Cortar barba eu sou bom. Agora, eu aparo barba também, mas tem tipo de barba que eu não quero mexer.
P/1 – Por quê? Que tipo?
R – O golpe de vista não é o mesmo.
P/1 – Como assim?
R – O golpe de vista, fazer as coisas… até aqui assim, tudo bem, mas aquele negócio de fazer fininho assim, aqueles negócios… o golpe de vista não dá. A mão não é mais a mesma. Esse dedo aqui tá roxo, quer ver? Eu vou mostrar porque eu uso aliança na mão direita. Isso é reumatismo, esse dedo aqui dá cada _____01:12:07___, gostoso!
P/1 – Mudou muito, assim, de quando você começou até hoje profissão de barbeiro?
R – Mudou. Eu passei por vários tipos de cortes de cabelo. Cabelo do jeito que você usa, atrás da orelha… na minha época, cortava cabelo curto que nem agora, mas era americano que falava. Meio americano parado curto. Hoje, é zero, passa navalha. E tem outra, esses caras não sabem trabalhar nisso, porque esse serviço aí, esse serviço de passar navalha no cabelo, essas coisas, tem que ser o dobro do preço. E eles trabalham tudo errado.
P/1 – Mudou muito os estilos de cabelo, então?
R – Mudou. Agora mudou muito. Bom, eu tô na hora de parar, né? É que eu não ganho no jogo, se eu ganhar no jogo, eu paro na hora. Se eu ganhar uns trocados aí bons, eu paro de trabalhar. Contudo, eu tenho uns clientes que eu sou apaixonado, me sustentaram até hoje. Muito valor. Por exemplo, a molecada que vai no salão, nem olha na minha cara. Às vezes, eu tô lá parado, nem ilha. Mas eu também não tô nem aí, também não quero atender.
P/1 – Agora me diz uma coisa, os instrumentos mudaram também? Navalha?
R – Na época, era navalha, hoje é gilete, né? É mais higiênico.
P/1 – Por quê?
R – Porque você troca a gilete para todo cliente, é meia gilete, meia gilete… e a navalha, você tinha que por no Lysoform, você tinha que mandar amolar, você tinha que passar na pedra. Acabou tudo isso, agora é só trocar a gilete e acabou. Tudo mais fácil.
P/1 – Mas o senhor gosta mais do quê? Da gilete ou da navalha?
R – Eu… faz muitos anos que eu não uso… a navalha é muito cara. A navalha, além de custar caro, não tem ninguém para manter ela. Tem amolador de tesoura e quem arruma máquina, amolador de navalha, eu não conheço nenhum.
P/1 – Entendi. Agora, vamos passar para outro assunto. Você tava aqui no Brás, você conheceu a sua mulher, como?
R – Eu conheço minha mulher desde pequena.
P/1 – Ah é?
R – É. Desde quando ela veio da Itália.
P/1 – Ela veio da Itália?
R – É.
P/1 – Qual que é o nome dela?
R – Margeritta.
P/1 – Veio da onde, da Itália?
R – Veio de Pollignanno Al’Mare, da terra do pai do Guilherme.
P/1 – Como é que foi o dia em que vocês se conheceram? Você se lembra?
R – Eu conhecia, um dia, ela passou, eu falei: “É ela! Tem que ser ela. Não quero outra, tem que ser ela”, fui atrás, ficou meio, mas no fim, tô com ela há 41 anos. Quase três anos de namoro e noivado.
P/1 – Você conheceu a sua mulher, ela fazia o quê?
R – Minha mulher trabalhou no Olegário, depois, trabalhou na Cestol, depois foi chefe de venda do Óleo Pacaembu, durante muitos anos. Aí, ela parou, não quis mais saber.
P/2 – O Olegário é algum estabelecimento? O quê que era?
R – Olegário? Puta que pariu! Podre de rico. Até hospital ele teve. Foi um dos caras que teve mais propriedades aqui no Brás. Antônio Olegário, chamava. Não abria a mão nem para atender telefone, mas ficou milionário. A rua Benjamim, metade da rua Benjamim era dele. Por aqui… esse prédio que tem nessa direção aqui, na rua Benjamim ainda é dele, ainda tem o seu Valdomiro lá que trabalha pra ele, ainda.
P/1 – Tá vivo ainda esse cara?
R – Olegário morreu. Morreram os filhos, acho que tem só um vivo.
P/1 – Ele foi comerciante de alimento daqui também?
R – Começo, era. Depois, ficou só trabalhando com imóveis. Comprou muita propriedade. esperto, né? Cara que tem cabeça. Pessoa quando nasce e tem cabeça…
P/1 – Por quê que no dedo mindinho, você deixa a unha crescer e no resto, não?
R – Para limpar a cera da orelha.
P/1 – É só para isso, mesmo?
R – (Risos). Eu tenho muita cera na orelha, então, tem hora que eu tô na rua, coça, eu meto a unha e tiro. Mas só tiro a cera, procuro não ferir, não.
P/1 – Entendi. Agora vamos voltar para o seu casamento. Você casou com a sua mulher em que ano foi?
R – 1975.
P/1 – Você se lembra do dia do casamento, como é que foi?
R – Treze de abril de 75.
P/1 – Foi aqui no Brás o casamento?
R – Foi no Belém, São Carlos Borromeu.
P/1 – Daqui a dois dias é aniversario de novo, né?
R – É, dia 13 é aniversario de casamento.
P/1 – Quantos anos vocês vão fazer?
R – Quarenta e um. Eu tenho um filho que tem 38 anos, ela não quis mais, só teve um. Tenho um neto, não tem quatro anos ainda. A única coisa que eu consegui foi comprar a minha casa até hoje e vivi bem. Comi em restaurantes bons, conheci lugares bons. Quando eu fiz 40 anos de casamento, eu fiz um almoço lá perto de onde tá aquele vagabundo do Lula, no sitio do meu sobrinho, lá em Atibaia. Mas tá tudo bem. Chega ou quer mais?
P/1 – Ia te perguntar quais são os seus sonhos para o seu futuro, hoje? Para você, para a sua vida, assim?
R – Pra mim? Eu queria que o meu filho acabasse de pagar o que ele deve e viver a vida dele, pra mim, o que vier é lucro. Não tenho sonho de nada, com esses vagabundos que estão aí na politica, eu vou sonhar o quê? Não presta nenhum! Nenhum presta. Tudo vagabundo, tudo estão lá por causa de dinheiro. Agora, eu quero uma coisa, esses 132 deputados aí que estão na incerteza, eu quero que o jornal ponha o nome deles no jornal, o nome desses caras aí que não querem que essa mulher saia. Ela pode ser honesta, pode ser o que for, mas ela é incompetente. E esse vagabundo do Lula, esse vagabundo do Lula que fica agitando aí, se tivesse um cara macho ia prender ele, que ele não pode fazer o que ele tá fazendo. Ele fica agitando. Agora, quando ele vai viajar, ele vai bonitinho, quando ele vai fazer agitação, ele vai todo relaxado com aquele câncer que ele tem na garganta, lá, esse vagabundo.
P/1 – E o quê que você acha que vai…
R – Eu espero que tenha o impeachment. Eu espero que tenha outra eleição.
P/1 – Não, mas eu digo, o quê que você acha do Brás e da zona cerealista, assim, o quê que vai ser?
R – O Brás, eu calculo que se continuar assim, não dura dez anos. Amigo, quem ganhou, ganhou. Pode ficar o Santa Paula, Casa Flora que tem estrutura, mas o resto… os tios do Maurício, do Renato, eles têm 260 apartamentos, é ruim?
P/1 – O quê que você achou de falar com a gente hoje?
R – Tudo bem. É gostoso. É que a gente tem compromisso, às vezes, vem gente procurar: “Aquele vagabundo não tá? nunca chega”.
P/1 – Mas você gostou de falar, de lembrar as coisas? Falar do Brás? Você gostou?
R – Ah sim! Agora não, agora eu praticamente só venho aqui para trabalhar. Eu vou embora, fico em casa, não saio mais. Só que tem uma coisa, viu, a situação tá muito difícil. É que eu aprendi a conviver com pouco, porque eu ganhava melhor, né, hoje eu aprendi. Então… vivo com pouco.
P/1 – Tá certo, seu Vitor. Obrigado, viu!
R – Opa!
P/1 – Obrigado pelo tempo, aí.
FINAL DA ENTREVISTA
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