Identificação Museu da Pessoa - Seu Jair, para começar, eu gostaria que o senhor dissesse o seu nome completo, data e local de nascimento. Jair - Meu nome é Jair Antoninho Batista de Oliveira. Nasci em 24 de julho de 1943, em São Paulo. MP - Capital? Jair - Para ser mais certo, Vila Nova Conceição. MP - Está certo. Jair - Na rua Doutor Sodré. MP - Ah, não entendi. Jair - Na rua Doutor Sodré. MP - Doutor Sodré. A família do senhor é aqui de São Paulo mesmo? Jair - São todos do interior. A minha mãe de Dobrada, o meu pai de Taquaritinga. Avós MP - Os avós de parte de mãe o senhor chegou a conhecer? Jair - Muito pouco. Eu era bem pequeno quando conheci o pai do meu pai, só. Mas eu era muito pequeno e os demais eu não cheguei nem a conhecer. MP - Da parte de mãe não conheceu ninguém? Jair - Nem da mãe... MP - Mas o senhor sabe o nome deles? Jair - Do pai do meu pai, sim, que é o José Lélio Batista de Oliveira, né? MP - Da parte da mãe, não. Jair - Dos outros, da mãe, não sei. MP - Mas o senhor lembra da mãe contando um pouco da história dos pais dela, de como eles se conheceram, o que eles faziam? Jair - Da parte da minha mãe, o meu avô ficou viúvo com quatro filhos, sendo uma delas, a minha mãe, né? E casou novamente com uma, com essa que seria a minha avó. E essa minha avó teve mais oito filhos. Se juntaram todos. Ficaram em 12 no total e eu cheguei a conhecer. Essa seria a madrasta da minha mãe. Cheguei a conhecer bastante. MP - Como ela se chamava? O senhor lembra? Jair - Lembro "Nona", "Nona", a "Nona", né? E ficava meio... Perdi um pouquinho. Eu não lembro agora, não. MP - É de origem italiana? Jair - Origem italiana. Casa da avó MP - O que o senhor lembra dela, assim, dessa casa da Nôna? Jair - É, moravam junto com a... Ela morava junto com a minha tia, que era a caçula. E nessa altura, o meu avô já havia falecido também. E eu lembro das broncas que ela dava nas...
Continuar leituraIdentificação Museu da Pessoa - Seu Jair, para começar, eu gostaria que o senhor dissesse o seu nome completo, data e local de nascimento. Jair - Meu nome é Jair Antoninho Batista de Oliveira. Nasci em 24 de julho de 1943, em São Paulo. MP - Capital? Jair - Para ser mais certo, Vila Nova Conceição. MP - Está certo. Jair - Na rua Doutor Sodré. MP - Ah, não entendi. Jair - Na rua Doutor Sodré. MP - Doutor Sodré. A família do senhor é aqui de São Paulo mesmo? Jair - São todos do interior. A minha mãe de Dobrada, o meu pai de Taquaritinga. Avós MP - Os avós de parte de mãe o senhor chegou a conhecer? Jair - Muito pouco. Eu era bem pequeno quando conheci o pai do meu pai, só. Mas eu era muito pequeno e os demais eu não cheguei nem a conhecer. MP - Da parte de mãe não conheceu ninguém? Jair - Nem da mãe... MP - Mas o senhor sabe o nome deles? Jair - Do pai do meu pai, sim, que é o José Lélio Batista de Oliveira, né? MP - Da parte da mãe, não. Jair - Dos outros, da mãe, não sei. MP - Mas o senhor lembra da mãe contando um pouco da história dos pais dela, de como eles se conheceram, o que eles faziam? Jair - Da parte da minha mãe, o meu avô ficou viúvo com quatro filhos, sendo uma delas, a minha mãe, né? E casou novamente com uma, com essa que seria a minha avó. E essa minha avó teve mais oito filhos. Se juntaram todos. Ficaram em 12 no total e eu cheguei a conhecer. Essa seria a madrasta da minha mãe. Cheguei a conhecer bastante. MP - Como ela se chamava? O senhor lembra? Jair - Lembro "Nona", "Nona", a "Nona", né? E ficava meio... Perdi um pouquinho. Eu não lembro agora, não. MP - É de origem italiana? Jair - Origem italiana. Casa da avó MP - O que o senhor lembra dela, assim, dessa casa da Nôna? Jair - É, moravam junto com a... Ela morava junto com a minha tia, que era a caçula. E nessa altura, o meu avô já havia falecido também. E eu lembro das broncas que ela dava nas crianças, que ficavam brincando com numa bacia. Ela dizia para as crianças: "Vão pegar constipado", né? "Saiam daí Vão ficar constipado Venham e pegam as criança" Sabe aquele jeitão bem... Mas ela já estava com bastante idade quando eu vim a conhecer mesmo, né? Porque até aí, eu vim a conhecer depois. Eu estava com... Acho que uns 28 anos, que eu fiquei distante mesmo de ir para o interior. Meus pais não tinham condições. Era muito dura a vida aqui em São Paulo. Então, nós ficamos muito tempo sem fazer essas visitas lá para essa minha avó. MP - Porque ela continuava morando aonde? Jair - Em Dobrada. MP - Em Dobrada. A cidade de Dobrada, o senhor só veio conhecer, então, quando jovem? Jair - É, exato, é. Quando... Com uns 28 anos, mais ou menos, 26 anos. Eu estava com 26 anos quando eu fui para Dobrada conhecer mesmo. MP - E o que mais dessa Nona? Ela cozinhava bem, o senhor lembra? Jair - Ah, sim. Nossa Fazia cada comida que era uma delícia. E ninguém podia mexer. Era ela a dona da cozinha e não deixava. Tocava todo mundo da cozinha, quando alguém pensava em fazer alguma coisa, né, ela que era a dona da cozinha. Ela tomava conta de tudo. MP - Qual era a especialidade dela? O senhor lembra de gostar de algo, assim, especial? Jair - Eu gostava quando ela fazia o raviolli, que era aquele com frango, aquela... Uma sopa, né? Era o raviolli, e tinha o outro também que era uma massa, que depois jogava açúcar. Ele tem um nome, eu não me recordo agora. MP - Que era um doce? Jair - Era um doce. Era um doce bem típico italiano. MP - E essa casa onde ela morava, o senhor saberia me descrever como era essa casa da Nona? Jair - Era uma casa... A casa do meu tio. Do lado, era uma casa de esquina. Do lado, o meu tio... Era a padaria do meu tio e tinha o corredor, no fundo era... Seria a casa dos meus tios que cuidavam dessa minha avó. Era uma casa com... Aquelas casas bem antigas, né? E seis quartos, sabe? Cozinha enorme. Minha tia sempre foi uma... Como cuidava da minha avó, todos eles iam para a casa da minha tia. Todos os parentes no interior, a maior parte era de Cambé, Paraná, Catanduva, São Carlos, toda a família. Então, eles costumavam se reunir tudo na casa da minha tia. Então, a casa era grande para acomodar todos eles. MP - Fazer umas festas de família, assim, com todo mundo? Jair - É, depois, depois sim. Depois, eu casado, também com... Já com os filhos, eu já estava com os dois filhos. Aí começou a fazer as festas de... Fazer a árvore, né? Montar a árvore, aí vinha gente de tudo quanto é lado daquela gente. O meu primo: "Como?" "Da onde? Quem?" Tudo ficava até... Ia perguntar para a minha tia: "Tia, quem é esse Fulano?" Ela falava: "Esse aí é seu primo." É tanta gente, que ficava tudo perdido. MP - Árvore que o senhor diz, é o quê? Aquela árvore... Jair - Do início da família. MP - Ah. Aquela árvore genealógica? Jair - Exato. MP - As origens... Ah, está certo. Jair - As origens, tudo. Então, cada um que chegava, ia colocando os seus. Dentro dos seus galhos ia colocando o nome da... Fazia as etiquetas, né? Então, daquele galho, tal, Fulano era... Foi muito bacana, nossa MP - Tinha na parede uma árvore... Jair - Na parede, uma árvore. Cada um que chegava, colocava o nome. Então, você é da família tanto, você colocava, sabe? O filho, não sei o quê. Então, ia fazendo as seqüências. MP - Ah, que bacana. Jair - Foi muito... Foram umas três, quatro... Quatro festas dessa, né? Esperavam passar uns quatro, cinco anos, aí juntava todos, porque aí era... Alguém já casava, já tinham mais filhos. Então, aquela árvore ficou enorme. Até que um dia acabou... O pessoal desgostou. Começaram a reclamar. Então, a minha tia falou: "Não vou fazer mais nada." MP - Isso por parte de mãe? Jair - Por parte da minha mãe. Avós paternos MP - E por parte de pai, o que o senhor sabe da história dos avós? Jair - Olha, muito pouco, pouco mesmo. Dos avós, praticamente nada. MP - Brasileiros? Jair - Português, o pai do meu pai. Pelo que eu sei. Quer dizer, nunca me aprofundei também em saber das procedências? MP - A atividade desse avô, o senhor sabe? Jair - É mais lavoura. Na época já não tinha nada para aqueles lados, que era Dobrada, Taquaritinga, não tinha. Era só lavoura mesmo. Não tinha comércio nenhum. MP - O pai do senhor passou a infância lá, então, na lavoura? Jair - É, passou a infância no interior... MP - Uma família de muitos irmãos? Jair - Não, eles eram em três. Em três, três. Seriam duas... Não, quatro. Eram três mulheres e ele de homem. Único homem da família. MP - E o avô do senhor, então, trabalhava na lavoura? Jair - Trabalhava na lavoura. MP - E a avó? Jair - Então, não cheguei a conhecê-la também. Ele, o pai do meu pai, conheci muito pouco. Eu era muito pequeno, quando eu... Ele estava doente. Foram os últimos momentos dele. Eu me lembro que eu era bem pequenininho, uma vaga lembrança do meu avô. MP - Mas essa casa do senhor, essa fazenda, o senhor conheceu? Jair - Não. MP - Não? Jair - Também não. Lembranças do pai e da mãe MP - E o senhor sabe quando o pai do senhor sai lá do interior? Jair - Ele casou e veio para São Paulo. MP - Se casou lá mesmo? Jair - Se casou lá mesmo. MP - O senhor sabe como é que ele conheceu a sua mãe? Jair - É naquelas festas de footing, que eles chamam? Aqueles rodeios na praça, tal, foi aí que eles se conheceram. Que o meu pai, na época, também era viúvo. Acho até que deixei de comentar isso. Era viúvo. Já tinha dois filhos. Tinha um casal e no interior, por ser essas condições, ele teve que casar e ir embora porque pouca gente aceitava isso, né? O viúvo, tal, no interior, ainda? MP - Qual o nome do pai do senhor? Jair - José Batista de Oliveira. MP - E da mãe? Jair - Elvira Gorne de Oliveira. MP - E o senhor sabe o que seu pai fazia nessa época do interior, trabalhava com o quê? Jair - Trabalhava na roça também. MP - Ele também? Jair - Também trabalhava na roça. MP - Para vender ali mesmo? O senhor sabe algum detalhe mais? Jair - Ele trabalhava mais como empregado mesmo. Não tinha fazenda deles ainda. Eles eram empregados e veio para São Paulo e aqui ele começou a trabalhar de pedreiro. Ele não tinha uma profissão, não tinha nada. Trabalhava de pedreiro. Depois virou um empreiteiro, que aí ficou tomando conta de obras e coisa. Ele começou a melhorar um pouquinho mais. Ficou mais esperto que os outros. (risos) Sobressaiu. MP - O senhor lembra do pai saindo para trabalhar, quando o senhor era criança, de acompanhá-lo, de voltar do trabalho? Que lembrança o senhor tem? Jair - O meu pai... Ele saía muito cedo. Praticamente de madrugada. Então, é difícil a gente o ver de manhã. À tarde sim. À tarde, para a noite, então esperava para jantar, alguma coisa assim. Gostava de tomar as suas pinguinhas e a primeira parada dele era sagrada. Parava no bar, tomava umas... Aquelas pinguinhas dele. Depois ia para casa, para o jantar. Aí, sim, tinha o contato. Mas de manhã cedo, a gente estava tudo dormindo. MP - Como o senhor descreveria o seu pai? Jair - Meu pai é um homem... Era muito... Era muito preocupado com a família. Não deixava faltar nada, tentando querer sempre dar o melhor. Não gostava de prestação de jeito nenhum. Se ele tinha dinheiro, ele comprava. "Se não tem, não compra, não faça." E depois de muito tempo, nós conseguimos mudar um pouquinho a cabeça dele e colocar. Mas aí nós já tínhamos condições de mostrar para ele, porque ele mesmo não... Ele não queria esse... Prestação para ele, nossa Era um terror. Comprar, se tem dinheiro. "Se não tem, não compra, não faça. Prestação, não quero." E, às vezes, lembro até que a primeira televisão, que as minhas irmãs, trabalhando, compraram... O carnê escondido às sete chaves porque eles não podiam... Ele não podia pegar. Se soubesse que tinha um carnê. Estamos pagando... Falaram que tinham comprado, juntado dinheiro, tal e teriam comprado essa televisão. Mas não foi. Foi comprado à prestação. MP - E vivia de aluguel, seu Jair? Jair - É. Até os meus 22 anos, nós vivíamos de aluguel. Casa da infância MP - Aonde era essa casa? Jair - Essa casa, na Vila Nova. MP - Vila Nova. Jair - Na Vila Nova, porque nós rodamos muito, né? Então, da Vila Nova, onde eu nasci, eu fui para a Vila Madalena. Depois da Vila Madalena fomos para a Vila Olímpia. Da Vila Olímpia, voltamos para a Vila Nova. Aí, eu estava com seis, sete anos, mais ou menos. Tem pouco tempo, nós fizemos um rodízio até, mais ou menos. Aquela coisa de aluguel, um ano, dois anos. Então, saía de um lugar, ia para outro. E fiquei na Vila Nova até os meus 22 anos, sempre de aluguel, que ele não queria. E um dia nós... O dono pediu, pediu o imóvel. Nós tínhamos que desocupar, e nós pagávamos naquela época 50 reais de aluguel. É até uma história... Foi até interessante para conseguir fazer o meu pai ver que era uma vantagem. Então, o próprio dono ofereceu uma outra casa por 200 reais. E eu tinha, naquela época, estava juntando um dinheirinho. Eu tinha 1000 reais e precisava mais 500, que eu tinha visto uma casa que não estava acabada. Mas como o meu pai, pedreiro, tinha muita... Tinha porta, sarrafo, tábuas, tinha muita coisa naquele quintal. Então, eu falei para ele: "Vamos ver essa casa, que o senhor vai ver que é um negócio bom." Ele: "O que que é?" Eu falei: "Não. Vamos comprar e vamos ver porque nós estamos aqui já há tantos anos. Se a gente ficar mais três, quatro, cinco meses até nós terminarmos essa..." A casa estava semi acabada. "Até nós terminarmos a outra casa, nós podemos mudar para esse lugar e pagar uma prestação..." Quando falei em prestação, ele já... Ele preferia pagar 200 de aluguel, do que pagar 200 de prestação de uma coisa que era nossa. E nós conseguimos fazer a cabeça dele e tal. Mostramos a casa. Ele foi lá, olhou, olhou, olhou. Mas faltava 500 reais e eu pedi para um dos donos da Niccolini. Eu pedi emprestado 500 reais para pagar bem parcelado. E ele me emprestou, vendo se era um bom negócio, se o meu pai conhecia. Falei: "Meu pai é pedreiro. Ele sabe. Só de material lá tem mais ou menos isso. Então, uma mulher está desfazendo uma coisa, e é um bom negócio." Ele falou: "Então, tá. Fala com o Zé Roberto. Ele pega o dinheiro lá." Aí fui lá com o Zé Roberto, que ele tinha emprestado, na forma de pagamento, ele falou: "Não, não. Paga como você puder pagar." Porque eu já trabalhava na Niccolini já há um bom tempo e ele me fez essa gentileza de emprestar esses 500 reais. Eu fui pagando os 70. Nessa altura, eu estava só... Era eu e o meu irmão, nós éramos solteiros. As duas irmãs já eram casadas na época. Então, eu e o meu irmão assumimos, e fazia aquele mutirão, no final de semana, com toda família, e vamos. Terminamos... O telhado já estava coberto. Rebocamos, botamos a janela e nos jogamos lá dentro, porque não tinha... O chão já estava tudo batido, tudo. E depois arrumava uma parte, encostando para lá, para cá. Aí nós deixamos de pagar aluguel foi nisso. E uma casa que eu comprei junto com o meu irmão, e foi feito um pacto de enquanto os meus pais forem vivos, nem eu e nem ele iriam mexer na casa. "Passe o que passar, necessidades que vocês passarem, nós não vamos mexer na casa e a casa é deles, né?" E faleceram os dois. O meu irmão usou a casa bastante. Hoje está só a minha cunhada lá com os filhos, está morando nessa casa. Eu, graças a Deus, consegui uma coisinha a mais. Consegui fazer a minha vida independente dessa casa. MP - Essa casa fica aonde, seu Jair? Jair - Fica na Cidade Adhemar. Fica perto da Casa Palma. Naquela época era... Hoje está bonito. Nós temos essa casa até hoje e está lá, está a minha cunhada, está morando na casa, usando até hoje. MP - Queria voltar um pouquinho antes dessa casa, para aquela casa onde o senhor morou. Foram quatro casas na infância e depois voltou para a Vila Nova. Jair - Para Vila Nova, é. MP - Dessas casas de infância, qual foi mais marcante para o senhor? Jair - Foi da Vila Olímpia. Da Vila Olímpia, porque... Por que da Vila Olímpia? Porque ali tinha caça aos pássaros. Então, eu era pequeno e era perto do Jockey... Perto da Hípica, né, perto da Hípica. Então, passava aqueles cavalos, então aquelas recordações, que a gente colocava, de um lado era uma tecelagem. Então, a gente colocava uns fios de linha atravessando a rua e quando o carro passava, batia no peito, fazia aquele "tropé", sabe? Aqueles cavalos, aqueles puro sangue... (risos) MP - Mas os cavalos passeavam nas ruas? Jair - É. O pessoal saiu para... Saiu lá da Hípica e passavam lá com aqueles cavalos bonitos, que a gente pegava aquelas linhas da tecelagem, passava de um lado a outro da rua e escondia lá no mato. Então a gente ficava ouvindo o "tropé" que eles faziam com aqueles cavalos, batendo no peito. Era uma farra. E o rio, também, que tinha no fundo, quando enchia. MP - Que rio era? Jair - Era o Rio Uberabinha. E depois, por coincidência, quando eu fui para... Saímos da Vila Olímpia, fui para a Vila Nova, eu morava... Dava os fundos para o rio, na Vila Olímpia. Quando eu fui para a Vila Nova, o rio passava em frente a minha casa. Tinha só quatro casas do outro lado do rio e tinha uma ponte que servia só essas quatro casas, que também era o Rio Uberabinha. MP - E esse rio era de quê, de nadar, de pescar? Jair - Não, não, rio... Era um rio... Na época, sim, até que a gente fazia a farra. A gente cercava o rio. Travessuras da infância MP - Como era essa história? Jair - A gente cercava o rio, que era pouca água. Então a gente ia cercando com a folha de bananeira, colocando umas estacas, fazendo, enchia, fazia uma piscina e nadava nesse rio. Então, isso tudo na Vila Nova. MP - O que o senhor falou da caça dos pássaros? Que história é essa? Jair - Não, é que na Vila Olímpia, na época, na Berrini hoje, ali era um córrego. Era um córrego de água limpa. No rio Pinheiros nós íamos nadar na ponte lá do Socorro. Nós íamos nadar nesse rio Pinheiros. Do lado, onde é a Berrini, também tinha um rio, um riozinho também de água bem limpa, que a gente pescava ali. Então, um lugar bem gostoso, assim, para se caçar pássaros, nadar... MP - Caçava como? Era estilingue? Jair - Não, não. De gaiola? Era uma gaiola com pão, e pegava. (risos) MP - Colocava o pãozinho na gaiola e ele entrava. Jair - É, botava o alpiste. Eles entravam, pegava, levava para casa e cuidava. Aí vendia, trocava com outra, tal. Fazia aquelas coisinhas de criança mesmo. MP - E esse banho no rio, como era? Fugia da escola para ir nadar ou era no fim de semana? Jair - Não, não. Na Vila Olímpia eu ainda não estava na escola, ainda. Naquele tempo era só com sete anos mesmo. Quer dizer, não tinha outro. MP - E brincadeira na rua tinha muito, também? Jair - Tinha, tinha bastante. Brincadeiras da infância MP - Qual era a brincadeira favorita do senhor? Jair - Aquele pega-pega, queimada... Aquele "o macaquinho gosta"? (risos) MP - Como era? Jair - Quando alguém saía de casa, comendo alguma coisa, então quando cruzava com alguém: "O macaquinho gosta" Era obrigado a dividir um pão, ou um doce. Então, a primeira pessoa que você visse tinha que pedir para eles assim: "Licença". Então, licença, quer dizer, você não precisava dividir com ninguém. Você via alguém, pedia licença. Então, não precisava dividir. Se alguém pegasse você desprevenido: "O macaquinho gosta" Então era obrigado a dividir o pão, o doce, coisa... (risos) MP - E dentro de casa era muita brincadeira, seu Jair? O senhor lembra dos pais do senhor brincando com o senhor, com os irmãos, como é que era dentro de casa? Jair - Não, meu pai e minha mãe nunca foram assim de brincar, sabe? Foram muito reservados. Não sei por que, mas sempre foram assim. MP - Mas tinha passeio em família, por exemplo? Jair - Era difícil. Assim, vamos dizer que na época, aquele negócio de piquenique, excursão, não. Nunca, nunca. Nós nunca fizemos isso. MP - Ia passear no Centro da cidade, por exemplo? Não saía de lá? Jair - Era difícil. Era coisa, assim, de final de ano, que a gente... Meu pai pegava todos, e levava para cidade, para ver roupa, que era o final do ano, para ter o Natal, essa coisa toda. MP - O senhor se lembra dessas compras de fim de ano? Jair - Lembro. Não era sempre que a gente queria. (risos) Conforme o bolso. Então, "eu quero isso, eu quero aquilo." Não, não tinha. Não era... MP - E era roupa, era brinquedo? Jair - Era roupa. Só roupa. MP - Ia como para a cidade? Era carro? Jair - Não. MP - De bonde? Jair - Era de ônibus mesmo, que era na Avenida Santo Amaro, então era de ônibus. A gente ia lá para o Centro, fazia as compras e, de vez em quando... Quer dizer, meu pai... Era aquele final do ano, ele fazia disso uma... Como se fosse uma... O que ele mais adorava era um leitão de final de ano. Então, ele vinha lá, vinha aquele leitão, às vezes, até com leitão vivo. A gente tinha um quintal muito bom lá no fundo. Então, ele colocava aquele leitão lá para engordar. Então, a gente saía para as feiras, ia pegar... Pegava todos aqueles restos de feira, dava para o leitão. Depois matava o leitão. Para ele aquilo lá era uma... Era uma festa. Então, todo ano, final de ano, era... Tinha que ter um leitão, um cabrito. MP - No dia de Natal ou era Ano Novo? Jair - Natal. Casa da infância MP - O senhor falou que tinha um quintal grande, como era essa casa? Jair - Essa casa de um lado era germinada. Eram quatro casas, sendo germinadas de um lado, corredor, corredor bem longo, assim, na lateral. Corredor no fundo, que era esse quintal enorme. Então, ficava bem próximo do rio. Você saía, do portão para, como se diz, dava três passos, você caía dentro do rio. Então, tinha que dar dois, só. (risos) Era um corredorzinho mesmo. Uma pontezinha aqui... Uma casa... Eram dois quartos, só. Então, o nosso era um pequeno. Os meninos dormiam num quarto e o meu pai e minha mãe no outro. Então, a gente era obrigado a dormir todos juntos. MP - Quantos irmãos eram? Jair - Nós éramos em quatro na época. MP - O nome dos irmãos do senhor? Jair - A mais velha é Janete, a Jaci, eu e o meu irmão, José, falecido. Era o caçula. MP - Aí todo mundo dividia o quarto. Dessa época de Natal, do leitão... Alguma história que marcou o senhor na época de criança? Esse leitão crescia lá no pátio? Jair - É, lá no fundo a gente criava... Engordava, né? Engordava esse leitão e um dia antes, o pessoal ia lá e fazia a festa. Que tinha bastante amigos ali. Então, o pessoal ajudava, aquela coisa toda. Primeira escola MP - Foi nessa época que o senhor foi para a escola, seu Jair, ou foi depois? Jair - É, foi na... Na Vila Nova mesmo. Aí comecei a freqüentar nessa casa... MP - Essa casa do rio é Vila Nova. Jair - Aí eu comecei a freqüentar o Martim Francisco. MP - Que lembrança o senhor tem da escola, como era essa escola? Jair - Essa escola, eu nunca fui muito chegado ao estudo mesmo. Eu gostava mais da farra, das brincadeiras. Então, juntava, assim, aquela turminha de briguento, né? Então, era eu com mais dois. A gente vivia arrumando encrenca. A gente não entrava para aula, sabe? E a minha mãe sempre foi muito pacata, nunca cuidou, nunca exigiu, assim, tanto da gente, para ela tomar conta mesmo, né? Então, a gente fazia... Enganava, né? Escondia as coisas, ia cabular, ia para o Ibirapuera para nadar. Travessuras da infância MP - No Parque Ibirapuera? Jair - É. Aonde é a Assembléia. Tem o lago do Ibirapuera e tinha o outro ali, onde era a Assembléia era um outro lago também. Então, nesse lago que a gente ia para nadar... MP - E voltava com a roupa molhada? Jair - Não, tirava outra roupa lá. MP - Tirava toda a roupa... Jair - Tira a roupa e nadava lá. Botava a roupa... (risos) E um dia eu quase morri nesse lago. MP - Como foi? Jair - Eu fui... Não sabia nadar direito, bem. Eu fui ao fundo, quando eu vi, não tinha mais pé. Eu fui me debatendo, me debatendo, daí consegui achar o fundo e saí. Mas fazer o quê? Molecada queria, falou: "Parecia que você não ia voltar mais." Que era tudo pequeno. Depois desse dia, nunca mais eu entrei. Quando eu via água, até hoje, eu tinha até medo. Eu vou com uma calma danada no mar, bem recuado, que eu fiquei meio com trauma de... Quase morri nesse dia. Tomei bastante água e vim, por sorte, eu vim debatendo, eu vim para o raso. Porque se eu tivesse perdido um pouco a noção, eu ia mais para o fundo... Tinha ficado lá mesmo. MP - E sua mãe não ficou sabendo? Jair - Não. MP - Não descobria as travessuras do senhor? Jair - Nada. Dessa daí, não. MP - Descobriu outras? Jair - Não, a gente fazia as coisas bem feitinhas. (risos) Fazia as coisas bem feitas. MP - Mas, o senhor cabulava aula sem ser para nadar, cabulava ou fazia arte na escola? Jair - É, na própria escola. Na própria escola... MP - O que aprontava na escola? Jair - Então, porque tinha... Nós éramos em três. Era eu, tinha o Alemão, e o Nicola. Nós três éramos os fortinhos lá da turma. Então, a molecadinha tinha medo da gente, que quando mexia comigo, os dois... Mexia com o outro, então a gente... Era sempre os três juntos que partia para cima. Então, a gente sempre foi bem unido e ficamos os quatro anos, até mais, que nós cabulamos tanto, que a gente ficou até mais tempo na escola. E era uma... Era uma briga danada lá, do tempo de figurinha. Tirava as figurinhas da molecada, as bolinhas, porque naquele tempo tinha a seqüência, que hoje não tem mais, que era o peão, tinha bolinha, tinha os pipas, que era o quadrado. Hoje é pipa. MP - Fazia o quadrado? Jair - Fazia o quadrado. A gente ia lá arrebentar a linha, o outro do outro lado... A gente ia na turma do outro lado do rio, arrebentava a linha de um e corria para cá e os outros daqui pegavam, os nossos amigos pegavam o quadrado. A gente morava num lugar bem... Na Vila Nova, nesse... Aonde eu morei, do lado tinha uma chácara, tinha um campo de futebol. Ia precisar de alguma coisa e a gente ia lá roubar... Roubar verdura. MP - E levava para casa? Jair - Levava para casa. MP - O senhor lembra de ter roubado o que lá? Alface? Jair - Não, verdura... Alface, alface. Pegava aquilo lá e levava, fazia... (risos) Era uma festa que a gente fazia. MP - A turminha da escola era a turminha da rua também? Jair - Não, quem freqüentava muito lá e que essa parte, vamos dizer, essa parte da Afonso Brás para baixo, que era o meu lado, era a turma dos pobres. E da Afonso Brás para cima, que era a turminha dos riquinhos. É a maior parte que freqüentava a escola, era a turma desses riquinhos. Então, a nossa parte era a turma dos pobres,então, a gente abusava deles lá, tirava as figurinhas, aquele negócio. Eles não brigavam. Depois a mãe compra mais, né? Então, eles não brigavam e a gente se aproveitava disso, de figurinha, bolinha, peão. Então, a gente passava, pegava, levava, eles não... MP - E essa divisão, porque tinha mesmo a parte do bairro que eram de famílias mais ricas? Jair - Exato, é. MP - Que era a parte ali do Jockey... Não, do Jockey, não. Da Hípica, não tinha... Jair - Não, não. Isso aí é Vila Olímpia. MP - Ah, já era... Jair - Vila Olímpia. MP - É verdade. Jair - Nós estamos aqui em cima, já na Vila Nova. MP - Ah, está certo. Jair - Quando eu comecei a freqüentar a escola. MP - Então, tinha essa divisão. Era meio Robin Hood. Ia lá, roubava as bolinhas... Jair - É, ia para cima, pegava, que nem bola, essa coisa. Então, você ia lá, acabava a bola, a gente roubava. Então a gente ia lá, dar uma volta na pracinha, naquela praça Pereira Coutinho. Usava no quintal aquelas bolas de capotão. Então, tinha umas bolas, pegava a bola, um chutando para o outro. Depois a gente ia lá para baixo, rachava até gastar o que restava. A gente subia de novo lá para o bairro rico, lá... (risos) MP - Pegava outra bola. Jair - Aquela coisa de moleque. MP - E o senhor morou nesse bairro até que época, seu Jair? Jair - Morei até uns 22 anos, 23 anos, mais ou menos. MP - Quando o senhor começou a trabalhar, morava aí? Jair - É, já morava aí. Primeiro emprego MP - Qual foi o primeiro emprego do senhor? Jair - Olha, trabalhei em bastante lugares. Assim, mesmo estudando, a única coisa que eu sempre falo até para os meus filhos, eu falo: "A única coisa que eu não fiz até hoje, faltou eu fazer, foi engraxar sapato." Que eu comecei com aquele carreto na feira, né? Carreto de feira. Tinha as freguesas todo o sábado. Pegava aquele carrinho, levava para feira. Tinha as minhas freguesas certas. Ganhava o meu dinheirinho. MP - Esse carreto ajudava a dona de casa a carregar? Jair - Ajudava. É, ajudava a dona de casa a carregar as coisas. MP - Até a casa dela? Jair - Até a casa dela. Aí na casa dela, ela me dava um lanche, um refrigerante. Eu voltava para a feira de novo, fazia outro carreto. E o dinheirinho dava todo... Até os meus 22, 23 anos, o meu ordenado eu dava na mão da minha mãe. Eu não tinha aquela coisa de "Eu trabalho, o dinheiro é meu.", "Dava metade para você, metade..." Até os meu 22, 23 anos, o meu ordenado era todinho da minha mãe. O carreto que eu fazia também era dela. MP - Só aos sábados? Jair - É, o carreto fazia só de sábado, que era o único dia que tinha feira lá, na própria Vila Nova. MP - Era com aqueles carrinhos de rolemã? Jair - Carrinho de rolemã, é. Depois fazia aqueles... Uns carrinhos bonitos, deixava bem bonito. Então, eu tinha bastante freguesa. MP - E a feira era legal, o senhor gostava de ir para feira? Jair - Nossa Eu adorava, adorava. Eu ganhava dinheiro, um lanche. Com um lanche que era sempre quando fazia, tinha as freguesas já certas. Chegava lá: "Espera um pouquinho." Aí ela vinha com lanche, com refrigerante. Então, até voltar para o meu lugarzinho lá na feira, eu já tinha comido o meu lanche. E depois, na hora de ir embora, eu pegava... A gente tinha um galinheiro também no fundo de quintal, então pegava, passava nas barracas e pegava aquelas verduras, aquelas coisas, e levava para casa para a minha mãe cuidar dos frangos. Das galinhas que ela tinha lá, que botavam os ovos, sabe? MP - E em que cantinho da feira o senhor ficava? Ali na saída da feira? Jair - Era sempre, sempre... Não tinha saída. Qualquer lado que você ficava, é sempre início da feira. Nunca na parte do peixe, que cheirava mal. Então, ficava sempre do outro lado. Do lado peixe era... MP - E tinha alguma barraca favorita ali que o senhor gostava de ir? Jair - Não, não tinha porque eu estava sempre no carrinho... MP - Trabalhando? Jair - É, é, trabalhando. MP - Mas era o senhor e vários outros meninos? Jair - É, tinha bastante crianças. MP - Virava uma farra também? Jair - Virava uma farra ali. E era... E eram aquelas freguesas certas. Já tinha, mais ou menos, o horário que ela chegava na feira. MP - O senhor lembra de alguma freguesa em especial? Jair - Eu lembro. Tinha uma japonesa, essa daí que fazia todo o meu lanche. Essa aí era uma japonesa. Segundo emprego MP - E depois do carreto, o senhor trabalhou com alguma coisa? Jair - Depois do carreto, comecei a trabalhar num armazém. MP - Fazendo o quê? Jair - Servindo o freguês. Era um armazém bem pequeno. Foi aí que foi o meu emprego mesmo, assim, fixo. De ficar, foi esse daí. Depois eu fui para uma... MP - No armazém, o senhor devia ter quantos anos, seu Jair? Jair - Eu acho que uns 10 anos, 11 anos. MP - No carreto o senhor era mais novinho? Jair - Era mais novo, era mais novo. Eu estava na escola ainda, que eu fazia isso daí. Eu acho que estava com o quê? Uns oito, nove anos, que fazia esse tipo de carreto. Eu fiquei muito tempo. Eu acho que uns 10, até uns 10, 11 anos, fiquei fazendo carreto e depois fui para esse armazém. Depois fui para uma fábrica de boneca. MP - Fazendo o quê? Jair - Nossa Fazia boneca. Era aquele maço de algodão, um monte de algodão. A gente enchia os paninhos, montava as bonecas, colocava a cabeça, colava, tal. Montava as bonecas de... Umas bonecas de pano. MP - Era uma boneca bonitinha? Jair - Boneca bem tranqueira. Mas devia vender bastante, que a gente fazia muitas. (risos) MP - Onde é que ficava a fábrica? Jair - Era na Indianápolis. Indianápolis, que era Moema, né? MP - O senhor era criança ainda? Jair - Era criança. MP - E muitas crianças trabalhando nessa fábrica? Jair - Trabalhando, brincava, é. Tinha bastante, bastante criança mesmo. Era tudo pessoalzinho ali do pedaço também. "Tem algum amigo que quer vir? Tá, vem para cá." Então, a gente ficava lá porque era um servicinho tão fácil. Não era perigoso. MP - Fazia o quê, exatamente? Jair - Vinha... Não era o esqueleto da boneca. Havia um tecido, o tecido da boneca é tudo costurado e a gente ia enchendo. Enchia as mãozinhas com... Que nem algodão. Um negócio tudo... Não era bem algodão. Que nem uma estopa. Então, a gente enchia os bracinhos, as perninhas, tal, o corpo. Então, a cabecinha já era pronta. Então, a gente colocava a cabeça, amarrava uma linha, cortava, amarrava, enfia o fiozinho para dentro, estava a bonequinha prontinha, assim, bonitinha. MP - E colocava a roupinha... Já era roupinha? Jair - Já era roupinha. Já tinha tudo... O próprio tecido já era... Uma boneca de pano mesmo que chama. MP - Quantas horas de trabalho nessa fábrica? Era o dia todo? Jair - Era o dia todo. MP - Comia lá mesmo? Jair - Não, aí eu ia para casa, dava uma corridinha em casa, almoçava e voltava para lá. MP - E tinha um salário certinho? Jair - É, tinha um salário. Mas era tranqueirinha, também. Era para não ficar na rua. Que a minha mãe adorava. Deixar a molecada na rua era um terror. Então, ela gostava, que pelo menos tinha o retorno, que era o dinheirinho que entrava a mais. Depois daí, eu fui para um... Marcenaria, trabalhar de marceneiro. Lixar as madeiras, envernizar. Fiquei um ano, mais ou menos, nessa... Depois fui para uma fábrica de rádio na Vila Olímpia, uma fábrica de rádio. Depois da fábrica de rádio, eu fui para... Entrada na Niccolini MP - Fazendo o quê, na fábrica de rádio? Jair - Soldando os componentes lá. Fábrica de rádio. Depois eu saí, eu fui para a Encomar, que era uma casa de material de construção. E depois dessa fábrica de material de construção, já estava com 14 para 15 anos, foi quando eu fui com um amigo meu na Niccolini. Era o Alemão, era o meu amigo de infância. Então, ele falou: "Vamos lá para a Niccolini, que eu vou preencher ficha." E tinha o tal do senhor Raul que conhecia o pai dele e tal. E pediu emprego, falou: "Vamos até lá comigo?" Falei: "Vamos." Eu fui lá, fui acompanhar ele até preencher a ficha. Aí o Leonerte, que é do Departamento Pessoal: "Você não quer preencher uma ficha também?" Falei: "Ah, fazendo nada." Eu preenchi também. Falei... Eu tinha emprego. Fui lá, preenchi a ficha e ele mandou chamar nós dois. E o Alemão: "Ah, não, não vou, não. Não é isso que eu quero." E tinha uma moça na Encomar, Iraci, chamava-se Iraci, eu falei para ela: "Poxa, a Niccolini me chamou." Porque a Niccolini era uma empresa grande no bairro. E ela falou: "Jair, e você está aqui na Encomar? Aqui é uma loja de material de construção que não tem futuro. Pelo menos na Niccolini é uma empresa grande, uma firma grande, você pode ter uma coisa bem melhor lá. Se eu fosse você, eu ia. Deixava aqui. Quer dizer, não quero que você saia, mas é para o seu bem mesmo. Vai lá Se ele chamou, vai lá" Aí, eu: "Vamos, Alemão, vamos, vamos" O Alemão: "Ah, não. Não vou Não quero, não quero..." O Alemão queria ser açougueiro, e foi açougueiro depois. Eu entrei na firma, assim, de... Comecei a assumir a Niccolini, assim, sem querer. MP - Onde que ficava nessa época? Jair - Na Afonso Brás. MP - Como era esse prédio, o primeiro prédio da Niccolini? Jair - Então, a Niccolini passou pela Brigadeiro Luiz Antônio, que era uma garagenzinha. Depois teve o outro... Não sei para onde que teve. Teve uma outra passagem, um pouquinho maior, não me recordo agora. Depois foi para Afonso Brás. Afonso Brás era grande. Afonso Brás já era grande a empresa. MP - O senhor já tinha ouvido falar da empresa, então? Jair - É que era próxima da linha onde eu morava também, eu morava na parte de baixo da Afonso Brás. Eu morava bem próximo. Inclusive, eu trabalhando, eu ia de bicicleta, ia para casa, almoçava, voltava. Então, a gente estava ali bem próximo e eu estava num emprego bom, perto de casa... MP - E o senhor começou fazendo o quê, lá? Jair - Eu comecei como ajudante de encanação. Depois eu fui para a máquina de verniz, para envernizar. Depois daí, a Ivete, que trabalhava no caixa, me chamou. Aquela coisa, eu era bom papo, sabe? Conversava com todo mundo. Um dia eu estava no escritório, sentado no sofá e nós começamos a conversar. A Ivete falou: "Você não quer vir trabalhar aqui comigo?" Eu falei: "Ah, se você me arrumar aqui." Ela falou: "Não, eu vou ver aqui. Você quer vir?" Eu falei: "Ah, bem melhor." MP - Ela cuidava de quê? Jair - Eu trabalhava de macacão. Então ela falou: "Vem para cá. Você trabalha no escritório, aqui é mais limpinho, tudo." Falou: "Só que é office-boy. Você vai começar como office-boy." "Ah, se você me arrumar, eu venho para cá." Ela falou lá, não sei com quem. E passou uns dias, me chamou. Aí eu deixei de trabalhar na fábrica, e fui para o escritório como office-boy. Aí depois ela saiu, eu fiquei no Caixa. Tenho conhecimento, trabalhei junto com o Almir no caixa. Depois do Caixa, eu fui para a Contabilidade. Lá na Contabilidade, fazendo Livro diário da firma. Fiquei lá muito tempo, aí foi quando não deu mais, eu pedi um acordo. Foi quando me chamaram, fizeram essa proposta para passar como representante. Origens da Niccolini MP - Antes da gente chegar na fase de representante, queria voltar um pouquinho lá no começo. Quando o senhor entrou na empresa, qual era o tamanho da Niccolini? O senhor lembra? Já era uma empresa grande? Jair - Já era uma empresa grande. Por ser uma gráfica. Na época já era uma gráfica assim de porte, sabe? MP - E produzia o quê? Jair - As embalagens da linha farmacêutica. Trabalhava muito com a Rhodia, com a Laboterápica Bristol, com a Fontoura, Instituto de Medicamento da Fontoura também, a Rhodia... MP - Mas fazia exatamente o quê? Produzia as embalagens? Jair - Produzia as embalagens, os cartuchinhos de remédios. Já era... Foi sempre uma especialidade no ramo farmacêutico. MP - Nessa época, como era o equipamento, seu Jair? O senhor lembra como eram as máquinas? Jair - Olha, eram umas máquinas enormes, perto das máquinas de hoje. Era máquina de uma cor, mas eram umas máquinas enormes, muito grandes. Coisa que hoje as máquinas são, tem até máquina de seis cores, perto daquelas máquinas que era a Chief. Chief, deve ser isso daí, era uma máquina que tinha até escadinha para você subir lá em cima e mexer nas tintas, sabe? Era uma máquina enorme. Então, não era... O sistema era bem diferente. Era tudo com tipos. Tinha máquina de linotipo, que se fazia lá dentro mesmo, tipo uma máquina de escrever, saía todos aqueles chumbinhos. Com tudo aquilo, depois você montava, tinha o montador, depois fazia... MP - Os escritos. Jair - Os escritos, as embalagens, tudo. MP - Embalagens todas de uma cor, o senhor diz? Jair - É, de uma cor, ou até mais. Até mais. Processo de trabalho MP - O senhor entrou em qual função mesmo? Jair - Eu entrei na seção... Na encadernação. Naquela época, nós tínhamos uma seção de encadernação. Onde fazia blocos, fazia livros... Uma encadernação. MP - Que além das embalagens, também tinha esse tipo de... Jair - Tinha, tinha esse setor também, que era um dos setores que fazia parte também. E depois da impressão, pegava todas essas folhas e passava para uma máquina de verniz. Depois eu fui para esse setor também, de seção de verniz. MP - Como era? Envernizar o quê? Jair - Envernizar as folhas. As folhas já impressas. Então, depois da impressão, aí passava esse verniz, aí ia para o corte e vinco para dar o acabamento. Depois ia para o destaque, tirava, depois essas embalagens levava para a máquina para fechamento dos cartuchos. MP - Eu gostaria que o senhor tentasse descrever o processo todo. Eram folhas grandes de papel? Como transformava a folha em embalagem? Como era esse caminho? Jair - Da folha... Quer dizer, tem diversas embalagens em cada folha. Diversas embalagens. Depende muito da quantidade e do... Para você ter uma tiragem, da quantidade e o formato de cada embalagem para ver quantos tem. Tem embalagens que você coloca 15 repetições, 20. Tem outras, como hoje. Nós temos hoje uma embalagem que nós colocamos 130 cartuchinhos de chicletes numa folha. MP - Então, era uma folha em branco... Jair - Então, era uma folha em branco, aí ia para impressão. Na impressão... MP - Naquela época era linotipo? Jair - É, era linotipo. Linotipo, que eram todos... Montagem. Linotipo. Depois, essa folha impressa passava para envernizar, envernizava essa folha... O verniz nada mais é para dar um brilho. Para dar um brilho e fixar a tinta. Para não ter o decalque, para não ter o atrito. Então, o verniz protegia a tinta. Depois de envernizar, ia para um corte e vinco. Esse corte e vinco, essa faca era feita lá dentro mesmo da própria Niccolini. Que era numa máquina tico-tico, que era tudo... Hoje é laser. Antigamente era tudo no tico-tico, você cortava toda aquela... MP - Era manual? Jair - É, tudo, tudo, artesanal mesmo, sabe? Então você montava, cortava, ajeitava tudo na mão. Era tudo, tudo praticamente artesanal mesmo. MP - Tico-tico o que era, uma máquina? Jair - É, chamava tico-tico. Era uma máquina de serra. Você contornava todas as embalagens, sabe? A tábua. Aquela tábua você ia contornando todinha, que já estava toda riscada. Ela estava toda riscada para fazer os contornos da própria faca da embalagem. E esse tico-tico você tinha que ser um profissional mesmo, mas tudo artesanal. MP - Ia como que dirigindo a mão. Jair - Dirigindo. Ia vindo para cá, para lá, vai contornando. Tem a curva, tal. E aí saía a embalagem. Aí colocava todas as facas nesse vão, colocava as lâminas, aí ia para a máquina do corte e vinco. Depois desse corte e vinco, ia para o destaque. E o destaque tirava os excessos de cartão. Ficaria só o cartucho, só a embalagem mesmo. Aí dessa embalagem, depois ia para uma outra máquina... Seria a seção de fechamento do cartucho. MP - Porque entregava a caixinha já colada? Jair - Entregava já colada na lateral. Mandava assim fechada, mas colada na lateral. Aí no laboratório, quando tinha manual, então armava-se o cartucho, colocava o produto dentro. Ou se não, tinha a máquina semi-automática. Colocava na máquina, a máquina mesmo armava, fechava a parte debaixo. Armava o cartucho, jogava as coisas dentro. Hoje é tudo... Hoje não tem semi-automático... Avanços tecnológicos MP - Hoje como é esse processo, seu Jair? Jair - Continua o mesmo ainda, só que as facas eram ... Não são mais artesanais, as facas são feitas à laser. Então, é muito mais precisa. Antes, tinha uma diferença, por ser manual, uma faca da outra podia dar uma diferençazinha. E hoje, não. Hoje, de um desenho de faca, você faz todos com a mesma repetição. São idênticas, não tem como. É laser, não tem como... Era uma um pouquinho maior, outra menor. Não, elas são perfeitas. MP - E a impressão também é diferente hoje? Jair - A impressão, sim. A impressão é bem diferente. Teve processo no linotipo, depois teve os filmes, que era gravado com filmes. E hoje já estamos na fase já de disquete. Você não precisa mais tirar um filme. O próprio disquete, você coloca na máquina, essa máquina passa direto para a chapa, sem ter necessidade de você fazer um filme para gravar uma chapa, a não ser que você queira um filme. Aí, do próprio disquete, você tira um filme. MP - E a parte de recorte dos excessos continua igual? Jair - Continua igual. Até o processo de destacamento até hoje é o mesmo, que é na marreta. MP - Como é? Jair - É na marreta. É uma martelo de madeira. E você tira, vai ter que bater, o pessoal que fica batendo e tira as caixas do... É tão difícil, assim, explicar como é que é. MP - É como se destacasse? Jair - É como se destacar, você contornando a faca, sobra sem... A folha é quadrada. Então, a que vai interno tem sempre os cortes ou, então, daqui dá o excesso. Dá um excesso de cartão. Esse excesso é que é tirado para formar esse, você tira só esse miolo, aqui. MP - E com a marreta bate aonde? Jair - E com a marreta bate, você tira... MP - A borda? Jair - As bordas ou até, às vezes, até interno, na própria embalagem para ela sair por baixo. E fica só o contorno, só da própria peça que você tirou de dentro. Aquele maço de embalagem que você tirou de dentro do cartucho. MP - E naquela época, depois de pronto, isso tudo era embalado e levado para os laboratórios? Jair - Para os laboratórios. É que hoje o processo é muito mais... Pelo maquinário dos próprios laboratórios. Então você tem que fazer embalagem hoje perfeita para poder funcionar. Não precisa parar uma máquina dessa porque cada minuto que pára, você tirar uma embalagem que deu um probleminha tirar, se perde uma produção violenta. MP - Depois dessa fase de produção o senhor foi, então, fazer esse trabalho no escritório? Jair - Sim. MP - Como office boy? Jair - Esse outro processo eu fui conhecendo. Conhecendo, porque como eu trabalhava lá na gráfica, eu fui conhecendo, mas eu não cheguei a trabalhar nesse processo. Que eu chegava só a envernizar as folhas. Aí eu pegava as folhas depois da impressão, envernizava e depois eles levavam para um outro setor, que era o corte e vinco. Processo de trabalho MP - Esse processo de envernizar, o que era? Era a pincelada mesmo, era um jato de verniz, como era? Jair - Não, era um cilindro. Uma máquina com cilindro, passava essa folha que tinha uns rolos de verniz. Verniz era um líquido. Então, nesses rolos ficavam girando, e essa máquina passava, levava a folha, pegava a folha assim, levava a folha junto com esse cilindro, passava no rolo e saía a folha envernizada. Aí essa folha envernizada passava por uma estufa e lá na frente caía, já caía sequinho, pronto. Já podia colocar uma em cima da outra que não decalcava. MP - E o senhor fazia o quê, exatamente? Jair - Tirava essa folha de uma pilha, colocava uma por uma. Avanços tecnológicos MP - E hoje como é esse processo? Jair - Esse processo hoje tem máquinas. Como a Niccolini. A Niccolini hoje tem máquina que já é seis cores. Máquina até de seis cores, mais o verniz. Então, na impressão já passa também pelo verniz, já sai lá na frente pronta. Não tem mais aquele processo de você fazer a impressão e ir para uma outra máquina. Hoje já tem as máquinas já com a própria seqüência. Já sai a embalagem envernizada. MP - Depois o senhor falou que tem o corte e o vinco? Jair - É, corte e vinco. Aí depois... MP - O vinco o que é? Jair - O corte e vinco já é na seqüência. O corte e vinco já faz a... MP - Que é aquela dobradinha? Jair - Exato, é. Aí você montando, ela fica quadradinho, do jeito que você montou essa faca. Dia-a-dia de trabalho MP - O senhor acompanhou isso esse tempo todo que o senhor trabalhou, mas envolvido diretamente, o senhor estava mais na parte administrativa? Jair - Na parte administrativa. MP - Como era esse trabalho na rua, o senhor gostava? Jair - Eu gostava, era interessante... Eu gostava de estar fora, livre, sabe? Mexendo com as coisas. Sempre gostei, assim, de ficar ao ar livre. Interno, mesmo... Depois, eu não sei como agüentei tanto tempo na parte da contabilidade. Que aí me deixaram interno. MP - E na contabilidade o senhor fazia o quê, exatamente? Jair - Eu fazia o Livro diário da firma. Depois, tinha aquela gelatina. Aquelas folhas, eram como se fossem um papel carbono. Aí você pega aquela folha e passava naquela gelatina. Era um rolo de gelatina, você decalcava em cima, tirava fora, pegava o Livro diário da firma e colocava tudo. Repassava tudo para o livro diário. Tudo, tudo que tinha da contabilidade, os documentos. MP - E era tudo manuscrito? Jair - Não, tudo na máquina. MP - Datilografado? Jair - Datilografado, exato. MP - Então, datilografava nessa folha mais fina? Jair - Nessa folha mais fina, que era com carbono. Como se tivesse um carbono, aí você transportava. Dessa folha, você passava para a gelatina. Da gelatina, você pegava o Livro diário da firma, que era o mesmo tamanho, que eram umas folhas grandes. Que era o livrão diário. Você colocava em cima, aí transportava, registrava tudo. E aquela folha ficava arquivada, que perder aquela folha não tinha importância. Tendo o Livro diário da firma estava todo o registro de pagamentos, ordens, banco, tudo, tudo, tudo. MP - Nessa época da contabilidade, quantos anos o senhor tinha? Jair - Acho que 18 anos, 18 anos. MP - O senhor não tinha casado ainda? Jair - Não. MP - Foi casar quando? Jair - Casar depois de 10 anos, 28 anos. MP - Ah, 28. Tem chão. Jair - Ainda tem. (risos) MP - O senhor conheceu o Aché antes da esposa ou... Jair - Ah, sim. MP - É? (risos) MP - Como o senhor entrou em contato com o Aché? Foi nessa época da contabilidade? Jair - Então, foi bem próximo do casamento, inclusive. Não muito, que eu falei: "Não, faz tempo." Não, não foi. É porque eu estava com 12 anos, mais ou menos, quando eu saí e depois com 13 anos eu me desliguei da firma. Eu me desliguei, mas aí eu já estava namorando com ela nesse tempo. Já estava visitando o Aché. Eu comecei a namorar. Então, já faz 30 anos, 31. Namoro e casamento MP - Vamos falar primeiro do casamento ou primeiro do Aché? O que o senhor prefere? Jair - Foram os dois na mesma época. (risos) MP - (risos) Então vamos falar primeiro do casamento. Quando é que... Jair - É o casamento, o casamento foi mais rápido. (risos) O Aché dura até hoje. MP - Como o senhor conheceu a esposa, seu Jair? Jair - Eu conheci minha esposa do bairro mesmo. Do bairro. MP - Ela morava lá? Jair - Ela morava. E nessa época eu tinha meu fusquinha. Que eu consegui comprar um carrinho na época. Então, eu passava em frente da casa dela, mas nunca tinha notado assim alguma coisa. Tanto é que um dia a minha irmã falou: "Pôxa, você viu que menininha bonita que tem aqui no bairro?" Eu falei: "Não." "Aí, está do lado." E comecei a passar e começar... Aí comecei a reparar. E a minha cunhada falou: "Você não consegue ela, não." Eu falei: "Como não? Você vai ver." Ficou um desafio. E um belo dia, eu passei, fiquei uns cinco metros para baixo. Chamei, ela veio, ficamos conversando, tal. Ela comentou do pai dela, que eu tinha o cabelo meio comprido. Falou: "Poxa, meu pai se ver ele aqui, vai..." E o pai dela veio mesmo. Tinha um terreno baldio do lado, o pai dela estava lá mexendo em alguma coisa. Quando saiu, falou: "O que que é?" Falou: "Não, o rapaz veio pedir informação de rua." "Ah, bom." Ele olhou assim, meio... Entrei no carro e fui embora. Mas já tinha iniciado um papo. MP - Ela ficava ali na porta, ali na janela? Jair - Ela ficava na porta. Depois ela ficou o tempo todo, ela sabia o meu horário de vir, ela ficava ... (risos) MP - O senhor voltava do serviço, ela já estava lá? (risos) Jair - Era para ir, voltava. Ela não saía do terraço, depois... (risos) MP - Era um terracinho que tinha lá? Jair - Era um terraço acima da rua. Então, ela ficava no terraço, esperando que eu passasse por ali. MP - E o senhor lembra do primeiro passeio que fez com ela? Jair - Lembro. Foi no tobogã do Ibirapuera. MP - No parque? Jair - No parque Ibirapuera tinha aquele tobogã. Na IV Centenário, entrando pela IV Centenário tem um tobogã enorme. Foi ali que nós começamos... Que eu saí, inclusive, fui junto com a minha irmã, tal. Nós fomos de carro com a minha irmã e foi o nosso primeiro passeio. MP - O que era? Subia lá em cima e escorregava? Jair - Subia lá em cima e depois descia, "chuuuuu." MP - Mas não caía na água? Jair - Não, não. Ali não. Sentava em cima daqueles sacos. Descia aquilo numa velocidade enorme. MP - E muito tempo de namoro? Jair - Foi um ano e meio. MP - Um ano e meio? Jair - Não, era a nossa... A nossa intenção era mais porque quando eu fui, quando eu entrei para pedir noivado, tudo, pedi um tempo bem maior. Noivado MP - Teve, assim, pedido de noivado? Jair - É. MP - Como foi? Jair - Tem que pedir, pedir a mão e tal. Se informar para ficar noivo. MP - O senhor foi na casa dela? Jair - Fiz uma surpresa, que foi no aniversário dela. MP - Como foi? Jair - Levei as alianças, pedi ela em namoro... MP - No dia do aniversário dela? Jair - No dia do aniversário. Tem que ter a cara de pau. No meio de todo mundo, pedi e alguém atrás me ajudando. (risos) "Fala isso, agora isso." (risos) MP - Foi o senhor sozinho ou o senhor foi acompanhado com a família? Jair - Não, nessa altura eu já conhecia toda a família. Então, foram todos, que era aniversário dela. Então, foram todos, mas da minha parte, praticamente todo mundo já sabia. Só ela mesmo, para ela era uma surpresa. Ela não esperava também. Os pais dela sabiam que eu ia propor. MP - No meio da festa? Jair - No meio da festa. Então, parou, fui pedir para o noivado, tal. E falei também que não era minha intenção... Ficar noivo, sim, mas casamento ia demorar um pouquinho mais, porque eu queria primeiro ter a minha casa, tudo. Mas aí o namoro foi mais rápido. Aí o pai dela ofereceu um terreno do lado da casa dela. "Se quiserem construir, podem construir aqui do lado, tal." E lá fui eu. MP - Esse ficava aonde? Jair - Construiu rapidinho... MP - Então, retomando, o senhor estava contando do... R - Do noivado. Então, nesse dia, falei que nós íamos ficar noivo, mas o casamento tinha que esperar porque eu queria construir primeiro, fazer primeiro a minha casa para não pagar aluguel e depois nós iríamos pensar no casamento. Mas aí passou um tempo. A gente estava já com um ano e... Um ano, mais ou menos, entre namoro e noivado. Aí comecei a procurar um terreno. O meu sogro tinha um terreno do lado da casa dele e me ofereceu esse terreno para que não... Como era a única filha mulher. São dois filhos. Então, ele falou para ela não ficar longe da mãe. Falou: "Você aceita esse terreno aqui do lado? Aí você constrói aí para ela ficar perto da mãe e tal. Você também está com todo pessoal aqui do lado." Falei: "Bom, ao invés de investir no terreno, vamos construir aqui, então." Aí contratei meu pai para iniciar a obra e, no final de semana, eu e ela pegava na massa lá. Nós íamos... Fazíamos, ajudava o meu pai a carregar massa, fazia. Ia mais gente também lá de casa. Adiantava, a casa ficou pronta. Nós marcamos o casamento. MP - Uma casa bonitinha? Jair - Bonitinha. Um quarto... Um quarto e cozinha. A cozinha bem moderninha, sabe? Bem... MP - Moderninha como? Jair - Moderninha, assim... Tinha uma divisão na própria cozinha, era uma cozinha e uma copa sem parede. Era só um pilarzinho no meio, sabe? Muito bem decoradinho. Um quarto bem grande. E no fundo, a lavanderia. Fizemos um negócio bem bonitinho. Um terreno grande. Fizemos no fundo do quintal. Então, ficou como se fosse uma edícula. Aí ficamos ali quase três anos. Já tínhamos a Patrícia. A Patrícia nasceu ali. Dia do casamento MP - O casamento mesmo, o senhor casou na igreja... Jair - É, casamos na igreja. MP - O senhor lembra alguma coisa do dia do casamento? Jair - Olha, eu casei, eu estava com 28 anos, eu pesava 58 quilos. Era magrinho e quando mandei fazer o meu terno, mandei fazer o meu terno bem mais largo, que é para apresentar um pouquinho de músculo, alguma coisa, porque eu tinha vergonha. (risos) 58 quilos, eu era magro. Era magrelo mesmo. Então, mandei fazer terno um pouquinho mais, um pouco mais cheinho. MP - Como era esse terno? Jair - Um terninho marrom. Mandei fazer bem mais cheinho um pouquinho, mais largo, então enchia um pouquinho mais. Fazer alguma coisa para apresentar um pouquinho mais de corpo, que eu era magro demais. E a nossa festa foi feito... Foi tudo feito com os doces. Foi tudo feito doce em casa, que a minha sogra faz uns doces maravilhosos. MP - O bolo como foi? Jair - O bolo também foi ela que fez. Fez questão de fazer o bolo, todos os doces. Não foi nada de mandar fazer fora. A única coisa que entrou foi só bebida, porque foi no salão da Brahma, lá em Santo Amaro, salão da Brahma. Então, o chopp foi por conta da Brahma. E foi tudo feito, doce caseiro, foi muito bonita a festa. Aí, nós saímos... Vou contar que a gente estava indo para a Lua de Mel. e eu tinha... Acabei de vender o fusquinha e comprei um outro fusca. E nesse trajeto que nós fizemos, nós fomos para Campos de Jordão... Não, para Poços de Caldas. Então, nesse trajeto que nós fomos, eu tinha vendido meu carro, completei, tudo, e chave de roda, essa coisa... Macaco, chave de roda, não sabia onde é que estava. Então, caminhando, a gente estava lá em Pirassununga, Pirassununga é lá por perto. E na madrugada furou um pneu. Nós, com todas as malas, com dinheirinho no bolso, que tinha que passar as coisas, vamos... Ladrão naquele tempo era difícil, mas podia acontecer? Aquela escuridão tremenda. Fui procurar a chave de roda, não achava no carro. Para levantar o macaco, eu não tinha, não achava. Eu falei: "E agora?" E nós dois naquele... Disse: "O que nós vamos fazer aqui? Não tem o que fazer." E roda, e tira as malas, põe tudo no chão, olha... Chave de roda, não tinha... Para levantar, o macaco não tinha. Aí, nisso veio um Dodge, um Dodjão passou por nós. Lá na frente, naquele silêncio, escutei, "vrom, vrom." E ele veio de frente. Veio na contramão, no acostamento, veio de frente para nós. Dois homens e uma mulher mal encarada. Falei: "Nossa" Quando escutei lá embaixo, que ele roncou, falei: "Ele está voltando." Aí peguei dinheiro, reparti, botamos na meia, enfiou dentro... O que nós vamos fazer? Não tem que correr, não tem jeito. Aí esse pessoal chegou, desceu, falei: "Agora foi. Assalto, vão levar tudo, estou perdido." "Precisa de alguma ajuda?" Falei: "A chave do macaco, eu não tenho a chave do macaco." "Ah, vamos dar um jeito aí." Ele fez, começou a trocar. Falei: "Vai preparar o carro, vai levar tudo, vai largar nós aqui." E aquele medo danado. Ele foi, completou tudo aquilo, arrumou, tirou toda a roda, botou pneu, ajeitou, tal. Falou: "Bom, vamos embora. Está tudo pronto. Olha, vou andando aqui na frente, vocês vão atrás e mais uns oito quilômetros para frente tem um posto de gasolina, você ali manda consertar isso aí, tal." Falei: "Está bom." E tal, né? "Mas será que é só isso?" (risos) Estou pensando que eles iam fazer alguma coisa a mais. E um pouquinho mais para frente, 20 quilômetros para frente, ele deu sinal, que tinha um posto de gasolina. Então, deu sinal, tal. "Pára aí." "Muito obrigado." Que alívio. (risos) Pôxa vida, não foi nada daquilo que a gente estava imaginando. Falei: "Ainda tem gente boa." Agradeci demais: "Vamos tomar um café?" "Não, não, muito obrigado. Boa viagem, boa viagem." Já foram embora e eu... Um mal danado, achando que eu... Aquele dia, falei: "Hoje fomos para o brejo." MP - Chegaram em Poços de Caldas sãos e salvos. Jair - Chegamos em Poços de Caldas sãos e salvos. MP - E foi boa a viagem? Jair - Foi bacana. É, depois deu tudo certinho. Aí, quando eu voltei, eu descobri onde é que estava a chave. Estava embaixo de um tapete no fusca. Estava lá embaixo, nunca, jamais ia achar aquela peça mesmo. E ele conseguiu fazer levantar com uma chave de fenda, ele levantou... Nem chave de fenda eu não tinha nesse dia. Amigos MP - E nesses primeiros anos de casado era uma vida gostosa? O senhor trabalhava ou dava tempo de passear também? Jair - É, eu trabalhava porque todo início de casado é maravilha, lindo, né? Então, final de semana, passeando. MP - Nessa época passeava em que lugar na cidade? Jair - Os amigos. Nós tínhamos formado... Quer dizer, a maior parte era tudo pessoal ainda da Vila Nova, que onde eu morava na Cidade Adhemar, foi quando eu comprei a casa dos meus pais. Tinha poucos amigos. Não tinha... Deixei todo o pessoal na Vila Nova. Então, eu curtia muito a Vila Nova e meus amigos todos casaram praticamente tudo na mesma época, sabe? Acho que foi, assim... Um casando esse ano, outro depois de seis meses, outro três meses, outro depois de um ano e meio. Então, todo mundo aí se reunia todo final de semana, nós tínhamos uma cantina lá na Vila Nova. Então, todo final de semana, curtimos esse pessoal nosso, os amigos. As mulheres se deram muito bem. Às vezes, uma fazia um jantar, então ia todo mundo para lá. Era uns seis, sete casais. MP - Esses amigos do senhor não aprontaram nenhuma no dia do casamento, não? Jair - Aprontaram. Levaram a gente para passear no aeroporto, toda ela de noiva e eu do lado. MP - Como foi? Jair - É, sequestraram a gente. (risos) MP - Aonde? Na igreja? Jair - Não, na saída do casamento. MP - Na saída da igreja? Jair - Não... MP - Na festinha? Jair - Na festa. A hora que acabou a festa, aquela coisa toda: "Não, vocês não vão embora agora. Espera aí. Vão passear primeiro." Saímos em cada carro, levaram para o aeroporto, passamos no Aeroporto de Congonhas. Ela vestida de noiva, aquela coisa toda. MP - E o senhor do lado? Jair - É, do lado. MP - Tiveram que dar uma volta lá no aeroporto. Jair - Tivemos que passar em tudo quanto é canto lá dentro e sair caminhando no saguão lá do aeroporto. MP - E o pessoal... Jair - E todos eles atrás: "Êeeee" (risos) Aí depois falei: "Vocês me pagam. Vocês vão ver." (risos) MP - O senhor devolveu? Jair - Cada vez que um casava, eu já esperava. Falei: "Agora, vou aprontar?" MP - Aprontou alguma boa com os amigos também? Jair - Aprontamos. Nós tínhamos... Tinha um menino quando casou, o Evélcio. Nós tínhamos um menino lá no bairro, era um menino meio pancadinha, sabe? E esse menino, deram um arrastão. Então, onde tinha bebida, ele passava e ia tomando, sabe? Então, não podia descuidar. Descuidava, estava o Teco, o apelido dele era Teco. O Teco tomava tudo aquela... E nesse dia, casamento, convidaram... O Teco era uma pessoa, mesmo ele assim, mas ele era muito amigo de todos lá. Estava no casamento e o Teco tomou um fogo e dormiu. Pegamos o Teco, botamos no carro do noivo, no banco de trás, deixamos ele e fomos embora. (risos) O noivo se despediu, aquela coisa toda e foi o Teco, foi atrás. Aí depois, distante, distante, o pessoal foi acompanhando. Botamos o Teco dentro do carro do noivo e foi... O Evélcio levou ele para passear. MP - E ele foi perceber quando? Jair - Percebeu lá no hotel, quando ele chegou, porque ele foi... Ele ia ficar aqui no hotel. Quando chegou no hotel, que foi tirar as coisas, estava o Teco dormindo no banco de trás e o pessoal tudo escondido. Quando olhou, foi a maior farra, que ninguém chegou junto com ele. Deixou ele levar o Teco embora. Aí, de longe, ficaram observando. Quando ele viu o Teco dormindo no banco do carro... MP - Essa é a mesma turma daquela época... Jair - É, a mesma turma. Essa turma hoje, praticamente, nós estamos em três, só. Nós tínhamos uns seis ou sete casais. Uns se foram, outros separaram, tal. Hoje, praticamente, nós temos amizade ainda com uns três casais. MP - E no trabalho, que época era essa, seu Jair? Depois da contabilidade? O trabalho de representante Jair - Depois da contabilidade, que já estava como autônomo. MP - O senhor foi ser autônomo, trabalhar em que área? Ser representante? Jair - Ser representante. MP - O que significa ser representante? Jair - Representante é ter o contato, é ser o intermediário da Niccolini junto ao cliente, ao comprador, ao que o cliente precisa. Então, eu fazia esse intermediário. Então, precisava de alguma coisa, eu ia até junto ao cliente ver o que ele precisava, o que ele queria. Aí pedia todo o material para ele, levava para a firma e, nesse meio tempo, tinha-se um preço, de quanto ia custar esse material, e eu tinha uma comissão das vendas. Então, eu trabalhava sob comissão, quer dizer, até hoje? MP - E a empresa tinha muitos representantes? Era uma equipe? Jair - Tinha. Tinha uma equipe de representantes. MP - E o senhor cuidava de alguma área específica? Jair - Eu cuidava... Não, de área, não. Cuidava de clientes. Não de área. De clientes e não tinha, assim, um setor. Vai, você tinha a Zona Sul, a Norte. Não, eu podia estar em qualquer canto. MP - Nessa época, quais eram os principais clientes da Niccolini? Jair - Bom, um deles era o Aché, que era... Sempre foi o Aché, sempre foi dos principais o Aché, Rhodia, Laboterápica, Fontoura, Squibb, Jonhson, a Boehringer,... Nossa Diversos. Eu acho que em todos os laboratórios nós tínhamos uma participação. Relação com o Aché MP - O senhor sabe quando começou essa relação do Aché com a Niccolini? É antes do senhor ser representante? Jair - É, foi um pouquinho antes. Foi um pouquinho antes. MP - O senhor sabe como começa essa relação? Jair - O início mesmo... Eu sei que o Victor ia direto na Niccolini. Não tinha um representante, alguém que fazia esse intermediário, esse meio campo. Então, o Victor ia direto na Niccolini, conversava com o Jordan, que é o Fred Jordan, com o Radamés, com o Martinez. Então, o Victor passava lá com uma Kombi, retirava o material para levar para o laboratório. Quando eu tinha uma urgência, porque sempre foi naquela urgência de... Não tinha, assim, uma programação como hoje. Hoje, você compra para três meses, seis meses. Naquela época, não. Vendia-se tanto, então: "Poxa, eu preciso, mas para semana que vem, tal. Me faz aqui." Era meio corrido até. E ele ia lá retirar o material, levava. "Não, pode deixar que eu vou retirar." Ele mesmo ia lá com a Kombi, retirava esse material lá na Niccolini, levava para o Aché. MP - Que nessa época era o Aché lá do Imirim? Jair - No Aché do Imirim. Era o Aché de Imirim. Ele levava para lá, fazia... A quantidade também era pequena. Eles estavam iniciando, praticamente. MP - O senhor lembra quais eram as embalagens dessa época, tem alguma lembrança? Jair - Pôxa vida. O Moderex era um deles. É moderador de apetite, Moderex. Tinha Somalium, Moderex, Somalium... Pôxa, eram tantos. São diversos. MP - Quando o senhor começa a trabalhar diretamente nessa área, já estava organizado um pouco diferente esse contato com o Aché ou ainda era o senhor Victor? Jair - Não, aí o Victor deixou... Foi aí que me convidaram, que nós já tínhamos uma equipe de representantes. E como eu estava distante, a Niccolini com o Aché, essa pessoa falou: "Bom, eu não quero. Eu não quero ir até... Vir até Guarulhos?" Então, como eu estava iniciando, falou: "Bom, então, vamos passar para o Jair. É longe, está iniciando." Então, foram lá e passaram, mas não tinha, assim, esse movimento todo, não tinha esse faturamento que depois nós viemos a fazer do decorrer do tempo. Então, como era distante, o pessoal, eles estavam mais folgados, podia escolher. Então, falava: "Jair, você pega o Aché, a Fontoura White..." Que era lá na Via Anchieta. Então, me deram alguns clientes, assim, bem distante. "E depois que você puder encontrar mais alguém por aí, pode ir trazendo, que nós vamos..." "Está bom." E eu começo. Quando eu vim para cá, o primeiro contato que eu tive foi com o Depieri. O Depieri já tinha assumido a parte de compras e eu comecei a ter um contato direto com o senhor Depieri. Primeiro contato com o Aché MP - O senhor lembra da primeira vez que foi lá no Aché em Guarulhos, que impressão o senhor teve? Jair - Olha, eu cheguei, eu cheguei tremendo, que era um dos meus primeiros contatos. Ainda falar com o dono do Aché foi... Mas me deixou muito à vontade, uma pessoa muito boa, muito bacana, me ajudou demais. Tivemos amizade até bem... Amizade bem íntima mesmo. E chegar até a programar uma pescaria. Aí que é a história desse contato que nós tivemos depois um bom tempo. Que ele contava as pescaria dele, que ele fez no mar, tal. Ele sempre adorou pesca. E o senhor Helmut tinha, que é o dono da empresa, o senhor Helmut tinha um rancho, praticamente bem na barranca do rio Paraguai, lá em Mato Grosso. Tinha um caseiro, tomava conta da casa... Bem, muito bonito lá. E falei: "Você não quer ir pescar um dia no rio Mato Grosso?" Ele falou: "O quê? De avião? Nem pensar" Falei: "Um dia, pôxa, é bacana." Só que ele falou: "Não, você está doido. Não ando de avião de nenhum jeito." Aí vim a saber que, realmente, ele não andava de avião, nunca tinha entrado dentro de um avião, porque quando tinha alguma competição no Rio, ele não ia com o piloto dele. Ele ia de carro e lá o piloto levava o iatezinho dele. Levava lá para o Rio de Janeiro e lá eles se encontravam. Lá eles iam fazer a pescaria, aquela coisa toda. Mas de avião ele não ia, não. Não queria saber. Não ia nem junto com o piloto, que o piloto demorava muito, aquela coisa. Então, ele pegava o carro, ia de carro. E eu consegui convencer ele para fazer essa pescaria lá no Mato Grosso. E ele: "Pôxa, mas como é que é, não sei o que, vamos..." "Eu vou." A primeira vez que ele ia entrar dentro de um avião. Eram 11h da manhã, nós fomos aqui no Aeroporto de Congonhas, na Vasp. Ele chegou todo eufórico, sabe? Já tinha tomado Somalium, calmante, para entrar dentro do avião. (risos) Ele falou: "Hoje, eu estou naquele dia. Primeira vez que eu vou entrar dentro de um avião." E ele achava aquilo lá... Um avião, nem pensar. Ele foi, me lembro até hoje, ele tem a pele clara. Ele vermelhou. Quando aquele bichão começou a soltar, saiu. Ele avermelhou, ficou parado, assim, estático. "O que vai acontecer?" Aí foi relaxando, relaxando e começou a olhar, olhar. Pegamos um dia muito bonito, nem uma turbulência, nada. Mas ele foi, levantou, começou a olhar de um lado, do outro, tirando o cinto, já ficou de pé, olhava para fora, sabe? Ficou maravilhado com aquilo. E depois de lá, aí foi, descemos em Campo Grande, tal. Depois levantou vôo, foi para Corumbá, mais uma vez. Aquele sobe-desce, sobe-desce. Chegou em Corumbá. Nós entramos num... Nós tínhamos arrumado um teco-teco. Um aviãozinho pequenininho de seis lugares. E lá jogamos, botamos o Depieri lá dentro daquele aviãozinho também. Aquele "bééémmmm." Aquilo foi que... Quando ele entrou no grande, ele já achou que aquilo lá era uma maravilha. Era a coisa mais linda do mundo. Ele falou: "Pôxa vida, nunca imaginei que fosse um negócio assim Pôxa, mas que bacana" Ele fez um outro teste nesse outro teco-teco. Foi de Corumbá até o rancho e lá tinha um pista de pouso, aquela terra, aquele negócio todo. Desceu todo eufórico, adorou a viagem. MP - Então, ele tinha uma proximidade grande do senhor com o pessoal lá? Jair - É, foi... Pescaria era com ele mesmo. MP - Está certo. Jair - Nossa Pescaria era do que ele mais adorava na vida. Não sai do mar. Hoje, não sei. Parece que ele já deu uma acalmada até com negócio de pesca. Mas depois passou um tempo, ele comprou avião. (risos) Ele veio a comprar um avião há pouco tempo. Ele não andava de avião de nenhum jeito. Não queria saber de entrar no avião por nada. É até interessante. Foi a gente que conseguiu colocar ele dentro do avião, para depois ele ir lá e comprar um avião. Hoje, ele não anda de carro. É difícil. Só de helicóptero. (risos) MP - De aviãozinho. Nessa época, era o senhor Depieri que cuidava dessa parte de compra? Jair - Ele que cuidava. Ficou muitos anos. MP - Mas como era a rotina de trabalho do senhor no começo? Isso foi em que época, mais ou menos? Jair - Dessa pescaria foi em 1975, 1976, mais ou menos. MP - Era o começo da... Jair - Foi o meu começo também. MP - Do Aché em Guarulhos, também. Jair - É, foi começo do Aché praticamente... Rotina de trabalho MP - Como era a rotina do trabalho do senhor? O senhor ia toda semana lá no Aché? Como eram esses pedidos? Jair - Depende dos dias. Até três, quatro vezes por semana eu tinha que vir para cá para pegar material, trazer cotação... Quer dizer, entrega não. Entrega, a gente não fazia. Entrega era pelo caminhão mesmo, mas, às vezes... Tinha até rótulo, às vezes, precisava de rótulo, nós fazíamos tanto as embalagens como os rótulos também. MP - A bula também? Jair - A bula. Fazíamos também na época, que era praticamente quase completo. Era o cartucho, o rótulo e bula. Nós ficamos muitos anos fornecendo como fornecedor exclusivo. MP - Por que o senhor falou em cotação? Quer dizer, a cada embalagem... Não existia um contrato entre a gráfica e o Aché, existia? Jair - Não, existia só... Não era bem um contrato. Existia só uma coisa: "Eu quero para dois meses. Preciso daqui para dois meses." Então, não tem aquele negócio: "Ah, não quero mais." Não, não tinha. Fez o pedido, eles assumiam, recebiam tudo, precisando ou não, estava dentro do que havia combinado antes, da quantidade. Então, eles recebiam o material. Então, faziam uma programação para dois, três meses, sabe? Não era: "Vem aqui, eu preciso de mais isso, mais isso." Existia uma programaçãozinha em cima de todo esse material. MP - Tinha um estoque de embalagem? Jair - Tinha um estoque, é. O Aché mesmo tinha um estoque, a gente repunha o estoque. MP - Nessa época, o senhor lembra de alguma embalagem que tenha dado mais trabalho para produzir, que tenha sido uma inovação? Tinha disso? Jair - Teve, teve uns trenzinhos promocionais do Victor, que ele fez uns trenzinhos. Então, eram uns cartuchinhos e cada um era um desenho de um trenzinho e uma faca especial, sabe? Então, as rodinhas, depois tirava daqui de dentro, tirava, ficava, formava uma rodinha do trenzinho. Tinha um engate, um do outro, sabe? Era um negócio bem sofisticado. A linha Combiron, Iodepol, Carnabol. MP - O trenzinho era... Jair - Cada embalagem era um produto. MP - E era um brinde? Era para o médico? Jair - Não, era uma amostra grátis. O frasco ia dentro de... Amostra grátis tem sempre o conteúdo reduzido, o frasco era menorzinho. MP - A embalagem da amostra grátis é específica? Jair - É, na época sim. Mas depois começaram a mexer também com mais alguma coisa, além de colocar a amostra, colocava, como promoção, um vidrinho de pimenta. Então, ao invés de colocar uma amostra grátis, o produto, colocava-se um vidrinho de pimenta, dava como promoção. O produto era um Digeplus. Então, colocava um vidrinho de pimenta, você botou pimentinha, tratava Digeplus e... MP - Ia um vidrinho junto com o remédio? Jair - Ia um vidrinho junto. Embalagens MP - O senhor lembra se as embalagens, se tinha alguma coisa diferente comparado com outros laboratórios, ou era mais ou menos um padrão? Jair - Não, como formato sim. Mas o único diferencial era a cor. Essa cor do Aché, esse magenta, você bate os olhos... Não sei se é para gente que está tão acostumado, você bate os olhos: "Ah, é o Aché, é o Aché." Que é uma cor bem, bem... Ficou marcada para o Aché, porque o Aché não mudou. A embalagem tem aquele magenta e isso até hoje. MP - E na parte gráfica, a cor magenta dava mais trabalho que as outras ou não? Jair - Ah, sim. É uma cor bem, uma cor bem ingrata. MP - Por quê? Jair - Porque é o tipo da cor, é uma cor que se você deixar meio exposta ao sol, pela cor, ela vai... Perde muito. MP - Desbota. Jair - É, por causa da magenta. A cor meio forte, magenta, ela... MP - E tem o tom certo, a magenta? Jair - Tem. É o padrão. Tem o mínimo, o máximo e o padrão. Tem que estar dentro desse mínimo e máximo. Se tiver fora, então há a devolução. Você conseguiu tirar fora a cor, mas isso não é... MP - E sempre foi a cor? Jair - Sempre foi essa cor. MP - Todas as embalagens têm essa cor? Jair - Todas as embalagens dele sempre tiveram essa cor. Hoje, não. Hoje já mudaram um pouquinho. Já teve uma modificação bem grande nas embalagens, mas esses produtos mesmo que é a linha farmacêutica mesmo, continua ainda... MP - Destacava na prateleira? Jair - Destaca em qualquer farmácia, drogaria. Entrava: "É do Aché, aquele é Aché." Hoje, está um pouquinho, mudaram um pouquinho. Diferencial do Aché MP - Tinha mais algum diferencial nessa relação com o Aché, assim, por ser um cliente nacional, tinha alguma diferença? Jair - Não. A única coisa que eu sempre admirei, foi a estrutura deles. Como eles chegaram a construir tudo isso. Os três, a força que eles fizeram... Como é que eles conseguiram. Eu sempre admirei a união deles nesse aspecto de chegar aonde chegaram com toda força, os três. Da onde eles vieram. Quer dizer, a história deles também é interessante. MP - Está certo. Jair - Saber as histórias deles também vai ser interessante para gente... MP - O senhor disse que a Niccolini era quase fornecedor exclusivo do Aché nessa época? Jair - Não, foi. MP - Foi? Jair - Foi. Foi muitos anos fornecedor exclusivo do Aché, porque havia uma concorrência e nessa concorrência nós tínhamos a prioridade. Porque nós sempre entregamos certo, nunca demos nenhum problema, funcionava tudo, máquina, o pessoal, o acondicionamento, a forma de entrega, o nosso relacionamento, condições de pagamento. Quer dizer, nós sempre fizemos sempre o máximo. Tudo que precisava para manter esse cliente, que era importante para nós. MP - Tinha um peso para a Niccolini, o Aché? Jair - Tinha. Sempre teve. Sempre foi um dos clientes de prioridade. Quer dizer, o Aché pediu, tem que ser atendido, porque ele é o nosso cliente... É o primeiro. Então, o Aché pediu, vamos fazer, vamos trabalhar. Trabalha no final de semana, precisa de hoje para amanhã. Pára uma máquina, pára o que tem, coloca e põe o Aché como prioridade. Isso nós sempre fizemos. MP - Pelo volume de negócios, pelo volume de vendas? Jair - Pelo volume de negócios, pela parceria que nós temos. Parceria com o Aché MP - O que o senhor acha que deu certo nessa parceria? Jair - Foi, eu acho que foi tudo. Foi um todo, de se formar uma amizade, se formar as condições de atendimento e, do outro lado, a Niccolini oferecendo tudo que ela tem, oferecendo, dando tudo o que tem também. Então, se formou uma coisa bem... Que está, permanece até hoje. MP - Tem algum momento marcante desse relacionamento que ficou gravado no senhor? O senhor falou dos picos de produção, por exemplo, na virada, noite, fim de semana... Tem algum momento que ficou marcado? Jair - Não tem, assim... Não sei se de um passado, de uma correria: "Preciso, mas para amanhã." E tem que fazer, tem... Teve uma passagem, até no tempo do seu Depieri ainda. Ele ligou para firma, não estava lá. Ele ligou para firma e falou lá com uma pessoa lá com... O nome dele era o Basseto. O seu Depieri ligou para lá e falou: "Olha, eu preciso desse material aqui para amanhã ou depois de amanhã, alguma coisa assim." E o Basseto era o gerente da produção. Ele falou: "Olha, seu Depieri, não vai dar para fazer isso daqui. Não dá, não." Por que ele foi falar isso para o seu Depieri? Seu Depieri sempre foi, assim, muito à vontade. Já xingou ele, falou um monte de coisa: "Como não dá? Sabe com quem você está falando? Você precisa me entregar isso daí, eu quero" Aí o Basseto procurou, estava na rua, né, me ligou, falou: "Jair, o homem lá ficou bravo." "Pelo amor de Deus" "Eu falei para ele que não ia dar para entregar. Não dava Estou com material na máquina." "Espera, deixa eu ir lá." Aí fui fazer uma visita, como se fosse uma visita normal. Cheguei lá: "Pôxa, seu Depieri, tudo bom?" "Tudo bom. Quem é esse tal de..." Falou lá um nome estranho. Eu falei: "Mas o que houve?" "Não, eu pedi para ele um material e ele falou que não dava para fazer. Mas que cara é esse?" Eu falei: "Calma, calma. O que o senhor precisa? Para quando é?" "É para isto." "Tudo bem. Pode deixar. Deixa para mim." Mas, nesse meio tempo, eu já tinha falado: "Coloca na máquina, pára, coloca, que eu vou lá falar para ele que eu vou entregar e se você não fizer isso por mim agora, nós dois estamos perdidos." E foi. Entregamos o material, tal, falei: "Calma, precisa de alguma coisa, fala comigo. Não fala com mais ninguém, lá. Fala comigo, que eu ajeito, está bom?" Ele falou: "Mas o cara veio falar para mim..." Falei: "Calma, deixa para lá. Deixa o homem para lá. Não liga, não. Deixa para lá." Ajeitei para quando precisava, entreguei. (risos) Não podia deixar a peteca cair nessa hora. MP - Ainda hoje tem esses pedidos, assim, de hoje para amanhã, ou isso era naquela época? Jair - Na época só. Na época, porque hoje, não. Hoje, você tem a programação de três meses. Mudanças no trabalho MP - Quais foram as principais mudanças nesses anos de trabalho, desde que o senhor começou como representante comercial até hoje? Esses procedimentos foram mudando muito? Jair - É, foram mudando. Hoje, existe... Não é bem um contrato, mas é uma forma, um tipo de compra que você faz, uma compra anual e os pedidos para três meses. Então, você tem, vai, 12 milhões de cartuchos, sendo 100 mil por mês, mais... Você faz o pedido de 300, aí depois desse pedido, coloca mais 300. Então, no final do ano a gente dá os números. Então, hoje se tornou bem mais fácil esse tipo de compra, você tem condições de antecipar uma compra de cartão, comprar melhor esse cartão para poder atender o seu cliente, porque você sabe que você tem um pedido de três meses. Você não tem um pedido de um mês. "Olha, me dá 100 mil cartuchos." "E no mês que vem, será que ele vai pedir mais 100? Será que eu posso comprar mais esse cartão para ter o produto aqui em casa? Será que ele vai comprar 100, ou 200, ou 50, ou não vai comprar?" Então, você tendo uma programação é muito mais fácil de se trabalhar para os dois lados. MP - É um pedido de três meses, mas é compra de um ano? Jair - É compra de um ano. MP - O que significa um ano? É garantido que durante um ano o Aché vai comprar? Jair - Durante um ano vai comprar esse material. MP - Porque antes não tinha essa garantia? Jair - Não... MP - Era compra a compra. Jair - Era compra a compra. Então, fazia uma programação de quatro meses. Então, fazia um custo. Depois de quatro meses fazia uma outra compra. "Agora, quero para três meses, não é mais 12 milhões de cartuchos, é só 10." Então, fazia um novo custo. Então, para cada compra existia um preço. E hoje você faz uma programação anual com um preço praticamente fixo. Esse preço só é mudado na hora da fábrica de cartão. Ela te vem com um preço... Aumenta o cartão e você não pode assumir isso daí, então você é obrigado a repassar. Então, a gente vai de encontro ao cliente e fala: "Olha, eu tive um aumento de cartão, precisamos ver o reajuste. Daqui representa 60% da matéria-prima. Então, isso daqui tem um reajuste de tanto, ok?" "Não, não concordo." Aí, vamos... Aí, entra a conversa, tal. "Não aceito 5%. Eu te pago só 3% e a gente..." "Está bom, dá para assumir?" "Está bom. Dá para assumir 3." "Tudo bem." "Então, 3% de reajuste." Se não, não dá. Não tem condições, porque já teve um outro que eu não repassei, eu assumi. Então, dessa vez aqui, não dá. Eu tenho que juntar todos eles, vamos... Então, esse preço hoje fica um preço anual. MP - E já não tem mais aquela exclusividade também? Jair - Não. Não, porque cresceu demais. Cresceu demais e pelo certo, nunca é bom ser exclusivo. Na época, sim, porque quando dá número tão grande, você tinha condições de ter um fornecedor. Mas depois o volume foi tão grande, que aí juntou a Parke-Davis também. Parke-Davis veio para... O Aché começou a assumir a Parke-Davis, e ficou um volume muito grande. E ficaram com medo de ter um fornecedor. Aí ajeitaram mais um para ter um outro fornecedor, mas nós temos... Representamos hoje 70% do faturamento do Aché, de entrega de embalagens. Parceria com o Aché MP - Fornece 70% das embalagens do Aché. E o Aché representa o que para a Niccolini? Jair - Olha, caiu bastante, caiu bastante o volume. O Aché sempre representou, sempre foi um dos primeiros como faturamento, como faturamento da Niccolini, foi sempre o primeiro. Hoje, já não está... Deve estar como terceiro, às vezes, quarto lugar. Mas muitos anos sempre representou como primeiro. É que o Aché mesmo... As vendas de todos os laboratórios tiveram uma caída com essa entrada do genérico. Os problemas que têm, que teve. Então, houve realmente uma queda muito grande. MP - O senhor avalia que cresceram junto as duas empresas? Teve uma época que uma foi bem importante para a outra? Jair - Ah, sim. Foram, foram... Pelo menos, de início, como Aché como primeiro, primeiro faturamento da firma. Representou muitos anos sempre o primeiro faturamento da firma. Então, foram... Cresceram juntos. Dia-a-dia atual MP - E hoje, como é que está a situação do senhor? O senhor continua representante comercial, fazendo essa ponte? Como é o dia típico do trabalho do senhor, atualmente? Jair - Hoje, pelo que eu consegui da amizade, às vezes, eu nem saio de casa, atendo por telefone. Por que eu vou perturbar, ir lá, se eu sei que está tudo em ordem, está tudo ok? Então, só um telefonema: "Ô, como é que está? Está tudo bem?" "Está tudo jóia." "Não precisa nada?" "Não, não, ok." Pronto, encerra. Quer dizer, não preciso ir mais cativar, correr atrás, pedir mais alguma coisa. Porque a nossa programação está fechada, é anual. Quando tem alguma coisa de mais urgente, então tem celular, tem telefone na minha casa, tem telefone da minha filha, que a minha filha me ajuda também no dia-a-dia. "Precisar de alguma coisa, pai, estão te chamando lá." Ou Aché, ou Warner, a Bayer. "Estão te chamando para você ir lá, que deu um pepino lá. Corre lá." Aí vou, vou de encontro. Mas o meu dia-a-dia, hoje, não tem necessidade, assim, de correr, de ir junto, ver se precisa de alguma coisa. Precisa ver até cansa a pessoa. O próprio comprador, ou alguém: "Pôxa, está tudo em ordem, vem esse cara aqui. Tem que atender, para ele entrar, vir aqui." Então, eu até evito de fazer, assim, alguma coisa. De vez em quando fico lá na Niccolini, lá no escritório. MP - Que o senhor se tornou autônomo, mas continuou trabalhando lá dentro? Jair - Continuo trabalhando dentro da Niccolini. Filhos MP - Nesse meio tempo nasceram os filhos também, seu Jair? Jair - Sim. MP - Como se chamam? Jair - Patrícia, que é a minha mão direita. Ela me ajuda que é um horror. Ela que mexe no computador. Eu ainda não consegui, ainda... (risos) Eu tenho que... Você tem que mexer, tem que saber. Mas é aquele negócio: "Patrícia, veja isso aqui para mim? Puxa aí, abre aí." E ela vai fazendo. Quer dizer, eu mesmo achei tão cômodo, que eu mesmo não vou mexer. Às vezes, preciso de uma coisa: "Poxa vida, cadê a Patrícia?" Aí preciso pegar: "Ô, Minão, vem aqui." Minão, aquele negócio de Minão, não chamo ninguém pelo nome. "Faz favor, abre aqui. Veja para mim esse material onde é que está, como é que está." Que eu mesmo não sei mexer ainda. MP - Quantos anos ela tem? Jair - Patrícia está com 29. MP - Depois dela? Jair - Tem o Fábio, com 28 e a Priscila, com 21. MP - Moram todos juntos? Jair - É, os dois. A caçula, que é a Priscila, já está há três anos nos Estados Unidos. Eu tenho minha irmã que mora lá, Janete. Ela já é até avó. Ela foi para lá com duas meninas pequenas. Ela foi fazer uma aventura para ficar uns cinco anos nos Estados Unidos. Foram para Chicago e estão lá até hoje. Construíram, as filhas casaram com americano. Elas estão lá e eu aproveitei. Esse meio tempo, a minha caçula queria estudar fora, queria fazer alguma coisa. Falei: "Tem a minha irmã lá. Vamos para lá?" "Eu vou." Foi para lá já faz três anos, que ela está... Quer dizer, ela vai ficar seis meses, que ela pega um visto de seis meses, ela volta, retorna. Dia-a-dia atual MP - E o dia-a-dia como é? Além do trabalho, a que mais o senhor se dedica? Jair - Olha, fora do trabalho, andar de carro. (risos) Não faço nada, nada além de andar um pouquinho, fazer alguma coisa que eu preciso. MP - Tem algum hobby, algo que o senhor gosta de fazer? Jair - Não... MP - Cozinhar? Jair - É. Passear é o que eu gosto. Passear, cozinhar, encontrar com os amigos, bater um papo, mas sempre de carro. Nunca andar... "Vamos andar?" "Não." (risos) Eu sei que eu preciso. Tenho a recomendação médica, preciso andar um pouco, fazer um pouquinho... A minha vida é muito sedentária, muito, muito. Sonho MP - A gente está chegando no final, eu queria perguntar para o senhor sobre o futuro. A gente falou de passado; olhando para o futuro, qual é o maior sonho do senhor? Jair - O maior é ver os meus filhos casados. Eu ainda falo para eles: "Patrícia, e o meu neto?" (risos) Quero ver os meus filhos bem, minha família... Estão bem, mas eu gostaria de que eles estivessem bem melhor, casados e que não esquecessem da gente nunca. O futuro, que esse vínculo entre eu e o Aché e a Niccolini, também não me esqueçam. Contar sua História MP - O que o senhor achou de ter contado um pouquinho da sua história, seu Jair? Jair - Eu achei bacana. Jamais alguém poderia chamar, para contar, assim, alguma coisa... Isso que nós estamos batendo um papo até agora. Eu achei interessante. Quando ligaram, falei: "Pôxa, que legal, contar alguma coisinha da..." Também não esperava que ia surgir alguma coisa lá do fundo do baú. (risos) MP - E é bom lembrar? Jair - Foi bacana, foi legal. É que pega a gente meio desprevenido, às vezes, a gente esquece um monte de detalhes. Como o nome dos avós, aquelas coisas. A gente fica meio perdido, mas é legal. Pega a gente desprevenido. É bom, foi legal. (risos) MP - Sem muito preparo? Jair - É. MP - Surpresa? Jair - Exato, é. MP - Muito obrigada pela participação. Foi muito bom o seu depoimento. Jair - Quem agradece sou eu? MP - Obrigada. Jair - Muito obrigado a vocês.
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