Votorantim Fercal
Depoimento de Eurides de Lira Andrade
Entrevistada por Marcia Trezza e Andréia Aguiar
Fercal, 07/05/2015
Realização Museu da Pessoa
VOF_HV004_Eurides de Lira Andrade
Transcrito por Ana Carolina Ruiz
MW Transcrições
P/1 – Nildinha, nós vamos começar a entrevista, fala o seu nome completo.
R – Eurides de Lira Andrade.
P/1 – E como você ganhou esse apelido de Nildinha?
R – Eu acho que é porque eu era miudinha, né, quando eu nasci, aí minha mãe, foi mais meu... Meu irmão não, que eu sou quase a mais velha. Não sou a mais velha, não, sou a segunda, mas foi a família mesmo que, não sei, Nildinha, Nildinha, por Nildinha ficou até hoje. Até eu morrer agora. Ninguém me conhece por Eurides, não. Se você chegar aqui e falar: “Onde a Eurides mora?”. Aí eles não sabem, mas falar Nildinha...
P/1 – Que data você nasceu?
R – Eu nasci no dia 16 de maio de 1944.
P/1 – Em que cidade você nasceu?
R – Bom Jardim, Pernambuco.
P/1 – Pernambuco. Nildinha, qual o nome dos seus pais?
R – O nome do meu pai era Severino Cavalcante Guerra. Eunice Alves de Lira Guerra.
P/1 – Que lembranças você tem do seu pai?
R – Eu? Eu tenho uma lembrança... Eu não tenho uma lembrança muito boa do meu pai porque meu pai separou de minha mãe, eu era pequena ainda, tá? Aí separou, eu não tenho assim uma lembrança muito boa de meu pai, não. E sim, da minha mãe sim, que me criou até morrer.
P/1 – O seu pai você depois não encontrava mais com ele?
R – Não. Nós mudamos de Pernambuco, meu pai ficou lá, aí ele faleceu. Mas depois que ele faleceu já fui lá em Pernambuco.
P/1 – Foi, né? Em quantos irmãos vocês são?
R – Meus irmãos? Nós somos quatro comigo, né? Quatro.
P/1 – E são todos irmãos filhos desse pai que deixou... Sua mãe separou.
R – Tudo do Severino Guerra.
P/1 – E quando ele separou da sua mãe, você disse que é a segunda filha.
R – É. Segunda.
P/1 – Você tinha que idade? Fala pra mim de novo.
R – Eu tinha 12 anos. 12 ou era 13 anos, por aí.
P/1 – E seus irmãos menores que idade tinham?
R – É. Ficou.
P/1 – Que idade eles tinham, mais ou menos, quando separou?
R – Meus irmãos? Eram bem mais novos, porque a gente não tem assim a idade... São só dois anos, um ano de um pra outro, sabe? Primeiro o pessoal... Hoje não, o pessoal tem um filho, passa não sei quantos anos sem dar... Primeiro não, era vapt-vupt.
P/1 – Você disse que lembranças da sua mãe você tem bastante.
R – Lembrança de minha mãe eu tenho porque nós mudamos de Pernambuco com ela, ta? Moramos em Ceres, depois mudamos pra Minaçu, daí ela morreu em Minaçu.
P/1 – E essas duas cidades ficavam em Pernambuco, não?
R – Goiás.
P/1 – Você assim... Como que ela era, a sua mãe? Como que você se lembra dela?
R – Minha mãe... Lembro, uai. Tenho até foto da minha mãe.
P/1 – Como que ela era?
R – Minha mãe era uma pessoa muito trabalhadeira, muito honesta. Ela era evangélica desde pequena, sabe? Ela nunca... Pra falar a verdade, ela era evangélica, ela largou do meu pai ela era nova, ela tinha acho que uns 30 e poucos anos. Ela nunca arrumou outro pai pra nós. Nunca. Ela era uma mulher trabalhadeira, honesta.
P/1 – Você se lembra de coisas assim que ela falava pra você, que ela fazia que te marcaram?
R – Eu tenho muitas, sabe? Marcava assim, ela tinha o maior carinho com a gente, falava pra gente: “Minha filha, vocês têm de ter o exemplo que eu tive, ta? O exemplo que eu tenho, sou uma pessoa assim, assim”. O jeito que ela falava. Eu tenho muita coisa marcada. Tenho muita.
P/1 – Certo. E qual era a rotina de vocês, Nildinha, assim quando criança?
R – A minha rotina? Gostava assim de brincar, muito brincar. A gente naquela época não tinha esse negócio de estar nas ruas, não, sabe? Pra gente ir na casa de um vizinho minha mãe falava assim: “Você vai lá, eu vou cuspir aqui, se você chegar e esse cuspe não tiver você vai levar uma surra”. Era desse jeito. A vida nossa era desse jeito. Trabalhava...
P/1 – Tinha que ir e voltar rápido?
R – Era. A gente trabalhava assim, lá em Pernambuco a gente não tinha água encanada, não tinha nada. A gente pegava água da cacimba. Então a gente descia na cavalaria pra pegar água na cacimba, fazia uma rodia, colocava na cabeça, colocava o pote e se quebrasse o pote quando chegar levava uma surra. Era desse jeito. Fui criada foi desse jeito.
P/1 – Que idade você tinha mais ou menos, Nildinha, quando você carregava essa água?
R – Hã?
P/1 – Que idade mais ou menos você tinha?
R – Uai, dez anos, 11 anos. Era pequena.
P/1 – Você e seus irmãos?
R – Meus irmãos.
P/1 – E ela trabalhava em que?
R – Não, ela não... Ela era dona de casa.
P/1 – Dona de casa. Mas depois que separou do seu pai?
R – Aí ela separou do meu pai, aí ela trabalhava, ela dava aula. Não era concursada, sabe? Você sabe que lá de primeiro você tinha o quarto ano, você sabia mais de quem é formado hoje, né? Então ela dava aula.
P/1 – Dava aula na casa de vocês?
R – Na casa dela mesmo, sabe? As crianças ficavam lá.
P/1 – E é assim que ela sustentou vocês?
R – Assim é que nos sustentou.
P/1 – E vocês faziam algum trabalho além de brincar?
R – Fazia.
P/1 – Além de carregar água também?
R – Fazia tudo. Fazia a gente... Eu mesma, nós tínhamos sítio de café, eu toda vida fui... Não vou falar que eu sou trabalhadeira, não, mas aí eu pegava e pegava café. Colocava o balaio aqui e ó, e ó no café, cafezal. E ganhava dinheiro.
P/1 – Vocês tinham... A terra era de vocês?
R – Era. Mas eles pagavam a gente. Se eu trabalhasse, aí eles pagavam pra nós.
P/1 – Ele quem?
R – Minha mãe, pagava a gente. Não era de graça, não.
P/1 – Ah, é?
R – De graça assim, ela dava um trocadinho. Já não ia pagar pros outros? A gente chegava da aula, aí pra não ficar à toa a gente ia. Pegava café.
P/1 – Recebiam pelo trabalho.
R – Pegava. Por isso que eu sou trabalhadeira.
P/1 – Isso em Pernambuco ainda?
R – Em Pernambuco. E outra coisa que a gente fazia também, tudo em Pernambuco.
P/1 – Sei.
R – Nessa época tava com o meu pai ainda, né? A gente rapava muito mandioca. Não sei se vocês sabem, macaxeira lá é a mandioca aipim aqui. Macaxeira. Então a gente tinha uma casa de farinha e a gente rapava mandioca, chegava da escola não ia... Rapava a mandioca e serrando.
P/1 – Pra fazer a farinha?
R – Pra fazer a farinha, fazer beiju, fazer, como é que é? Polvilho, né?
P/1 – Você sabia fazer tudo isso?
R – Fazia tudo, mas tinha outras pessoas também que ajudavam, tá? Não éramos só nós, não. Nós éramos pequenas. Naquele tempo não tinha conselho tutelar mesmo.
P/1 – Os meninos também trabalhavam?
R – Também.
P/1 – Faziam a farinha também?
R – Tudo. Tudo trabalhava.
P/1 – Nildinha, e você disse que mudou de Pernambuco, pra essas cidades que vocês foram...
R – Nós vínhamos para Formosa do Rio Preto.
P/1 – Então, como foi essa mudança?
R – Essa mudança foi assim, porque aí foi onde já o meu pai tinha separado de minha mãe, meu irmão mais velho que falou: “Vamos sair daqui. Vamos embora, vamos pra Brasília”. Esse tempo ele trabalhou aqui em Brasília, nós ficamos em Formosa do Rio Preto.
P/1 – Sei.
R – Aí lá na Formosa do Rio Preto o negócio era mais pesado, lá era roça, você tinha de capinar. Só que eu sabia, eu aprendi umas coisinhas, eu bordava, sabe? Eu bordava, fazia tricô, fazia tudo, aí eu não fui muito pra roça, não, que eu era meio... Depois meu irmão: “Nós vamos procurar melhorar pra vocês”. Ele veio pra cá.
P/1 – Entendi.
R – Pra Brasília.
P/1 – Sei. O mais velho, né?
R – Aí trabalhou aqui em Brasília, no começo de Brasília. Eu tenho até foto dele ali. Sobradinho tinha só umas duas casinhas. Aí ele veio, depois ele nos buscou, meu irmão mais velho.
P/1 – Ele veio na construção de Brasília ou um pouco depois?
R – Veio. Foi depois.
P/1 – Antes de inaugurar Brasília.
R – Depois. É. Foi mesmo, a construção já existia, aqui Sobradinho era... Ele morava até em Sobradinho. Ele ficava em Sobradinho. Aí depois nós viemos pra cá, depois não ficamos, não. Viemos direto, fomos pra morar em Ceres.
P/1 – Então antes, Nildinha, pra gente entender bem a sua história, na fazenda que você morava em Pernambuco, você disse que era de vocês a fazenda.
R – Era nosso. É o sítio. Era sítio nosso.
P/1 – Era um sítio. Lá também vocês plantavam pra alimentação própria?
R – Também.
P/1 – E quando vocês foram pra Formosa do Rio Preto, você falou que é Goiás, né?
R – Não. Lá é Bahia.
P/1 – Ah, é Bahia. Sei.
R – Aí nós viemos pra Bahia. Nós viemos de, como é que é? De vapor dentro da água.
P/1 – De barco?
R – Foi de barco. Nós viemos foi de...
P/1 – Como foi essa viagem?
R – Ish, foi muito longa. Demoramos foi muito.
P/1 – Você lembra o que aconteceu nesse barco?
R – O que aconteceu no barco?
P/1 – Como foi durante todos esses dias.
R – Foi bom, só que eu era meio exibida, aí inventei de fumar lá dentro. Não, foi... O rapaz tava fumando, aí me deu o cigarro, mas levei foi uma surra lá dentro desse... E fiquei tonta. Lá tinha a lancha, a lancha você pode fazer o que você quiser, aí na lancha lá, ele pegou e fumou, pegou e me deu, menina, e eu dei uma tragada nesse cigarro, moça do céu, quase que eu morri. Ainda apanhei por cima. Ainda vomitei, ainda apanhei. Por isso que eu tenho raiva de cigarro até hoje.
P/1 – Nunca mais...
R – Deus me livre. Só foi pra, sabe? Você sabe, quando a gente é nova, toda exibidinha, mocinha de 14, 15 anos só quer ser, né? Mas me dei mal. Dei mal.
P/1 – E quando vocês foram pra Formosa vocês foram pra outra fazenda?
R – Não. Formosa ficamos lá numa fazenda chamada Fazenda São Benedito. São Benedito. Foi lá que eu casei.
P/1 – Agora, como que vocês assim descobriram essa fazenda?
R – É porque esse pessoal de lá era de Pernambuco e era assim parente da gente.
P/1 – Entendi.
R – Foi isso. Mas lá é ruim, viu? O lugar pior que teve foi esse.
P/1 – Foi lá?
R – Foi.
P/1 – Lá também você já era mocinha 14, 15 anos.
R – Já.
P/1 – Vocês faziam algumas coisas assim pra se divertir ou só trabalho?
R – Então, não, eu fazia também. Eu to falando pra você que eu bordava, fazia muita coisa, fazia porta-joias. Lá em Pernambuco a gente aprende muitas coisas, sabe, nas escolas. Não é como aqui, não, que aqui só estuda, estuda, estuda. Lá não. Lá tinha muita coisa, a gente aprendia muita coisa.
P/1 – E como que você assim, você fazia tudo isso aí dava pra...
R – E vendia. A gente vendia.
P/1 – E vendia pra quem?
R – Comparação... Pra comunidade lá, pro pessoal. Ela encomendava: “Eu quero que você borde esse vestidinho assim pra minha menina”. Aí eu bordava tudinho, aí ganhava um trocado.
P/1 – Ficou famosa lá de bordadeira?
R – Fiquei, minha filha.
P/1 – E pra se divertir, o que vocês faziam?
R – Tinha, não. Só o rio mesmo. Só o rio. Só o córrego pra banhar mesmo, mais nada.
P/1 – É?
R – Era. Tinha nada.
P/1 – E aconteceu alguma coisa nesse rio que marcou você?
R – Muito bom. Muito bom. O rio de Formosa do Rio Preto é um rio e tanto, muito peixe, pegava peixe. Aí, eu não que eu era mulher, mas os outros iam caçar, pegavam tatu, até anta, veado. Isso tudinho lá em Formosa do Rio Preto.
P/1 – É mesmo? Seus irmãos iam caçar?
R – Meus irmãos junto com os outros da fazenda lá.
P/1 – E pescar, você pescava, Nildinha?
R – Nunca gostei.
P/1 – É?
R – De pescar. Eu não gostava muito de pescar, não.
P/1 – Você gostava de banhar só?
R – Só banhar, mas os meninos pescavam.
P/1 – E você se lembra de alguma história que aconteceu nessa época no rio assim que você também guarda na memória?
R – Sim. Porque lá é perigoso, né? E eu morria de medo de água também. Um dia quase que eu me afoguei. Aí foi que o rapaz foi lá e me pegou. Isso aí eu lembro até hoje.
P/1 – O sufoco.
R – Por isso que eu tenho medo de água até hoje, não gosto muito de água. Só na beirinha lá, porque é rio, né? Lá era rio. Rio não, ainda é.
P/1 – Nessa ocasião vocês ficaram quanto tempo lá?
R – Não fiquei muito tempo, não. Nós ficamos uns três anos lá. Três anos, nem isso eu acho. Pouco tempo. Lá não foi muito bom, não, porque a gente trabalhava. Vamos procurar outro rumo, né?
P/1 – Sim. Aí como você conheceu o seu marido, porque você morou...
R – Foi lá.
P/1 – Foi lá mesmo?
R – Foi lá.
P/1 – Como foi que você o conheceu?
R – Uai, porque nós morávamos na fazenda deles lá, sabe? Eles são parentes do meu... Não era parente nosso, era parente de uns conhecidos nosso lá, aí foi lá.
P/1 – E como foi esse encontro?
R – Ai, meu Deus do céu, o encontro foi horrível.
P/1 – Horrível?
R – Não, foi bom. Porque depois ele não prestou, né? Foi bom. Deixa-me falar pra vocês, eu saí de Pernambuco eu namorava o irmão dele.
P/1 – Namorava o irmão?
R – Namorava o irmão dele. Aí nós viemos de Pernambuco juntos, ele veio pra casa dos pais dele, sabe?
P/1 – Sei.
R – Porque os pais dele, ele foi criado com os avós. Aí ele chamava Tião, né? Ubiratan. Ele veio mais nós, nós viemos pra lá pra fazenda deles e lá ele bebia, sabe? Eu peguei, os meninos, o pessoal: “Você não vai casar com Fulano, não, que ele bebe muito”. Aí vou pro outro. Foi.
P/1 – Mas você que quis namorar o outro irmão dele?
R – Foi. Eu ficava assim, sabe? Só que o outro era bem mais bonito.
P/1 – O que bebia?
R – Era bem mais bonito. E naquele tempo a família que falava: “Não, você não pode casar com Fulano, você tem que procurar melhor pra você”. Vai, eu peguei e separei dele, casei com o Ubirajara. Era o Ubiratan, aí casei com o Ubirajara.
P/1 – E o Ubiratan ficou triste, né?
R – É, os nomes deles são tudo de índio.
P/1 – E o Ubiratan ficou bem triste então?
R – Não. Ele veio embora também pra cá, casou aqui, só que ele morreu primeiro que o outro. Morreu faz tempo. Ele bebia muito.
P/1 – E o Ubirajara, vocês começaram a namorar e aí?
R – E aí casamos. Aí casamos, não tivemos nenhum filho lá, viemos pra cá.
P/1 – Mas fala do dia do seu casamento.
R – Hã?
P/1 – Como foi o dia do seu casamento?
R – Eu casei em casa. O juiz foi, casou-me em casa. Foi em igreja não.
P/1 – Que idade você tinha?
R – Na roça também. Nós morávamos na fazenda, aí o juiz veio da cidade lá, que era Formosa do Rio Preto, aí casei em casa.
P/1 – Que lembrança você tem desse dia, Nildinha?
R – Bom, né? Porque eu queria casar.
P/1 – Mas assim, teve alguma festa, alguma coisa?
R – Teve. Teve um... Festão assim de dar não porque era assim, minha família é o seguinte, é um pouco evangélico e o outro católico, sabe? Então é respeito a todos, tem que respeitar. Então não teve, teve uma janta e pronto. E cada um depois foi pra sua casa.
P/1 – Mas você ficou com o seu marido?
R – Fiquei na minha casa. Aí construiu lá um rancho. Casa assim que eu falo é casa, mas é uma casa assim de... De que mesmo? De tábua, não era? De tábua, de coisa, de palha.
P/1 – Depois que você... A Andréia tá aqui do meu lado, faz a pergunta que você queria fazer.
P/2 – A senhora casou com quantos anos?
R – Dezesseis.
P/2 – Novinha. Idade boa.
R – Eu casei com 16 anos por que o que eu ia fazer? Não era? A gente não saía em lugar nenhum, então casar.
P/1 – Não ia a festa? Não tinha festas lá?
R – Não. Só a gente ia mesmo, porque eu to falando, minha mãe era evangélica, a gente ia pro culto. Lá não tinha nem igreja, onde a gente morava, aí fazia o culto nas casas. Aí era assim.
P/1 – Desse jeito.
R – Desse jeito.
P/1 – Aí você disse que ficou três anos lá...
R – Ficamos.
P/1 – E depois foram praquela cidade.
R – Nós viemos pra cá, daqui nós fomos pra Ceres.
P/1 – Ceres. Onde fica Ceres?
R – É aqui perto, né, Delson? Ceres. Aí ficamos lá um tempo na casa do... Meu tio tinha fazenda lá, meu tio José Lira. Nós ficamos lá na casa de tio, meu irmão foi pra Sama Mineração de Amianto, sabe, na Sama, que é o Minaçu hoje. Ele foi trabalhar lá, depois nos levou, aí foi todo mundo já. Aí meu marido também.
P/1 – Seu irmão mais velho?
R – Meu irmão mais velho. Ele foi pra lá primeiro, né, aí ele foi... Primeiro, da Bahia mesmo ele já foi pra Sama, tá, Mineração de Amianto. Eu já tinha casado, depois nós viemos todo mundo.
P/1 – A família toda?
R – A família toda. Era desse jeito. Ia tudo.
P/1 – Aí que foi em Ceres, né?
R – Ceres. Depois de Ceres...
P/1 – É em Goiás?
R – Goiás. Ceres é Goiás. E Sama Mineração de Amianto é Goiás também, que é o Minaçu hoje. O Minaçu falado. Aí lá o negócio melhorou mais, né?
P/1 – E seu marido, ele trabalhou...
R – Meu marido trabalhava na Sama.
P/1 – Também.
R – Aí nós ganhamos casa na Sama. E lá é assim, sabe, trabalhou na Sama, aí todos... O povoado lá da Sama, nós ficamos lá muito tempo. Depois a Sama é mineração de amianto, você sabe como é que é, né, o amianto. Aí mandaram assim umas pessoas embora, os mais velhos assim, mandaram por causa de problema, pulmão, esses negócios. Aí mandaram ele embora.
P/1 – Mas ele já tinha problema de pulmão?
R – Não. Mas eles mandavam antes. Mandavam tratar em Goiânia, fazer um checkup, e mandavam muitos embora. Não deixavam muito tempo na Sama. Agora não. Agora ele já tá aposentando porque o negócio melhorou também, né? É igual Tocantins aqui. Aí meu marido veio aqui pra Tocantins trabalhar na Tocantins.
P/1 – Por que eles mandavam embora mesmo?
R – Mandavam. Aí nós ficamos lá, fiquei lá no Minaçu, nós tínhamos uma casa, comprei uma casa lá no Minaçu pertinho da Sama. Lá eu tive meus meninos, tive os filhos lá e tenho aqui também, tive aqui também. Aí nós viemos pra cá.
P/1 – Pra Fercal?
R – Ele veio na frente.
P/1 – Pra Fercal?
R – Pra Fercal. Aí da Sama nós fomos pro Minaçu. Sama e Minaçu hoje é uma coisa só, porque primeiro tinha demais pro Sama, falar vamos pra Sama, Minaçu, é só a guarita que tem. A guarita. Não sei se você sabe o que é guarita. A guarita é o lugar onde fica o vigilante, o guarda. Você só passa pra ir pra Sama, é igual aquele ali.
P/1 – Entendi.
R – Aí tem a Sama, que é mineração de amianto, e tem o Minaçu.
P/1 – Minaçu é?
R – É uma cidade.
P/1 – Uma cidade.
R – Que não era, não, mas agora é.
P/1 – E vocês tinham uma casa lá...
R – Aí nós tínhamos uma casa, depois nós vendemos. Ele veio primeiro, eu fiquei, ele veio, aí trabalhava na Tocantins.
P/1 – Ele veio pra trabalhar?
R – Foi trabalhar. Arrumou serviço, ele era mecânico. Ele pegou, trabalhou na Tocantins, aí nos buscou. Eu vim...
P/1 – Nildinha, como foi pra você ter seus filhos assim, a primeira vez quando você ficou mãe? Como foi pra você?
R – Foi bom demais, meu filho. Foi um menino homem. Esse menino, Eleocir, ele nasceu foi em Ceres. Eu vim grávida da Bahia, eu ganhei ele em Ceres. Ganhei em casa, viu? Não é no hospital, não.
P/1 – É?
R – Eu ganhei, quem fazia os meus partos era a minha vó.
P/1 – Olha.
P/2 – Interessante.
R – Três. Três filhos que eu tive foi minha vó que fez os partos.
P/1 – Em casa?
R – Em casa.
P/1 – Tudo normal?
R – Tudo normal.
P/1 – E não era muito sofrimento, não?
R – Não. Parece que era até melhor que no hospital. Eles tinham um negócio de dar um negócio quente lá pra gente beber, parece que era pimenta do reino, sei lá. Era logo ele nascia.
P/1 – Mas aí você dormia quando dava esse...
R – Não. Eu ganhava o neném.
P/1 – Não dormia?
R – Não. Aí ficava conversando com a gente, um do lado conversando, ensinando, né? O primeiro foi o Lelé, Eleocir.
P/1 – Isso que eles davam pra você, você não sabe pra que era?
R – Eu sei. Eles davam assim, eu tenho pra mim que era um negócio quente, uma pimenta do reino assim, um negócio lá. Batia, sabe, dava e eu tomava.
P/1 – E você com os meninos todos, um pertinho do outro que eles nasceram?
R – É.
P/1 – Como foi ser mãe de quatro filhos?
R – Eu tenho cinco.
P/1 – Cinco?
R – Cinco. Olha, eu ganhei Eleocir, depois Eleonice, Ubiraci. Do Ubiraci eu operei, eu peguei e fiz a cirurgia lá. Vim lá da Sama, operei em Ceres, dizendo eles que tinham me operado. Só que depois de cinco anos lá vem Maurinice, depois mais seis anos vem o Ubirajara, que é o Junior.
P/1 – Nossa, Nildinha.
R – Já foi aqui. Fizeram algum cambalacho lá comigo, mas fiquei brava. E quando eu pensava que eu não tinha mais filho e eu ruim, minha filha, vomitando, magra, parecia uma caveira. “Ah, não. Eu sou operada”. Eu ia nos... Não. Aí deu uma gastrite. Que gastrite foi essa? Que veio uma filha. Que veio a Maura. Acho que por isso que ela é brava.
P/1 – Mas você não percebeu que você tava grávida?
R – Não. Porque eu menstruava, vinha a mesma coisa. Aí depois que eu tratei, eles falando que era gastrite, aí foi que eu fui no médico, quando eu cheguei na porta o médico olhou pra mim, falou: “Aí tem coisa estranha”. Eu falei: “Oxe, tá doido, é?”. Mas eu já sabia, que eu tava gordinha, né? Aí foi desse jeito. Depois com mais seis anos... Em 11 anos eu ganhei dois filhos. Eram 11 anos, mas depois que me fizeram um negócio lá em Ceres, operaram-me.
P/1 – E você não percebeu nada, não sentia nada? Com quantos meses você tava de gravidez que descobriram?
R – Vish, já tava bem com uns quatro meses. E eu ruim. Eu vim de avião, sabe? Eu vim de avião da Sama pra Goiânia, pra Anápolis. Eu ruim, vomitando, vomitando, é gastrite, é gastrite. Passaram um monte de remédio pra mim, a gastrite veio Maura.
TOCA DE FITA
P/1 – Mas que história hein, Nildinha?
R – To falando. E o médico chamava, não sei se ele já morreu, lá em Ceres, doutor Domingos. Ainda paguei pra operar.
P/1 – Olha só.
P/3 – Particular, né?
R – Particular.
P/3 – É que antigamente o processo que fazia é amarrar as trombas, né?
R – Era.
P/3 – Se amarrar as trombas, se passar do tempo ela desamarrava sozinha.
R – Mas aí precisava de vir com tanta doença depois? Com tanta coisa?
P/1 – Sem você saber inclusive.
R – Sem eu saber. Eu ia no médico, falava: “Não. Não to, não. É assim, assim, assim”.
P/1 – E depois veio mais o...
R – Depois veio o Ubirajara. Eu ganhei na L2 Sul, aí eu operei de verdade. Aí me operaram de verdade.
P/1 – O que é L2 Sul? Você morava nesse lugar?
R – Não. Eu morava aqui e ganhei lá na L2 Sul aqui no Plano. É Plano, né? Agora não é mais L2 Sul. Não. É. L2 Sul.
P/3 – Não. Agora é HMIB, né?
R – É. HMIB. Mas no meu tempo, era L2.
P/3 – Ela falou assim que veio para Fercal, mas não diz quando, que a gente tá contando a história, pra gente é importante as datas mais ou menos, o ano mais ou menos que você veio pra...
P/1 – Que veio pra Fercal.
P/3 – Pra Fercal.
R – Eu sei.
P/1 – Então fala.
R – Foi no dia 21 de setembro de 1972. Chegamos, descemos aqui direto, sabe? Aí ficamos lá de frente a Tocantins ali. De frente assim que eu falo na estrada, as estradas não eram boas assim não. Aí não tinha nem aquela ponte. Nós ficamos lá num ferrão lá sentado até o meu marido ir, falaram lá pro meu marido ir lá na fábrica, ele veio. De lá nos moramos na Rua do Mato, né, Delson? Moramos na Rua do Mato, mas foi pouco tempo também. Depois viemos pra cá.
P/1 – Nildinha, vocês...
R – Aí nós separamos...
P/1 – Antes. Vocês chegaram em 1972, né?
R – Setenta e dois.
P/1 – Você diz que chegaram, você e seus...
R – Era. Não eram os filhos tudo, não, porque nasceu e fez aqui.
P/1 – Três. Seus três filhos. E ele sabia que vocês iam chegar.
R – Ele sabia.
P/1 – E já tinha um lugar pra vocês morarem?
R – Já tinha lá na Rua do Mato.
P/1 – Sei. E quando você chegou em Fercal, qual foi a sua impressão assim do lugar?
R – Ah, meu Deus, achei horrível isso aqui.
P/1 – Por que, Nildinha?
R – Era uma poeira. Não tinha esse asfalto ainda, estava mexendo nele, sabe? Mato, mato, mato.
P/1 – E a poeira era do que?
R – É poeira mesmo, da rua mesmo.
P/1 – Da terra?
R – Da terra e dos carros. Alguns carros, que tava construindo, né, e era muito carro pesado. Eram as maquinonas pesadas que passavam. Mas primeiro morei na Rua do Mato. Passei uns três meses lá, pouco tempo. Aí vim pra cá e to aqui até hoje.
P/1 – E quando você chegou lá?
R – Aí nós separamos.
P/1 – Lá na Rua do Mato como é que você se sentia?
R – Eu senti bem lá, porque o pessoal lá muito legal, sabe? Eu gosto de fazer muita amizade e eles já sabiam que a gente ia chegar, que o Ubirajara, que era meu marido, já tinha alugado lá, tudo. Tinha arrumado tudinho lá, eu achei legal. Primeiro conheci dona Ana, depois o pessoal de Delson, aí depois Manoel Baiano. Moramos também lá em Manoel Baiano, lá na Rua do Mato.
P/1 – Além do... Você disse que tinha bastante mato, tinha...
R – Era só mato e cobra, moça do céu, mas tinha. E eu morro de medo de cobra.
P/1 – Mas você viu alguma?
R – Oxe. Meu Deus do céu.
P/1 – Teve alguma história assim?
R – De cobra?
P/1 – É. Alguma dificuldade ali que você passou.
R – Nós passamos dificuldade também.
P/1 – Não, com a cobra. Com alguma cobra.
R – Não. Lá na Rua do Mato não, mas aqui sim.
P/1 – Ah, é?
R – Ahã. Deixa-me falar. Aí nós mudamos de lá da Rua do Mato, viemos morar aqui. Minto. Nós não viemos morar aqui, nós viemos direto lá pra Tocantins, lá pra... Como é que chama ali, Delson? Ficamos uns meses lá, depois a Tocantins precisou, a Tocantins deu casa. Como é que é, moço?
P/3 – Na Fercal I?
R – É. Não, no Fercal ali. Lá no Sovaco da Gia quase. No Sovaco da Gia.
P/1 – Vocês foram lá porque a Tocantins deu a casa.
R – É. A Tocantins deu a casa, depois a Tocantins precisou das casas, porque já era pertinho ali do estrondo, né? Aí nós saímos e viemos pra cá.
P/1 – Agora só pra entender, Nildinha, quando você tava lá na Rua do Mato tinha assim estrutura? Água, luz na casa?
R – Tinha não, moça. Não tinha, não. A água é do córrego e luz não tinha, não. Depois com muito tempo foi que veio a luz. Não, minha filha, era no candeeiro. Ainda eu cozinhava num fogãozinho, ainda bem que a casa que nós alugamos lá tinha um fogão, fogãozinho caipira. Aí eu cozinhava nesse fogão.
P/1 – De lenha?
R – De lenha. E nós íamos pro córrego, lá tinha muita água, né?
P/1 – E onde você morava antes era assim também?
R – Não. Onde eu morava tinha água, tinha luz, tinha tudo. Minaçu. Minaçu pra cá.
P/1 – E como foi assim essa fase, Nildinha, pra você? Como você funcionou ali, reagiu?
R – Não, eu... Eu achei meio ruim um pouquinho. Bem, deixa-me falar pra você também, lá no Minaçu nesse tempo nem televisão também não tinha, tinha energia, mas não tinha televisão.
P/1 – Sei. (interrupção) E nessa época em que você morava em Minaçu ou na Rua do Mato vocês se divertiam de alguma forma?
R – Na Rua do Mato era bom.
P/1 – Era?
R – Era. Na Rua do Mato tinha umas quadrilhas doidas, não era, Delson? Umas quadrilhas.
P/1 – Conta um pouco sobre a quadrilha como era?
R – Umas quadrilhas... Era no mato mesmo, uai. Eram umas quadrilhas doidonas que a gente fazia lá. Era. Sanfona.
P/1 – E quem organizava isso?
R – Era a comunidade mesmo de lá mesmo. Naquele tempo não tinha nem Maura, não era? Era Delson, pessoal do Delson é muito animado, sabe? Aquele pessoal de rio. Agora não, agora ficou mais, sabe? Mas ali era bom, não tinha miséria, não, minha filha. E a gente, depois nós mudamos pra cá, que eu falei lá em Tocantins ficamos pouco tempo, viemos pra cá, daqui a gente saía pra Rua do Mato, o pessoal lá da Rua do Mato. Por aqui por dentro, a pé. Tinha umas novenas, na Rua do Mato tinha umas novenas, sabe, que começam no dia 28, 28 de novembro, e termina no dia oito de dezembro. A gente não perdia uma. Aqui por dentro, com cobra, com tudo, sabe? Aí aqui nesses matos. E ali tinha um cemitério. Um cemiteriozinho que, não foi do meu tempo, não, que morreu não sei quem, enterraram por ali e nós passávamos lá com medo, de noite, no escuro, aí os meninos falavam: “Aqui tem um cemitério”. E a gente saía doida correndo com medo do cemitério. Os meninos, eles levavam nesse tempo que eu vinha mesmo quando eram pequenos, aí uns vinham, outros não, os pequenos eu deixava com alguém em casa e eu ia. Mas não perdia uma novena lá na Rua do Mato.
P/1 – E a hora que passava pelo cemitério...
R – Virgem Maria, o cemitério e pra vir os meninos ficavam fazendo medo pra gente.
P/1 – Teve alguma vez que alguém viu uma visagem?
R – Eles falavam que viam, eu nunca vi, não, que a gente passava era doido correndo, nem olhava. Não, vem sofrendo aqui.
P/1 – E a quadrilha, essa quadrilha tinha...
R – A quadrilha é boa.
P/1 – Era só assim o pessoal dançando ou tinha assim algum campeonato de quadrilha, competição?
R – Nada. Qualquer um mesmo, o povo fazia, até eu mesma: “Vamos ensaiar a quadrilha.” “Vamos”. Era não, Delson? Fazia o pessoal do Delson, pessoal dona Maura, sabe? Nós não ensaiávamos. Não tinha assim profissional, não. Profissional éramos nós e era bonito e bom e saudável, sabe por quê? Porque não tinha briga, não tinha confusão nenhuma. Se quisesse você amanhecia o dia no outro dia ainda, não tinha confusão nenhuma.
P/1 – E tinha um dia especial dessa festa?
R – Tem, uai. Tem São João, né? São João, São Pedro, Santo Antônio.
P/1 – Era o dia, essas festas juninas?
R – Era. Festa junina. Nós todas exibidas, sabe, de roupinha de rodar, que além de ser novinha, nesse tempo eu ainda era mais novinha um pouquinho, né?
P/1 – Nildinha, ensaiava a quadrilha vários dias pra apresentar na festa?
R – Era. A gente ensaiava quase toda noite. Eles faziam o fogo, faziam fogo, a fogueira, porque não tinha luz, não tinha nada.
P/1 – Era gostoso.
R – Você vê o tanto que nem maldade ninguém tinha, né? No escuro, todo mundo novinho, todo mundo bonitinho e não tinha o que tem hoje.
P/1 – E vinham pessoas de outros bairros, assim de outras comunidades?
R – Vinha. Ia daqui pra lá.
P/1 – Não, pra assistir no dia?
R – Ia. Eu lembro tanto da Dilma, sabe? Dilma vestia uns vestidões de uma irmã dela parece, de noiva. Mas era bom.
P/1 – Tinha o casamento.
R – E sabe de que a gente se maquiava, as pessoas se maquiavam? Com carvão. Carvão, ué, porque não tinha... Colocava o bigodão de carvão assim, mas rapaz, a gente ficava era bonita.
P/1 – Os homens, né?
R – Não era Delson?
P/1 – Mas os homens que colocavam bigodão, ou as mulheres também?
R – Os homens... Não. Tinha vezes que não tinha o tanto de mulher, aí mulher também colocava pra dançar com a mulher.
P/1 – Não tinha muitos homens...
R – Era.
P/1 – Muito bom.
R – Muito bom.
P/1 – E aqui quando você veio... Antes você falou que a Tocantins, hoje é Votorantim, né?
R – É Votorantim.
P/1 – Tinha barulho. Como que era morar perto?
R – Barulho? Não. A Tocantins tinha muito era poluição, poeira. Aqui você chega e ficava... Eu não morava aqui, né? Morava aqui na frente num barraco quando eu vim da Rua do Mato. Aí tinha muita poluição aqui. Esse pessoal reclamava, reclamava. A gente falava: “Gente...”. Não é? O pessoal trabalha, a maioria do pessoal todo não trabalha aí? Vou falar, olha, meu marido trabalhou na Votorantim, que era Tocantins, meus filhos, os homens, dois, e eu tenho um neto que trabalha lá. Ele entrou lá, o Rangel, como um bom menino.
P/1 – Seu neto?
R – E tá lá hoje, graças a Deus.
P/1 – Entendi. Agora, além da poluição tinha barulho também?
R – Não, não tinha muito. Tinha um barulho era dos caminhões, né? Dos caminhões como até hoje.
P/1 – Nildinha, quando você veio pra cá eu vi que tem algumas pedreiras.
R – Tinha.
P/1 – Você lembra disso?
R – Lembro.
P/1 – Ainda tem?
R – Tinha uma pedreira aqui da frente. Pra você ver, tinha uma pedreira bem aqui na frente, tem lá até hoje o britador. E tinha o pessoal trabalhando aqui também, aqui que eu falo do outro lado do córrego.
P/1 – Sei.
R – Aí eu pegava, lembro como hoje, os trabalhadores lá, coitados, tudo trabalhando, aí eu pegava, falando era de graça também não, pegava, fazia bolo, esses negócios tudinho, sabe? Aí os meus meninos levavam pra eles lá. Eles davam um trocadinho pros meus meninos também.
P/1 – Sei. E você ouvia o barulho das britadeiras?
R – Ouvia.
P/1 – É britadeira que diz?
R – Britadeira. Ela brita. Ainda tem lá, se você quiser ir lá uma hora no britador que tem lá, tá? Tem um britador, se quiser levar, Delson, qualquer um, acho que todos conhecem esse britador. Que depois virou até uma bagunça lá com esse britador. E outra coisa, a gente aqui não tinha assim, quando eu morei pra cá, a gente não tinha assim lugar pra gente... Dia de domingo principalmente, aí nós tínhamos uma pedra encantada que tem na Tocantins. Não sei se você...
P/1 – O que é?
R – Pedra encantada. Nesse tempo, nessa época a gente passava lá por dentro, passava na guarita, aí pedia, o guarda deixava a gente ir pra lá, que hoje ninguém entra mais, né? Mas to falando em 73, 74, por aí. A gente ia, minha filha, lá, se você for lá é uma casa, essa pedra encantada é uma casa. Tem os quartos assim, parece que dividiram os quartos, sabe, dessa pedra encantada. Tem um pé assim de criança assim, tá lá, deve ainda estar lá.
P/1 – Olha...
R – A gente ia só pra lá, mas era bom demais, a gente levava comida, ficava lá, tinha um córrego. Era onde a gente ia, depois apareceu a sucuri.
P/1 – Mas antes, esse córrego era limpo?
R – Era. Limpo.
P/1 – Dava pra se banhar nele?
R – Era. A gente pulava lá, era limpo. Tinha a Tocantins, mas tava começando, não tinha o que tem hoje. Tô falando que a gente passava por dentro ali, a gente passava ali, não era Delson? A gente ia lá pra pedra encantada. Hoje todo mundo, esse pessoal do Sobradinho vinha: “Onde é que é essa pedra encantada?”. A gente ia lá mostrar pra eles. Parece mentira, mas é verdade, é dividido assim os quartos, negócio, parece...
P/1 – E ainda tem, só que não dá pra visitar mais?
R – Eu acho que tem porque agora a gente não pode ir lá mais, né? Pra lá tinha o Sovaco da Gia.
P/1 – O que é isso, esse Sovaco da Gia?
R – Era uma comunidadezinha, não era? Tu falaste o Buraco da Gia aquele dia. Aí a gente ia lá tomar banho também. Tinha uns moradores que moram lá antigos e a gente ia lá pra conversar, chupar cana, lá tinha cana, sabe? Feijão. Às vezes a gente pegava tudo lá.
P/1 – Pegava o feijão?
R – Depois da Tocantins, ali na Tocantins. Era.
P/1 – Mas agora não dá mais?
R – Agora não tem mais disso mais não, minha filha. Pessoal...
P/1 – Por que não tem?
R – Porque a Tocantins tomou conta, era da Tocantins. Você vê que a Tocantins é até lá na Boa Vista, né? É da Tocantins.
P/1 – Comprou as terras?
R – Comprou. E verdura a gente comprava de uns japoneses que tinha lá na Tocantins também, pro lado da Tocantins, que aí a Tocantins também comprou e eles saíram de lá. É, minha filha...
P/1 – Nildinha, quando tinha... Eles ainda trabalham nessa pedreira com a britadeira?
R – Quem? Aqui não. Aqui não.
P/1 – E eles exploravam lá pra própria Tocantins, não?
R – Não. Aqui era particular, era outra coisa.
P/1 – Sei. E você disse que tinha muita poluição, mas ainda tem?
R – Tinha. Tem não. Agora a Tocantins... Ih, reportagem era direto por aqui, sabe? O pessoal reclamando. Eu falava, a gente não pode nem reclamar porque a gente vive é da Tocantins, não é? Vivia da Tocantins.
P/1 – A comunidade não se mobilizava pra reclamar?
R – É. Não. Aí colocaram uns tais de uns filtros, não reclamou mais. De vez em quando assim de tardezinha, noite que a gente vê a fumacinha, mas melhorou bastante.
P/1 – Eu digo, a comunidade que morava perto não reclamava, não se mobilizou pra reclamar?
R – Reclamava. Reclamava sim também.
P/1 – Também?
R – Vinha reportagem, vinha tudo, né?
P/1 – Sim. E vocês aqui quando vieram você falou não tinha água, não tinha luz. Como que chegou tudo isso?
R – Não. Aí quando chegamos aqui, eu com uma barrigona, sabe, do Junior, lavava as roupas no córrego. Atravessava aí, ó. E era assim, a bacia, nós lavávamos louça no córrego, lavávamos louça e roupa nesse córrego aqui, e tomava banho. Tudo era no córrego.
P/1 – Mas ainda era limpo?
R – Limpo. Limpo. Lembro, aí até o pessoal até brigava por causa de pedra. Sabe que horas que a gente levantava aqui? Eu, minhas vizinhas aí? Cinco horas da manhã pra pegar uma pedra melhor. Aí colocava a roupa e ia pra lá lavar a roupa. E vinha com aqueles pesões de roupa na cabeça, menina. Chegava aqui, os meninos estavam estudando, estavam pro colégio, aí pegava a louça suja, voltava de novo, ia lavar as louças e vinha fazer a comida, deixa os meninos irem pra escola.
P/1 – E tudo você? Os seus filhos não ajudavam?
R – Ajudavam, mas estavam estudando, né? E eram pequenos também, tinha uns pequenos, ajudavam também. Mas, minha filha, eu sofri um pedaço.
P/1 – E a pedra, vocês gostavam de escolher a pedra por quê?
R – Ah, era eu, Dilma. A irmã dele morava aqui, aqui a gente contava as casas que tinha. Tinha uma aqui na Vila Azul agora, era a rua dos motoristas. Motorista que a gente fazia não era muito, falava motoristas porque era mais de um, mais de dois, mas era pouquinho, viu? Tinha o Ricardo que tinha... Aí quando chegava lá tava a Dilma na minha pedra: “Não, Dilma, pode sair de minha...”. Ia eu, minhas vizinhas até hoje moram aqui, que é a Fiinha, que é uma antiga, a Lena, a gente só ia aqui pra lavar roupa lá.
P/1 – E a pedra era pra que?
R – A pedra era quem chegasse primeiro pegava, né?
P/1 – Mas por que...
R – Pra nós lavarmos a roupa, moça. A gente coloca as roupas, colocava o sabão, tá pensando que tinha máquina, tinha tanque, tinha nada. Tudo na mão, minha irmã. Tá pensando que é brincadeira. E eu tenho raiva quando chega gente de fora: “Aff, Maria, essa Fercal é isso e aquilo”. Não sabe o tanto que a Fercal melhorou. Ruim era quando nós estávamos aqui, não é não, Delson? Quando a gente era mais novo, chegamos aqui, sofremos. Agora chegam essas belezinhas, eu detesto quando chega um falando da Fercal, viu? Aí nisso meus filhos estudaram aqui, depois foram pra Sobradinho, enrolaram lá, nem estudaram direito, um estudou, outros não estudaram, iam pra rodoviária, a gente pensando que tava estudando e voltava, sabe? Era. Aí eu, que era só eu, já tinha separado do tal do marido, aí, minha filha, eu ia lá pra Viplan. A Viplan era longe, comprar passe escolar, comprar os passes escolares pra poder ele passar, passe pro ônibus. E esse danado ia e ficava na rodoviária. O Ubiraci e Eleocir. Era.
P/1 – Mas no fim eles terminaram os estudos? Concluíram?
R – Terminaram não. Todo não. Só um foi dos que terminou, os outros não quiseram, não. Aí sabe o que eu falava: “Meninos, vocês estudem.” “Que nada, eu vejo Fulano de tal, formado aí, tá aí desempregado, sem trabalhar, trabalhando na Tocantins, na Ciplan”.
P/1 – E hoje eles trabalham?
R – Trabalham.
P/1 – Todos?
R – Todos.
P/1 – Eles trabalham em que, Nildinha?
R – Um é vigilante. O Ubiraci tá até encostado da Tocantins, tá? Porque ele operou da coluna, ele adoeceu lá, tá encostado faz é tempo. E o outro trabalhava na Tocantins, depois a Tocantins, não sei o que ele teve lá ele saiu da Tocantins. Ele saiu num dia, a Ciplan chamou ele no outro, ele tá lá até hoje, graças a Deus.
P/1 – Ciplan é empresa de...
R – Já vai aposentar, ele perdeu... Eu tenho um filho que é esse mais velho, Eleocir, ele perdeu a mão na Tocantins... Na Ciplan. Desculpa. Na Ciplan.
P/1 – Como foi?
R – Ele perdeu. Ele era mecânico industrial e a mão… E perdeu a mão, mas trabalha até hoje. Não foi aposentado, não.
P/1 – E as meninas trabalham também?
R – As meninas não.
P/1 – Casaram?
R – Casaram, graças a Deus duas, casaram. Tão bem, graças a Deus.
P/1 – Nildinha, Ciplan é empresa de que?
R – Quem sofreu mesmo mais nesse tanto fui eu mesma.
P/1 – Nildinha, Ciplan é empresa de que?
R – De cimento.
P/1 – Cimento também?
R – É.
P/1 – E você falou...
R – São duas empresas que tem aqui, é a Votorantim e a Ciplan, né?
P/1 – E a Ciplan. Você disse que tinha as pessoas que trabalhavam com as britadeiras, né?
R – Como é que é?
P/1 – Tinha quem explorava as pedreiras.
R – As pedras.
P/1 – Com as britas, que vocês falam, é brita?
R – É.
P/1 – Quantas eram? Quantas empresas tinha na época?
R – Ish, tinha bem umas quatro, porque tinha as gatas, né? As gatas.
P/1 – Conta um pouco. O que é gatas?
R – Gata que a gente fala são aquelas que vêm de fora... Fala aí Delson.
P/3 – Terceirizada.
R – É.
P/1 – Pode falar.
R – Como é que você falou?
P/3 – Terceirizada.
R – Terceirizada. É.
P/1 – Terceirizada.
R – Essa mesma. Eram essas que a gente chama gata. O pessoal até hoje fala gata, gata então vou falar da minha língua gata, são as que vêm de fora, né? Aí tinha a Planalto, tinha a Engespa...
P/1 – E elas vinham, eram quatro que você falou?
R – Tinha. Agora tem muitas, né?
P/1 – E era tranquila essa convivência com essas empresas assim, essa exploração era tranquila pra vocês?
R – Era.
P/1 – Não incomodava?
R – E agora mesmo, agora só tem mais é... O empresário maior que tem hoje é o Sálvio que é o dono da Pedreira Contagem. Os outros caíram, foram embora, um morreu.
P/1 – E não tem mais exploração das pedreiras aqui?
R – Tem.
P/1 – Quem faz agora?
R – A Tocantins e a Ciplan agora, né?
P/1 – Entendi. Elas continuam...
R – Tem outra não, né? Como é que é o nome?
P/3 – A Pedreira Contagem.
R – Então, a Pedreira Contagem, eu falei a Pedreira Contagem.
P/2 – Que é a maior, né?
R – Eu falei que só a Pedreira Contagem...
P/3 – Pedra Negra.
R – A Pedra Negra.
P/1 – Sei. E pros moradores daqui da região essa exploração altera alguma coisa pra vocês? Essa exploração das pedreiras.
R – Até hoje as casas são tudo rachadas. Tudo rachada.
P/1 – E eles dão o sinal ainda?
R – Dão. Eles dão um sinal que é pra ninguém passar por perto, né? Ish, minha filha, é um estouro, um estouro tão grande que você... Agora melhorou, não sei o que é que fizeram que melhorou, mas primeiro quando dava estouro chegava a casa a ficar assim. As casas tudinho daqui são tudo rachadas.
P/1 – E os moradores convivem bem com isso? Nunca teve nenhum movimento?
R – Convive porque... Não, já fizeram muitas coisas contra a Ciplan, a Tocantins, mas não tem jeito. Fazer o que?
P/1 – Essas ações que fizeram eles queriam o que?
R – Acabar, mas como que acaba? Melhorar, não acabar. Melhorar como melhorou. Eu falei pra você que a poluição aqui era grande, amanhecia, até hoje ainda de vez em quando acontece, os carros, quem tinha carro, amanheciam branco, branco, branco, branco.
P/1 – E você, Nildinha, que tá aqui...
R – As plantas, as plantas também, só que hoje não tem mais. Você pode olhar que está tudo verdinho, não é? Tá lindo agora, mas de primeiro era só poeira.
TROCA DE FITA
P/1 – Nildinha, você tava dizendo quando não tinha água aqui, pode falar agora que tá gravando.
R – Pois é, nós não tínhamos água, aí já falei, isso aí já falei da roupa, que eu lavava tal. Então, aí a gente com o seu Luiz ali fizemos… e conseguimos fazer um carneiro. O carneiro o que é o carneiro? Carneiro você faz uma cacimba, lá em Pernambuco o pessoal fala cacimba, né? Aí coloca o motorzinho e trazia a água pra cá.
P/1 – Mas precisa ter a luz. Precisa ter a energia pra fazer.
R – Sem energia.
P/1 – Sem?
R – Sem. O motor lá é sem energia, é na gasolina.
P/1 – Entendi.
R – Puxava lá e deixava lá, aí a gente usava essa água, o carneiro a gente fala. Agora eu não sei como é que é o nome mesmo certo, que a gente falava a água é do carneiro. Mas não é carneiro de... É um poço, sabe? É uma cacimba.
P/1 – Sim. Deu pra entender. Nildinha, você falou que separou do seu marido. Conta um pouco pra gente como que foi essa fase.
R – Como eu separei dele?
P/1 – Como foi essa fase.
R – Eu separei do meu marido por quê? Ele tinha outras mulheres, bebia muito. Dois defeitos que ele tinha só, era mulherengo e bebia. Aí chegava agressivo e quem aguentava? Eu também apanhava, mas batia também. Aí ele arrumou outra mulher, arrumou umas três. Ele arrumou uma mulher que essa mulher vivia aqui em minha casa, eu cuidava da filha dela, chama Adriana ela hoje e a mãe chama Caçula. Eu cuidava dessa menina, não cobrava nada, nada, nada. Sofria porque não tinha água, do jeito que eu tô falando pra vocês, né? Não era água como nós temos hoje, graças a Deus. Eu cuidava dessa menina tudinho, aí comecei a desconfiar dela porque ela falava: “Vou pegar a Adriana hoje, não”. Ele não dormia em casa, Delson. Aí...
P/1 – E você ficava com a menina ainda.
R – Oxe, fiquei. Fiquei com essa menina foi muito tempo. Quando eu descobri, sabe como eu descobri, que não tinha energia ainda nesse tempo? A lua. A lua tão clarinha, sabe, e eu lá fora. Aí eu vi os dois naquele pé de manga onde tem um pé de manga até hoje onde o chapa fica, sabe? Naquele tempo não tinha aquele movimento de gente como tem hoje. Hoje você... É pouquinha gente, né? Tava ele lá mais ela, aí pegou e sumiu lá pra casa dela. Falei: “Tá, desgraçado. Amanhã tu me pagas, infeliz”. Não dormi à noite, que é claro que ninguém dorme. Mas quando foi no outro dia que ele colocou o pé em casa eu peguei as trouxas dele e joguei no chão: “Some da minha vista”. E meus meninos também, já estavam grandinhos meus meninos, minhas filhas já estavam grande, falaram: “A senhora tá certa, mamãe”. Aí ele sumiu com essa mulher. Depois tava na pindaíba de novo, aí pediu... Não. Vou contar o caso da menina. Aí eu fiquei com a filha dela 15 dias, ela não veio buscar a filha dela. E as meninas falavam: “Não, mamãe, nós não vamos levar a Adriana. Vamos fica com Adriana”. Eu tava pensando que quando ela viesse buscar essa menina eu ia dar uma surra nela, só que não dei. Não, não, não.
P/1 – O que aconteceu na hora, que você não deu?
R – Aconteceram meus meninos: “Não vai fazer nada. Não vai fazer nada”. Eu não fiz nada. Ela pegou a filha dela, pegou as coisas dela e foi embora. Não fiz nada com ela. Dessa vez. Dessa vez. Aí depois começou de novo ele com ela.
P/1 – Porque ele pediu pra voltar, você ia dizer?
R – Aí voltou, pediu pra voltar, os meninos: “Não, mamãe, papai tá devendo muito, ela acabou com o meu pai na bodega ali, na venda. Vamos dar uma chance mais pro meu pai.” “Por causa de vocês”. Porque filho tem hora que dobra você. Aí nisso eu fiz. Ele veio, mas nunca foi mais como era antigamente, né? Mas antes disso ele já tem uns causinhos já, tem filho fora, tudo. Aí ela pegou, mas como ela era minha amiga, minha amiga, chegava do serviço, comia mais eu aqui nesse barraco aqui pra frente. A Caçula. Desse jeito. Aí começaram de novo, falei: “Hoje eu pego”. Saí doida, minha filha. Dona Palmira era uma vizinha, uma antiga também, muito tempo, ela morava primeiro aqui do que eu aqui, eu acho. Aí ela pegou e veio me falar: “Nildinha, você tem que dar um jeito no Bira mais Caçula que ninguém tá dormindo à noite com rádio...” nesse tempo era radinho “...com rádio ligado”. Agora acontece tanta coisa, passaram uns anos ninguém liga. Eu falei: “Pode deixar, dona Palmira”. Aí deixei escurecer, mulher. Não tinha luz mesmo, tudo escuro. Fui lá, mas peguei ela, mas bati, só que teve um erro, minha filha mais velha que é Leonice foi comigo. Só que ela não me ajudou, ela tava puxando meu cabelo. Leonice pensando que tava puxando o cabelo da mulher e meu cabelo tava maiorzinho um pouquinho e tava puxando era o meu, e ela pensando que era o dela. Eu falei: “Não”. Aí que ela viu: “Não, mamãe, é o seu.” “É claro, você tá puxando é o meu”. E eu debaixo dela batendo na Caçula e ela puxando o meu pensando que tava ajudando. Aí nisso acabou, sabe? Acabou, ele ficou pra lá, depois ele arrumou outras e sumiu, graças a Deus. Morreu na Bahia, não morreu aqui, morreu em Formosa do Rio Preto, que a família dele era de lá. Ele bebia muito, ficava aqui na pracinha aqui bebendo, mas já faz mesmo mesmo tempo, tem uns dois anos, nem isso, né? As meninas pelejavam com ele: “Papai, larga disso”. Ele aposentou, tudo. “Larga dessa cachaça, papai”. E ele arrumou outra mulher que bebia mais que ele. Eram os dois, sabe? Caído por aí bêbado. Aí pronto. Foi embora pra Bahia, morreu. Amém.
P/1 – E você não casou de novo?
R – Ave Maria. Eu fiquei foi nova quando eu separei dele. Nem 40 anos eu não tinha, moça. Vou arrumar diabo pra me coçar, não. Não arrumei não. Até que naquele tempo ainda tinha até uns homens mais ou menos, mas hoje não vale a pena, não. E outra coisa, eu não arrumei, não. Sabe por que eu não arrumei? Quando eu separei dele tinha os meus meninos tudo pequeno, eu queria dar um bom exemplo pra eles sabe? Porque se eu fizesse alguma coisa errada, se eles fizessem eu ia reclamar, e aí? A senhora não fez? Não é não. Aí até hoje, uai. Tô aí firme e forte, graças a Deus.
P/1 – Nildinha, e você trabalhava quando chegou aqui?
R – Trabalhei. Não. Quando eu tava com ele ainda não trabalhava, não. Depois que eu separei dele, porque esse pessoal pensa que mulher trabalhando, sabe, aqueles abestalhados de antigamente, não presta, é isso, eles colocam isso e aquilo, mas não é bem assim. Coloca chifre, aí vai trabalhar e aqui mesmo que a gente pega umas caroninhas mesmo, aí eu não trabalhava. Eu trabalhei sim. Trabalhei na Ciplan, eu trabalhei uns tempos na Ciplan e saí por causa dele, porque ele não tava dando sossego, aí saí. Eu comecei a trabalhar no GDF, trabalhei com a Tereza, trabalhei uns anos aí, trabalhei pra eles acho que foram uns 15 anos, por aí, no GDF. Aí aposentei e tô aqui.
P/1 – Depois que você separou dele aí conta um pouco...
R – Ah, a vida foi outra, moça. Aí eu suspirei.
P/1 – Conta um pouco dos seus trabalhos, Nildinha, depois que você separou dele.
R – Olha, eu trabalhei na LBA, acho que vocês nem sabem o que é isso, Legião Brasileira de Assistência Social. Trabalhava de voluntária. Meu negócio não é tanto dinheiro, meu negócio é ajudar o povo. Aí trabalhei, trabalhei na administração de Sobradinho. Trabalhei na de Sobradinho II.
P/1 – Também como voluntária?
R – Não. Voluntária só na LBA. Trabalhei numa creche antes da... No tempo da LBA, que era da LBA mesmo a creche aqui. Eu falei pra você que eu trabalhei numa creche, né? Comecei no voluntário, depois ganhando um pouquinho aí. Eu sei que eu me virava. Lavei até roupa pros outros, minha filha. Eu lavava até roupa pros outros pra eu ganhar meu dinheiro pra não depender de ninguém. Porque é bom, os filhos ajudam, mas é ruim filho ajudar, né? Eu não tenho esse negócio.
P/1 – E você continuou trabalhando com bordados também?
R – Como é que é?
P/1 – Você continuou trabalhando com bordados também, com costura?
R – Ahã. Com tudo. Tô aí.
P/1 – Nildinha, você disse que Fercal melhorou muito do que era.
R – Oxente, melhorou.
P/1 – E como que aconteceram essas mudanças? Como que vocês conseguiram isso?
R – Não foi fácil, não, que eu falei pra você que nós tínhamos o tal de carneiro que a gente puxava a água pra cá, depois nós fechamos a rodovia em 84, não foi Tereza? Em 84, por aí. Aí nós tínhamos um governador muito bom, tá? Nesse tempo nem era votado, era interim, que era o Joaquim Roriz. Nós fechamos a rodovia no dia 30 de abril.
P/1 – De que ano?
R – Quando foi no dia primeiro... Não. De março. Minto. Foi no dia 30 de março. Quando foi parece que no dia 31 tava ele aí com as máquinas tudo. Tava com as máquinas que eu falo e os homens, né? Tava Caesb, CEB, segurança, telefone, a Telebrasília nesse tempo, que era Telebrasília, viu?
P/1 – Que ano foi isso, você lembra, Tereza, qual o ano...
R – 84.
P/1 – Tereza, não. Nildinha.
R – 84, 89, sei lá. Que nós fechamos a rodovia foi em 84. Sabe por que eu sei? Porque sua tia... Era tia sua? Não. Não é não. Era parente... Tinha ganhado a menina dela bem aqui na minha área, nós doidinhas querendo, doidinhas que já amanhecesse o dia pra gente fechar a rodovia e ela aqui sofrendo pra ganhar a neném, nós enrolando-a para arrumar um carro pra levar pro hospital, a Preta. Por isso que eu lembro. Por aí. Pois é, por aí. Aí melhorou bastante, ele veio...
P/1 – Nildinha, mas agora então conta assim se você lembra desse dia que vocês foram fechar a pista. Conta um pouco assim dos detalhes, como que você participou disso.
R – Uai, nós participamos de tudo. Aí veio o pessoal, a gente saía doida, ia atrás do pessoal mostrando. Primeiro a reportagem veio, nós levamos as reportagens nos lugares mais feios mesmo, nas águas só a lama que a gente bebia nos “garrinchos” ali. Nos lugares piores nós levamos a reportagem, tá? A reportagem veio, passou por aí, nós não tínhamos nem televisão, não passava nada, a gente não via, só via o jornal. Aí que veio, o governo começou.
P/1 – Sim, mas eu digo você, Nildinha, fez assim, como que você participava desse momento?
R – Uai, ajudando.
P/1 – Como que você participou? Conta alguma coisa assim que você lembra, você ali.
R – Olha, eu não saía de cima. Assim, eles estavam trabalhando eu tava em cima falando: “Tem que fazer isso primeiro ali”. Eu era a presidente da associação nesse tempo, eu tinha mais, sabe? Aí vamos fazer isso, fazer aqui, primeiro isso, primeiro aquilo. Aí teve um problema também, que não tinha os canos, a Caesb não tinha os canos. Vamos fazer vaquinha pra gente comprar esses canos. Aí fizemos a vaquinha, arrumamos um caminhão pra ir buscar esses canos. Tudo isso. E eu no meio.
P/1 – Nildinha, e como que você se colocou, como que aconteceu você virar presidente da associação?
R – Já existia a associação, né? Tem o Jacinto que era o presidente da associação, aí eles pegaram e me convidaram aqui na igreja da Assembleia de Deus, eu fui, fui eu e a Benedita, aí na votação eu ganhei. Aí pronto. Ganhei e fiquei, saía e entrava, saía e entrava.
P/1 – Mas pra você ser presidente da associação outras pessoas participavam lá?
R – Participava. Tem a diretoria, não é?
P/1 – Sim, mas muitas pessoas participam da associação.
R – É.
P/1 – E pra você ficar como presidente, como que você atuava na associação? Porque nem todo mundo fica presidente, né?
R – Mas eu não, eu conseguia, eu ia atrás das coisas. Eu sofria muito. Antes da gente fechar essa rodovia a gente saía atrás da Caesb, atrás da CEB, atrás desses órgãos tudinho, ninguém, minha filha, ninguém nem ligava pra gente. Eu saía de manhã, eu saía de manhã junto com a Jovina, seu Adão, seu Adão já até morreu, a gente ia lá, minha filha, e nada, nada, nada, nada. Aí por isso que nós fechamos a rodovia. Foi onde eles vieram conhecer a Fercal, porque a gente...
P/1 – Quem que resolveu assim: “Vamos fechar a rodovia”?
R – Fomos nós mesmos, a turma nossa. Foi Ricardo, Tereza, pessoal tudinho da comunidade. Nós não tínhamos rádio, não tínhamos nada aqui, nós fomos na Rádio Capital lá no Plano, levamos tudinho direitinho, escrito tudinho a mão. Não era, Tereza? Tudo a mão: “Tal dia vamos fechar a rodovia, isso e isso, queremos isso, queremos aquilo”. Tudinho, sabe? Aí foi assim que nós fizemos.
P/1 – Levaram pra quem isso escrito?
R – Levamos lá pro locutor da rádio. Porque nós não tínhamos...
P/1 – E na hora de fechar a rodovia você se lembra daquele momento assim?
R – Lembro. Lembro-me daquele momento, nós pegamos, nem dormimos, to falando pra você, nós nem dormimos aqui. Ficamos doidinhas, doidinhas e fechamos a rodovia com madeira, com pau, depois com... Colocamos madeira, colocamos pneu, fechamos a rodovia. Fechamos a rodovia, aí começaram a chegar as reportagens. To te falando.
P/1 – E parou o trânsito?
R – Parou. Mas rapaz, parou o trânsito e nós lá. Não vamos fechar quando vier... Antes disso, antes, fechamos a rodovia, aí quem era nesse tempo, o padre Joana era o administrador de Sobradinho I. Foi onde o Joaquim Roriz viu a manifestação lá, aí falou assim: “Governador quer vir aqui, mas como vem? Como é que vai chamar o povo?” “Pode deixar.” “E vai ser onde?” “Pode deixar com a gente que nós conseguimos”. Aí saiu andando, não é Delson? Saiu uma turma pra um campo, saiu outra turma pra outro, pouquinha gente porque naquele tempo não tinha quase ninguém, né? Arrumamos o seu Bil, que ele já até morreu, conseguimos o caminhão do seu Bil pro governador subir. Não tinha um lugar pra ele, mas não deixou de vir, não. Ele queria que ele não viesse, sabe? A gente falou: “Não. Ele vai vir”. Aí pegamos e conseguimos o caminhão do seu Bil, aqueles caminhões de carroceria, até amarelo esse caminhão. Deixamos, colocamos lá, aí chegou o Roriz numa poeira bem aqui nesse campinho agora onde é a feira, de helicóptero. A poeira comia tudo, ninguém via nada, nada, nada de tanta poeira. Falei: “Mas, rapaz, não vem é o que?”. Mas não foi fácil, não, a gente sair atrás desse pessoal, não. Eu tenho foto dele, tenho foto dele com a mãe dele, a mãe dele já morreu.
P/1 – Desse dia?
R – Eu tenho tudinho.
P/1 – Mas desse dia?
R – Desse dia. Eu não achei aí pra mostrar pra vocês, se tivesse falado pra mim tem a mãe dele, tem um monte de gente tudo daqui da comunidade. Nós tudo em cima do caminhão. Não porque não tinha lugar pra ir ele não vinha? Mas, rapaz, nós demos um jeito, demos uns pulos aí, conseguimos foi tudo.
P/1 – E aí quando ele chegou?
R – Ele veio, ish Maria, foi o maior... Não tinha uma multidão de gente, não, porque não tinha muita gente, naquele tempo era pouquinha gente, mas deu muita gente. Aí um falava uma coisa, falava outra, rapaz, no outro dia começaram os trens a chegar, as máquinas a chegar. E estamos aí.
P/1 – E aí veio tudo ao mesmo tempo, luz, água?
R – Veio. Veio tudo. Foi. Primeiro a CEB veio, você ver como é que são as coisas, eu correndo, nós correndo pra energia pros outros e eu quase fiquei sem.
P/1 – Por quê?
R – Sabe por quê? Porque isso aqui era cercado de arame, sabe? Era de arame mesmo, pensou que era particular. Aí todo mundo com energia e eu sem. Falei: “Não”. Foi lá, os meninos pegaram e arrancaram pra poder colocar. Foi.
P/1 – Aí você diz, primeiro chegou, aí você ia contar como que tinha chegado aqui.
R – Chegou a energia, chegou a água, chegou tudo de uma vez, não foi, Tereza? Foi tudo de uma vez.
P/1 – Telefone também?
R – Telefone. Telebrasília demorou mais um pouquinho. Telebrasília. Posto... (interrupção) O posto policial, veio o posto policial também, era ali embaixo, era de tábua, o postinho policial, mas tinha, mas veio. Veio tudo.
P/1 – Agora, nessa época ainda era Fercal, não era separado de Sobradinho ainda?
R – Era. Era Fercal, mas era Sobradinho, era um, o Sobradinho I.
P/1 – Sei. Era Sobradinho I.
R – Sobradinho I porque o administrador daqui era de Sobradinho I. Só que a gente não via ninguém aqui, não, não vinha administrador, não vinha ninguém, não era Delson, vinha? Era difícil de vir administrador aqui.
P/3 – Eu queria escrever exatamente isso, porque naquela época, tava falando aí, não existia nem Sobradinho II ainda.
R – Não tinha Sobradinho II, só tinha Sobradinho I.
P/1 – Que era aqui?
R – É. Aqui é mais velho, aqui é mais velho do que Sobradinho I.
P/1 – Do que hoje Sobradinho?
R – Eu acho que isso aqui, a Fercal, é mais velha que Sobradinho I também. É porque colocaram uma data aí mais ou menos assim, sabe? Mas isso aqui é antigo, Fercal.
P/1 – Hoje Fercal é separado do que a gente chama de Sobradinho?
R – É.
P/1 – Mas você tá dizendo que aqui, pelo que você conheceu, é mais antigo ainda do que ali.
R – É. Muito mais. Sobradinho...
P/1 – Começou antes?
R – É. Aqui foi. Sobradinho II é novo.
P/1 – Pode perguntar pra ela pra ela falar. Pergunta pra ela que ela responde isso que você tá falando.
P/3 – Porque ela tá dizendo aí acha, mas não é acha... (interrupção)
P/1 – Nildinha, até pra eu deixar registrado pras pessoas que forem ouvir entenderem, você disse que aqui é mais antigo, aí você ia começar a falar a gente interrompeu, mais antigo do que...
R – Do que Sobradinho I.
P/1 – Aqui era chamado Sobradinho II, não?
R – Não. Aqui era Sobradinho... Como é que é o nome daqui, meu Deus? Era Sobradinho... Eu tenho até uma escritura ali do Manoel Baiano que era Sobradinho não sei o que. Como é que era, Tereza, o nome? Sobradinho...
P/1 – Não precisa se preocupar.
R – Era não sei o que lá do Sobradinho. Tem até um documento ali. Fazenda Sobradinho. Era. Fazenda Sobradinho.
P/1 – Entendi. E lá então é mais recente que aqui mesmo, o Sobradinho hoje que a gente chama.
R – No papel não é, não, mas... No papel isso aqui...
P/1 – Agora, a Rua do Mato...
R – É mais antiga.
P/1 – Fazia tudo parte aqui. Quando vocês faziam esses movimentos era pra toda essa região?
R – Pra tudo. Aqui a gente... Aqui... Eu tô falando daqui já, eu não tô falando da Rua do Mato, aqui a gente não tinha um local pra fazer festa, a gente fazia festa ali nos matos ali, ó. Ali onde é o campo hoje, a gente fazia festa junina era lá. E era bom, minha filha, era melhor do que hoje as festas. Bem boas as festas.
P/3 – Nildinha, a Márcia tava falando aqui no começo lá da Rua do Mato, naquele começo que vocês começaram a lutar pela Fercal, como é que foi a sensação do primeiro protesto assim que vocês fecharam a BR que pra mim, caramba, é muita emoção assim. Quando se vai lutar qual foi a sensação assim que você sentiu? Eu tô fazendo alguma coisa pra poder aqui melhorar.
R – Eu sei. A gente se sente bem porque a gente tá fazendo o bem. A gente não só pode olhar pro lado da gente, tá? Então olhava pro lado da comunidade. É por isso que nós fechamos lá e conseguimos as coisas não só pra mim, pra comunidade. Eu gosto muito de ajudar, sabe? O que eu posso... Tem coisas que eu não posso, mas consigo. Consigo...
P/1 – Como assim?
R – Uai, conversando, pedindo, tal, e consegue as coisas.
P/1 – Você diz eu não posso como?
R – Não posso assim, tem coisa que alguém pede pra você e naquele momento você não tem pra dar, mas você consegue. Você sai com os vizinhos, conversa com um, conversa com outro, aí consegue até mais coisas, ajuda o povo. Olha, eu ajudo uma família lá no Bananal que tinha três filhos deficientes. Agora morreu uma, ficaram dois. Tem vezes que eu fico assim: “Menina, isso aqui tá muito pouco pra eu levar”. Aí eu saio, vou nos meus filhos aqui, vou acolá, vou a um, a outro e levo muita coisa pra eles. Chama Luzia, o nome dela.
P/1 – Nildinha, e você contou esse momento que chegou água, luz, todas essas...
R – Depois nós conseguimos a água, luz, depois veio a feira. Nós conseguimos a feirinha, não era aquela feira, nós conseguimos aqui, a feira era aqui na praça aqui, sabe? Aqui nos matos mesmo ali. Conseguimos a feirinha e era...
P/1 – Como é que foi pra conseguir essa feira? Conta.
R – Foi nós conversando. Tinha o gerente, era Rômulo Ervilha, não era? Aí nós conseguimos fazer uma feira, o pessoal querendo aí por quê? Qualquer coisa a gente tinha de ir pra rua e fazia uma feira, o pessoal procurava muito. Aí conseguimos, fizemos o cadastro bonitinho, direitinho. Aí cadastramos o pessoal e conseguimos essa feira aí.
P/1 – Vocês cadastravam quem?
R – As famílias. As feirantes. Os feirantes.
P/1 – Eles produziam nas suas...
R – Uns sim, outros nãos. Porque começou, começou gente lá do Córrego do Ouro, Catingueiro, isso aí tudo é fruto de lá. Era. Depois saíram, acharam difícil também, não tava...
P/1 – E pra conseguir essa feira, você disse que era muito difícil, o que vocês tiveram que fazer pra até chegar a feira?
R – Isso que eu tô falando. Vamos conversando, aí vamos conversando, vamos conversando com a comunidade, eles procuravam a gente, aí procurava a gerência, não era Tereza? Não era administração, era a gerência e nós tínhamos um gerente excelente, muito bom, sabe? Aí conseguimos foi através disso aí, mas a comunidade procurando a gente. Era a comunidade. E a gente também ia a eles também, ia às vezes lá: “Vocês vão querer? Vamos fazer feirinha.” “Vamos.” “O que é que você vai vender?”. Começou assim, sabe? Vendendo uma coisinha, o outro outra, depois não deu. Era assim, comparação, eu vendia um cachorro quente, o outro já não vendia, vendia outra coisa, mas aí depois não deu, não, aí todo mundo já... Começou assim, um vendia roupa usada, o outro vendia roupa nova, outro vendia isso, vendia aquilo, mas aí não deu assim pra fazer separar. Todo mundo vende o que quer. Hoje todo mundo vende o que quer.
P/1 – Agora, continua a feira até hoje?
R – É. A feira coberta agora, né? Saiu dali, aí conseguiu fazer a feira, conseguiu cobrir a feira.
P/1 – Vocês também tiveram que...
R – Também. Tudo tem mãozinha nossa, não é não? Tudo tem. Saiu a feira daqui e foi pra lá.
P/1 – Você continua atuando assim, Nildinha?
R – Como é?
P/1 – Você continua nos movimentos?
R – Mesma coisa, eu não... Oxe. Pra mim, olhe, pra mim uma coisa que a gente viu nascer, ave Maria, aquilo ali pra mim é uma coisa boa, ótima, não é não? Eu adoro ver essas coisas. Nós temos o centro comunitário ali, eu tô muito triste com o centro comunitário porque aquele centro comunitário era um centro comunitário, sabe? Nosso, suor nosso, sabe? Conseguimos tudinho lá, arrumamos ali tudinho, arrumamos direitinho junto com o Sálvio, arrumamos tudinho o centro, um centro comunitário. Tinha cursos, tinha de tudo, de tudo, de tudo, costura, tudo, tudo, tudo tinha ali naquele centro.
P/1 – E agora?
R – E acabou. Tem só o Torão, não é Tereza? Eu peguei, quando eu entreguei a associação, entreguei a associação bonitinha com tudo dentro, tudo, tudo, tudo, sabe? Tudo que eu falo é de panela a computador, tudo, tudo. Vai lá agora pra você ver o centro comunitário. Acabaram com o centro comunitário.
P/1 – Mas, Nildinha, o que você acha que acontece pra mudar tanto assim?
R – Ah, minha filha...
P/1 – Ou o que aconteceu?
R – Aconteceu o seguinte, porque elegemos um presidente da associação que não importou com a associação. Ele pensava assim, eu acho que tem gente que pensa presidente de associação ganha dinheiro. Não ganha, não, minha filha, você tira do seu, tá? Aí ele pegou, tá aí, não sei nem como é que tá. Tem sabe quantos anos que ele tá sendo presidente da associação e que não pode, que nem existe mais essa associação? Quatro anos e cinco meses.
P/1 – Antes não era assim?
R – São só três anos. Aí tem nova eleição e não teve até agora.
P/1 – Não teve nova eleição? E os moradores? Como que reagem?
R – Uai, vai lá, fala: “Vou fazer uma reunião, vou fazer isso, fazer aquilo”. E nisso entregou pra outros lá. Quem tá lá tomando conta é... Não vou falar o nome, não, porque...
P/1 – E os moradores têm procurado, têm se organizado?
R – Eles procuram a gente, falam: “Por quê?”. Olha, aquele centro comunitário vinha gente da Rua do Mato fazer festa, alugava, a gente alugava. Tinha vezes que a gente nem alugava, falava, conforme a pessoa, fazia aniversário, casamento, tudo, missa, culto, sabe? De tudo ali tinha. Aí a gente... Bazar. Tinha coisa que a gente nem cobrava, falava: “Não, você traz um material de limpeza”.
P/1 – Nildinha, agora assim, vocês têm, você no caso ou mais alguém aqui, você tem intenção de movimentar de novo?
R – Eu queria, sabe? Eu queria, só que meus filhos não querem que eu mexa mais. Eu queria.
P/1 – E quando eles falam que não querem como que você faz?
R – “Ah, mamãe, mexer com isso mais não, mamãe. A senhora já tá velha. Não precisa mais, não, mamãe. Mexe com isso mais não. Era dor de cabeça, a senhora vivia com dor de cabeça no tempo do centro comunitário”. Falei: “Mas eu gosto, sabe?”. Eu não fico quieta, não. Eu vou lá, cutuco direto. Esses dias mesmo eu fui lá. Falo: “Gente, como é que vai ficar isso?”. Como é que vai ficar esse centro comunitário? Um centro comunitário só uma pessoa que é dona dele? Duas pessoas? Não é, menina, ali é um centro comunitário.
P/1 – E tem alguma coisa que é possível fazer ainda?
R – Tem. É só o rapaz, ele, a comunidade reunir e fazer nova eleição. Mas eles estão com um negócio de mudar o estatuto, Tereza, fazer não sei o que, não sei o que.
P/1 – Nildinha, pra vocês reunirem, não agora, mas na época, como vocês conseguiam reunir, mobilizar as pessoas? O que você fazia pra conseguir que as pessoas participassem?
R – Conseguir as coisas? Olha, vou falar pra você, primeiro a gente conseguiu lá o espaço, depois o Sálvio ajudou a gente. Sálvio é da Pedreira Contagem. Depois a Tocantins, quando eu entreguei, eu tava falando pros meninos aqui, quando eu entreguei o centro comunitário, eu entreguei uma biblioteca, Tocantins que doou as prateleiras pra nós no centro comunitário. A Tocantins doou uma televisão, a Tocantins doou... Eu falo Tocantins. Votorantim, né? Doou DVD. Menina, muitas coisas, muita coisa. Computador zerado eu deixei lá quando eu entreguei a associação.
P/1 – Mas o que eu quero... Entendi.
R – E não tem nada disso lá.
P/1 – Mas eu pergunto pra você, Nildinha, como na época que vocês, você e os seus companheiros conseguiam, as coisas eu entendi que vocês se mobilizavam, mas como é que vocês conseguiam reunir a comunidade?
R – Uai, convidando. Convidando as comunidades: “Gente, nós vamos ter uma reunião, vamos eleger Fulano de tal, vamos conversar com eles, vamos ver quem...”. É assim que a gente faz, a gente sai nas casas, conversando com o povo, na rua mesmo.
P/1 – E o pessoal se animava participar? Não tinha assim: “Ah, eu não vou, não”?
R – Participava. Não. No começo, ish, era uma beleza. Depois foi mudando, mudando, mudando, ninguém, sabe? Mas ali foi muito bom. Eu entregava sopa, não era Tereza?
P/1 – A associação que entregava?
R – Sopa lá na associação. Eu como presidente da associação vinha uma sopa, a gente entregava sopa, entregava enxoval, serviço social, entregava tudo, fazia tudo. Quando a enchente desabrigou o pessoal foi lá, que eles ficaram lá no centro comunitário, 14 famílias.
P/1 – Quando foi essa enchente, Nildinha?
R – Chuva, né? A enchente veio e carregou...
P/1 – Não, quando? Quando?
R – Foi em 2006. Aí a enchente veio, a grandona mesmo foi nesse, mas sempre dava as enchentes, sabe? Sempre, sempre, sempre, mas essa de 2006 foi a... Aí tiraram as casas do pessoal, veio...
P/1 – Era onde tinha área de risco?
R – É. De risco. Área de risco, aí tiraram as casas tudo, aí ficavam 14 famílias ali no centro comunitário. Eu como presidente nem dormia de noite, o pessoal direto, direto, já tinha telefone, foi agora em 2006, direto me ligando: “Nildinha, Fulano tá brigando aqui”. Eu saía doida, minha filha. Chego lá casal brigando, outros brigando por causa dos locais: “Ah, esse lugar aqui é melhor do que o meu. Eu quero é esse”. Era uma coisa. Eu sofri com esse pessoal. Aí ganhamos muita doação, pode ver que tem foto que tem as doações, a gente entregando as doações pro povo. Era isso. E a associação é pra isso, você é presidente da associação não é pra você, não, pra ganhar dinheiro, não. É pra ajudar a comunidade, não é? Mas não é assim que eles pensam. Tem gente que não pensa, não tá pensando isso. E tá aí o centro comunitário. Comparar, tá esse centro comunitário ali, o conselho tutelar está atrás de um local, por que não ali? Por que não ali?
P/1- Vocês como moradores, vocês podem cobrar da associação alguma atitude? Podem cobrar da associação, como moradores.
R – Pois é. Eu fui lá esses dias, conversei até com, não é Delson, aquele dia, com o deputado, tudinho, falou que ia ver, até hoje. Isso aí. Tem mais?
P/1 – Fala, Nildinha, você falou baixo, não deu pra ouvir.
R – Eu tava conversando com a menina aqui.
P/1 – Você falou, eu falei: “Mas não dá pra ir lá cobrar?”. Aí o que você falou?
R – Então, já pensei, nós falamos, já conversei com o atual presidente que não é nem presidente mais porque já passou, ele falou: “Tal dia”. Ele marca até o dia: “Tal dia eu vou lá, vou fazer isso, vou fazer aquilo”. Até que o Severino também falou: “Vamos ver. Vamos por isso pra frente, gente, porque a gente não pode perder aquele espaço, não. Aquele espaço é nosso, não é de Fulano nem Cicrano, não. Aquele espaço é nosso, é da comunidade”.
P/1 – Nildinha, e hoje assim, como é que tem sido o seu cotidiano? Que a gente já tá chegando no final da entrevista.
R – Como o que você falou?
P/1 – Como é que tem sido o seu dia a dia hoje, suas atividades?
R – Meu dia a dia, amanheço o dia, vou, converso com uma, converso com outro. Saio, vou na administração ali, vou na casa de um vizinho ali conversar, vou aqui na pastelaria aqui conversar também, perguntar como é que foi e tal. Todo dia eu dou uma volta aqui, todo dia eu tô andando aí. Duvido quem não me vê aí nessa estrada conversando. Visitando, que eu adoro visitar, sabe? E dia de quinta-feira eu vou pra igreja.
P/2 – Dona Nildinha, e os netos? Como foi a chegada dos netos? Porque teve os filhos, a senhora disse que os seus filhos já são todos casados, né?
R – Graças a Deus.
P/2 – E os seus netos? Quantos netos a senhora tem?
R – Falar igual o menino, eu fui num casamento, falou: “Fulano vai casar”. Falou assim: “Pena ele casar, porque Deus me livre de casamento hoje em dia, viu?”. Eu podia dar os meus pêsames. O pessoal fala assim: “Parabéns”. Não, foi assim, sabe? Não sei quem casou, aí fui dar os parabéns, aí eles me falaram: “Dá parabéns, não. Dá meus pêsames”. Meus pêsames.
P/2 – Quantos netos a senhora tem?
R – Eu tive meus filhos, que eu já falei pra vocês. Tenho neto.
P/1 – Quantos?
R – Eu tenho 14 netos, graças a Deus. Tenho dois bisnetos, a coisa mais linda. E não sei se eu vou ainda ver os tataranetos. Não sei, Deus é quem sabe, né?
P/1 – Pelo jeito vai.
R – Todos moram aqui, graças a Deus, todo dia a gente tá conversando, vendo: “E aí?”. Agora no momento mesmo a minha filha tá viajando, tem uns viajando. E é desse jeito, a vida nossa...
P/1 – Nildinha, e os seus netos, como que eles veem agora a Fercal? O que eles acham de Fercal agora?
R – Ah, meu filho, fala da Fercal pra eles pra você ver. Todos gostam da Fercal. A Maiara, essa menina aqui, ela falava assim, aff, meu Deus do céu, quando tava estudando, ficava lá, né? Muita gente ficava com vergonha de falar que morava na Fercal.
P/1 – Ela estudou onde?
R – Ela estudava na UNB, quando ela se formou, ela é formada, essa aqui é advogada.
P/1 – Formada em que?
R – Advocacia. É formada. Aí ela pegou disse que o pessoal ficava com vergonha lá esperando o ônibus lá na rodoviária, vergonha de falar que morava na Fercal. Mas ela fala: “Eu não. Eu moro lá, eu tenho que falar que moro é na Fercal mesmo”. Aí ela falava: “Ave Maria, eu não quero casar com gente daqui da Fercal, não, vovó.” “Uai, por quê? Não é homem, não, também não? Vai e casa, minha filha”. Essa menina minha é casada, essa neta, é casada com o filho do seu Sebastião Rosa.
P/2 – Que legal.
R – E essa daqui é casada também com gente daqui também. Essa daqui namora...
P/1 – Daqui.
R – Daqui. Tudo daqui.
P/1 – E essa que se formou advogada hoje ela não tem mais vergonha de dizer que mora? Ela tinha um pouco?
R – Ela não tem. Ela não tem vergonha mais nada. Isso no começo, todo mundo falava e ela lá esperando o ônibus, esperando o ônibus da Fercal.
P/1 – E agora?
R – Agora não. Agora ela tem...
P/1 – Estão todos morando aqui? Moram aqui?
R – Moram aqui. Todos os meus netos moram aqui. Meus bisnetos aqui, meus filhos aqui e eu aqui.
P/1 – Nenhum fala: “Ah, eu quero sair daqui”. Nenhum fala?
R – Fala pra ver. Ninguém. Ninguém. Porque a Fercal é boa, gente. A gente reclama porque não tem ninguém, reclama de alguma coisa, mas aqui, minha filha, parabéns pra Fercal, a Fercal é outra. Não é como antigamente, como eu já falei pra vocês que a gente ia pros lugar, pras festas, voltava sozinha. Hoje em dia não dá mais porque aumentou a bandidagem também, tem muita coisa ruim também.
P/1 – Nildinha, a gente já tá terminando, eu vou só perguntar se um dos meninos, dos jovens querem fazer alguma pergunta e depois nós vamos encerrar.
R – Pode falar que se eu souber eu falo.
P/1 – Vocês querem?
R – Veio uma neta minha agorinha aqui, vocês não falaram. Ela veio da faculdade.
P/1 – Nildinha, a gente já tá terminando, tem alguma coisa, algum acontecimento que você queria muito contar que a gente não perguntou?
R – Ah, meu Deus do céu. Assim, pode ser que a gente sentiu muita falta assim, tal e tal? Não. A gente aqui, a gente agradece muito ao Manoel Baiano. Manoel Baiano era um morador antigo aqui, o que a gente hoje tem aqui, uma água que fica ali a bica foi o Manoel Baiano. Ele morreu, mas deixou esse fruto aí pra comunidade. Porque nós temos água, a nossa água não é uma água potável, não é água doce, não. Daqui não. Não é água doce. Então quem não pode comprar água mineral vai aqui na bica do seu Manoel Baiano e tá lá, e pega água a vontade. Pode passar lá e ver lá duas torneiras lá, na rua ali, aqui logo na frente. Isso aí marca a gente muito, sabe? E ele foi uma pessoa muito boa.
P/2 – O campo, né, que ele deu.
R – Só que o campo agora tá com um probleminha, né?
P/2 – Mas foi fruto dele, né, pro lazer.
R – Foi ele que deu o campo. Tudo. Não só o campo nem só essa água como aquele poço artesiano que tem ali em cima, foi seu Manoel Baiano que deu o terreno, eu tenho até o documento que ele me deu, aquele tempo eu era presidente da associação. Ele ainda falava assim, falava: “Olha, só você mesmo pra eu dar documento de minha terra viu, Nildinha?”. Aí me deu.
P/1 – Como assim?
R – Hã?
P/1 – Como assim só você?
R – Porque ele não dava documento pra ninguém, da terra dele. Pra ninguém. Ele deu pra eu conseguir o poço artesiano lá em cima, nas curvas. Nas curvas, não, na caixa d’água. Caixa d’água.
P/1 – E o campo a senhora disse que...
R – Também. Ele também foi muito bom. Esse pessoal aqui, esse pessoal que mora assim nas curvas, que o pessoal fala curva, aqui até ali pra baixo da igreja era tudo dele e o pessoal invadiu tudinho, ele deixou. Aqui o desenho todinho aqui, caixa d’água, invadiram, alguém invadiu e alguém vendeu pra outros. Agora fala que é dono. Invadiram, mas ele não importou, não. Ele não fazia conta de nada, seu Manoel Baiano. Por isso que morreu tão cedo. Muito bom.
P/1 – Bacana.
R – Tá bom?
P/1 – Nildinha, e pro futuro assim você tem algum sonho ainda?
R – Tenho, menina. Nós temos são muitos. Eu tenho um sonho aqui, nós termos um posto de saúde, pelo menos um posto de saúde, que nós não temos. Melhor um hospital. Um hospital. Uma delegacia decente, que nós não temos uma delegacia, nós temos um postinho aqui, mas não temos uma delegacia. Um colégio, que nós não temos aqui um colégio bom, sabe? Tem o Engenho Velho aqui, é só até a quarta série. É isso. Tem mais coisinhas por aí, mas esse daí, a saúde em primeiro lugar, educação e segurança. Não é?
P/3 – Eu ia perguntar, já que a senhora falou de posto de saúde, e a senhora assim, a senhora ainda tá nova, né, toda a saúde inteira. Eu conheço gente que é mais novo que a senhora que tá com a saúde pior. A senhora tem planos assim pra entrar em alguma coisa na Fercal? Plano pra futuro continuar ajudando em alguma ONG, montar alguma obra social.
R – Vou te falar, eu gosto de ajudar, agora, pra eu ter uma responsabilidade mesmo minha mesmo assim, não. Isso aqui ainda eu posso ajudar, se você precisar de mim pode vir aqui. Nildinha, vai lá, você conhece Fulano, Cicrano, tal, tal, vamos lá comigo?”. Eu vou, mas pra eu entrar assim num negócio.
P/3 – Responsabilidade. Hoje quer só curtir, né?
R – Não, e outra coisa, sabe, a gente é aposentado, aí os filhos têm férias? Tem. “Vamos mãe?”. Aí eu vou. Os netos: “Vamos, vó?” “Vou”. É por isso que eu não quero pegar, ter mais uma responsabilidade pra depois marcar e não cumprir. Mas se precisar de alguma coisa assim, sabe, vir: “Nildinha, você tem isso e isso aqui”. Eu tenho muita coisa que eu não sabia, se soubesse, de fotos, eu tinha procurado umas fotos antigas aí. Eu não sabia.
P/1 – Mas a gente... Você pode agora procurar, principalmente aquela do caminhão que você falou que tem.
R – Ah, do caminhão com o Roriz em cima e a mãe dele, todinho, eu vou ver se eu acho.
P/1 – A gente vai continuar se encontrando e aí essas fotos, não muitas, mas essas principais a gente continua recolhendo.
R – Tem nós, né? Você tem? Você deu? Pois é, eu tenho, tá por aí.
P/1 – Nildinha, agora nós vamos encerrar mesmo, o que você achou de fazer essa entrevista, contar história? Como é que você se sentiu?
R – Foi ótimo. Gostei. Parabéns pra vocês, pra Votorantim que lembra mesmo de nós, né? Vem lembrando, mesmo fazendo nem uma visitinha, né?
P/1 – Mas o que você achou...
R – Mas eu não posso nem falar, a Votorantim é igual eu falei pra você, da Tocantins, eu tinha um filho, tenho neto, né, Tereza?
P/1 – Mas o que você achou de contar a sua história aqui e gravar a sua história?
R – Achei bom. Se tiver mais, ficar até o dia todinho conversando, eu falo do jeito que eu sou, que eu falo. Não sei falar tan, tan, do jeito que eu sei falar eu falo, do jeito que eu sou.
P/1 – Tá ótimo. Pra nós foi muito bom ouvir sua história. Obrigada.
R – De nada.
FINAL DA ENTREVISTA
Recolher