P/1 - Márcia Ruiz
P/2 - Sueli Andrade
R - Fernando Telles
P/1 – Boa tarde, Fernando. Eu queria que você me dissesse o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Fernando José Costa Telles. Eu nasci no Rio de Janeiro, no dia 7 de março de 1967.
P/1 – E o nome dos seus pais, Fernando?
R – Meu pai chama-se José Telles de Siqueira Souza e a minha mãe, Iedalva Costa Telles Souza.
P/1 – E você sabe a origem do nome da sua família?
R – É portuguesa, né? Uma família que veio de Portugal. Meu bisavô era português - do lado do meu pai. E a família da minha mãe também é de origem de Portugal. E é Costa. Quer dizer pessoa que parou na costa, não foi para a selva; então não virou Silva, né?
P/1 – (risos)
R – Então é o Costa e o Telles. Mas, tudo português.
P/1 – E qual é a atividade profissional dos seus pais?
R – Meu pai, hoje em dia, é aposentado. Foi empreendedor a vida inteira. Ele tinha uma distribuidora de valores - trabalhava no mercado financeiro. E a minha mãe é fonoaudióloga, também, hoje, não exerce mais a profissão. Estão os dois aposentados. Cuidam dos netos, na verdade.
P/1 – Fernando, eu queria que você falasse um pouquinho do bairro, da rua que você morava na sua infância.
R – Eu nasci em Santa Teresa, no Rio de Janeiro, que é um bairro bem tradicional, bem carioca, onde o bondinho passa - é o único lugar que tem bonde nos trilhos. Eu nasci e me criei lá até casar, quando eu tinha 23 anos. Era um bairro muito gostoso. Quer dizer, a proximidade da rua era muito grande. E é um bairro de classe média do Rio de Janeiro, mas onde a proximidade da pobreza era muito grande. Então você tinha um contato muito próximo com pessoas de várias classes sociais. Hoje em dia, ele tornou-se bastante perigoso por causa disso. Então, um bairro formado por morros. Ele é um morro e é formado por morros. E como tem morro, tem muita...
Continuar leituraP/1 - Márcia Ruiz
P/2 - Sueli Andrade
R - Fernando Telles
P/1 – Boa tarde, Fernando. Eu queria que você me dissesse o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Fernando José Costa Telles. Eu nasci no Rio de Janeiro, no dia 7 de março de 1967.
P/1 – E o nome dos seus pais, Fernando?
R – Meu pai chama-se José Telles de Siqueira Souza e a minha mãe, Iedalva Costa Telles Souza.
P/1 – E você sabe a origem do nome da sua família?
R – É portuguesa, né? Uma família que veio de Portugal. Meu bisavô era português - do lado do meu pai. E a família da minha mãe também é de origem de Portugal. E é Costa. Quer dizer pessoa que parou na costa, não foi para a selva; então não virou Silva, né?
P/1 – (risos)
R – Então é o Costa e o Telles. Mas, tudo português.
P/1 – E qual é a atividade profissional dos seus pais?
R – Meu pai, hoje em dia, é aposentado. Foi empreendedor a vida inteira. Ele tinha uma distribuidora de valores - trabalhava no mercado financeiro. E a minha mãe é fonoaudióloga, também, hoje, não exerce mais a profissão. Estão os dois aposentados. Cuidam dos netos, na verdade.
P/1 – Fernando, eu queria que você falasse um pouquinho do bairro, da rua que você morava na sua infância.
R – Eu nasci em Santa Teresa, no Rio de Janeiro, que é um bairro bem tradicional, bem carioca, onde o bondinho passa - é o único lugar que tem bonde nos trilhos. Eu nasci e me criei lá até casar, quando eu tinha 23 anos. Era um bairro muito gostoso. Quer dizer, a proximidade da rua era muito grande. E é um bairro de classe média do Rio de Janeiro, mas onde a proximidade da pobreza era muito grande. Então você tinha um contato muito próximo com pessoas de várias classes sociais. Hoje em dia, ele tornou-se bastante perigoso por causa disso. Então, um bairro formado por morros. Ele é um morro e é formado por morros. E como tem morro, tem muita favela, mas na minha infância era fantástica.
P/1 – Conta para a gente um pouquinho como é que era o bairro. O que tinha próximo à sua casa, como é que era a sua casa?
R – A minha casa era um apartamento de dois quartos, né? Eu dormia junto com a minha irmã em um quarto, meu pai e a minha mãe no outro. Era um prédio pequeno, os apartamentos eram pequenos também. Perto de casa tinha um hotel, do lado. Tinha um conservatório do outro lado do prédio, um conservatório de música. Tinha judô, essas coisas todas. E aí, perto, tinha aquele comércio tradicional de bairro: um açougue, uma padaria, uma quitanda. E todo mundo se conhecia. A gente fazia as coisas todas a pé, quer dizer, as coisas [eram] muito próximas, ou andava de bonde, que era o negócio gostoso.
P/1 – E qual era a sua brincadeira preferida?
R – Eu jogava futebol, né? Como todo garoto eu jogava futebol. Sendo que jogar futebol em Santa Teresa era um grande desafio, porque é ladeira, né? O bairro era ladeira. Então metade do tempo tinha que mudar de lado, o time, para o outro time poder fazer gol. (risos) O time que estava jogando de baixo para cima dificilmente fazia gol.
P/1 – (risos) E você lembra dos amigos dessa época?
R – Lembro, lembro. Ainda tenho vários deles. Quer dizer, a gente, assim, até tem uma parte triste dessa história aí. Eu tenho vários amigos de infância, mas tinha uma turminha dos que eram os mais bobos, que eu entrava entre eles assim. Era mais bobo, porque a gente não tinha carro, não tinha moto, não tinha isso e tal, não sei que lá. Ia para as festas a pé. E tinha aqueles mais espertos. Depois, a gente veio a saber que os mais espertos, quer dizer, devido à facilidade de se envolver com drogas e tal - que já tinha naquela época. Na verdade, eles trabalhavam para os traficantes da época. E muitos dos meus amigos morreram antes de 20 anos. Eu digo que eram amigos porque eram colegas de infância, mas, que frequentavam a minha casa. Almoçavam na minha casa, eu almoçava na casa deles, tal. E aí tem o lado triste disso. Alguns viraram mendigo, outros viraram viciados, muitos morreram, e outros não. Outros seguiram uma carreira normal, uma vida normal, e me relaciono com esses outros até hoje. Gente que era do meu prédio, que cresceu junto.
P/1 – E, me diz uma coisa, desses seus amigos de época, quem foi que te marcou mais, Fernando?
R – Que me marcou mais? Eu tenho um amigo que é meu amigo até hoje, que é o, chama-se Giovanni, que é filho de italianos. Ele tem uns dois ou três anos a mais que eu. E a gente passou a adolescência toda juntos. Então a gente sempre se fala. Ele acabou de voltar da França, passou três anos morando e trabalhando lá. E é um que a gente tem sempre um relacionamento mais próximo. Os outros não, acabaram ficando mais distantes, o contato.
P/1 – E me fala uma coisa, Fernando, como é que era um pouco essa questão: eu queria que você falasse um pouco da sua escola. Qual foi a sua primeira escola? Como é que foi essa experiência da primeira escola?
R – Eu entrei, primeira escola foi o João e Maria. Era uma escola pequenininha que tinha em Santa Teresa. Eu entrei com três anos lá. Então, na época, era maternal, jardim e alfabetização. Então eu entrei no João e Maria. Tenho amigos do João e Maria ainda, até hoje, que também são de Santa Teresa. As famílias de Santa Teresa acabam se conhecendo, era um bairro pequeno. Então era uma escolinha no João e Maria. Depois, estudei lá até a alfabetização, e lá só ia até a alfabetização. Que, na época, era pré-primário, né? Aí, depois, eu fui para uma outra escola chamada Brentano, que era Padre Leopoldo Brentano, também do lado da minha casa. Todas essas escolas, a gente ia a pé. Era tudo muito pertinho de casa. Essa passou muito pouquinho tempo. Me lembro que teve uma briga lá dos alunos, aí fomos para uma outra escola que chamava-se Menino Jesus. Eu já estava no primeiro ano. Eu fui fazendo o primeiro ano. Metade eu fiz no Brentano e outra metade no Menino Jesus. E quando chegou no final do ano, e aí meu pai e a minha mãe resolveram que a gente tinha que estudar em uma escola melhor. E aí a gente foi estudar no Colégio Zacarias. Então, colégio de padres, tradicional do Rio de Janeiro, e a gente foi estudar nesse colégio. Eu fiquei lá da segunda até a oitava série. Quer dizer, era uma coisa que meu pai, na época, não podia pagar, mas aí fazia um esforço para poder pagar aquela escola para a gente. Quer dizer, esse foi um negócio que foi muito legal. Meu pai sempre fez um esforço para pagar a educação da gente.
P/1 – E, me diz uma coisa, Fernando, nessa escola, como é que ela era? Essa escola que você colocou para a gente aí que, essa dos padres, uma escola meio tradicional. Como é que ela era? E eu queria que você descrevesse um pouquinho essa escola para a gente.
R – Olha, era uma escola grande, né, para os meus padrões de criança na época. Ela era uma escola grande, tinha o que a gente chamava do prédio antigo e o prédio novo. Então ela tinha o prédio antigo que era um casarão enorme, onde a gente tinha algumas salas de aula. E tinha o prédio novo, onde eram as salas de aula do ginásio, que era o seu objetivo aspiracional, né? Estudar lá. Tinham três pátios e quadras de futebol, para você trabalhar no recreio. Tinham laboratórios, tinha tudo. Tinha laboratório, que, na época, a gente não chamava de Física, mas era da aula de Ciências. Tinha uma parte vivencial muito grande. E era um negócio muito interessante, porque tinham muitas turmas. Então ela ia do maternal até o terceiro ano colegial. E estudava todo mundo junto ali. Quer dizer, o, da sétima série em diante era de manhã e o resto era a turma da tarde. Então você ia crescendo conhecendo todas aquelas pessoas. Elas moravam muito próximas da escola. Uma escola que era no Catete, que era próxima a Santa Teresa também. E foi um período muito bom. Quer dizer, uma convivência muito saudável. Até hoje a gente tem um grupo que se encontra, dessa escola. Quer dizer, eu saí de lá em 1980. Saí em 80 e até hoje a gente se relaciona com as pessoas de lá, se fala. E hoje já é um bando de quarentão, né? Que tem os filhos e tal. É um negócio, mas é divertido. Também é uma coisa...
P/1 – E me diz uma coisa, Fernando, nessa escola, você teve algum professor que você gostava mais, que te marcou? E por quê?
R – Ah, tive. Tinha um professor de História lá, chamava-se João Pompilho da Hora. João Pompilho da Hora era um baiano, era um senhor baiano. Quando ele dava aula para mim - quando você é criança, não tem muita noção de idade, né? Mas eu acredito que ele já devia ter próximo dos seus 60 anos. Ele já faleceu agora. E era divertidíssimo. Então eu estudei História com ele quatro anos do ginásio. E ele dava aula de uma maneira super divertida. Você participava da aula. Ele dava sempre exemplos. Tinha umas histórias fantásticas que ele inventava, que ele morava em um dodecaplex e tinha um submarino, não sei o quê, e tal. E era um, era quase folclórico ele. E todo mundo gostava muito dele. E tinha, eu sempre gostei muito de Matemática. Então todos os professores de Matemática acabaram ficando muito próximos de mim. Eu tinha uma facilidade de fazer conta, fazia conta muito rápido e tal. Então eles, os professores, gostavam de mim. Eu me lembro sempre dos meus professores de Matemática, também.
P/1 – E como é, você estudou nessa escola até a oitava série, aí o colegial você foi fazer em que escola?
R – Aí o colegial eu fiz uma prova para a escola técnica do Rio de Janeiro, que é o Cefet. Então eu fiz um concurso para estudar Eletrônica na escola técnica. Aí passei, e fui estudar lá. E aí foi uma mudança, assim, completamente radical na minha vida. Eu estudava em uma escola de padre, onde até a oitava série você tinha que estar na aula, você tinha presença, você tinha uniforme, tinha isso tudo. Aí mudei para uma escola onde você não tinha uniforme, ninguém controlava o seu horário, não era obrigado a assistir às aulas. Você tinha uma presença mínima. Você podia ter 25% de faltas. Isso para mim era uma liberdade fantástica. Eu aprendi a jogar totó, meu futebol melhorou. É a época que você começa a paquerar, aquelas coisas. Então era um negócio, assim, completamente diferente. Era uma liberdade nunca experimentada. E aí fora que, você, nessa época, vai para a escola sozinho, anda em um ônibus sozinho. Eu tinha aula sábado, então sábado eu ia de bicicleta. Que era uma grande besteira. Eu morava em Santa Teresa, então para descer para escola era ótimo. (risos) Para voltar... Mas era uma liberdade tamanha. “Eu vou para a escola, eu vou de bicicleta.” E era na Tijuca, no Maracanã, a escola. Não era perto da minha casa. Então era, mas tudo era uma experiência, né? Era tudo um negócio muito interessante. E você, assim, a convivência na escola, na escola técnica, era diferente. Porque era um curso profissionalizante, né, então tinham várias turmas de várias especialidades. Então tinha Eletrônica, Construção Civil, Mecânica, Meteorologia. Então você convivia com gente muito diferente, com ambições muito diferentes, com objetivos de vida muito diferentes. Isso era muito legal. E aí também era uma coisa diferente, para mim, porque essa escola, ela misturava gente do Rio de Janeiro inteiro. Eu que era um menino de centro de cidade, mais próximo da Zona Sul, de repente encontro gente lá que ia para a escola de trem. Então não ia à praia porque a praia era extremamente longe da casa. Eu me vejo andando de trem para visitar amigos, então eu conheci o subúrbio do Rio de Janeiro. Outra realidade, gente que tinha ainda menos condições do que eu. E era, esse negócio é um aprendizado muito grande. Você aprende muito com gente, né? Você aprende muito com as pessoas e tal. Isso foi um negócio também muito interessante. E eu, ao longo da vida, fui construindo alguns amigos de escola assim. Então, tem uns dois meses, um amigo meu que mora nos Estados Unidos agora, e fez escola técnica comigo, veio me visitar. Com a mulher, os dois filhos e tal. E um outro, que fez o Zacarias comigo - esse é uma história super bacana: o pai dele era porteiro e pagava o Zacarias para ele lá, conseguiu uma bolsa depois, e tal. Aí eu achei ele pelo Orkut, né? O Orkut, aliás, é fantástico para você achar amigos perdidos. Aí eu achei ele no Orkut e tal, ele é cardiologista. Morava na Alemanha, voltou, é o diretor do Hospital da Posse, de Nova Iguaçu. Eu mandei um Orkut para ele. Eu falei: “Pô, eu não sei se você vai lembrar de mim, eu sou o Fernando e tal”. Ele mandou respondendo assim: “Pô, lembrar de você? Você era o meu melhor amigo da escola”. E ele foi lá na minha casa; eu, conversando, apresentei para a minha esposa, ele falou: “Olha, o Fernando para mim representava uma inclusão social em um mundo que eu não tinha acesso”. E ele não era diferente das outras pessoas. Porque o Zacarias era uma escola de classe média, e ele era pobre. Mas sempre ia na minha casa, a gente sempre chamava ele para ir ao clube. Ele participava da vida da gente. Ele falou assim: “Eu via no Fernando uma família estruturada, o pai e a mãe, e aquele negócio, que era um negócio meio distante da minha realidade. Então foi muito importante no meu desenvolvimento”. Você ouvir isso é um negócio bacana, né? E conseguir conquistar essas amizades e continuar usufruindo delas é muito bom.
P/1 – E, Fernando, me diz uma coisa, você falou um pouco dessas amizades, de como é que era essa coisa da escola, o colégio técnico? Eu tenho duas perguntas para te fazer em relação a isso: o que é que esse grupo de amigos faziam fora a escola? Quais eram as atividades, o local que vocês frequentavam?
R – Quando era no Zacarias, a gente jogava botão. Então, uma das coisas prediletas era jogar botão. Que é o futebol de mesa, né? Então a gente sempre organizava campeonatos, jogava botão, ia para a casa um do outro. Porque era todo mundo pequeno ainda, 10, 11, 12 anos. Quando foi o grupo da escola técnica, era o futebol. E, assim, aí como era um negócio já mais adolescente, a gente ia jogar futebol sozinho na Quinta da Boa Vista, por exemplo. Então saía todo mundo para jogar futebol na Boa Vista. Ou alugava uma quadra para jogar futebol em algum lugar. Depois começa a fase do cinema [e] depois, começou a fase das boates. Então a gente sempre procurava fazer as coisas juntos. Não tinha violência. Então, por exemplo, para você ter uma ideia, para eu sair [e] ir em uma boate: eu saía de casa, descia a pé de Santa Teresa até o Flamengo, pegava um ônibus e ia para a boate. Aí quando voltava da boate pegava um ônibus. E aí, obviamente, não tinha nenhuma condução para Santa Teresa, subia a pé. Só que aí meus amigos queriam dormir na minha casa, porque um morava na Vila da Penha, o outro morava em Olaria. Então, a minha casa era muito mais perto, apesar de ter que subir a pé. A gente fazia muito isso. Começava a sair. Ia muito à praia. Muito, muito, muito à praia. A praia era o programa obrigatório. Porque até saía de casa de sunga, sem camisa, sem chinelo, e dinheiro enfiado dentro da sunga. Suficiente para comprar um Biscoito Globo, tomar um mate, e dar um calote no ônibus na volta. Que era descer, sem pagar, pela porta de trás. Então era essa a realidade de adolescente ali. No meu período de adolescência, também, inaugurou uma coisa fantástica no Rio de Janeiro, que não tinha: era o shopping. Então inaugurou o Rio Sul. Eu me lembro, fui na inauguração do Rio Sul. Eu tinha 13 anos. Então eu fui na inauguração do Rio Sul. E a gente ia toda tarde no Rio Sul. Toda tarde, ia lá e ficava paquerando as vendedoras, enchendo o saco, sem dinheiro nenhum. Ninguém tinha dinheiro e ficava andando lá, andando. Conhecia as vendedoras, conhecia todo mundo. Conhecia os seguranças. E esse era o passeio. Ia para a praia, voltava para casa, almoçava, tomava banho, ia para o shopping ficar enchendo o saco de quem estava trabalhando.
P/1 – (risos) Fernando, e por que a escolha de se fazer o colégio técnico no colegial?
R – Na verdade, é o seguinte: quando eu tinha sete anos, eu resolvi que eu queria ser engenheiro eletrônico [e] queria fazer uma guitarra elétrica. Eu não sei tocar nada, eu não toco, mas eu falei, achei fantástico aquele negócio de um cara que tinha feito uma guitarra elétrica e tal. Então eu resolvi que queria ser engenheiro eletrônico; e aí fui alimentando esse sonho, entrei para fazer uma escola técnica de Eletrônica. Eu falei: “Não, eu achei legal isso aí”, e fui. Carreguei esse sonho e fui fazer escola técnica. Me formei em técnico em Eletrônica. Por isso que eu fui estudar lá. E aí trabalhei como técnico em Eletrônica também. Trabalhei três anos como técnico eletrônico consertando computador. Quer dizer, esse era o objetivo. Depois é que desvirtuou da Engenharia e... (risos) Tanto que eu entrei na faculdade para fazer Engenharia Eletrônica. E aí, depois é que eu descobri que não era nada daquilo que eu queria. Não era Engenharia Eletrônica, não era muito o que eu quero, o que eu estou querendo fazer. Tanto que os meus amigos que fizeram escola técnica comigo e entraram, se formaram em Engenharia Eletrônica. Esse que eu citei que mora nos Estados Unidos, é engenheiro que projeta umas antenas de satélite. Ele até me explicou direito. Eu falei para ele: “André, estou tão longe desse mundo. Então eu não entendo mais nem o que é que você faz, está vendo?”. (risos)
P/1 – (risos) Agora, Fernando, conta um pouquinho para a gente como é que foi essa sua fase de faculdade? Você...
R – Olha...
P/1 – ...escolheu Engenharia...
R – É, a faculdade é um período grande da minha vida. Na verdade, eu [não] escolhi Engenharia Eletrônica, escolhi Engenharia. Então, você entrava e fazia um curso básico. Eu entrei na faculdade com 16 anos. E a faculdade é outra mudança. Porque, se na escola técnica eu tinha alguma liberdade, que tinha que ter 25%, podia ter 25% de falta; na faculdade, não tinha presença. Você não era obrigado a assistir aula, aparecia no dia para fazer a prova. Então eu fiz, entrei na faculdade, três meses, [e] a faculdade entrou em greve. A faculdade passou 120 dias em greve. Durante 120 dias eu viajava para búzios para mergulhar, pegar coral, tal. Tinha 16 anos. Fazia esse negócio todo, aí voltei para a faculdade. E estudei ali até o Carnaval, até a sexta-feira de Carnaval a gente estava estudando. Eu entrei no terceiro período da faculdade, foi o primeiro ano, e aí tirava notas baixíssimas na faculdade. Que era um negócio completamente, eu sempre fui, assim, o melhor aluno da sala. Tirava notas altíssimas. Quando eu entrei na faculdade, só dessa liberdade toda, esse monte de coisas que eu nunca tinha visto... O primeiro semestre eu fui bem. No segundo semestre, nas primeiras provas, eu tirei: zero em Álgebra Linear; 0,2 em Cálculo e 0,8 em Física. Foi um negócio assim, fui o ano inteiro, que é que é isso? (risos) E aí consegui passar nas matérias, estudei e tudo, tal. Mas era um negócio, eu falei: “Nossa, mas que coisa é essa?”. Então, no terceiro período, eu tranquei a faculdade. Falei: “Não, não é isso que eu quero fazer”. Tranquei a faculdade e fui trabalhar. Aí fui trabalhar como Técnico em Eletrônica. Trabalhei três anos como técnico. Mas, trabalhei um ano e resolvi fazer um outro vestibular, fiz para Administração. Entrei em Administração de Empresas em outra faculdade. Fiz seis meses, achei muito fácil. Fiz outro vestibular, entrei em Engenharia em outra faculdade. Que eu achava que a faculdade que eu estudava era muito longe, que era o Fundão. “Ah, é muito longe, é por isso e tal.” Eu entrei em outra faculdade de Engenharia, na Uerj, que era uma estadual, e fiz, ainda fiz um período e já com ênfase em Engenharia Eletrônica. Só que era assim, eu também não ia à aula. Eu trabalhava o dia inteiro e a faculdade era de dia, então não ia à aula. Eu só ia fazer as provas. Só que enquanto no Fundão, quando eu não ia à aula, eu chegava e tirava dois na prova; na Uerj, eu tirava nove. Eu falei: “Não, tem alguma coisa errada aqui”. E aí eu resolvi fazer o seguinte: “Não, eu vou voltar para o Fundão. E aí eu vou voltar”. Aí eu fiz alguns movimentos. Eu trabalhava e meu pai tinha o negócio dele, né? Eu fiz uma proposta para o meu pai. Eu falei assim: “Olha, eu quero voltar para a faculdade, quero estudar no Fundão. Só que o Fundão, o estudo é de dia. Então eu queria fazer o seguinte, pedir demissão do emprego que eu estou, queria vir trabalhar com você, no horário que não é o da faculdade. Então eu venho trabalhar com você, mas vou voltar para a faculdade para acabar esta faculdade”. E aí voltei. Então isso foi na metade de 88. Na metade de 88 eu voltei para o Fundão. Me inscrevi em uma matéria, que era o que estava fazendo pela quarta vez, que era Cálculo Três. Me inscrevi só em Cálculo Três. Consegui passar em Cálculo Três. Depois eu fui e entrei no curso profissional. Quando foi a escolha do curso profissional, eu falei assim: “Eu não vou fazer Engenharia Eletrônica”. Que aí eu procurei o que é que era menos parecido com Engenharia. E, na época, era Engenharia de Produção. Porque tinha Sociologia, tinha Psicologia Industrial, tinha Higiene, tinha Administração, Economia. E tinha algumas coisas de Mecânica, Resistência dos Materiais, Termodinâmica, tal. Mas era muito menor do que os outros cursos todos. E eu não sei desenhar também, então mesmo que eu quisesse fazer uma coisa mais sofisticada de Engenharia, também não ia conseguir. Eu entrei em Engenharia de produção. E aí foi legal, porque eu entrei em uma turma que era do meio do ano e eram os desgarrados da faculdade. Porque as turmas eram assim, começava todo período inicial de ano, então era todo mundo que vinha naquela linha. Vinha passando e tal. Essa turma, só tinha desgarrado da faculdade. Então era gente que, pô, estava na faculdade há não sei quantos anos, tinha repetido não sei quantas vezes. E eu reencontrei nessa turma o Fernando Pantaleão, que entrou na faculdade junto comigo e, lá, em 84, passamos no mesmo vestibular. E a gente veio se encontrar nesta turma aqui. Desta turma, eu tenho vários amigos. Que aí a gente teve que se unir ali. Foi um negócio assim: “Meu Deus, e agora? Como é que a gente vai fazer? Como é que essa turma de perdidos aqui...”. Para você ter uma ideia, na formatura, a gente pensou em tocar Missão Impossível, né? (risos)
P/1 – (risos)
R – Porque era um negócio assim, completamente impensável. Eu voltei, aí comecei a trabalhar e a ganhar dinheiro, tal. Antes de me formar, eu casei. Quando eu me formei, a minha filha foi na minha formatura. A minha filha tinha um mês. Então é uma passagem, assim, muito interessante. A faculdade foi um período longo: eu entrei em 84 [e] saí em 91 da faculdade. Mas um período de muito aprendizado para mim. Quer dizer, esse período foi de muito aprendizado, consegui construir muita coisa ali. Ver o que é que você quer, o que você não quer. No meio da faculdade também. E aí, praticamente, perto do fim, eu casei. E a gente faliu. Quer dizer, eu e meu pai quebramos. O negócio quebrou na época do Plano Collor. Eu tive que entrar para ser estagiário da Andersen. Quer dizer, é uma coisa completamente diferente, eu era casado, né? Eu era casado e tal, não sei que lá. E fui ser estagiário da Andersen [Arthur Andersen LLP], ganhava super mal. Não tinha dinheiro, o meu pai tinha falido. Então foi uma época de muitos sofrimentos para mim assim. E, ao mesmo tempo, tinha que acabar a faculdade, então não podia mais uma vez desistir da faculdade. Eu tinha que acabar. E aí consegui acabar a faculdade e tal. Consegui superar isso tudo aí.
P/1 – Fernando, você falou um pouquinho dessa fase de aprendizado. Quais foram os grandes aprendizados que você teve nessa época?
R – Olha, eu primeiro aprendi que você não pode querer tudo. Quer dizer, olha, eu queria tudo. Eu queria poder me divertir, que a faculdade fosse perto da minha casa, também trabalhar [ao mesmo tempo] e ganhar dinheiro. Eu queria tirar as notas boas, mas sem estudar. Quer dizer, na verdade, aquela época que você é adolescente, acha que pode tudo, né? “Eu vou fazer tudo, tudo eu vou conseguir, tal e tudo.” Depois de um tempo, eu falei assim: “Não, eu vou ter que focar em alguma coisa. Então vou ter que abrir mão desse emprego aqui que eu ganho um dinheiro”. Que para mim que tinha 20, 21 anos, era um dinheiro fantástico. Eu falei: “Não, eu vou ter que abrir mão desse dinheiro aqui, dar um passo atrás no que é a vida profissional e voltar para a faculdade”. Então você começa a aprender que tem que fazer escolhas. Você tem que fazer escolhas na vida, não consegue ter tudo ao mesmo tempo. Então eu fui aprendendo a fazer as escolhas certas. Mesmo quando eu decidi casar... Quando eu decidi casar, falei assim: “Não, eu vou casar”, sabendo que ia ter uma vida difícil, mas que era uma escolha que eu, naquela época, achava que era acertado. Eu falei: “Não, eu vou fazer isso. Quero casar. Acho que é o meu objetivo de vida agora. Então eu vou casar, vou mudar a minha característica [e] o meu padrão de vida. Eu vou sair da casa do meu pai, deixar de ter esse tipo de conforto, e vou ter um outro padrão”. Então você aprende muito isso, amadurece muito. E eu também aprendi muito no sofrimento. Quer dizer que, depois que o meu pai faliu, o ano de 1990 foi um ano extremamente complicado para a gente. Quer dizer, na verdade, no final de 90 e 91. Então, no final de 1990, o meu pai teve um infarto; minha mãe teve câncer, né? A minha mulher estava grávida. E aí eu tinha que fazer mais uma vez uma escolha, porque eu ganhava muito mal e precisava do dinheiro, então tive que fazer uma escolha de trabalhar fora da cidade para poder ganhar mais dinheiro. Mas deixar esse lado da família aqui todo, quer dizer, meu pai infartado, a minha mãe com câncer e a minha mulher grávida, que trabalhava, tudo. Eu falei assim: “Olha, eu vou ter que fazer essa escolha aqui”. Então fiz uma escolha de trabalhar fora da cidade para poder ganhar mais, entendeu? E passar por aquela fase. Então é uma, é um momento assim, quando você sofre, acaba amadurecendo muito mais. Você começa a perceber o que é que tem valor, o que é que não tem valor. O que é que é contratempo, o que é que é revés. Aí você fala assim: “Olha, tem um monte de coisa que você se preocupava, te aborrecia, tal, nada disso é tão importante assim. Tem outras coisas que você tem que saber priorizar, porque o resto é, vai passar. Esse negócio vai passar”. E no final acaba, tudo vai passando. Umas coisas te deixam mais marca outras deixam menos, né?
P/1 – Fernando, você falou que decidiu casar nessa época. E como é que foi, como é que você conheceu sua esposa? E por que essa decisão de casar tão novo?
R – É, na verdade, assim, eu conheci a minha esposa em 1983. Ela estudava com a minha irmã. A gente começou a namorar em 85. E quando, em 1987, em 87, 86, finalzinho de 86, 87, foi diagnosticado nela uma doença. Ela tinha um problema no ovário. Ela tinha um problema no ovário e tal. E aí o médico me chamou lá e falou assim: “Olha, ela tem um problema no ovário. Pode ser um câncer, então a gente vai fazer uma cirurgia, vamos ver o que é. E, de qualquer forma, ela vai tirar 3/4 de um ovário e vai tirar 1/4 do outro”. Aí ele me chamou e falou assim: “Olha, ela provavelmente não vai poder ter filhos. A não ser que seja em um prazo muito curto”. Então isso era 86. Eu falei assim: “Bom, então vamos casar, né? - Eu falei. - Vamos casar para ter filhos”. E depois o meu pai foi sempre muito, ele sempre me deu muito suporte e tal, não sei que lá. Ele falou: “Não, você quer casar? Tudo bem”. Um dia ele sentou para falar comigo e falou: “Filho, se você não quiser casar, não precisa casar”. Eu falei: “Não, pai, mas eu quero casar.” Depois eu parei e pensei, sentei e conversei com ela. Falei assim: “Vem cá, eu tenho 19 anos. Se eu casar com você agora, eu provavelmente vou ter que parar de trabalhar, você também. Vai ser um negócio - eu falei assim -, que vida que a gente vai construir? Quer dizer, a gente vai casar para ter filho. É uma coisa diferente”. Eu falei assim, aí tomei uma decisão, ____ tomar uma decisão aos 19. Falei: “Não vamos casar agora, a gente casa depois. E se a gente não puder ter filho, a gente adota um filho”. Que assim, não sei, para homem, e para a mulher... Quer dizer, com 19 anos você tomar uma decisão que você não vai ter um filho que você pode ter, mas não vai ter - é um negócio complicado. E a gente foi, e aí continuou namorando. Quando chegou em 1990, a gente já namorava há cinco anos, [se] conhecia a sete, e a vida estava mais ou menos estabilizada. Ainda não tinha falido. Mais ou menos estabilizada, eu falei assim: “Não, pô, agora acho que dá para a gente casar. A gente vai ter uma vida conjunta...”. Quer dizer, mais sair da casa do pai, sair da casa da mãe, “...então vamos casar”. E a gente resolveu casar. Era novo, mas se conhecia há anos. Eu falei assim: “Não, vamos casar”. E aí resolvemos casar. E aí, (risos) aquele negócio: bom, a gente achava que ela não podia ter filho, né? Tal, tal. Muito bem, não vai poder ter filho. Dois meses depois que a gente casou, ela estava grávida. E aí eu não tinha condição de ter filho, porque isso não fazia parte dos planos. Então, quer dizer, quando eu fiz um ano de casamento, a minha filha nasceu. Minha filha nasceu; eu casei dia 7 e minha filha nasceu dia 12 do outro ano. E aí, totalmente sem estrutura. E no meio desse caminho, aconteceu esse negócio todo: a gente faliu, meu pai enfartou, quer dizer, foi um negócio... A época que a minha filha nasceu foi uma época super conturbada, né?
P/1 – E aí, Fernando, você falou que tomou uma decisão que também foi muito importante para você, que foi essa questão de você mudar, de sair da cidade para trabalhar [e] ganhar um pouco mais.
R – Isso.
P/1 – Conta um pouquinho dessa experiência: para onde você foi, que tipo de emprego era esse?
R – Na verdade, eu fui trabalhar em Belo Horizonte, né? Em uma, pela empresa de consultoria. Porque eu era estagiário da empresa e trabalhava meio período. E aí eu fiz a opção de trabalhar fora. Trabalhava em período integral, eles pagavam as minhas despesas. Então eu conseguia economizar um pouco do dinheiro da refeição. Ganhava um salário dobrado, porque trabalhava horas a mais. E conseguia contribuir com mais alguma coisa na minha casa. Só que era um negócio extremamente sofrido, né? Porque as coisas acontecendo, aquele negócio, a família toda precisando de uma ajuda, e hospital, aquele negócio todo, e eu fora. Quer dizer, e o trabalho de consultoria é um trabalho intenso. Não era que trabalhasse pouco. Não, trabalhava muito. E voltava para casa sexta-feira à noite e ia embora segunda-feira às seis horas da manhã. Então esse foi um período bastante complicado, mas era a única forma que tinha para fazer para que aquilo ali acontecesse. Que aí, assim, era uma situação realmente complicada. Quando minha filha nasceu, eu tive que vender o meu micro-ondas e a minha, e o meu freezer para pagar o parto dela. Para pagar um pedaço do parto. Peguei um pedaço de dinheiro emprestado e tal, para poder pagar. Não tinha dinheiro para absolutamente nada. Tem uma cena muito marcante assim... Quer dizer, nesse meio tempo, eu fazia alguns bicos também e tal. Então estava fazendo um projeto em Niterói. E aí, em Niterói, tinha um ônibus que eu pegava de volta, tinham dois ônibus de Niterói para o Rio. Um era o 999 e o outro era o 996. O 999 ia para um lado e o 996 ia para outro, passava perto da minha casa. E, naquela hora, lá, voltando de Niterói oito horas da noite, eu entrei no ônibus errado. Então quando ele desceu da ponte e tal, ele virou para o outro lado. Aí eu virei para o trocador, falei assim: “Ué, esse aqui não é o 996?”. Ele falou: “Não, esse aqui é o 999”. Eu falei: “Então não vai para lá?”. Ele falou: “Não vai”. Eu falei: “Pô, então eu preciso descer”. Aí eu desci. Quando eu desci, de terno, tudo, falei o seguinte: “Eu não tenho dinheiro para pegar outro ônibus. Se seu pegar outro ônibus, não tenho dinheiro para ir pegar o ônibus para ir trabalhar amanhã”. Então eu fui andando para casa. Era longe. Fui andando, de terno, carregando a minha pastinha. E aí você vai pensando, eu falei assim: “Pô, não é possível. Eu me achava inteligente, esse negócio todo. Eu estou aqui andando a pé, que eu não tenho dinheiro para ônibus”. Aí você começa a se questionar de um monte de coisa. Eu falei: “Mas será que é isso mesmo?”. Estudei e não sei o quê. E você fica naquele dilema. E aí é outra coisa que você tem que tomar uma decisão ali. Eu falei assim: “Não tem, o que é que eu vou fazer? Eu posso ou desistir de tudo, ou persistir”. E eu tomei uma decisão, quer dizer, praticamente ali, naquela caminhada, falei assim: “Eu vou persistir. Vou continuar na consultoria, aprender mais [e] ganhar dinheiro. E eu sei que essa situação um dia ela vai melhorar. Não vai ser agora, não vai ser hoje, não vai ser amanhã, mas um dia ela vai melhorar”. E quando eu cheguei na minha casa, minha mulher estava - não tinha celular, né? Ninguém tinha celular, eu também não tinha dinheiro para comprar a ficha do orelhão para avisar. Cheguei, ela estava super nervosa, eu expliquei. Ela: “Ah, coitado e tal”. Eu falei: “Não, mas, porque não tem problema”. Aí eu já estava com um ânimo muito melhor. (risos) Quer dizer, apesar de ter andado a pé, estava com um ânimo muito melhor, que eu falei assim: “Só quem pode mudar isso sou eu. Ninguém vai mudar, ninguém de fora vai mudar essa situação”. Então eu persisti naquilo ali. E aí, quer dizer, (risos) tem umas coisas super engraçadas. A minha filha nasceu de oito meses. E eu era estagiário da Andersen há quase um ano e meio lá, porque eu não era formado e não podia ser contratado. Então, uns dez dias antes da minha filha nascer, a Andersen tomou a decisão de cortar o plano de saúde dos estagiários. E cortou o plano de saúde de todo mundo. Só que o meu plano de saúde era o que ia pagar o parto da minha filha. E aí cortaram o plano de saúde. Eu falei: “Poxa, mas tem um ano e meio que eu trabalho aqui!”, “Ah, mas não sei o que, é multinacional, não sei o que lá”. E aí, mais uma vez, eu falei assim: “Eu vou embora, vou pedir demissão dessa empresa”. Eu falei: “Eu não vou pedir demissão. Agora que eu passei um ano e meio aqui, aprendendo, fazendo. Eu vou continuar”. Como eu ganhava muito pouco, a mudança era sempre para ganhar mais, e às vezes muito mais, proporcionalmente. Mas eu continuei. Eu falei: “Não, eu vou continuar. O que eu estou aprendendo aqui, não vou aprender em outro lugar. E no dia que eu sair daqui, vou levar esse conhecimento comigo”. Eu acho que a única coisa que ninguém tira de você é o conhecimento, né? E valeu a pena. Quer dizer, eu não me arrependo disso. Sofri, mas não me arrependo não.
P/1 – E me diz uma coisa, Fernando, como é que foi essa ida para Belo Horizonte? Eu queria que você falasse um pouquinho dessa sua carreira profissional, aí da...
R – Olha, sim, depois que eu fui para Belo Horizonte, aí eu voltei para o Rio, a minha filha nasceu e eu comecei a viajar muito. Então o meu período na consultoria era um período de constante viagem. Então eu morei dois anos em Belo Horizonte, morei dois anos em Salvador. O resto do tempo eu passei praticamente em São Paulo. E ficava muito pouco tempo em casa, era praticamente [só] nos fins de semana. Porque viajava de segunda a sexta, trabalhando. Então era uma vida muito sofrida. Agora, aprendia barbaridades. Porque eu era consultor, entrava nos projetos. Eu estudava muito. E aí tem o lado bom de você também estar fora de casa, né? Quer dizer, eu estudava à noite, no hotel. Eu estudava, estudava, comprava livro, estudava. Estudava os cursos da empresa, todo esse negócio. Então eu fui me especializando em serviços financeiros. Fui aprendendo, fazendo curso. Tinham aqueles cursos elegíveis que você fazia, pegava na biblioteca e fazia o curso. Eu fazia aquilo tudo. Então eu fui crescendo profissionalmente muito, aprendendo muito. Fui me tornando um profissional com um vasto conhecimento, mas a vida pessoal sacrificada. A vida pessoal sacrificada. Em 1994, é, 94, eu sempre ganhei mal. Na consultoria, você sempre ganha mal. Sempre ganhando mal. Recebi uma proposta para ser “controller” [gerente de controladoria] de um banco lá na Bahia. E aí voltei para a Andersen, falei: “Recebi essa proposta, tal”. Eles fizeram uma contraproposta: “Não, vamos fazer o seguinte: a gente sabe que você ganha mal, mas a gente transfere você para São Paulo. Você vem para São Paulo que a gente consegue te dar um auxílio transferência”, porque as políticas da empresa eram super rígidas. A empresa era americana, tal, então não podia ter isso. “Te dá um auxílio transferência.” Eu falei assim: “Ah, então eu quero que vocês paguem o meu MBA”, porque minha preocupação sempre foi essa, sempre foi aprender. Sempre quis aprender [e] aprender. Então fiz curso de estratégia. Fiz oito cursos nos Estados Unidos de estratégia. Tudo pago pela empresa. “Então vocês pagam o meu MBA.” E eu vim para São Paulo. Aí me mudei com a família. Meu filho tinha - na verdade, eu vim antes - dois meses nessa época. Eu vim quando ele fez seis meses, aí eu trouxe a família para cá. E quando eu cheguei em São Paulo, eu vi outra realidade, que era uma cidade muito mais cara do que o Rio de Janeiro. Eu não tinha carro, morava em uma casa que era embaixo de outra. Era uma garagem que foi adaptada para uma casa, então ela não tinha janela. E era um negócio assim, desesperador. Tinha dois filhos pequenos. E ia para o trabalho, saía de casa, subia uma ladeira, pegava um ônibus, ia até a Avenida Paulista, descia uma ladeira, ia para a Nove de Julho, pegava outro ônibus para ir para o trabalho. Isso todo dia. (risos) E era um negócio, eu falei assim: “Deus do céu, que coisa horrível”. E fazia o meu MBA duas vezes por semana à noite. De sete às dez da noite. E aí voltava para casa. Encontrei um amigo meu de MBA. Também amigo de infância. Estava fazendo o mesmo MBA, uma vez ele falou assim para mim: “Cara, você é um dos caras mais inteligentes que eu conheço, como é que pode isso? Como é que você pode ganhar o que você ganha?”. Ele me dava carona para casa porque ficava com pena de mim. “Não é isso.” Eu falei assim: “Cara, eu sei, mas eu estou batalhando aqui, aprendendo [e] vendo o que é que é, tal”. Em 1996, e aí eu já estava a sete anos na consultoria, tomei a decisão de sair de lá. Que eu falei assim: “Não, chega, não dá mais. Não dá mais para eu ficar aqui”. Porque eu tinha uma vida incompatível com a posição que eu tinha. Assim, as pessoas que tinham entrado na Andersen junto comigo, eu tinha sido promovido antes delas, esse negócio todo. Só que todo mundo tinha entrado recém-formado, saído da faculdade, com 20 anos. Eu entrei, tinha 23, e a minha vida [tinha] uma velocidade muito maior do que a deles. Quer dizer, quando chegou nessa fase aqui eu tinha dois filhos, mas ganhava a mesma coisa que os outros que moravam em casa, com o pai, com a mãe, e tal. E eu falei: “Olha, isso aqui é incompatível com a minha vida”. E aí eu fui, nessa época, conversar com o presidente da empresa. Eu falei: “Olha, eu preciso ter um aumento de 50% ao menos”. Ele falou: “Olha, eu não posso te dar 50% de aumento. Você faz parte de uma turma, vou desagradar um monte de gente”. E aí virou, falou assim [e] eu falei: “Cara, eu gasto mais do que ganho, todo mês. Isso vai chegar uma hora que vai explodir, não vai ter jeito. Não dá para eu ficar no cheque especial todo mês”. (risos) Aí ele falou uma coisa para mim, assim: “Não, mas onde os seus filhos estudam?”. Eu falei: “Ah...”, “Não, mas a escola onde seus filhos estudam é muito cara. Você não pode mudar eles de escola?”. Aí eu falei um negócio para ele, assim: “Olha, o único motivo de eu ser analista da empresa e estar aqui sentado conversando com o presidente da empresa, e você estar ouvindo o meu pleito, é porque eu estudei. Porque eu tive educação, o meu pai, mesmo sem poder pagar, a gente não tinha carro, não tinha televisão, mas ele pagava a escola para mim. Pagava curso de inglês, então por isso você está me recebendo aqui”. Ele falou assim: “Desculpa, você está certo. Nem considera isso que eu te falei”. Mas aí eu cheguei para ele e falei assim: “Olha, eu vou ter que arranjar uma solução para isso. Eu vou ter que sair daqui”. Ele falou: “Não, tal”. Eu falei assim: “Me muda de grupo, me bota no grupo de Estratégia”. Que eu era, tinha grupo de Processo, “Me bota no grupo de Estratégia”, “Não, mas o grupo de Estratégia é só nos Estados Unidos e tal, ainda não tem aqui”. Eu falei: “Pô, mas cria uma vaga aqui - eu falei - quero ficar aqui”. Mas acabamos não chegando em um acordo ali. E aí eu resolvi que eu ia pedir demissão. E, ao mesmo tempo, apareceu o projeto da Credicard. Credicard queria fazer uma avaliação de empresa, um negócio e tal. Aí eu montei a proposta; a gente veio, fez a proposta para a Credicard. E antes de acabar o projeto, eu pedi demissão da Andersen para ir para outra empresa. Eu ia para outra empresa. E aí acabei vindo para cá, para a Credicard, montar a empresa.
P/1 – Fernando, eu queria que você falasse um pouquinho desse projeto que foi desenvolvido na Andersen. Qual foi o objetivo da Credicard contratar a Andersen? O que é que ela queria com este projeto? Eu queria que você contasse um pouco esse projeto que você estruturou.
R – Tá bom. Era assim, na realidade, eu não estruturei, eu era só uma parte da equipe do projeto. (risos)
P/1 – Tá.
R – Tinha um diretor da Andersen, sócio da Andersen, de Nova Iorque, participando do projeto; que era um projeto estratégico. E o que é que era? A Credicard queria pegar uma divisão e transformar em uma empresa. Isso é uma, um “Spin-off”, que se chama. Então ela queria pegar essa divisão, transformar em uma empresa. E ela não sabia quanto valia isso. Então ela contratou um projeto que era para determinar o valor desta empresa aqui, depois de 10 anos de vida. Que era uma empresa que não existia, era uma unidade de negócio. Então a gente entrou, fez uma proposta, né? Quer dizer, a consultoria em si elaborou uma proposta, como é que é a metodologia de trabalho. Então o projeto era eu, que era analista; tinha um outro analista que era mais Junior do que eu; um diretor da empresa; um sócio da Andersen, de fora. E tinha um especialista em tributos e modelagens, que fazia parte do projeto. E o projeto era o quê? Era, primeiro, conhecer as pessoas que trabalhavam naquela divisão, entrevistar as pessoas. Saber como aquilo funcionava, e como aquilo seria estruturado em uma empresa. Quais eram as linhas de receita, as linhas de despesas, quantas pessoas tinham, qual era a atividade, como é que cobrava dos clientes, quantos clientes, como é que se relacionava. E estruturando isso, depois botar isso tudo em planilhas para chegar ao final, dizer assim: “Olha, essa empresa vai ganhar tanto de lucro por esse ano, tanto nesse, nesse [e] nesse”. Fazer uma projeção de 15 anos e dizer assim: “Olha, vale tanto”. Era esse o projeto. Só que no meio do projeto também surgiu a necessidade de fazer como seria a estrutura societária da empresa. Como é que essa empresa vai funcionar societariamente? Vão ser os mesmos sócios da Credicard? Na época, queria se atrair outros, outros participantes, outros sócios. A Mastercard deveria participar da empresa, também. Então se tornou um negócio um pouco mais abrangente. Que era esse projeto de desenhar o modelo de empresa e dizer o quanto que ela valia. Quais eram as linhas de receita, de despesa. Quantas pessoas deveriam ter. Como é que ia funcionar. Então era um negócio bastante interessante. E eu aprendi muito, né? Aliás, a característica do consultor é você entrar em um negócio e aprender muito rápido sobre aquilo ali. Então eu entrevistava as pessoas e aprendia muito rápido ali. Aprendia, fui aprendendo aquilo muito rápido. Já tinha essa característica de aprender rápido. Quer dizer, a consultoria te ensina isso, a aprender, né? De aprender muito rápido. E o projeto era de dois meses. Era um projeto super rápido. Final de dois meses, você apresentava o resultado [e] dizia assim: “Olha, esse aqui é o resultado da empresa”. E depois você tentava vender um outro projeto de implantar aquela empresa. Então, consultoria é isso: faz um projeto e tenta vender o próximo, né?
P/1 – Uhum.
R – Então era esse o foco. Era um projeto pequeno, de dois meses só.
P/1 – E o que é que aconteceu? Vocês desenvolveram o projeto, apresentaram para a Credicard, e aí?
R – É, na verdade, foi o seguinte: a gente desenvolveu o projeto, né? E aí, como eu te falei, antes do final do projeto, pedi demissão da empresa. Eu falei assim: “Vou acabar o projeto, mas eu vou embora, vou pedir demissão”. E aí ficou aquele negócio: “Não, não pede. Vamos ver como é que faz”, e aí começamos a fazer apresentações para a Credicard. Tem uma coisa super engraçada, quer dizer, a primeira apresentação que eu fiz para o que eles chamavam de Police, na Credicard, tinha o presidente da Credicard, e os diretores, né, que eram vice-presidentes na época, e eu fui fazer a apresentação. Então tinha um diretor da Andersen e eu fazendo a apresentação. Aí eu botei o primeiro, a primeira transparência lá. Aí botei e comecei a falar. E aí o presidente da Credicard virou e falou assim: “Olha, ah, está tudo errado”. Eu sempre fui extremamente folgado, quer dizer, aí eu virei e falei assim: “Olha, para. Tudo errado não está. Pode ter alguma coisa errada, muita coisa errada, mas tudo errado não está. Você não viu nada, como é que você está dizendo que está tudo errado?”. E o meu chefe, que era o diretor, fazia assim: “Olha, meu Deus do céu!”
P/1 – (riso)
R – Eu falei assim: “Se você deixar eu passar para frente, pode ser que a gente chegue a alguma conclusão aqui, senão a gente para aqui agora”. Aí o cara olhou, falou assim: “Não, está bom. Então continua aí.” Aí deixou eu fazer a apresentação, foi argumentando. E aí ele foi vendo que eu entendia do negócio. Quer dizer, porque eu fui aprendendo. Porque você, para saber o valor de uma empresa, tem que formular uma série de hipóteses e premissas: “O que é que vai acontecer quando essa empresa se separar? Como é que vai acontecer? O que é que o mercado vai reagir? O que é que os clientes, como é que vai acontecer? Qual é o preço?”. Aí fui. Chegou no final, eu apresentei o valor da empresa. Eu falei: “Olha, a gente acha que o valor da empresa vai ser esse aqui”. O presidente virou e falou assim: “Olha, eu não sei como é que você fez não, mas eu fiz as contas aqui e é isso aí mesmo. Está dando isso aí”. Aí eu virei, mais uma vez, falei assim: “Olha, isso não é por acaso. Fico muito feliz que tenha batido aí com o seu número. Porque você deve ter muito mais experiência do que eu, deve conhecer muito mais o negócio que eu. Isso para mim é um reconhecimento de que o trabalho que a gente fez está excelente”. (risos)
P/1 – (risos)
R – Aí o diretor olhava assim, falou: “Meu Deus do céu, a gente vai ser mandado embora daqui”. (risos) Falou: “Não, está bom. Muito bem”. Aí eles queriam apresentar para a Mastercard o projeto, para a Mastercard se tornar acionista. E aí me convidaram para fazer a apresentação e eu vim. Comecei a fazer a apresentação para a Mastercard e tal: aí tinha o presidente da Mastercard da América Latina; o vice-presidente mundial da Mastercard de Nursings and Acquisitions, Fusões e Aquisições; o presidente da Mastercard do Brasil; um analista de investimento deles lá; o presidente da Credicard; e o meu chefe. Eu comecei a falar, falei assim: “Olha, se eu fosse o presidente da empresa, eu faria isso, isso [e] isso”. Aí o presidente da Credicard virou falou: “Olha, está vendo? O presidente da empresa falando, pô!”. Quando acabou aquela reunião, ele virou para o meu chefe e falou assim: “Olha, eu quero contratar o Fernando para trabalhar para mim.”, “Não, mas não pode”. Porque eu era funcionário da Andersen, tinha um acordo, tal. E o vice-presidente da Mastercard de Finanças me deu o cartão dele. Ele falou assim: “Liga para mim que eu quero falar com você”. Eu achei que ele queria alguma coisa do projeto. Aí liguei para ele, falou assim: “Eu quero que você venha trabalhar comigo em Nova Iorque, para a Mastercard”. Eu falei: “Olha, infelizmente eu não posso, tenho um compromisso aqui”, “Não, a proposta é séria”. E eu, pedindo demissão da Andersen, cheguei para o meu chefe e falei: “Olha, eu estou saindo, estou pedindo demissão. Vou trabalhar em uma outra consultoria”. Ele virou e falou assim: “Não, você vai me dar... Sua decisão está tomada?”. Eu falei: “Está tomada, não tem a menor chance de eu ficar”. Ele falou assim: “Então eu só preciso de um dia, para falar com você”. Ele foi no presidente da Credicard que tinha dito que queria me contratar e falou assim: “Olha, Fernando pediu demissão. Agora você pode contratar ele”. (risos) Aí o presidente da Credicard me chamou para saber se eu queria trabalhar na Credicard. Eu falei para ele: “Olha, infelizmente, eu não posso porque eu já assumi um compromisso com outra empresa de consultoria”. Aí me botaram junto com o diretor de RH, aquele negócio todo. E eu fui, fiquei fascinado pela ideia e acabei topando. E era assim, eles queriam que eu viesse para montar a empresa. Eu falei assim: “Tá bom. Mas o que é que eu vou ser?”, “Não, você vai ser o líder do projeto de condução da empresa”. Eu falei: “Ah, isso aí é trabalho de consultor”. Eu falei assim: “Você quer me contratar para fazer trabalho de consultor? Eu vou, estou saindo da Andersen, mas vou para outra consultoria. Me contrata na outra consultoria. Eu venho aqui vendo um projeto para você”, “Não, mas eu quero que você trabalhe aqui porque você entende dos números”. E aí foi aquele negócio e tal. Eu falei: “Tá bom, eu vou ser o que aqui?”, “Não, você vai ser o diretor de projetos”. Eu falei: “Não, não quero, isso é consultor”, “Não, então você vai ser o diretor financeiro”. Eu falei: “Não, não quero ser o diretor financeiro. Aqui a empresa é de executivos de linhas de venda, eu quero ser linha, quero trabalhar na área de Vendas, na área Comercial, área de Produtos.”, “Não, você não entende, tem que ser, você vai estruturar isso”. Bom, aí topei. (risos) Aí virei o diretor financeiro da empresa. Então, quer dizer, eu saí de analista da Andersen para ser diretor financeiro de uma empresa. Isso foi assim, a grande mudança da minha vida. Quer dizer, nunca fui nem gerente na Andersen. Eu saí de analista para ser diretor financeiro da Credicard. Quer dizer, que era um negócio assim totalmente impensado para mim. Nesse dia, você fala assim: “Pô, aquele negócio, aquilo valeu a pena”. Eu entrei na Credicard no dia do aniversário de dois anos do meu filho, então ficou marcado na minha vida. Eu falei assim: “Não, isso aqui é um marco realmente. Quer dizer, eu vou, agora eu estou mudando de vida. É uma outra coisa, é uma outra carreira”. E aí foi totalmente diferente do que eu imaginava. Quer dizer, até imaginava mudar para uma consultoria, virar gerente, ia ser gerente na outra consultoria. Esse negócio todo, e foi...
P/1 – Vamos voltar um pouquinho, Fernando?
R – Vamos.
P/1 – Você colocou alguns dados interessantes que eu queria saber um pouquinho mais. Quando você fala que fez a apresentação para o presidente da Credicard, você chegou em um valor da companhia, qual foi esse valor?
R – Era um bilhão de dólares. (risos)
P/1 – (risos) Você fez uma outra consideração: que esta, se você fosse o presidente você faria isso, isso [e] isso. Quais foram as considerações que você fez na época?
R – Na verdade, era assim, porque a empresa era formada por vários tipos de receita, então a gente estava mostrando para a Mastercard porque ela deveria trabalhar na empresa. E eles começaram a questionar o modelo de negócio da empresa, então eu explicava para eles, falando assim: “Olha, se eu fosse presidente, eu trabalhava assim: ó, nessa receita aqui eu faria isso, aumentaria esse preço. Essa forma, eu trabalhava assim. Entraria nesse segmento”. Que eram coisas específicas do negócio. Que eu não tinha nem a menor autorização para falar aquilo, mas estava ali para vender o modelo de negócio que eu tinha construído. E [o] porquê ele ia dar aquele valor. Porque eu acreditava que ela valia um bilhão de dólares. Então essa era a pergunta dele: “Mas por quê? E por que é que a estrutura é assim? Por que fazer isso? Por que se beneficiar dessa maneira? E o aluguel das máquinas?”. Então eu argumentava como se eu fosse um executivo da empresa dizendo como é que a empresa seguiria ao longo do tempo, né?
P/1 – Aí você me diz o seguinte: que você vai para a Credicard, assume a direção, o cargo, ser diretor de Finanças dentro da Credicard...
R – Na verdade, na Credicard, eu era um diretor de Novos Negócios em Finanças. E o meu papel era montar a Redecard.
P/1 – E como foi montar a, eu queria que você falasse um pouco de como você estruturou na Redecard.
R – Na verdade, assim, o projeto de formação da Redecard é um projeto que a Credicard inteira participava. Eu era uma espécie de coordenador do projeto. Não tinha nem tanto conhecimento assim para tocar o projeto, mas aí tinha todas as áreas de Finanças, Contabilidade, Jurídico, as áreas de Negócio envolvidas, o RH, e eu ia trabalhando com essas diversas frentes para a gente chegar no dia 31 de outubro e ter uma empresa montada. Então, uma empresa com nome, com conta, com clientes, com estrutura, com plano contábil. Que aí eu vinha aprender o que é que era. “Qual o plano contábil da empresa? Como é que vai funcionar isso? Os sistemas, como é que vai separar?” Então, na verdade, era uma coordenação de vários projetos, várias equipes. E eu, na verdade, não tinha funcionário, era só eu. Depois tive um funcionário, que era quem fazia todas as modelagens para mim. Foi o primeiro funcionário que eu tive, para coordenar essas equipes. E aí foi um período extremamente interessante, o seguinte: porque eu tomava muita decisão. Eu tinha recém entrado na empresa, né? E tinha que tomar as decisões. “Esse produto, vai ficar na Credicard ou vai para a Redecard? Isso aqui vai ser cobrado como? Como é que é a divisão de receita disso e daquilo?” Eu tomava uma série dessas decisões. Então apresentava para as pessoas e tal, mas chegava uma hora que alguém tinha que tomar uma decisão. Então eu montei, por exemplo, toda estrutura de liquidação financeira da Redecard com os bancos que emitiam Mastercard no Brasil, junto com a Mastercard. Outro dia eu estava vendo lá o pessoal mostrando, eu falei assim: “Olha aqui, aí tem uns papéis assinados por mim” - são documentos de acordo com o Banco do Brasil, como o Bradesco, da Mastercard e a Redecard. E eu assinando ali aquele negócio. Falei assim: “Meu Deus, mas eu não tinha nem essa, não era o diretor”. Quer dizer, eu virei de um dia para o outro. Então eu tomava muita decisão. Eu me lembro, o fato mais engraçado que eu me lembro [que] eu entrei em uma reunião, devia ter umas 20 pessoas na reunião e tinha uma pessoa na outra ponta da mesa, que eu não conseguia ver da ponta de cá. Começou uma discussão e o cara pegou o papel, falou assim: “Não, mas o Fernando Telles aprovou”. Ele falava isso para o outro que estava na frente dele. E eu estava lá na outra ponta da mesa. “O Fernando Telles aprovou.” E, de repente, a mesa abriu assim, falou: “Olha, então pergunta para ele”. Ele não me conhecia. Assim, ele nunca tinha me visto. Eu entrei na reunião, porque eu entrava, saía de uma reunião [e] entrava em outra. Entrava na reunião, ficava ali no cantinho, ouvia um pouco, falava e tal. Falou: “Bom, então pergunta para ele”. O cara olhou assim para mim, eu falei: “Você está certo. Eu falei isso mesmo, eu mandei um - na verdade, era citimail o nome na época, era um citimail - citimail dizendo que é isso mesmo, que a decisão está correta, tal. Vamos em frente”. E ele ficou me olhando assim. Na época, eu tinha 29 anos, uma cara de criança. E ele olhava assim para mim, quase como quem diz assim: (risos) “Mas é esse daí? É esse mesmo que está tomando as decisões e está falando aqui?”
P/1 – (risos)
R – As pessoas me chamavam de Diretor Garotinho. “É o Diretor Garotinho”, “Ó, o Diretor Garotinho está vindo aí”. Quer dizer, então era um negócio diferente para mim. E eu trabalhava muito. O chefe aqui que a gente teve, que veio depois para a Redecard - que foi o Livo - ele falou na época, assim: “Não, o Fernando, se você falar assim para ele: 'precisa morder parede', ele vai morder parede”. (risos) Não tinha esse negócio.
P/1 – E quais foram os principais desafios que a Redecard enfrentava, naquele momento, quando ela se estruturou?
R – Olha, a Redecard tinha um desafio grande que era o seguinte: como tudo era feito dentro da Credicard - todo relacionamento com os estabelecimentos era via Credicard - e você cobra uma taxa para o cartão de crédito ser aceito. Quando você separa duas empresas, essa aqui cobra uma taxa, mas um pedaço dessa taxa é desta empresa aqui, que não tem nada a ver com essa na composição do resultado. Então, muitas vezes, quando você cobrava uma taxa, cobrava uma taxa menor, mas porque aqui você tinha uma base de clientes de cartão de crédito que financiavam, pagavam anuidade. Então valia a pena. Então vou filiar um supermercado, vou cobrar pouquinho dele para aumentar a base de cartões, aumentar a aceitação. Mas eu não ganho dinheiro nesse relacionamento aqui, ganho nesse [outro] aqui. A hora que você separa, ficou um lado com um relacionamento que não ganha dinheiro e o outro que ganha dinheiro. Então esse era o maior desafio. Mostrar para a área Comercial quanto que se ganhava em cada transação. Então uma das primeiras coisas que eu fiz na Redecard foi estruturar um modelinho de simulação para a área Comercial, que mostrava o seguinte: “Olha, quando você cobra um preço de um estabelecimento, tanto ele vai para pagar o emissor - que é a Credicard e os outros bancos - tanto vai pagar a despesa, tanto é o custo da transação, tanto é isso”. Então a gente fez uma planilhinha que ele simulava, botava lá. E aí, no final, aparecia um sorrisinho, ou uma carinha assim, ou uma cara triste. Para dizer para ele: “Tá vendo, olha, com esta taxa você perde dinheiro”. Era a taxa, o prazo, como é que era. Se tinha antecipação, [se] não tinha antecipação. Então a gente começou a introduzir na força de vendas o conceito de margem de resultado. Porque, antigamente, só tinha, era uma divisão da empresa. Então só tinha receita. Uma outra coisa muito engraçada é que era o seguinte: era uma empresa, não era mais uma divisão. Então, muitas vezes, quando eu estava discutindo custos com as pessoas, o pessoal falava: “Você, não, mas isso aí é custo de operações”. Custo de operações era o seguinte: era uma coisa que não era alocada no centro de custo da área adquirente, era alocada no centro de custo de operações. Então aquela área não se preocupava com aquilo. Eu falava assim: “Gente, mas agora é uma empresa. A área Operações somos nós”. Então esse era o maior desafio no começo, quer dizer, criar esse modelo de rentabilidade. Esse trabalhar com a força de vendas para isso. E o outro grande desafio era o seguinte: como é que convive com a Credicard, mas tira de dentro; como é que tira de dentro a Credicard? Quer dizer, a Credicard tinha quatro milhões de clientes e a gente tinha 300 mil estabelecimentos. Então todo foco da Credicard era para esses quatro milhões de clientes. Desde a central de atendimento, sistemas, tudo. Então isso aqui sempre foi alguma coisa mais ao lado, mais marginal, e agora era o negócio principal desta empresa. Então como é que você mostra para esse teu prestador de serviço que isso aqui é o mais importante para você? Isso era o maior desafio que a gente tinha: como tirar isso de dentro da Credicard. Agora, você perguntou do projeto, quer dizer, o projeto foi extremamente enriquecedor para mim. Quer dizer, eu aprendi muito de Direito, com os advogados, discutindo contrato, formação, tributário. Aprendi muito de contabilidade, de finanças. De toda essa parte que você nunca quer aprender, né? Aí você entra em uma empresa formada, você não vai querer saber como é que é o plano contábil da empresa, como é que é o contrato que rege o relacionamento com os estabelecimentos. E eu aprendi isso tudo, porque tinha que fazer isso tudo de novo. Apesar de já existir tudo, tinha que fazer tudo de novo. E uma das coisas mais engraçadas que eu me lembro assim, a empresa não tinha nome. Não tinha nome, então tinha uma agência trabalhando. A agência trouxe um dia, nesse Police, duas sugestões de nomes. Um nome era Masternet e o outro nome era Redecard. E aí tinham oito pessoas na sala: “Qual nome você escolhe? Qual nome você gosta?”, “Eu gosto desse”, “Eu gosto desse”. Aí deu quatro a quatro. E, nessa hora, entrou o garçom para servir o café da gente. E aí o presidente da Credicard, que era o Canepa, né, ele virou falou assim: “Ô - acho que era Gomes o nome dele - Gomes, qual nome você gosta mais?”. Aí ele falou assim: “Redecard é bom, né?”.
P/1 – (risos)
R – Virou Redecard ali, naquela hora. A empresa virou Redecard ali. Foi ele que escolheu o nome. Então isso é um negócio legal, né? Porque você está construindo do zero. Quer dizer, você está ali todo mundo construindo. Quer dizer que, Redecard ou Masternet? Quer dizer, “A outra parece mais com a Visanet, parece com mastercard, e tal”. E “Redecard é bom”. Pronto, ficou Redecard.
P/1 – (risos) Fernando, e como é que foi o processo da sua vinda para a Redecard? Porque você estava dentro da Credicard, estruturou o projeto, vamos dizer assim, foi lançado. E como é que foi a sua vinda para cá?
R – Na verdade, eu nunca fui visto como funcionário da Credicard. Quando eu entrei, todo mundo já sabia: “Ah, esse é o cara que vai trabalhar na empresa nova”. Sempre foi isso. Só que quando a empresa começou, tinha uma ideia que era assim: “Não, ele vai ser o diretor de Finanças, então ele se reporta ao diretor, ao vice-presidente de Finanças da Credicard, e também ao presidente da Redecard”, era uma coisa meio matricial. Ou seja, eu quase não tinha área aqui. As pessoas que eram aqui, iam trabalhar para mim. Estavam na Credicard. Era um negócio meio imbricado. Mas quando o presidente chegou, que era o Livo, e ele, aí ele tomou algumas decisões, falou assim: “Não, eu quero que o diretor de Finanças trabalhe para mim. Tenha uma área, da mesma forma que eu quero ter uma área de RH, como eu quero ter uma área de Vendas”. Então aí é que foi uma das grandes mudanças, que eu deixei de ser um funcionário do vice-presidente de Finanças da Credicard para me reportar a um presidente de empresa. Então a gente trabalhava todo mundo junto, no começo. Na mesma mesa. Então trabalhava eu, o Irélio, o Anastácio e o Costa, em um mesão, e o Livo. Que era o presidente da empresa. Então a empresa era aquilo ali no comecinho. E cada um tinha os seus funcionários. Eu tinha três funcionários na época. E aí é que a gente foi estruturando. Quer dizer, então, mas eu nunca fui visto como funcionário da Credicard. Eu sempre fui: “Ah, ele vai trabalhar na empresa nova”, quando não tinha nome. Depois...
P/1 – E como é que era essa área de Finanças nesse momento?
R – Olha, a área de Finanças, no momento, ela era uma área muito mais de modelagem de negócios e informações gerenciais do que propriamente uma área de Finanças. Na verdade, o que é que a gente fazia? A gente fazia todos os modelos de rentabilidade da empresa, todas as projeções de resultado. Era uma grande área de planilhas. Todas as projeções de resultado, e quem fazia a contabilidade era a Credicard, que fazia a contabilidade para a gente. Quem fazia a captação do dinheiro era a Credicard. A gente tinha uma área quase de informações gerenciais. Era isso. Que depois foi crescendo, se estruturando, e aí foi. No começo, era tudo via Credicard. Mesmo os nossos reportes do Citibank, eram via Credicard. Depois a gente foi ganhando uma independência, mas, no começo, ela era uma área pequenininha. Uma área pequenininha que fazia isso: modelagem, tinha um relacionamento com a força de vendas, de “pricing”. Tinha um relacionamento com a área de Produtos, modelava aquele produto, quanto ganhava o outro. Mas era um negócio bem menorzinho, muito mais gerencial do que efetivamente finanças no sentido da palavra.
P/1 – E qual foi a estratégia utilizada por vocês neste momento para atuar junto ao seu cliente, ao seu mercado? Qual foi a estratégia?
R – Aí a estratégia foi muito parte dessa planilhinha que eu falei de simulação. Então a gente fez um treinamento com a força de vendas mostrando como era a composição do resultado da empresa. E mostrando o seguinte: “Olha, nós temos que voltar e visitar os clientes, e explicar para eles que é outra realidade. Que é uma empresa nova, que os serviços vão ser melhores, mas que o preço vai ter que mudar”. E muitos iam ter que aumentar o preço. Então foi uma estratégia muito grande, e assim, a gente tinha um acompanhamento dos 30 maiores clientes, e muitos deles traziam prejuízo para a empresa. Então era, aquele negócio era sempre acompanhado para ir revertendo aqueles clientes para o positivo. O trabalho era tudo da força de vendas e a gente por trás dando um suporte de: “Olha, o que é que dá para fazer em termos de negociação, em termos de taxa, e quanto?” Vai negociar a taxa algumas vezes, muda o prazo, sempre para a força de vendas entender qual era o impacto daquelas coisas que ela estava fazendo.
P/1 – E qual era o negócio da Redecard?
R – O negócio da Redecard era credenciar estabelecimentos para aceitar o cartão de crédito. Esse era o negócio. Era um negócio de adquirente. Quer dizer, então, a aceitação do cartão de crédito nos estabelecimentos. Então isso compreendia o quê? Compreendia a instalação de uma maquininha, para você aceitar o cartão de crédito. Compreendia, onde não tinha maquininha, você ter uma central de atendimento por trás para autorizar aquela compra, né? Compreendia você pagar aquilo para o estabelecimento, garantir que ele ia receber aquilo ali. E tinha uma atividade financeira que era antecipação do pagamento para os estabelecimentos que o desejassem. Então esse era o negócio. Tinha essas grandes linhas de negócio. Quer dizer, credenciar o estabelecimento, cobrar uma taxa dele para aceitar o cartão, garantir que ele receba aquele dinheiro, colocar uma maquininha para os estabelecimentos que fizessem sentido ter a maquininha na época. A maquininha era super cara. Só tínhamos 38 mil máquinas. E antecipar o faturamento para quem quisesse antecipar, que trazia uma receita financeira. Esse era o negócio da Redecard.
P/1 – E qual era o negócio... Aliás, desculpa, a relação com os bancos. Fernando, eu queria que você falasse um pouco dessa relação com o banco, entendeu?
R – Tá. A relação com os bancos, da Redecard com os bancos, no começo, ela era bastante complexa e complicada. Por quê? A Redecard era uma empresa que era dentro da Credicard, né? Então em um determinado momento, ela foi criada para poder os outros bancos emitirem cartões Mastercard. E não só a Credicard que tinha exclusividade. Então a Credicard perdeu a exclusividade de emitir cartão Mastercard e ficou com a exclusividade desse credenciamento de estabelecimentos. Então em um belo dia você começa a se relacionar com o Bradesco, com o Banco do Brasil, com o Banco Real, que eram os emissores Visa. E os outros emissores da Credicard, que eram os emissores Mastercard, já faziam parte aqui, mas todos embaixo da Credicard. Então você tinha que negociar com o Bradesco quanto que ele iria contribuir para o fundo de marketing da Mastercard, por exemplo. Como é que era a aceitação. E, nesse mesmo momento, você tinha duas redes: a rede da Credicard, rede de computador atrás, tal, era diferente da dos outros emissores. E essa funcionava melhor do que a deles. Então você chegava em um fim de semana, às vezes, o cartão do Bradesco não passava, mas o da Credicard funcionava. E o banco não entendia e não aceitava aquilo de jeito nenhum. Por exemplo, tem um produto que hoje é super famoso, que era o Parcelado Sem Juros: só a Credicard tinha. Os outros bancos não tinham. Então, por exemplo, eu me lembro de ter ido em processadoras de bancos para ensinar como era o produto, como fazer aquele produto. Quer dizer, junto com a processadora do banco, ensinar. Então tinha um relacionamento muito próximo deles, porque tinha que definir toda forma de liquidação, toda negociação do que é que eles pagariam de garantia para estar na rede da Mastercard. E um trabalho muito em conjunto com a Mastercard. Porque só quem tinha relacionamento com a Mastercard era a Credicard. E um determinado instante do tempo, a Mastercard tinha relacionamento com esses outros bancos, com a Redecard e com a Credicard. E a Redecard era peça fundamental nisso daqui. Para os bancos acreditarem e falar assim: “Então qual é a rede que você vai botar disponível para mim? Como é que vai funcionar? E quanto tempo eu tenho que te pagar? Em quanto tempo você paga o estabelecimento? Como é que é esse relacionamento, para onde a transação vai?”, era um aspecto muito técnico. Era bem menos negocial e muito mais técnico. Era a construção da rede. Eu diria assim, que, talvez o primeiro ano da Redecard foi muito isso. Quer dizer, negociação com estabelecimentos da nova forma, e o aspecto técnico muito forte por trás.
P/1 – Qual a necessidade da criação da Redecard?
R – Na verdade, assim, a necessidade da criação da Redecard foi para a manutenção da exclusividade que a Credicard tinha com a Mastercard. A verdade é essa. Quer dizer, ela, a Credicard, tinha tudo. Só quem podia fazer coisa com a Mastercard no (Brasileira?), a Credicard. Então ela podia emitir, processar, credenciar estabelecimento. E aí os outros bancos tinham um acordo com a Visa. Um determinado instante do tempo, começou uma pressão muito forte no mercado para se acabar com essa exclusividade. É o que se chamou de dualidade. Então foi decidido o seguinte: “Agora todo mundo vai poder emitir todas as bandeiras”. Aí os bancos do lado Visa se uniram para criar uma rede de credenciamento que é a Visanet. E a Credicard, do seu lado de cá, falou assim: “Não, então nós também queremos criar uma rede para a Mastercard que vai ser exclusiva nossa. Então todo mundo vai poder emitir, mas só quem vai poder capturar Visa são aqueles, aquela empresa. Só quem vai poder capturar a Mastercard é essa empresa aqui”. Então era uma resposta ao mercado de como é que eu continuaria com uma exclusividade com a Mastercard. Tanto que todo acordo de formação da Redecard previa essa exclusividade. A exclusividade de captura de transações Mastercard é da Redecard, é dessa empresa que vai ser criada. Esse era...
P/1 – A essência da coisa.
R – É.
P/1 – E, Fernando, como é que você trabalha, como é que vocês trabalharam na verdade a questão do banco? Porque você tinha dentro da Credicard três bancos, que eram Unibanco, Itaú e...
R – Citibank.
P/1 – É. Como é que você, a hora que você tira a exclusividade, e sendo que os maiores acionistas são bancos. Como é que foi isso? Como é que se trabalhou isso?
R – Na verdade, quer dizer, a Redecard era a empresa que mantinha a exclusividade, né? E o que é que tinha? Os produtos que a Redecard ia desenvolver, ela teria que desenvolver para todos os emissores. E mesmo independente de todos os emissores, mesmo dentro de casa entre os três acionistas, sempre houve aquele negócio? “Bom, mas vai desenvolver primeiro para quem? Vai ser primeiro para o Itaú, primeiro para o Unibanco, primeiro para o Citibank?”. Então isso era uma das coisas para você trabalhar e tentar mostrar para todos os, não só sócios, mas também aos outros, que não existia aquela diferenciação entre os emissores. Então esse foi um trabalho muito grande de conquista dos emissores, trazer todo mundo para cá, para todo mundo se sentir especial e privilegiado. E esse, só tem um jeito de fazer isso: com transparência. Visitando, mostrando, chamando para participar. Não tinha outro jeito. Quer dizer, e a Redecard sempre foi muito isso, sempre foi uma empresa muito transparente. A gente sempre soube lidar muito bem com os acionistas e emissores também.
P/1 – Agora, me conta um pouquinho como é que foi esses anos da Redecard e a tua trajetória? Queria que você falasse um pouquinho disso.
R – Assim, eu entrei como Diretor de Finanças, né? E assim, era uma pessoa que queria fazer de tudo. Eu queria fazer tudo. O que jogassem na minha frente, eu ia fazer, queria assumir e tal. Então eu fui diretor de Finanças. Depois, a minha área foi crescendo, e aí um determinado momento o presidente resolveu o seguinte, falou assim: “Olha, nós precisamos agora, já chegamos - isso foi em maio de 97 -, nós chegamos em um determinado estágio onde precisa dar o próximo passo na empresa”. Então ele falou assim: “Olha, eu queria fazer um trabalho para a gente reestruturar a empresa”. Então a gente desenvolveu internamente, aí até eu joguei contra, contra a minha origem; eu falei o seguinte: “Olha, a gente não precisa contratar uma consultoria para fazer um trabalho de reestruturação aqui. Fazemos nós. A gente vai dizer para a consultoria o que é que ela vai fazer. Eu sei que eu vivi isso sete anos”. Então a gente conduziu, assim, nós, os diretores da empresa, um trabalho de reestruturação, de como a empresa deveria funcionar a partir dali. Então teve a criação de outras áreas. Quebrar a área de vendas em área de Vendas Varejo e área de Grandes Contas. Criação de uma vice-presidência de Marketing e Produtos. Uma vice-presidência e Operações e Tecnologia. Ter uma diretoria de Finanças, uma diretoria de Risco. Então a gente criou dentro de casa esse trabalho, mas foi um trabalho super bem elaborado, que ele analisava todas as forças e fraquezas da Redecard. “Quais eram os desafios? Por que é que isso tinha que acontecer?” E a gente apresentou isso para o presidente da empresa. O presidente gostou muito desse trabalho. E apresentou para o chefe dele que era o presidente do Citibank no Brasil. Também gostou, falou: “Vamos em frente”. E, nessa hora, eu falei assim: “Bom, é a minha oportunidade de sair da área de Finanças”. Então já tinha um substituto formado, e tinha um objetivo de ir para uma diretoria de Grandes Contas na área Comercial. Falei: “Não, vou para essa diretoria de Grandes Contas”. Grandes Contas era um negócio que você lidava muito no Financeiro. Quer dizer, você ser o responsável pela conta de um Pão de Açúcar, uma Loja Americanas, era uma negociação muito financeira e menos de dia a dia de estabelecimento, tal. Falei: “Bom, esse negócio pode ser meu primeiro passo”. Então, na verdade, desenhei aquela caixinha lá em conjunto com todo mundo, falei: “Bom, essa vai ser a minha caixinha”. Mas aí, no meio desse processo [que] a gente estava estruturando: tinha uma pessoa que era o vice-presidente; um vice-presidente de vendas; eu, que era diretor de Finanças; o Irélio; o vice-presidente era o Anastácio - o Irélio era o diretor de RH -; e o Costa era o vice-presidente do resto do mundo. Quer dizer, tudo que não estava nessas áreas, era com ele: Marketing, Produtos, Operações, Tecnologia, Central de Atendimento. E quando quebrou isso daí, o presidente resolveu o seguinte, falou assim: “Não, o Costa vai ser Operações e Tecnologia, vou trazer uma pessoa para Marketing e Produtos. Finanças, pode botar um substituto”. E eu iria para Grandes Contas. Esse era o desenho que estava montado. E aí aconteceram dois movimentos: um, o Costa não quis ser o vice-presidente de Operações e Tecnologia, ele ficou muito pouco tempo e depois ele resolveu sair. E a pessoa que foi convidada para ser vice-presidente de Marketing e Produtos, que era de fora, uma pessoa do mercado, não aceitou. E aí quem estava lá na hora? Eu. E aí eu recebi a proposta para ser o vice-presidente, para ser, na verdade, diretor de Marketing e Produtos. E aí eu falei assim: “Não, se é para ser Marketing e Produtos, aí eu queria ser vice-presidente”. E aí eu virei o vice-presidente de Marketing e Produtos, o Costa ficou sendo o vice-presidente de Operações e Tecnologia, e aquela pessoa que eu tinha formado virou o diretor de Finanças. E aí contratamos um diretor de Risco e contratamos uma outra pessoa para ser diretor de Grandes Contas. Então o time ficou: o Anastácio, na área de, era o vice-presidente de Vendas, do Varejo; o Irélio era o diretor de Recursos Humanos; aí contratamos o Fernando Chacon, para ser o diretor de Grandes Contas; veio do Cândia; Fábio Palmeira virou o diretor de Risco; Luis Faria virou o diretor de Finanças; eu fiquei sendo o vice-presidente de Marketing e Produtos; e o Costa ficou sendo o vice-presidente de Operações e Tecnologia. Então essa foi a estrutura depois da reorganização. E isso foi em agosto de 97. E aí, um pouco tempo depois, o Costa saiu. Na verdade, assim, me lembro quando eu, quando eu assumi isso foi em agosto, e o Costa saiu, acho que ele saiu um pouquinho tempo depois. Acho que ele saiu em outubro, alguma coisa assim. Ele voltou para o Citibank. Ele achou que tinha que ter uma formação na área de Produtos e voltou para o Citibank. E aí ficou essa área de Operações e Tecnologia sem ninguém. Ela ficou uma área meio sem ninguém. E eu, obviamente, como era espaçosíssimo, fui me enfronhando ali naquela área. Tanto que um ano depois, eu assumi toda a área de Atendimento. Então, em julho de 98, eu assumi toda a área de Atendimento, que estava ali meio sem chefe, aquele negócio, [e] eu 'tum', botei a área de Atendimento para mim. Quando eu assumi a vice-presidência de Marketing e Produtos, a primeira coisa que eu fiz foi contratar alguém que sabia marketing, né? Então eu trouxe o Pantaleão. Tirei ele da Ambev, falei assim: “Não, vem para cá (risos) trabalhar comigo porque agora é marketing. Bom, eu, de engenheiro para Finanças, para Marketing. Olha, é muita coisa. Vou aprender marketing, mas vem para cá”. Então coloquei ele aqui, tinha umas pessoas de produtos que já eram da casa, eram super boas. E a gente foi estruturando. Depois fomos para, assumi essa área de Atendimento, em julho de 98. E aí já tinha uma, um trânsito na empresa super bom. Quer dizer, já influenciava em todas as áreas, já metia a colher em todo mundo. Tinha um relacionamento ótimo com todo mundo aqui. Eu sentava, nessa época, lá na Paulista, em uma mesa que era assim: a minha mesa era aqui e a do Irélio era ali. E o Irélio tinha três cartõezinhos. Ele tinha um cartão vermelho, um cartão amarelo e um cartão azul. E aí eu ficava, era tudo aberto, o salão aberto, ali falando com as pessoas. E aí ele fazia assim com o cartãozinho. Ele abria a gavetinha dele, tirava o cartãozinho e mostrava assim para mim. Quer dizer, o cartãozinho vermelho é quando eu estava demais ali já, né, com a pessoa.
P/1 – (risos)
R – Quando dava para dar uma segurada, ele mandava um amarelinho. Aí eu me lembro até hoje do dia que ele mostrou o azul. Eu me levantei e falei: “Ó, dá licença, espera aí um segundo”. Levantei, dei um beijo nele. “Ah, um cartão azul!” (risos)
P/1 – (risos)
R – Que era assim, a Redecard foi uma etapa muito importante da minha vida. Foi assim, principalmente, o melhor período profissional que eu vivi. Eu entrei garoto na Redecard e saí homem. Por quê? Todo mundo gostava muito de mim, ajudava na minha formação. O Presidente Livo, o Anastácio, o Irélio, o Fábio Palmeira, todas as pessoas trabalhavam ali quase que me ajudando. Porque eu era garoto, era um garoto inteligente. E [tinha] uma disposição, fazia e acontecia, mordia e tal. E eles iam me ajudando porque eu ajudava eles também. Quer dizer, sempre era querendo o melhor para a empresa, mas eles me ajudavam muito mais do que eu ajudava eles. Porque todo o amadurecimento que eu tive, todo esse negócio, foi muito do relacionamento com eles. Quer dizer, são meus amigos. Eu tenho 20 anos a menos do que eles. Então foi um negócio assim que para mim foi fantástico, né? Eu falei assim: “Olha, eu tive oportunidade de me relacionar com pessoas que trabalhava há muito tempo”, eu nunca tinha trabalhado em uma empresa. Era consultor, tinha trabalhado antes em algumas coisas menores. E, de repente, ali, me vejo em uma posição, que tem que tomar decisão, tem que fazer isso, tem que fazer aquilo. E eles sempre junto de mim ali. A gente se reunia, trabalhava todo mundo junto, no mesmo ambiente. Era um crescimento muito intenso para todo mundo, mas, para mim, era, eu tirei muito mais deles do que eles tiraram de mim. Muito mais. Eu aprendi muito, assim, absurdamente. E todos eles apostavam muito em mim. Todos apostavam muito na minha carreira, no meu crescimento. Tanto que quando eu fui assumindo outras coisas na Redecard, peguei a área de Atendimento, aí fui, a área de Atendimento, bem, foi um sucesso e tal. Quando chegou no final de 98, e aí me fizeram uma proposta para eu assumir a área de Operações e Tecnologia. E a minha primeira reação foi assim, eu falei: “Pô, olha, eu saí de Finanças, fui para Marketing e Produtos, aí a gente fez um belo negócio em Marketing e Produtos. Depois eu peguei o Atendimento, consegui fazer um negócio bacana no atendimento, melhorar muito. Agora vocês querem me dar outro osso? Não, pô”. E aí me lembro até hoje disso, o Irélio falou assim: “Cara, que é que você quer?”. Eu falei: “Cara, eu quero ser presidente”. Aí ele falou assim: “Então isso aqui é o que está faltando para você”. Eu falei: “Ah, isso é conversa de RH, pô”. Ele falou: “Não, não é conversa de RH, só falta você, se você assumir essa área de Operações, não falta nada para você estar formado para ser um presidente”. Eu acreditei, e aí topei, peguei a área de Operações. Então, em 1999, eu tinha área de Operações, Atendimento, Produtos, Tecnologia. Aí era um negócio enorme, monstruoso. Era 75% do quadro da empresa, tocava a empresa toda, e tal. Não tinha, só não tinha Vendas e Finanças, né? Aquele negócio. E aí fui crescendo muito. Tanto que quando eu saí da Redecard, saí para ser presidente de outra empresa. Quer dizer, realmente, foi fundamental. A Redecard para mim foi assim um marco na vida que é: antes da Redecard e depois da Redecard. E a outra coisa que eu consegui construir amigos na Redecard. Quer dizer, então eu saí daqui há sete anos e tenho amigos aqui que, de vários lugares que eu passei, não tenho amigos como os que eu tenho aqui. Isso foi fantástico assim.
[Pausa]
P/1 – Fernando, você colocou para a gente algumas coisas do desenvolvimento da Redecard, eu queria que você falasse um pouquinho para a gente dos projetos que você esteve envolvido na Redecard qual que foi o mais marcante para você?
R – Olha, um dos projetos muito marcantes na Redecard foi assim, logo que, logo não, mas eu assumi a área de Marketing em agosto de 97. E quando chegou no final de 97, a gente não tinha dinheiro para fazer a campanha de Natal. Então a gente não tinha dinheiro para fazer a campanha, não tinha dinheiro. E a gente desenhou uma campanha do Parcelado Sem Juros. “Vamos fazer o Parcelado Sem Juros, vamos fazer esse negócio crescer na nossa base de transações. É uma maneira da gente evoluir.” E eu, na verdade, ia passar o pires junto aos regionais de venda, que o orçamento de marketing era deles. E ninguém tinha dinheiro: “Não, não tem, a gente já consumiu”. Então a gente preparou um projeto para levar na Mastercard e tentar fazer com que a Mastercard desse um dinheiro para a gente fazer aquilo. Porque, na verdade, eu falava da marca Mastercard. E fui apresentar no Comitê de Marketing da Mastercard, [que] era formado pelos bancos emissores de Mastercard. Só que 85% das transações era da Credicard. Então a gente foi apresentar - era um grande desafio. Ele falou assim: “Não, tudo bem. Mas você vai fazer isso, 85% do volume vai ser da Credicard”. E o meu trabalho era convencê-los do seguinte, eu falei: “Não, olha, se vocês fizerem a diferença nesse negócio, é o início da virada. Deles deixarem de ser 85% e vocês terem uma participação”. Então, e a gente desenhou um projeto com mídia, com jornal, comunicação com estabelecimento. Era uma comunicação individualizada, um negócio muito bacana que não tinha sido feito antes. Que a gente sempre fazia um monte de mala direta, para aquela base inteira de estabelecimento. Não, a gente selecionou os estabelecimentos, quais iam receber a mala direta, o porquê, qual era a proposta para cada um deles. Envolveu a força de vendas. E a gente tinha uma meta de ter 5% de participação do Parcelado Sem Juros na venda. Foi 13. E foi um sucesso absoluto. Quer dizer, o Parcelado Sem Juros foi um sucesso absoluto. A gente comemorou à beça. Quando virou o ano, eu cheguei para o presidente [e] falei assim: “Pô, e aí, gostou?” Falou: “Não, fantástico.” “Então agora eu quero 100% da verba de Marketing na minha mão”. Ele falou assim: “Mas não é?”. Eu falei: “Não é”. Eu mostrei para ele: “Olha, assim, assim [e] assim”. Ele falou: “Não, então está bom”. Eu falei assim: “Então, ó, eu já escrevi um e-mail para você. É esse e-mail aqui. (risos) É só você mandar”. (risos) E ele mandou. E aí a gente começou a trabalhar a área de Marketing de uma maneira totalmente diferenciada, tentando criar uma identidade. Que esse negócio era muito mais distribuído, cada um fazia a sua atividade do jeito que achava. E a gente começou a trazer, e aí é o que o chefe até falava: “Olha, engenheiro no Marketing”. Todo mundo que apresentava um projeto, eu queria saber qual era o retorno daquilo para a empresa. Quanto que ia trazer de transações, de lucratividade. Mas, a empresa foi crescendo dessa maneira, então isso foi um marco muito importante. E outro grande projeto foi quando eu assumi a Central de Atendimento. Quando a gente assumiu a Central de Atendimento, na verdade, eu me lembro disso até hoje, chamei o Pantaleão para ir na minha casa - ele era o diretor de Marketing. Eu falei assim: “Olha, eu quero assumir a Central de Atendimento”. Ou foi ele que chegou para mim falou que queria assumir a Central de Atendimento. Agora já não me lembro mais. Eu sei que a gente chegou à uma conclusão que: “Olha, a gente precisa assumir a Central de Atendimento. Dá para a gente fazer”. E a gente entrou para assumir a Central de Atendimento, que eram 500 pessoas. Eu tinha tido, até então, sei lá, 20 funcionários. Então eram 500 pessoas, atendentes. A gente assumiu a Central de Atendimento, e aí a gente botou a nossa Engenharia de Produção para funcionar. A gente fez um mapeamento dos funcionários e mediu a produtividade de cada um deles. Então, quando a gente fazia as metas, eram individuais, por funcionário. Ninguém ia sair de zero para 100. Ele saía de cinco, para dez, para vinte e assim chegava. E assim, em grandes números, quando a gente assumiu a Central de Atendimento, 16% das ligações eram abandonadas. A gente tinha um nível de serviço de 60%. Quando a gente, em dezembro, concluiu esse projeto, tinha 2% de abandonos, com 90% de nível de serviços. Foi um ganho assim, fantástico. E o mais engraçado foi o envolvimento das pessoas, o mais gostoso disso. Quando a gente assumiu a área, foi em julho, e eu fui, tinham três áreas. Era no Rio de Janeiro, São Paulo e em Salvador. E eu fui em todos eles e perguntando que é que eles queriam, né? Qual era a expectativa da área. E você se depara com um público completamente diferente, que assim, muitos não têm uma ambição muito grande, estão ali de passagem. Aquilo ali é um emprego; não é um trabalho, é um emprego, entendeu? Não querem muito aborrecimento. Mas tem muita gente querendo crescer, querendo aprender, querendo se desenvolver. E quando eu cheguei lá, o pleito de todo mundo era o seguinte: “Quando é que vai trocar os terminais?”, que era um terminal de tela verde, era feio. E aí eu me lembro, falei assim: “Olha, amanhã”. Aí ficou todo mundo assim: “Pô, amanhã?”. Eu falei: “Amanhã. Mas eu também quero o seguinte, 2% de abandono [e] um nível de serviço de 90%. Eu quero um tempo médio de ligação tantos por cento menor”, “Não, mas isso não é a gente”. Eu falei assim: “São vocês. Isso depende de vocês”. Eu assumi um compromisso com a Central de Atendimento, que era o seguinte: “Olha, vamos fazer isso aqui. E o dinheiro que a gente economizar, eu reinvisto na Central de Atendimento. Agora, eu vou deixar vocês escolherem: a gente pode colocar esse dinheiro em ‘layout’, pode colocar esse dinheiro em terminal, ou eu posso pagar bolsa de estudos”. A gente passou dois anos para mudar o “layout” da Central de Atendimento, porque eles viram que não era esse negócio que fazia diferença. Agora, pagamos bolsa de estudos para várias pessoas. E aí tem o lado, tem os outros projetos que não são tão alegres. A gente fez um projeto também de terceirizar a Central de Atendimento. Então a gente pegou 250 pessoas, a conta era: 250 pessoas iam ser demitidas, desligadas. E aí eu, como carioca, tive que tomar uma decisão de ao invés de demitir as pessoas de forma distribuída nos três pólos, desligar o pólo do Rio de Janeiro. E botar 250 cariocas sem emprego. Então esse foi um negócio, foi um grande projeto de preparar o fornecedor que ia terceirizar isso tudo junto com a gente. E um determinado dia, convocar todas as pessoas para um hotel para serem demitidas. Negócio extremamente triste. Mas tem um lado legal disso que [é] assim: aí o RH, junto com a gente, fez um trabalho de recolocação. E a gente conseguiu recolocar, acho que foram 185 pessoas. Quer dizer, uma parcela muito grande a gente conseguiu recolocar no mercado. Ou no fornecedor, ou em outras empresas, ou orientar. E ver que tinha gente que não tinha que estar ali, que tinha que ir para uma outra área. Tinha que fazer outro tipo de negócio. Então essas coisas foram muito marcantes. Esse relacionamento com gente, tomar decisão de demitir 250 pessoas, mas, também trabalhar para recolocá-las. Isso foi um dos projetos bastante interessantes. Faz...
P/1 – Fernando, você está colocando um pouco dessa relação de situações em que foram tomadas decisões que envolvem pessoas. Eu queria saber quais foram os valores que foram levados em consideração para tomada de decisão?
R – Olha, na verdade, o que é que a gente levava em consideração? Quer dizer, tinha uma busca de resultado do negócio muito grande. E uma visão de futuro. De coisa, por exemplo, essa que a gente decidiu terceirizar era uma atividade que iria morrer. Que é que era a atividade? Dar um número de autorização pelo telefone. Para que é que você dava esse número? Para as transações que não eram eletrônicas, eram transações manuais. Então, em uma visão de futuro, isso ia morrer. Hoje a Redecard tem mais de 99% das transações em eletrônicas. Então não existe aquilo, não existe aquela área. Então a gente falou assim: “Olha, nós estamos investindo um negócio que não é saudável nem para a empresa [e] nem para as pessoas. Não tem futuro nesse negócio. É melhor isso aqui você tirar da empresa, você terceiriza. E você cresce, as pessoas que ficam, crescem, e se beneficiam de uma empresa que vai crescer. E não uma empresa que está investindo em um negócio que vai morrer”. Esse foi um dos grandes fatores de decisão. Agora, a decisão de “quem vai ser desligado”, essa especificamente, todas as decisões de desligamento. Quer dizer, a Redecard trabalha com um mapeamento de pessoas, que isso é fantástico. Isso eu sempre uso, para todos os lugares que eu fui depois. Você mapeia todas as pessoas que trabalham em nove quadrantes, em nove quadrados. Então, por performance, por desempenho e potencial. Então são os valores que você usa para fazer uma movimentação, um desligamento. Mas, nesse caso específico, das 250 pessoas, foi uma decisão muito mais de logística. Falar assim: “Não, o que é que eu economizo mais? O que é que eu consigo mais eficiência mesmo na recolocação e o que é que eu consigo fazer com que as pessoas que permaneçam não fiquem com aquela sensação seguinte: 'Ih, esse foi só o primeiro movimento. Vem um outro movimento aí'?“. Então era desligar um polo, porque os outros polos seriam mantidos. E as pessoas iriam mudar a característica do trabalho delas, entendeu? Mas com uma mensagem clara: “Por que é que foi desligado aquele polo? As razões eram econômicas”. Não era razão de performance. Porque assim, até uma coisa um pouco perversa, é o seguinte: a gente melhorou muito a produtividade para poder terceirizar. Quer dizer, na verdade, a gente não tomou a decisão lá atrás de terceirizar. A gente, quando foi melhorando a produtividade, percebeu que tinha uma atividade que fazia muito mais sentido ser terceirizada. Tanto que a produtividade dela aumentou assim absurdamente. Porque ela era totalmente mecânica. E aí quando a produtividade atingiu um pico, assim, fantástico, a gente terceirizou. E o fornecedor tinha que prestar aquele nível de serviço para a gente, aquilo ali. Mas então para as pessoas, você imagina: “Eu trabalhei, trabalhei [e] trabalhei. Chega em um nível de produtividade e agora sou desligado da empresa?”. Esse lado é triste, é mais complicado.
P/1 – Me fala uma coisa: você acha que a Redecard, considerando que Redecard, pelo que você contou, foi um desmembramento da própria Redecard, né? Você acredita que ela tem uma identidade própria?
R – Tem; a Redecard não tem uma identidade, a Redecard tem uma cultura própria. Ela construiu, isso foi um trabalho assim, feito, né? A gente construiu isso e aí eu acho que muito pelo processo de formação, de união, no começo. Redecard era um negócio muito sólido no começo, muito unido. O grupo que formou a Redecard, lá no comecinho, ele era muito unido. Nada conseguia penetrar naquilo ali, nada vinha contra a gente. A gente brigava entre a gente, mas, dali para fora, éramos só nós. Era uma unidade só aquilo ali. E isso foi passando ao longo do tempo na Redecard. Isso foi literalmente passando. Você vê, a Redecard hoje, ela, ainda hoje, é assim. Ela é uma empresa coesa, unida. Não ganha melhores empresas para se trabalhar a anos por acaso. A gente quando ganhou a primeira vez, (risos) não podia ser elegível ao prêmio. A gente entrou, se inscreveu, depois quando chegou lá no resultado, eles disseram para a gente: “Ó, vocês ganharam. Vocês foram a melhor empresa para se trabalhar no setor de serviços”. Depois eles voltaram, ligaram, assim: “Olha, vocês não podiam ter concorrido, só têm dois anos. Tem que ter cinco. Então a gente deu uma menção honrosa na Revista Exame: ela chegou lá em menos tempo”. Depois, no outro ano, eles mudaram isso para três anos e a gente entrou e ganhou. Então, mas isso é característica. Quer dizer, e todo mundo que trabalhava aqui no começo, tinha muito amor pela Redecard. Isso é um negócio que eu aprendi: você construir uma empresa é uma experiência única, participar da construção. Isso que eu falei de tomar a decisão, tudo, você decide o que é que vai acontecer. É muito diferente de você entrar em uma empresa formada. Quer dizer, hoje as pessoas que entram na Redecard não vão ter essa percepção da construção que a gente teve. Todas elas constroem um pouquinho do que está por vir aí, mas não aquela de tirar do zero, né? Tipo, vi neném ali, era nada e foi... Redecard era uma mesa, pô! Era uma mesa ali com a gente sentado na mesa. Não tinha telefone para todo mundo, era, e aquilo ali trouxe uma união muito grande, que perdura até hoje. A gente janta junto, periodicamente, aí; se vê, se gosta. É uma coisa muito forte.
P/1 – Fernando, quais são os valores que permeiam as relações da Redecard?
R – Olha, eu acho que um dos valores da Redecard é a integridade. Esse eu acho que é talvez um dos principais valores. O outro é essa, é colocar as pessoas em primeiro lugar. Quer dizer, na Redecard, as pessoas são efetivamente valorizadas. Sempre foram, sempre vão ser. Isso é um valor super forte da Redecard. E eu acho que o outro é a transparência, Redecard tem uma transparência muito grande. Seja para dentro, seja para fora, seja nas suas movimentações internas, no seu relacionamento com o mercado. Eu diria assim, esse tripé faz da Redecard uma empresa diferenciada.
P/1 – Como é que você imagina a Redecard daqui a 10 anos, Fernando?
R – Daqui a 10 anos ela vai estar bem diferente do que ela é hoje. O mercado muda, ela vai ser uma empresa diferente. Eu imagino uma empresa ainda bastante lucrativa. E aí eu posso responder essa pergunta dizendo lá atrás o porquê é que eu resolvi vir para a Redecard. Quando eu resolvi vir para a Redecard, a decisão foi, eu falei assim: “Olha, sempre vai ter alguém comprando, sempre vai ter alguém vendendo. E alguém vai ter que ligar essas duas pontas aí”. E a Redecard está nesse negócio, no negócio de facilitar as transações entre empresas. Então ela vai sempre existir. Ela vai continuar, sempre, existindo. Ela vai ser sempre um elo dessa cadeia, e um elo forte. E como a Redecard desenvolveu uma capacidade de se reinventar muito forte, ela vai existir diferente do modelo que ela tem hoje, mas vai continuar existindo lá. E os valores vão permanecer, porque os valores que ela tem e carrega são bastante suficientes para fazer uma perenidade para Redecard aí.
P/1 – Fernando, e por que a saída da Redecard?
R – Assim, na verdade, eu, como eu falei para você, queria ser presidente. Eu queria ser presidente da Redecard. Então eu vim me formando, formando para ser presidente e tal. E, assim, todo mundo achava que eu iria ser o próximo presidente, aquele negócio todo, enfim, trabalhando junto com os acionistas. Em 1999, o Livo era o presidente e ele já estava envolvido em uma série de atividades no Citibank. Então eu sempre ficava como presidente interino, estava ali, tudo e tal. E tinha uma aceitação por parte dos pares muito grande, eles gostavam de mim. Todo mundo participou da minha formação. Era quase como se eles estivessem escolhendo o presidente, né? “Ó, nós escolhemos esse aqui para ser o presidente.” Quando chegou em outubro de 1999, eu recebi a informação que eu não ia ser o presidente da Redecard, tinham escolhido uma outra pessoa. Eu fiquei extremamente triste, naquela época, tal assim. Falei assim: “Mas o que é que aconteceu? O que é que deu errado, né? O que é que deu errado nesse negócio? Será que por que eu sou muito novo? Por que foi? Será que alguém não gosta de mim?”. Aí procurei saber se tinha alguma resistência ao meu nome, não tinha nenhuma resistência assim: “Não, não pode ser esse, e tal, não sei o que lá”. Aí liguei para o, para a pessoa que ia ser o presidente da Redecard, que era o Fleury. Eu falei: “Olha, queria sentar com você para conversar, te contar um pouco, tal”. E ele até, eu me dou super bem com ele, falou assim para mim: “Pô, deve estar complicado na sua cabeça, né? Porque essa cadeira era sua, né?” Eu falei: (risos) “Olha, na minha cabeça ela era minha, mas se a decisão é essa, eu queria dividir com você o que é que eu faria se fosse continuar aqui, se eu fosse presidente e tal”. Aí dividi, discutimos desde estrutura a negócios, pessoas. Como é que deveria ser a estrutura daí para a frente, na minha visão. Ele agradeceu muito e tal. E eu comecei a olhar, falei assim: “Olha, eu acho que eu tenho que mudar”, porque não tinha mais espaço para eu ficar na Redecard. Quer dizer, eu não podia ser agora um super vice-presidente. Quer dizer, e tal. E o próprio Fleury, falou para mim, assim: “Cara, eu ia pedir para você sair daqui. Porque você é uma referência muito grande aqui dentro. As pessoas que vêm falar comigo, antes passam na sua mesa, para falar com você. E te mostram o que vão mostrar para mim”. Eu falei: “Ah, cara, porque esse negócio foi construído...”. Ele falou: “Cara, você é uma liderança que foi construída, então isso é uma coisa muito forte”. Eu falei: “É verdade”; Aí me fizeram a proposta de ser vice-presidente executivo do Conselho de Administração. Mas eu tinha 32 anos, eu não queria ser do Conselho de Administração. E aí, assim, uma coisa que eu nunca tinha feito era começar a olhar para o outro lado, o lado de fora, né? Eu falei: “Bom, deixa eu ver”. E aí, na época, estava aquele negócio de internet. Uma febre de internet. As empresas valiam muito dinheiro. E eu recebi uma proposta para ser presidente de uma empresa de internet, com uma participação acionária. E, na época, a empresa tinha como, valia 300 milhões de dólares. Eu falei: “Nossa, como é que essa empresa vale 300 milhões de dólares? Empresa pequena, e tal”. Mas tinha aquele negócio. E aí eu tomei uma decisão, quer dizer, muito mais ali de, falei assim: “Olha, eu tenho que aproveitar o tempo a meu favor também. Porque se um dos motivos de talvez eu não ter sido presidente da Redecard era porque eu tinha 32 anos, [então] tinha que usar isso em meu benefício. Quer dizer, eu só tinha 32 anos, então eu podia arriscar. Eu podia fazer um movimento que se desse tudo errado, daí a dois anos eu ia ter 34. Eu já tinha sido vice-presidente de empresa. Ia continuar sendo novo. E aí eu tomei uma decisão., falei assim: “Não, eu vou sair da empresa. Eu vou tentar uma outra coisa”. E fui ser o presidente da Zip Net. E foi uma experiência super bem sucedida. Quer dizer, foi um negócio, também tem que dar um pouco de sorte na vida, né? Foi uma experiência super bem sucedida, foi super bem. Conseguimos vender a empresa, que era meu propósito lá. Então foi essa, o motivador inicial foi o seguinte: “Pô, não virei presidente. Vou embora”.
P/1 – E, Fernando, como é que você, saído dessa empresa, se tornou presidente? O objetivo era vender essa empresa? E eu queria que você falasse um pouquinho como é que você chegou a presidente hoje...
R – Aí assim, uma das coisas, você vai aprendendo um pouquinho, né? Um pouquinho de cada vez. Quando eu saí daqui, fui para a Zip Net [e] encontrei um mundo completamente diferente. Que era um mundo desestruturado, era uma empresa de internet. Eu era o executivo, né? O único que era executivo era eu. Os outros todos eram amigos que se juntaram e fizeram, e veio um daqui e dali. Conheciam internet. E eu era executivo, um executivo do Citibank. E eu fui para lá e tentando estruturar esse negócio. Então, no começo, foi um grande choque para mim. “Nossa, como é que as coisas funcionam aqui assim?” E aí me vi do outro lado da mesa também, que era o seguinte, falei assim: “Olha, lá na Redecard eu mandava nos fornecedores. Os fornecedores vinham para mim querendo me vender. Aqui eu vou no fornecedor querendo comprar, dizendo que eu não tenho dinheiro para pagar”. Então aí você adquire um outro aprendizado muito grande. O outro é trabalhar para captar dinheiro. Então era uma empresa que precisava trabalhar para captar dinheiro para se financiar, para financiar a sua operação. Então isso vai te dando um crescimento muito grande. Depois que eu saí, vendemos a empresa; eu saí de lá [e] resolvi montar a minha empresa. Eu falei: “Eu vou montar o meu negócio agora”. E montei o meu negócio. Eu montei uma incubadora de empresas. Que o objetivo era fazer outras empresas. E fizemos várias coisas interessantes, [também] fizemos várias coisas que deram errado. Com as coisas que vão dando errado você aprende muito mais, mas de uma forma diferente. E eu aprendi muito. Porque eu estava em uma posição de venda, de criação de empresas novas. De não ter orçamento, de ter que se relacionar com empresas grandes: eu era o fornecedor. Aquele mesmo fornecedor que quando eu estava sentado na cadeira da Redecard, recebia ele, e aí tratava bem. Mas com alguns eu não queria fazer negócio, e alguns não estavam na minha prioridade e tal. Eu me vi do outro lado. Eu falei assim: “Olha, como é duro”. Porque o cara fala para você: “Não, legal. Eu te ligo daqui, eu te ligo o mês que vem”, “O mês que vem?”, mas na minha agenda aquilo ali era importantíssimo. Na agenda do Fernando Telles, daquela empresa lá, não era. Ele podia: “Vou viajar. Então daqui a um mês eu te ligo”. Me atendia bem, me recebia, mas não estava na prioridade dele. E aí você começa a perceber isso. E você começa a adquirir uma capacidade de visão de negócio, de gestão - de saber o que é que dói no seu bolso. Como se portar como um acionista. Eu tinha sócio, eu tinha fundos que eram meus sócios. Então, fundos de investimento. Eu tive empresa junto com o IGP, junto com o Grupo Martins; com a Rio Bravo, que é do Gustavo Franco. E aí você começa a ficar muito mais maduro. Tem que aprender a se portar de uma determinada maneira, aprender a negociar, a ceder. Você tem que aprender a barganhar. Tem que aprender a comprar, saber dizer o sim, saber dizer o não. E vai crescendo. Eu me lembro que em uma época que eu estava em uma dessas empresas. Aí houve uma mudança no Citibank, e tal, aí o Citibank me ligou, eu fui lá conversar com eles. Eu liguei para o Alvarão. O Alvarão era o diretor regional do Citibank para a América Latina, mas já tinha saído do Citibank. Eu falei: “Pô, Alvarão, posso ir aí conversar com você?”. Ele falou: “Tudo bem”. Eu fui lá conversar com ele, falei assim: “Olha, tem, está acontecendo isso, o Citibank me chamou para conversar. Putz, mas eu estou em uma dúvida enorme. Eu estou tocando o meu negócio aqui e tal, indo razoavelmente bem. Já toquei alguns negócios que deram errado. Já quebrei alguns,as esse agora está indo bem”. Eu falei assim: “Mas eu estou receoso de, pô, colocar um monte de exigência, dizer um não para o Citibank”. E ele falou um negócio para mim que aí, eu acho que caracteriza bem. Ele falou assim: “Ô, Fernando, você agora é um executivo ‘prouvent’”. Eu falei assim: “Que é que é isso, Alvarão?”. Ele falou assim: “Não cara, porque a gente sabe como você reage no sucesso e no fracasso. A gente sabe como é a sua reação. Tem muitos executivos aí que tiveram uma carreira, mas só tiveram sucessos. Você não sabe o que é que vai acontecer no dia em que esse cara quebrar, ou que o negócio der errado. Ou que ele passar por uma dificuldade, ou que o orçamento ficar pior. Você já fez isso. Hoje você acaba valendo muito mais do que se você tivesse ficado dentro da empresa”. Eu falei assim: “Pô, engraçado de falar isso, né?”. Ele falou: “Mas é verdade, você amadureceu muito nesse período que acabou saindo. Aprendeu muito dentro do Citibank. E você, agora, está do lado de fora, e teve sucesso. A gente acompanha você. Então você teve sucesso em alguns negócios, você não teve sucesso em outros, mas continua aí. Você está surfando a onda, mas está sempre ali em cima”. Eu falei assim: “É, isso é verdade”. Então essa capacidade de adaptação, de, pô, entender a hora... Quer dizer, quando monta uma empresa, você entender a hora e falar assim: “Não, tem que fechar a empresa. Tem que parar de perder dinheiro aqui. Fechar. Vou fechar, demitir”. Eu tive empresa de ter 100 funcionários, meus. E chegar em uma hora e falar assim: “Olha, gente, vamos ter que fechar a empresa. Nós estamos perdendo as concorrências e tal, nós não vamos ter dinheiro para pagar vocês. Então nós vamos, eu tenho dinheiro para pagar vocês mais dois meses. Então eu vou dar o prazo para vocês, vocês escolhem se vocês querem continuar aqui procurando emprego, ou se vocês preferem que a gente feche agora e todo mundo vá procurar emprego”. Todo mundo optou, falou: “Não, Fernando, nós vamos ficar aqui com você. Vamos continuar tentando esses dois meses. E, na medida do que for acontecendo, a gente vai saindo”. E aí as pessoas não ficam com raiva de você, quer dizer, as pessoas entendem. Elas vivem aquilo ali com você. Então isso vai te amadurecendo muito e te dá uma visão de negócio muito diferente. Quando você, alguém te convida para alguma coisa, a pessoa olha tua trajetória [e] fala assim: “Bom, esse cara aqui vai tratar isso aqui como se fosse dele”, porque eu também não sei fazer de outro jeito. Então, eu não sei ser empregado, não sei mais ser empregado. Eu sou, o negócio, eu vou tratar aquilo como se fosse meu. Dependendo se tem um, dois, dez acionistas, vou tratar como se fosse meu. Acho que essa é a característica fundamental. Eu que, assim, e desde muito novo, queria ser presidente. Eu queria ser presidente, sempre quis ser presidente. (risos) Eu costumo dizer que eu não sei fazer nada, só sei ser presidente. Me chama para ser diretor de alguma coisa que: “Hum, não vai dar certo”. (risos)
P/1 – E a sua ida para a Itaú... Ai, como é que é?
R – A Financeira Itaú.
P/1 – A Financeira Itaú. Como se deu?
R – Na verdade, é assim, quer dizer, essas coisas acontecem na vida, tem umas coisas engraçadas. O Itaú, em 2003, ele contratou o Canepa, né, que tinha sido presidente da Credicard para montar uma financeira lá. Aí o Canepa me ligou, falou assim: “Pô, vem aqui conversar comigo”. Na época, eu tinha a minha empresa. Eu estava com a minha empresa. Ele falou: “E aí, como é que você está?”. Eu falei assim: “Ah, cara, eu estou com uma empresa, mas a empresa, pô, [tá] cheia de dificuldades. É um mercado complicado. Bom, tudo bem”. Aí ele falou: “E aí? Olha, estou aqui, tem um projeto para a gente montar uma financeira”. Eu falei: “Poxa, legal! Interessante”. Ele falou: “Quer conversar?”. Eu falei: “Olha, você me chamar para ser diretor de uma área daqui não é muito minha característica, tal. Agora, se o teu negócio é essa folha de papel aí em branco e vamos começar a desenhar nela, pô, me interessa”. Ele falou: “Tudo bem. Então eu vou conversar aqui e depois te ligo”. E aí marcou para eu ir lá, acho que era uma semana ou quinze dias depois. E aquelas coisas que acontecem na vida. Depois que eu saí de lá, me liga um “headhunter”. Ele falou o seguinte, falou assim: “Olha, tive uma oportunidade para conversar com você”. Eu falei: “Pô, cara, eu estou vendo um outro negócio aqui que é interessante”. Ele falou assim: “Olha, é no Rio e é um jornal”. Eu falei: “Putz, no Rio? Que legal, podia voltar para o Rio, meus filhos moram lá”. Perguntei: “Qual é o jornal?”, “Ah, o jornal O Dia”. Eu já tinha trabalhado no jornal O Dia. Eu falei: “Ah, eu conheço esse jornal O Dia”, “Estão procurando um diretor de Marketing”. Eu falei assim: “Cara, eu não quero ser diretor de Marketing. Eu não sei ser diretor de nada”, “Ah, não, porque a presidente do jornal é a dona. Você, que os jornais todos têm dono”. Eu falei: “Tudo bem, cara, a gente fica amigo, não tem problema.” Ele falou: “Mas você não queria conhecê-la?”. Eu falei: “Então está bom”. Fui, viajei para o Rio para conhecer a dona do jornal. Conheci, contei a minha história. Ela falou: “Mas você não quer vir para cá trabalhar? Para ser diretor de Marketing?”. Eu falei: “Olha, eu vou ser honesto, não quero. Não quero. Se tivesse uma posição aqui, sei lá, diretor geral, diretor executivo, qualquer coisa assim, eu acho que posso te ajudar mais. Mas para ser diretor de Marketing, eu não quero; obrigado”. E nem falei que tinha outra proposta, nada disso. Voltei para São Paulo. Passou dois dias, ela me ligou de novo. “Queria conversar com você. Eu estou aqui em São Paulo.” Fui conversar com ela. Ela falou: “Não, tal, eu acho que você tem razão, mas eu queria que você conhecesse as outras acionistas”. Aí fui conhecer as outras acionistas. E isso passando o tempo. Um dia antes de eu ir para o, conversar lá no Itaú de volta, ela me ligou, falou assim: “Você pode vir aqui ao Rio?”. Eu falei: “Posso”. Fui ao Rio. Fiquei no Rio negociando com ela: vai, não vai, vai, não vai. E voltei para cá, fui no Itaú e falei o seguinte: “Olha, (risos) eu vim aqui dizer para vocês uma coisa extremamente chata. Apareceu um outro negócio, que não está fechado, mas é uma possibilidade de voltar para o Rio. E eu estou considerando. Então eu queria deixar vocês livres para poder buscar outra pessoa”. Pô, ficou todo mundo assim, falou: “Pô, mas você não quer vir?”. Eu falei: “Não é isso. É Rio, tal”. Aí eu ia falar com o Roberto Setúbal, um dia. Eu me lembro, fui lá, falei com o Canepa, e o Canepa falou: “E agora? O Roberto está esperando”. Eu falei: “Cara, eu não quero ir lá no Roberto Setúbal dizer para ele que eu não venho aqui trabalhar aqui, né?”. Ele falou: “Não?”. Eu falei: “Não, vai lá conversa com ele, vê o que ele fala”. Aí o Canepa subiu - eu pedi para não ir, não fui. Ele falou: “Não, o Roberto acha que você tem que ir, família, não sei o que, tal, tudo bem”. E aí eu fui para o jornal, fui para o jornal. Seis meses depois, o Itaú resolveu formar uma outra financeira junto com o Pão de Açúcar. E mais uma vez o meu nome apareceu. Aí eu falei: “Bom, agora (risos) não tem jeito. Eu não vou dizer não duas vezes”. E aí vim de volta para São Paulo, vim para o Itaú. O projeto é super legal. E aí mais uma vez montar uma empresa do zero. Montar uma empresa que não existia, com dois sócios, é um... E aí, quando eu falei assim, ele falou: “Olha, a gente pensou no teu nome por causa da Redecard. Você foi o cara que montou a Redecard, [que] tinha mais de um acionista. Você tem essas características, pô, vem para cá”. Eu falei: “É”. (risos)
P/1 – Fernando, voltando uma coisinha para a Redecard; só. A Redecard. ela tinha um gestor único que era o Citibank.
R – Isso.
P/1 – E depois de um tempo, mudou-se um pouco essa estratégia, não sei bem assim, e passou a ser...
R – Uhum.
P/1 – E por que aconteceu isso?
R – Olha, eu acho que, assim, na verdade, esse movimento acontece muito em função do movimento que aconteceu nas outras empresas. Que assim: era a Credicard, depois apareceu a Redecard, depois a Orbital. Então era uma tríade de empresas que o Citibank era o gestor. E [em] um determinado instante do tempo, os sócios em comum resolveram ter uma participação diferenciada nos negócios. Então o Unibanco vendeu a participação dele na Credicard para o Citibank e para o Itaú. E o Citibank e o Unibanco venderam a participação que eles tinham na Orbital para o Itaú. Então ficou um negócio assim: olha, o Itaú passou a ser dono da Orbital, o Citi e o Itaú passaram a ser donos da Credicard, mas vai acabar a empresa. E os três continuam sendo donos da Redecard. Mas aí olharam, falaram assim: “Bom, mas agora não faz mais sentido ter a gestão de um. Vamos todos interferir na gestão, mas vamos ter uma empresa independente”. Por quê? Porque eles passaram, que já eram concorrentes, eles eram concorrentes, mas tinham um interesse em comum, que era a Credicard ali, tal. Agora eles são só concorrentes. Falou assim: “Não faz mais sentido a gente ter uma gestão de um dos sócios”, até porque a empresa é empresa madura. É empresa madura, que tem uma estabilidade, tem um profissionalismo, consegue andar, tem as suas linhas de receitas bem equilibradas. Falou assim: “Não, vamos ter essa empresa e nós três vamos participar como acionistas da empresa”, que é um movimento natural. Então essa é a característica. A Redecard, hoje, tem uma característica já diferente daquela Redecard que a gente montou lá atrás. Hoje é uma empresa diferente.
P/1 – Fernando, e a Orbital? Qual é o negócio da Orbital?
R – A Orbital é uma processadora de cartões. Uma processadora de transações. Então a Redecard, por exemplo, é cliente da Orbital. É ela que processa as transações da Redecard, como processa as minhas também lá da financeira. Eu tenho, um dos meus produtos, ele é processado pela Orbital.
P/1 – E a estratégia de montá-la foi por quê?
R – A Orbital? A estratégia de montar a Orbital era para ter um negócio independente. Assim, a Credicard quando separou a Redecard, ela ficou uma administradora de cartões junto com uma processadora com Central de Atendimento e tal, tudo isso. Determinado instante do tempo, olharam, falaram assim: “Não, espera aí. Tem duas atividades aqui que são distintas. Uma é essa atividade de emissão de cartões que é um negócio extremamente lucrativo, que não precisa ser tão grande, não precisa ter tanta gente. E tem uma outra que é uma processadora. E está aqui tudo embaixo desse mesmo, dessa mesma gestão. Então faz mais sentido a gente ter isso aqui voltado para um negócio de processamento que é custo baixo, volume de transação alto, intensivo e ingente. E um outro aqui que é produto, estratégia, negócio”. E aí eles resolveram separar isso daqui. E ter isso daqui, e prestar serviço para outros também. Quer dizer, a Credicard não presta serviço para ninguém, é um negócio em si. E essa aqui, a Redecard é uma prestadora de serviço, e a Orbital também é uma prestadora de serviço. Então eles resolveram separar, o que fazia mais sentido, né? Para ter uma...
P/1 – Fernando, vamos voltar um pouquinho para o lado pessoal. Você falou do seu pai, da sua mãe. Conta um pouquinho como é que eles estão, e o processo?
R – Hoje estão mais velhinhos. O meu pai tem 70 anos, a minha mãe tem 60. Hoje vivem muito em função dos netos, o que é uma coisa, para mim é muito boa. Quer dizer, e assim, são duas pessoas fantásticas que me passaram a maior coisa que eu tenho na vida, que são os meus valores, né? Eles passaram os valores para mim, que isso é a coisa mais importante que tem. Não é dinheiro, não é bem, não é nada disso: é passar os valores. Quer dizer, sempre investiram muito em mim. São corujas como todos os pais, têm um orgulho enorme de mim. Toda vez que eu apareço em algum lugar, minha mãe fala, fica feliz e tal, conta para as amigas. Então é uma característica assim. E é, são pessoas simples, entendeu? São pessoas simples que vivem hoje bastante para a família. Gostam dos netos, os netos são apaixonados por eles. Que eu acho que isso é uma grande conquista também. Quer dizer, a família estar próxima, né? Eles não têm um distanciamento. Você vê tanta família que, pô, o neto não fala com o avô e tal. Aqui não, ali, assim, eu sou separado da minha, da minha primeira mulher e ela voltou para o Rio de Janeiro quando a gente se separou. E aí, assim, é uma coisa super interessante: ela foi morar próximo dos meus pais. E ela foi morar próximo deles porque são eles que estão ali com ela, que ajudam, que gostam das crianças - que estão sempre perto. Então a relação é super saudável, entendeu? E são pessoas que tiveram grandes conquistas na vida. Meu pai, quer dizer, nunca trabalhou para ninguém. Uma característica completamente diferente. É um cara que veio do Piauí, né, sem nada. Veio para cá, foi batalhando. E sempre foi empreendedor. Sempre teve o negócio dele, batalhou para conquistar, para crescer, para conseguir construir as coisas dele. Aí passou isso para mim. Passou os valores, né? Falou assim: “Olha, tem que ser honesto, íntegro, dar valor às pessoas”. Quer dizer, isso é o fundamental. O resto, tudo você consegue.
P/1 – Fernando, eu queria que você falasse qual a pessoa que foi mais importante para você como referência na sua vida. Eu queria que você falasse tanto pessoal como profissional.
R – Como pessoal, sem dúvida nenhuma, é o meu pai, né? Quer dizer, que me passou os valores. Como referência profissional é o Livo. Assim, aí é a pessoa, uma pessoa super importante para mim na minha vida. Como profissional e como pessoal também. Uma pessoa que eu amo assim de paixão. Quer dizer...
P/1 – E por quê? O que é que ele representava para você?
R – Ó, o Livo representava assim, em primeiro, tudo que eu queria ser, né? Quer dizer, que era um presidente de empresa, um cara bem sucedido, um cara de bem com a vida. Um profissional completo, entendeu? E, ao mesmo tempo, gente. Era uma pessoa que era gente, era próxima. Uma pessoa que, pô, se dá para as outras, gosta das pessoas, entendeu? E é uma pessoa que gostava de mim também, dava para ver claramente que ele gostava de mim. Quer dizer, fazia por mim muito mais do que eu fazia por ele - como eu falei para você. É um negócio assim, todo mundo brinca aqui que o Livo é o meu pai, né? “Ah, o seu pai”, e é mesmo. Quer dizer, ele é como se fosse o meu pai mesmo. Eu gosto dele como eu gosto do meu pai.
P/2 – Ele é carioca também?
R – Ele é carioca também.
P/1 – (risos) Ó o bairrismo.
R – (risos) Ele é carioca também.
P/1 – Fernando, qual é o seu maior sonho?
R – Meu maior sonho hoje? Hoje é ter uma vida feliz. Quer dizer, eu acho que já consegui muita coisa, quer dizer, já consegui muito. Do lado profissional, já consegui muita coisa. E aí os seus valores também isso é uma coisa boa, né? Porque você vai crescendo, os seus valores vão mudando. Então, e depois que eu me separei, quer dizer, eu mudei muito a minha percepção de vida. Mas muito. Então o meu maior sonho é que meus filhos sejam felizes, que eu consiga ter uma vida feliz. Quer dizer, que eu tenha saúde. Os meus valores mudaram. Quer dizer, eu não tenho ambições de dinheiro, material, esse negócio, não é o meu direcionador: meu direcionador é ser feliz. Eu quero ser feliz. Quero ao máximo que eu puder conseguir, ser feliz, conseguir as pessoas que me circundam sejam felizes, tenham amigos. Ter uma velhice com amigos, isso é um negócio que é importante. Tem muita gente que envelhece mal, sem saúde ou sozinho. E eu não queria isso para mim não. Eu queria ter um, envelhecer, mas cercado de pessoas, cercado de amigos. Ser uma pessoa feliz. Isso é a minha maior ambição hoje.
P/1 – Você falou, Fernando, [que] quando você se separou foi um marco nessa coisa de você...
R – Foi a...
P/1 – ...de rever. Por quê?
R – Ah, quando eu me separei, foi o momento que eu mais sofri na minha vida. E assim, quando você se separa, você tem uma separação que é se separar do, da sua companheira, né, aquele negócio ali. Mas quando você tem filho, você vive uma coisa que é, que você não sabia. Que fala assim: “Eu também estou me separando dos meus filhos”. Então a distância física dos filhos foi para mim um impacto muito grande. Só que, depois, eu percebi o seguinte, quer dizer, eu hoje estou muito mais próximo dos meus filhos do que eu estava quando era casado. Porque o fato de estar, de viver na mesma casa fazia com que eu me dedicasse menos a ele, porque sabia que estava na mesma casa. Então tudo bem. Às vezes eu chegava muito tarde do trabalho, saía muito cedo, não os via. Não conversava, mas: “Ah, tudo bem, está na mesma casa. Fim de semana vai estar junto”, tal. Mas não vivia a vida deles. E depois que eu me separei, percebi o seguinte: eu não quero me separar dos meus filhos. Eu não quero que meus filhos me tenham como uma referência distante. Eu morava em São Paulo e eles moravam no Rio. Eu ia todo fim de semana para vê-los no Rio. E aí eu falava com eles todo dia pelo telefone. Faço isso até hoje. Quer dizer, eu falo com eles todo dia. Eu conheço todos os amiguinhos. Eu sei o que é que vão fazer, sei as necessidades. E aí eu fui para o Rio, montei um apartamento. E aí tem o quarto deles. Quer dizer, eles fazem parte da minha vida hoje, muito mais do que antes, e eu sinto que eu faço parte da vida deles. Então isso é um marco na sua vida que você vê que, de repente, as coisas que importam para você, estão muito mais próximas e talvez muito mais à mão do que você imagina. E o tempo passa. Quer dizer, os seus filhos vão crescer. E se você não viver a vida com eles, ela vai passar. Não adianta você querer ser amigo do seu filho quando ele tiver 20 anos; você tem que ser amigo dele quando ele é criança, porque aí ele vai ser seu amigo quando tiver 20 anos. Aí ele vai ter verdade de conversar com você, e não ao contrário. Mas isso, quer dizer, não sei se por bem ou por mal, eu só aprendi isso depois de uma separação.
P/1 – E foi quando isso, Fernando?
R – Foi em 99.
P/1 – E hoje você está casado novamente?
R – Hoje eu estou casado novamente.
P/1 – E como é que foi conhecer a nova mulher? (risos)
R – Aí é uma coisa assim, a minha mulher também já veio de um outro casamento. Eu costumo dizer para ela que a gente tem um casamento maduro, né? Quer dizer, porque você aprende também até onde você pode ir no relacionamento, né? Você aprende a ceder, aprende a hora de não esticar a corda muito senão ela vai arrebentar. Então é uma relação muito mais adulta. Eu tinha um amor adolescente com a minha primeira mulher, que é aquele negócio que vem criando e as pessoas crescem diferente, né? As pessoas crescem de forma diferente. E aí hoje não, quer dizer, como as pessoas são crescidas e aí você vê se os interesses são comuns ou não são comuns. Não que todo mundo tenha que gostar das mesmas coisas, fazer as mesmas coisas, mas acaba sendo assim, entendeu? Acaba sendo assim. Agora, é um relacionamento muito mais maduro. Quer dizer, um relacionamento adulto, maduro. Eu diria talvez muito mais difícil para ela do que para mim, porque eu cheguei com três filhos, né, entendeu? Que convivem com ela. E ela gosta muito deles, tal, mas é uma conquista, né? Ela não tinha filhos. Então agora, de repente, tem três filhos que vão ficando adolescentes. Então é todo um viver a vida dos filhos, ou a parcela de educar os filhos também. Ela faz um pedaço disso também junto comigo. É um relacionamento completamente diferente.
P/1 – Para ir finalizando, Fernando, eu queria que você falasse um pouquinho do que é que você acha da Redecard estar comemorando os seus dez anos de existência recolhendo depoimentos de seus funcionários e ex-funcionários?
R – Ah, eu acho fantástico isso. Quando o Irélio me ligou, eu falei: “Olha, cara, eu fico lisonjeado de ser lembrado. Eu fico orgulhoso, fico feliz de poder contribuir”. A Redecard, para mim, está no coração. A Redecard é um negócio assim, me sinto como se fosse um pai da Redecard. Quer dizer, participei da criação, falo isso para todo mundo. Isso para mim é a minha maior realização profissional. Assim: “Não, eu participei da criação da Redecard, estava lá no comecinho, no lançamento. Estava lá no dia zero. Estava no dia menos um. Criei, passei, vi crescer”. Então isso para mim é um motivo de orgulho assim. E se tiver alguma coisa que você perguntar assim, eu ia falar assim: “Ah, conta aí uma coisa da sua carreira?” Eu falo: “Olha, eu participei da criação da Redecard.” (risos) É isso, se eu tivesse que escolher uma, seria essa.
P/1 – Fernando, eu queria que você falasse um pouquinho do que é que você achou de ter participado dessa entrevista?
R – Olha, eu achei muito gostoso. Achei ótimo, quer dizer, poder, essa é uma história que eu já contei várias vezes, para várias pessoas. Mas, agora, sabendo que ela vai ficar, eu queria que depois você me desse a fita, né? (risos)
P/1 – Você vai receber uma. (risos)
R – Vai ficar marcada, vai ficar gravada. Acho um negócio fantástico. Quer dizer, se todo mundo pudesse fazer isso, né, pegar o depoimento das pessoas, o que viveram, o que aconteceu, como é que foi. Provavelmente vocês vão ter uma coisa tão ampla que você vai ver a visão de um e de outro, e dos momentos, o que cada um citou. Esse é um negócio, eu achei fantástico. Achei uma ideia fabulosa, assim.
P/1 – Eu queria agradecer a sua participação.
R – Eu que agradeço.
P/1 – (risos)
P/2 – Obrigada, Fernando.
[Fim do depoimento]
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