Célia Nunes Figueiredo nasceu em Cuiabá em 20 de março de 1913. Formou se como professora primária na Escola Normal “Pedro Celestino” que funcionava no piso superior do Palácio da Instrução, no piso térreo, estava vinculado o grupo escolar Modelo “Barão de Melgaço”. Começou a lecionar com dezessete anos de idade em 1930. O prédio em que funcionava estas instituições escolares foi construído em frente à praça da República no centro de Cuiabá.
Quando estudou, o curso primário era realizado em quatro anos, depois havia um curso complementar preparatório de dois anos para ingressar na escola Normal. Dentre as disciplinas que compunham o currículo da referida escola, faziam parte, psicologia e metodologia. Sobre o modo como aconteciam as orientações didáticas aplicadas na escola, lembrou-se com vivacidade de que o professor ministrava a parte teórica em classe e na parte prática, o professor pedia para subir alguns estudantes do 1 ano do grupo escolar. O professor das normalistas dava a aula para as crianças e elas observavam com atenção todos os detalhes da desenvoltura até a técnica mostrada.
A alegria da então normalista Célia era visível quando faltava uma professora no grupo escolar pois o diretor solicitava a alguém do último ano para descer e dar a aula. Não era obrigatório, mas as alunas que se interessavam, ficavam à tarde toda com os estudantes. Sempre que precisavam de substituição a estudante Célia se prontificava todas às vezes. Sorria quando se lembrava desses momentos, pois as colegas de turma já sabiam que ela gostava muito de dar aulas e quando alguém vinha perguntar quem queria descer para ficar com estudantes, ela tomava a frente e suas companheiras de turma riam e a chamavam de “saliente”. Ela fazia o possível com seus quinze e dezesseis anos para ensinar, pois sabia da responsabilidade que teria quando terminasse o curso e recebesse a primeira turma como regente principal.
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Célia Nunes Figueiredo nasceu em Cuiabá em 20 de março de 1913. Formou se como professora primária na Escola Normal “Pedro Celestino” que funcionava no piso superior do Palácio da Instrução, no piso térreo, estava vinculado o grupo escolar Modelo “Barão de Melgaço”. Começou a lecionar com dezessete anos de idade em 1930. O prédio em que funcionava estas instituições escolares foi construído em frente à praça da República no centro de Cuiabá.
Quando estudou, o curso primário era realizado em quatro anos, depois havia um curso complementar preparatório de dois anos para ingressar na escola Normal. Dentre as disciplinas que compunham o currículo da referida escola, faziam parte, psicologia e metodologia. Sobre o modo como aconteciam as orientações didáticas aplicadas na escola, lembrou-se com vivacidade de que o professor ministrava a parte teórica em classe e na parte prática, o professor pedia para subir alguns estudantes do 1 ano do grupo escolar. O professor das normalistas dava a aula para as crianças e elas observavam com atenção todos os detalhes da desenvoltura até a técnica mostrada.
A alegria da então normalista Célia era visível quando faltava uma professora no grupo escolar pois o diretor solicitava a alguém do último ano para descer e dar a aula. Não era obrigatório, mas as alunas que se interessavam, ficavam à tarde toda com os estudantes. Sempre que precisavam de substituição a estudante Célia se prontificava todas às vezes. Sorria quando se lembrava desses momentos, pois as colegas de turma já sabiam que ela gostava muito de dar aulas e quando alguém vinha perguntar quem queria descer para ficar com estudantes, ela tomava a frente e suas companheiras de turma riam e a chamavam de “saliente”. Ela fazia o possível com seus quinze e dezesseis anos para ensinar, pois sabia da responsabilidade que teria quando terminasse o curso e recebesse a primeira turma como regente principal.
Com relação a forma de alfabetização das crianças explicou que aplicava o método sintético, instituído pelo educador Leovegildo de Melo quando houve a instalação da escola Normal em 1913, em substituição ao então jeito de ensinar tradicional, que consistia em soletração, palmatória e “aquela coisa toda”, com esta expressão mostrava que desaprovava o método aplicado até então, e ,aprovava a nova forma de ensinar, que na prática funcionava da seguinte forma: iniciava pela frase; para a palavra depois vinha a sílaba. Estudava uma frase, depois ia destacando as palavras principais e as palavras eram partidas em sílabas até chegar as letras. Explanou com detalhes a primeira lição que era a frase –” A menina olha o livro”. As crianças estudavam e decoravam. A frase era escrita no quadro e destacava-se as principais palavras com giz de cor. A palavra “menina” era escrita de vermelho e a palavra “livro” era escrita de azul. Todas às vezes que aparecia as palavras, livro e menina, os estudantes identificavam, A professora Célia alfabetizou muitas crianças dessa forma, ela lembrou que neste período não havia pré-escolar, as crianças entravam direto no 1º ano completamente sem alfabetização e a maioria precisava de auxílio para conseguir manusear o lápis. Considerou que o método de ensino sintético ensinado no curso normal e posto em prática pelas normalistas foi muito eficaz, pois os estudantes saíam lendo e escrevendo corretamente, em um ano, com boa letra, pois era norma exigir que os estudantes treinassem para ter letra “bonita”. Observou que essa exigência não prevaleceu nas escolas, pois segundo ela: - tem cada beleza de caligrafia! Ironizando as letras mal feitas nas lições que corrigia dos cadernos dos seus netos.
O depoimento da professora Célia foi realizado na década de 1980 e ao fazer uma comparação entre as formas de ensinar a ler e escrever, lamentava o jeito da alfabetização que vigorava no período, avaliando que tinham voltado ao método primitivo no qual começava pela letra e depois as juntava para formar sílabas. Em vários momentos da conversa ela foi acometida por uma forte tosse, fato que era desencadeado sempre que falava por muito tempo. Lembrou que as crises começaram no período em que dava aula ponderando que deveria ser doença de professora.
Tão logo se formou no curso normal iniciou seu trabalho profissional na cidade de Santo Antônio do Leverger. Foi para lá porque não havia vaga em Cuiabá, no entanto, lecionou por apenas seis meses na localidade, conseguindo remoção para a capital. Da turma de alunos que recebeu para alfabetizar, dos vinte e cinco, desistiram apenas um ou dois. Trabalhou durante muitos anos no ensino primário, mas foi requisitada para atuar no ensino secundário, no colégio estadual, aposentou-se ministrando aulas de língua portuguesa.
Na percepção da professora Célia o objetivo da educação escolar era aprender a ler e escrever, era formar-se no curso primário que chegava até o 4º ano. Depois de concluído este estudo, muitos jovens iam em busca de trabalho. Para mostrar que o ensino era forte ela traça um paralelo da competência alcançada pelos estudantes do 4º ano do tempo que lecionava com os estudantes que concluíam o último ano do fundamental do período do depoimento, a 8ª série. Defende que os estudantes do 4º ano finalizavam mais preparados pois saiam da escola primária lendo bem, escrevendo bem, fazendo contas e possivelmente ensinariam qualquer estudante da 8ª série.
Os livros didáticos e cartilhas utilizados pela professora Célia eram adquiridos por conta própria. O governo não fornecia, como notava que vinha acontecendo e os livros não eram trocados. O mesmo de quando começou lecionar no curso primário permanecia muito tempo depois a serem utilizados. Considerou um disparate essas mudanças porque o livro usado por uma criança não poderia ser usado pelo irmão mais novo no ano seguinte. Considerou muito inadequado a permissão de se escrever no livro, visto que, o espaço para escrever as respostas era apenas uma linha e para dar uma resposta apropriada, o espaço reservado teria que ser maior, então o estudante começava a rabiscar e o livro ficava muito sujo e desorganizado.
Considera que em “seu tempo” como estudante e professora primária era diferente, descreveu como era o procedimento nas salas de aula: a professora passava o ponto e as perguntas no quadro, o aluno copiava no caderno, este era corrigido. O estudante levava o caderno para casa, passava a limpo em outro caderno e trazia para o professor conferir. Escreviam bastante e aprendiam assim. Proferiu a frase com ênfase: Não se faz ditado quase! Analisa novamente referindo-se “no meu tempo”, no qual a prática de se ter o ditado todo dia, a leitura todo dia, sendo que o estudante lia alto da sua carteira para a professora ouvir de onde estivesse. Então, essas práticas de ensino de leitura e escrita foram consideradas eficazes pela educadora porque “aparecia” a aprendizagem dos estudantes e, por esses métodos terem caído em desuso muitos estudantes dos quais tinham proximidade mal conseguiam executar leitura e escrita de uma frase.
Ela recordou-se que havia vários tipos de escolas: isolada, reunida e grupos escolares. Pela cidade de Cuiabá havia várias escolas isoladas e lembrou de uma que funcionava na rua Barão de Melgaço. Funcionava em uma casa grande, em geral, alugada pelo governo, que morava a família da professora e a sala da frente era transformada em escola. A professora tomava conta de tudo, não tinha porteiro. Refletindo, professora Célia se indaga sobre esses tipos de escola, para ela, era talvez uma maneira de ter uma escola de forma mais econômica.
As escolas instituíram a “caixa escolar” para atender algumas necessidades imediatas dos estudantes, pois sempre aparecia um com dor de dente, dor de cabeça, de barriga e até precisando de roupas. Professora Célia sempre tentava resolver as necessidades dos estudantes da sua turma mesmo com poucos recursos que disponibilizava. Não havia merenda escolar e no início do ano observava quais estudantes não trazia lanche. Como conhecia e tinha amizade com as mães pedia para as que tinha mais posse para que mandassem dois lanches. Então os alunos chegavam e colocavam os lanches em cima da mesa da professora, na hora do lanche ela repartia e todos se alimentavam. Tinha conta em uma loja para dar calça, blusa, paletó ... e na papelaria União tinha conta para conseguir dar caderno, lápis e tudo o mais. A professora conta que não havia uma assistência contínua do governo. De vez em quando o diretor da instrução pública mandava materiais escolares que eram direcionados aos mais necessitados. Já livros para leitura lembrou que pelo menos uma vez o governo distribuiu no grupo escolar modelo a obra de Olavo Bilac “Contos Pátrios”.
Quando frequentou a escola como estudante, a biblioteca era muito disputada e colocada como lugar de desejo pelos estudantes. Pois aqueles que terminassem as lições um pouco antes do horário da saída, que era às 17h, poderia ir para lá, ficava sempre ansiosa por terminar e poder ficar lendo livros de historinhas. Já quando atuou como professora a biblioteca estava desfalcada, mas, para os estudantes terem acesso à leituras, arranjava livros e guardava em um armário em sua sala de aula. E fazia o mesmo com seus estudantes, assim que terminassem as tarefas, ganhavam um livro e ficavam lendo em sala mesmo.
Assim sendo, lembrou que muitas professoras se esforçavam além da sala de aula para que o aprendizado fosse alcançado por todos os estudantes e recebiam seus alunos com dificuldades em suas casas no contraturno da escola para explicar novamente e fazer as tarefas. Faziam isso gratuitamente não cobravam nada. Os dirigentes da instrução pública instituíram um prêmio para as professoras que apresentassem uma certa quantidade de aprovações, no entanto acabaram com essa forma de gratificação porque, segundo professora Célia apenas algumas professoras eram beneficiadas. Geralmente as professoras que tinham fama de serem boas profissionais eram disputadas pelas famílias de mais posses, cujos filhos eram mais bem alimentados e tinham mais assistência em casa, a “mãe” tinha tempo para orientar e os pais tinha profissões. Concluiu que eram fatores que ajudava em um bom desempenho na escola. Isto beneficiava esses professores. A turma da professora Célia todos iam muito bem mas ela se esforçava para isso. E mesmo sendo uma das professoras que recebia as gratificações, reconhecia que o trabalho realizado por uma professora com estudantes que tinham apoio e melhores condições de vida era mais fácil do desenvolvido com aluninhos carentes e com “mães” analfabetas. A gratificação foi retirada ao perceberem que essa prática era injusta com muitas professoras. A mãe da professora Célia via o esforço dedicado ao trabalho e incentivava a fazer outros concursos para que tivesse um salário melhor porque o de professora era muito pouco. Então prestou concurso para atuar na escola de Aprendizes artífices, foi aprovada mas não foi nomeada. Era um período complicado por haver interferência política nas nomeações, e todos já sabiam quem ia ser nomeado. Mas ela não foi atrás para ser nomeada porque gostava de trabalhar no grupo escolar modelo “Barão de Melgaço”.
Professora Célia faz questão de afirmar que sempre gostou muito de lecionar e nas férias ficava com saudade. Passava o tempo arrumando os livros, os materiais e todo dia ia dar uma passadinha na escola para ajudar a passar notas na secretaria. Lembrou-se do marido, professor Cesário Neto, que também ficava ansioso pelo fim do período de férias para voltar aos trabalhos nas escolas.
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