Projeto Memória nos bairros
Depoimento de Yuichi Ide
Entrevistado por Stella Franco e Marina D’Andrea
São Paulo 27 de setembro de 2000
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Ronaldo Ventura Souza
P/1 - Projeto Memória nos bairros, depoimento de Yuichi Ide, entrevistado por Stella e Marina. Local: residência em Itaquera; São Paulo, 27 de setembro de 2000. Entrevista número 015, Realização Museu da Pessoa.
P/2 - Então, seu Yuichi, para começar a entrevista, a gente gostaria que o senhor falasse seu nome completo, de novo, local de nascimento e a data de nascimento.
R - Meu nome é Yuichi, eu nasci na cidade de Mirandópolis, no noroeste de São Paulo, no dia 26 de setembro de 1939.
P/2 - E qual o nome dos seus pais?
R - Isamu Ide e Terue Ide.
P/2 - Qual que era a atividade deles?
R - Sempre trabalhava de plantador na cidade no interior, que era Mirandópolis, né, então ele trabalhava com plantação de café, algodão, depois plantou... eu creio que ele plantou acho que café e algodão, não sei muita coisa disso não. Eu não sei muita coisa disso não, mas creio que mais é café e algodão, que foi isso que plantou, né?
P/2- Seu Yuichi, o senhor sabe a origem da sua família, por que foi que vieram para o Brasil, seus avós... o senhor conhece essa história?
R - Eu ouvi pouco sobre a história de japonês, eu sei que a situação no Japão não estava muito boa, a situação estava... economicamente estava muito péssimo, então resolveram... porque eles vieram de uma família, eram onze famílias de Ide.
P/2 - Ah, é?
R - Eram tudo parentes, né? Lá no Japão, eu creio que tem vários parentes espalhados aqui em São Paulo, que são Ide também, mas não é primo de primeiro grau, assim não é, parentes, nos tempos idos, talvez tenham sido irmãos ou tios, mas é um parente já bem disperso, entende? Um pouco mais...
P/2 - Mas o senhor nem conhece?
R - Conheço.
P/2 - Conhece.
R - Conheço, mas tenho pouco contato com esse...
Continuar leituraProjeto Memória nos bairros
Depoimento de Yuichi Ide
Entrevistado por Stella Franco e Marina D’Andrea
São Paulo 27 de setembro de 2000
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Ronaldo Ventura Souza
P/1 - Projeto Memória nos bairros, depoimento de Yuichi Ide, entrevistado por Stella e Marina. Local: residência em Itaquera; São Paulo, 27 de setembro de 2000. Entrevista número 015, Realização Museu da Pessoa.
P/2 - Então, seu Yuichi, para começar a entrevista, a gente gostaria que o senhor falasse seu nome completo, de novo, local de nascimento e a data de nascimento.
R - Meu nome é Yuichi, eu nasci na cidade de Mirandópolis, no noroeste de São Paulo, no dia 26 de setembro de 1939.
P/2 - E qual o nome dos seus pais?
R - Isamu Ide e Terue Ide.
P/2 - Qual que era a atividade deles?
R - Sempre trabalhava de plantador na cidade no interior, que era Mirandópolis, né, então ele trabalhava com plantação de café, algodão, depois plantou... eu creio que ele plantou acho que café e algodão, não sei muita coisa disso não. Eu não sei muita coisa disso não, mas creio que mais é café e algodão, que foi isso que plantou, né?
P/2- Seu Yuichi, o senhor sabe a origem da sua família, por que foi que vieram para o Brasil, seus avós... o senhor conhece essa história?
R - Eu ouvi pouco sobre a história de japonês, eu sei que a situação no Japão não estava muito boa, a situação estava... economicamente estava muito péssimo, então resolveram... porque eles vieram de uma família, eram onze famílias de Ide.
P/2 - Ah, é?
R - Eram tudo parentes, né? Lá no Japão, eu creio que tem vários parentes espalhados aqui em São Paulo, que são Ide também, mas não é primo de primeiro grau, assim não é, parentes, nos tempos idos, talvez tenham sido irmãos ou tios, mas é um parente já bem disperso, entende? Um pouco mais...
P/2 - Mas o senhor nem conhece?
R - Conheço.
P/2 - Conhece.
R - Conheço, mas tenho pouco contato com esse pessoal. Tem pessoal em Mogi, também na cidade, tem outros lugares também, mas não tem muito contato mais.
P/2 - Em que ano seu avós chegaram?
R - 1929.
P/2 - E eram avós paternos?
R - Paternos.
P/2 - O senhor pode dizer o nome deles para a gente?
R - Meu avô chamava Zenkiti Ide e minha avó chamava Tei Ide.
P/2 - E o pai do senhor nasceu...?
R - No Japão. É, então, ele, quando chegou, tinha... disse que tinha dezenove anos.
P/1 - Eles vieram com a imigração?
R - Vieram com a imigração. Então, vieram com o navio lá, eu não sei o nome do navio agora, vieram com aquele navio...
P/1 - Vieram no Kasato Maru?
R - Sempre tem um Maru no fim.
P/2 - Kasato Maru?
R - Não, Kasato Maru foi o primeiro...
P/2 - Primeiro navio.
R - ...navio de imigrantes japoneses no Brasil, né? Mas não era esse não.
P/2 - Todo o navio de imigrante tem o Maru no final?
R - Todo o navio, todo o navio do Japão tem o Maru no fim.
P/2 - O que é Maru?
R - Agora, aí eu não sei, viu, aí eu não posso dizer o que é.
P/2 - E o pai do senhor contava histórias do Japão?
R - Olha até, se ele contava, acho que isso tudo que ele contava também... não contava muito não, porque não tem, não tinha o que contar, né? Antigamente, o Japão antigo não era desenvolvido como agora, então não tinha, porque ele morava no interior do Japão, então no meio do mato que nem eu, né, então não tinha muita história para contar também.
P/1 - Ele não era o mais velho, né?
R - Era o mais velho. Na minha casa eram três irmãos, três homens, ele era o mais velho.
P/1 - Mas no Japão não, a terra era dos seus avós, ou eles não tinham terras.
R - Não, é, meu avô disse que tinha terra, claramente, que até tinha uma plantação de madeira lá, não sei que tipo que tinha de plantação, então meu pai contava essa história, que no Japão meu avô tinha uma área plantada de madeira, né, então se tiver alguma dificuldade financeira é só voltar para o Japão que tem lá, mais madeira. Teve aqui, reforma agrária que dizem, então meu pai... uma que não tinha condições de voltar para Japão, e também ficou muito tempo aqui, aí depois foi ver, em 1973 meu pai voltou para o Japão pela primeira vez, desde que chegou do Japão, aí quando voltou disse que não tinha mais nada, disse que a reforma agrária do governo tomou, disse que distribuiu para todos e ficou sem nada, disse que não tinha nada do patrimônio que meu avô tinha deixado. Ele estava, disse que não tem como recuperar, né, aí ficou desiludido, mas não tinha como recuperar isso.
P/2 - E o senhor morou em Mirandópolis até quando?
R - Eu morei até 1947, março de 1947 vim para cá.
P/2 - E o senhor se lembra de lá, da sua casa, de onde o senhor morava?
R - É, eu lembro, mas eu já tenho a informação de que a casa onde eu morava já foi derrubada já, não tem mais a casa onde eu morava.
P/2 - Como é que era a sua casa?
R - Aquela... lá no interior, como era muito quente, eles fizeram um assoalho, que colocava aquelas madeira de tora embaixo e colocava, fazia a casa por cima, essas toras deixavam arejando em baixo, né, disse que era para deixar refrescando. Então a casa, eu sei que a casa era grande, ela foi feita toda de madeira, então eu tenho uma lembrança dessa casa.
P/2 - E era de vocês mesmos?
R - Isso, era. Quando disse que... ao sair do Japão para o Brasil, já comprou terra lá no Japão, aqui no Brasil.
P/2 - Ah, é?
R - É, seja...
P/1 - Lá no Japão comprou terra aqui?
R - Lá.
P/1 - Não era o governo que dava?
R - Não era que o governo dava. Que vinha comprando, disse que já de lá, comprou lá e veio. Então não sabia que aquilo lá, vale inteiro lá em Mirandópolis, né, disse que levou do lado que, ficou aqui no... imigração...
P/2 - Do Brás.
R - Do Brás. Ficou um dia lá, disse que depois pegou trem, levou três dias para chegar até lá.
P/2 - Nossa!
R - Então vê como é, foi como eu disse, a viagem foi muito precária, né?
P/1 - Só uma coisinha para esclarecer, ele comprou as terras lá no Japão.
R - Sim.
P/1 - O senhor não ouviu dizer que o governo japonês comprava terras para os seus agricultores virem para cá, já com terras compradas?
R - Isso aí eu ouvi dizer. Essa história eu não ouvi não, mas eu ouvi dizer que ele comprou terras lá no Japão mesmo, para vir aqui para o Brasil.
P/1 - Ah, tá.
P/2 - Tá certo. E porque seu pai e sua mãe, sua família, enfim, resolveram mudar para São Paulo?
R - Para cá, de Mirandópolis para cá?
P/2 - Isso.
R - É que meu pai pegou uma doença, eu não sei, não sei se a senhora já ouviu falar no que tem... Lá em Mirandópolis como o clima era quente...
P/2 - Já.
R - ...então, tem aquela doença lá que, disse que formava uma ferida no nariz, disse que... disse que subia no cérebro essa doença, essa ferida, né?
P/2 - Essa eu nunca ouvi falar.
R - Não tinha como cuidar desse enfermo. Meu pai foi até lá em Araçatuba, para se cuidar, e disse que se tivesse penicilina naquela ocasião... disse que é fácil a cura, mas como não tinha penicilina, então aplicava sei lá que remédio que é, e disse que era remédio muito forte. E isso acabou com a vida, com a saúde dele, aí o médico proibiu, que não devia ficar num clima quente assim que não ia... que o físico dele não ia aguentar, e ele mandou procurar um clima mais fresco, ameno, né, aí viemos viver aqui em Itaquera.
P/2 - E porque ele escolheu aqui?
R - Nesse... nesse lugar onde eu moro atualmente, tinha um casal de... um casal aqui, esse casal, o marido morreu de ataque do coração, conforme eu ouço a história, ouvia a história naquele tempo, ele morreu e essa senhora ficou viúva aqui. Aí foi de conhecimento do meu pai, então meu pai fez a oferta aqui com o terreno, comprou o terreno, e essa senhora tem um parente lá na Primeira Aliança, lá em Mirandópolis, e ela foi para lá, então fez uma troca aqui com ela.
P/1 - E ela também era japonesa?
R - Era japonesa, chamava Tamako Fujioka, chamava.
P/2 - Seu Yuichi, e quando vocês mudaram para cá, vocês eram em quantas pessoas da família?
R - Nós viemos aqui... A minha irmã caçula agora nasceu aqui em Itaquera, então nós viemos quatro irmãs, meus pais e vieram mais meus tios, um casal, meu tio e minha tia, eles vieram juntos nessa viagem aqui, viemos em seis, oito pessoas, viemos aqui.
P/2 - O senhor era o mais velho?
R - Eu sou... tenho uma irmã mais velha.
P/2 - Mais velha que o senhor?
R - É, tenho.
P/2 - Qual é o nome dos seus irmãos?
R - Minha irmã mais velha chama Satoi, né, agora ele... chama Satoi, Satoi Kurame, ela tem dois filhos; e meu irmão, logo abaixo de mim, chama Mutsuini, é casado e tem uma filha; e tem outro, minha irmã, chama Isaili, ela não tem filhos; e tem o mais caçula, que chama Paulo Yoshimidia, é casado com uma brasileira, tendo ainda um casal de filhos aí, mora lá na cidade.
P/2 - E o senhor se lembra da mudança de Mirandópolis para cá? Como é que foi feita essa mudança?
R - Eu lembro que foi feito... viemos de trem, mandamos aviar uma mudança apenas de caminhão e viemos de trem. Na época na verdade ainda se andava de trem. (risos)
P/2 - Já tinha andado alguma vez?
R - Não, não tinha andado, nunca tinha saído lá da cidade, lá da onde eu morava, nunca tinha saído de lá, então era de trem, né?
P/2 - Como é que era o trem?
R - Era coisa maria-fumaça, né?
P/2 - Maria-fumaça?
R - É. Daqueles que viemos de São Paulo. São Paulo era tudo uma cidade... naquela ocasião era em 1947, a cidade ainda tinha os bondinhos ainda, na cidade antiga.
P/2 - O que mais marcou quando o senhor chegou em São Paulo, na cidade?
R - Eu acho que eu não tenho lembrança disso, viu, se marcou alguma coisa. Não, essas coisas não tenho lembrança não.
P/2 - Mas o bonde o senhor nunca tinha visto, já imaginava...
R - Não, não tinha visto não, bonde não. Tudo era novidade, porque bonde, carro assim, era novidade, tinha em casa também, mas eram poucos carros que tinha, no tempo que vim para cá, né, então era novidade, tudo era novidade para a gente.
P/1 - O senhor veio direto para cá, não parou na cidade?
R - Não, viemos direto para cá, viemos direto para cá.
P/2 - E aí, quando chegou aqui o que tinha na colônia?
R - Na colônia tinha mais granja... e tinha pouca plantação de pêssego, pouca mesmo, e goiaba quase não tinha não, mais era pêssego, estava no início da plantação de pêssego, né?
P/2 - Isso em 1947?
R - 1947.
P/2 - Sei. E a casa onde vocês vieram morar já estava construída?
R - Não, nós viemos aqui, viemos morar aqui embaixo, então não era aqui não. Viemos da outra estrada lá, do outro lado da rua, viemos, passamos lá no meio do mato, viemos aqui, parar aqui, e aqui era mato ainda, era uma trilha, não era uma estrada que nem a... igual a que... larga assim, asfaltada, não, mas era meio uma trilha que carroça andava, né?
P/2 - Ah, vinha de carroça?
R - Não, eu vim da cidade, vim descendo de trem, trem da Estação da Luz, né, e viemos de táxi até aqui.
P/2 - Ah, pegaram um táxi.
R - Pegamos um táxi. E antigamente o táxi era tão leve, sei lá, naquela ladeira lá, não subia, não conseguiu subir na ladeira lá.
P/2 - E aí?
R - Aí descemos do táxi que... até o motor morreu, se eu me lembro, que o motor morreu e não conseguiu chegar à ladeira do outro lado, mais íngreme, né, não conseguiu subir. Aí nós descemos lá e viemos pelo mato, porque disse que para fazer a casa... acho que fica do outro lado, lá, no meio do mato tinha uma trilha lá e minha mamãe...
P/2 - A família inteira lá?
R - A família inteira.
P/2 - E era de noite ou de dia?
R - De dia, era de dia, era dia.
P/2 - Mas não tinha uma matula para carregar? Eu ouço essas coisas.
R - Não, tinha pouca coisa, né, tinha pouca coisa só, porque não tinha aquela intenção de dormir no hotel, né, então viemos assim, viemos com poucas coisas também, então não era problema carregar as coisa.
P/2 - E aí vocês chegaram lá, fizeram a trilha e foram parar aonde?
R - Tinha trilha já.
P/2 - Já tinha?
R - É, já tinha trilha, tinha uma casa aqui.
P/2 - Ah, já estava...
R - Era pau-a-pique, tudo, era pau-a-pique, né?
P/2 - Pau-a-pique?
R - É, parede de barro.
P/2 - Com aqueles...
R - É, trançado com madeira, com... daquele tempo pegava árvore fininha, fino do mato, e trançava lá, e com cipó mesmo, e fazia com parede... até um bom tempo nós moramos assim, né?
P/2 - E como é que era essa casa por dentro, quantos cômodos?
R - Cômodos, tinha uns quatro, cinco cômodos, cômodo não era arrumado, o chão era de terra batida mesmo, não era cimentado, não era lá essas coisas, não tinha nada de luxo, não. Uma casa bem rústica, né?
P/2 - Sei.
R - E tinha... quando chovia era úmido, que entrava água.
P/2 - Ah, é?
R - Que desbarrancava e a água que corria não corria pelo lado, entrava, tinha esses problemas aí.
P/2 - Puxa! E tinha luz elétrica quando o senhor chegou?
R - Não, foi só em 1950... um ou dois anos que chegou a luz aqui na colônia.
P/2 - E como é que era aqui, assim, de noite, como é que vocês se iluminavam?
R - Com lampião.
P/2 - Lampião?
R - Lampião à querosene, né, era aquele lampião mesmo, que tinha aquele pavio no meio, tinha que levar lá, quando queria um pouco mais de claridade, tinha que aumentar o pavio para iluminar a casa, né? É nessa base que vivemos, foi um bom tempo.
P/2 - E, seu Yuichi, como é que era a sua mãe? Como o senhor descreveria ela?
R - Diria como?
P/2 - Ah, de temperamento, de personalidade.
R - É, minha mãe é tipo... pô, como é que eu poderia descrever a vida de minha mãe?
P/2 - Ela gostou de vir para cá?
R - Não sei, acho que minha mãe era o tipo de mulher revoltada, né, acho que não gostava muito não. (riso)
P/2 - Por quê?
R - Porque sempre ela andava brava.
P/2 - É? (riso)
R - Sempre estava reclamando.
P/2 - O que ela reclamava, seu Yuichi?
R - Porque uma que a vida era miserável aqui para a gente, né?
P/2 - Mais do que lá? Lá era melhor?
R - Eu creio que sim, era bem miserável aqui, porque cuidava da granja, mas granja não era aquela coisa, né, não estava ainda... hoje é pior a granja, né, mas naquele tempo estava, porque precisava ter um certo capital. Porque com a granja, era uma coisa que onerava muito, precisa conseguir desde a granja, a construção, depois precisa ter capital para alimentar as galinhas, até a produção vai ter uma despesa grande e o retorno não era muito bom não.
P/1 - E como era as instalações para as galinhas?
R - Galinhas, é, fazer galinheiro e não criava no chão não, fazia ripado, elas criava em cima do ripado, né?
P/2 - E por que vocês chamam galinha poedeira?
R - Aquele que dá ovo. Então tem o frango, que é granja, mas tem o frango, que é de consumo, é, venda de frango para consumo de carne, né? E tem a poedeira que é para a produção de ovos, então a diferença é nesse sentido.
P/2 - E qual que dava mais aqui?
R - Naquele tempo era mais... não falava em frangos.
P/2 - Ah, não?
R - Frango era só a galinha, galinha para tirar ovos mesmo, produção de ovos, então essa era a finalidade, mas frango depois, um bom tempo depois, começaram a criar frangos para corte, né, corte, como diz, para a venda de carne, né?
P/1 - Não havia consumo de frango naquela época?
R - Olha, fazia-se as galinhas refogadas, a turma comia carne das galinha, era só as galinhas refogadas, não as para, especialmente, para o consumo de carne, né, para...
P/1 - E o que fazia com os frangos?
R - Oh, enfim, acho que eliminava, viu, porque, não sei como, mas eliminava, eles só vinham e compravam as galinhas, as fêmeas só.
P/2 - Voltando um pouquinho para a sua casa, é, como que é, a sua família tinha práticas religiosas?
R - Olha, meu pai... meu pai quase que era ateu, ele não praticava muito não, e minha mãe sentia falta da religião, aí de uns tempos para cá, aqui, logo aqui embaixo tem jardim das classes retardadas mentais.
P/2 - A Kodomo-no-Sono?
R - Isso. E essa instituição foi organizado pela igreja, pelo templo budista que tem lá na Lapa. Então tinha o padre que... Aí como foi o padre, então sempre teve aqueles sermões religiosos, tinhas essas coisas então, e naquele tempo quando o Kodomo-no-Sono, né, das crianças retardadas mentais, a gente participava muito e depois que o padre veio aqui, começou a andar nas casas do pessoal aqui, moradores, quando chegava no tempo de finados, ele andava e ia rezando, cada dia, a família depois tem aquele oratório, não sei se você ficou sabendo, mas tem oratório.
P/2 - A dona Sada falou para a gente.
R - É. Então cada oratório, dentro daquele oratório, cada pessoa da família que morre, tem um símbolo, símbolo de um, aquele lá é igualzinho o túmulo japonês, e tem aquilo lá, um letreiro, o mesmo que uma tabuinha, que a base parece um túmulo japonês. Então tem uma tábua em cima aqui, então tem todos os dados...
P/2 - Da família?
R - ...da, da pessoa, o dia em que nasceu...
P/2 - Escrito em japonês?
R - ...escrito em japonês, o dia em que nasceu e o dia em que faleceu e o nome da pessoa, e atrás, geralmente atrás, é... quando os que falecem, diz que vira santo, então o padre dá o nome de santo aí atrás já, então isso é escrito em japonês.
P/1 - Mas é o oratório budista?
R - Budista.
P/1 - E o padre fazia?
R - Então, viemos ter esse oratório, esse aí que está aí, tem até um boneco aí, não tem? Aquilo é um oratório.
P/2 - Que bonito!
R - Mas é um marceneiro que faz oratórios, existe na cidade ainda, até agora vende esses oratórios na cidade.
P/1 - Na Liberdade também tem?
R - Tem, tem, eles vendem. Então a gente compra e geralmente, quando falece alguma pessoa da família, vai pedir para aquela... para aquele templo que pertence, para o pastor, para o padre, como diz, é...
P/1 - O monge.
R - ...o monge, né, é, vir rezar, desde corpo presente até, por exemplo, um ano, cada aniversário, aí pede para ele rezar, né, rezamos até primeiro ano, terceiro ano, sétimo ano, décimo terceiro e vigésimo quinto, viu, conta assim.
P/2 - Ah, é?
R - É, fazer missa. Aí o pessoal, você chama o pessoal para fazer, geralmente, faz em casa...
P/1 - Espera um pouquinho, só para eu entender, é missa ou é a cerimônia budista? Ou é a missa católica?
R - Não, é a cerimônia budista, tudo budista.
P/1 - Sei, e aí vem um monge budista?
R - Vem.
P/1 - E esse padre que veio para cá não é padre, é um monge.
R - Monge, é.
P/2 - E aí o senhor estava contando da... que a escola Kodomo-no-Sono foi fundada por um monge.
R - Não, não é, foi fundada por um monge. Lá, a sede do templo fica lá em Lapa, na Lapa, né, no ponto do Piqueri.
P/2 - Mas aí tinha cerimônia lá?
R - Lá no, no... Kodomo-no-Sono geralmente monta altar e faz a cerimônia, faz a missa, né, toda a vez que tiver alguma coisa, faz a missa. E minha mãe tanto interessou e começamos a participar nesse templo aí, então todo o ano ele vem, faz em todo ano...
P/2 - E quando que acontecia a cerimônia?
R - A cerimônia geralmente é que a gente chama o padre, esse monge, né?
P/2 - Ah, não tem um dia certo toda a semana?
R - Não tem, não é que nem católica não.
P/2 - Entendi.
R - Então agora tem tanto aqueles dias, no ano tem sete, oito dias...
P/2 - Cerimônias?
R - ...do ano que tem a cerimônia tal, tal, então vem o convite para participar desse... dessas missas, né, então a gente participa.
P/2 - Mas você chama uma missa mesmo ou é culto, como é que é?
R - Agora é, mas é culto, né?
P/2 - Culto.
R - Mas acho que é culto, né?
P/2 - Missa é mais a abrasileirado assim?
R - Eu creio que isso é mais é católica, né?
P/2 - Católica.
P/1 - Isso é católica.
P/2 - E tinha alguma profissão que era valorizada na sua família, pelos seus pais, que eles queriam que os filhos seguissem, como é que era isso? Ou eles queriam que vocês fossem agricultores como eles?
R - Eu sei que... japoneses em si, cuidavam é, como diz, se preocupavam muito com a educação dos filhos, mas então dizem que aqui em Itaquera, a colônia de Itaquera, foi um dos bairros mais intelectuais de São Paulo, porque tinha muitos estudantes na faculdade. E ultimamente todo o lugar, todo o mundo estuda, a faculdade, a mesma coisa, isso é normal. Então até tinha um tempo que, ano de 1950, sei lá, ano de 1960, naqueles tempos, quando fazia censo, diz, lá onde tem o Corinthians, o clube, aqui no Parque São Jorge, lá na frente do Parque São Jorge, do Corinthians, ali era favela, não sei se já conhece essa história.
P/2 - Não.
R - Lá era favela. E naquela favela disse que tinha duas famílias japonesas.
P/2 - Ah, é?
R - É, a única coisa que diferenciava de lá e do japonês que mora antes, que todos os filhos dos japoneses estavam estudando, estavam indo na escola, não tinha um que deixava de ir na escola, disse que essa era a diferença. Então o japonês se preocupa muito na educação dos filhos, mas se o mesmo que.... agora quando a coisa chega até o ginásio, muita gente tinha mandado, mas depois do ginásio, começa a dar despesa, que aqui não tinha escola. Em todo o lugar também já tem a faculdade, colegial tem em quase todo o canto, mas se a gente quisesse estudar o próprio ginásio mesmo, precisava ir até a cidade estudar.
P/2 - E o senhor estudou, como é que foi isso?
R - Eu estudei, a gente fazia até o quarto ano, naquele tempo era quanto ano, primeiro até quarto ano.
P/2 - Era o grupo?
R - Grupo.
P/2 - E onde o senhor fez o grupo?
R - Grupo fiz... foi feito aqui na colônia mesmo.
P/2 - Ah, aqui dentro?
R - É, aqui mesmo, tinha aí onde tem o clube atualmente, tinha, dava aula lá.
P/2 - Como é que chamava?
R - Chamava grupo Escolar da Colônia de Itaquera, né?
P/2 - E como que... o que o senhor lembra do grupo escolar? Como é que era?
R - Olha, eu sei que a professora era muito brava, (riso) dava reguada na cabeça da gente, (riso) quando estava no segundo ano aí.
P/2 - É mesmo?
R - É.
P/2 - Era japonesa?
R - Não, vinha professor do... por que no ano de 1940, eu sou formado em 1950 aqui, no grupo, em 1948 aqui ficou é a escola, chama escola particular da Colônia de Itaquera.
P/2 - Ah, era paga?
R - É, a associação pagava a professora.
P/2 - Entendi.
R - A professora, né, e cedia espaço do clube lá.
P/2 - Tá.
R - E em 1948 ficou Grupo escolar, então já mandavam os professores para cá.
P/2 - Aí ficou público?
R - Ficou público, ficou. Aí ficou público.
P/2 - Tá certo. E como que as crianças iam para a escola? Era de manhã?
R - De manhã, de manhã. todo o mundo ia a pé, né?
P/2 - Era longe?
R - Aquilo tem um quilômetro e meio mais ou menos, isso é, andar era normal, porque depois que formar esse quarto ano, acima disso precisava fazer admissão para prestar exame para entrar no ginásio, e esse ginásio tinha só na cidade, São Paulo ou Suzano, Poá tinha um ginásio...
P/2 - Poá?
R - Poá. Estudei lá em Poá dois anos, lá em Poá, depois fiz exame no Colégio Roosevelt, lá no Parque Dom Pedro, depois prestei aqui no Belenzinho, Bairro do Belém, lá tinha, escola era chamada de Grupo Escolar, não sei o que, eu sei que ficou lá naquele largo lá, do Belém, prestei exame de admissão lá, prestei lá em Suzano, que chamam de estadual de Suzano, e prestei aqui no Ginásio Estadual de Poá. Aí passei no Belém.
P/1 - Roosevelt era na rua São Joaquim.
R - Não, era no...
P/1 - Na Liberdade.
R - Não era Liberdade, o Colégio Roosevelt ficava naquela, descendo a [avenida] Rangel Pestana, descendo a Rangel Pestana, quando vira para lá, para ir para o lado do Ipiranga, na esquina, passando o Ipiranga, o primeiro prédio, depois o segundo prédio, lá é aquele prédio velho, era aquele Colégio Roosevelt, era o melhor, melhor ginásio naquele tempo lá. Eu não consegui passar não.
P/2 - Não?
R - Não.
P/2 - Onde o senhor passou?
R - Passei... fui lá em Suzano e repeti, depois fui aqui no Belém, porque tinha primeira época e segunda época, tinha, tinha duas oportunidades de prestar o exame de admissão para passar, prestei lá no Colégio Roosevelt, não passei, prestei lá em Suzano, eu repeti, aí nesse colégio, no ginásio estadual lá no Belém, Largo do Belém, tinha organizado o ginásio estadual e tinha uma vizinha aqui embaixo, que morava aqui embaixo, que o irmão dele também estava querendo, procurando esse ginásio, né, e eu falei assim: “olha, tem um ginásio que está formando agora”, que estava fazendo o exame da admissão lá, não quer prestar, no que eu prestei lá, eu passei. Aí era noturno, porque o pessoal ia daqui, saia daqui para ir estudar até onze horas da noite e voltava para casa...
P/2 - Que hora o senhor saía daqui?
R - Saía daqui é... bem em torno é... sete horas lá entrava no ginásio, então eu saía mais ou menos, é de bicicleta, pegava o trem, maria-fumaça, ia até a estação, acho que...
P/1 - Onde punha a bicicleta para subir no trem?
R - A bicicleta, antigamente no... em frente à estação de Itaquera, tinha um bar, chamava Bar Moderno, né, a turma deixava a bicicleta lá, trocava de roupa, e, que quando chovia a estrada é tudo barro, então trocava a roupa, sapato e depois ia lá, né?
P/1 - E na volta, que hora vocês voltavam?
R - As vezes era onze horas, onze e pouco, né?
P/2 - E para voltar na escuridão?
R - Voltava na escuridão, não tinha luz, não tinha nada.
P/2 - Como é que enxergava o caminho para a bicicleta?
R - É, tenho certeza que era na base de intuição, né? (riso)
P/2 - Que dureza, hein, seu Yuichi?
R - Pior quando furava a bici... pneu e pior quando chovia, fazia lama, enchia.... E tem aquele pára-lama que chama, né, onde tem aquela capa lá.
P/2 - É.
R - Onde tinha capa na bicicleta e enchia de barro, bicicleta não andava e parava, furava isso de dentro do barro, no barro, lotava tudo, vermelho e barro aí.
P/1 - Mas vocês não faltavam?
R - Era difícil faltar, porque a gente: “oh não pode não, faltar à escola não pode não.” Depois de meio ano noturno passei para Poá. Poá era de dia, era à tarde que estudava lá, foi até segundo... segunda série, né, naquele terceiro da série ginasial. Aí fizeram o Ginásio Estadual de Itaquera aqui, aí pedi transferência para cá.
P/2 - Onde era?
R - Onde atualmente funciona a sede da prefeitura municipal, a regional de Itaquera.
P/2 - Ah, lá não era o grupo escolar, não fizeram juntos?
R - Fizeram, lá era grupo, era grupo escolar, e no outro fizeram galpão de madeira, aquela ocasião, tempo que fazia de galpão de madeira, a sala de aula era galpão de madeira, e estudamos nesse, onde no instante é a Regional de Itaquera.
P/2 - Aí lá, depois, fizeram o ginásio.
R - É, esse ginásio, e a frente era grupo de primeiro até quarto ano, né?
P/2 - Seu Yuichi, quando o senhor fez o grupo escolar aqui na colônia, como é que ia vestido para a escola?
R - Ah, pelo menos mandava... a professora disse que o uniforme da gente era calça azul, camisa branca, isso a gente tinha, né, agora o sapato, tinha tênis ou descalço mesmo que ia na...
P/2 - É?
R - É, mas, mas era muito... a gente ia descalço.
P/2 - É. E quais que eram as brincadeiras das crianças aqui na colônia?
R - Olha, na colônia, eu brincava muito de beisebol. Para as meninas... depois as meninas brincavam com as brincadeiras das meninas lá, né, como eles dizem, é... como que chamam aquelas brincadeiras lá?
P/2 - Roda?
R - Roda... ou seria do que ficava no chão lá, e ficava pulando lá no chão...
P/2 - Esconde-esconde?
R - Não, não.
P/1 - Estátua.
R - Não, é um que riscava lá, e elas ficavam pulando.
P/2 - Amarelinha.
R - Eu não sei como é que chama...
P/2 - Faz um risco no chão e joga a pedrinha?
R - É.
P/2 - Amarelinha.
R - É, acho que sim, então fazia essas brincadeiras, né, mas a gente jogava mais beisebol, mas futebol era pouco, hein?
P/2 - Futebol lá era pouco?
R - Na colônia japonesa não jogava futebol não, era mais beisebol.
P/2 - E tinham times de beisebol?
R - Depois de vários tempos já começou a montar time de beisebol, né, e jogava muito beisebol.
P/1 - Uma curiosidade: era colônia japonesa, mas tinha alguém que não era japonês, que veio aqui...
R - Tinha, tinha. Onde atualmente chama Adriano Bertozzi, Avenida Adriano Bertozzi, que justamente onde tem Carrefour, vai para lá do Parque do Carmo, aquela rua lá, aquela avenida lá, era a maioria italianos que estavam lá.
P/2 - Ah, o que eles estavam fazendo lá?
R - Fazendo a mesma coisa que a gente fazia, plantavam pêssego, plantavam uva, e também não plantava muito pêssego, é uva.
P/2 - Uva?
R - É, uva, mas pêssego também plantavam, igualzinho a nós, plantavam o pêssego.
P/1 - E vocês se davam?
R - Dávamos muito bem.
P/1 - Eram amigos, tinham amizade?
R - Amizade, tínhamos amizade.
P/1 - Sim?
R - Tínhamos sim, tínhamos amizade sim.
P/2 - Como é que era a relação aqui? ah, não, desculpa... só para complementar, para não me perder, quando vocês não tinham os times formados de beisebol, como é que vocês se organizavam, os jovens, as crianças?
R - Porque ali o beisebol, só pelo fato de pegar uma bola e jogar para o outro pegar, essa era a brincadeira da gente, né?
P/2 - Já era beisebol.
R - É, então, não precisava ser time para jogar mesmo, né, oficialmente.
P/2 - Não era no clube então, toda vez?
R - Não, não é, aquele tempo era... jogava só para passar tempo mesmo, né?
P/2 - Entendi.
R - É.
P/2 - E quando o senhor começou a trabalhar?
R - Olha, todo o mundo na colônia japonesa aqui, como não tinha... naquele tempo não tinha dinheiro para pagar empregado também, então trabalhava com mão-de-obra própria da família, então acho que desde criança pequena, não tinha esse negócio de atualmente, falar que criança menor não pode trabalhar, que não pode trabalhar mais que quatro horas, tem um montão de coisa que ultimamente fala, e deixam a gente mais preguiçoso, mas naquela ocasião voltava da escola, precisava trabalhar, ajudar.
P/2 - E onde que era, que ajudava?
R - Ajudava na... pois aquele tempo tinha plantação de pêssego, ou às vezes tinha outras plantações, quem não tinha plantação de pêssego tinha plantação de verduras, né? Então sempre precisava de mão-de-obra, onde vai recorrer com mão-de-obra, são as crianças. Então a gente tinha nove, dez anos, já estava trabalhando normalmente.
P/1 - Fazendo o que mais ou menos?
R - Tudo que vê, tira mato, pegar a enxada e tirar mato, ou optava escolher, se for necessário colher as verduras, as frutas, ajudar a encaixotar, ajudar a fazer caixa, por exemplo, no tempo de pêssego eu precisava fazer caixa, então a gente fazia caixa, ou fazia, no tempo de ensacamento de... porque naquele tempo ensacava pêssego, ainda ensaca, conforme rende ainda ensaca, mas é...
P/1 - Verdes?
R - Pequenininho, porque não dá... para não dar bicho, então ensaca um por um.
P/1 - Ah, entendi, sim. Pois dá árvore?
R - Isso. Então esse serviço era da gente.
P/2 - Das crianças?
R - É.
P/2 - E vocês iam em turma, iam os irmãos?
R - Não, cada família... porque cada família cuidava da sua, né, não ia no vizinho cuidar, o vizinho não, mas sempre cuidava cada um...
P/1 - Fazia caixa com madeira e prego é isso?
R - Isso, madeira e prego.
P/2 - Onde vocês conseguiam a madeira, seu Yuichi?
R - Nós tínhamos a cooperativa, Cotia, a gente pertencia à Cooperativa [Agrícola] de Cotia.
P/2 - Lá em Pinheiros?
R - Lá em Pinheiros, né, mas tinham as regionais, então cuidava todas essas, é... o necessário para mantimentos, materiais para uso da chácara, insumos, quer dizer, adubos, caixas, papéis, todas as coisa que necessitasse para sítio, para a chácara, né, a cooperativa providenciava.
P/1 - Quer dizer, aqui em Itaquera era a mesma Cooperativa de Cotia, é isso?
R - Então, a Cooperativa de Cotia tem a matriz, que é lá em Pinheiros.
P/1 - Ah, tá, é uma filial aqui?
R - Não, eram regionais.
P/1 - Ah, tá.
R - Não é filial, são regionais que tinha. A própria cooperativa só tinha deixado fazer essas depois das regionais, chamava depois das regionais, porque deixou a administração, pequena administração, para cuidar dos associados locais, então isso que fazia, né?
P/1 - E também o produto vinha para a cooperativa para vender?
R - Então, mandava para os outro também, quando tinha produto para ser vendido, colhia e levava para a cooperativa, para a sessão de venda da Cooperativa Cotia.
P/2 - Toda a produção seguia para lá?
R - Toda a produção seguia lá, e quando desviava a produção para outros desses que pagavam mais, aí a gente achava ruim, né?
P/2 - Aqueles que pagavam mais?
R - Porque eles financiavam a produção também.
P/2 - Entendi. Eles punham dinheiro, então tinha que ficar...
R - A obrigação moral de mandar para eles, né?
P/2 - E eles pagavam um preço baixo?
R - É que se detém as despesas, que é... às vezes perdia na venda, em preço, baratíssimo, porque lá no mercado de Cantareira, lá tinha o mercado para você entrar, era lá na Cantareira, né, antes de passar pelo Ceasa. Então mandava tudo para o da Cantareira, naquela redondeza da Cantareira o pessoal alugava as casas a comercias para a venda de frutas, de pêssego, ou qualquer outras mercadorias que estivessem por lá. Aí esses “barraquistas”, que a gente chama de “barraquistas”, né, aí eles tinham preço mais vantajoso, aí...
P/2 - Mas não podia?
R - ...não podia, né, quer dizer, como é cooperado, a gente tem aquela sociedade lá, disse que não podia fugir daquilo, então procurava sempre mandar para lá, mas é... de vez ou outra a gente desviava, e eles não gostava, né?
P/2 - Eles ficavam sabendo?
R - Ficavam sabendo, porque o motorista ia ver que ele não mandou.
P/2 - E todos os moradores da colônia que trabalhavam com lavoura tinham que ser associados da cooperativa?
R - Não, não, não, aqui, eu creio, que no tempo do auge da safra, acho que saiam quatro ou cinco caminhões todo o dia, carregados de pêssego.
P/1 - Qual era o mês da safra?
R - Naquela ocasião era de novembro a janeiro.
P/2 - Em que anos que foi mais forte a produção de pêssego?
R - Olha, nos anos 50 até 70, né?
P/2 - 20 anos?
R - 20 anos.
P/2 - O senhor estava dizendo, antes da gente começar a entrevista, que as crianças ajudavam os pais também a pulverizar o pêssego, né?
R - Ah sim, tudo. Tudo que o adulto fazia a gente fazia, porque o pêssego, pêssego era produção anual, mas chegava no mês de abril, por exemplo, precisava começar a adubar os pessegueiros, e chegava no mês de... é, já acabava de adubar, precisava começar a podar os pés, né, depois que poda, começa a brotar, floreia, forma fruta, então precisa começar a pulverizar para cuidar do...
P/2 - Para não dar bicho.
R - ...para não pôr pragas na planta e não pegar fungos também, né? Então, atualmente eu tenho plantação de flores, eu jogo inseticida, fungicida, duas vez por semana, assim mesmo não consigo, é difícil controlar as pragas, né?
P/2 - O senhor joga com quê?
R - Com máquina.
P/2 - Máquina. E antigamente?
R - Antigamente era na base de... tinha uma máquina manual, mas era mais manual, né, depois com o desenvolvimento das coisas vieram máquinas motorizadas.
P/2 - E essa manual é que punham inseticida? Era uma manivela?
R - Não, colocava numa vasilha que nem um tambor, fazia, preparava no tambor, de duzentos litros, né, depois pegava, tinha uma bomba manual, que ficava bombeando uma pessoa e outra pessoa jogando. Bico com mangueira, né, isso que fazia. Agora não, agora a gente prepara, e só ligar a chave, a máquina motorizada funciona só, o resto de jogar a gente mesmo joga, né, então é...
P/1 - Não precisa mais bomba, é isso?
R - Ah, não, não, não precisa. Então agora é tudo motorizada, né? E naquela ocasião, então, não tinha como contratar funcionários, empregados, aqui para dar conta do serviço, mas uma que não tinha condições financeiras, então quem ajudava nessa mão-de-obra era a própria família, e a própria família, geralmente no início da colonização, as crianças são pequenas, mas idade não influía não, trabalhava do mesmo jeito.
P/1 - Qual era a área da sua propriedade?
R - Área aqui era um alqueire... vinte e quatro, vinte e cinco... acho que era de vinte e cinco mil metros quadrados.
P/1 - E a produção de pêssego era quanto, para um alqueire, lembra?
R - Agora não lembro não, quanto foi não.
P/1 - Quanto era essa produção, né?
R - Ele não tinha condição de plantar muito grande, porque não tinha mão de obra, né? Tem pessoas que plantavam mil pés, tinha aquela coisa mesmo, para plantar duzentos pés só de pêssego.
P/2 - E quanto dava, quanto dá um pé? Não tem, não dá para fazer uma estimativa assim, né?
R - Eu não sei não, eu...
P/2 - É muito pêssego?
R - Não, não é muito não, não é muito não, acho que cada pé acho que tirava umas vinte caixa.
P/2 - Vinte caixas, a safra inteira?
R - É, em cada pé, né?
P/1 - E que pêssego era? Como era a espécie?
R - Naquele tempo eu tinha um pêssego aqui da região mesmo, que chama pérola de Itaquera, e tinha pêssego sawabe, né?
P/2 - Sawabe?
R - É, e depois tem rei da conserva, para as indústrias.
P/2 - Rei da conserva?
R - É.
P/2 - O que é isso?
R - É para... o nome que deu para essa qualidade...
P/2 - Ah, é?
R - É, variedade de pêssego, até pêssego mais... rei da conserva, porque é especialmente para conservas, aquele é...
P/1 - Pêssego em calda?
R - ...em calda.
P/2 - Ah, ah, é um tipo diferente.
R - Diferente, diferente da mesa.
P/1 - E o da mesa, qual é que era a espécie?
R - Tinha uma pérola de Itaquera, né, e então tinha um senhor, acabou enxertando, fazendo hibridação, né, quer dizer, cruzamento de uma flor com outra, aí tinha um tal de sawabe.
P/2 - Sawabe. Como é que fazia isso, produzir um novo tipo de pêssego?
R - Quando fazia assim, pegava pólen de um outro pessegueiro e passava no pé da outra. Quer dizer, até pegava outro, porque geralmente quer fazer cruzamento da outra variedade, fazia cruzamento, tirava aquela volta da flor, tem... como diz, tem um macho, fêmea, então tem... deixa a parte de macho, tirava todo, e trazia aquele esporo e passava, passava o cartucho em cima disso aí, para não ser contaminado.
P/2 - O que é cartucho?
R - Um...
P/1 - Um saquinho?
R - ...saquinho
P/2 - Saquinho.
R - É, para formar o fruto aí, né, sem contaminação exterior.
P/2 - Entendi.
R - Aí formava com os... aí pegava essa semente, plantava e o que nascia era a nova variedade.
P/2 - Olha, e sempre dava certo?
R - Não dava não, então… Tem um tal, esse Guichi Yoshioka, também era pesquisador, e o irmão dele, Tai Yoshioka, também pesquisador, eles faziam muitos cruzamentos aí.
P/1 - Mas era só de pêssego ou era de outras coisas? Tomate, morango...
R - Não, mais de pêssego, mais era pêssego.
P/1 - Não era aquele pêssego solta-caroço.
R - Oh, tinha solta-caroço, ultimamente tem muito solta-caroço, depois o Instituto Agronômico de Campinas começou a pesquisar, antes não tinha esse Instituto Agronômico de Campinas que pesquisava pelas novas variedades. Tem um amigo meu, que até agora trabalha no Instituto Agronômico de Campinas, trabalha para o setor de fruticultura, ele se dedica sempre à pesquisa das variedades e ultimamente não tem mais esses pêssegos que a gente tinha antigamente, ela vem... vai buscar lá no Sul, Rio Grande do Sul, tem variedades diferentes, né, vão buscar lá.
P/1 - E por que aquele não tem mais?
R - Olha, acho que economicamente não era viável, né, ultimamente esses pêssegos que tem aí, esses pêssegos que aparecem na feira, vem mais do Sul, são variedades do Sul.
P/2 - Seu Yuichi, e como é que foi acabar o pêssego aqui, foi em que época?
R - A vida de um pessegueiro é curta, mais ou menos trinta anos. Não desenvolvia como queria, e então ele não aceita replantio, né, no mesmo solo, aí o que aconteceu? Muita gente que tinha a plantação de pêssego aí, que muitos proprietários foram procurar áreas, outros lugares, Atibaia, Jundiaí, Campinas, foi por aquelas bandas lá.
P/1 - E se mudaram?
R- Se mudaram, e começaram para lá mesmo a plantação de pêssego.
P/1 - E aqui foi ficando o quê só?
R - Aí, eu fui ficando... ficou aí com ameixa, que chama, aquela ameixa amarela.
P/1 - Que dá aquele cacho?
R - É, e goiaba. Veio caqui depois.
P/2 - Quem trouxe essas plantas, essas frutas?
R - Goiaba... goiaba é nativa daqui do Brasil, né, só que não cuidava para ser comercializada, porque goiaba então, diziam que goiaba sem bicho não é goiaba, a turma dizia, né? Então começamos a cuidar, então começou pôr em saquinho, cuidava então, jogava inseticida, fungicida, para não pegar praga, doenças, né, cuidava de tal forma que...
P/1 - Fazia enxertos também?
R - Fazia enxertos também. Aí começamos a ter goiabas de qualidade, aí tem gente que ficou rico com goiaba, mas é...
P/1 - Eu ia perguntar para o senhor mesmo, naquela época do pêssego, que o senhor era pequeno, ajudava, aquela renda dava para tocar a família?
R - Com muito custo, com muito custo.
P/1 - E ali era só pêssego que o senhor tinha?
R - É, então, como meu pai tinha granja, as vezes a despesa... que até a galinha botar ovo tinha despesa, então às vezes o que conseguia com o rendimento do pêssego “tapava” buraco.
P/2 - Com a granja?
R - Com a granja, “tapava” buraco na granja, né, e quando depois punha o dinheiro na granja, a gente fazia... sobrevivia com isso, mas é, é tal coisa, a produção de pêssego dava só dois meses mais ou menos, novembro, dezembro, né? Esse aí, se calcular bem, é justamente o salário destes dois meses só, os outros dez meses ficava sem produção, sem ter rendimento.
P/2 - Só investimento.
R - É, só investimento, então, quer dizer, com a produção que teve em dois meses, precisava comprava novamente adubado, adubos, caixarias, saquinho, papel para saquinhos...
P/2 - Inseticidas.
R - ...inseticidas, isso aí tudo precisava comprar com esse dinheiro, e não dava muito bem não, a coisa, quem tivesse escala daquela coisa, que tinha escala grande produção de pêssego, eu creio que aí sim, tinha gente que economiza bastante, tem muita gente que ficou rico por causa disso.
P/1 - Mas aí tinha que ter empregado?
R - Precisava ter empregado, precisava ter mesmo.
P/2 - Entendi. E como que era a colheita do pêssego, o senhor participava?
R - Sempre participei.
P/2 - É colheita que chama?
R - Colheita.
P/2 - E como é que era?
R - Colheita era andar um por pé, pé por pé, tem algumas [frutas], que nunca amadurecem de uma vez só, vai de pouco a pouco, então a área é pé por pé, pega aquelas frutas maduras, colhe, cuidado para pôr na cesta, trazia até galpão, no galpão selecionava os tamanhos e depois encaixotava, de acordo com o tamanho encaixotava no pé... na caixa, depois fechava, vinha um caminhão, chegava à tarde e levava até a cooperativa, assim no meu caso, né, havia muita gente que não era associada na cooperativa, que vinham caminhões que faziam... muitos chamam carreteiros, né, que faziam esse serviço de recolher as caixa...
P/1 - Recolhia no pé, né?
R - Não, não, não era no pé, a gente mesmo colhia, fazia as...
P/1 - Dava aos outros?
R - A maioria.
P/1 - Que eram fora da cooperativa?
R - Não, o sistema era o mesmo.
P/1 - O sistema era o mesmo.
R - Só que não era o caminhão da cooperativa que vinha recolher as mercadorias.
P/2 - Eram os carreteiros?
R - Eram os carreteiros que recolhiam, e levavam no mercado central.
P/1 - Agora, que porcentagem das propriedades aqui eram de pêssego, o senhor sabe?
R - Naquela ocasião, acho que 95% eram produtoras de pêssego.
P/1 - Que ano mais ou menos isso?
R - No ano de 1950 para cá, né?
P/1 - 90% era pêssego?
R - Pêssego, só vivia pêssego também.
P/2 - Que mais que tinha de produção aqui na colônia?
R - No início começaram com tomate, né?
P/2 - Tomate?
R - Tomate, depois morango.
P/2 - O senhor chegou a cultivar alguma coisa assim?
R - Não, não, já... quando eu cheguei já passou, tinha passado essa era já...
P/1 - Então é bem de antigamente.
R - É, tinha, então já era granja.
P/2 - Ah, tá.
R - Depois de granja a... o pêssego.
P/1 - E depois do pêssego?
R - Depois do pêssego vem ameixa, goiaba, caqui. Depois passei essa fase, entrei na fase de plantas ornamentais, então orquídeas, samambaias, aí que comecei com plantação, comecei com plantação de rosas aqui, aí plantação de rosas, e plantei rosa por um bom tempo, plantei de 1967 até 1980, fiquei plantando rosas, aí passei para crisântemo, e de 1980 para cá estou com crisântemo, até agora estou com crisântemo.
P/1 - Até hoje?
R - Até hoje.
P/1 - E o senhor acha que é rentável?
R - Olha, graças... graças à plantação de flores, desde o tempo de rosa para cá, que eu tive oportunidade de educar os meus filhos nas melhores escolas.
P/2 - Vamos falar o nome de seus filhos para a gente deixar registrado. O Marcos foi nesse escola de artes e ofícios, então ele fez curso de eletrônica lá, e com esse curso de eletrônica, é... ele começou a trabalhar, fazer estágio no Olivetti, naquele tempo não era fax, era aquele aparelho grande que fazia transmissão lá, é, telex...
P/1 - Telex.
R - Era telex. Ele fazia... então ele fazia manutenção de telex, quer dizer, muitas firmas mandavam esse aparelho para ser consertado no Olivetti. Aí que eu fui conhecer nesse... nessa conversa do telex, que parece que ele foi conhecer essa minha nora que é de Caxias do Sul.
P/2 - Que é brasileira?
R - É filha de italianos, né, foi conhecer lá, por intermédio de telex, que conheceu ela, e...
P/2 - E os outros filhos estudaram também?
R - O meu outro, segundo filho, que é o Cléber, ele... ele fez depois do oitava série, ele fez colegial Etapa, depois do colegial Etapa ele prestou, ele tentou fazer lá em Barbacena, no Minas Gerais, é...
P/1 - Geologia?
R - Não, é de...
P/1 - Mineralogia?
R - EPECAR chamava, Escola Preparatória de Cadetes do Ar.
P/1 - Ah, tá, tá.
R - Só que foi lá, prestou exame, passou, mas na hora de fazer, começar a aula mesmo, ele desistiu.
P/2 - Ah, é?
R - Desistiu, disse que não era esse que ele queria e desistiu, aí ele fez, entrou no Colégio Etapa, ele fez Getúlio...
P/2 - Getúlio Vargas?
R - Getúlio Vargas, fez administração de empresa.
P/2 - E a sua filha?
R - Minha filha, minha filha fez até a oitava série, Karina fez até a oitava série aqui nessa [escola], do lado aqui, Carlos Brunetti, esse colégio ao lado aí, após o colégio, fez o... o colegial ela fez no Bandeirantes, Colégio Bandeirantes, lá na Vila Mariana, depois da Vila Mariana, depois do Colégio Bandeirante, prestou lá na PUC, para estudar Direito, se formou lá. Isso graças à produção de flores, que deu essa rentabilidade para estudar.
P/1 - É que são colégios caros.
R - É, agora oficialmente, naquela ocasião, o colégio lá do Getúlio Vargas, última mensalidade, eu que esqueci o número, parece que estava setecentos e oitenta reais, né?
P/2 - Nossa! Está caro.
R - É que minha filha estava na PUC, estava quinhentos e setenta reais.
P/2 - Nossa!
R - Então, quer dizer, a flor deu uma boa rentabilidade, por isso que deu para manter...
P/1 - E eles, quando eram pequenos, ajudavam o senhor na plantação?
R - Olha, como já no meu... tirando da minha época já, que após casado, tudo, com o desenvolvimento das coisas, com flores já estava com empregados.
P/1 - Que dizer, o senhor casou, estava com flores?
R - Quando casei estava começando a plantar foi a rosa.
P/2 - Só queria voltar um pouquinho antes de chegar no casamento, que a gente já vai entrar lá, eu queria que o senhor contasse um pouquinho, é... se os seus irmãos, porque o senhor foi até ao ginasial, né?
R - Fui.
P/2 - Os seus irmãos continuaram os estudos, como é que foi isso?
R - É, a minha irmã mais velha fez é, aqui no Brás tinha o colégio Carlos de Campos, a escola industrial, né, então ela estudou lá, fez o curso, sei lá que curso que ela fez, acho que, se não me engano, um curso de costura assim, e até agora ela faz costura para o pessoal lá, onde mora, né? Agora, meu segundo, meu logo abaixo, meu irmão, ele fez escola técnica de contabilidade, Escola Técnica 30 de Outubro, ele fez lá, formou técnico de contabilidade, agora minha irmã fez até ginasial e desistiu.
P/2 - Mas ele... eles não mexeram com a lavoura como o senhor nas, nas...
R - A minha irmã, minha irmã mais velha, até casar ficou trabalhando na lavoura, com a gente, minha irmã segunda também, então ela ficou trabalhando aqui com a gente.
P/2 - Entendi. Então toda a família trabalhou?
R - É, trabalhou. Meu irmão mais novo, ele é formado lá na Poli, engenheiro civil.
P/2- Sei.
R - Mas ele também ajudou bastante na chácara, que... que tive problemas, naquela ocasião de 1960 até 1970, assim, tinha problema de coluna, entende, então não podia trabalhar muito, meu irmão, esse caçula, também ajudou bastante.
P/2 - Ah, bom, então agora vamos falar do casamento do senhor, como é que o senhor conheceu a dona Emiko?
R - Olha, a gente morava aqui na colônia, tem um clube aqui, que é... naquela ocasião ele chamava Associação Cultural Desportiva da Colônia de Itaquera, antes mesmo, antes mesmo tinha vários clubes grandes, não eram clubes, eram pequenos clubes, né, a Associação das Moças de Itaquera, Associação dos Moços, quer dizer, cada um reunia, fazia um clubinho aí, dentro do próprio... dentro da colônia aqui.
P/2 - O senhor sabe dos nomes em japonês das associações?
R - Em japonês?
P/2 - É.
R - É o de velhos, de casados e velhos chama
, a Sociedade Civil Itaquerense, chamava.
P/2 -
?
R - Agora, o, a associação dos moços chama
.
P/2 -
?
R - É. E das moças
, né?
P/2 -
.
R - É. Agora tinha... fora isso tinha beisebol também, Itaquera Beisebol, o clube também que puseram o nome, e aí tinha... que antes praticava naquela ocasião tênis de mesa, então tinha Tênis Clube de Itaquera [Nikkei Clube], né, e tinha pessoa que estudava, justamente pessoa que naquela ocasião estudava em forma para a faculdade, para universidade, eles chamavam... tinha Clube dos Estudantes de Itaquera, que só reunia pessoas estudantes lá.
P/2 - Ah, era?
R - É. Aí daqui a pouco veio a ênfase: Clube Agrícola de Itaquera, que, que... aí vinha funcionário da Secretaria da Agricultura e formamos um clube agrícola para o pessoal que estava desatualizado trabalhar na agricultura. Esse clube agrícola tinha em várias regiões aí, em Catanduva, Registro, Mirandópolis também tinha, na primeira vez estava dando Oba lá, fazenda Oba não sei se...
P/2 - Yuba, não é?
R - Oba, Oba.
P/2 - Oba.
R - É, fazenda de gado.
P/2 - Sei.
R - Fazenda Yuba é mais para...
P/2 - Yuba é colônia, não é?
R - É colônia, é colônia lá. É sistema socialista, né?
P/2 - É.
R - Mas a fazenda Oba é um só o dono lá.
P/2 - Sei.
R - Então, e o pessoal fez lá os clubes agrícolas, né, tinha intercâmbio por causa dos clubes agrícolas.
P/2 - Deixa eu perguntar uma coisa, que se eu estou entendendo, todas essas associações formavam o clube?
R - Cada um formava uma diretoria independente, que como era clube, cada... Itaquera Beisebol Clube era com diretoria composta independente,
era diretoria independente... cada um com sua diretoria...
P/2 - E onde ficava, cada um...
R - Ficava lá, cada um ficava num clube, pegava um quartinho, montava sua sede lá, porque funcionava a escola lá antes, né?
P/2 - Que escola?
R - Esse grupo escolar, que é de Itaquera, funcionava nesses prédios, depois o governo fez prédio, mais para lá em cima, agora estrada do Jacu Pêssego, né, então a colônia doou uma parte da terra e fez o grupo lá.
P/2 - E aí o senhor conheceu a dona Emiko lá?
R - Eu já conhecia desde pequeno, já conhecia desde estudante, já conhecia, né, lá no clube, porque é difícil, sabe, na colônia japonesa um ir na casa do outro.
P/2 - Ah, tá.
R - Então o clube era centro de lazer de todo o mundo.
P/1 - Ninguém costuma ir na casa do outro?
R - Era difícil, era difícil, todo o mundo reunia lá. Então qualquer coisa que tivesse lá, atividade... qualquer coisa que tinha.... era tempo inteiro no clube, era lá que o pessoal reunia, divertia, jogava, fazia as coisas tudo lá.
P/2 - E tinha dança também?
R - Eles são muito do baile, organizava muito baile.
P/2 - E o que dançava, que músicas?
R - Olha, o... naquele tempo lá, clube estudante, tinha era bolero, samba, baião, essas coisas...
P/2 - Ah, é?
R - ...tinha muito era assim.
P/2 - E vocês gostavam de dançar esses ritmos?
R - Era de dançar, a gente dançava, né, e no tempo de festa junina fazia os bailinhos, né?
P/2 - Quermesse, essas coisas?
R - Não, quermesse não, baile só.
P/2 - Ah.
R - Vivia divertindo dessa forma, né?
P/2 - Em que ano que o senhor casou?
R - Em 68.
P/2 - E teve festa de casamento?
R - Fizemos festa sim. Depois, naquela época, todo mundo fazia festa, então eu também imitava os outros, né?
P/2 - Ah, é? (risos) Como é que era a festa?
R - A festa, o... geralmente, bom, aqui também todo o casamento tem os padrinhos, né, mas no casamento na colônia japonesa, quem manda mais, quem organiza tudo é o padrinho.
P/2 - Padrinhos.
R - É, os padrinhos, os padrinhos que organizavam, sempre eles entravam no meio e faziam, e organizavam tudo, esse casamento, né?
P/1 - E a festa é no templo, foi no templo ou foi na igreja?
R - Não, arranjamos de fazer no… geralmente faz em casa, né, quem não tem salão monta um, se encoberta de encerado, uma coisa de fazer a festa em casa. E eu fiz aqui, aqui no Brunetti, naquela ocasião, estava no início das construções, e tinha uma coberta lá grande, né, eu fiz festa no Brunetti.
P/2 - E chamou toda a vizinhança?
R - Os amigos, vizinhança.
P/1 - Mas veio o monge para fazer o casamento?
R - Não, não, não.
P/1 - Não teve religioso?
R - Olha, toda a cerimônia japonesa que eles fazem, o próprio casamenteiro, né, quer dizer, já não é padre, é casamenteiro que a gente fala, né?
P/2 - Ah, tá.
R - Esse... depois fica padrinho, mas é casamenteiro.
P/1 - O que é um casamenteiro?
R - Que procura, é... porque você chega numa idade de casar, os pais tem um casamenteiro que vai: “Olha minha filha está com idade, o meu filho está com idade, arruma mulher para ele”, então esse casamenteiro procura e traz.
P/2 - Ele vai procurar uma moça para o moço?
R - É, é, apresenta, ele apresenta então, você namora esse, se vocês derem certo...
P/1 - E se não quiser também não namora?
R - Não, quer dizer...
P/1 - É casamento arranjado?
R - Não é casamento não, esse que... antigamente tinha muito casamento arranjado, mas no meu tempo já não era casamento arranjado não, quer dizer, que, sabe, que na idade de... da juventude, tem timidez, tem aquela vergonha de se apresentar e falar alguma coisa, japonês em si já é calado, né, não se abre muito, então tem esse casamenteiro que providencia, que vai lá, conversa com ele, conversa com ela.
P/2 - Facilita um pouco.
R - Facilita bastante, facilita bastante. Quando passado o tempo, meus filhos já não aceitam mais isso, já no meu tempo, já não estava aceitando mais, então é esse casamenteiro que faz tudo. Aí no meu tempo já, o pai da minha mulher era muito gozador, entende, então quando veio o casamenteiro, ele tirava sarro, brincava com o casamenteiro, faz... não levava a sério, entende, tinha dessas coisas, né, mas ainda funcionava bem naquela ocasião.
P/1 - No seu tempo, do casamento?
R - É, funcionava muito bem.
P/1 - Mas com seus filhos não foi assim?
R - Meus filhos não, cada um se vira de um jeito, e nem está... e nem está interessado que faça isso, e nem está se incomodando se vai ficar solteirão, solteirona, e não está incomodando mais. (risos)
P/2 - Seu Yuichi, e o que é o “
?
R - “
é sede.
P/2 - Sede do Clube?
R - É, Kaikan é sede do clube.
P/2 - O que acontece lá, as festas, tudo?
R - É uma atividade de um clube, né, então tem esporte, parte cultural, ultimamente muito
.
P/2 - Ah!
R - É, aí no Kaikan da colônia aqui, mais, é... está mais ativo, quer dizer, os velhos, já aposentados, os velhos já... jogando, não sei se aquilo chama
.
P/2 -
, que é com que, com...
R - É um taco.
P/ 2- Taco.
R - Cada time é formado por cinco pessoas.
P/2 - Os japoneses mais velhos, é isso?
R - Não, não tem idade, mas são os mais velhos, porque não dá muito esforço físico, então você pratica isso para lazer, né, e também poder ficar em casa, então justamente, é difícil, como digo, é difícil vir na casa do outro, porque uma que trabalho, todo o mundo trabalha, se for nesse meio da semana que... incomoda as pessoas lá.
P/2 - Entendi.
R - Então reunindo no clube, reunindo lá no Kaikan, lá no clube, sabe que todo o mundo vai a hora que quiser, volta a hora que quiser, então não tem problema. Agora que precisa marcar uma hora, para todo o mundo se reunir, né, mas fazem isso.
P/2 - E como é que é o
conta para a gente?
R -
é um campo quadrado, tem um arco que precisa passar a bola, tem três arcos e no fim, vai passando, no fim tem um centro, tem um...
P/2 - Furinho?
R - ...tem um pau em pé, precisa bater nessa bola, né, mas são... como são terras adversárias, então o adversário não deixa passar nesses arcos, quer dizer, vai eliminando, então faz esse jogo, que não cansa.
P/1 - Qual é a origem desse jogo, é japonês?
R - Eu creio que sim, acho que sei lá, se surgiu de repente aí...estava jogando, né?
P/2 - E o Bon Odori, o que é?
R - Bon Odori, esse Bon Odori aí, essa é a lei do templo, da religião japonesa, budista.
P/2 - Tem aqui?
R - É, o [Dia de] Finados japonês é em agosto, 15 de agosto, que é o Finados japonês, dia de Finados, né? Aqui é em novembro, dia 2, né?
P/2 - É.
R - Mas lá no Japão é 15 de agosto, então o… nesse dia, antes que é o
, o “
” chama Finados, aí nesse dia aí... que dizer, que então vai lá visitar os mortos, faz toda a cerimônia, né? Aí, como reunia todo o mundo nesse dia, então eles começaram a fazer festa, começaram a dançar. Então, na verdade, é uma festa religiosa dos mortos, mas como aproveitou esse dia e começou a se reunir e dançar, então foi Bon Odori,
é dança, o
é finados, então como se aproveitou o Dia de Finados para dançar, então puseram “Bon Odori”.
P/1 - Quer dizer, traduzindo fica como?
R - É.
P/1 - A dança dos finados?
R - A dança dos finados.
P/1 - Baile dos finados.
R - Mas não é baile, é uma dança, né?
P/2 - E aonde acontece, aqui no Kaikan?
R - Bon Odori? Bon Odori, aí ,diz que a turma... aqui são na festa, mas
é aquela dança em grupos, né?
P/1 - É a dança japonesa?
R - Japonesa. Então esse
aí, diz que, é, em qualquer ocasião festiva, antigamente dançava, então não é todo mundo, as moças que... moço, não precisa ser moça, pode ser rapaz também, aquele que tem... que quer dançar, dançava, né, é isso aí. Quer dizer, então precisa ter aquele gosto de querer dançar e não é em qualquer lugar que vai dançar também. Aqui no Parque do Carmo tem um Jardim de Cerejeiras, parque da cerejeira lá, isso todo o ano faz Festa de... da Cerejeira, no mês de agosto.
P/1 - Por que agosto?
R - Porque tem muito, é a hora que a flor...
P/1 - Abre as flores.
R - Abre a flor, aproveitando o dia da flor, que é... Então nesse dia... então essa Associação Parque do Carmo aí, que tem Jardim das Cerejeira e é mantido por vinte e três... vinte e duas associações da Zona Leste, então nesse dia reúne todo o mundo e nesse dia então o presidente da associação dos mantenedores do parque da cerejeira, então convida todos aqueles que dançam para fazer Bon Odori lá.
P/2 - Ah, é?
R - É.
P/1 - E parceiro, podem ser homens também?
R - Podem ser homens também.
P/2 - Homens e mulheres?
R - Pode ser, isso é, isso é...
P/2 - Como é que é uma...
R - Faz uma roda, então toca a música e vai dançando, vai sempre circulando.
P/1 - Todo o mundo de kimono?
R - É, todo o mundo de kimono.
P/2 - E a música, tem uma música?
R - Tem uma música lá, tem vários tipos de música, né, então toca lá e eu sei que tem muita gente que vai na escola, vai no clube, tem uma professora que ensina dança e nesse dia eles fazem essa demonstração.
P/1 - E vai muita gente assistir essa festa?
R - Vai muita gente sim, no Parque do Carmo.
P/1 - Que não tem nada a ver, que não é japonês, nem nada?
R - Tem, vai, vai muita gente.
P/2 - E além dessa festa Bon Odori, quais são as outras festividades tradicionais aqui da colônia de Itaquera?
R - Olha, Bon Odori é difícil acontecer aqui no clube, Bon Odori é difícil acontecer.
P/2 - Mais no Parque do Carmo?
R - Mas só, o que eu vi só no Parque do Carmo mesmo.
P/2 - Sei, e aqui?
R - Aqui é mais festa junina, é, acho que festa junina, tem um tradicional... atividade tradicional do japonês, é a tal de Undokai, né? É grupo... como é que é? Festa poliesportiva chama.
P/2 - Ah, como é que é essa festa, seu Yuichi?
R - É uma festa, que isso vem da tradição japonesa mesmo, lá no Japão, da própria escola, diz que fazem isso, é, reúnem toda a família, leva lanche, vai no local, no campo, e tem várias atividades, provas de atletismo, prova... outras provas, uma gincana em si. Então fica o dia todo desde cinco anos, a criança de dois anos a três anos, até setenta, oitenta anos participa, o dia todo dessa gincana aí. A gente chama de Undokai, fica uma festa, participa o dia inteiro. Devia conhecer um dia.
P/2 - É? Não conheço essa.
R - No clube japonês tem, todo o ano chega no mês de maio, começa no mês de maio até setembro.
P/1 - Todo o fim de semana?
R - Não é fim de semana, conforme a região, conforme a região marca...
P/1 - Um dia?
R - ...um dia do ano.
P/1 - Ah, tá.
R - Itaquera, por exemplo, é dia... é tradicional, dia primeiro de maio, no dia primeiro de maio tem esse Undokai, aí já é tradicional.
P/2 - Seu Yuichi, voltando um pouquinho, na sua juventude, como é que os amigos se divertiam aqui, tinha cinema, o que faziam além do clube, fora daqui da colônia também, ia até o cinema?
R - Tinha uma época que quando começou a se comprar carro, pegava o carro e ia para o cinema; para ir para salão de baile, naquele tempo não tinha muito salão de baile, mas ia muito sair por aí, passear, né? Mas o pessoal ficava mesmo no clube, todo o fim de semana ia no clube, aí, por exemplo, atualmente, que nem tem tênis de mesa, que é o mais ativo aqui no Itaquera Nikkey Clube, então treina três vezes por semana a noite aí, depois tem sábado e domingo, e tem... como tem várias atividades esportivas, ele vai para praticar esporte.
P/1 - E tem esportes aquáticos?
R - Não, não.
P/1 - Tem piscina?
R - Tem piscina para lazer só. Recreativa só, é muito rasa também, né?
P/1 - Agora me diz uma coisa, o senhor educou seus filhos falando japonês?
R - Não.
P/1 - Eles não falam japonês?
R - Não falam.
P/1 - O senhor fala?
R - Para o meu uso, né, o meu gasto.
P/2 - E o senhor chegou a ir nos cinemas lá na cidade, exibiam filmes...
R - Já, já, antigamente tinha três cinemas lá na cidade.
P/2 - Quais eram?
R - Cine Niterói, Cine Tokyo e Cine Jóia, que passavam filmes japoneses lá.
P/2 - Onde era?
R - Um ficava na Galvão Bueno, o Cine Tokyo ficava no... antigamente ficava na São Joaquim, depois foi para a Tomás de Lima, né, Tomás de Lima, Tomás de Morais, naquela região da Liberdade lá, e tinha o Cine Jóia que ficava atrás da Liberdade lá, avenida Liberdade.
P/2 - E que filmes vocês viam lá?
R - Olha, todo o tipo de filme japonês, né, desde aqueles dos tempos dos samurais, que batiam nos feudais, né, e tempos modernos para cá, então todo o tipo de filme, era acho que mais diversão ir no cinema na cidade, mas ficava mais tempo aqui no clube.
P/2 - Ia sozinho para lá?
R - Muitas vezes ia turma.
P/2 - Em turma?
R - É. Aí no início, início de 1960 assim, primeiro de janeiro, eu ia assistir cinema lá no Cine Niterói.
P/2 - Ah, é?
R - Ia com a turma lá.
P/2 - E como é que se locomovia até lá?
R - Ia de ônibus, nessa época tinha ônibus sim.
P/2 - Nessa época já passava?
R - Passava, ia de ônibus.
P/2 - Entendi, tá certo. Ai, eu queria que o senhor voltasse um pouquinho na época da instalação da eletricidade, o senhor lembra?
R - Aquilo foi uma obra, o próprio pessoal da Light naquele tempo, naquele tempo era Light, foram dizer que nunca fizeram uma instalação tão grande como essa aqui da colônia.
P/2 - Ah, é?
R - É, que aqui na colônia tem quatrocentos alqueires, né, foi feita a instalação para todo o mundo nessa ocasião, então lá no clube, lá na Itaquera, no clube tem uma pedra fundamental do início da eletrificação da colônia de Itaquera, é, tem uma pedra lá.
P/2 - Que ano que foi?
R - Acho que aquilo foi em 1951, viu, então foi feita toda a eletrificação aqui na colônia, naquela ocasião.
P/1 - Nas ruas, mas nas casas já tinha?
R - Não, quer dizer, não tinha nem poste, não tinha fio, que fez pondo...
P/1 - Mas e dentro da casa?
R - Não, justamente nessa ocasião... Quer dizer, naquele tempo a Light fazia a instalação nas ruas e a gente fazia a instalação dentro de casa e quando chegavam já iam ligando, né, então é uma coisa quase junta, né?
P/1 - Que ano foi isso?
R - 51.
P/2 - 51?
R - 1951, 1952, acho que 52.
P/2 - E o que mudou assim na vida de vocês com a chegada da luz?
R - Antes de vir a eletricidade comprava rádio que funcionava a base de pilha, aquelas pilhas grandonas, comprava aquilo que funciona, aí quando veio a eletricidade, então todo o mundo já com rádio ligado na eletricidade, né?
P/2 - Que mais?
R - Aí comprou, começou a comprar geladeiras, é que geladeira era novidade naquela ocasião, né, então foram melhorando as coisas, aí um comprou uma geladeira, um comprou uma... aí eu acho que em 1960 começou a comprar televisão, né, 60 começou a entrar televisão.
P/2 - E os telefones?
R - Telefone foi bem depois, telefone foi em 69, se não me engano, quando entrou a primeira linha. Antes tinha, mas telefone de manivela, que põe em... caía na central de Itaquera, depois dava completada a ligação para São Paulo assim, era com esse sistema demorado.
P/1 - Demorava para ligar?
R - Demorava, e não tinha tanta linha também, né, então era assim, era muito precária a telefonia.
P/2 - E tinha correio por aqui antes disso tudo? Como é que vocês se correspondiam com os parentes do Japão?
R - Tinha, em Itaquera tinha correio, ia até Itaquera, colocava no correio de Itaquera.
P/2 - A comunicação era toda por cartas?
R - Isso.
P/2 - Entendi. E o calçamento das ruas, veio quando?
R - Aqui foi feita em 69, foi asfaltado aqui. É que aqui, essa colégio aí das freiras...
P/2 - Como é que chama mesmo?
R - Carlos Brunetti. Em 1948 teve a primeira festa do pêssego, veio prolongando aqui, a festa do pêssego... porque tinha dificuldade de colocação no mercado a fruta, então, para efeito de propaganda, começou a fazer festa do pêssego, né, veio até 1970, só aqui teve dezoito festas, dezoito, dezoito vezes a festa do pêssego.
P/2 - Descreve essa festa para a gente, seu Yuichi.
R - A festa mesmo consistia mais no número de pêssegos, então naquela ocasião não tinha festa, festa de nada, festa de pêssego aí começou, depois a gente começou a festa do morango, festa de uva, festa não sei o que... aí fizeram um montão de festas, aí um das primeiras festas, assim, que os produtores faziam, né... mas é mais para comercializar, propaganda para...
, né? Aí naquela ocasião, o que fazia? Ia na Secretaria de Cultura e fazia propaganda, imprimia todos aqueles folhetos para fazer propaganda e montava aqueles palanques, palanques no dia, para fazer shows, trazer alguns cantores, alguma coisa, né, e depois fazia exposição de... de frutos, pêssego era principal, nós apresentamos, conseguimos fazer quererem conhecer a exposição. Exposição e fazia concurso de prêmios também, melhor produto, né, então naquela ocasião tinha o pêssego, granja, verduras, flor não tinha naquela época não.
P/2 - E como é que escolhia o melhor produto?
R - Aí tinha comissão de premiação, fazia a seleção.
P/2 - Mas quais eram os critérios que eles tinham?
R - Eu nunca falo, porque eu não sei como é que é, então pegava o agrônomo da casa da... antigamente tinha casa de lavoura, secretaria de cultura, né, pegava agrônomo de lá, pegava entendida no... na fruticultura, as coisas, pegava mais ou menos meia dúzia de pessoas, fazia classificação aí.
P/2 - Entendi. E a rainha do pêssego, não tinha um festival?
R - Rainha do pêssego, sempre colocava rainha do pêssego, primeira, primeira rainha do pêssego, colocou essa vizinha que mora em casa, naquele dia consta, no livro consta, a primeira foi Kazuko Okada.
P/2 - Kazuko Okada?
R - Foi a primeira, mas ela, naquela ocasião, era difícil falar português, não tinha esse desembaraço.
P/1 - Que ano era esse?
R - Isso em 1948.
P/1 - Foi a primeira festa?
R - Primeira festa. Então não tinha... colocou ela, mas não falou um pio, se não me engano, turma lá perguntava, não sabia falar não, era toda acanhada, tímida, entendeu, sei lá.
P/2 - E era venda de voto?
R - Não, era verdade, aquela primeira não foi venda de votos.
P/2 - Ah, não?
R - É.
P/2 - Era beleza mesmo?
R - Beleza, beleza, você vai ser Rainha do Pêssego, mas que dessa forma foi, né? (riso)
P/2 - Ah, é?
R - Porque tá com kimono, né, a lá.
P/2 - Ah, ela punha um kimono?
R - Pôs, foi kimono naquela primeira festa do pêssego.
P/2 - Ah, tá. E quem que escolheu a sua vizinha?
R - Naquela ocasião, quer dizer, em 1948, eu tinha oito anos, são nove anos só, né?
P/2 - Ah, tá.
R - Eu não sei como é que fizeram, mas sei que o pessoal...
P/1 - Ela tinha quantos anos?
P/2 - Não, ele tinha oito anos.
P/1 - Ah, tá.
P/2 - E aí nas outras passou a ser venda de votos?
R - Que depois disso tinha a rainha e as princesas, geralmente eram cinco pessoas, a rainha e mais quatro princesas, então para decidir, definido isso, era venda de votos, uma maneira de fazer fundos.
P/2 - E os fundos eram revertidos?
R - Na festa do pêssego.
P/2 - E tinha brasileira que participava da competição?
R - Tinha sim.
P/2 - E chegou a ganhar alguma vez?
R - Creio que não.
P/2 - Mais as japonesas?
R - É, porque naquele tempo, pêssego era uma potência, né, e quem tinha produção boa de pêssego eram os japoneses.
P/2 - Entendi.
R - E quem tinha filha que se candidatava para ser princesa ou rainha da festa do pêssego, os pais soltavam, pagava bem.
P/2 - Entendi.
R - Comprava bem os votos.
P/2 - Aí era difícil de competir, né?
R - Era difícil mesmo, os japoneses são, olha, gastam dinheiro que é uma coisa incrível, impressionante, viu? (riso)
P/1 - Escuta, por acaso houve alguma visita aqui do príncipe do Japão, esteve aqui o príncipe, quando ele veio para o Brasil?
R - Eu não lembro essa história, eu não lembro dessa passagem não.
P/1 - Não teve príncipe, não teve...
R - Veio um príncipe aqui no Brasil...
P/1 - Veio.
R - ...mas aqui em Itaquera não.
P/1 - Ah, é, Itaquera.
P/2 - Seu Yuichi, ah desculpe Marina.
P/1 - Ele passou na Liberdade.
R - Ah, sim, no centro ele sempre passa, no centro é o...
P/1 - Aqui não veio?
R - Não.
P/1 - O senhor não foi lá ver?
R - Eu fui ver no Pacaembu, porque fizeram foi setenta anos, sei lá, sessenta anos da colônia, da imigração japonesa, fizeram lá no Pacaembu.
P/2 - Ah, é, no ginásio?
R - Não, não, no Estádio do Pacaembu mesmo.
P/2 - No estádio?
R - É. Eu fui lá uma vez ver o príncipe lá, antes de... agora é imperador, né?
P/2 - E aqui, eu queria que o senhor contasse um pouquinho sobre o aquário, como é que é lá?
R - Aquário, aquela história do aquário é o seguinte: o dono do aquário lá recriou as carpas, e o sangue da carpa, diz que é bom para bronquite, então aqui japoneses às vezes come o "ikititi". "Ikiti", quer dizer, é sangue da carpa vivo.
P/2 - Como é que diz esse nome com...
R - “
é vivo, “
é sangue.
P/2 - Tá.
R - Então, se tomasse aquele sangue da carpa, disse que muita gente curava a bronquite. Então ele começou a oferecer... oferecendo não...
P/2 - Vender.
R - … vender o sangue da carpa, aí começaram a reunir pessoal, lá no... no aquário lá, então todo o... porque é na parte da manhã que pega carpa, se a pessoa está interessada, então vai lá, compra a carpa... porque não é qualquer um que tira sangue lá, tira o sangue, disse que dá uma colher de sopa, né, de sangue, é ruim de tomar, mas se a pessoa, assim, normal também tomar, disse que quem está debilitado...
P/2 - É?
R - ...dizem que é espetacular, dizem que é bom.
P/1 - Que bom, já tomou?
R - Eu nunca tomei.
P/2 - E ainda faz isso lá?
R - Faz. Aí... aí começaram a juntar o pessoal, então, naquela era depois do pêssego, passou essa era do pêssego, da fruticultura aqui na colônia, então era a era das plantas ornamentais. Nessa época aqui, que então, como reunia a pessoa lá... aí começaram a reunir, não tinha nada nesse aquário, não tinha nada, praticamente nada, só a cria, carpa e mais nada, não tinha mais que ver lá, mais o pessoal começou a vir aqui, de fim de semana, enchia o aquário aí.
P/2 - Pessoal de onde?
R - Mais de Santo André, São Bernardo que vinha.
P/2 - Não japoneses?
R - Não, não, não. Aí o pessoal aqui que plantava essas coisas começou a vender na... fora da... da cerca para fora do aquário, começaram a montar barraquinha de domingo e começaram a vender plantas aí. Aí, um dia veio o fiscal da prefeitura aí, da regional de Itaquera, e multou todo o mundo, então o dono do aquário falou assim: “não, já que é assim, então passa para dentro da cerca”.
P/2 - Ah!
R - Aí passaram para dentro da cerca, até não cobrou nem um centavo da área que eles exploram, entende, do pessoal que vende lá no aquário, tudo isso. Aí começou a vir mais gente para comprar as plantas, e cada um ficou com um pedaço assim, marcava sobre seus pedaços e cada um começou a montar suas barraquinhas, por conta própria. Aí foi crescendo, foi crescendo, que todo o mundo queria espaço lá para vender as coisas, aí disse que o negócio ficou um comércio, de uma hora à outra, ficou um comércio tal, que ultimamente se você fala em aquário, todo o mundo conhece, aí montaram bar, montaram padaria, montaram não sei o que, restaurante, vai montando, aquilo vai crescendo... A única pessoa que ganha dinheiro na porta da cozinha é esse aquário, porque começou a vender sangue na porta da cozinha, aí começou a mexer fruta, que tinha produção de fruta, e logo eles começaram a vender sanduíche, aí foi crescendo, foi crescendo de uma tal forma, naturalmente, foi crescendo esse aquário aí.
P/2 - O senhor não vende lá?
R - Eu não, não vendi, nunca vendi.
P/1 - As carpas são aquelas coloridas, ou é aquela carpa marrom?
R - Cor... aqui a carpa não é, aquilo é carpa, carpa é peixe ornamental, entende, não era peixe ornamental...
P/1 - É aquela que vive...
R - ...é aquela grande mesmo.
P/1 - Aquela que vive na lama.
R - É.
P/1 - Mas aquela ornamental também é carpa?
R - É carpa, mas aquela é para ornamental só.
P/2 - Só é de enfeite?
R - É, não é para tirar o sangue e dar.
P/2 - E tem um pesqueiro que é lá também?
R - Pesqueiro fica desse lado de cá, aquele já é outro dono.
P/2 - Ah, é?
P/1 - Também é japonês?
R - Também, mas aqui é... pode andar por aí que todo o mundo aqui vai ser japonês, fora indústria que entrou depois, 1970, no tempo do prefeito, eu não sei que prefeito que era em 1970, construiu área industrial aqui na colônia, então dividiu a cidade em zonas. A prefeitura... a prefeitura, câmara lá, dividiu a cidade em zonas, então tem Z1, Z2, Z3, Z4 até Z8, e aqui em Itaquera era Z8, zona 17, é, 17, zona especial...
R - ...então, naquela ocasião lá, começou a dividir a zona e na cidade muito pessoal do… da Moóca foi obrigado a sair de lá, porque não podia ficar com indústria lá na Moóca, aí começou então a compra de lotes aqui no Itaquera. Nessa ocasião que começaram a aproveitar para vender, todo o mundo começou a vender terrenos aqui, mas venderam sessenta, setenta lotes de terrenos e indústrias compraram.
P/2 - Indústrias de quê?
R - Aqui podia montar indústrias não poluentes.
P/2 - Sei.
R - Se fossem não poluentes, então qualquer indústria poderia vir, então seria... tem aqui indústria de sapato, material para sapato, indústria metalúrgica de torneiras, tem torneiras, tem fábrica, tem três fábrica de torneiras, bolas, tem indústria daquela
, Panco, é... que tinha de torneira, que tem de sapato, lá embaixo tinha bola, isso já tem vários anos, sei que entraram cinquenta, sessenta indústrias aí.
P/2 - Isso foi na década de 70?
R - É, 1970 para cá, até 80 e pouco, né? Aí entrou em crise, aí outras prefeituras começaram a dar incentivo fiscal, deva terreno com terraplanagem pronta, com energia já instalada e incentivo fiscal.
P/1 - Para trazer para cá para...
R - Para outras prefeituras, puxando as indústrias.
P/1 - Para ir para outra, não tem...
R - Aqui em Itaquera o indivíduo comprava o terreno caro, precisava fazer terraplanagem, precisava ver se tinha capacidade de energia para mover todas as máquinas e não tinha incentivo fiscal, pagava imposto, IPTU alto. Aí quando os outros municípios começavam a oferecer todos esses incentivos, então...
P/2 - As indústrias foram embora.
R - ...foram embora, muitas foram embora.
P/2 - Certo. E o pesqueiro que o senhor estava falando?
R - Esse pesqueiro... então, esse homem gostava de... Ao contrário do aquário, ele montou pesqueiro porque ele gosta de represa, gosta da água, então ele criou...
P/2 - É só lazer?
R - É prazer, é para lazer do dono, tem uma lagoa grande para andar de barco lá. Aí entraram nessa história de pesqueiro, né?
P/2 - Como é que funciona?
R - Pesqueiro funciona aqui, paga uma taxa só na entrada, pode pescar o quanto quiser e pode ir embora.
P/2 - E leva o peixe?
R - Leva o peixe. Então...
P/1 - Que peixes tem?
R - Olha, eu sei que tem tilápia, sei que eu não sou muito pescador, então não guardo os nomes dos peixes, mas é pacu, como é que é... eu sei que tem seis ou sete variedades de pêssego, peixe.
P/1 - Lá tem um restaurante e tudo?
R - Não, tem um barzinho...
P/1 - Quem vai pescar...
R - ...sempre tem um barzinho.
P/1 - Uma lanchonete?
R - É, lanchonete. Mas é, aqui na colônia tem vários pesqueiros, tem acho que cinco ou seis pesqueiros, tem aqui.
P/2 - Seu Yuichi, em termos de melhoria de vias de acesso, que mais que teve de construção aqui depois do calçamento da... das ruas, teve a outra avenida grande que é essa aí lá de fora, Jacu?
R - Tem muitas ruas que já estão asfaltadas aqui, porque tem indústrias também, que tem a força aí, política, né, então manda dinheiro para asfaltar e que nem, para sair para o lado de Guaianases, passa pela colônia e tem uma saída aqui, que o pessoal não faz esse caminho, né, então tem várias ruas já asfaltadas...
P/2 - Sei.
R - ...aqui na colônia.
P/2 - E a avenida Jacu Pêssego?
R - Esse avenida Jacu Pêssego é do tempo que foi do Maluf.
P/2 - Ah, tá.
R - Esse Maluf, ele quis fazer uma saída para Santos, ia até via Dutra, né, só que a verba acaba no meio do caminho, então essa própria estrada Jacu Pêssego vai um pouco para a frente, falta um pedaço para terminar as duas pistas, né, e quando chegou lá na estrada de ferro, perto lá do...
P/2 - Da estação antiga?
R - Não, não, não é de São Miguel.
P/2 - Ah, tá.
R - Perto do Trabalhadores, na divisa do Guarujá, então ia lá, chegou lá e o prefeito não fez, teve... não teve um entendimento com o prefeito de Guarulhos, aí parou, aí desvia, né? Mas é, facilitou muito a vida da gente, mas também o movimento de carro, graças a isso, aumentou barbaramente.
P/2 - E antes como é que era? Antes de ter avenida asfaltada, era terra?
R - Não, era...
P/2 - Tinha asfalto?
R - ...já tinha asfalto, só que precisava fazer...
P/2 - Ah, o que ele fez foi...
P/1 - Retificar.
R - Retificar, porque quando saía em São Miguel foi uma coisa simples e fácil, né, mas antes precisava passar por Itaquera, depois tinha o centro de Itaquera, depois passar nas ruazinhas, aí chegar até São Miguel... Agora não, com a Jacu Pêssego é num instante até São Miguel, e para pegar, por exemplo, o aeroporto de Cumbica, foi uma coisa muito fácil, é só chegar no fim dessa Jacu Pêssego, e já pega logo pela Ayrton Senna, e vai para Cumbica, né, Aeroporto de Cumbica.
P/1 - Radial Leste, Jacu pêssego e...
R - Não, não, nem precisa pegar a Radial Leste.
P/1 - Não?
R - Não, facilitou bastante, bastante mesmo.
P/2 - E vocês tiveram aqui problema com abastecimento de água?
R - Aqui não tem água, não é encanada.
P/2 - Ah, não tem água ainda?
R - Não tem água encanada, não tem água encanada.
P/1 - É, tem poço?
R - É poço.
P/2 - Como é que é?
R - É poço.
P/2 - É poço.
R - É, com uma bomba.
P/2 - Ah, mas é na colônia inteira?
R - Não, na Jacu Pêssego já tem.
P/2 - Jacu Pêssego já tem?
R - Jacu Pêssego já tem, aí na vila já tem.
P/1 - E como é que a gente reconhece que está na colônia, tem algum sinal, tem alguma, né, é uma área demarcada?
R - Não, a gente sabe até onde vai, onde é o limite.
P/1 - Mas não tem marca?
R - Não tem marca nenhuma, não tem marca nenhuma. Quem vem de... não sei se, vocês vieram de que lado?
P/1 - Pelo metrô.
R - Metrô, descendo na Estação Itaquera?
P/2 - É, e pegamos um táxi.
R - Pegando um táxi, né? Então lá, quando vem de táxi, não sei se o táxi pegou aquela rua, como é que poderia chamar, é o...
P/2 - É uma que vem pela Santa Marcelina.
R - Veio pela Santa Marcelina?
P/2 - Veio. Acho que ele deu uma voltinha com a gente.
R - Santa Marcelina, ele deu uma... não, ele não deu uma volta grande, mas é um pouquinho mais longe só.
P/2 - É, né?
R - Então, conhece o Parque do Carmo?
P/2 - Sei.
R - Parque do Carmo, aquele Parque do Carmo cercado com aquele cerca de...
P/2 - Ferro.
R - ...ferro, outro lá, quando chega lá em cima, no topo lá, ali começa a colônia.
P/2 Ah, já?
R - É.
P/2 - Desde lá?
R - Então, deve ter a planta da colônia, depois eu dou para ter uma demarcação.
P/2 - Seu Yuichi, a gente já está finalizando, vamos... queria que o senhor contasse para a gente o que mais mudou desde que o senhor veio para cá.
R - Ah, mudou tudo aqui, naquele tempo era sítio, zona rural mesmo, né? Ultimamente deixou de ser zona rural, parece que a área de lazer do pessoal que vende lá da... No início, o que facilitava para mim por ter mudado a situação... porque geograficamente mudou muito a situação, porque antes era assim, estritamente rural, aí foi mudando para zona... mais para semi-urbana, né, porque tem agricultura, a história de pêssego, Jacu Pêssego, é uma cidade já, uma cidade, tem até sinal de rua já tem lá, né, então é uma cidade, tem Carrefour, mas entrando mais cem metros da Jacu Pêssego, ainda mantém a vida de zona rural. Mas isso facilitou para a gente, porque o pessoal vem aqui... que nem, eu trabalho com plantação de flores, então a pessoa procura flores, particular procura as flores.
P/2 - Ah, é?
R - É.
P/2 - Para comprar na fonte, direto?
R - É, comprar na fonte direto, que a gente naturalmente vende.
(PAUSA)
R - É particular. Então aquela pessoa que quer casar, ou aquele pessoa que quer fazer alguma coisa, às vezes, é... quer muito, alguma pessoa da família quer comprar flores, então vem direto aqui na chácara comprar, isso está ajudando muito a nossa venda de flores, se a gente dependesse só de comerciantes, feirantes e lojistas, a situação não estaria nada boa para... tanto para comerciantes como feirantes.
P/1 - O senhor vende cortada, não no vaso?
R - É, isso, cortada. Então isso...
P/2 - Isso mudou muito. E lá no bairro de Itaquera, o que o senhor acha que mudou desde que o senhor veio para cá?
R - Nossa! O que tem de gente nova em Itaquera é uma coisa... o que tem de comércio, todo o comércio que a gente imagina ter, já tem em Itaquera.
P/2 - Antes não era assim?
R - Não era assim não, bancos também, tem uns sete, oito bancos já. Então Itaquera virou uma cidade mesmo, o que no centro faz, aqui em Itaquera já tem, tem tudo.
P/1 - E nisso tudo como é que entra o metrô na sua opinião, ele facilitou, o que é que o senhor acha?
R - Nossa senhora! Quando pegava, antes era ônibus, levava uma hora e vinte, uma hora e meia, do Parque Dom Pedro para chegar em Itaquera, agora em trinta minutos está em Itaquera.
P/2 - O senhor já andou de metrô?
R - Ando sempre.
P/2 - Ah, é?
R - É.
P/2 - O senhor pega o metrô aqui de Itaquera?
R - Pego, como tem estacionamento lá em Itaquera, lá na estação do metrô, deixo o carro lá e vou de metrô.
P/2 - Olha... E qual foi a sensação de andar de metrô pela primeira vez?
R - Eu andava de trem, não é mesmo, antigamente só andava de trem, mas só que é mais rápido...
P/2 - O metrô?
R - O metrô, o trem chegava, levava uma hora... levava uma hora para chegar até a estação do Brás.
P/2 - Ah é?
R - É. Não tem hora para chegar, não tem hora para sair, não tem hora para pegar o trem, então não tem hora para chegar lá onde a gente vai chegar, né? Ficava parado muito tempo na estação, agora tem um, eu falo, bom é que meia hora já estamos no centro, então isso facilita muito a...
P/1 - O senhor não usa mais o trem?
P/2 - Não, trem agora...
R - Tem, tem, tem o trem agora também.
P/2 - Tem é?
R - Tem, mas o trem é...
P/1 - Mas o senhor não usa o trem?
R - Não, não uso.
P/2 - Faz quanto tempo que desativaram a antiga ferrovia, o senhor sabe?
R - Foi agora (tosse) (PAUSA) setembro, inaugurou em agosto.
P/2 - Esse ano?
R - É.
P/2 - Ah, é super recente então?
R - Super recente.
P/2 - E o metrô, o senhor lembra da época da inauguração? O senhor foi?
R - Não, não fui, não fui na inauguração do metrô, não.
P/2 - E o senhor ouviu falar alguma coisa, como é que estavam indo as obras?
R - Olha, eu passava mas nunca, é… nunca cheguei a interessar não, isso... eu sei que estava fazendo essa obra, né, mais primeiro chegou até Tatuapé, depois estendeu até Artur Alvim, para Patriarca, depois até Itaquera, né, porque vem em etapas.
P/2 - E a população queria o metrô?
R - Ah, sim, porque... apesar que ultimamente já está numa situação de Deus nos acuda, de tão cheio que vai, né, no horário do pico, mas é uma... pelo menos é uma condução muito fácil e muito rápida, né?
P/2 - Seu Yuichi, e as Cohabs?
R - As Cohabs, eu não sei se isto foi bom ou ruim, porque o que aumentou de gente em Itaquera é por causa dos Cohabs.
P/2 - Ah, é?
R - É, tem Cohab I e Cohab II, né, Cohab I fica no Artur Alvim e Cohab II fica aqui, mas o que aumentou de gente...
P/2 - Mudou muito a fisionomia do bairro?
R - Ah, mudou, mudou.
P/2 - Por que? Como o senhor vê antes...
R - Porque antes, antes você via, naquele tempo da colonização, que a gente conhece um pouco o colono, só via japoneses, né, agora não vê mais japonês, difícil ver japoneses.
P/2 Ah, é?
R - É pouco o japonês que vê por aí andando.
P/2 - Na rua?
R - Na rua.
P/1 - Para onde foram os japoneses?
R - Quer dizer, a comparação fica entre dez por um aqui, então diz que não aparece mais.
P/1 - E que tipo de gente é essa da Cohab?
R - É gente mais baixa.
P/2 - Baixa renda.
R - Baixa renda mesmo. Então não sei se minha colocação vai ofender ou não, mas é, não sei porque quando uma pessoa pobre consegue alguma coisa fica muito arrogante, aí se pensa que é o tal. Então esse colégio aqui é pago, quando alguma coisa sai de errada, então a bronca além do que a gente imagina, né, exige demais, eu acho que essa diferença que está criando.
P/2 - Seu Yuichi, e como que o senhor gostaria que esse bairro tivesse daqui assim a cinquenta anos, como o senhor gostaria que ele fosse?
R - Olha, eu não pensaria muito no futuro não, (risos) mas é, a gente vai ficando imaginando como é que vai ser, a gente pensa isso, mas como é que vai ser agora a frente...
P/2 - Como o senhor acha que vai ser?
R - Aí eu nunca pensei, acho que não tenho idéia de como que vai ser não.
P/2 - E o senhor tem assim, perspectivas otimistas ou pessimistas pelo bairro?
R - Eu acho meio pessimista, né? Porque pessimista? Porque o desenvolvimento da gente é que como agricultor não vai ter espaço, porque se plantar alguma coisa comestível, tanto verdura, como fruta, a gente não tem vez de colher, porque é roubada.
P/2 - É o quê?
P/1 - Roubo?
R - É roubado, né, invadem aí e pegam.
P/2 - É mesmo?
R - É. Eu não sabia que tinha cana-de-açúcar em casa, em cima, antes, agora eu sei que tem e aumentou bastante. A cerca arrebentada, entende, e chupando cana na rua, é, é consequência de quê? É que desenvolveu e que o pessoal está sempre de olha nas comidas.
P/2 - Sei.
R - Então eu sou, eu fui obrigado a cortar toda a cana, mas cana sempre brota, então ultimamente não sei a... eu ouvi gente dizer que a história de uma constituição de uma cidade, disseram que passa em várias fases, né, primeiro vem o povo, planta as coisa, a agricultura que vem, depois a agricultura, não é agricultura que vem primeiro... os coitados, quer dizer, não tem onde morar, então faz as barraquinhas e começam a morar, aí vem os loteadores, loteamento de terreno, e vem com loteamento mais ou menos que faz umas casas, aí vai, que a cidade vai crescendo, então a classe média e esse pessoal vai mais para o fundo, então é assim que vai constituindo a cidade, né? Essa vila aqui no lado... Aqui, no início era uma cidade, um bairro, chama Jardim Cibele, né, mas lá era um lugar que não podia chegar de noite que era perigoso, era só assaltante, tinha muito, tem também, tem um montão de gente que a turma diz, eu não sei o quê, quem tem comércio lá, faz que aquilo assalta, aquilo é maconheiro, aquilo é fuma drogas, não sei o que, então conta, né? Tem, mas hoje já tem gente que faz casas bonitas aí, então está mudando a fisionomia da vila, está mudando para o lado bom isso aí, mas antigamente era... tinha uma época que era um assalto atrás, um ladrão dentro da chácara, que eu planto flores e é iluminada a noite, então roubava fios, fios isso já foi dez anos atrás, mas eu fui roubado onze vezes aqui. Fio.
P/2 - Nossa! Fio?
R - Fios.
P/2 - Da onde?
R - Porque na chácara todas aquelas estufas lá que tem, têm iluminação, então carregava os fios, isso já acabou, né, graças a Deus.
P/1 - E hoje como é que o senhor faz para vender suas flores?
R - Eu vendo tudo aqui.
P/1 - Aqui mesmo?
R - Aqui
P/1 - As pessoas vêm buscar.
R - Os comerciantes vêm buscar, os particulares vêm buscar, então vendo tudo aqui.
P/2 - Seu Yuichi, como é que é sua rotina hoje? Seu dia-a-dia?
R - Como qualquer um que... minha rotina seria... É curioso, meus empregados trabalham das sete da manhã e vão até cinco e meia da tarde, então a gente começa às sete horas da manhã e vai até cinco e meia, mas se o empregado vai embora cinco e meia, dispenso cinco e meia porque é a hora deles pararem, mas eu vou até o escurecer, né, fico trabalhando.
P/1 - Sozinho?
R - Sozinho, porque sempre na chácara tem muitas coisas para fazer, então fico aí, mas também tem muitas coisas que precisa fazer, passar no banco, comprar, comprar mercadorias, insumo aí para a chácara, então eu saio bastante também, e ainda mais, tem o lado desse sindicato rural que toma um pouco de tempo da gente também.
P/2 - Ah, tá. Porque o senhor exerce uma atividade lá?
R - É.
P/2 - O que o senhor faz lá?
R - Eu faço parte da diretoria, eu sou vice-presidente lá.
P/2 - Onde fica?
R - Fica, apesar de ser uma associação, um sindicato rural, né, fica lá no centro.
P/2 - Nossa!
R - Centro da cidade.
P/2 - Super movimentado?
R - É, fica... ninguém acredita que tem uma sede lá no centro da cidade, né, fica no centro da cidade.
P/2 - E aqui os agricultores são todos sindicalizados?
R - Não são todos não, não são todos.
P/1 - E o senhor é... eu esqueci o que eu...
P/2 - Ah não, tudo bem.
P/1 - Ah, as flores que o senhor vende, já perguntei.
P/2 - A gente está já finalizando, só para terminar, o senhor tem netos?
R - Tenho, uma neta.
P/2 - Vamos dizer o nome dela.
R - É Milena Ide, que mora em Caxias do Sul.
P/2 - Quantos aninhos?
R - Completou um ano agora.
P/2 - Um ano. Seu Yuichi, e que lições o senhor tirou da sua experiência de vida e que o senhor gostaria de deixar registrado?
R - Nossa senhora! Uma pergunta muito intelectual, não? (risos) Mas olha, são coisas que como a gente acostuma a tirar copia do outro, né, então não tem essa de fiques, não tem essa de... Não sou pioneiro, mas coisa que... se fosse pioneiro, devia ser um pesquisador, então queria deixar uma coisa na vida para o próximo, né, mas é como... eu só copio o que os outros fazem e trabalho para a minha sobrevivência, né, então não tenho nada que dizer para deixar uma lição de vida ou alguma coisa para deixar para o futuro, alguma coisa, eu não tenho não.
P/2 - Tá certo.
P/1 - O senhor vive com quem hoje, mora com quem?
R - Eu e minha mulher.
P/1 - Só?
R - Só.
P/2 - Nesse período já tomaram cada um...
R - É... um está lá no Sul, tenho mais dois, o segundo está lá, lá com os gerente lá do supermercado, então ele fica lá praticamente o dia todo até a tarde, então não volta para cá, e minha filha está desempregada, mas está fazendo cursinho para ser... procura aquela carreira de promotora, ou juiz, ou fiscal de trabalho, então ela está fazendo isso.
P/1 - Eles não moram aqui, moram lá?
R - Moram lá na cidade, então ficam na cidade.
P/1 - Cidade o senhor quer dizer centro de São Paulo?
R - Cidade que a gente se refere é sempre de São Paulo, não do bairro.
P/2 - E o senhor tem algum sonho que o senhor gostaria de realizar? Sonho na sua vida?
R - Olha, eu gostaria de ir no Japão.
P/2 - Ah, é?
R - Gostaria de conhecer o Japão, agora se tiver coisa que... eu penso como ultimamente a situação está difícil para todos, antigamente fazia... agora cuido dos meus filhos, os filhos depois dão sustento para os pais e a gente vai passear um pouco, mas como não temos estas condições, então eu acho que tenho que trabalhar mais um pouco, para enquanto puder trabalhar, eu prefiro trabalhar, e minha mulher já acha que quer mais passear, viajar, disse que já está cansada, então quer parar, mas é, não tem condições de fazer isso, porque eu vejo pela situação dos meus filhos, eles também lutam para conseguir sobreviver. Quer dizer, eles não conseguem comprar apartamento, não viajam muito, porque não têm condições, então a gente não dá para apelar para os meus filhos: “ó, sustenta a gente”, então precisa lutar para a minha sobrevivência, para não ficar pedindo, para não pedir dinheiro para eles que cuidam da gente, né?
P/2 - Mas se o senhor tivesse condições, seu sonho seria ir para o Japão?
R - Conhecer Japão, não só conhecer Japão, mas poder viajar um pouco, né?
P/2 - Está bom, seu Yuichi, a gente agradece muito a sua entrevista, foi ótima, viu?
R - Bom, se você vê alguma coisa, está muito bom.
P/2 - Está bom, muito obrigada!
Recolher