IDENTIFICAÇÃO
Meu nome é Ney Robinson. Sou natural de Juiz de Fora, Minas Gerais. Nasci no dia 03 de março de 1950. Eu até brincava com a minha mãe (que ficava brava), dizendo que ela não precisava ter feito isso comigo, ter deixado eu nascer em Juiz de Fora (risos). Toda a família é de lá...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO
Meu nome é Ney Robinson. Sou natural de Juiz de Fora, Minas Gerais. Nasci no dia 03 de março de 1950. Eu até brincava com a minha mãe (que ficava brava), dizendo que ela não precisava ter feito isso comigo, ter deixado eu nascer em Juiz de Fora (risos). Toda a família é de lá, muitos primos, muita brincadeira.
FAMÍLIA / PAIS
Minha mãe se chama Angelina Salvi dos Reis, e meu pai, Luthero Costa dos Reis. Meu pai é de Petrópolis e a minha mãe é de Juiz de fora. A família toda da minha mãe é de Juiz de Fora e a família toda do meu pai é de Petrópolis. Não tenho irmãos, sou filhinho único (risos)
INFÂNCIA
Não cresci em Juiz de Fora, por isso que eu falei que implicava com a minha mãe, pois logo que eu nasci o meu pai teve um problema, foi logo no pós-Guerra. Ele era lapidário de pedras preciosas, e o dono da lapidação convenceu a ele e ao meu tio, de que [aquele] era um bom negócio. Eles já trabalhavam naquilo, então, eles compraram do antigo dono a lapidação. Mas logo depois veio a falir, porque o negócio ficou ruim. Como eu nasci em 1950, em março, no final do ano o negócio já estava mal, aí eles tiveram que caçar (risos) outras oportunidades e vieram para o Rio de Janeiro. Vim para o Rio antes de um ano de idade, e fomos morar no Catete, onde eu moro até hoje. O meu tio continuou em Petrópolis, mas o meu pai veio correr atrás, veio ser motorista de caminhão, depois, motorista de ônibus e, depois, chofer de táxi. Eu cresci no meio dessa mecânica, foi aí que eu comecei a gostar de mexer com essas coisas. Sempre ajudava meu pai a consertar o carro no fim de semana. Cresci no Catete. A casa era humilde, pequena. Primeiro nós moramos num quarto de uns portugueses. Logo que chegamos aqui foi o que o meu pai e a minha mãe conseguiram. Os portugueses eram maravilhosos, eu adorava Seu Orlando e Dona Júlia; ela fazia tremossos. O dia que ela fazia tremossos era uma festa, (risos) ela botava tudo de molho no tanque, tinha cachorro e gato, a casa era uma festa. Quando eu a via chegar com um saco de papel, da feira, (risos) eu já sabia que ia ter festa; tinha todo o ritual: ela enchia o tanque, botava os tremossos de molho. Eu sabia que na semana seguinte ia ter tremossos para comer, adorava aquele negócio de apertar o tremosso, ele pular dentro da boca. Fomos morar com essa família, Seu Orlando e Dona Júlia, que me ensinaram um monte de coisas. O Seu Orlando era um portuguesão forte, tinha sido lutador de luta livre em Portugal e aqui no Rio ele era representande de sardinhas, vendia sardinhas, Sardinhas Fidalga. Ele tinha uma bolsinha de couro que tinha sempre umas três ou quatro latinhas de sardinhas ali dentro (risos). E ele estava tentando fazer sardinha na casa dele, tinha um quintal grande, então, a gente fazia muitas experiências, a gente, não, ele fazia e eu participava, sempre ali coladinho com ele e o meu pai trabalhando Eles tinham uma filha, a Rosa Maria, mas eu não me lembro muito bem dela, eu nem sei onde ela ficava, (risos) sei que eu ficava lá brincando com eles. Aprendi a caçar passarinho com Seu Orlando. Hoje já não caço mais, não é legal, mas ele tinha uma espingardinha de ar comprimido. A Dona Júlia também me ensinava a fazer comida. Eu tive vários pais e várias mães. Foi muito bom Tinha outras crianças na vizinhança, nós soltávamos muita pipa, balão, jogávamos bola de gude e brincávamos de polícia e ladrão, o que era muito bom. Eu queria ser sempre o ladrão, ser “polícia” era muito chato (risos) Eu tinha mais uns colegas e a gente gostava de ser o ladrão pelo seguinte: na hora que se escolhiam os times, a gente ia ser ladrão, o “polícia” tinha que sair correndo atrás da gente, como numa boa história, e tinha dias que eu e esses colegas íamos embora para casa (risos) e o cara ficava procurando a gente um tempão, (risos) era muito legal Eu morava entre o Morro de Santo Amaro e a rua Tavares Bastos – hoje está complexo lá -, mas o mais bacana era soltar pipa de um morro para chegar no outro, cruzar a pipa no ar.
AVÓ / RELIGIÃO
Minha vó me ensinou a fazer as minhas pipas, é aquela bem definida, aqui no Rio chama-se “cafifa”, a pipa carioca. Em Petrópolis, aonde eu ia passar as férias, era a “raia”, a pipa que quando você puxa, ela inverga, é muito legal; é pipa sem rabo. A minha avó que me ensinou, ela me ensinou a fazer um monte de coisas. Minha avó, mãe do meu pai. Ela era professora primária, a “Dona Irene”. Se chegar em Petrópolis e falar da “Dona Irene”, todo mundo conhece, ela já é falecida, infelizmente. Ela sabia de tudo Não sei onde aquela mulher tinha tanto tempo para fazer de tudo, ela estava sempre disponível, é impressionante A gente chegava em Petrópolis e ela estava lá com um chale prontinho para minha mãe, eu falava: “Como é que você faz isso?”. Ela ficava tricotando de noite. Adorava ler Eu achava bonitinho, de noite, todo mundo já nos seus nichozinhos para dormir, ela abria o livrinho dela, lapisinho, lápis tinta, molhava assim e saía sublinhando as passagens do livro que ela gostava mais. Depois eu descobri que o livro era a Bíblia, ela tinha uma religiosidade muito forte. Ela não conseguiu muito passar isso para mim. Na hora de preencher a ficha aqui, vocês me perguntaram: “Qual é a religião que você tem?”, eu falei: “Todas”, porque eu acredito em tudo. A gente aprendeu essas coias mais com os amigos, na rua. Eu lembro que a minha mãe ia à missa ao domingo, de vez em quando tinha que ir. Eu fiz primeira comunhão, terninho branco, brilhantina no cabelo, (risos) lá fui eu, queimando a mão com aquela vela pingando. (risos) Foi muito legal, foi no Largo do Machado. Mas a gente não era fanático
FAMÍLIA / PAIS
Minha mãe era a maior autoridade na casa. Meu pai trabalhava muito, ele teve um período difícil, porque como veio para cá com “uma mão na frente” e a outra eu nem sei onde é que estava, ele teve que trabalhar muito. Começou trabalhando como motorista de caminhão, depois arrumou emprego no desmonte do Morro do Castelo, onde hoje é a Petrobras. (risos) Ele tirava terra dali e levava paro o Aterro do Flamengo. Ele foi um dos que ajudou a fazer o Aterro do Flamengo, ele trabalhava à noite toda levando terra. É bonitinho, porque ele não tinha o que comer na rua e a gente estava meio mal de situação, a minha mãe pegava o pão meio dormido já, tirava a parte de fora da casca - porque o pão era velho, ia ficar duro - e botava lá um pedaço de carne assada ou uma fritada dentro. Um dia, ele não comeu o pão, não sei porquê e quando ele chegou de manhã, às sete horas da manhã, era a hora de eu ir para escola. Não sei porquê, também, estava lá o pão em cima da mesa, eu passei, o cherinho estava gostoso, eu dei uma mordida. Sei que a partir dali ele passou a não comer o pão, para trazer para mim (emoção). Depois foi melhorando e com um outro tio, que não é o irmão dele, é cunhado da minha mãe, eles compraram uma lotação, aliás, eles pegaram o caminhão, desmontaram e usaram a sua carroceria; puseram uma carroceria de lotação e começaram a trabalhar com lotação. Também era outra coisa bacana, porque a minha mãe e eu íamos para a praia do Flamengo, em frente ao Hotel Novo Mundo, para levar a comida dele na hora do almoço. Era aquela coisinha de filme, um prato, outro prato em cima, amarra. Foi muito legal (risos)
FORMAÇÃO ESCOLAR
Estudei também no Catete. Em frente ao Palácio do Catete tinha uma escola chamada Rodrigues Alves, um prédio belíssimo que o metrô veio e derrubou. Fiquei chateado. (risos) Era bonito A gente ficava na sala, aquelas janelas grandes, aquele prédio antigo e o presidente estava ali do nosso lado, era o maior barato, eu gostava muito A gente via, chegavam aqueles carros suntuosos. Para nós era festa ver os presidentes e as autoridades chegarem bem do lado. Hoje fizeram uma escolinha menor lá.
Eu lembro praticamente de todas as professoras do primário: a professora Idelsa, do primeiro ano, a professora Iréia Bocater, do segundo ano, Dona Daura, professora do terceiro ano e Dona Assumpção Vita, do quarto ano, No quinto ano eu fiz o exame de admissão, ou seja, saí do quarto ano e fui fazer um curso preparatório, como um vestibular para passar para o segundo grau, aí fui estudar em Laranjeiras, no Curso Dillon, na rua Pereira da Silva.
É engraçado, a gente guarda os nomes, porque tem que fazer o cabeçalho do caderno, (risos) aquele caderno encapadinho. Eu não gostava muito na época, hoje eu acho que foi importante. No cabeçalho se botava o dia, quer dizer, se aprende a escrever a data, aprende-se a escrever o nome das pessoas, o seu nome inclusive. Acho que ali é que se começa a fazer a tua identidade, quando se escreve o seu nome várias vezes e se aprende o que você gosta de fazer no seu nome. Hoje a minha assinatura é basicamente o que veio daquela época. Eu gostava muito de Português, aliás, de linguagem, não de Português, gostava de Matemática também. Nunca fui muito bom aluno, sempre fui meio “vagabundo”. Mas tinha uma galerinha e estudávamos juntos, em grupo. Eu gostava mesmo era do recreio da escola. No Rodrigues Alves, o recreio tinha: sopa de macarrão com feijão, toddy, (risos), tinha melado com uma farinha que eles botavam em cima, eu, literalmente, me lambuzava todo. Tinha também mingau de fubá. Cada dia tinha um negócio, eu adorava. É engraçado, hoje as escolas estão diminuindo os recreios, por conta de um tal de conteúdo aí que você tem que aprender, o que é completamente questionável. Lembro-me que no nosso recreio a gente comia, repetia, entrava na fila várias vezes, brincava, e ainda ia jogar bola no pátio da escola. Devia ser, sei lá, uns 40, 45 minutos. O tempo para criança e para o adulto é diferente. Mas era muito tempo Chegávamos suados na sala, vermelhos (risos) de correr pra lá e pra cá, era muito bom Eu não pensava no que ia ser quando crescer, mas quando me perguntavam eu dizia que ia ser piloto de avião a jato, não tinha outra coisa que me saltasse à cabeça
INFÂNCIA
Quando eu estava na casa do Seu Orlando e da Dona Júlia eu era mais sozinho, então, eu fazia as minhas brincadeiras. Meu pai, às vezes, me ajudava em alguma coisa, eu fazia caixinha d’água; tinha um formigueiro que era o meu xodó. Chovia, eu protegia o formigueiro, o sol saía, eu ia lá fazendo assim... (risos). Às vezes o formigueiro sumia, eu falava: “O que aconteceu com o meu formigueiro?”, aí descobri que as formigas se mexem, se deslocam no terreno. Seu Orlando tinha muitas gaiolas de passarinho, o que eu também adorava. Biquinho-de-lacre Tinha o dia de pegar biquinho-de-lacre. Ele tinha uma horta com couve e outras coisas, ele fazia uma rede e gente ficava escondidinho, na hora que os biquinhos-de-lacre vinham para a horta, puxava e pegava. Biquinho-de-lacre é um passarinho que não serve para nada, nem canta. Mas o Seu Orlando era muito interessante, porque ele pegava, prendia o passarinho, e um tempo depois me falava: “Vamos soltar os passarinhos?”, soltava, era aquela festa, dia de soltar passarinho. Tinha também outro evento: podar a videira. Ele trouxe lá de Portugal umas cepas de uva e tinha uma videira no quintal. Muito legal (risos)
ESCOLA TÉCNICA / DITADURA MILITAR
Participei muito de movimento estudantil no curso Dillon, graças a DeusEu fui para lá acho que por um pouco de influência dos meus pais, pois eu tinha que ser alguém na vida. Não sei de onde veio isso, mas fui ser preparado para entrar no Colégio Militar, pois os bons colégios do Rio de Janeiro eram o Pedro II e o Colégio Militar, mas eu não passei, claro Não era estudioso, eu era meio “vagabundo” para estudar. Fiquei meio frustrado porque tive que fazer um outro colégio qualquer, que foi o Souza Aguiar, na Rua dos Inválidos. Mas foi ótimo porque eu conheci grandes professores ali dentro: o Paulo Roney, que nos dava aula de francês. Ontem mesmo eu estava comentando isso com um colega. Tive aula de latim, de francês e aula de inglês. Latim foi com uma outra pessoa que eu não me lembro o nome. Foi uma pena, porque no ano seguinte teve a reforma de ensino e acabaram com o latim, mas eu ainda tenho lá, até hoje, o meu dicionariozinho de latim e de francês. Gostei muito do Souza Aguiar, porque era no centro do Rio e isso me abriu outras portas, por andar pelo Rio de Janeiro. Adoro o Rio Às vezes vou e volto da Lapa a pé, estou em casa, literalmente em casa. As pessoas dizem: “Mas o Rio de Janeiro é perigoso”, “Perigoso nada, eu estou em casa”. Moro entre dois morros e conheço os traficantes e os bicheiros, nos chamamos pelo nome; a maioria já morreu. Jogamos bola de gude juntos, soltamos pipa, então eu me sinto completamente à vontade. Pode até acontecer [algo] um dia, a gente não sabe, mas eu não tenho o menor medo de sair no Rio de Janeiro. Essa ida para a cidade, para estudar no Colégio Souza Aguiar, foi muito boa, porque como pretexto, eu pegava o dinheiro do ônibus, aliás do bonde e guardava para ir ao cinema, dois anos depois, porque não se tinha muito dinheiro, (risos) e eu ia e voltava a pé, era uma festa.
Fui para [o Souza Aguiar] com dez, 12 anos. Em 1964 eu estava com 14 anos e junto ao movimento estudantil; passamos corrente no portão da escola para não ter aula, (risos) aquelas coisas. Estávamos no enterro do Edson Luiz. Eu não era ativista, mas gostava muito daquele movimento. Não sabia muito o que estava acontecendo, mas sabia que era uma coisa importante para o país que estava naquele movimento todo. Conheci algumas pessoas que foram fundamentais, depois, para outras escolhas. Nesse colégio conheci um cara chamado Edgar, ele era “o certinho”, cabelinho, bem “milico”. Eu gostava muito dele. Ele tocava trompete, era escoteiro do mar, só tirava dez nas provas, e tivemos uma afinidade grande. Um dia ele chegou pra mim e falou assim: “Ney, vou fazer prova para a Escola Técnica, no Maracanã”. Do Catete para a Lapa já tinha sido um desbravamento, (risos). Eu falei: “Onde é isso? Escola Técnica?”, e ele: “É um curso legal, a gente aprende a mexer com máquinas, a fazer solda, aprende a fazer um monte de coisas”. E como ele era uma pessoa em quem eu confiava muito, tirava boas notas, era um bom cara, jogava bem futebol também, a gente era sempre do mesmo time, um dia eu fui com ele ao Maracanã. Pegamos uma carona e fomos. Vocês conhecem a Escola Técnica Celso Suckow da Fonseca? É uma escola técnica federal. Cheguei lá, tinha almoço, tinha oficina, tinha campo de futebol, eu falei: “Caraca, mas isso aqui é muito bom”. Fiz o concurso depois para a Escola Técnica por causa do Edgar. Ele também vinha de uma família humilde, mas fazia curso na Cultura Inglesa e na Maison de France. O cara era o “cdf”, era (risos) o que eu queria ser, mas não conseguia. Ele era muito bom, inteligente, brilhante Não fizemos prova juntos, inclusive, depois não nos vimos mais. Fiz a prova e, graças a Deus, passei para a Escola Técnica e fui fazer o curso de Máquinas e Motores. Aí que começamos a nos envolver mais com a política, porque lá eu já estava um pouco mais maduro, já entendia tudo o que estava acontecendo. Tinha uma disputa muito grande no Maracanã, naquela região, entre a Escola Técnica, o Colégio Militar e o Pedro II. Havia um pouquinho de: “Já que eu não passei para o Pedro II. Não passei para o Colégio Militar...”. Eu participava das brincadeiras contra os meninos do Colégio Militar, que era padrão. Não fomos nós que inventamos, isso já era um costume. O pessoal do Colégio Militar andava a cavalo - na rua Professor Gabizo, onde hoje tem a Petrobras, na rua General Canabarro - e o pessoal da Escola Técnica tomava um café com leite, mate e pão às nove horas, mas as janelas eram abertas, o pão era molhado no café com (risos) leite e jogado nos meninos do Colégio Militar. Isso durante a Ditadura, com a repressão, eles entraram a cavalo na Escola Técnica. Foi um período realmente negro, muito difícil, colegas nossos sumiram, foi um negócio meio difícil de viver, mas passou. Fizemos passeatas, estivemos no enterro do Edson, foi um negócio bastante forte. Participamos também da “Passeata dos 100 mil”.
Escolhi o curso de Máquinas e Motores. Foi quase que um acidente, pois por influência do Edgar eu tinha escolhido Eletrônica como primeira opçã, mas como já falei, eu não era um grande estudioso, então não passei na primeira opção. Fiquei com a segunda, que era máquinas e motores, e de novo foi fantástico para mim Acho que o meu anjinho da guarda está de plantão, umas 38 horas por dia, porque sempre me ajuda muito. Quando eu não passei e tinha vaga em Máquinas e Motores, no início fiquei meio chateado, como também tinha ficado de não passar no Pedro II, mas depois foi ótimo, porque eu adorei as oficinas da Escola Técnica. Eu era muito bom de solda, qualquer tipo de solda, adorava fazer fundição, que tinha que trabalhar com madeira, fazer os moldes. Aí que eu aprendi a trabalhar com formão, coisa que meu avô fazia em Petrópolis e eu passei a fazer também.
FAMÍLIA / AVÓ
Todos os homens da minha família são muito hábeis para fazer as coisas, acho que são todos artesãos. Minha avó era hors concours, ela fazia tudo isso e várias outras coisas. Dos homens eu peguei essa parte mais dura, mais bruta, digamos. Com as mulheres eu peguei essa parte mais feminina, eu acho que eu tenho um lado feminino bastante grande. Minha avó me ensinou a fazer tricô, crochê, frivolité, eu sabia fazer esses negócios todos. Hoje, se eu pegar as agulhas, deve sair algumas coisas, mas eu sabia mesmo, sentava ao lado dela e tricotava. Não tinha vergonha disso, mais tarde é que eu pensei: “Eu podia ter (risos) caído para um outro ramo aí”, mas não, foi só habilidade mesmo, e gostei muito Eu já fazia engenharia com ela, sem saber que fazia. Ela fazia aqueles telefones, com caixinha, com fio. Como eu falei, ela era profesora primária, e na aula não tinha recursos, então, ela criava os seus próprios apetrechos didáticos. Tinha um deles que era uma casa, com janelas, porta, telhado e para ensinar a tabuada, ela botava assim: “Essa é a casinha do vezes”, aí quando se abria uma janelinha lá estava o número dois, abria outra janelinha, estava o número três e quando se abria a portinha tinha o resultado; trocava os papeizinhos, era uma festa E ela fazia isso tudo e ainda tinha tempo de cozinhar, (risos) tempo de tomar conta de mim que estava passando férias lá, um barato Ela fazia esses objetos e todos funcionavam. Em uma das primeiras revistas da Petrobras eu fiz um artigo, dizendo: “Cientista é a avó”. É meio dubio, parece xingamento Dizia que ela já era cientista e eu não sabia. Eu já estava pegando esse gosto pela ciência, pela curiosidade de materiais e não sabia, e foi muito em função da minha avó.
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS
De novo o anjinho continuava guiando. A Escola Técnica não era uma coisa muito aceita, ou seja, era uma coisa de segunda, era uma coisa para pobre, para suburbano, tanto que lá havia, acho, um convênio com a estrada de ferro, pois o pessoal vinha do subúrbio para estudar e voltava. Nós fomos uma leva de pessoas da zona sul que foram para a Escola Técnica. Nessa época eu já estava mais metido a andar na moda, e alguns amigos meus tinham camisa Lacoste, por isso nós tínhamos um apelido: “o pessoal da camisa Lacoste”. A comida da Escola Técnica é muito boa. Até hoje eu adoro, quando estou viajando e vejo: “comida caseira”, eu paro, porque é a melhor comida que tem, e a comida da Escola Técnica era assim. O ensino lá era industrial, então recebemos toda essa parte mais feita para o pessoal mais humilde, com o objetivo de arrumar logo um emprego. Essas máquinas ficaram na Escola Técnica, e isso me influenciou a escolher engenharia depois, porque eu aprendi a gostar de fazer coisas, não de mandar, não de projetar e de planejar, aliás, aprendi a gostar disso tudo, mas aprendi a fazer também. Tanto que, como eu falei,
me dei muito bem nas oficinas, por conta disso. Os professores eram fantásticos O professor de forja, (risos) era muito engraçado, muito temperamental. Ele fazia a fila dos alunos, para que pegassem a sua tarefa, então, ele desenhava e, por exemplo, falava para pegar um vergalhão, aquecer na forja e transformar aquele vergalhão numa ferramenta, num sextavado, num quadrado. Ele fazia a primeira peça e ele botava o ferro na forja, aquele tufão, um fogo danado, a gente com medo. Ele batendo na bigorna: uá uá uá, péin péin péin. Ele fazia a primeira peça e mostrava para todo mundo, esfriava a peça e botava em cima da mesa, e cada um de nós ia fazer a sua própria peça. Eu tinha um amigo, o Ricardo, ele mora no Catete ainda, de vez em quando nos encontramos rimos muito. Ele era um desastre, (risos) ele fazia tudo que a gente fazia, ele não sabia escrever, a gente fazia as provas dele, era um barato aquele cara, alegre pra cramba. Então, nesse dia, ele pegou a peça dele, foi lá, botou a peça na forja, e óbvio, o aço dele fundiu, derreteu e foi embora. Nós estávamos fazendo a nossa peça e chegou o Cadinho: “Cara, a minha peça fundiu, o professor vai me matar”, (risos) então, o Paulo e eu roubamos a peça do professor, que estava em cima da mesa, (risos): “Toma Ricardo, vai lá, finge que está trabalhando”. Todos fizeram as suas peças e entramos na fila para ganhar a nota, aí, foi fulano, beltrano, ciclano, e o professor, que já não tinha muita paciência, com o Ricardo, então, não tinha paciência alguma. O Ricardo chegou, (risos) aí, o professor, abaixou o óculos, olhou para o Ricardo e disse: “Esta peça está uma droga”, (risos) era a peça que ele tinha feito (riso) O Ricardo não podia falar que era a sua peça. O professor lhe deu um seis ou sete,
não me lembro mais. Deu uma nota ruim para o cara, mesmo sendo a peça que ele havia feito
FORMAÇÃO / ENGENHARIA
A Escola Técnica foi importante para eu saber que podia fazer as coisas. A experiência com a minha avó, somado à experiência com o meu pai, com o meu avô e a Escola Técnica me deram a visão do que eu posso fazer hoje, do que eu já venho fazendo desde que comecei a trabalhar com Engenharia. A escolha por Engenharia foi quase que uma [conseqüência], eu já estava ali e fui fazendo. De novo, eu tinha que trabalhar rápido, porque o meu pai não tinha muita grana, e, nessa época, tinha um curso na Escola Técnica chamado Engenharia Operacional, era só três anos e já se saía formado Engenheiro. Eu tinha que trabalhar, então escolhi fazer Engenharia Operacional, fiz o vestibular e passei, na primeira opção.
A Escola Técnica tinha um curso médio, um curso técnico, e eles já estavam recém-abrindo o curso de Engenharia, mas o que aconteceu? Como o curso técnico não era um curso muito famoso ainda e eu tinha que ser alguém na vida, eu fiz a Escola Técnica de manhã e fazia o científico, que era o curso tradicional, à noite. Eu estudava o dia inteiro. Aliás, estudava, não Eu vivia nas escolas o dia inteiro. Na Escola Técnica eu matava aula para ir para a oficina, para brincar na oficina. O ensino técnico foi se distanciando do ensino tradicional muito rapidamente, o ensino técnico era muito bom, então, à noite eu passava o que eu tinha aprendido na escola técnica para os meus colegas do científico, tanto que quando rolou o vestibular foi mole Eles já ensinavam “integral”, “derivada”, coisas que o pessoal do científico não ensinava. Foi um diferencial bastante grande. Quando surgiu o vestibular eu passei bem, fiz a Engenharia Operacional, três anos para começar a trabalhar. Foi muito legal
TRABALHO / CAUSO
Meu primeiro trabalho foi na Companhia Soutex de Roupas, Demillus Eu fazia controle (risos) de qualidade de
sutiã, era ótimo (risos) Logo depois que eu me formei, fui trabalhar na avenida Lobo Junior, na Penha. Tem uma passagem interessantíssima nesse emprego: eu fui ser assistente de métodos e processos, um nome pomposo e que não quer dizer nada Eu ganhava “dois mil, trezentos e um dinheiro”, não sei qual era a moeda, acho que era cruzeiro. Fui ser assistente de métodos e processos, e o que eu tinha que fazer? Tinha que ir às linhas de montagem da Demillus, junto com o Seu Hector, que era meu chefe, ajudar os caras a melhorar a produção. Foi engrassadíssimo Um dia um funcionário chegou para o Seu Hector e falou: “Nós estamos com problema na linha de montagem de sutiã”, era o pessoal que faz aquele fechinho de plástico do sutiã, que se engata. Estava acontecendo o seguinte: o pessoal que faz o plástico é da parte de estrutura da extrusão, das extrusoras que fazem o fechinho. É feito assim: um saco de machos e um saco de fêmeas. A máquina faz o macho e a fâmea separados, e esses sacos vão para a parte de costura, onde as meninas pegam o macho e a fêmea e costuram no sutiã. O pessoal recebia esse conjunto macho e fêmea juntinhos. O Seu Hector falou pra mim assim: “Oh, o pessoal está precisando de uma máquina ou de alguma coisa que pegue o conjunto de fechos macho e o conjunto de fechos fêmea e junte isso”, eu falei: “Legal Um desafio interessante”. Bolei uma máquina toda complicada, com uns vibradores. Era despejado um saco de fêmeas de um lado e um saco de machos do outro, aí, tinham umas esteiras rolantes que vinham andando assim, e lá pelas tantas o macho chegava perto da fêmea, só faltava dar beijinho, e encaixava, juntava e caía, já os dois prontinhos, caía num saco e ia depois para o setor de costura. Fiz o protótipo, foi um sucesso, todo mundo gostou: “Que legal, o macho e a fêmea se juntam”. Aí, como sou muito curioso, falei: “Seu Hector, eu queria ver para onde está indo esse negócio que a gente está fazendo aqui. Fiz o protótipo, agora vamos ver aonde é que vai dar isso”. Fui a um outro setor da fábrica, que era a parte que costurava, cheguei lá, falei com quem e trabalhava e o chefe da seção falou: “Vocês fizeram um trabalho para gente, não é? Mas tem o seguinte a gente recebe aqui o conjunto de macho e fêmea, e tem aqui essa linha de montagem de costura, essas moças, e aqui a parte de controle de qualidade que corta o fiapinho que sobrou, mas dá um trabalho para a gente, cara, pois chegam uns sacos aqui com os negócios agarrados um no outro, e eu tenho que ter esse monte de meninas aqui tirando um do outro (risos) porque eles são costurados em máquinas diferentes”. Eu voltei correndo lá, (risos) e falei: “É melhor vocês conversarem aí, porque eu acho que a gente vai perder tempo com essa maquininha que a gente inventou”. (risos) Quer dizer, é falta de conversa Depois, ao longo da vida, eu vim ver que esse é o maior problema que o ser humano tem: a comunicação. Você acha que fala, o outro acha que entende. Bom, graças a Deus, a máquina não foi para frente. Bem que eu queria que ela tivesse ido, porque foi uma máquina fantástica. Fiquei lá pouco tempo, um ano e meio ou dois. Aí surgiu uma oportunidade de sair do Rio e eu fui para Blumenau, Santa Catarina. Fui trabalhar na Metalúrgica Zimmermann, de uns alemães. Foi aí que eu entrei na linha de trabalho do pião, vamos dizer assim. Fiquei cerca de um ano e meio em Blumenau. Perdi o emprego, porque eu briguei com a família inteira dos Zimmermann, pois eu queria modernizar a (risos) fábrica deles e eles diziam: “Não precisa, a gente trabalha assim há anos, dá certo” (risos). Não deu certo, tive que sair, fui para Curitiba, onde eu conheci a Petrobras.
INGRESSO NA PETROBRAS
Até então a Petrobras para mim era só posto de gasolina. Na metalúrgica em que eu fui trabalhar em Curitiba, estavam fazendo umas estruturas para a refinaria de Araucária, que estava sendo montada em Curitiba. Eu entrei na Petrobras, achei enorme, linda Nunca achei que eu ia trabalhar na Petrobras. Saí dessa metalúrgica, entrei numa outra empresa que atendia a Petrobras, a Montreal Engenharia, onde fiquei por 12 anos. A Montreal foi uma empresa muito grande; lá eu trabalhei em Curitiba, em Ponta Grossa, em Coronel Fabriciano, em Minas, trabalhei, na Usiminas, e de lá fui para a Nuclep [Nuclebrás Equipamentos Pesados S/A] em Itaguaí, Rio de Janeiro, uma fábrica de reatores nucleares. A Montreal pegou o consórcio MMW [Montreal, Micoperi, Worley], já para construir as plataformas da Petrobras e eu fui transferido para Niterói, na base da Ilha da Conceição, ao atravessar a Ponte Rio-Niterói, do lado esquerdo. Aí conheci a Petrobras e foi paixão Comecei a embarcar para montar as plataformas de Enxova, Garoupa e Cherne, ainda trabalhando na Montreal. Mas a Petrobras já estava arrebentando, indo para águas cada vez mais profundas. A Montreal fez uma associação com uma empresa de mergulho, a Oceaneering, e fundou uma empresa chamada Monocean, e eu, mais uma vez de enxirido que era, comecei a estudar essa parte de mergulho, esse trabalho debaixo d’água. Quando surgiu a oportunidade de se trabalhar com essa nova tecnologia, eu já sabia alguma coisa. Fui
transferido para essa empresa, a Monocean, e eu fui ser o engenheiro de projeto de sistema de mergulho.
TRABALHO EM PLATAFORMA
Trabalhei em Enxova, Garoupa e Cherne, as primeiras platafomas fixas. Era um negócio meio de ficção científica. Foi bem no princípio, já tinha bastantes plataformas, mas a maioria delas não era brasileira, não tinha brasileiros trabalhando. Lembro-me que a primeira vez que a gente foi, achou muito estranho, era meio de tardinha, aquele monte de flair, queimando. A primeira plataforma mesmo foi Garoupinha, antes de Garoupa, era o sistema antecipado de Garoupa, que nós fomos preparar para ser substituído pelo sistema definitivo. Ainda estava na Montreal. Nós trabalhávamos no planejamento dessas operações, e embarcávamos para fazer a operação. Foi um período muito legal, porque a gente tinha que aprender tudo. Não havia essa especialidade, dentro do Brasil a engenharia não estava preparada para isso.
Foi muito legal, a gente tinha que ler muito. A Petrobras já era uma escola, em função dos padrões e dos procedimentos. A Petrobras sempre foi “o padrão de qualidade”. Até estranhamos que hoje a Petrobras esteja comprando isso e pagando gente para lhe certificar; ela não precisa disso, porque o corpo técnico da Petrobras na época já era fantástico. Nós que éramos das empreiteiras, saíamos correndo atrás dos manuais e dos folhetos, para aprender. Foi uma época muito legal Eu trabalhei primeiro em Garoupinha, preparando ela para o sistema definitivo, depois em Enxova e, depois, Cherne. Foram as três primeiras grandes plataformas que eu participei. Enxova foi a que deu mais trabalho, uma plataforma belíssima, quando pegou fogo eu chorei muito. Não me lembro quando foi esse incêndio, mas houve uns eventos tristes de Enxova, como aquele acidente grande, do bote, em que morreu muita gente. As as pessoas não souberam operar o bote, ele caiu lá de cima e matou muita gente. Mas é uma plataforma belíssima, tínhamos toda uma vida social a bordo, aquela coisa de embarcar 14 dias por 14 dias.
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS
Embarquei durante muito tempo, uns cinco anos, 14 dias lá, 14 dias cá. Eu adorava Dizia para os meus amigos: “Quando eu venho para a terra é que eu me canso, a bordo é uma festa”. Eu fui o primeiro a soltar pipa na plataforma, ninguém sabe disso, vocês estão sabendo agora, (risos). Não era nem proibido, porque isso não era nem (riso) pensado. Fiz experiências a bordo, foi muito legal Sempre gostei muito do mar, quando eu estava ainda na Escola Técnica, participei de um programa do Governo chamado Operação Mauá; tinha o Projeto Rondon e Operação Mauá. A Operação Mauá é como se fosse o primeiro emprego. Trabalhando como estagiário, fui num navio até o Canadá. Trabalhava na sala de máquinas e voltei trabalhando no passadiço, para aprender a mexer com máquinas. Eu devia ter uns 18 ou 19 anos. Foi uma experiência fantástica Na ida nós pegamos o navio aqui no Rio de Janeiro, o Navio Minerva, da empresa Netumar, que ia costeando o Brasil, entrava pelo Golfo do México e passava em Cuba, Antilhas, e ia direto para Nova Iorque e, depois ao Canadá. Foi essa a viagem que eu fiz. Ainda aqui no Brasil, eu fui à cozinha, peguei várias garrafas de água mineral, fiz uns bilhetes, em português e inglês, escritos à mão: “Sou estudante do curso...”,
não me lembro, acho que era engenharia, “Sou apaixonado pelas correntes marinhas e estou fazendo uma viagem a bordo do navio...”, expliquei tudinho: “Estou mandando seis mensagens, essa aqui é a mensagem um, essa é a dois, três, nas coordenadas tais e tais, por favor, quem encontrar essa garrafa mande a mensagem para mim”. Joguei uma na frente de Salvador, acho que a outra no Rio Grande do Norte, depois em Antigua. Fui jogando garrafas (risos) pelo mar afora. Eu botava o meu endereço, as coordenadas de onde eu tinha jogado a garrafa, e dizia: “Eu quero saber aonde que essa garrafa foi parar, para saber das correntezas”. Isso foi em 1969, 1970, por aí. Até hoje eu não recebi nenhuma garrafa de volta (risos). Aí, eu fiquei pensando: “E aquelas histórias que o cara se perde numa ilha, joga uma garrafa e vem alguém salvá-lo?”, “Achamos a sua garrafinha”. Furada (risos). Eu já estaria morto. (risos)
INGRESSO NA PETROBRAS
Eu estava fazendo engenharia dura, aquela coisa mais de montagem que eu também adoro. Aí fui selecionado para aprender essa nova tecnologia do mergulho, porque a Petrobras estava trabalhando em água com até 200 metros de profundidade, Enxova era 130 metros, Cherne, eu acho que era um pouquinho mais, não me lembro, mas tinha que usar mergulhador, não tinha jeito As conexões no fundo eram feitas com mergulhador (aí é que começam a entrar as maquetezinhas que eu quero mostrar). Precisa que o homem esteja presente para as operações serem concluídas. Enxerido que eu sou, fui fazer curso de mergulho para saber como era, até porque eu projetava os equipamentos dessa empresa, quer dizer, a gente recebia muita coisa da Oceaneeirng, mas muita coisa tinha que ser feita aqui no Brasil. [Refiro-me] aos equipamentos de submarino. Tem um sino de mergulho, onde os dois mergulhadores vão dentro e o sino desce até a profundidade de trabalho. É um negócio muitíssimo perigoso. Eu comecei a tomar contato com a parte da engenharia que mexe com a segurança do homem. Até então eu mexia com a segurança, mas não era tão direto. Se o sino despressurizar o cara morre, é imediato. Porque o nosso sangue fica cheio de gás, dissolvido, e se você despressurizar rapidamente acontece o fenômeno da água mineral com gás que quando você abre as bolhas pluflufluflu. Isso acontece no sangue e mata a pessoa ou dá dores terríveis. Tem que comprimir o mergulhador de novo, fazer um tratamento com um ar rico em oxigênio, tem toda uma parte médica que eu também tive que estudar. Eu também me apaixonei por essa atividade.
ROBÓTICA / MERGULHO
Também mergulhei, claro A Petrobras estava começando a trabalhar em 300 metros, 400 metros, até que aconteceu um problema numa árvore de natal da Petrobras a 411 metros, e os mergulhadores não podiam ir até lá. Foi aí que eu tive que desenvolver a primeira ferramenta; eu já estava trabalhando com robótica, sem saber, para mim era só uma extensão da engenharia para resolver um problema que era impossível para os mergulhadores. Mais ou menos nessa época que começou aqui no Brasil esse desenvolvimento das ferramentas especiais, eu nem sabia. Isso foi no campo de Marimbá. Era o seguinte: a árvore de natal encaixa em quatro postes-guia, quando foi retirado o BOP, que é o blow out preventers, ele bateu nos postes e empenou. Esse poço, que era bastante produtivo, não poderia receber a árvore de natal, porque o poste estava empenado. Ou seja, tinha dois postes bons e dois empenados. Nós fizemos então uma ferramenta que cortava esses dois postes e colocava um poste novo para que a árvore de natal pudesse se encaixar, um trabalho belíssimo Belíssimo Nesse trabalho eu fui à 411 metros dentro de um sino especial chamado sino atmosférico, para poder seguir a operação de perto. Essa operação foi feita com um sino atmosférico que tem braços manipuladores para trabalhar, e com dois veículos de operação remota, para fazer o trabalho. Esse foi o primeiro grande trabalho brasileiro de intervenção em locais inacessíveis ao homem. Tenho foto disso, filme, tenho tudo guardado. Dentro do sino eu operei o braço junto com o operador do próprio sino. Nós revesávamos, porque o espaço lá dentro é muito pequeno. Foi belíssimo descer nesse sino, porque ali eu conheci o azul marinho. O sino, quando ele entra na água, passa pela interface da água, por enquanto se está vendo aquele azul belíssimo do mar, quando ele vai descendo a luz já não penetra mais, quando chega aos 120, 150 metros, aí se vê o azul aparecer. O azul marinho Dá vontade de abrir e beber aquela água toda, é maravilhoso, maravilhoso Não se escuta nada, só o sino sendo espremido pela pressão do mar (risos).
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS
Eu estava sentado atrás da escotilha de entrada, atrás de mim tinha um operador e uma grande janela de acrílico, para a gente ver o mar. Aqui atrás eu escutava assim: ki ki ki. (risos) Teve uma hora que eu botei a mão atrás e estava molhado, eu falei: “Está entrando água aqui”, (risos) e ele falou: “É assim mesmo, a pressão vai e fecha”. Cadê que eu acreditava nisso (risos)? Mas depois fechou e a gente desceu. Era água mesmo porque a vedação que existe entre a porta e o sino é feita com o que a gente chama de anel O-Ring e a pressão externa aperta, aperta até que pára de entrar água. Quanto mais você desce mais ela fecha (risos). Foi ótimo Essa operação também foi inusitada, porque a gente desceu uma vez, duas, a gente desceu umas dez vezes. Isso foi em 1986. A equipe já estava “morta”, porque a ferramenta não encaixava lá embaixo, e tínhamos que trazer a ferramenta para cima, quer dizer, eu descia para ver a ferramenta, tinha que ajustá-la sem estar presente, a ferramenta não encaixava, a gente tirava, eu saía do sino, ia lá com os mecânicos, ajustava a ferramenta e entrava de novo e descia... O que aconteceu? Na última tentativa que a gente ia fazer, sempre assim é a Lei de Murphy, faltava só dar aquele “totozinho” para encaixar, aí o sistema de respiração do sino começou a dar problema, aí o cara falou: “A gente vai ter que subir”, e eu disse: “Não vamos subir”. O sistema de bombeio, um macaco hidráulico que tinha dentro do sino para fazer a ferramenta funcionar do lado de fora, começou a vazar e a gente tinha que subir de qualquer jeito. O macaco vazou, não tinha mais óleo para botar no macaco. O operador fez xixi dentro do
macaco (risos). É hidráulico, água, óleo, tudo a mesma coisa. Foi aí que conseguimos terminar a operação, encaixar a ferramenta lá embaixo, e conseguimos subir. Eu e ele estávamos com uma dor de cabeça enorme, porque o oxigênio já estava diminuindo, já estávamos com a mistura pobre de ar para respirar dentro do sino, mas felizmente a gente conseguiu fazer, graças a aquela mijadinha que foi dada dentro do macaco hidráulico (riso).
INGRESSO NA PETROBRAS
Essa operação foi uma operação que determinou a minha vinda para a Petrobras, pois em 1986, logo depois, apareceu um anúncio no jornal: “Concurso para Petrobras”. Eu estava na praia do Flamengo com uns amigos e chegou um rapaz mostrando o anúncio. Eu falei: “Eu nem vou lá”. Não me achava nem um pouco capaz. Ele falou: “Está aqui, é o que você faz, intervenção submarina, usar mergulhador, veículo de operação remota. Vai lá rapaz”. Eu disse: “Não, não”, até que eu disse: “Está bom”. Na semana seguinte eu preparei um currículo e fui ao Cenpes, cheguei na portaria, aquela portaria horrível que: ou você fala, ou você escuta, ou você vê (risos). Falei do anúncio do jornal e ela falou: “É aqui mesmo”. Eu falei: “Eu trouxe o meu currículo”, peguei o envelopinho e entreguei e ela pegou o envelope e botou numa pilha enorme. Pensei: “Ferrou Estou fora”, ela disse: “Espera o telegrama”, o famoso telegrama. Continuei trabalhando, sei lá, umas duas semanas depois e veio o telegrama: “Comparecer com máquina de calcular e caneta para fazer prova”, fui e fiz a prova: “Espera o telegrama” (risos), duas, três semanas depois chegou o telegrama: “Comparecer para prova de não sei o que”. Fui fazer a prova: “Esperar o telegrama”. Três meses, quatro meses depois recebi outro telegrama: “Comparecer no Cenpes para entrevista”, falei: “Está diferente agora, não é mais prova”. Cheguei, fiz a entrevista com o meu antigo chefe, o Luiz: “Nós estamos com um problema”, eu falei: “Estava bom demais O que é?” “Seguinte: o nosso anúncio no jornal, o nosso pedido, era para uma vaga e nós temos dois candidatos finalistas, você e um outro rapaz”, eu rapidamente pensei: “Vou pensar pelo lado positivo ou negativo? Bom, negativo: a vaga já era do outro rapaz e eu estou aqui de penetra, ou positivo: a vaga era para mim e ele é que está me ameaçando”. No fim eles conseguiram duas vagas, ou seja, eles tinham pedido uma vaga só e no final entramos eu e o Venceslau, que infelizmente já saiu. Fiquei com essa dúvida, até hoje eu não sei se a vaga era para ele e eu entrei de bicão, ou se a vaga era para mim e ele que entrou de bicão. Sei que entramos, foi muito legal.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
A vaga era para intervenção submarina, por isso que eu achei que poderia ter sido determinante esse trabalho que nós fizemos, e talvez eles tivessem querendo uma pessoa bastante específica dessa área. Quando eu entrei fiquei bastante feliz porqua eu estava fazendo um trabalho que já era necessário para a Petrobras e eu não sabia. No Cenpes, no antigo Semec, que era o Setor de Equipamentos, Mecânica e Corrosão, e hoje e o Temec [Tecnologia de Matérias, Equipamentos e Corrosão], nós trabalhávamos com o Aluísio Nóbrega, que era fantástico, um visionário. Também estava chegando no setor o meu colega, que a gente divide baia até hoje, o Luiz Mecina, e o Aluísio, com aquela clareza, falou: “Vocês vão montar o laboratório de robótica”. Mecina e eu começamos a rascunhar esse laboratório e o montamos depois, que é o que eu estou tocando até hoje. Fizemos ótimas coisas nele e vamos fazer ainda muito mais. Mas aí que começamos, eu pelo menos, eu comecei a ter uma visão maior do que eu já fazia, pois eu já fazia engenharia com a minha avó e não sabia, o meu pai já tinha me dado um monte de dicas, informalmente, e, além disso, teve a Escola Técnica Foi aí que essas coisas começaram a ter um formato, uma aplicação para o negócio. Aí o meu lado ideológico começou a aflorar mais, por trabalhar na Petrobras, por saber que é uma empresa importantíssima para o país, por saber que temos condições de fazer praticamente tudo aqui. A nossa formação de povo, essa mistura, nos faz um povo especialíssimo Nós somos super inteligentes, super criativos, somos bonitos e agradáveis. É ótimo O brasileiro é fantástico Na maioria das vezes, não precisa comprar essas caixas pretas dos irmãos do norte, porque temos condições de resolver tudo aqui. Eu já entrei direto para o Cenpes e aqui eu vi que é possível esse tipo de realização. Aliás, já foi mais, hoje está muito difícil de se trabalhar; não sei nem se vamos conseguir tempo para falar sobre essas coisas, mas aqui nós temos condição de resolver os problemas da operação, os problemas políticos, os problemas operacionais, enfim. Trabalhando na Amazônia agora eu vi que essa responsabilidade aumenta ainda mais. Em uma das palestras que eu dou, boto o mapa da América do Sul, delineio a Amazônia, que não é só brasileira, é de outros países irmãos, e boto a Europa em cima. Amazônia e Europa, quer dizer, a nossa responsabilidade é muito grande, porque temos que desenvolver a Amazônia, desenvolver o país. Esse discurso de que a Amazônia é intocável, isso tem que ser repensado, pois ela tem que ser tocada com carinho, e não intocada, e é isso que a Petrobras está fazendo, a partir de Urucu e a partir do gasoduto Coari–Manaus, no qual nós estamos trabalhando direto. Nós é que temos condição de tocar isso Somos brasileiros, sabemos como lidar com aquela região e estamos aprendendo a lidar com o povo de lá, que sabe, que vive lá há séculos. As soluções do Brasil, as soluções que passam pela Petrobras, elas obrigatoriamente têm que ser dadas por brasileiros. Não quer dizer que temos que fechar os ouvidos e os olhos para as soluções que já estão lá fora, mas temos condições de fazer isso aqui.
COTIDIANO DE TRABALHO
Em 1987, águas profundas era 400 metros (risos). Eu tenho três copinhos de isopor no laboratório de, é a explicação que quero dar. Um deles é um copo de isopor normal, feito pela fábrica de copinhos de isopor, que está na mesma atmosfera que nós estamos aqui, um quilo por centímetro quadrado. Não sentimos essa pressão, porque já nascemos [submetidos a ela], estamos adaptados. Tem um copinho do lado que é igualzinho ao copinho normal, mas nós o submetemos a uma pressão de mil metros de lâmina d’água, você vê que o copinho é pressionado. O barulho que eu escutei dentro do sino, atua nos corpos. E ao lado tem um copinho que foi submetido à uma pressão equivalente à três mil metros de lâmina d’água, que é a profundidade em que a Petrobras está trabalhando hoje, são três quilômetros dentro d’água, 300 quilos por centímetro quadrado. Tudo que você bota ali vai sofrer aquela pressão, não só a pressão mas a temperatura também, porque a mil metros de lâmina d’água tem-se uma faixa de três, quatro graus centígrados de temperatura. Se você pegar uma barra de aço comum, até essa temperatura, e botá-la no fundo do mar a três, quatro graus centígrados, naturalmente ela sofre com a variação de temperatura, muda as suas dimensões. Eestou falando em metro, medidas grosseiras, em que praticamente não se observa isso, mas se você, por exemplo, está trabalhando com eixo e mancal, isso tem uma folga Se esse eixo tem que rodar nesse mancal, e aqui na superfície ela roda, porque existem tolerâncias que fazem com que ele rode, se você colocar isso nessas novas condições de temperatura e pressão, ele trava Se você trouxer para cima, para concertar, ele vai funcionar, aí você pensa: “Poxa, mas ele está bom”, mas quando bota lá embaixo, está ruim. Foi todo um aprendizado, porque isso não estava em livro nenhum Não tinha experiência de gringo que nos desse isso Isso foi aprendido por nós, técnicos brasileiros que estávamos nos defrontando com essas situações pela primeira vez. É conhecimento empírico, completamente empírico Depois as pessoas viram que tinham que estudar isto melhor. Aí fui buscar a academia, fazer associações com as universidades, estudar temas. Mas foram os brasileiros que desbravaram isso.
Hoje nós temos a fama: “O brasileiro é que entende de águas profundas”. Isso não é de graça, foi com muito suor e muito erro em cima. Uma das dificuldades que eu falei a pouco, é que hoje é um tabu dizer que errou. Ora, errar faz parte do ser humano, tá certo? “Mas é com o erro que se aprende”, isso é um discursinho. Tem que errar mesmo Você quer errar? Não, mas errando você pode usar aquele erro para aprender muita coisa. E o principal disso tudo é o seguinte: se você fica com medo de errar, você pára de ousar, parando de ousar, você pára de ter soluções disrruptivas, que são as soluções que nós precisamos no momento Porque o nosso momento é especial Está aí “em nossa porta” a exploração do pré-sal, como é que faz? Se as pessoas tiverem medo de dar soluções que podem vir a falhar não vamos ter aquela que vai acertar
PROCAP / COTIDIANO DE TRABALHO
[A relação da robótica com o Procap - Programa de Desenvolvimento Tecnológico de Sistemas de Produção em Águas Profundas] não era direta, porque o Procap não tinha número. Isso estava começando quando eu estava chegando. O Procap era para atender mil metros. Ele já inovou com essa proposta, que era trabalhar matricialmente, mas trazia um problema e se pensava, onde se estivesse, na empresa ou fora da empresa, pessoas, grupos e tecnologias, para ajudar a resolver aquilo, nós devíamos participar, com projetos que propúnhamos dentro do Procap.
Não éramos do Procap. Esses projetos eram para atender a carteira do Procap. Depois veio o Procap 2000, 3000, e tomara que (risos) continue. No laboratório nós temos claramente três linhas de atuação: “apagar incêndio”, quando se trata de uma solução urgente e que não tem em prateleira de lugar nenhum do mundo; o auxílio aos projetos novos, quando, por conta da experiência que temos, falamos assim: “Não faz desse jeito, porque assim já deu errado. Tenta fazer assim, que tem a chance de dar certo”. Tem também o acompanhamento aos projetos que estão rolando, projetos da empresa, por exemplo, manifold, fazer manifold para atender Marlim. Marlim precisou de não sei quantos manifolds, a maioria das empresas que fez os manifolds, não tinha experiência para fazer do tipo que era preciso, então, cada empresa, cunhou a sua tecnologia. Onde nós entramos para ajudar? Como são águas não mergulháveis precisava ter o veículo de operação remota para fazer as operações, as válvulas, trocar as tomadas de lugar, liga aqui e bota lá, e nós tínhamos um manipulador no laboratório que servia para fazer os testes nos manifolds, ainda aqui no estaleiro. Eles faziam as concepções de projetos deles, montavam o painel e nós, com o nosso manipulador, íamos até lá testar, para ver se aquilo era factível. Também inauguramos uma fase muito interessante que é, ainda no canteiro você dizer: “Isso aqui, quando chegar lá embaixo, vai ser muito mais difícil de operar”. Então, mexíamos no projeto e dávamos sujestões para que eles adequassem os painéis de interface. Hoje os dois hoje estão em manutenção, temos dois manipuladores que são exatamente para fazer isso: simular as operações no fundo do mar. Têm projetos que são feitos em terra para ajudar o pessoal que está construindo os manifolds e as árvores de natal que vão para o fundo do mar. Tenho que confessar que o que mais me agrada mesmo são os “incêndios”, porque (risos) são as coisas inusitadas: “Tem que apertar um parafuso de uma árvore de natal que já está instalada a mil e não sei quantos metros de profundidade”, como é que faz isso? (Aí, de novo, tería que mostrar por meio dos exemplos da maquete)
PROJETOS / DESAFIOS
Os projetos de maior dificuldade, não foram nem dificuldades técnicas, foram dificuldades de execução mesmo, foram de resgate a helicópteros que cairam com colegas nossos dentro. Resgatá-los do mar é muito difícil. Isso acontece mais do que eu gostaria (risos). Fazemos esse trabalho também, porque as empresas que prestam serviço de helicóptero para a Petrobras, são terceirizadas, mas na hora que acontece um sinistro desses, não importa, a Petrobras assume a operação e tenta: primeiro, tirar os nossos colegas com vida do mar; segundo, se não der, porque a maioria dos acidentes são fatais, temos que tirar os corpos, e o mais difícil ainda é quando o helicóptero vai para o fundo, e normalmente vai, as pessoas vão dentro do helicóptero. Não mais pessoas, mas só os seus corpos. Tem as famílias querendo uma notícia primeiro, depois, querendo o corpo e, às vezes, não tem o corpo, e nós, que estamos ali na sala de contingência, temos que dar conta de todas essas emoções que estão no ar. Temos que fazer um trabalho técnico bem feito, porque os críticos estão sempre de plantão, e [há também] a pessoa que perdeu um ente da família, mesmo que não tenha sido uma culpa direta da Petrobras; não temos palavras para [este momento]. Esse foi o pior trabalho que já fiz. Fazemos bastante, cada dois, três anos, temos que fazer um negócio desses, é muito desagradável
MELHORES PROJETOS / MAQUETES
Agora, os trabalhos que dão prazer são muitos. O xodó foi uma coisa política, foi num momento muito difícil da Petrobras, que estavam querendo privatizá-la e apareceu um vazamento num campo de Marlim, no Marlim meia dúzia, e o pessoal lá de Macaé recebia telefonemas, viemos a saber disso depois, eram telefonemas de ONGs [Organizações Não Governamentais], ou pelo menos se diziam de ONGs, que [afirmavam que] iam denunciar, e que o vazamento da Petrobras estava prejudicando o meio ambiente e nós tínhamos que dar uma solução para isso, e não podia tirar a árvore de natal que estava vazando lá do fundo do mar, na época que era o Irani Varela que era o superintendente. Pedimos orçamento para as empresas de mergulho, para fazer essa intervenção, a resposta veio: “Fazemo sim Vai custar zilhões de dinheiros, mas não damos garantia de sucesso”. Aí, caiu no meu colo fazer alguma coisa para sanar o vazamento. Foi nessa época que eu comecei a trabalhar com o Zé Almir, a fazer maquetes de madeira, porque a gente não tinha a peça para trabalhar. Construímos no laboratório a maquete e isso foi bom, porque mostrou que existia uma linha, uma metodologia muito interessante de trabalho, que é essa de se trabalhar com maquete. Aqui na Petrobras, sim, [foram as primeiras maquetes] Existe um pré-conceito: já que se trabalha num centro de pesquisas da maior empresa da América Latina, já que se está trabalhando num laboratório de robótica, trabalhar com marceneiro? Por que você não faz prototipagem rápida? Por que você não trabalha com AutoCAD? Por que você não usa o 3D Max? O colonizado tem essa coisa: “Vamos usar o melhor do mundo para fazer o melhor do mundo”. Não foi assim que o vietnamita ganhou a guerra Eles não construíram porta-aviões, eles não treinaram vários “rambos” para combater os americanos, eles fizeram ponta lá no bambú, puseram saquinhos de arroz na cintura e foram ganhar a guerra. Tem que haver consciência do tamanho das tuas pernas, dar o passo que você pode, mas saber que você tem coisas boas dentro do que você está precisando fazer. Em relação a trabalhar com maquete, enfrentei e ainda enfrento algumas resistências bastante fortes aqui, mas está aí, o resultado mostrou que funciona.
Comecei a trabalhar com vários carpinteiros, alguns se destacaram mais e hoje o Zé Almir, para mim, é o artista. Ele não é mais marceneiro, ele é um profissional do corpo de engenheiros de um laboratório de robótica. A opinião que ele dá tem o mesmo peso que a minha, ainda que eu tenha que decidir no final. Ele embarca com a gente, vai para campo. Na hora que ele fala: “Não dá para fazer isso, ou faça isso”, paramos para escutar. Nesse caso de Marlim meio, existia uma pressão externa muito grande, acho que estava para ser votada a quebra do monopólio, não podíamos dar esse mole, [para que dissessem]: “Está vazando, está vendo como a Petrobras não tem condições de tomar conta dos seus equipamentos?”. Aí, chegou lá pra mim: “Ney, vamos fazer?”, eu falei: “Vamos Estamos dentro, vamos fazer”. Fizemos a maquete e começamos a estudar opções de intervenção. Tinha um técnico aqui muito bom, o Carlos Henrique, ele hoje está fora do Cenpes. Nós desenvolvemos duas ferramentas para fazer a intervenção desse vazamento. Trabalhamos uns sete meses nesse negócio, sorte que o vazamento não era constante, era um vazamento intermitente, vaza hoje, amanhã não vaza. A Petrobras botou um esquema forte de inspeção em cima para monitorar esse vazamento, e a gente aqui, trabalhando. Até lembro um dia que o Irani, preocupado também com esse problema, na Demam [Departamento de Manutenção], na nossa oficina aqui dentro, aí estávamos lá o Alfredo, Magé, o soldador de tig, que infelizmente faleceu, e eu, estávamos soldando uma peça dessa ferramenta; o Irani era o superintendente, ele que observou isso. Foi muito interessante, ele uma vez num papo e, depois, em uma entrevista, falou isso: “Ney, eu cheguei e as pessoas não arredaram pé”, quer dizer, a leitura dele foi a seguinte: as pessoas estavam tão – eu fico arrepiado [em falar] – dentro do trabalho, tão dentro da necessidade, que elas não abriram para a autoridade chegar.
Ele era mais um Naquela hora todo mundo era igual: “Pois não? Aqui a peça é assim. Agora dá licença que eu vou trabalhar” (risos). Foi muito bonito, e isso quem observou foi ele, foi um momento muito interessante.
Acho que essa operação foi o divisor de águas, antes nós éramos mais um grupinho que estava tentando fazer algumas coisas. Nessa ocasião fizemos duas ferramentas, embarcamos, fechamos o poço em apenas quatro horas. O poço não podia parar, porque a gente não podia também baixar a nossa produção. Nós embarcamos num barco de apoio, quando estava tudo preparado, mergulhamos, e só quando a ferramenta já estava na boca de fazer o trabalho é que mandamos fechar o poço, porque, aí, também, não podíamos piorar o problema, com o poço aberto para gente fazer alguma coisa que fosse vazar muito mais, então naquela hora fechou-se o poço. Em quatro horas a gente conseguiu fazer o aperto dessa porca que estava frouxa, tiramos a ferramenta e viemos comemorar no barco. Foi o divisor de águas. Já fizemos coisas muito mais complexas, mas essa, pelo caráter delicado da situação, do momento, da estratégia do país de não perder a Petrobras, de manter uma empresa importante como essa, brasileira, suamos um bocado a camisa.
NOMES / PATENTES
Nessa época eu não dava nome para os equipamentos ainda não, (riso). Temos
que que brincar também, temos que nos divertir. Eu crio algumas siglas, assim, que têm umas brincadeiras por trás. [Patenteamos] alguns equipamentos sim. Quando a ferramenta ou quando o sistema vai ser usado mais vezes, temos a preocupação de patentear, como é o caso do Girino, que é o robô que nós fizemos para trabalhar dentro de tubulação, o caso do robô ambiental híbrido Chico Mendes, que é para trabalhar na Amazônia ou em áreas inundadas. É uma ferramenta que esperamos fazer outras operações com ela. Agora, quando é uma ferramenta que vai operar uma vez só não patenteamos. Teve uma ferramenta que eu fiz e que eu patentiei um detalhe dela, que é uma chave que encaixa de qualquer jeito numa porca, então, isso pode ser usado em qualquer outra ferramenta, porque foi uma idéia fantástica de uma solução mecânica para um problema universal. Serve para qualquer coisa, por isso que eu pedi para patentear. Mas quando é uma ferramenta que será usada uma vez e nunca mais, e que não tem nada específico nela, de novidade, não patenteamos. E estamos cheios desses exemplos, lá tem um monte deles, é o que eu quero mostrar para vocês. (risos)
PROJETO / CRIAÇÃO
Há uma outra grande luta nossa dentro do Cenpes, que é o seguinte: um centro de pesquisas não pode ser uma quitanda. Não podemos estar aqui só recebendo encomendas. Temos que trabalhar no incêndio. Apagar incêncios? Sim Temos que trabalhar para atender a produção. E o lado operacional? Sim Mas nós temos que ter liberdade para indicar coisas para o futuro, e hoje nós não estamos tendo essa liberdade conforme gostaríamos. O Chico Mendes não era para existir, porque ninguém pediu. Aí é que está Eu posso falar isso, porque eu já estive do lado operacional e do lado de pesquisa. Hoje estou mais no lado de pesquisa, mas também atuo no operacional. O que normalmente o operacional quer? Quer resolver um problema imediato: “Hoje a minha chave quebrou, quero concertar a minha chave” “Hoje o poço está parado, eu quero concertar o poço” “Hoje o meu navio está com um furo, eu quero tapar o furo”, é uma coisa muito imediata. Quando se pede auxílio ao centro de pesquisas, se espera, indivíduo ou universidade, que venha uma solução um pouco mais perene. O Cenpes, de um tempo para cá virou um órgão de demandas imediatas. São importantes? Muito importantes, mas, dentro de um centro de pesquisa tem que ter espaço para que você pense amanhã, para que os problemas de amanhã não sejam incêndios também. Nem que deixe meia dúzia de malucos dentro do Centro de Pesquisas pensando coisas para o amanhã.
PROJETO CHICO MENDES
Vou falar do Chico, do Chiquinho (riso). Estive na Amazônia em dezembro de 2004, vendo a região aonde o gasoduto iria passar, porque a Petrobras fez um convênio com a Universidade Federal do Estado do Amazonas, a Ufam, e tem um projeto lá chamado Piatã. Piatã quer dizer forte, vigoroso, em tupi-guarani, eu acho. E esse projeto estava vendendo [a idéia de] que precisava se estudar os impactos ambientais de um possível vazamento de óleo numa floresta tropical úmida, mas quando se começa a estudar isso não se fica só nisso. Foi o que aconteceu quando eu estive lá, estava a bordo de uma voadeirazinha junto com um mateiro e um colega: pãããããã; aquela rabetazinha, um barquinho de alumínio. Nós tínhamos que ir numa região atrás das árvores grandes; as árvores chegam a 50, 60 metros de altura. No meio do rio, olhamos assim - tenho fotos disso, tenho até o filme -, nas beiradas, eles chamam de igarapé, para mim aquilo é um rio enorme, (risos), mas na beirada do igarapé vimos uma relvazinha verde, parece praia de restinga, aquela relvazinha em cima da areia. Eu, dentro da minha ignorância sulista, sul-centrista, olhava e falava: “Que praiazinha legal, de um lado e do outro”. Quando o barco se encaminhou para a região que nós queríamos ir, quando chegou na interface entre a água e esse colchão verde o barco parou, porque ele não passa ali. O barco bateu assim e eu vi aquele negócio. A marola chegou, eles chamam de banzeiro, e eu falei: “Caramba, é de manhã ainda, não tomei nenhuma cerveja e eu estou vendo tudo mexer” (risos). Eu falei: “O que está acontecendo?”, ele falou: “Aqui é a tapagem”, que é o termo técnico daquilo, que têm macrófitas e canarana. Vim a estudar isso depois. “Isso aqui a gente não passa”. Eu falei: “Mas a gente tem que ir lá em terra firme”. Aí, o homem tirou um terçado, é uma peixeira desse tamanho, foi para a beirada do barco; o meu coração caiu (risos). Ele começou a cortar aquele colchão vegetal, que estava na flor da água, e aquilo abriu; ele foi com o remo empurrando o barquinho, e cortando mais, e foi empurrando, cortando. Vai até chegar lá no fundo. Eu estava entretido, vendo o que ele ia fazer, eu já tinha visto ave sair dali, mais adiante tinha jacaré, um negócio riquíssimo E o cara, tcha tcha tcha e andando. Quando chegamos lá, 50 metros depois, eu olhei para trás, cadê o caminho? Já tinha fechado de novo, eu falei: “Seu mateiro, fechou Como é que a gente vai fazer à tarde, quando a gente voltar?”, ele falou: “A gente corta tudo de novo”, eu falei: “Não Não vai cortar tudo de novo”. Isso foi em dezembro de 2004. Aí eu pensei: “Daqui a não sei quantos anos a Petrobras vai ter naquela região, sei lá, 200, 300 pessoas fazendo operações, indo ao gasoduto toda hora, entrando para fazer manutenção, inspeção, imagina se eu tenho 200, 300 pessoas com seus barquinhos e todo mundo cortando a tapagem? Não Não vai fazer isso, isso é loucura Em janeiro de 2005 eu entrei de férias, estava andando na Rua da Alfândega - adoro a Rua da Alfândega, quer dizer, adoro o Rio, já falei -, gosto de comer um quibe ali no árabe aos sábados; passei em uma daquelas lojas, no Saara, que fazem festas de crianças, que têm a Mônica, o Cascão, o Super-Homem, aqueles castelos horríveis, feitos (risos) de isopor, olhei na vitrine e tinha uma esfera grandona de isopor, aquela que a gente cola vidrinho para fazer bola de festa. Passei, voltei, olhei a bola assim, entrei: “Moço, você tem dessa bola maior?”, o cara: “Tem uma lá em cima. O fulano...”, aquelas coisas, o Saara é uma zona “Vê lá se tem aquela bola lá de tantos” “Tem, de quatro”, acho que era de 400 milímetros de diâmetro, ela é bipartida assim. E já ia saindo, eu falei: “Quero as quatro” “Traz as bolas aí”. [Veio] o cara com aquele saco preto, tudo cheio de poeira. Comprei as bolas, levei para casa; eu já estava com a idéia do robô nessa hora. Em casa comecei a brincar com esse negócio das metades do isopor, bota na água, flutua, fecha, flutua mais, quanto é que é esse peso? Voltei aqui no Cenpes, ainda de férias, [falei] com o Zé, “o Gepeto”. Ele é assim: você fala um negócio e ele já melhora, depois manda para mim, eu melhoro um pouco, e volta para ele. Em março nós estávamos com um prototipozinho do robô andando aqui no lago do Cenpes. Em março Em setembro nós fomos com o protótipo para Amazônia, na seca. Porque ainda tem isso, lá você tem quatro estações muito bem definidas: cheia, vazante, seca e enxente, muda tudo O que eu fiz? Fiz uma proposta para que não se fizesse a incursão na floresta tropical úmida da Amazônia, daquele jeito que estava sendo feito desde sempre, porque a tendência do ser humano é usar o que já está aí, está certo? Quando nós viemos com uma proposta, uma quebra de paradigma - para usar uma palavrinha da moda - para transportes em zonas inundadas, as pessoas [perguntaram]: “Ué, mas quem é o cliente?” “Não tem cliente, caramba Não precisa ter cliente, a gente tem capacidade de pensar também”. É o espaço para esse tipo de atividade que estamos pedindo aqui dentro do Cenpes. Não existe mais hoje, um Aluísio, por exemplo, que era um cara visionário, que falava assim: “É, isso pode dar certo, vamos fazer”. É o risco. A pessoa que está hoje numa determinada posição, seja de gerente, de chefe, o nome que se queira dar, ele [precisa] ter corajem (risos) para falar assim: “Acredito nesse projeto, pode trazer benefícios para a empresa, para o país, e nós aqui do Cenpes vamos bancá-lo, independente se alguém pediu ou não”. Quantos vão dar certo? Não sei, mas se de 10, um der um resultado fantástico, ele paga todos os outros.
COTIDIANO DA PESQUISA
Pesquisa é isso Não que estejamos defendendo que todo mundo faça o que quer, o que der na cabeça, não Temos uma experiência hoje, não somos mais crianças, sabemos o que estamos fazendo. [Deve-se] deixar que determinadas pessoas façam as suas propostas, até num fórum diferente. Por isso que nós criamos aqui o fórum transverso, numa tentativa de falar transversalmente com todos os outros setores que têm lá as suas caixinhas, as suas missões e suas visões, essa coisa bem caretinha da empresa moderna. Nós só conseguimos fazer um encontro do fórum transverso até hoje porque precisamos trabalhar, precisamos apagar os incêndios. Temos os projetos, temos esse monte de buracracia que temos que vencer hoje, é stif, é sap; passa-se o dia fazendo isso, vendo correio que não interessa. Tem determindas coisas que tem que se dar um tratamento diferente, e é isso que estamos pedindo aqui dentro do Cenpes, já há algum tempo. Falta ar, sabe (risos)
MUDANÇAS / PROJETOS PESSOAIS
O que mudou? Pergunta difícil. Na minha vida, eu estou exatamente fazendo esse balanço agora; não dá para saber ainda o que mudou. Dá para saber que ficamos mais críticos, mais seletivos, as dificuldades mudam, como essa que eu estou relatando, agora: querer fazer coisas [quando] a estrutura não está muito favorável. Estou fazendo esse balanço agora, porque durante muito a minha dedicação ao trabalho foi muito, muito grande, e isso até em detrimento de família, de filhos e de relações amorosas. Quando eu comecei a embarcar me separei (risos). Tenho dois filhos, a Mariana e o Vicente. A Mariana está com 31 anos e o Vicente com 28. Estou repensando a minha vida, porque fiquei muito tempo, muito dedicado ao trabalho. Isso não é desculpa, foi só um erro de avaliação (risos). Já, há algum tempo, estou tentando retomar isso com eles, em casa também, hoje eu moro com uma outra pessoa, já, há bastante tempo. O trabalho para mim é uma coisa muito visceral, muito forte, quer dizer, não é trabalho, vou tirar essa palavra, essa atividade estratégica do país que passa pela Petrobras e passa pelo o que eu acredito, ela me emociona muito, então, eu me dedico muito à ela. Mesmo aqui dentro, sem ter tido as promoções nos períodos normais, os cargos disso e daquilo. Sempre fui preterido, pelo menos na maioria das vezes, quem falou não fui eu, foram as pessoas: “Ney, de novo você não foi a consultor?”, eu falei: “Não, deixa pra lá, vou continuar trabalhando igual”. Essa relação, que deixa de ser uma relação só profissional para ser uma relação ideológica, uma relação de visão de mundo, obriga, do meu lado, que eu seja melhor ainda, para que não tenha do outro lado, críticos de plantão, aquela bestazinha: “Está vendo, eu disse...”. Hoje acho que essa dedicação foi super dosada. Mas não quer dizer que eu me arrependa, não é isso, é só uma reflexão que eu estou fazendo. Deixei de fazer coisas, por conta disso, e acho que eu vou continuar, mas, hoje, com outro conhecimento.
Esse trabalho na Amazônia está sendo muito bom. Quando eu apresentei o robô para a Universidade Federal do Amazonas, o professor Jackson, da Ufam, falou assim: “Ney que trabalho legal que vocês estão fazendo. Onde é que você fez doutorado?”, eu falei: “Não fiz doutorado não” “Não? Onde você fez mestrado?”, eu falei: “Também não fiz mestrado” “Você não tem mestrado, mas como é que vocês fazem esse negócio?”, falei: “Isso é engenharia”. Contei, mais ou menos, da minha avó, do meu pai e ele falou: “Cara, mas isso é um projeto de doutorado que você tem na mão, por que você não faz agora?”. Inocência minha, eu falei: “Jackson, isso é desonesto, eu já tenho um negócio pronto, eu vou fazer um mestrado?”, ele falou: “Isso é o que todo mundo gostaria de ter” (risos). Fiquei com aquele negócio, pensando; isso já tem dois anos e meio ou três; faz parte desse balanço que eu estou fazendo. Falei: “Até que não é de todo tão maluco assim”. Conversei aqui com o pessoal do RH e a Fatima falou: “Ney o teu projeto é de doutorado sim”. Comecei a fazer mestrado na Ufam, em Manaus. (risos) Aí que está, não [quero ser] o cara de Stanford, não Sou da Ufam, sou brasileiro. Fiz a proposta para fazer o mestrado primeiro, teve uma resistência grande aqui dentro: “Mas a Ufam, a Ufam tem nota três na Capes [Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior], porque você não faz pelo menos aqui na Coppe [Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia], que tem nota sete, seis?”, eu falei: “A Coppe sabe de Amazônia tanto quanto o pessoal da Ufam?”, não tem resposta, não é? Se eu quero trabalhar na Amazônia eu vou fazer mestrado aqui? Pode até ser que aqui tenham excelentes conhecedores do Amazonas, mas lá estou literalmente suando - [já] que lá é quente pra caramba - ao lado do cara. Onde é que eu ia aprender o lance da macrófita se não fosse lá do lado do mateiro?
Onde é que eu teria tido a idéia de não cortar, se eu estivesse fazendo as coisas aqui? Acho que esse é um caminho que está certo, que está legal. Entrei como aluno ouvinte em 2007, alunos especial como eles chamam. Fiz a prova em 2008, passei e hoje sou aluno, era um aluno especial, hoje sou ordinário. Eu não entendi isso (risos). Hoje estou fazendo o mestrado como aluno formal de lá; devo defender, sei lá, daqui a seis meses, mais ou menos, e o tema é: sistemas de transporte e locomoção em florestas tropicais úmidas e a base é o robô ambiental híbrido, o Chico Mendes. Mas eu não queria fazer um negócio, assim: “A Petrobras botou o nome de Robô Chico Mendes no projeto deles”, não Entrei em contato com a viúva do Chico Mendes, a Ilzamar e, depois, com a Elenira, que é a filha dele; marquei uma reunião com elas em Rio Branco, no Acre. Conversei com elas e mostrei o projeto, elas ficaram de conversar na Fundação Chico Mendes, seis meses depois me mandaram uma carta dizendo: “Concordamos, mas qual vai ser a contrapartida?”. Começamos a estudar isso. Nesse meio tempo a gente [chamava]: “O Robô Chico Mendes”, eu falei: “Gente, não podemos chamar de Chico Mendes ainda, não tem autorização”. Aí, começamos: “O Chico, o Chiquinho O Chiquinho”, então, ficou Chiquinho. (risos) Ano passado chegou a autorização formal, podemos usar o nome Chico Mendes para o robô ambiental híbrido, mas Chiquinho já está (risos) institucionalizado, chamamos de Chiquinho; para os íntimos. É muito simpático
e bem brasileiro, exatamente
MEMÓRIA PETROBRAS
Ótimo, maravilha Como falei no início, acho que a gente precisa muito disso. No período em que a Petrobras e o Governo anterior incentivaram as pessoas a saírem da empresa e se aposentar, acho que perdemos muito de conhecimento. Muito da história da Petrobras foi embora ali, muito da estratégia de país passou para mãos estrangeiras, porque as pessoas foram trabalhar nas multinacionais. Acho esse projeto fundamental. Não tenho detalhes do que vocês vão fazer com isso, mas só o fato de vocês estarem nos órgãos captando o que as pessoas pensam, o que as pessoas acham e a experiência da Petrobras, que é muito grande, acho isso fantástico A Petrobras não foi feita por decreto, foi feita por pessoas, e essas pessoas é que detêm esse tesão por fazer uma empresa como a Petrobras. Por isso que brigamos tanto para voltar a ter uma Petrobras como gostaríamos que fosse, com ousadia, porque todos os recordes que nós quebramos, não foi em cima de medo, foi em cima de certezas, em cima de ousadia de pessoas que se arriscaram, algumas morreram, outras ficaram doentes, mas é aquela história, como diz lá o poeta: “Eu não erro nem uma, nem duas, nem três, eu só aprendo”, quem foi que falou isso mesmo? Esqueci o nome do autor – mas ele diz que só aprende quando erra muitas vezes, então, temos que errar muito e temos que saber que podemos, não ficar com medo de errar. É Paulo Leminski [o nome do poeta].Recolher