Um dos diálogos que mais me cercam é sobre como lidar com a vontade de vivenciar a liberdade sendo mãe. Ao longo dessa primeira década de maternidade, já ouvi questionamentos diversos. Um dos primeiros foi quando meu filho entrou na creche aos seis meses. Me perguntaram se ele não era muito novo para isso, se não seria melhor que eu ficasse mais tempo com ele em casa. Quando saí do regime CLT para empreender, decidi mantê-lo no sistema integral, e então ouvi: “Mas você não quis empreender para ter mais tempo com seu filho?”
Quase perdi meu emprego quando ele, com 13 meses, teve catapora. Não pude faltar um único dia. No trabalho, era julgada por pedir para chegar mais tarde, enquanto outros me julgavam por não estar com ele. Tive que responder perguntas como: “Com quem você deixa seu filho quando vai a um show?” Curiosamente, o pai, que estava sempre ao meu lado, nunca recebia essas perguntas. Afinal, a vida de um homem não sofre tantas modificações quando o filho nasce. Mas a da mulher, sim. Sempre recaíram sobre mim as perguntas sobre as demandas da criança, seja em reuniões de trabalho ou em mesas de bar.
Viajar sozinha sempre foi um desejo. Hoje, sou grata por meu trabalho me proporcionar isso, mas percebo que a sociedade ainda enxerga essa decisão com reprovação, especialmente quando a mulher é mãe e casada. Como se nossa vida estivesse destinada exclusivamente à maternidade e ao casamento. Recentemente, me perguntaram: “Seu marido não diz nada?”
Mas será que uma mulher que busca sua liberdade está, de fato, abandonando esses papéis? Ou está, na verdade, resgatando o que há de mais essencial em si mesma, tornando-se uma mãe ainda mais conectada e presente?
Ser mãe é um dos papéis mais importantes que já desempenhei, mas não é o único que me define. Existe uma expectativa social profundamente enraizada de que, ao nos tornarmos mães, devemos abrir mão de qualquer desejo individual. Parece que, de...
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Um dos diálogos que mais me cercam é sobre como lidar com a vontade de vivenciar a liberdade sendo mãe. Ao longo dessa primeira década de maternidade, já ouvi questionamentos diversos. Um dos primeiros foi quando meu filho entrou na creche aos seis meses. Me perguntaram se ele não era muito novo para isso, se não seria melhor que eu ficasse mais tempo com ele em casa. Quando saí do regime CLT para empreender, decidi mantê-lo no sistema integral, e então ouvi: “Mas você não quis empreender para ter mais tempo com seu filho?”
Quase perdi meu emprego quando ele, com 13 meses, teve catapora. Não pude faltar um único dia. No trabalho, era julgada por pedir para chegar mais tarde, enquanto outros me julgavam por não estar com ele. Tive que responder perguntas como: “Com quem você deixa seu filho quando vai a um show?” Curiosamente, o pai, que estava sempre ao meu lado, nunca recebia essas perguntas. Afinal, a vida de um homem não sofre tantas modificações quando o filho nasce. Mas a da mulher, sim. Sempre recaíram sobre mim as perguntas sobre as demandas da criança, seja em reuniões de trabalho ou em mesas de bar.
Viajar sozinha sempre foi um desejo. Hoje, sou grata por meu trabalho me proporcionar isso, mas percebo que a sociedade ainda enxerga essa decisão com reprovação, especialmente quando a mulher é mãe e casada. Como se nossa vida estivesse destinada exclusivamente à maternidade e ao casamento. Recentemente, me perguntaram: “Seu marido não diz nada?”
Mas será que uma mulher que busca sua liberdade está, de fato, abandonando esses papéis? Ou está, na verdade, resgatando o que há de mais essencial em si mesma, tornando-se uma mãe ainda mais conectada e presente?
Ser mãe é um dos papéis mais importantes que já desempenhei, mas não é o único que me define. Existe uma expectativa social profundamente enraizada de que, ao nos tornarmos mães, devemos abrir mão de qualquer desejo individual. Parece que, de repente, nossa única função no mundo passa a ser cuidar dos filhos, como se toda a nossa identidade fosse encapsulada nesse rótulo. Ser mãe é uma das partes mais lindas da minha vida, mas me pergunto: por que não posso ser, ao mesmo tempo, livre, independente e capaz de explorar o mundo sozinha?
Os homens raramente enfrentam esse tipo de cobrança. Se um pai decide viajar sozinho, a pergunta “Com quem ficarão as crianças?” quase nunca aparece. Para eles, a individualidade e o autocuidado são aceitos como parte normal da vida. Para nós, mulheres, somos vistas como negligentes, egoístas ou, no mínimo, imprudentes. Mas por que a responsabilidade pelo cuidado dos filhos recai apenas sobre nós? Por que a sociedade não enxerga o cuidado dos filhos como uma responsabilidade compartilhada, onde o pai, os avós ou uma rede de apoio também podem estar presentes? A verdade é que o desejo de estar sozinha não surge de uma vontade de fugir da maternidade ou do casamento, mas de uma necessidade de reconexão íntima da mulher consigo mesma.
Durante minha primeira viagem sozinha para a Amazônia, longe de casa, percebi o quanto me anulei ao longo dos anos em nome dos papéis que exerço. Cada dia distante, cada conversa com outras mulheres buscando a mesma autonomia, me fez redescobrir facetas de mim que estavam adormecidas. Entendi que, para ser uma boa mãe e esposa, eu precisava, antes de tudo, ser fiel a mim mesma.
Existe uma pressão cultural que nos faz acreditar que precisamos estar constantemente à disposição da família, como se qualquer ato de liberdade fosse sinônimo de abandono. Sentimos culpa por querer momentos a sós, por desejar explorar o mundo sem levar ninguém conosco. Mas até que ponto essa culpa é genuína? E até que ponto é uma construção social, uma imposição de expectativas irreais?
Em minhas trocas com outras mães, o tema da culpa materna sempre aparece. Eu pergunto: “Quando você achou que era culpada e por que se achou culpada?” As respostas invariavelmente apontam para padrões familiares como a maior fonte de pressão na vida das mulheres.
É preciso questionar: por que uma mãe que busca momentos de solitude é rotulada como egoísta? O autocuidado não é egoísmo. Pelo contrário, é uma forma de amor que muitas vezes negligenciamos. Quando uma mãe se permite momentos de liberdade e auto descoberta, ela não apenas se nutre, mas retorna para sua família com mais amor e compreensão.
Normalizamos esconder dos filhos uma comida especial, como se não soubéssemos dizer não. Precisamos desconstruir a ideia de que o desejo de liberdade de uma mulher enfraquece seu papel como mãe ou esposa. Minha experiência me mostrou que, quanto mais cuido de mim, mais forte me torno em todos os aspectos da minha vida. Viajar sozinha ou vivenciar momentos distantes dos papéis sociais não me tornou uma mãe ausente, mas me fez mais inteira. Me ajudou a perceber que, além de cuidar de quem amo, eu também preciso cuidar de mim. E ao fazer isso, não perco nada – só ganho.
A liberdade pessoal é uma forma de empoderamento que toda mulher merece vivenciar. Ao ir além dos rótulos, ela pode descobrir um mundo de possibilidades dentro e fora de si. E ao voltar para casa, ao abraçar seus filhos e reencontrar seu companheiro, traz consigo uma versão mais plena e conectada de si mesma. Viajar sozinha é, acima de tudo, um ato de amor-próprio, e esse amor fortalece todas as nossas relações.
Então, para quem questiona: “Como você tem coragem de viajar sozinha e deixar seus filhos?” Eu respondo: como eu poderia cuidar bem deles sem cuidar de mim primeiro?
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