P/1 – Boa tarde Luiz.
R – Boa Tarde.
P/1 – A gente gostaria de começar a entrevista falando o seu nome completo, data e local de nascimento.
R – É Luiz Augusto Velloso, 18 de maio de 1958, no Rio de Janeiro.
P/1 – O nome dos seus avós e atividade, origem.
R – Os meus avós maternos eram Augusto Pereira e Adélia Pereira. Eu conheci os dois. Os avós paternos: o meu avô paterno eu não conheci e a minha avó chamava Belandina Velloso. O meu avô materno era português, e minha avó brasileira. E meu avô e minha avó paternos eram brasileiros de Nova Friburgo, uma cidadezinha aqui perto chamada Nova Friburgo e meu pai também é de uma cidadezinha chamada Bom Jardim, há uns quinze, vinte minutos talvez daqui de Friburgo aqui no Rio.
P/1 – E qual era a atividade de seus avós?
R – O meu avô materno tinha uma padaria aqui no Estácio, aqui o Rio de Janeiro, mais do que no Estácio, no morro de São Carlos. E o meu avô paterno tinha umas terras lá no interior do Rio de Janeiro, e aí os filhos vieram para o Rio de Janeiro e lá para o Estácio, para o Morro de São Carlos, lá começaram um comércio que se desdobrou num ramo de atividades importantes, comercial que veio a ser muito conhecido aqui no Rio de Janeiro que veio a ser a Casas da Banha, supermercado. E apesar de ser um negócio em geral identificado com os portugueses, no nosso caso não era. Talvez longinquamente o meu bisavô tenha sido português, mas do lado paterno não. Era do interior do Estado do Rio, talvez por isso explique que nós somos, dentro da coisa do supermercado, uma família rubro-negra, ao contrário da maioria que sempre se identificou mais com o Vasco, por causa da origem de Portugal.
P/1 – E seus pais, qual era o nome deles?
R – Manuel Hildebrando Velloso e Vilma Pereira Velloso. Meu pai faleceu em 1990, um mês depois de eu ter sido eleito vice-presidente do Flamengo e a minha mãe está...
Continuar leituraP/1 – Boa tarde Luiz.
R – Boa Tarde.
P/1 – A gente gostaria de começar a entrevista falando o seu nome completo, data e local de nascimento.
R – É Luiz Augusto Velloso, 18 de maio de 1958, no Rio de Janeiro.
P/1 – O nome dos seus avós e atividade, origem.
R – Os meus avós maternos eram Augusto Pereira e Adélia Pereira. Eu conheci os dois. Os avós paternos: o meu avô paterno eu não conheci e a minha avó chamava Belandina Velloso. O meu avô materno era português, e minha avó brasileira. E meu avô e minha avó paternos eram brasileiros de Nova Friburgo, uma cidadezinha aqui perto chamada Nova Friburgo e meu pai também é de uma cidadezinha chamada Bom Jardim, há uns quinze, vinte minutos talvez daqui de Friburgo aqui no Rio.
P/1 – E qual era a atividade de seus avós?
R – O meu avô materno tinha uma padaria aqui no Estácio, aqui o Rio de Janeiro, mais do que no Estácio, no morro de São Carlos. E o meu avô paterno tinha umas terras lá no interior do Rio de Janeiro, e aí os filhos vieram para o Rio de Janeiro e lá para o Estácio, para o Morro de São Carlos, lá começaram um comércio que se desdobrou num ramo de atividades importantes, comercial que veio a ser muito conhecido aqui no Rio de Janeiro que veio a ser a Casas da Banha, supermercado. E apesar de ser um negócio em geral identificado com os portugueses, no nosso caso não era. Talvez longinquamente o meu bisavô tenha sido português, mas do lado paterno não. Era do interior do Estado do Rio, talvez por isso explique que nós somos, dentro da coisa do supermercado, uma família rubro-negra, ao contrário da maioria que sempre se identificou mais com o Vasco, por causa da origem de Portugal.
P/1 – E seus pais, qual era o nome deles?
R – Manuel Hildebrando Velloso e Vilma Pereira Velloso. Meu pai faleceu em 1990, um mês depois de eu ter sido eleito vice-presidente do Flamengo e a minha mãe está aí.
P/1 – E a idade deles.
R – Minha mãe atualmente está com... Minha mãe é de 1935, meu pai é de 1932, tem que fazer as contas aí. Enfim, estão bem.
P/1 – E ele também era comerciante
R – Sim, trabalhou a vida inteira na Casas da Banha, surgiu ali com os irmãos, ele era o irmão mais novo, veio lá do interior do Estado do Rio e chegou aqui, já trabalhando no comércio e a vida inteira trabalhou no grupo, na empresa.
P/2 – E conheceu sua mãe como?
R – Conheceu lá, conheceu no Estácio, originariamente eu sou rubro-negro e torcedor da antiga Unidos de São Carlos, que depois de um projeto de modernização, virou Escola de Samba Estácio de Sá. E um outro tio nosso também, rubro-negro doente também, mas ele foi presidente muitos anos de escola de samba, numa época que não necessariamente eram os bicheiros que mandavam na escola de samba. Ele presidiu a Unidos de São Carlos e ele dirigiu o processo que fez a escola mudar de nome e transformar-se na Estácio como é hoje. E esse meu tio era grande torcedor do Flamengo, foi muito importante na minha vinculação com o clube. E o filho dele, Paulinho Magacho foi o meu vice-presidente, quando eu vim a ser presidente e é grande rubro-negro.
P/1 – Você tem irmãos?
R – Eu tenho dois irmãos, o Cláudio que com 17 anos foi morar na Itália, foi estudar, fazer universidade lá, agora esse ano ele voltou, ele é filósofo formado pela Universidade de Padova. E está casado com uma italiana, agora estão vindo, trabalhando aqui no Brasil, trabalhando na Unicamp, professores, estão ministrando alguns cursos e tal. Morou os últimos vinte anos na Itália, os últimos dezoito na Itália e os últimos dois em Paris, eles se casaram e foram morar em Paris. E o meu, o caçula e o outro, o Marcos, é artista plástico, desenhista, professor, intelectual. Os dois são pessoas muito consistentes do ponto de vista intelectual e tal, sem muita vinculação com o esporte. Gostam e tal, mas não tem nem de longe a ligação que eu tenho com o futebol e com o esporte.
P/1 – Marcos Henrique?
R – Marcos Henrique é o do meio e o Cláudio é o mais novo.
P/2 – Como é que era o ambiente em sua casa: pai, mãe, os dois irmãos?
R – Ah, tudo bem, a gente brigava muito quando moleque, mas tudo bem, meu pai era um cara muito na dele, muito tranquilo e tal, minha mãe já tinha uma personalidade mais forte, assim, naquela época, mais durona. Mas a nossa relação era ótima, nós convivemos assim, bastante intimamente, até o momento que os três estudaram no São Bento, quer dizer, aí depois o Cláudio e o Marcos, por outras razões, ainda no segundo grau, no primeiro para o segundo, saíram do São Bento e foram estudar no São Vicente de Paulo, aqui no Cosme Velho. Mas eu não, eu cursei o São Bento os sete anos, os quatro do ginásio e, na época os três do Clássico. Na época eu fui, a minha turma foi a última turma de Clássico no São Bento.
P/1 – Aonde é que vocês moravam?
R – Na Tijuca, nós nascemos no Estácio e depois moramos muitos anos na Tijuca, pertinho do América ali, na Campos Salles. Isso fez com que no início da minha adolescência, eu fosse ao Maracanã demais, eu ia a pé ao estádio. Nós tínhamos cadeira perpétua, quer dizer, não precisava comprar ingresso, qualquer que fosse o jogo, o lugar era marcado. Então eu vi muito futebol, tem algumas pessoas que tem a memória melhor do que eu, Vinícius França, alguns amigos aí que são terríveis com as datas. Mas eu vi muito futebol, não só Flamengo, todos, os jogos do Flamengo eu não faltava nenhum, mas os clássicos, seleção brasileira, eu era fanático.
P/1 – E você lembra da sua casa de infância, como era?
R – A do Estácio, muito, muito... nós saímos de lá e eu tinha quatro para cinco anos de idade, acho que 1962, 1963. Da Tijuca eu me lembro perfeitamente, era um apartamento confortável e a gente, eu tive... Não tenho do reclamar da minha vida, pude fazer, com muito sacrifício meu pai trabalhou demais para construir, ajudar os irmãos a construir as coisas que fizeram na vida. Eu tive tudo o que eu precisei, estudei nos melhores colégios, fiz os cursos que eu queria, viajei sempre, até passar o incentivo com a nossa formação cultural, acadêmica, foi uma coisa que a minha mãe sempre foi muito preocupada com isso e o meu pai sempre preocupado em ajudar, em viabilizar essas coisas. Então, não é por acaso que eu tenho um irmão filósofo, outro artista plástico, na verdade, a formação dele é de cientista social pela UFRJ. E a gente teve essa, sempre leu muito, sempre teve uma participação nas coisas, na escola, no São Bento, sempre fomos participantes das entidades dos nossos colégios. Eu conclui o São Bento com sete anos, o Marcos teve um problema no segundo ano do ginásio com a matemática - e no São Bento é uma matemática diferente da maioria dos colégios - e aí ele foi para o São Vicente de Paulo. E o Cláudio aproveitou porque ele era brilhante como estudante e no São Bento tinha um concurso de matemática todos os anos entre os estudantes. O Cláudio ganhou por dois ou três anos consecutivos e é um concurso “Lélio Gama”. Então o Cláudio era um aluno brilhante, um dos melhores alunos da turma, ele participou da reativação do jornal do colégio. E o São Bento que é uma instituição que até hoje eu sinto saudades e tal, e tenho orgulho de ter passado por lá, sempre foi uma instituição muito conservadora. Dom Lourenço que era o Reitor, uma dia chamou a minha mãe e falou: “Olha, a gente acha melhor para o Cláudio se transferir de colégio.” E aí, o Cláudio aproveitou e foi para o São Vicente que naquela época era um colégio muito liberal, com movimento estudantil organizado. E essa coisa fez com que eu me distanciasse um pouco deles, nessa coisa do dia-a-dia, porque eu fiquei no São Bento, conclui no São Bento todo o meu curso e com isso eles vivendo lá no São Vicente, eram outros amigos, era outro mundo na verdade. E o São Bento tinha uma coisa que até hoje é assim, é um colégio só de homens e o São Vicente não, já era um colégio misto. Mas isso interferiu pouco como formação cultural, como formação até para os concursos da época, eu não posso reclamar de nada. Até vestibular, todos os vestibulares que eu fiz eu passei, fui para a UFRJ, mas passei na Fundação Getúlio Vargas, passei na PUC e acabei só cursando a UFRJ.
P/1 – E como é o aluno Luiz Augusto?
R – Médio. Nada... Eu gostava de algumas coisas e outras eu só estudava por obrigação. Matemática, física, essas coisas eu estudava porque eu realmente era obrigado, agora história, português, inglês e geografia eu gostava muito e eu era um aluno mediano do mediano. Passava com notas suficientes sem grandes sacrifícios, às vezes com a matemática, mas nada demais. Mas eu gostava muito daquela coisa do São Bento, era futebol e aula o tempo inteiro, como era um colégio só de meninos, chegava antes para jogar bola, no intervalo era futebol e depois voltava para jogar bola. Eu também não era nada demais jogando bola, mas eu gostava tanto, e a discussão de futebol e isso me ajudou, ajudou, influenciou muito nessa coisa da vinculação com o futebol, porque era a discussão o tempo inteiro e cada um com os seus clubes, aquela gozação.
P/1 – Nos tempos de garoto, ainda, estudava, qual era, quando você não estudava o que é que você gostava de fazer, de diversão?
R – Olha, bom, primeiro sempre jogar futebol e praticar esporte, isso aí foi uma coisa influenciada pela minha mãe, eu sempre nadei, nunca competi nadando, mas muito jovenzinho a gente aprendeu a nadar. No início, no América, que nós morávamos pertíssimos e depois no Flamengo, em 1969, 1970, eu nadei na escolinha do Flamengo e o meu professor era o Rômulo Noronha que até hoje é funcionário do clube. E o grande técnico do Flamengo na época era o pai do Rômulo Arantes, o professor Rômulo, que é uma pessoa muito importante na história do clube, na história da natação do Flamengo. E aí, eu lutei judô também, mas eu não gostava muito, ali foi uma coisa que eu não sei direito porque eu lutei, até há alguns anos. Eu gostava mesmo de jogar futebol e nadar, eu nadava razoavelmente bem, mas não competia, não fui por aí. Mas sempre incentivado por minha mãe, sempre levado, a gente visitava todos os museus do Rio, sempre. Eu tive a chance de ter contato com coisas legais que até hoje me abriu muito a cabeça e isso eu acho importante. Então eu ia muito ao cinema, eu adoro, é uma coisa que eu gosto muito e é isso, eu me divertia muito.
P/1 – Como é que era a Tijuca naquela época?
R – Era uma coisa legal, a gente morava em uma região que na época era um região que era sofisticada. O nosso prédio era um prédio que muita gente importante morava, era um prédio que tinha uma família vascainíssima até hoje, na verdade eram quatro andares, dois éramos nós e uma outra, irmã do papai, mãe desse primo que foi vice-presidente comigo no Flamengo, e o outro era a família Cunha, proprietária do Café Palheta, donos de metade dos restaurantes em aeroportos do Brasil, os maiores fornecedores de refeição industrial, refeição para vôos, refeição industrial. E o Zé Eduardo, que era o filho mais velho, era Vasco doente. Ele morava no terceiro andar e botava uma bandeira do Vasco, dava vontade de queimar ela. Mas a gente morava muito bem e tal, era uma região muito legal. Aí o que foi que aconteceu? No final da adolescência basicamente, o Cláudio e o Marcos se transferiram na prática para o Cosme Velho, para Laranjeiras, porque namoravam gente dali, os melhores amigos eram dali, às vezes passavam semanas sem encontrá-los porque era outro ritmo. Enfim, atualmente eu me dou conta de que a gente está chegando de fato a ser adulto, aos 42 anos, vamos supor, quando eu vejo as pessoas de minha geração, de fato em posições e acontecendo de alguma maneira a mesma coisa com eles, com os amigos deles, hoje importantes no mundo cultural, especialmente, contemporâneos, amigos de turma, amigos de frequentar a casa. A mesma coisa comigo, enfim, a gente, desse ponto de vista das amizades, das condições de vida, graças à Deus, a gente teve condições e tranquilidade de optar e fazer aquilo que a gente se sentiu melhor fazendo.
P/2 - Nesse período de sua infância, juventude, tem amigos que você ainda encontra, que estão por aí?
R – Tem, tem, tenho. Quer dizer, vendo com menos frequência, mas o mais legal daquela época são as pessoas que tem a ver com o Flamengo. Pessoas que de alguma maneira conviveram com o meu início de fanatismo, de vinculação com o Flamengo e que depois acompanhando a minha trajetória dentro do clube, o orgulho que as pessoas sentiram assim. E sentem assim, quando se referenciam à isso, é uma coisa legal, primos mais velhos meus, tios, pais de amigos que nos levavam para o futebol. Então isso aí é uma coisa interessante, e que eles têm a ver com o fato de um dia eu ter sido presidente do Flamengo, foi dali que nasceu a vinculação com as coisas do clube, de ir a futebol, estádio, acompanhar tudo o que saía na imprensa, de acompanhar... Como eu gostei muito de ler sempre, e gosto até hoje, sou um rato, por isso também trabalhei sempre ligado à isso, tudo o que tinha do Flamengo eu comprava, era leitor desde sempre dos jornais de esportes diariamente. Anos depois eu fui trabalhar e isso, eu sempre digo, a melhor coisa é você sempre ler, o melhor hábito que alguém pode ajudar a pessoa a desenvolver é a pessoa ler e isso até hoje. Quando eu não tenho nada, por circunstâncias, eu vou almoçar sozinho, ou em algum lugar eu vou jantar, eu vou com alguma coisa na mão, sempre. Eu tenho esse hábito, no Brasil não tem muito esse hábito de sentar em um lugar sozinho e contar com uma revista, um jornal, sempre lendo. Eu gosto muito disso.
P/1 – Agora você falou de um tio seu que foi, num primeiro momento que te fez...
R – Eu não sei direito, eu acho que essa coisa de ser Flamengo, tem a ver com várias pessoas e com algumas circunstâncias de... A família da minha mãe é majoritariamente vascaína, amplamente vascaína, ela Flamengo, os dois irmãos são Vasco, mas nada fanáticos. O Cláudio e Marcos: o Cláudio gosta mais de futebol do que o Marcos porque morou anos na Itália, e a Itália se não é a mesma coisa, certamente é mais fanática do que brasileiro. Acho que é um fanatismo até mais saudável que o brasileiro, em relação ao futebol, mas eles não se declaram muito. Mas a vida inteira foram sócios do Flamengo, sempre nadaram no Flamengo, sempre frequentaram. Mas aí o que acontece é o seguinte, naquela época, o meu melhor amigo de criança - sem ser o Paulinho Magacho - meu primo e os meus primos flamenguistas, o meu melhor amigo, que hoje mora em São Paulo e sempre que o Flamengo joga lá, eu vou, ele vai, a gente marca e ele vai, o Marco Antônio ele era fanático pelo Flamengo, tanto quanto eu, o pai dele também, que é um médico que depois se transferiu para São Paulo com a família, e eles foram super importante nessa coisa do hábito de ir ao estádio, porque sempre fui, tem muita gente e o fenômeno da televisão não deve ter essa visão tão forte dessa época, eu sempre fui fanático, mas de ir ao estádio. Quer dizer, o Flamengo jogar eu não ir ao Estádio é uma coisa que para mim não existe. Eu moldo a minha vida para poder ir ao estádio e ver o Flamengo jogar. E sempre foi assim desde, talvez, esse tenha sido um legado de várias pessoas. Nós tínhamos um vizinho também muito importante nessa coisa, que é um advogado, Dr. Hélio, que também era fanático, ele na época em que eu tinha assim, uns dez, doze anos, ele tinha uma filha única e depois ele teve um menino bem mais novo. Então ele não tinha companhia de futebol e eu ia com ele. E especialmente nos jogos noturnos, no início eu não ia sozinho ao estádio, eu ia com o motorista, eu ia com o meu avô que não entendia nada de futebol, mas era a companhia e com essa pessoa, no final dos anos 1960, início dos anos de 1970, até 1974, assim, foi um grande companheiro de ir ao futebol. E alguns primos e a rivalidade do colégio, isso aí é uma coisa super importante, marca demais, marca demais. Até hoje, mesmo nesse auge, dessa maluquice de Flamengo e Vasco, a rivalidade com o Vasco, que eu procuro até menosprezar, porque eu acho o Vasco tão inferior como instituição, acho que essa rivalidade é um sucesso do Vasco porque ele de alguma maneira tem tentado se equiparar ao Flamengo, coisa que ele não é, não tem nem porquê. Não há nenhum dado objetivo que justifique isso, para mim o grande rival até hoje, a grande vitória do Flamengo até hoje não é contra o Vasco, é contra o Botafogo. Quer dizer, as minhas maiores tristezas da minha adolescência sempre foi com o Botafogo. E até hoje, por encontrar aqueles cri-cri de sempre, eles alimentam a rivalidade que eu mantenho contra o Botafogo, porque no início do fanatismo, o Botafogo era cruel com o Flamengo. Durante muito tempo eu sofri mais com o Flamengo do que tive prazer, aí quando veio a geração Zico a coisa mudou e nós fomos, eles pagavam em dobro o que eu sofri.
P/1 – Você lembra algum jogo antes da era Zico, quando você era garoto, algum jogo sofrido, que tenha te marcado?
R – Ah! Muitos! O primeiro jogo que eu fui ao Maracanã, do Flamengo, acho que foi em 1965, acho que eu tinha uns 7 anos, acho que foi esse, posso ter ido antes mas o que eu registro foi Flamengo e Vasco, gol do Silva, grande jogador do Flamengo que tem que depor aqui também. Um dos jogadores mais elegantes da história do futebol, batuta, que até hoje circula ali pelo Flamengo, ele é observador, olheiro, jogador extraordinário, que veio do Santos para o Flamengo, ou do Corinthians e depois foi do Santos. Um jogador extraordinário, grande jogador e o Silva... E eu fui à esse jogo e a partir daí acompanhei o campeonato de 1966 todo e com todas aquelas coisas que fazem parte do folclore, não do folclore mas do romantismo do futebol, o Almir, Flamengo e Bangu, que o Almir fez um gol enfiando a cara, o Ubirajara acabou soltando a bola, Bangu ganhava de 1x0, Flamengo virou o jogo, o goleiro, no último gol o goleiro espalmou, e o Ubirajara e o Almir veio de “peixinho”, jogo com muita chuva, ele botou a cabeça para botar a bola dentro do gol e até hoje tem uma foto no Flamengo, é linda! Ele com a cara toda cheia de lama porque ele precisou arrastar a cara no chão para fazer o gol. Aquele campeonato eu acompanhei muito, sofri demais no último jogo, foi aquela confusão toda do Flamengo e Bangu. Que o jogo não acabou, o Flamengo tinha um grande time e Bangu também, mas acompanhando a história toda depois, vendo a história toda verdadeira, o juiz estava comprometido com o Castor de Andrade e o Flamengo, o nosso maior, um dos maiores jogadores do campeonato era o ponta-direita Carlos Alberto, que era um jogador já a nível de seleção brasileira, muito jovem, mas que sofreu uma contusão, ele jogou mais uma ou duas vezes depois daquela partida e depois abandonou a carreira. Foi um jogo muito marcante. Eu não fui à essa decisão porque o estádio ia estar muito lotado, o meu pai preferiu que eu não fosse à essa partida, mas eu me lembro perfeitamente bem das circunstâncias e já naquele jogo eu sofri demais. E depois, em 1968, esse é o jogo que eu mais me lembro, da minha... A coisa era inacreditável, o Flamengo ia ser campeão estadual e ele empatou com o Botafogo de 0x0. E depois, o último jogo do campeonato era Flamengo e Bonsucesso. O empate dava o título ao Flamengo, então o Flamengo já entrou no estádio com 80 mil rubro-negros. E eu não fui ao jogo porque era à noite, estava ouvindo, me lembro perfeitamente, o Waldir Amaral dizendo: “O Flamengo passa a mão na taça, lustra.” 1x0, Bonsucesso, no início do jogo, gol do Moraes. E aquele desespero e eu rezava, e eu chorava. Eu sempre fui muito referenciado à Menino Jesus de Praga, até hoje a minha referência de fé. E eu rezava e ía até a frente da imagem e tal e rezava, pedia: “Não é possível, o Flamengo vai empatar, vai empatar.” E quase aos quarenta minutos: 2x0, Bonsucesso, aí eu não aguentei mais. O pior é no dia seguinte na escola, aguentar a gozação. E depois a gente foi jogar, o Flamengo tinha um timaço, perdemos de 4x1. Foi uma tragédia e o Botafogo foi campeão ali. Os anos de 1960, o Flamengo tinha um bom time o tempo inteiro, e alguns anos foram muito difíceis. 1967 foi um ano muito ruim para o clube, para o time, para o futebol. Mas você vê, o Flamengo foi campeão em 1963, foi quase vice em 1964, campeão em 1965, vice em 1966, 1967 e 1968, o Botafogo foi bi-campeão, ali, nós estávamos bem, e em 1969 nós fomos vice-campeões de novo. Quer dizer, o Flamengo sempre teve, não tinha um time a nível de seleção brasileira, mas tinha um time que o Carlinhos era titular absoluto, Carlinhos e Nelsinho que agora está de volta ao clube, o Silva no início e no final o Doval, com o Domingues, que foi talvez o maior goleiro que eu já vi jogar no Flamengo, mas que infelizmente, parece que é provado que ele andou se corrompendo na final de 1969, a expulsão dele, eu estava no estádio e foi uma coisa... e hoje não há dúvidas, as pessoas que viveram aquele momento, que ele teve algum tipo de comprometimento naquela partida que é, isso é triste porque o Flamengo contratou naquele momento o maior goleiro do mundo, o Dominguez tinha sido anos goleiro do Real Madrid e veio para o Flamengo, ele na verdade foi até um pouco responsável pelo Flamengo ir até o final do campeonato contra o fluminense, não a final porque não era exatamente a final, mas a penúltima rodada, o Fla X Flu, na verdade, esse jogo decidia o campeonato e o Dominguez foi extraordinário durante o campeonato inteiro e naquela partida ele teve uma atitude comprometedora. E hoje, quando você conversa com as pessoas que estavam envolvidas naquele momento, essas pessoas não tem dúvida de que realmente ele se comprometeu de alguma maneira com o Fluminense. E aí nós, aquele ano o Flamengo tinha um time que não era brilhante, mas dava prazer de ver jogar porque jogava com muita raça, muita. O Flamengo até a geração Zico, tinha bons times, montou bons times, mas acima de tudo era aquela coisa da camisa e da torcida que acima de tudo era muito forte. Quer dizer, eu vi o Flamengo ganhar jogos só porque a torcida influenciou e ajudou, levou para frente o time. E o time tinha jogadores muito identificados com o clube, o Carlinhos, o Paulo Henrique que durante anos foi capitão do Flamengo, o Doval, que depois foi um ídolo extraordinário e Paulo Cézar Caju. Esse sim foi um super craque, talvez até ali o maior jogador que eu tenha visto jogar no Flamengo, até o Zico. E era uma época que era isso, a mística da camisa... porque depois, quando o Zico chegou ao Flamengo, o Zico evidentemente sempre foi um jogador admirável na dedicação, mas além disso ele era um super craque, quer dizer, ele aliou as duas coisas, a identificação, a dedicação, o profissionalismo, a seriedade, talvez alguém possa ter sido igual ao Zico, mas mais do que ele nessas coisas, eu acho que é impossível ser. E ele trouxe um toque de excelência que eu não tinha visto no Flamengo. Eu não vi os tricampeonato, que o Flamengo tinha uma história extraordinária, mas eu não tinha visto o Zizinho jogar, mas com todo o respeito e admiração que eu tenho pelo Zizinho, se você analisar a história assim, a gente, o Zico foi algum degrau, no mínimo um degrau acima do Zizinho, porque o Zico fez o Flamengo se transformar numa potência nacional, conquistou projeção internacional. Mudou a escala, é uma… o Flamengo galgou, construiu um capítulo diferente na sua história.
P/1 – Você lembra o que se falava do menino Zico?
R – Eu vi o Zico desde o juvenil, eu vi o Zico ser campeão no juvenil do Flamengo. É aquilo que eu te falei, eu devo ter assistido o Zico usando a camisa do Flamengo pelo menos 90% das vezes que ele botou a camisa do Flamengo, profissional certamente, e o Júnior não porque eu só via na preliminar ou nas decisões importantes. Foi uma coisa legal ter visto o juvenil, não era juniores ainda o juvenil, porque o Flamengo tinha o Zico e um bom time, e o Vasco tinha um grande time, tinha o Roberto Dinamite, que era um jogador extraordinário do Vasco. Mas infelizmente, nós do Flamengo, na gestão do Márcio Braga, o Flamengo praticamente contratou o Roberto quando ele estava no Barcelona, insatisfeito e houve uma reviravolta na negociação, mas se o Roberto e o Zico tivessem jogado no mesmo time, acho que o Flamengo teria antes sido campeão brasileiro e antes sido campeão do mundo. Porque acho que seria o maior ataque que naquele momento, aos vinte e poucos anos, eu não sei, mas era coisa que não daria para definir direito, com o Júnior, com o Atílio, onde é que iria dar isso, com o Leandro, com o Mozer. Acho que ia ser perfeito demais, acho que ele foi um jogador extraordinário e o Zico eu assisti essa final, que foi uma final na Gávea, de 2x0. Eu vi o Zico várias vezes jogar, várias vezes nas preliminares e desde que ele virou profissional e aí então desde, ele começou no profissional e ele ainda era juvenil. Via ele nos profissionais, vi ele no jogo em que Carlinhos, quando o Carlinhos se despediu, passou a chuteira para o Zico. Enfim, acompanhei o primeiro título dele, vi tudo. Agradeço a Deus por ter tido essa coisa, agradeço ao Zico por essa... pela contribuição que ele deu ao Flamengo.
P/1 – Naquela época, você ainda era estudante no São Bento?
R – É, 1972 eu ainda estava no São Bento, eu estudei no São Bento até 1970... Eu passei para a universidade em 1977, 1974 eu ainda estava. O primeiro título estadual do Zico foi em 1974, na final com o América e ali ainda estava no São Bento. Em 1972, o Flamengo tinha sido campeão, mas o Zico jogou muitas poucas vezes, acho que nem jogou direito, mais era o Doval, Paulo Cézar, Renato, Liminha – que até hoje é funcionário do clube - , era um time que tinha um super craque que era o Paulo Cézar, tinha um zagueiro extraordinário que era o paraguaio Reyes, que tinha vindo para jogar no meio de campo do Flamengo e depois virou zagueiro. E os outros jogadores eram jogadores razoáveis, Doval, um grande ídolo, era uma pessoa... Depois eu o conheci, o Doval faleceu no dia seguinte à um jogo do Flamengo na Argentina que ele foi nosso... Eu era o presidente ou era o vice. Ele foi para o jogo com a delegação e assistiu o jogo e no dia seguinte, quando nós chegamos, à noite seguinte, quando ele faleceu, nós já estávamos no Brasil. Eu não acreditava: “Como?! Como é que ele faleceu?!” Foi assim, ele assistiu ao jogo do Flamengo à noite anterior em que ele faleceu, em Buenos Aires. O Flamengo até ganhou o jogo e era um sujeito espetacular, divertidíssimo, um ídolo, aquela coisa do bom vivant de Ipanema, conquistava as mulheres, no campo dava a vida pelo Flamengo. Era, foi inteligentíssimo, malandro. E gostaria de ter convivido mais com o Doval, eu o conheci, conversei muito com ele, mas eu queria ter acompanhado mais de perto a carreira dele no Flamengo.
P/1 – Agora eu queria voltar mais um pouquinho pro São Bento, quando chegou o momento do vestibular. A opção foi fácil ou foi difícil? Eu vou estudar...
R – Eu tinha feito uma opção anterior que foi entre o científico e o clássico que era uma diferença assim entre seguir uma carreira mais dentro da área de humanas e uma área mais de medicina ou de exatas, a definição é essa. Aí eu já tinha feito uma definição que afunilava, matemática, biologia não era muito a minha praia não. E aí eu fiz, tinha uma diferença assim, interessante, no São Bento o clássico era pela manhã, no São Bento, o ginásio inteiro eu estudei à tarde e o Clássico era de manhã. Que era uma turma que na verdade, devia ser um quarto do número de aluno do Científico que eram três turmas apenas, no Científico tinha quem quisesse fazer medicina e quem quisesse fazer engenharia como grandes campos. E no Clássico não, era uma única turma, de pouca gente, mas que foi muito legal eu ter estudado ali porque foi, já vinham as pessoas do ginásio, mas chegou gente de fora. Pepê, surfista que estudava no Santo Inácio veio e nos transformamos em grandes amigos, uma pessoa extraordinária, o cara mais capaz que eu já vi, esportivamente, ele, onde ele se metia ele era o melhor, do surfe, da asa delta, um cara extraordinário, torcedor do Botafogo, mas ele acompanhou toda a geração Zico e quase virou, quase, um torcedor do Flamengo, quer dizer o Pepê era íntimo amigo da Márcia Braga, muitas vezes a gente se encontrou no Maracanã e o Flamengo, e ele falava: “Eu não posso deixar, - ele adorava futebol -, eu não posso deixar de ver o Flamengo jogar.” Que era uma coisa muito legal. E aí, o Kiko Nascimento Brito, que a família é até hoje dona do Jornal do Brasil, e foi nosso orador de formatura, o Paulinho Forte, filho do João Forte, eram pessoas muito legais, que o Luiz Fernando Mendes de Almeida, que veio do Santo Inácio e foi uma fase muito legal. Também porque ali eu já estava virando uma personagem mais madura, já tinha ali um independência total; de decidir o que fazer da vida, dos programas e a gente criou um ambiente muito saudável. Foi o início da minha, do meu amadurecimento da visão de mundo, saber que a gente vivia numa ditadura mesmo e por conta disso, nós que fizemos um curso de humanas, começamos a perceber assim censura e aí aconteceu uma coisa inacreditável! Quando a gente, na formatura do Clássico, o nosso coordenador do Clássico era um professor de história chamado Fernando Pinho de Almeida, um intelectual extraordinário, um humanista, um cara fantástico que brigava dentro do São Bento pela sobrevivência do curso de humanas, do Clássico. E o Pinho era o nosso ídolo e a nossa referência disso, de ir contra aquele caminho que a gente estava vendo: “Você tem de ser engenheiro ou médico.” De que ciências humanas era uma coisa que simbolizava você ser uma cara meio marginal culturalmente. Não marginal, mas crítico e o São Bento era uma instituição muito conservadora. E na nossa formatura o nosso orador foi o Kiko Nascimento Brito, que hoje é diretor do Opportunity, Banco Opportunity. E o Kiko, nós discutimos o teor do discurso e o discurso foi isso, a gente acha que está errado, que as carreiras humanas precisam ser valorizadas no Brasil. E aí o Dom Lourenço, que era o reitor, é até hoje, Lourenço de Almeida Prado, um cara cultíssimo, mas homem muito conservador, pediu a palavra e começou a falar da União Soviética e de não sei o quê. E ali, pô! Ninguém liderava nada, nem pudesse estar imaginando, a crítica nem passava por isso, era uma crítica imediata, ali da nossa... Até que todos nós depois pudéssemos evoluir e fazer uma crítica mais radical que fizemos naquela era. E Dom Lourenço, o que é que tem a ver com isso? Um discurso completamente inadequado para o que a gente... E aí eu decidi seguir economia porque eu tinha a pretensão de trabalhar no grupo de empresas que o meu pai trabalhava que era a Casas da Banha, nas suas empresas. Enfim, isso gerava o vestibular e eu passei na UFRJ no segundo semestre naquele, não sei se é assim ainda, tinha uma turma que aprovava no primeiro semestre e outra no segundo semestre. Eu passei no segundo semestre, tinha feito na Fundação Getúlio Vargas, passei para o primeiro e tinha feito para a PUC, passei para administração de empresas, mas na PUC eu nem cogitei fazer e na Fundação eu comecei cursar utilizando o tempo, eu não queria fazer, era mais para ter o que fazer naquele período. Mas aí foi um tempo muito legal porque eu meio que vagabundeei honestamente, como o curso só começava em agosto, eu fiz dois ou três meses de Fundação e aí eu falei: “Eu não vou mais estudar não, eu vou curtir a coisa.” Então eu nunca li tanto, nunca fui tanto ao cinema na minha vida, Mam, Cinemateca, os cine-clubes. Assim, foram quatro meses que sei lá, foi o momento em que eu mais li e “elevei” o meu nível cultural, por mim mesmo. Eu decidia o que é que eu ia ler, o que ia fazer e foi uma coisa importante. Aí depois eu entrei na economia da UFRJ e como economista, e aí pouco tempo depois eu percebi que não era a minha praia. Quer dizer, eu até cursei três anos de faculdade já sabendo que determinadas coisas tinham a ver com a minha opção lá de trás, com matemática, com geometria, microeconomia, estatística. Foi uma coisa. E em compensação sociologia, história da economia, macroeconomia, política econômica, isso eu adorava e eu tive a chance de ter grandes professores como Maria da Conceição Tavares, Carlos Lessa, Winston Fritsch. A UFRJ fez, naquele momento rejuvenesceu o seu quadro de professores e eu tive muitos bons professores que me ajudaram a gostar desse lado da economia. Mas aí, eu concluí que eu seria assim um péssimo economista e até porque eu tinha amigos que eu sabia que iam ser brilhantes economistas e até hoje são, estão todos por aí, ou no governo, ou na iniciativa privada, estão todos aí nessa carreira. E eu ajudado pelas circunstâncias de que eu trabalhava na empresa em que meu tio era o presidente, eu aí comecei a seguir carreira mais voltada para a comunicação social onde eu me realizei. Onde eu trabalhei muito, com muito prazer e que eu trabalho de alguma maneira até hoje.
P/1 – Em que consiste este trabalho na Casas da Banha?
R – Ah, no início, eu era estagiário da área econômica, de acompanhamento de informações das lojas, das compras, já era uma empresa importantíssima, era o segundo grupo de supermercados do país, tínhamos 16 mil funcionários espalhados pelo país inteiro. Eu gostei de trabalhar nessa empresa, me deu boas noções de muitas coisas. Aí lá, quando decidi deixar de ser economista e fui para a área de comunicação, eu passei a trabalhar na área de comunicação social da empresa que era uma coisa, aos poucos foi se transformando em uma coisa muito importante. Para uma empresa que tinha 16 mil funcionários, tinha 20 mil exemplares, 18 mil exemplares, porque todos os funcionários recebiam, mais alguns clientes, mais os fornecedores, mais os órgãos do governo. Então era... E aí, na verdade a gente fazia um veiculozinho importante, interessante de comunicação, diferente do que você participar de um jornal e era muito interessante. E essa área cuidava também das promoções, cuidava do investimento de marketing da empresa, então os patrocínios que a gente fazia e como a minha coisa, o tempo inteiro foi essa coisa do esporte, eu ajudei a direcionar um pouco desse investimento para a área esportiva. Tinha tudo a ver, era uma coisa lógica do ponto de vista empresarial que eu tinha de ajudar a empresa a se vincular às coisas do esporte. E aí, isso aí durou alguns anos, tive uma experiência super legal, super interessante, a gente investiu muito no atletismo naquela hora. Isso tinha a ver um pouco de gostar de correr - esporte que eu pratico até hoje - e a gente patrocinou muitos atletas, muitos eventos e então, patrocinava algumas coisas mais culturais também. E isso aí me aproximou bastante com os jornais de esportes que haviam sido adquiridos pela empresa, a Casas da Banha em 1982. Então em 1986, muitas das coisas que nós fazíamos na empresa tinha muito a ver com o jornal. E como eu gostava demais, lia, tinha sido leitor a vida inteira. Aí eu comecei a convencer o meu primo, que era vice-presidente da área: “Acho que eu quero ir para o jornal.” 1986 todo foi a transição e aí no final de 1986 se consolidou a minha transferência para o Jornal dos Sports. Quer dizer, o que é que tudo isso tem a ver com o negócio do jornalismo? Como eu participava da elaboração, foi uma experiência de jornalismo mesmo, muito interessante, as pessoas até menosprezam esse tipo de trabalho, mas não é não, eu hoje acho que é um lado super interessante, ser jornalista.
P/1 – Como era o trabalho?
R – Porque você tinha de produzir uma publicação que tinha a ver com a vida do cara que ia lá trabalhar. Então você tinha, com isso você procura fazer coisas que façam o cara receber e leia, não jogue fora. Então você... e ao mesmo tempo você tem de atender o objetivo de comunicação da empresa, que é passar umas certas mensagens, ajudar a criar uma relação saudável e menos conflituosa com os seus funcionários, enfim, atendia à uma série de objetivos. Quando é bem feito, eu acho que é um trabalho que serve muito à empresa e é de muita utilidade para o funcionário também. Foi uma experiência legal. Então foi a primeira vez, a primeira não, a primeira vez que eu trabalhei ligado à uma publicação foi em duas oportunidades. A primeira vez, eu era diretor de comunicação do Centro Acadêmico da Faculdade de Economia da UFRJ, onde eu conheci e tive grandes amigos até hoje, tanto professores quanto alunos. E a gente se elegeu no Centro Acadêmico e além de ser uma das pessoas que pensava política dentro do Centro Acadêmico, eu era diretor de comunicação, a área social era a Monique Gardenberg, que hoje é da Dueto Produções que criou esse evento espetacular que é o Free Jazz Festival. Eu vi o evento todo nascer, o primeiro show que a Monique produziu foi lá na Faculdade de Economia, e dali ela ia ser uma economista, e acabou sendo uma empresária super bem sucedida, isso tudo nasceu de um evento lá que a gente fez, um show no Teatro de Arena da faculdade, foi um show muito simbólico, porque depois de 1968 aquele espaço tinha sido proibido de se fazer qualquer coisa. E aí em 1977, 1978 eu acho, 1977 ou 1978 que a gente fez esse primeiro show e a reitoria não queria autorizar. Mas a gente conseguiu fazer lá e a partir dali, não só os shows, mas as próprias assembléias e reuniões puderam voltar a ser realizadas ali, que é um lugar espetacular, eu não vou lá há muitos anos, mas é muito legal, tanto arquitetonicamente, eu gosto muito, tenho muita saudade da UFRJ, ali da Praia Vermelha. A Faculdade de Economia é ali ao lado do Iate Clube. E dali foi a minha experiência, a atividade política intensa, fazia movimento estudantil e essa coisa me fez editar o jornalzinho, muito mal feito, do Centro Acadêmico. E eu fiz muitas amizades, gente não só da economia, como gente de fora da economia que estão aí na vida. Já falei com a Monique, gente que estava no governo, como o João Maia, o Edward Amadeo que até hoje está trabalhando, eu tive contato com o Pedro Malan, eu votei no Malan na primeira eleição do IE/UFRJ – Instituto de Economia, como estudante eu votei nele, é um sujeito seríssimo, independente de eu divergir dele, quem sou eu para divergir dele? Mas eu acho que em alguns aspectos ele está tecnocrático demais, mas como eu o conheci como economista é um sujeito muito respeitável, tem uma formação. Até hoje eu mantenho grandes amigos daquela época. A própria Maria da Conceição Tavares que foi minha professora, que era uma pessoa... eu sabia que alguns aspectos da economia eu gostava mas às vezes eu ia ver, a Conceição dava aula para os últimos períodos da faculdade e quando já estava lá no primeiro, segundo, terceiro ano já ia ver aula dela, porque eram mais do que aula, eram coisas muito legais. Ela é uma pessoa com uma formação espetacular, brilhante e foi uma época super legal. Ela é daquela geração do Antônio Cláudio, que depois foi presidente do Banespa, presidente do IBGE, um monte de gente. E na minha geração um monte de gente que aí, o Amadeo que é um pouquinho mais velho do que eu e hoje é presidente do Banco de Boston, gente que está na televisão, o pessoal do Casseta e Planeta, foram todos meus contemporâneos de... O Hélio de La Peña é desde o São Bento, eu era mais jovem, mas tinha sido do São Bento também. O Bussunda, o Cláudio Manoel e o próprio Hélio eram da Faculdade de Engenharia da UFRJ, e o Bussunda era da Comunicação e o Marcelo Madureira eu não me lembro. Mas dessa época a gente convivia e eu jamais imaginei que o Casseta Popular, que era o jornal que eles faziam na UFRJ podia um dia inspirar um programa da TV Globo. É um programa de televisão, mas da TV Globo, um dia a emissora do Dr. Roberto ia admitir um programa com aquela irreverência! Claro que não é a irreverência da época da universidade, porque era, tinha muito de política, apesar deles terem sempre mexido muito com as coisas dos costumes e dos preconceitos, mas tinha a coisa da política. Mas é muito interessante essa transição. E a segunda vinculação com o jornalismo, com a comunicação foi o seguinte: na minha militância com a universidade, se confundia com a militância política em geral. E eu era muito identificado com uma formação política do movimento estudantil que se destacava e, São Paulo, que tinha uma tendência do DCE da USP, que era uma grande entidade no Brasil e a tendência se chamava “Caminhando”. Que depois eu vim a saber que na verdade era o braço público do PCdoB, mas essa tendência, também conheci gente que continua minha amiga até hoje. Eu tive muito contato com um jornal que marcou seu tempo no processo de redemocratização que chamava “O Movimento”, foi um jornal e a seguir o “Opinião”, que também foi um jornal muito importante do Fernando Gasparian, que chamavam de imprensa alternativa no Brasil. E o “Movimento” era um jornal dirigido por um jornalista que tinha sido da “Veja”, Raimundo Rodrigues Pereira, que tinha ganho já o
. Um jornalista extraordinário que junto com intelectuais, Chico Buarque, os Irmãos Villas-Bôas, Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Paul Singer, eles montaram esse jornal, ajudaram a fazer esse jornal e eu colaborava intensamente com esse jornal, eu fazia de tudo: escrevia matéria, distribuía jornal, fui vender jornal na porta de cinema, ajudei... Todas as maneiras era uma espécie de quase doação à coisa da redemocratização, a luta contra o final ali da ditadura, contra a censura e ali foi uma coisa muito legal. Eu até fiz uma matéria que até serviu de prova para a obtenção do meu registro de jornalismo que é o seguinte: eu fui fazer com um cara um pouco mais velho, mas acabou que a entrevista acabou sendo feita por mim, nós fomos entrevistar o presidente da OAB na época, que era o Dr. Raymundo Faoro, que era um extraordinário advogado e que fez com que a OAB deixasse de ser uma entidade em cima do muro. Ele deu uma entrevista e pela primeira vez a OAB se definiu pela anistia ampla geral e irrestrita, que era uma coisa polêmica. Os liberais brasileiros achavam, os liberais Tancredo, Thales Ramalho, eles achavam que a anistia tinha de ser um pouco limitada, o pessoal que cometeu crime mais violento não devia entrar na anistia. E a grande bandeira era a anistia ampla, geral e irrestrita e o Dr. Raymundo falou nessa entrevista: “Não, eu sou a favor da anistia ampla, geral e irrestrita, a OAB vai se mobilizar.” E quando a matéria, nós escrevemos a matéria e quando chegou em São Paulo, o Raymundo: “Quem fez essa matéria? Essa matéria é uma bomba!” Aí foi a manchete do jornal, a capa do jornal, o Dr. Raymundo dizendo que a partir de agora a OAB vai buscar a bandeira da anistia ampla, geral e irrestrita. Aquilo ali eu tive uma participação muito legal com jornal, eu tenho amigos hoje, o correspondente da TV Globo na Europa até há pouco tempo, o Antônio Carlos Ferreira era o diretor, era um dos diretores do jornal, o Márcio Bueno que até pouco tempo era diretor da Record era o diretor chefe da sucursal no Rio. Foi uma experiência política, cultural, profissional muito marcante para mim.
P/2 – Como é que você se aproximou do jornal?
R – Porque, pelo seguinte, o movimento estudantil quando se reestruturou a partir de 1977, ele estava mais ou menos hegemonizado. As referências eram de São Paulo e em São Paulo as grandes tendências do movimento estudantil era o “Refazendo”, que era, a irmã do Marcelo Rubens Paiva, a Veroca, que era líder do “Refazendo”, uma pessoa com um carisma imenso. E o “Refazendo” era a grande tendência e tinha o DCE da USP que era a maior entidade do Brasil, e a segunda maior tendência lá era o “Caminhando”, baseado na música do Geraldo Vandré, Caminhando e Cantando. E eu comecei a me relacionar com o pessoal da “Caminhando” e a gente, aqui eu comecei a pensar as coisas e o “Caminhando” era no fundo, no fundo o PCdoB que estava por trás. Não era bem assim, o movimento então, com certeza não era só isso, o Fernando Henrique estava lá, o Paul Singer, que nunca tiveram vinculação com o PCdoB, mas quando o movimento do jornal começou a ficar cada vez mais PCdoB a gente saiu, eu mesmo, eu nunca entrei muito nessa... eu cheguei a ser de longe militante, mas eu nunca concordei muito com essa coisa da Albânia, esses dogmatismos, nunca foi muito a minha... Quando essa coisa começou a ficar latente, porque aí a coisa foi se abrindo, as divergências foram se aflorando, as entidades foram ficando cada vez mais nítidas e eu falei: “Albânia! O que é que é isso?” Mesmo a coisa da China que o pessoal do PCdoB é muito ligado, tem um certo romantismo, tem o Mao, tem coisas muito interessantes ali, é um fato histórico fantástico a Revolução Chinesa, que não tinha muita coisa a ver com o Brasil. Então dali eu tenho amigos espalhados aí, o Genoíno, por exemplo, que é um homem extraordinário, eu não votaria no Genuíno lá em São Paulo hoje, mas é um sujeito espetacular! Conheço ele dessa época, um dos diretores do UOL hoje, o Alon é meu amigo da vida assim, a esposa dele também, contemporâneos dessa época, contemporânea, tem muita gente espalhada, Marcelo Barbieri que é Deputado lá, eu sempre discuti com ele. Aí tem a eleição da UNE, isso tudo aí explica porque um dia, tão jovem, eu ganhei a minha eleição no Flamengo. Acaba que os processo sindicais, políticos, eleitorais são todos muito parecidos. As experiências se repetem de outra maneira e eu lá no Flamengo reencontrei com gente que teve essa experiência também, lá trás, em algum momento da vida, ninguém faz só política no clube. Alguém, em algum outro lugar as pessoas estão com algum tipo de atividade classista, setorial, mesmo lá na minha, lá, quando eu comecei a fazer alguma coisa mais a fundo lá no Flamengo, o Vinícius que eu falei aqui, o Vinícius França que até hoje é o empresário do Chico Buarque ele entrou nessa coisa organizando os shows do Cebrad que eram shows imensos, no 1º de Maio. Ali foi a primeira experiência maior dele de organização de eventos, foi o tal show da bomba do Riocentro, o show onde explodiu a bomba, ainda bem que explodiu fora. Enfim, o Henrique Brandão que foi o meu vice-social, que hoje trabalha até no PT, pensamos muito diferente politicamente, mas persiste uma amizade imensa aí. Então essas experiências se somam, quando eu cheguei ali no Flamengo e eu fui me aproximando e eu fui sendo convidado para assumir certas coisas, nunca imaginei que um dia eu ia ser vice-presidente, não que eu não sonhasse um dia servir o Flamengo, mas eu nunca imaginei que tão rápido o Márcio Braga fosse me convidar para ser vice-presidente, candidato a vice-presidente com ele em 1991, 1990 e a eleição foi em 1991.
P/1 – A gente vai dar uma paradinha rápida. Bom Luiz, então nós ficamos falando do teu trabalho jornalístico, nos tempos da ditadura militar.
R – É e aí no Jornal Movimento que foi uma experiência muito legal, porque acaba que eu fiz uma coisa, eu entendi como uma empresinha de comunicação, não era... mas as várias etapas, os vários níveis de profissionais necessários, necessidade de ter anúncio, porque o jornal vivia de ter assinaturas e de vendas muito desorganizado, era difícil a distribuição, mas assim, mas era um jornal que marcava porque muita gente importante lia e foi uma experiência muito legal.
P/1 – E depois disso você...
R – Bom, aí eu segui a coisa do... eu profissionalmente eu estava, eu trabalhei na Casas da Banha, e quando eu retornei a coisa mais para o jornalismo, foi essa experiência da área de comunicação da Casas da Banha que durou uns três ou quatro anos e aí eu fui para o Jornal dos Sports. Profissionalmente foi uma decisão: “Deixa eu seguir.” E onde eu falo que a experiência anterior do Movimento, anterior, foi importante, é porque lá de fato eu fiz de tudo, fui repórter, fui editor, fui vendedor, fui apoiador.
P/1 – Agora, antes de entrar no Jornal dos Sports, você e um grupo fundaram a Fla Diretas. Como foi que aconteceu isso?
R – Essas pessoas todas que eu falei, o Bussunda, o irmão dele que atualmente é presidente do IBGE, o Sérgio Besserman, o Henrique Brandão, o Vinícius talvez, não me lembro. E aí o movimento de Diretas do Brasil e a gente tinha uma grupo que íamos sempre aos jogos do Flamengo e ficávamos na linha, na linha do gol e o outro lugar era o posto à tribuna de honra, do outro lado mas exatamente na linha do gol. Então os amigos de universidade e a gente ia a todos os jogos e a gente estava participando de toda aquela movimentação em torno das diretas, eleições diretas e a gente falou então: “Porque é que a gente não faz a Fla-Diretas?” Aí foi legal, deu mídia, foi legal, a gente estava sempre no mesmo lugar, tinha camiseta, tinha as bandeiras, uns instrumentos. Ali a gente conheceu melhor algumas pessoas das torcidas organizadas, o pessoal da Raça Rubro-Negra nos recebeu muito bem, o Cláudio da Raça, ele entendeu, o Márcio Braga deu uma força para a gente e o Cláudio era muito ligado ao Márcio Braga e ali a gente fez a torcida que cumpriu o seu papel naquele momento.
P/1 – Durou muito tempo?
R – Durou até a votação das Diretas.
P/2 – Era só no Estádio que se realizava ou levava para fora?
R – Quando havia as manifestações e tal a gente levava a bandeira mas não tinha... era uma coisa, a gente juntou as coisas, a gente estava participando das campanhas das Diretas e a gente ia a todos os jogos do Flamengo, juntamos as coisas. Foi legal, não foi uma coisa completamente diferente nem tão marcante porque as torcidas do Flamengo são... trazem muitos problemas mas são entidades com muito peso, com vida própria, com organicidade, é um mundo interessante.
P/1 – E aí você entra no Jornal dos Sports como repórter, como...
R – Eu entrei já como... é como eu falei para você, eu passei todo o ano de 1986 me preparando para ir para o jornal. Então eu lia tudo, conversava com um mundo de gente, lia os jornais internacionais esportivos e ajudei a influenciar o Jornal dos Sports em uma redefinição editorial porque ele tinha sido, sofrido um golpe na verdade, em sua existência, quando convenceram o meu tio – que era o presidente do jornal – a tentar fazer uma diversificação editorial no jornal. Então o jornal procurou cobrir também outras coisas além do esporte, a educação e até hoje são as duas principais áreas de atenção, de cobertura, e aí teve até crime na primeira página! Tentou-se fazer um jornal popular e isso foi terrível para o jornal, os resultados foram os piores possíveis de venda. E aí, lá do CB ainda, falei: “Isso aí está errado, é um absurdo. O Jornal dos Sports é um jornal de jovens.” A gente conhecia minimamente as informações, as pesquisas, os resultados de vendas. Aí quando o jornal voltou a ser só de esporte e de educação foi a hora que eu entrei de fato no jornal. E aí a gente iniciou todo um trabalho de melhoria editorial, de re-inserção do jornal no mundo esportivo. E esse processo andou paralelo com o meu início efetivo de participação no Flamengo. Quer dizer, porque eu dirigia a redação do jornal, enfim as manchetes, tudo o que saía no jornal era importante para os clubes. E particularmente para o Flamengo mas não só com o Flamengo, mas nessa época eu me reunia muito com dirigentes de outros clubes também. Mas no Flamengo era especialíssimo, eu era sócio desde 1968. Aí voltando lá atrás, quer dizer, o meu primeiro título de sócio que eu ganhei do Flamengo, foi como presente de Primeira Comunhão, dos meus pais, em 1968. Aí eu - sócio-patrimonial -, e aí eu fui lá, nadei uma época, fui da escolinha. Sempre gostava de ver treinos, especialmente o jogo de domingo ou sábado à tarde eu ia ver treino. Frequentava socialmente muito pouco o clube e nas reuniões importantes, a partir de 1985, 1986, toda reunião importante do Conselho eu ia e aí em 1987. 1987 não, comecei a participar de fato na gestão do Márcio, na gestão do Elói eu participei muito pouquinho, muito de longe, mas na gestão do Márcio eu comecei a ir aos Conselhos, comecei a ficar muito amigo e aí com a coisa do jornal as minhas opiniões eram consideradas, as pessoas me ouviam muito. Aí em 1987, 1988 o Márcio me concedeu o título de sócio honorário, depois entrou o Gilberto Cardoso e eu participei muito da campanha da eleição do Gilberto e no final da gestão dele, eu ganhei o título de sócio emérito também. Então essa foi a minha coisa. E essa coisa toda com o Jornal dos Sports porque eu tinha muita lucidez – eu não sou pouco modesto não -, em identificar o que era interesse do jornal e o interesse do Flamengo, quer dizer, o jornal era uma coisa séria, tratava muito seriamente, para mim foi dramática a noite do Flamengo e Botafogo, que o Botafogo foi campeão depois de vinte anos em cima do Flamengo. Porque eu sai do jogo arrasado, fui para o jornal participar, já estava muita coisa planejada, de uma edição muito importante naquele momento, porque a gente sabia que ia esgotar o que a gente pusesse na rua, porque eram vinte anos sem título do Botafogo, fiquei até a uma hora da manhã no jornal preparando a edição, aquela coisa toda e quando saí de lá com alguns amigos para jantar, eu fui para a Pizzaria Guanabara e quando a gente chegou era um mar de botafoguenses! Pô, contra o Flamengo, não é possível, eu não me conformava! O primeiro título depois de vinte anos e era contra o Flamengo. E aí... mas eu consegui trabalhar, sabendo que era uma edição histórica do jornal e o jornal bateu seu próprio recorde de vendas, a gente, no Rio, vendeu 120 mil exemplares em banca, que era uma venda muito expressiva para a capacidade industrial inclusive, porque não deu para rodar mais. E aí, eu sabia definir os interesses do jornal e os interesses do Flamengo, minha coisa pessoal. Essa preocupação ética eu sempre tive com as coisas e uma coisa era a política editorial do jornal para quem eu tinha de prestar satisfações, que eram os donos do jornal, meu primo e meu tio e os seus leitores. E do outro lado a coisa do Flamengo. É claro que muitas vezes a gente usa, as coisas se combinavam, várias promoções que o jornal fez junto com o clube na área social, na área de eventos, como fizemos com outros clubes também. Mas eu sabia mais das coisas que aconteciam mais no Flamengo e então fizemos coisas legais. Ajudei no que eu podia a atividade social e cultural do clube.
P/1 – Como é que era o dia-a-dia do Jornal dos Sports?
R – Bom, primeiro falava de futebol o dia inteiro e de outros esportes que era muito prazeroso também. Eu chegava até dez horas, dez e meia da manhã e eu já havia lido o Jornal dos Sports e um jornal pelo menos. Na minha sala tinha todos os outros jornais e eu acabava de analisar o que o jornal tinha publicado com os demais jornais. Tinha contato com as outras áreas do jornal para verificar como é que tinha sido a rodagem do jornal naquela noite, se os horários tinham sido cumpridos. Porque parece que não, mas cada vez mais, hoje o jornal, para você fazer um jornal impresso é você produzir um produto que não é um sapato, quer dizer, você tem de cumprir um horário. Se não cumprir o jornal não chega, não sai na hora certa e não vai chegar na casa do leitor na hora certa, nem no ponto de venda e você perde o ponto de venda por causa disso, você desagrada o leitor, você perde anúncio. Então você tem uma atividade que é cada vez mais cronometrada e acho que... Enfim, esse acompanhamento todo era feito ali de manhã para que na hora que a redação chegasse a gente começava a discutir a edição daquele dia considerando o que tinha acontecido na edição anterior, se o horário tinha sido cumprido, se não tinha, o que é que nós tínhamos dado melhor ou pior do que os demais jornais. Quando eu comecei no jornal, a informatização ainda estava engatinhando nos jornais, os jornais ainda não tinham os terminais, era máquina de escrever e era um processo muito diferente do que é hoje. E aí, à tarde era acompanhar a produção das coisas, do pessoal que estava na rua e acompanhar, buscar informações sobre o que é que estava acontecendo, e daí eu tomava conta da área editorial e da área de promoções também, o marketing do jornal. Como é uma empresa, acho que até hoje não deve ter mais de 250 funcionários, na época era isso, o que me dava muito prazer! Eu chegava as dez horas e não tinha hora para sair. Eu jantava, eu acho que acontece isso com grande parte dos diretores de jornal, ainda mais com jornais bem maiores, então a rotina. E eu sempre gostei muito de ver os eventos e muitas vezes fui ao futebol e voltei para o jornal, porque é muito perto do Maracanã, onde estava o Jornal dos Sports e então... Se o evento justificava uma edição mais cuidadosa, eu então estava lá para acompanhar. Porque é sempre bom você, a gente trabalhou, eu sempre trabalhei com pessoas muito legais, muito competentes, mas você, quando você representa o interesse da empresa é um pouco diferente, você tem de atender à determinados objetivos. Às vezes a edição que satisfazer mais, a manchete que pode satisfazer mais ao editor não necessariamente pode ser a melhor manchete naquele. Em qualquer lugar é assim. Então eu vivi muito o Jornal dos Sports, até 1990, final de 1990. Quer dizer, depois da Copa do Mundo da Itália, que a gente fez um trabalho muito legal, o Jornal mandou quinze pessoas para a Copa do Mundo da Itália, foi uma mobilização muito grande, editorial, comercial, industrial e é uma pena que o Brasil não foi bem na Copa, isso não foi. Apesar de que Copa do Mundo não é um evento importante para a imprensa escrita, não só para os jornais de esportes, hoje pro Lance, O Globo, do ponto de vista de venda, porque é um evento hoje cada vez mais da televisão e a televisão acaba esgotando todos os assuntos. Então o cara passa o dia inteiro diante da televisão, a televisão deixa de ser apenas uma, ela não cumpre apenas o papel que ela cumpre normalmente, ela esgota muitos dos assuntos que em geral você só obtém esse nível de informação nos jornais na maior parte do tempo, durante a Copa ou Olimpíada não, os caras tem tantas informações, o volume atinge um tal nível que o trabalho da mídia impressa fica um pouco, acaba ocupando um pouco este espaço. Então os resultados das vendas mostram isso, quer dizer, em Copa do Mundo as vendas, inclusive às vezes caem, dos jornais esportivos, no Brasil, não no exterior, no Brasil cai. Nesse ano, na última Copa da França foi mais ou menos assim para o Jornal dos Sports e para o próprio Lance, até porque no Brasil os jornais, mesmo somados, se você somasse hoje o espaço ocupado pelo Lance e pelo Jornal dos Sports, ainda é um espaço relativamente pequeno em relação ao que os principais jornais esportivos do mundo ocupam em seus países. O maior jornal espanhol hoje é o Marca, jornal esportivo, vende mais que o El País, o maior jornal de venda na Itália é a Gazzetta dello Sport, vende mais do que o La República e o Corriere della Sera, tiragem de um milhão, um milhão e 200 mil exemplares, dois milhões quando a Itália... Se a Itália tivesse ganho no domingo, na segunda-feira tinha batido em dois milhões certo. Tanto é que foi o recorde de audiência na França, na Itália na história da televisão dos dois países. Na França inclusive é natural até, na Itália acho que eles já tiveram oportunidade até de bater esse recorde mas na França é explicável. Porque a França eu acho que agora definitivamente entrou no seleto grupo das potências mundiais. Então essa coisa do Jornal dos Sports eu aprendi muito e a minha segunda maior escola em relação aos esportes, e até os negócios, primeiro evidentemente foi presidir o Flamengo, mas o jornal me deu uma outra visão da coisa do esporte, da administração, dos negócios. Eu sempre tive que ser muito crítico de tudo e muito pé no chão. Quer dizer, muito crítico sem ser crítico na exposição das coisas. Eu aprendi, aí muito já pela experiência do Flamengo a tentar sempre me colocar na posição da pessoa que eu estou criticando, eu tento ser justo, independentemente de eu concordar ou não com a pessoa. Mas aí muitas vezes você critica, e o exemplo clássico disso é hoje na televisão, a análise da arbitragem. Tem um lance duvidoso, aí passa cinco vezes o mesmo lance de câmeras completamente diversas e no último lance o cara conclui que o juiz errou e diz: “É um absurdo, o juiz errou!” Bom, teve chance de ver cinco vezes por ângulos diferentes e concluir que o juiz errou. O cara está lá, na hora ele não tem um segundo para decidir, ele tem o direito de errar. Eu não estou dizendo que não há mau juiz porque há mau juiz e nem juiz desonesto, mas é essa posição diante da crítica que eu hoje, principalmente depois da minha passagem pelo Flamengo, eu hoje sou, tenho muito cuidado com essa coisa, eu tento sempre entender a motivação da pessoa na hora de ter feito, seja lá no Flamengo, seja na política, seja em qualquer lugar. Quer dizer, eu sou uma pessoa muito compreensiva.
P/1 – De 1987 até final de 1990 você colabora com o Flamengo?
R – É, do Gilberto e do Márcio, mas nesse nível, quer dizer, eu ia aos clube, eu ia aos Conselhos, acompanhava os acontecimentos, os eventos, eventualmente até influenciava algumas coisas porque tinha até uma posição que me permitia ter opinião e as pessoas me escutavam e tal, mas eu participava muito do Flamengo já. Mas eu sempre tive a preocupação de saber diferenciar o meu papel de conselheiro do clube, membro do Flamengo e de diretor do Jornal dos Sports. Às vezes as pessoas tentavam confundir, quando o Botafogo foi bi-campeão em 1988 no Rio de Janeiro, o Botafogo foi campeão de uma maneira tumultuada porque no último jogo do campeonato o Vasco estava levando porque se houvesse um determinado resultado o Vasco seria campeão também. E o resultado acontece e nós do Jornal dos Sports entendemos que o campeão era o Botafogo e o Eurico que era o Vasco e não sei o quê. E a manchete do dia seguinte foi: “Botafogo Bicampeão” e o Globo e o JB nem saíram com essa coisa taxativa e o Jornal dos Sports saiu. E a decisão acabou indo para o tribunal que acabou dando o título para o Botafogo e a manchete do Jornal do Sports foi instrumento de defesa do Botafogo. Aí depois o Eurico foi um dia na televisão conosco: “Não, porque essa coisa é um absurdo. A mídia influencia, o Jornal dos Sports influenciou.” “Ih, ele não é nem Botafogo, é Flamengo!” (risos) Naquela época ele queria ser polêmico com todo mundo mas era o certo, o Botafogo era o campeão naquele ano. E aí a gente, olha que eu não queria dar essa manchete porque eu repito, não gosto do Botafogo, mas eu era obrigado, era o correto naquela hora.
P/1 – Nas reuniões de conselho, você pensava dentro de você: “Eu gostaria de ser presidente.” Um dia eu vou chegar lá?
R – Não, até eu imagina, eu me imaginava ainda sem, não se colocava isso. Uma vez eu comecei a imaginar que talvez pudessem me chamar para ser o vice-presidente dessa área de comunicação social. Mas o que aconteceu foi o seguinte: o Márcio Braga, estava acabando a gestão do Gilberto Cardoso em 1990, ele tinha sido um presidente que enfrentou de muitas dificuldades, políticas de relacionamento, a imprensa, boa parte da imprensa foi muito cruel com o Gilberto, que inclusive o Cléber, que veio a ser presidente, foi várias vezes excessivamente duro, eu acho, com o Gilberto. E diante daquele quadro ali, algumas pessoas, eu pessoalmente, entendemos que era a hora da volta do Márcio Braga à presidência. Um fato ruim para o Márcio, mas bom em relação à essa ideia é de que o Márcio tinha perdido a sua reeleição para deputado federal. Aí eu, o Vinícius França, o João Henrique Areias e algumas outras pessoas resolvemos convencer o Márcio de que ele devia voltar a ser candidato. Eu tive uma conversa e era uma conversa até um pouco dessas que acaba: “Puxa vida, eu alí, diante do Márcio, que era uma instituição o Flamengo...” E a gente tentando convencer, conversei meia hora, eu era muito amigo da Márcia Braga, filha dele e um dia nós encontramos com ele no centro da cidade, fomos andando ali na Rio Branco e na esquina paramos ali e ficamos meia hora conversando: “Você tem de ser, não tem outro.” “Pô, mas eu tenho de reconstruir a minha vida, está toda desorganizada, tenho de voltar de Brasília para o Rio.” E eu e a Márcia insistindo muito e aí o Gilberto ia lá, por outros lados, com outras pessoas, o Josef, pedindo que ele aceitasse e ele acabou aceitando. Aí ele se lançou candidato e um dia, eu estava lá no jornal e me ligou uma pessoa que era muito ligada à ele, que era até a pouco tempo funcionário do Flamengo, não sei se ainda é, o Eduardo Manhães, era uma espécie de coordenador político do Márcio: “Eu preciso falar com você.” “Vem aqui.” Eu imaginava que a gente ia conversar sobre o processo político, eleitoral e aí chegou lá e ele falou assim: “Olha, o Márcio pediu para eu te fazer um convite para que você seja o companheiro dele de chapa, como vice-presidente.” Eu quase caí para trás e aí, “Você está me convidando na verdade para eventualmente ser presidente do Flamengo em algumas situações que o presidente vai ter de se afastar.” Eu tive a noção exata da dimensão da proposta. Aí o jornal estava vivendo um momento de redefinição, porque o próprio grupo vivia um momento difícil, os supermercados do país inteiro estavam vivendo uma crise grave e o C.B. iniciando um crise que levou à sua dissolução e então eu estava um pouco desestimulado pelo futuro do jornal naquela hora ali. Aí fui ao Venâncio que é o meu primo mais velho, que mais ou menos liderava essas coisas dentro da empresa e meu tio que era o Presidente da empresa, pedi um dia para pensar e fui lá e expus o que estava acontecendo, que o Márcio Braga era razoavelmente amigo do meu tio, das atividades da política e do mundo empresarial, e os meus primos me deram muita força. O meu tio ficou sempre com um pé um pouco atrás porque ele tinha medo da vinculação do nome da empresa com determinado clube, mas os meus primos sempre foram: “Não, não. Aceita, vai para lá, é legal.” Bom, quando eu fui falar com o meu pai, quer dizer, a primeira pessoa que eu fui falar foi com o meu pai, ele já não estava muito bem de saúde e o meu pai tinha, era uma coisa, apesar de depois ele ter até ganho do Helal numa eleição até que me fez afastar um pouco pessoalmente dele durante um tempo, mas o meu pai tinha na figura do Helal uma coisa de importante no Flamengo e ele falou: “Vem cá, o Helal vai estar do lado de quem?” Eu falei: “Não do Márcio, ele vai estar com a gente.” “Ah, então está bom. Vai.” Enfim eu busquei lá autorização porque eu tinha de sobreviver, eu vivia do meu trabalho, como vivo até hoje. Tive muito conforto em casa, muito por causa de meus pais, mas não fui milionário, meu pai não era o dono da empresa e tal, nós vivemos bem. Aí eu consegui que a empresa mantivesse o meu salário, mas que eu me dedicasse ao Flamengo, aí o Márcio confirmou a candidatura, isso aí eu tinha uns 33 e pouquinhos, 32 anos e a gente ganhou a eleição. Foi duríssima! Duríssima! E aí foi uma gestão muito conturbada por vários aspectos. O Flamengo vinha numa... vários problemas do Flamengo estavam sendo empurrados com a barriga e continuaram sendo, a situação financeira do clube não era muito boa e aí eu me divergi muito com o Márcio à postura dele em relação à presidência, porque ele assumiu a presidência e logo depois começou a desenvolver projetos próprios de ser Secretário de Estado, foi Superintendente da Suderj e, naquele momento e hoje ainda, o presidente do Flamengo, não tem condições de tocar muita coisa, ele tem de se concentrar porque é muita coisa. Naquele momento, mais até do que hoje, porque o clube não tinha estrutura profissional que já tem hoje, quer dizer, aos poucos o Flamengo foi montando uma estrutura de funcionários tanto em número como em qualidade, que vai permitindo que o “dirigente amador” vai se tornando imprescindível ou a sua transformação também inevitável. Se comparar a estrutura que nós temos lá, hoje em 2000 ao que nós assumimos lá em 1991 é muito diferente. O Flamengo já tem um estamento ali que é de funcionários de grande competência e que na verdade tocam o clube sozinho. Acho que hoje até o dirigente amador atrapalha mais do que ajuda. Mas naquela era foi uma decisão, quer dizer, primeiro eu não esperava o convite. Seguramente não passava pela minha cabeça aquela história. E segundo eu, comecei a viver, enfim, foram quatro anos em que eu, tinha semanas que eu só saia para ir ao Maracanã ou para ir para alguma outra atividade, porque eu sempre trabalhei, depois que eu saí da Tijuca, há muitos e muitos anos, me mudei para o Leblon e Gávea. Sempre fiquei por ali e a vida era sempre pelo Flamengo. Então foi de dedicação quase exclusiva. Eu ia ao jornal quase duas ou três vezes por semana, muitas vezes até por encontros ou situações que até tinham a ver com o próprio Flamengo ou que tinham a ver com o jornal e com o Flamengo. Aí nesse período eu influenciei muito pouco o Jornal dos Sports e me deixaram na presidência, muitas vezes eu fui criticado pelo jornal. E deixava rolar porque eu não me preocupava em influenciar, eu estava distante e a não ser que a coisa partisse para uma coisa absurda, está totalmente errado, não é nada disso. O editor do jornal é uma pessoa fabulosa durante todo esse período, o Carlos Macedo, que hoje trabalha na agência do Lance, profissional e uma pessoa admirável, um cara espetacular mesmo e me ajudou muito, me dava cobertura nessa coisa.
P/1 – Nesse período de vice-presidente geral, quais foram as preocupações, os principais feitos que o Márcio, você e a diretoria fez dentro do Flamengo? Não existia sede?
R – Ali tinha acontecido o seguinte: o Flamengo tinha construído um esqueleto e que ficou por muitos anos não concluído e ficou lá o esqueleto e o Flamengo não ocupava, não ocupava. Quando o Márcio, quando nós assumimos precisava retocar aquela história. O Gilberto Cardoso, no finalzinho do mandato dele tinha iniciado um entendimento com uma empresa chamada Pinto de Almeida para revitalizar aquele empreendimento, mas acabou não concluindo e durante essa gestão em que eu fui vice-presidente, também a coisa não andou, mas assim que eu assumi a presidência, eu, seja porque, às vezes as coisas acontecem menos pela sua ação e pela sua capacidade, mas mais pelas circunstâncias. E aí a gente consegue concluir a negociação com a Pinto de Almeida e no final do meu mandato como presidente a gente entregou a sede ao clube, a gente concluiu a sede, coisa que eu me orgulho muito porque era uma aspiração antiga e tal e foi um trabalho de gente admirável. Eu costumo dizer que no Flamengo eu conheci gente que eu prefiro não ter conhecido, mas tem gente que tenho a vida pela amizade, pela consideração, pelo respeito. E algumas dessas pessoas, exemplos disso são algumas pessoas que nos ajudaram a concluir aquela sede lá. O Coronel Brother, o Roberto Sá, o Maia, o Renato Noval, alguns profissionais, o pessoal da Pinto de Almeida, era uma confusão aquela história, tinha problema na prefeitura, tinha problema, o Hélio Barroso e o próprio Edmundo que hoje é presidente, era da comissão de obras naquele momento e foi uma pessoa que já na condição de vice-presidente era um cara extremamente dedicado ao Flamengo e que cumpriu um papel muito importante na busca de soluções, que é como eu tinha falado, só aparecem depois. O grande, quando eu falei lá atrás que hoje eu analiso as administrações e os governos de uma maneira muito cuidadosa porque nem sempre o que você faz certo hoje, o resultado aparece hoje. Às vezes o resultado aparece depois, alguém capitaliza aquilo e as pessoas esquecem de que aquela história foi plantada, aquela história foi lançada por alguém. Isso no futebol é muito comum. Quer dizer, inegavelmente o período Zico é o exemplo, é o momento mais glorioso da história do Flamengo, primeiro porque tinha um grande time e segundo porque tinha uma administração, ou duas ou três que ao longo do seu período souberam dar um suporte àquele time. Porque para você ganhar campeonato, precisa ganhar fora do campo, precisa dar estrutura, precisa dar oportunidade ao jogador, pagar bem, resolver os seus problemas, dar condições de treinamento, de trabalho e então... Só que alguém fez o Zico! Alguém trabalhou a geração Zico e foi a administração anterior à chegada do Márcio e do Antônio Augusto à presidência do Flamengo e foi gente que depois, é verdade que de certa forma precisou ser substituída na direção do Flamengo, mas na hora do futebol ele foram extremamente importante, foram eles que implantaram o trabalho do craque que se faz em casa, que é desenvolver os craques nas divisões inferiores, quer dizer. Doutor Hélio Maurício que era o presidente do Flamengo nessa época e um pouquinho antes, um pouquinho, o Dr. Richer, eles investiram muito nessa coisa, quer dizer, o Zico não nasce da noite para o dia, quer dizer, você, alguém investiu nele lá atrás, alguém acreditou nele. Muita gente, às vezes, teve dúvida se valia continuar investindo nele porque o resultado não apareceu imediatamente na proporção que se imaginava, mas eu acho que a pessoa que simboliza isso aí, que já faleceu, foi um dos maiores rubro-negros que eu já conheci, um dos caras que mais pensou o Flamengo de fato, acima de qualquer divergência, foi Ivan Drummond, que a gente chamava ele de Barão. O Barão era uma pessoa extraordinário, um cara que pensa, conhecia futebol, ajudava todos os presidentes, independente de quem fosse e ele lá atrás, na administração do Dr. Hélio e do próprio Dr. André Richer ele que montou toda aquela estrutura nas divisões inferiores no Flamengo e que gerou essa quantidade imensa de jogadores que a gente gera até hoje. E nasceu lá essa coisa e outras pessoas capitalizaram, o Flamengo é um só. Eu tenho muito essa visão, eu tenho uma visão muito própria hoje, eu tento fazer o máximo para que o Flamengo seja entendido como uma coisa só, ou nós ganhamos ou nós perdemos. Eu não gosto daquela coisa: “O meu time ou o time dele.” É o time dele, o time do presidente Kléber Leite é o time dele, do Edmundo. Então a gente precisa reconhecer essas coisas. Mas eu estava falando em relação à outras coisas, quer dizer, você, nem sempre aquilo que começa a ser projetado num determinado momento, frutifica ali, frutifica às vezes no futuro. E nem sempre, você às vezes trabalhar a longo prazo, nem sempre você tem as coisas reconhecidas. No futebol então que o que vale é o resultado, isso é muito comum.
P/1 – E no esporte amador?
R –No esporte amador do Flamengo, que hoje na minha opinião passa por um momento muito importante de reflexão lá para a gente não perder a coisa, primeiro não existe mais esporte amador e porque já a alguns anos o esporte amador é cada vez mais, menos amador, porque mesmo modalidades que historicamente foram desenvolvidas de maneira amadorística, não são mais. Aliás, praticamente todas as modalidade olímpicas, no Brasil, o atleta de ponta já não é mais amador. E quando você tem uma instituição poli-esportiva, como é o Flamengo, como é que você distribui os seus recursos para essas modalidades? É uma discussão que nós estamos vivendo agora porque se o Flamengo na Olimpíada de Seul, a delegação do Flamengo era maior do que muitos dos países que estavam participando das Olimpíadas. Mas ainda ali, muito dos atletas ainda eram semi-profissionais ou semi-amadores. Hoje já não dá mais para ser assim. Então não adianta o Flamengo querer disputar hoje 13 ou 14 modalidades porque o Flamengo não nasceu para competir, o Flamengo nasceu para ganhar, então nós vamos definir o que é importante historicamente para nós, o que a nossa história tem a ver para que nós tenhamos condições nessas modalidades de sermos os melhores no mínimo no Brasil e de preferência disputar com os melhores do mundo. Eu tenho a minha opinião, mas a natação, o basquete, o remo, porque nós nascemos o remo, alguma modalidade, tem de fazer isso porque tudo ao mesmo tempo agora já não dá mais. Porque da onde é que vem os recursos? Ou vem dos patrocínios ou vem das receitas que o Flamengo tem, dos sócios e do marketing. Mas é um patrocínio específico. Então é um... Mas enfim, eu sempre fui muito ligado nisso e eu falo isso, é claro que eu gostaria de ter 14 modalidades olímpicas no Flamengo mas eu acho que não dá mais. Porque quando eu fui vice-presidente, o Flamengo ganhava as 14. O Flamengo chegou na natação do Brasil, a ganhar dez ou doze vezes seguidas do Troféu Brasil, não só porque eu nadei, mas eu acho que a natação no Flamengo é muito importante do ponto de vista do quadro associativo, dentro das escolinhas, é de longe o maior número de participantes, portanto de sócios. O Flamengo tem um parque aquático que é muito legal e que agora eu sei que vai ser ainda mais, vai ser ampliado, vai ser reformado, vai ser modernizado e o Flamengo deu grandes glórias à natação brasileira e grandes conquistas. Eu tive um querido amigo que foi um dos maiores técnicos da natação no Brasil, que já faleceu, que é o Daltely Guimarães e a Patrícia, o Rominho, enfim, a Maria Elisa Guimarães, que foi uma extraordinária nadadora, a Cristina Calu, enfim. É uma modalidade muito importante por todos os motivos e que merece ser incentivada e tal e na minha época eu dei muita força tanto como vice-presidente como presidente. E esporte olímpico tem um lado legal dessa coisa do esporte, tem um pouco de romantismo mesmo já nas atividades já mais profissionalizadas, os técnicos em geral, os seus atletas mantém uma relação muito legal. Se você passar o dia ali no Flamengo é muito legal! Você acompanhar uma modalidade no momento em que ela está se aproximando de uma competição muito importante, a dedicação, a responsabilidade dos atletas. Esse lado é um lado que eu sempre curti muito e eu sempre gostei de ser vice-presidente de esportes olímpicos na gestão do Márcio. Foi ele que me colocou lá, eu não me propus porque era um problema político seríssimo. Um problema financeiro que se desdobrou em problema político e aquilo ali foi importante depois na questão da eleição porque eu me identifiquei muito com os técnicos e com os principais atletas do Flamengo e eu sempre tive uma ótima relação com os atletas.
P/1 – Luiz, a gente está começando a chegar no final da entrevista e eu gostaria de saber o que é que você acha de ter deixado o seu depoimento para o Museu do Flamengo?
R - Primeiro eu acho que esse é um projeto muito legal e que merece o meu apoio de qualquer nível, eu fui ver a exposição dele lá, quando foi exposto o projeto global de organização da memória do Flamengo que é uma coisa muito legal, tendo a ver com aquilo que eu falei de que as coisas às vezes, são plantadas hoje para frutificar depois. Basicamente as pessoas mais importantes que tocam esse projeto, se introduziram na administração e na política do Flamengo através de mim. São pessoas super generosas com o Flamengo e que eu sei que estão se dedicando ao máximo nesse projeto e é a tal coisa, foi plantado lá atrás. Naquela época a gente não tinha tempo de pensar direito nisso, é o tal negócio, essa coisa da marca, essa coisa do que um clube pode se desdobrar em termos de registros culturais e disso se desdobrar em outras coisas, é um fenômeno muito recente. Felizmente, nesse momento, as pessoas que estão na administração do Flamengo, responsáveis têm a noção disso e estão tendo – é preciso que se faça justiça nesse aspecto ao presidente -, o presidente está prestigiando este tipo de atividade. Deve ter gente que deve estar reclamando lá que no Flamengo os recursos são escasso com a demanda infinita. Todo mundo acha que a sua área no Flamengo é a mais importante, mas claramente daqui a muito pouco tempo essa vai ser uma obra que vai ficar para a história do Flamengo porque vai organizar tudo aquilo que eu sei, você sabe, os atletas, os profissionais, as histórias, os livros. Acho que a bibliografia sobre o Flamengo é muito menor do que deveria ser. Acho que eu tenho boa parte dela, contribuindo o que eu pude para ela se desenvolver, tanto por dentro como por fora do clube. Portanto, eu acho que esse projeto que vai, contemporâneo, faz a sua razão de ter, o primeiro passo, lá atrás, a gente começou a pensar isso e aí na própria gestão do Cléber, O Flamengo passou a ter uma sala de troféus digna, começou a pensar essa história de como organizar toda a sua tradição através de coisas que estão aí para serem aproveitadas pelo clube, a universidade, entidades que sabem como fazer isso e eu acho que nós estamos dando um passo legal para que até desse ponto de vista o Flamengo esteja na frente dos outros. Quer dizer, eu só posso agradecer por fazer parte dessa história. Eu não sei em que nível de importância, mas eu costume dizer que certamente eu não serei nada mais, não ocuparei nenhuma outra função, eu posso conquistar várias outras coisas na vida, mas nada me dá o prazer de ter sido presidente do Flamengo e poder fazer um depoimento desse tipo. Tem uma coisinha que eu queria deixar. Um dos maiores desafios que eu tive no presidir o Flamengo não foi só ter tido as responsabilidades dos cargos, de ter que decidir, daquela coisa, foi como eu tive de me relacionar com gente que para mim era tão importante que às vezes, o cara estava ali em uma situação em que eu tinha de me definir. Quer dizer, e essa era a coisa do amador, quer dizer, quando eu era torcedor a vida inteira, eu estou falando isso porque eu acho que é importante ficar registrado porque é a maneira de eu homenagear as pessoas que me fizeram feliz no Flamengo. Então era assim, eu presidi o clube que tinha como funcionários o Dida, o Joel e os caras chegavam na minha sala “Presidente!” com um sentido de respeito e os caras fazem parte da história dez vezes mais do que eu, quer dizer. A mesma coisa eu tive de conversar com o Júnior no dia que ele decidiu para de jogar futebol. E ele foi lá, eu peguei como presidente o Júnior, ele seis meses como jogador e ele foi lá na minha sala angustiado: “Olha, não dá mais, preciso parar.” E eu falei: “Então você vem ser técnico.” “Não, não está na hora e não sei o quê.” Mas dois ou três meses depois ele voltou e aceitou ser técnico. Como é que era difícil o Júnior como jogador e eu como presidente, a vida inteira ele era o máximo. E eu acho que eu tive essa noção, quer dizer, com todo respeito, o Zico então nem se fala, mas eu não precisei trabalhar profissionalmente com ele, infelizmente ele não foi meu profissional, mas seria o auge do desafio. E, portanto essa, eu acho que sempre foi o maior desafio, como lidar com o ídolo e como lidar com a responsabilidade do cargo. Eu acho que o que eu procurei fazer foi o que eu entendi melhor para o Flamengo.
P/1 – Muito obrigado.
R – Obrigado vocês.
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