P - Jasiel, a gente começa perguntando o nome completo, o local e a data de nascimento?
R - Jasiel Martins dos Santos, Piaçabuçu, Alagoas.
P - A data de nascimento.
R - 12 de outubro de 1967.
P - Você nasceu em Maceió?
R - Em Maceió.
P - Eu queria que você falasse um pouco d...Continuar leitura
P - Jasiel, a gente começa perguntando o nome completo, o local e a data de nascimento?
R - Jasiel Martins dos Santos, Piaçabuçu, Alagoas.
P - A data de nascimento.
R - 12 de outubro de 1967.
P - Você nasceu em Maceió?
R - Em Maceió.
P - Eu queria que você falasse um pouco do seu trabalho, o que você faz? Desde quando? Conta um pouco pra gente do Ponto e de você, né?
R - Certo. Bom, eu sou professor, sou músico, mexo também com algumas coisas com audiovisual, instalações, fotografia e na realidade a história de lidar com a cultura propriamente dita, ela surgiu há uns 16 anos mais ou menos atrás em Piaçabuçu no caso, né? Quando eu fui morar lá... A gente tinha uma necessidade muito grande de ter alguma coisa relacionada com a cultura que fosse uma coisa de fato genuína que tivesse a identidade do povo de Piaçabuçu. E através dessa necessidade foi que a gente começou a construir alguma coisa nesse sentido. Uma delas que eu diria que é nossa ação mais ativa é o Sarau Noite Livre que a gente faz lá em Piaçabuçu, que na realidade é um encontro de artistas. Então tem o som com a cadeira e a gente direciona o trabalho para que se tenha uma música legal, que as pessoas possam ver, que a gente também possa questionar o conteúdo dessa música, a letra dessa música, o ritmo. Aí vai entrando a poesia, a contação de história em alguns casos acontece piada também, na realidade é uma confraternização, isso acontece uma vez por mês e é itinerante. Já fizemos algumas vezes inclusive em Sergipe do outro lado do rio e aí, lógico, falar em rio como tudo gira em torno do rio, as coisas tendem a acontecer sempre na beirada do Rio São Francisco. Aí há o envolvimento da própria instituição, ela começou a surgir a partir de projeto chamado “Olha o Chico” que foi patrocinado pela Chesf que a ideia era capacitar 50 jovens só que essa capacitação se dá através da arte, através da música e a arte de audiovisuais. Esse projeto aconteceu no primeiro ano, isso em 99 e em 2000 ele foi renovado pela Chesf. Aí o projeto acabou e a gente sentiu necessidade de dar continuidade, não só nós, mas a própria comunidade dos jovens que tinham sido de fato formados naquele momento, naquele instante. Aí resolvemos transformar aquela ideia inicial que era um projeto, o nome numa instituição, então aproveitamos uma instituição que já existia que estava abandonada, esquecida e aí só foi colocar o nome de fantasia de “Olha o Chico” que era o nome do projeto e aí tudo acontece em torno disso. Aí uma informação importante que eu acho de colocar é que a instituição, ela é digamos assim, ela tem uma autonomia hoje pra existir, pra subsistir inclusive. Ela tem parceiros, óbvio como o Ministério da Cultura, como o governo do Estado, o governo municipal, mas se algum desses parceiros por algum motivo deixar de existir, ela vai continuar funcionando e essa autonomia que a gente vem brigando há alguns anos e a gente conseguiu. As ações, hoje a gente lista em torno de 11 ações distintas e o Sarau, eu diria que o Sarau é um grande laboratório, porque como ele é um local de manifestação artística, então a pessoa que também... E ele é informal, por exemplo, você canta lá, tem um violão lá pronto e o violonista, o cara diz a música e você pega na hora o tom e vai-se embora. Então essa informalidade faz com que as pessoas se sintam mais a vontade e colocar em prática aquilo que ela gosta de fazer e que muitas vezes não tem oportunidade. Aí é normal aparecer compositores, poetas, né? Pessoas que falam: “Eu faço música” “Mostra uma vez, vai lá no Sarau” e a partir daí as pessoas aplaudem e
as pessoas começam a perceber que existe uma troca e essa troca facilita a produção. Na verdade a nossa maior produção é a música, tudo gira em torno dela, nós temos 11 grupos ligados ao “Olha o Chico” desde Rock pop a Dark Reggae até o Reisado do Retiro que é uma manifestação bastante popular, né? E aí vem passando pelo samba, pelo Caçuá que tem uma linguagem da cultura popular, mas que leva pra espetáculos, aí você tem o caçuazinho, tem o guerreiro do ferrete e por aí vai. E toda essa manifestação em torno da música é um foco que a gente tem trabalhado muito, não dispersar muito, porque a gente tem observado que a dispersão, ela termina prejudicando o andamento dos trabalhos. Então através da música com o recebimento do kit também agregou bastante valor, a gente consegue estar registrando, inclusive temos produtos aqui que é um CD que está exposto aqui no seminário que é o resultado desse trabalho e aí vêm também os outros trabalhos que os mestres fazem, produzem que são as bonecas, por exemplo, o livro do Griô Zé Correia que é um contador de história e ele costuma dizer que... Ele tem um conhecimento da cidade e das pessoas fantástica, né? Ele diz que só não conhece em Piaçabuçu quem ainda não nasceu, porque até os que já morreram, ele também conhece. Então é um cara que tem uma riqueza dentro do contexto de Piaçabuçu muito grande, ele está conosco e é um dos diretores, né? Então as nossas ações são muito baseadas na história da oralidade também através da Ação Griô a gente aprendeu muito e é uma pedagogia que a gente utiliza em todas as nossas ações e nos nossos produtos também, porque dentro do Caçuá... Tem uma parte do Caçuá que trabalha com formação, capacitação e essa capacitação se dá a partir da pedagogia Griô que a gente aprendeu, absorveu muito bem e que com a sensibilidade que ela passa pras pessoas que ela transmite, isso logicamente faz as pessoas se abrirem mais facilmente e logicamente se entregar mais ao trabalho que a gente está propondo. Então eu diria que agora tem também o ponto, digamos crucial do trabalho que é do Ponto de Cultura. A gente costuma relacionar a ação do Ponto de Cultura como uma das ações para que de fato a gente não sobrecarregue essa ação, esqueça as outras e quando acabar o recurso a gente fica à mercê de uma ação sem continuidade. Então no caso do produto é uma trilha eco-cultural chamada Caminho do Rio São Francisco que ela percorre alguns trechos do rio, né? E essa trilha, ela tem uma característica de ter sustentabilidade com a base comunitária, ou seja, com os ribeirinhos, né? Então as pessoas não vão para pousadas e hotéis, mas que venham utilizar os pontos que a gente está capacitando, ou seja, as pessoas, as casas que estão sendo capacitadas pra receber esses caminhantes e aí as pessoas vão comer, dormir na rede, no colchão, comer o arroz que a pessoa todo dia come e é essa a ideia é interagir o caminhante com os ribeirinhos, com o peixe, com o camarão. E logicamente atrelado a isso vem as outras questões culturais, que são as manifestações artísticas também que existem, como o guerreiro, como o coco, como os contadores de histórias, como os emboladores, os rezadores, que é o Seu Zizinho. Então nós temos essa gama de ações que a gente está praticando no caminho do São Francisco, do “Olha o Chico”.
P - Deixa eu perguntar uma coisa Jasiel, como que você, o ponto enfim começa a participar do Cultura Viva? Como foi isso? Conta um pouco esse processo?
R - Então, eu acho que esse programa, ele... Não é a toa que existe hoje uma... Eu diria um respeito e um olhar muito forte pra o que está se fazendo com a cultura no Brasil, porque é engraçado, eu estava comentando hoje no grupo que uma das definições de cultura que eu achei mais interessante foi um mestre chamado Venâncio, tem uns cinco anos que ele falou pra mim, ele disse que cultura pra ele era como um morto que está ali e aí você atira um pouquinho de areia, ele se levanta, balança a poeira e sai correndo. Então essa efervescência, essa ideia de que as coisas estão, digamos escondidas, mas não estão acontecendo a gente se depara quando vê um Programa como esse que está de fato vindo a tona tudo isso, fazendo com que as pessoas tenham de fato um espaço de discussão de mostrar toda essa efervescência cultural que está acontecendo. Então quando a gente soube dessa história de Ponto de Cultura que existe essa possibilidade de potencializar as ações, a gente começou a perceber dentro do próprio edital “Puxa a gente já faz isso, faz aquilo, então nós somos de fato Ponto de Cultura.” Essa nomenclatura, inclusive ela veio, de repente, localizar a gente no espaço e no tempo e perceber que existem outras instituições fazendo a mesma coisa, né? Brigando contra o sistema, porque ele é muito carrasco em relação à cultura popular que ele é árduo porque é de fato o Griô, por exemplo, que detém o saber popular, né, quando ele não tem o saber erudito logicamente eles têm uma marginalização nesse sentido, mas que o saber é saber e a gente precisa analisar isso universalmente, em qualquer lugar. Então esse respeito com a pessoa, por exemplo, que nasceu um dia depois de mim e já viveu mais que eu, precisava ter esse respeito também. Então essa vivência das pessoas que está sendo passada e que o programa Cultura Viva começou a aflorar isso, os Pontos de Culturas do Brasil inteiro quando potencializa dizem: “Olha vocês têm... Vocês já fazem essa ação, mas está aqui essa ferramenta”. Então potencializa essa ação, potencializa e faz com que ela de fato tenha uma abrangência maior, uma sustentabilidade, uma sistematização maior. Então isso eu acho fantástico. Obviamente que como é tudo muito novo, existiu muitos problemas de administração de estrutura do próprio Ministério, mas eu acho que está sendo contornado, eu estou sentindo isso tanto no “Olha o Chico” como nos outros Pontos de Cultura a gente está vendo que tem um novo rumo, né? E esse rumo é muito bom, agora o grande desafio é: tornar isso uma política pública, né? Como a gente vai conseguir, eu acho que esse é o momento crucial pra que a gente possa discutir politicamente essa questão, porque deixa de ser um programa pra ser uma política pública.
P - Como a comunidade recebe o Ponto de Cultura? Como recebe o programa Cultura Viva, no seu caso assim?
R - Veja bem, eu acho que é como eu disse, essa potencialização das nossas ações com o investimento, com a estrutura melhor, logicamente deu muito mais credibilidade tanto é que na minha cidade é muito comum chegar um turista e perguntar na comunidade aonde que ele pega informações de turismo de cultura e as pessoas levam ele para o Ponto de Cultura. E às vezes nós somos confundidos inclusive com a secretaria municipal, isso também é muito comum, aí vêm duas questões que eu acho que é fundamental: uma foi a gente perceber no programa Cultura Viva, nessa história de ser Ponto de Cultura uma oportunidade da gente dar continuidade e com credibilidade porque quando você consegue a credibilidade da comunidade, você percebe que a coisa começa a fluir de uma forma que a própria comunidade se volta pra o Ponto. Então muitas vezes é assim: ela sabe até que existe o “Olha o Chico”, não sabe muito bem, mas a cultura quem faz é aquele pessoal ali. Então eu acho que o olhar da comunidade modificou bastante.
P - E assim Jasiel, qual... Vendo o cenário mais ou menos como está agora e com a sua experiência o que você acha que faltou, dobramentos futuros possíveis, a expectativa pro Ponto? Do ponto que você trabalha? Conta um pouco o que você espera agora daqui pra frente?
R - Então, eu vou dizer assim sendo bem prático agora... Como a gente conseguiu na realidade no edital anterior ser aprovado como Pontão, nós temos um trabalho inclusive já realizado com 11 municípios na realidade, não só em Piaçabuçu. Porque quando a gente começou a trabalhar como Ponto outros municípios começaram a perguntar por que a gente não estendia o caminho para outros municípios? E foi quando surgiu a ideia “Vamos escrever um edital pra ser Pontão.” Então nossa primeira expectativa hoje é que de fato a gente tenha se habilitado logo como Pontão pra que a gente possa de fato concretizar aquilo que foi pensado inicialmente que é trabalhar nos 11 municípios de Piaçabuçu e outra coisa trabalhar num bloco só, né? Agora essa perspectiva como eu disse, a continuidade inclusive do programa, o amadurecimento que eu estou vendo inclusive dos Pontos, dos gestores, de pensar isso como política pública, eu acho que é a grande saída pra que a gente possa ter continuidade. Nós estamos batalhado, por exemplo, lá em Piaçabuçu algumas ações práticas nesse sentido, por exemplo, nós fazemos parte de uma rede Nudap, que é uma rede de discussão de Piaçabuçu e nessa rede estão contemplados todas as escolas inclusive particulares, igrejas evangélicas, católicas e etc. e o Ponto de Cultura. E a ideia é transformar essa rede numa lei municipal para que toda a discussão,inclusive,orçamentária do município passe pela rede Nudap.Então já foi encaminhada pra Câmara, isso é uma realidade e já conseguimos a adesão de três vereadores pra ser apresentada e agora a gente está batalhando pra que de fato exista aprovação. No nosso caso específico vai facilitar, eu acho que esse mesmo amadurecimento, ele tem que acontecer em nível nacional pra ter continuidade, porque sinceramente eu vejo assim: o ano que vem é ano político, a partir de março a gente vai ter muitas limitações e a gente tem pouco tempo inclusive pra organizar, digamos o bloco que seja mais coeso e que tenha o respaldo de quem vai estar manipulando a política no país. A partir do ano que vem, não só os candidatos, mas quem vier a se eleger, apesar de que eu acredito que hoje o próprio programa, ele é um programa respeitado, né? A gente vê isso pelas empresas que estão chegando, pelos outros ministérios que estão chegando junto, que estão buscando parceira. Inclusive eu acho que é um fenômeno inédito no Brasil, essa história da cultura estar alavancando essas possibilidades de transformação, isso eu acho fantástico.
P - Tá bom Jasiel, basicamente é isso. Eu queria agradecer a entrevista, obrigado por ter vindo.
R - Eu que agradeço, estamos à disposição.Recolher