P/1 – Boa tarde, Ivone.
R – Boa tarde, Mirela.
P/1 – Eu gostaria que você começasse dizendo para gente seu nome completo, local e a data do seu nascimento.
R – Meu nome é Ivone Amâncio Bezerra Carlos de Souza. Eu nasci no dia 4 de junho de 1947.
P/1 – Onde?
R – Em Rochedo, Mato Grosso do Sul.
P/1 – Ah, sim, e qual o nome dos seus pais?
R – José Amâncio de Souza e Vicência Bezerra de Souza, já falecida.
P/1 – E seus avós, você lembra?
R – Lembro de Janjão… Eu não conheci nenhum deles, mas lembro de Janjão e Mariana, que eram os mais falados na família, eles já tinham morrido há muitos anos quando eu nasci.
P/1 – Pais pela parte de mãe ou de?
R – Por parte de mãe.
P/1 – Por parte de mãe, sim. E assim, qual era a atividade profissional dos seus pais e, se você souber, dos seus avós?
R – A minha mãe foi professora, o meu pai foi professor, e meu pai foi durante muitos anos chefe de pessoal em colégio e em uma universidade, em Lavras, Minas Gerais.
P/1 – Minas Gerais, sim. E qual a origem da sua família?
R – Meus pais são cearenses e por parte de pai eu herdei um tipo… Um biótipo de europeu e indígena e por parte da minha mãe europeu, espanhóis e portugueses. Do meu pai, português e índios tabajaras.
P/1 – Sim, legal. E você tem irmãos, assim?
R – Sim, eu tenho.
P/1 – Quantos e fala um pouquinho dele.
R – Eu tenho três irmãs e dois irmãos. A minha irmã mais velha, a Vandinha, chama-se Vanda Bezerra Mendes, ela é pedagoga, ela tem vários cursos de especialização. Ela é a mais velha de todas, ela foi diretora muitos anos em Brasília, da Escola das Nações, do Instituto Presbiteriano. Ela ajudou a fundar o Instituto Mackenzie em Brasília. Vandinha mora em Minas. Vanda Amâncio Bezerra Mendes. A outra é Vanilda Bezerra de Siqueira (Costa?), ela é contadora...
Continuar leituraP/1 – Boa tarde, Ivone.
R – Boa tarde, Mirela.
P/1 – Eu gostaria que você começasse dizendo para gente seu nome completo, local e a data do seu nascimento.
R – Meu nome é Ivone Amâncio Bezerra Carlos de Souza. Eu nasci no dia 4 de junho de 1947.
P/1 – Onde?
R – Em Rochedo, Mato Grosso do Sul.
P/1 – Ah, sim, e qual o nome dos seus pais?
R – José Amâncio de Souza e Vicência Bezerra de Souza, já falecida.
P/1 – E seus avós, você lembra?
R – Lembro de Janjão… Eu não conheci nenhum deles, mas lembro de Janjão e Mariana, que eram os mais falados na família, eles já tinham morrido há muitos anos quando eu nasci.
P/1 – Pais pela parte de mãe ou de?
R – Por parte de mãe.
P/1 – Por parte de mãe, sim. E assim, qual era a atividade profissional dos seus pais e, se você souber, dos seus avós?
R – A minha mãe foi professora, o meu pai foi professor, e meu pai foi durante muitos anos chefe de pessoal em colégio e em uma universidade, em Lavras, Minas Gerais.
P/1 – Minas Gerais, sim. E qual a origem da sua família?
R – Meus pais são cearenses e por parte de pai eu herdei um tipo… Um biótipo de europeu e indígena e por parte da minha mãe europeu, espanhóis e portugueses. Do meu pai, português e índios tabajaras.
P/1 – Sim, legal. E você tem irmãos, assim?
R – Sim, eu tenho.
P/1 – Quantos e fala um pouquinho dele.
R – Eu tenho três irmãs e dois irmãos. A minha irmã mais velha, a Vandinha, chama-se Vanda Bezerra Mendes, ela é pedagoga, ela tem vários cursos de especialização. Ela é a mais velha de todas, ela foi diretora muitos anos em Brasília, da Escola das Nações, do Instituto Presbiteriano. Ela ajudou a fundar o Instituto Mackenzie em Brasília. Vandinha mora em Minas. Vanda Amâncio Bezerra Mendes. A outra é Vanilda Bezerra de Siqueira (Costa?), ela é contadora formada com especialização, dedicou grande parte da sua vida profissional a Escola Superior de Agricultura de Lavras, chefiando o setor de Contabilidade. Tenho uma outra irmã chamada Iracema Amâncio Bezerra, ela é formada em Enfermagem, ela tem especialização também em sua área, e durante muitos anos trabalhou como enfermeira e depois como assistente social. As três são aposentadas. Tenho um irmão chamado José Amâncio de Souza Filho, que é desembargador em Minas Gerais, em Belo Horizonte, durante muitos anos foi juiz, agora é desembargador. E tenho um outro irmão chamado Araquém Amâncio (Bezerra?), que é microbiologista e já está aposentado.
P/1 – Sim.
R – Essa é minha família da consanguinidade próxima.
P/1 – Certo. E assim, descreva um pouquinho, agora falando da sua infância, o bairro ou a rua que você morava lá em Mato Grosso.
R – Olha, eu vivi apenas três anos em Rochedo, numa cidade que meu pai ajudou a elevar a categoria de cidade, então as pessoas diziam que ele era o fundador do local, isso para nós tinha uma importância grande. E passava por essa cidade o rio Aquidauana, onde toda tarde nossa mãe nos dava banho, lavava roupa, lavava as vasilhas, e eu acredito que esses três anos que eu passei as margens do rio Aquidauana, eles foram decisivos para despertar em mim esse interesse, esse amor pelas coisas do ambiente, da natureza, da vida biológica. E aí nós mudamos para Minas Gerais, porque meu pai buscava melhores oportunidades para educar os filhos, e o Instituto Gammon foi o local que nos ofereceu essa oportunidade. O meu pai foi chamado para trabalhar lá e aí eu passei a minha infância, minha adolescência em Lavras, Minas Gerais. Meu pai trabalhando no Instituto Gammon, foi uma infância muito rica de natureza, liberdade, tranquilidade, experiências, conforto familiar no sentido orientação, não era no sentido material. Estudei no Instituto Gammon desde o jardim de infância até o colegial e fui fazer o meu curso superior na Escola Superior de Agricultura de Lavras, que no primeiro ano do meu curso ainda pertencia ao Instituto Gammon, depois foi federalizada.
P/1 – Sim, descreve um pouquinho a sua casa na infância, então, lá em Lavras, que é o que você deve se lembrar melhor.
R – É, a casa que eu morei na minha infância, era uma casa que tinha varanda, onde no final de tarde sentávamos para… Para os adultos conversarem e as crianças escutarem. Ela tinha sala de visita, que era importante na época, sala de jantar, três quartos para seis filhos e pai e mãe, cozinha e um amplo quintal com árvores frutíferas.
P/1 – Que lindo, nossa, que delícia. E quais eram assim as suas brincadeiras favoritas?
R – Eu gostava muito de brincar de roda, de pular corda, de subir em árvores para apanhar frutos, de jogar bola, vôlei, de brincar de boneca. E eu fui uma criança um pouco diferente da média, porque eu tinha um enorme prazer em observar a natureza. Ver pássaros, flores, abelhas, então isso também para mim era folguedo, era brinquedo. Brincava com os mais velhos, gostava muito de ouvir contar histórias, minhas irmãs contavam muitas histórias, e isso foi muito gratificante na minha infância.
P/1 – Ah, que bom. Descreva, continue falando um pouco desse cotidiano na sua casa.
R – É, na minha casa nós éramos, como dizia minha mãe: “Pobres, porém honrados.” Nós éramos… Minha mãe fazia o possível para que fossemos unidos, solidários. E ela e meu pai fizeram tudo o que puderam para nos dar um diploma de curso superior e nos encaminharem na vida, e conseguiram. Conseguiram nos passar valores, ideais, sentimento, coisas que materialmente não se compra. Nós tivemos uma vida familiar bastante dinâmica. Meu pai sempre muito sábio, minha mãe muito sábia e brava na medida justa. Nos educou muito pelo conhecimento, mas muito também pelo instinto e pelo amor, e pelo ardor, porque quando precisou também ela nos impôs limites, isso também eu acho que foi muito importante para minha formação.
P/1 – Sim, sem dúvida. Como e quando a senhora iniciou os seus estudos?
R – Como iniciei meus estudos, no jardim da infância, quando eu tinha 6 anos de idade no Instituto Gammon.
P/1 – Sim, isso em Lavras?
R – Em Lavras.
P/1 – Sempre estudou no Instituto Gammon.
R – Em Lavras, em 1953.
P/1 – E descreve um pouco de como era esse instituto, já que você passou a sua vida inteira estudando lá.
R – O Instituto Gammon, ele era… É localizado numa cidade do interior de Minas Gerais, e ele tinha no passado duas localizações físicas. Uma destinada… Era um colégio interno, mas também externo, misto. E ele tinha uma grande chácara, uma verdadeira fazenda onde ficavam alojados os rapazes. E na parte alta da cidade, tinha também uma construção ampla, com pátios amplos onde ficavam as moças. A nossa casa, ela ficava lá naquela famosa chácara, grande localização, onde o colégio masculino ficava, porque era ali que ficava a direção central do Instituto Gammon. Então, o nosso quintal, ele dava fundo a uma verdadeira fazenda, ou chácara, onde funcionava um colégio americano, que tinha reitor. E a nossa infância foi muito entremeada pela cultura norte americana também, porque o reitor era americano, o diretor era americano, a professora de música era americana, a diretora da escola das meninas, do (Kemper?) era americana, havia várias autoridades na escola americanos, e nós brincávamos com os filhos deles. Então, a gente pegou um pouco dessa cultura misturada.
P/1 – Sim, entendi. E assim, quais são suas lembranças marcantes desse período que você estudou aí no Instituto Gammon?
R – As aulas de Música, as aulas de Literatura, isso quando eu era criança. Havia 23 salas com pianos, para o ensino de piano, eu jamais estudei piano, mas eu gostava muito de ouvir quem tocava. E também, quando eu fui ficando maior, as aulas que eu tive de Sociologia e Filosofia com o grande educador Rubem Alves, que marcou muito a minha adolescência, o meu início da minha fase adulta. Ele foi o pastor da minha igreja, e foi meu professor de Sociologia e Filosofia. São lembranças muito boas. Hora do recreio, é claro, com todas as brincadeiras, os desfiles do dia do Instituto Gammon, que eram muito bonitos, e os desfiles do dia 7 de setembro.
P/1 – Sim...
R – … Que eram ocasiões de grande pompa mesmo. A cidade inteira se mobilizava para assistir. A gente desfilava pela cidade toda com roupas características, uniformes.
P/1 – O Instituto Gammon, essa data que eles comemoravam o aniversário deles, tinham alguma relação com as datas comemorativas dos Estados Unidos, enfim, da América…
R – … Não, foi o dia da fundação deles…
P/1 – … Aqui no Brasil.
R – No Brasil. E ele se chama Instituto Gammon, por causa de Samuel Rhea Gammon, um de seus fundadores, que era um missionário americano.
P/1 – Ah, sim. E a filosofia era…
R – … Era presbiteriana.
P/1 – Presbiteriana…
R – … E a filosofia dele era: “Dedicado à glória de Deus, e ao progresso humano.”
P/1 – Sim, sim perfeito. E assim, havia na sua família algum incentivo para você seguir alguma carreira, alguma profissão?
R – Não, incentivo, direcionamento não, mas eu acabei fazendo Agronomia por questões econômicas, familiares, porque tinha… Era a única escola de nível superior que tinha na minha cidade. Como nós não tínhamos condições financeiras para estudar fora, eu fiz Engenharia Agronômica. Já tinha um irmão agrônomo, esse que hoje é desembargador, ele acabou depois fazendo Direito… Ele fez Agronomia, ele fez Direito. Já tinha um exemplo na família, meu pai trabalhava na Escola de Agronomia e eu fiz, não tinha nada contra o curso, e acabei fazendo Engenharia Agronômica.
P/2 – Dona Ivone, avançando um pouquinho agora no tempo, mas em relação a sua especialização, eu queria saber, quando a senhora decidiu fazer Educação Ambiental, como era a perspectiva dessa área no Brasil, para essa área no Brasil?
R – É, eu sou uma educadora ambiental autodidata, e essa especialização acabou sendo um prêmio dado pelo (Jeorgeam Rio College?) da Escócia, por um trabalho que eu havia desenvolvido no Espírito Santo, no governo do estado, criando um método de educação ambiental interdisciplinar para os professores do estado do Espírito Santo. Então, eu já era educadora ambiental, havia poucas pessoas na área nas décadas de 1980 e 1990, e nós fomos abrindo caminho, rompendo as barreiras, aprendendo enquanto fazíamos com as grandes conferências, e então veio a oportunidade dessa especialização em Glasgow, na Escócia. As perspectivas, elas eram intuídas, porque não se falava muito de meio ambiente ainda. As pessoas, ou eram educadores ambientais por extremo amor ao que faziam, sem a mínima espera de recompensa em troca ou de uma carreira promissora, ou eu vou me dar bem com isso, elas faziam porque sentiam amor pelo planeta, sentiam que estavam aprendendo enquanto faziam e eram idealistas. Foi assim Genebaldo Freire, no Brasil, a minha própria pessoa e tantos outros por aí. As perspectivas profissionais não eram promissoras, não, a maior parte das oportunidades estavam nas Secretarias de Meio Ambiente, dos governos do estado, que naquela época estavam começando a se formar. Nós temos de lembrar que eu estou falando de um período anterior a ECO 92, em que a questão ambiental não era moda, não era tema, não era força de lei, não era boca do povo, não era consciência da população, era o intuir de alguns. E esses alguns, graças a Deus, foram se tornando muitos, e hoje se fala disso como profissão mesmo, coisa estabelecida. Então, eu ganhei esse prêmio do governo britânico, porque eu só tinha o título de graduação, e acharam que a melhor maneira de me premiar, seria me dar esse curso de especialização lá em Glasgow, na Escócia, no (Georgeam Rio College?), que hoje é (Georgeam Rio Campos?), da Universidade de Strathclyde, mudou.
P/1 – Certo. Então, depois a gente volta a essas outras questões, enfim da questão ambiental.
R – Ok.
P/1 – Vamos falar um pouco da sua juventude. Como que era… A senhora tinha muito amigos, o que que vocês faziam, me fala um pouquinho.
R – Tinha. Eu não tinha muitos amigos, mas tinha amigos, amigas principalmente. E a gente, como morava numa cidade do interior, as diversões principais, os pais seguravam muito para a gente não namorar, então era o cinema, a praça e a igreja. A praça vinha depois da igreja, depois dava uma volta na praça, para dar uma paqueradinha, uma olhadinha. E tínhamos, por exemplo, como eu gostava muito de literatura, de poesia, de pintura, de desenho, eu tinha um grupo de amigos e amigas que também gostavam dessa área. Então, a gente conversava muito sobre literatura, lia muito, íamos ao cinema.
P/1 – Sim. Praticavam esportes também?
R – É, eu quando eu era adolescente, eu pratiquei corrida de 100 metros, 200 metros, aquelas corridas rápidas, mas como no nosso colégio, o Instituto Gammon, a Educação Física era muito dinâmica e muito bem aplicada, várias modalidades de exercícios e de situações esportivas eram colocadas. Por exemplo, handebol, vôlei, queimada, só que a gente não praticava isso com a ideia: “Estou praticando um esporte.” Estamos na aula de Educação Física e tendo o prazer de estar. Eu acho que a grande diferença daquela época para agora, é que tudo o que você fazia, você fazia, assim, pelo prazer de estar engajado num grupo, sabe, você não sabia porque era moda, ou dava músculo, ou porque melhorava o corpo, ou porque ia te tornar famoso, ou porque você ia ganhar medalha de ouro, eram as oportunidades que existiam na época e a gente achava muito bom.
P/1 – Sim, agora falando um pouco de como se vestiam, os costumes de vestir… Como que as meninas, você se vestia naquela época? Como que era a moda?
R – Bom, depende da época, porque eu parti desde as saias no meio da canela, mas eu não usei todas as modas, eu sempre preferi muito mais calça comprida, que eu acho muito mais confortável. Mas eu assisti ao advento da mini-saia, das mangas cavadas, que não eram moda na época, dos decotes… Estou falando da minha adolescência e do início da fase adulta. Durante o período escolar, havia o uniforme do colégio, enquanto a gente brincava, geralmente era short, camisas, camisetas. Quando a gente saía, a gente se arrumava melhor, havia o vestido de domingo, ou a saia e blusa do domingo, a roupa domingueira. Mas eu sempre tive uma predileção por calça comprida, roupas mais esportivas, mais práticas.
P/1 – E assim, como eram os namoros na sua época?
R – Bom, primeiro, filha mulher não era pra namorar muito. Geralmente namorava-se um ou dois no máximo e casava-se. E estimulava-se o filho homem a namorar o máximo possível, então ficava um incoerência, um desempate aí de oportunidades. Eu posso falar de mim, que eu namorei meu marido atual, que eu estou casada até hoje. Casei com ele, os namoros não tinham essa liberdade de hoje, eram nas salas das casas, vigiados, geralmente… Eu não tinha, porque eu era caçula, mas quem tinha irmãozinho mais novo, ele era mandado junto para o cinema, para praça. Os pais vigiavam muito e geralmente esperava-se da moça um bom comportamento. Virgindade até o casamento, eram as famosas moças de família, e os namoros eram gostosos, porque como quase nada era permitido, qualquer pequeno contato, um beijo, um bilhete, alguma coisa mais chegada, era tido como grande emoção. As coisas não eram fáceis.
P/1 – Sim.
R – Claro que havia exceções.
P/1 – Entendo. E assim, como é que você conheceu o seu marido? Vamos falar agora, então, logo desse…
R – … Eu conheci meu marido entrando no Banco Real, olhei pra ele, ele olhou para mim. Nos olhamos, eu não gostei dele, e ele não gostou de mim. Ele me achou muito magrela e antipática e eu não gostei do bigode grande que ele tinha. Nos vimos, e aí uma amiga minha estava querendo namorar com ele, e nós duas saímos juntas, só que tinha um amigo dele que gostaria de namorar com a minha amiga. Uns três meses depois desse primeiro olhar que nós nos demos, nós fomos apresentados, começamos a conversar e começamos a namorar. E a minha amiga não namorou o amigo dele, foi namorar uma outra pessoa, e foi uma coisa assim, tão natural, sem grandes choques.
P/1 – Isso lá em Lavras?
R – Lá em Lavras.
P/1 – Ele era bancário?
R – Era era bancário.
P/1 – Continua sendo bancário?
R – Aposentado.
P/1 – Sim, qual é o nome dele?
R – Antônio Carlos de Souza.
P/1 – Sim, perfeito. E vocês tem filhos?
R – Temos três filhos, Luciana, Fabrício e André Luiz, todos adultos. E tenho um netinho chamado Jean Vitor.
P/1 – Nossa, que legal. E assim, quando foi que você saiu de Lavras?
R – Eu saí de Lavras em 1976, quando a minha filha estava com um ano de idade, já casada. Para vir para o Espírito Santo a convite da empresa capixaba de agropecuária, para exercer uma atividade de redatora científica, porque aconteceu uma coisa interessante: eu fiz Agronomia e não me adaptei como engenheira agrônoma, mas eu sabia português, inglês, francês, espanhol. E aí dentro da profissão de engenheira agrônoma, eu comecei a trabalhar lá em Lavras com redação científica e línguas, porque a escola de Lavras tinha pesquisas, pesquisadores. Tomei gosto pela coisa, e acabei ficando uma profissional, assim, diferente da média, porque eu era uma agrônoma que gostava de escrever, sabia escrever e ler em mais de um idioma, e a empresa capixaba de pesquisa agropecuária daqui do Espírito Santo precisava de um profissional com esse perfil para… Pegando os resultados das pesquisas dos 16 projetos, ajudaram os pesquisadores na redação científica, na tradução dos resumos, e na publicação desses trabalhos. Aí eu vim para o Espírito Santo e me tornei, durante quase oito anos que eu fiquei na Encapa, eu me tornei redatora científica e editora da empresa, também de maneira autodidata.
P/1 – Que legal, depois a gente aborda um pouco mais essa sua posição de escritora e tudo. Você veio, então, para cá para trabalhar quando você saiu de Lavras?
R – Vim para trabalhar e meu marido também. Meu marido veio transferido pelo banco.
P/1 – E como foi assim, que você veio para Vitória?
R – Eu vim para Vitória.
P/1 – E como foi assim a sua primeira impressão, ter saído de Minas para vir para Vitória?
R – Olha, a primeira impressão que eu tive de Vitória, eu cheguei aqui, eu achei Vitória muito bonita, uma cidade… Uma capital pequena, mas eu estranhei muito, porque era a primeira vez que eu saia da minha família, a minha vida inteira eu morei, mesmo depois de casada, próximo aos pais, a maioria dos irmãos, e a diferença eu senti muito grande. Mas com a dedicação do marido, minha mãe vinha, me ajudava, pessoas amigas vieram e me ajudaram, não foi uma coisa intransponível, não. Aí eu tive mais dois filhos aqui no Espírito Santo, o Fabrício e o André Luiz. A impressão que eu tive de Vitória foi muito boa.
P/1 – Sim. E qual foi o seu primeiro trabalho?
R – Na minha vida?
P/1 – É.
R – Eu era estudante de Agronomia e eu trabalhei no laboratório de solos, da Escola Superior de Agricultura de Lavras, eu estagiava lá. Eu fazia análises de pH e de fósforo.
P/1 – Sim, e depois? Outros lugares que você trabalha, foi logo depois que você veio pra cá pro Espírito Santo?
R – Não, não. Quando eu me formei, eu fui trabalhar na Escola Superior de Agricultura de Lavras e fui dar aula também nos colégios de Lavras. E eu lecionei praticamente quase todas as disciplinas do segundo grau. E trabalhei também praticamente em quase todos os colégios da cidade. Porque uma agrônoma, sem vocação para o campo, e ainda tentando descobrir um caminho profissional, eu podia dar aulas e trabalhei na escola de Lavras, como eu te falei, com redação científica e tradução de trabalhos científicos.
P/1 – Certo.
R – Depois eu vim para Encapa.
P/2 – Dona Ivone, que resultados a senhora achou que foram a contrapartida desse trabalho como autora de questões ambientais, meio ambiente? A senhora sentiu um retorno desse trabalho?
R – Bom, eu escrevi o meu primeiro livro, A Gotinha Sapeca, para crianças, se não me engano acho que foi em 1983… Mil novecentos e oitenta e três já tem, assim, uns 20 anos a primeira edição dele. Para vocês terem uma ideia, ele foi reeditado, se não me engano em 1986 e nunca mais foi editado. Essa semana passada, eu fui chamada numa comunidade aqui no morro do Forte São João, porque um contador de histórias dentro de um projeto da Prefeitura, estava focalizando A Gotinha Sapeca, surrada, antiga, porque as escolas tiram xerox e usam até hoje. Além da Gotinha Sapeca, eu tenho treze cartilhas para o público infanto-juvenil, seis livros da editora Bahá’í do Brasil, um livro para professores com o método que eu criei para o Espírito Santo, Meio ambiente, uma proposta para a educação, é o nome do livro; e lancei há dois anos atrás três volumes de Educação Ambiental, semente para um mundo melhor também para professores. O retorno que a gente tem escrevendo e publicando, é o que fica escrito, permanece por muitas gerações e você não tem como dimensionar isso. Por exemplo, grata surpresa eu tive a semana passada da Gotinha Sapeca ainda estar tão atual, apesar de não reeditada há tantos anos. Um outro exemplo, eu lancei, se não me engano em 1999… Mil novecentos e noventa e nove não, 1991, uma coleção de cartilhas da mata atlântica do Espírito Santo, e tinha um caranguejinho chamado Xande, o caranguejinho do mangue, elas nunca foram reeditadas. Há uns dois anos atrás, crianças de uma escola municipal, com o xerox da cartilha do Xande, quando ele fez 10 anos, criaram uma noiva para ele chamada Vitória, e casaram o Xande e me chamaram para madrinha. Então, eu acho assim, permanece, o que você faz permanece. Se está escrito, o lastro é mais permanente, e é difícil para um autor dimensionar até que ponto isso impacta, abrange, atinge. O que eu posso dizer a vocês é que das minhas obras, as mais remotas ainda… As que não foram reeditadas, usadas e vistas, e as atuais distribuídas, trabalhadas em escolas, colégios. Para mim é muito gratificante ser escritora, ser autora.
P/2 – E como autora, a senhora acha que é um déficit na área de publicações para o público infantil, em geral, na área de educação ambiental?
R – Olha, nós já temos hoje excelentes escritores publicando livros que falam de educação ambiental não como chavão. Vou dar um exemplo, o professor Ângelo Machado, de Belo Horizonte, ele tem um série do bicho, que bicho fez a coisa, que bicho botou o ovo, que bicho comeu, são lindos, ecologicamente corretos, ele tem ao todo 21 livros. Rubem Alves, em muitos dos seus contos, parábolas, livros infantis, aborda as questões da vida de relação, da vida social, da parte do sentimento, da parte do meio ambiente. Ziraldo tem escrito livros que leva a criança a pensar sobre a questão ambiental. Eu acho assim, quanto mais, melhor. Mas eu não diria que o país está tão carente, não, nós temos grandes nomes aí, expoentes nacionais tratando dessas questões ambientais. Hoje o que mais se preocupa é escrever sobre educação… Quando eu digo educação ambiental, entendam: meio ambiente, atitudes para proteger o ambiente, e não o chavão ambiental para crianças.
P/1 – Sim…
R – … Existem muitas histórias já ecologicamente corretas. Inclusive uma preocupação de professores e escritores, de contar antigas fábulas e mitos da maneira ecologicamente menos danosa, ou mais correta.
P/1 – Sim, entendo. Voltando assim um pouco a essas questões… Por que você decidiu escrever primeiro para criança?
R – Ah, eu escrevi para crianças sem me decidir escrever para crianças. Eu tinha uma filha pequena, a Luciana, e eu trabalhava fora o dia todo e eu sempre gostei muito de conversar com ela. Quando eu chegava à noite, ela sempre pedia histórias. Só que ela não se contentava com as histórias tradicionais apenas, então eu comecei a criar junto com ela um personagem chamado Gotinha Sapeca.
P/1 – Ah, que legal.
R – Que foi o meu primeiro livro, aquele sobre recursos hídricos para crianças. E dos 3 anos aos 6 da vida dela, a Gotinha Sapeca eram contos noturnos. Aos 5, 6 anos, ela começou a fazer uns desenhos da Gotinha Sapeca, uns “deseinhos”. E quando ela fez 6 anos, nós juntamos tudo e um editor de Brasília, da editora Thesaurus, publicou o livro A Gotinha Sapeca, escrito por mim e ilustrado por ela.
P/1 – Ah, que legal.
R – Daí para frente foi tomar gosto, porque vieram mais filhos, eu fui contando mais histórias, eu fui olhando mais para o público infantil. Eu trabalhava numa empresa de pesquisa, com público adulto, mas eu tinha o lado lúdico, o lado de cá, né, que eu fazia nas horas vagas. Depois de oito anos de Encapa, eu deixei o meu trabalho de maneira espontânea para viver mais com os filhos. Foram três anos e pouco só em casa, foi quando eu desenvolvi mais esse lado de escrever, de estar mais com as crianças, porque eu estava mais com os meus filhos, com as escolas deles, com os amigos deles.
P/1 – Perfeito. E assim, agora já entrando nas questões da Aracruz, quando foi, como se deu seu primeiro contato com a Aracruz?
R – Eu trabalhava na Secretaria de Estado para assuntos do meio ambiente, a Seama [Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos], e tinha sido premiada pelo governo, pelo (Georneam Rio College?) e o governo britânico para fazer a minha especialização na Escócia. Quando eu retornei, foi em 1991 que eu retornei, 1991, 1992, eu dei várias entrevistas na televisão, e no Brasil ainda não se falava de desenvolvimento sustentável e na Europa já, e eu vim tomada pela ideia. Trouxe para o órgão de meio ambiente do estado, e numa das entrevistas que eu dei na televisão, falando sobre desenvolvimento sustentável, um antigo diretor da Aracruz Florestal, o doutor Luiz Soresini, assistiu, e a Aracruz Florestal estava iniciando um programa de educação ambiental com uma firma de consultoria chamada Simbios. E o doutor Soresini entendeu que eu poderia ser a pessoa indicada para coordenar esse programa. Foram feitos contatos, sondagens, eu tinha uma tarefa para terminar na Seama, que era formar a equipe de educação ambiental, terminar a estruturação do setor e publicar o livro Meio Ambiente, uma proposta para a educação, então essa minha ida para a Aracruz demorou alguns meses. Eu pensei bastante, porque eu não tinha experiência na área industrial, nem florestal para educação ambiental, eu tinha a área governamental, comunitária, formal de escolas. Meu métier eram professores, mas eu achei que o desafio valia a pena.
P/1 – Entendo.
P/2 – Dona Ivone, eu queria voltar um pouquinho. Eu queria que você falasse um pouco sobre a inserção da educação ambiental no currículo escolar do Espírito Santo. Como se deu essa inserção, que desafios?
R – Bom, eu escrevi um livro chamado Meio Ambiente, uma proposta para a educação. Na época, em 1991, se não me engano, ele foi amplamente distribuído pela Secretaria de Meio Ambiente e a Secretaria de Educação do estado para os professores. Nós treinamos, em 1991 e parece que parte de 1992, quase que 2000 professores no estado. Não havia lei sobre educação ambiental, não havia a obrigatoriedade de ser interdisciplinar, então essa foi uma fase. Depois, quando eu fui pra Aracruz, eu não trabalhei mais junto aos órgãos de governo, e a Secretaria de Educação e a Secretaria de Meio Ambiente fizeram várias gestões, atividades, participações, com outras técnicas, técnicas que eu digo, pessoas, outras pessoas técnicas para que essa inserção fosse uma realidade. Até hoje no Espírito Santo, em alguns setores, em alguns municípios, a gente ainda sente que no currículo a inserção ainda deixa um pouco a desejar, porque a questão do… Também você tem que analisar o seguinte: sobrepairando a questão do Espírito Santo, foram criados pelo MEC [Ministério da Educação] os parâmetros curriculares nacionais, os temas transversais. Meio Ambiente hoje é parâmetro curricular nacional de 5ª a 8ª série e a Secretaria de Educação do estado, ela é muito eficaz. Então, o que é que ela fez: ela tratou de promover seminários, encontros, eventos, as Prefeituras também, e hoje você tem através dos parâmetros curriculares nacionais, que não é a minha área, que eu não trabalho e não trabalhei, uma dinâmica muito grande de Prefeituras e do estado para que essa inserção no currículo, como tema transversal, o meio ambiente se torne uma realidade nas escolas, mas não dependeu de mim não, tá.
P/2 – Não, só queria entender para __________.
R – Quer dizer, eu tive uma participação bem lá no início _________.
P/2 – _________.
P/1 – Sem dúvida. Já que ele abriu esse parênteses, vou fazer uma pergunta também. Como foi, na época da ECO 92, você participou de alguma forma?
R – Sim, na época da ECO 92, eu era da Secretaria de Estado para assuntos do Meio Ambiente, a Seama, e o livro Meio Ambiente, uma proposta para a educação foi lançado lá na ECO 92, lá no Fórum do Futuro, eu fiz o lançamento do livro. Lancei aqui no Espírito Santo e fui para a ECO 92, que foi lançado no Fórum do Futuro, no estande do Espírito Santo.
P/1 – Sim…
R – … E pela, Através da comunidade Bahá'í do Brasil, eu proferi palestras para crianças de diversos países do mundo sobre meio ambiente, a proteção ao meio ambiente, também no Fórum do Futuro. Essa foi a minha participação na ECO 92, como educadora mesmo tal. Lancei um livro e fiz palestras.
P/1 – Essa Bahá'í, fala um pouco mais o que ela é.
R – A comunidade Bahá'í do Brasil, ela tem uma filosofia baseada nos princípios de Abdu'l-Bahá, que é um profeta que morreu em 1921, em que ela prega o não ao preconceito, a igualdade entre as raças, a importância da prece, a importância de convivência em equipe, que eles chamam de consulta, conviver em consulta uns com os outros. Não é minha religião, não é minha filosofia, mas eu não sou uma afiliada, mas eu sou amiga das comunidades Bahá'í, admiro profundamente o trabalho deles. E eles existem no mundo todos, são milhares de pessoas, milhões e eles tem por filosofia a paz mundial, e eles pregam a unicidade mundial, a terra é um só país e “cada ser humano é seu cidadão”, essa é a filosofia básica deles. E sobre a humanidade, os seres humanos em geral, eles dizem: “A humanidade é como uma ave que precisa de duas asas para voar, uma é do homem, outra é da mulher. Uma não substitui a outra. Para que a humanidade se equilibre, é preciso que ambas batam fortes e sincronizadas, para que a ave _______.” É por isso que eu admiro muito os Bahá'í, eles são profundamente poéticos, porém concretos naquilo que pregam, naquilo que reivindicam.
P/1 – Entendo, perfeito. Agora, voltando a Aracruz, foi nesse contato com o doutor Luiz Soresini que ele fez esse convite, foi um convite, né?
R – Foi um convite.
P/1 – Foi um convite. Então, depois que você ingressou na Aracruz, exatamente o que você foi fazer lá?
R – É, eu fui convidada por doutor Luiz Soresini, e o gerente Lineu…
P/1 – … Isso em que ano mesmo?
R – Em 1992, eu fui pra lá em outubro de 1992. Eu fui convidada por eles para coordenar o PEA, o Programa de Educação Ambiental, e coordenei o PEA, que na época era para os funcionários da empresa. E para o público externo, ele era voltado aos moradores do bairro Coqueiral, onde tinha grande concentração de empregados da empresa e o bairro era administrado pela Aracruz. Então, eu fui para coordenar esse programa criada por uma firma de consultoria chamada Simbios, que trabalhava em comum acordo. A nossa finalidade com esse projeto para o funcionário era despertar a atenção do funcionário para os processos produtivos da empresa, e os cuidados ambientais, daí inerentes, né, e para o público do bairro Coqueiral, os cuidados ambientais com o bairro.
P/1 – Sim, e, assim quais, eram… Na verdade, como a senhora via, enquanto educadora ambiental, essa questão dentro da Aracruz, quando a senhora entrou para organizar o PEA, para coordenar o PEA?
R –O PEA já estava criado, já estava organizado, aprovado e funcionando. Eu fui chamada para coordenar como funcionária interna. Eu vi o programa de educação ambiental como uma grande oportunidade de disseminar aquilo que a Aracruz tinha assinado, que era a carta de princípios para o desenvolvimento sustentável, em 1991, ela afirmou um compromisso mundial da carta de princípios para o desenvolvimento sustentável, e o seu Lorence, um dos acionistas da empresa, puxava no mundo, junto com outros empresários, a discussão sobre o desenvolvimento sustentável. Então, eu vi o programa como uma grande oportunidade de inserir junto ao funcionário, quer dizer, dentro da própria casa, do seu Lorence, os princípios que tanto tinham me fascinado quando eu estive lá na Europa, de que era possível produzir protegendo o ambiente, prevenindo a poluição, evitando a poluição, minimizando os impactos ambientais. E a Aracruz, já por força de suas licenças, sua conscientização, ela já fazia o seu processo produtivo com seus controles ambientais. O que precisava era ajudar no desenvolvimento da consciência de milhares de pessoas para entenderem a importância das ações que faziam.
P/1 – Ao longo desse período de 1992 até hoje que você está na Aracruz, quais são as principais mudanças, assim, que você percebe quanto essa conscientização por parte dos funcionários de maneira geral?
R – É, independente do programa…
P/1 – … Sim…
R – … Quer dizer, com a evolução dos fatos ambientais do mundo, as leis, as questões das licenças, das exigências ambientais, das exigências dos clientes, e também de um processo educativo, que tudo se complementa, nada é feito com exclusividade ou de ____________, a Aracruz, como toda empresa de ponta, ela evoluiu e muito. Ela sempre procurou estar à frente do seu tempo nas questões ambientais.
P/1 – Sim.
R – Então, eu vejo, no transcorrer desses anos, que ela cada vez mais busca realizar os seus trabalhos, voltada para a questão do desenvolvimento sustentável. Melhorando seus processos, as fábricas que ela inaugurou ao longo desse percurso foram sempre com melhor tecnologia, tecnologia de ponta para um melhor controle.
P/1 – Sim. A senhora teria como contar algum acerto ou algum problema nessa questão ambiental dentro da Aracruz, assim, que a senhora lembre agora?
R – Não.
P/1 – Não? Você acha que foi tudo perfeito, que o programa funcionou, funciona até hoje…
R – … Não, você está falando de duas coisas. Uma coisa você está falando um acerto ou erro ambiental dentro da empresa. Não, a empresa funcionou ambientalmente muito correta.
P/1 – Muito correta.
R – Agora, o programa de educação ambiental, é que com as mudanças ocorridas na empresa… Porque eu fui chamada para Aracruz Florestal, havia a Aracruz Florestal e a Aracruz Celulose. Aí a Aracruz Florestal foi assimilada pela Aracruz Celulose, houve uma redução drástica no quadro de funcionários para quase 50%. O programa de educação ambiental sofreu algumas interrupções, voltava ao longo do tempo, voltou como as palestras da coleta seletiva de lixo que foi implantada mais tarde, voltou como treinamentos da ISO 14001 que aconteceram mais tarde. E com as mudanças todas da empresa, o bairro foi aberto a população, aquele programa que era feito só para o bairro, ele não tinha mais condição de ser feito para o bairro, porque fugia do foco, que era o nosso funcionário. Então, nós… A empresa optou, em 1993, a desenvolver os seus trabalhos de educação ambiental para o público externo, através do Mosteiro Zen Morro da Vargem, em Ibiraçu, no Espírito Santo, porque o monge e o mosteiro, já eram parceiros da Aracruz, já tinham, eram parceiros. E naquele ano de 1993, o polo, o Mosteiro Zen, em 1992, ele foi eleito o polo de educação ambiental da mata atlântica e criou um grupo gestor, um grupo de gestão. Ele foi criado pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado, onde eu estava antes, e quando eu passei para a Aracruz, vendo a parceria do Mosteiro e a abrangência dele em quatro municípios, Aracruz, _________ Ibiraçu e Fundão e já tendo uma parceria com o Monge, eu sugeri a Aracruz, como a maioria dos seus funcionários morava nos quatro municípios, que a gente então aplicasse o programa de educação ambiental externo da Aracruz, também através do programa do polo de educação ambiental do Mosteiro Zen Morro da Vargem. E eu fui membro efetiva dessa comissão, até o último dia que eu fiquei na Aracruz.
P/1 – Que legal…
P/2 – … Eu queria que a senhora falasse um pouquinho sobre a ISO 14001. Só pra descrever pra gente quais são os critérios dessa ISO, e como foi esse treinamento...
P/1 – Quais foram os padrões exigidos pela ISO?
R – Bom, a ISO 14001, ela trata da gestão ambiental. Um dos requisitos dela é treinamento para funcionários. Obedecer a legislação, ter objetivo e metas ambientais, prevenir a poluição, treinar os seus funcionários, se comunicar com as partes interessadas. A minha tarefa na Aracruz, quando ela se candidatou a ter o certificado da ISO 14001 foi fazer exatamente o treinamento de sensibilização ambiental dos funcionários. Nós levamos quase dois anos, porque treinamos todos os funcionários próprios e multiplicadores de terceiros, e a sensibilização usada foi visão holística de meio ambiente e desenvolvimento sustentável. E tinha o complemento com a Ana Marta, que era uma outra companheira de trabalho, que hoje está na Aracruz, é responsável pelo sistemas ISO 9000, ISO 14000, é uma das responsáveis. Eu fazia parte de sensibilização e a Ana Marta fazia, então, a parte teórica do sistema, da norma em si.
P/1 – E como foi esse processo de sensibilização dos funcionários? Teve uma receptividade boa?
R – Teve uma receptividade muito grande, a frequência foi bem acima da esperada. Porque sempre quando você promove um treinamento, tem uma margem de faltosos, que estão de férias ou de licença. Nós conseguimos praticamente treinar todas as pessoas da empresa, as pessoas tinham uma empolgação muito grande com as mensagens que nós passávamos, tanto a Ana Marta como eu, e eu acho que foi um tempo muito produtivo, muito positivo para a educação ambiental lá dentro da Aracruz Celulose.
P/2 – E o reflexo na comunidade? Esse ensinamento ia para as casas, ia?
R – Olha, na época, quando a gente treinou o funcionário, nós criamos uma cartilha chamada “O que nós podemos fazer para ajudar” para ele levar para os familiares dele. Através desta cartilha a gente sabe o que foi levado, através de conversas, emprestávamos as fitas de motivação. Tinha uma fita chamada Zeia, outra chamado Buraco Branco no Tempo. Emprestamos tanto que as cópias acabaram se dispersando, a gente via um grande interesse do funcionário, e isso dos treinamentos dados dentro da empresa. Agora, do trabalho com o público externo lá no Mosteiro Zen Morro da Vargem, nós trabalhávamos lá quatro municípios, com cursos específicos para professores, policiais militares, líderes comunitários, com visitas monitoradas, era todo um outro tipo de abordagem para público em geral.
P/1 – Sim. Fala um pouco dos projetos, então, que você teve engajada. Do Mosteiro, junto ao Mosteiro Zen e mais algum especificamente que você tenha na comunidade, algum…
R – … Na época da… Há sim, na época da Aracruz, para São Mateus e Bahia, a educação ambiental externa era feita através o programa Bons Vizinhos, que é um programa voltado para os vizinhos limítrofes da propriedade da empresa. E ele tem toda uma dinâmica e ele é desenvolvido pela área florestal, pela PSM [?]. E eu tive a honra, enquanto estava na Aracruz, de ser convidada para todos os eventos de Bons Vizinhos, que durava um dia todo, com assuntos florestais, assuntos de vizinhança pelos técnicos de segurança da empresa, eu tinha o privilégio de ter uma hora reservado para a educação ambiental, para a sensibilização, para passar essas informações de meio ambiente.
P/1 – Sim…
R – … Uma pequena parte, uma hora de um dia, mas era para mim muito importante. E em Aracruz também teve o programa Bons Vizinhos, depois ele não teve continuidade… Esgotou-se os vizinhos, esgotaram-se, foram feitos todos, e enquanto teve o bom vizinho, em qualquer lugar que tivesse, todo mês ele era mensal, a educação ambiental lá estava. Então, eu posso citar como projetos de relevância, o PEA, o do início da empresa, a coleta seletiva de lixo, que eu também fui partícipe, junto com a (Incéu?), a fábrica. A ISO 14001 também, em colaboração, o programa Bons Vizinhos e o trabalho feito através do Mosteiro Zen Morro da Vargem para o público externo.
P/1 – Sim.
R – Mas eu não só trabalhei educação ambiental na Aracruz, não.
P/2 – A senhora poderia falar __________
P/1 – __________
R – Eu trabalhei… Acabei trabalhando também em comunidades indígenas.
P/1 – Sim.
R – Eu quando fui trabalhar na Aracruz, em 1992, o meu escritório era em frente a uma aldeia indígena guarani, chamada Boa Esperança.
P/1 – Sei.
R – Na época a empresa não tinha nenhum trabalho estruturado com comunidades indígenas. Os índios tinham uma demanda pela terra com a empresa. A empresa estava certa de que havia comprado e pago, não devia nada as comunidades, mas havia uma inquietação junto às comunidades indígenas. E eu fui ver índios do Espírito Santo pela primeira vez no meu escritório, que era em frente a aldeia Guarani. E me comoveu muito a situação deles, a maneira deles, e começamos uma… Eles iam lá vender artesanato, era um prédio que tinha em frente a aldeia. E começavam a pedir de tudo, de tudo. Pediam roupa, pediam mantimento, não havia um trabalho estruturado junto às comunidades. Havia sim várias facções ali, o Conselho Indigenista Missionário, a Pastoral Indigenista, algumas seitas religiosas, a Prefeitura de Aracruz. E a Aracruz Celulose estava acostumada a atender eventuais reivindicações de um grupo, de outro, como atendia de todas as comunidades da sua área de abrangência para doações. Então, às vezes, pedia-se semente de feijão, pedia-se mudas de árvores frutíferas, ela ia dando sem um trabalho estruturado. Quando eu mudei, como educadora ambiental, perto da comunidade guarani, estabeleceu-se uma relação de amizade entre os guaranis e a minha pessoa. E quase que no mesmo ano que eu mudei para lá, havia, assim, uma grande reclamação das facções envolvidas com as aldeias que a Aracruz não tinha um trabalho junto às comunidades indígenas. E a Prefeitura de Aracruz, aproveitando um decreto nacional que criava os Núcleos Interinstitucionais da Saúde Indígena, os Nisis(?), no Brasil todo, a Prefeitura de Aracruz resolveu abraçar a Nisi e criou um decreto municipal criando um Nisi local. Mas não para tratar só de saúde, para tratar de agricultura, saúde e educação, e convidou a Aracruz Celulose para ser membro desse núcleo. Isso foi nos anos de 1993, por aí. Eu fui a pessoa, então, indicada pela Aracruz, por ser educadora ambiental, já estar trabalhando as comunidades, e ter experiência com comunidade, por ser descendente indígena, e ser bem aceita por eles, e isso foi intuitivo, foi assim. E eu participei do Nisi vários anos. Aliás, eu participei do Nisi desde a sua fundação, até quando eu saí da Aracruz, em novembro de 2001. E dentro do Nisi, no Núcleo Interinstitucional da Saúde Indígena, participavam os radicais, que orientavam os índios para a reivindicação fundiária, a Prefeitura, o governo do estado e a Aracruz Celulose. Então, é como se fosse, assim, um imenso caldeirão de tendências, de intenções. Só que ali dentro, a gente não tratava das questões periféricas, a gente tratava de agricultura, saúde e educação. A Aracruz foi uma parceira que durante o tempo do Nisi, até 1998, ela participou com doações materiais, financeiras, como a Prefeitura participou, como o governo do estado participou, e a igreja católica também participou. E em 1998, saiu um decreto ministerial dizendo que a Aracruz deveria devolver aos índios mais de 2000 hectares de terra. E foi, assim, dentro do Nisi o período mais difícil de trabalhar, porque é preciso que quando a gente está se colocando num trabalho social, a gente tenha isenção de ideologias. Então, eu era Aracruz. Os índios, os demais parceiros ali envolvidos. E na justiça, um processo dos índios contra a Aracruz, e que a Aracruz teve de assinar um termo de ajustamento de conduta. E houve até um período que o Nisi suspendeu suas atividades para que as coisas não fossem confundidas, para que o social não fosse usado e a Aracruz não iria usar, com certeza, para a parte jurídica no processo das terras; e então em 1998, a Aracruz assinou dois termos de ajustamento de conduta. A aldeia de Comboios negociou com a empresa numa tranquilidade tremenda, sem grandes baques. E aí assinou-se um termo de compromisso, termo de ajustamento de conduta com os Comboios. As demais aldeias, foi mais difícil a negociação, que as partes tinham que se entender, e demorou mais tempo, demorou mais uns três meses quase a se fechar consenso, aí a Aracruz assinou o termo de ajustamento de conduta com as comunidades de Caieira Velha, Irajá, Pau Brasil e Boa Esperança. Bom, passada essa fase um pouco difícil da relação entre empresa e índios, o Nisi retomou suas atividades, só que agora com recursos alocados, recursos fixos definidos, anuais, através do termo de ajustamento de conduta firmado pela empresa. Assim que o termo foi assinado e o Nisi voltou a atuação, a nossa grande preocupação é como os índios iam gerir os recursos. Então, nós também ajudamos, a parte jurídica da Aracruz ajudou também na formação de duas associações indígenas. A Associação Indígena Tupiniquim de Comboios e a Associação Indígena Tupiniquim e Guarani, que foi a do grupo mais difícil de negociar. Essa associação gerida por índios, assessorada pelo Nisi e tendo como órgão assessor o CIMI, Conselho Indigenista Missionário, que sempre foi o mentor de todas as ações de arrebanhamento social dentro das aldeias, os índios foram buscando, então, um caminho de melhora, autossustentação. Que está sendo procurado até hoje, porque o termo é para 20 anos, tem cerca de que, uns cinco anos que foi assinado, por aí.
P/1 – E como é que era essa… Você ficava no contato direto nessas negociações com os índios?
R – Não, nunca negociei com índios.
P/1 – Não, né.
R – Não, meu trabalho era social.
P/1 – Social, né.
R – Sempre foi social. Agricultura, saúde e educação.
P/1 – Sim.
R – A negociação fundiária foi feita pela assessoria jurídica da Aracruz. Nunca conversei com índios sobre negociação de terras.
P/1 – Eles não te viam como Aracruz. Como que era essa relação com eles?
R – Eles sabiam que eu era Aracruz, mas sabiam que eu era uma pessoa que meu falar era: “Sim, sim. Não, não.” E que eu jamais usaria o trabalho feito para aliciamento ou arrebanhamento de índios para a negociação fundiária. Eles inclusive brincavam: “Tem hora que a gente até esquece que você é Aracruz, e fala mal da Aracruz perto de você.” Eu dizia: “Não tem problema, sejam sinceros e falem o que vocês sentem.” Eu acho que o meu trabalho com os índios, ele contribuiu sim para que a empresa os conhecesse melhor e eles conhecessem melhor a empresa, para que caminhos de diálogos pudessem ser abertos, em qualquer das áreas, porque houve a questão fundiária, e a terra repassada aos índios, ela era recoberta por eucaliptais de boa qualidade, e os índios demonstraram interesse em vender essa madeira para empresa, então eles tiveram de entrar para o programa de _____ florestal. Eu muitas vezes, nas dúvidas que os índios tinham e me perguntavam coisas, eu tinha que responder a eles a realidade da empresa Aracruz, mas eu não fui o porta-voz da negociação fundiária, nem poderia ser, de maneira alguma. Meu trabalho era educativo, era agricultura, saúde e educação. __________
P/1 – ________ … Um pouco mais esses três pontos que você abordava e trabalhava junto com os índios. Como é que era essa relação no dia a dia?
R – Olha, havia um grupo chamado Nisi, Núcleo Interinstitucional de Saúde Indígena, que tinha reuniões periódicas nas aldeias. Formado pela Fundação Nacional de Saúde, Funai [Fundação Nacional do Índio], CIMI, Pastoral Indigenista, Prefeitura do município, governo do estado e Aracruz Celulose. Nessas reuniões do grupo, do Nisi, que poderia ser em qualquer das aldeias, e depois que as associações criaram sede, passou a ser na sede de cada associação, a nossa relação era bastante cordial, porque a gente estava ali para construir. E minha pessoa sempre foi recebida com muito respeito e carinho pelos índios, que eles sabiam que se eu falasse “sim”, era sim, se eu falasse “não”, era não. Se eu falasse “vou ver e dou a resposta depois”, eu iria ver e dar a resposta depois. Mesmo com as pessoas que fomentavam a questão fundiária, que com as quais eu convivi no grupo, a nossa relação não foi difícil de levar, porque não se discutia questões periféricas dentro desse grupo. Fora isso, eu fazia como todo membro do Nisi fazia, visita as aldeias. Houve época em que os índios tiveram reuniões na Aracruz, então eles pediam que eu estivesse presente. Eu ficava ali simplesmente como presença, como autoconfiança para eles. Mas toda negociação foi feita pelo setor jurídico da empresa e pelo gerente de meio ambiente e relações corporativas, era o Braga, da assessoria jurídica, e o Carlos Alberto (Roxo?) do meio ambiente.
P/1 – Então, a tua relação com os índios era ótima?
R – É ótima até hoje.
P/1 – É até hoje, né.
P/2 – A senhora aprendeu a língua guarani?
R – É, eu estudei guarani com um índio, um professor de guarani, aprendi os rudimentos para poder me comunicar um pouco melhor, porque eles falam português. Mas as crianças até uma certa idade, até os 4, 5 anos, falam só guarani, e os idosos preferem falar em guarani. E quando eu era criança, lá em Mato Grosso, até os 3 anos de idade, nós convivemos com os índios caiuás, que também falavam o guarani, então já estava um pouco adormecido no meu espírito. Agora, não sou fluente, não posso dizer que falo guarani com fluência, entendo, me comunico, dá para quebrar um galho.
P/2 – Mas o nome Aracruz tem origem guarani?
R – “Ara” significa altar do sacrifício, e “cruz” é cruz mesmo, então é um crucifixo e um altar. Essa é a explicação que dão para o município de Aracruz. “Ara” é altar de pedra, agora “cruz”, do português mesmo, agora porque, como aconteceu o nome do município, eu não consigo te explicar.
P/1 – Certo. É, enfim, nessa relação com os índios, tem mais alguma coisa que você gostaria de falar?
R – Ah ,eu gostaria de falar, sim, das belezas do rio Comboios, da amizade, simplicidade de alguns indígenas, de alguns deles, da intenção forte deles de buscar um caminho de autossustentação, isso sempre me motivou muito. E eu acho que dentro da realidade dos dois grupos, comunidades indígenas e Aracruz Celulose, os dois despenderam esforços muito grandes e despendem até hoje para que uma relação mais concreta ocorra dentro desse termo assinado. É uma busca, porque são mais de 2000 índios e uma grande empresa. São mundos diferentes, ideais diferentes, realidades diferentes. As intenções é que são genuínas de parte a parte. Os índios na sua busca pelos seus direitos e a empresa, no cumprimento do termo que ela assinou, no que ela reconheceu que poderia ajudar os índios.
P/1 – Sei e, assim, quanto… O momento que você destacaria como importante nessa sua trajetória, o mais marcante dessa sua trajetória na Aracruz?
R – Mais marcante da minha trajetória na Aracruz, eu acho que foi marcante o nosso trabalho de educação ambiental no Mosteiro, foi muito importante… É muito importante, porque ele não parou, ele continua e eu presto consultoria eventualmente. E quando houve a fusão da Aracruz Florestal com a Aracruz Celulose, que foi um dos momentos mais difíceis que a educação ambiental enfrentou, e ela continuou sobrevivendo, foi um momento marcante.
P/1 – Por que?
R – Porque a empresa estava fundindo duas grandes empresas, e reduzindo o quadro e fazendo mudanças drásticas, e tudo estava mudando; então todos os projetos e programas em andamento ficaram colocados em cheque, foram cancelados alguns. Então, foi um momento, assim, muito importante eu acho, marcante, desafiador.
P/1 – Certo.
R – Os treinamentos também para ISO 14001 foram momentos de grande emoção, de sensibilização. São momentos que eu lembro, assim, com alegria de ter participado.
P/1 – Ed, algum? Agora, quanto a questão da turma… Você tem alguma coisa a ver com a criação da Turminha da Aracruz, ou não?
R – Tem. É, nós lançamos um concurso para os funcionários da empresa. A firma de consultoria Simbios, eu coordenava o programa e nós tivemos conjuntamente a ideia de criar um concurso para os funcionários para criar a Turminha da Aracruz. Iaracruz, Marcelulose, Célio Porto, Eucalipto e o cachorrinho Fibra Curta. Demos os nomes, os funcionários participaram com desenhos e sugestões. E dois funcionários ganharam e o cartunista capixaba Milson Henriques é que deu formato a turminha. Agora, as histórias da turminha quem escreveu fui eu. A criação dos mascotes foram os funcionários, agora as cartilhas e as historinhas…
P/1 – … Foram todas você.
R – Fui eu que criei.
P/1 – Ah, que legal. E os nomes dos personagens tem…
R – … Foi a empresa Simbios que criou, motivada, e a Iaracruz, por causa da Aracruz Celulose, Célio Porto por causa da Porto Céu, Eucalipto, pela árvore eucalipto, Marcelulose por causa da celulose, e o cãozinho Fibra Curta, porque o nosso, o nosso não, o produto da Aracruz é essa celulose branqueada de fibra curta. Então, o cachorrinho tinha um rabinho curto, era bravinho, nervosinho, chamado Fibra Curta. Esses nomes foram criados pela Simbios.
P/1 – Ah, sei.
R – O visual das mascotes por dois funcionários, e as historinhas, quem criou fui eu.
P/1 – Ivone, eu queria voltar um pouquinho ainda na questão de educação ambiental, eu queria saber o papel da educação ambiental dentro do entendimento que a gente tem hoje, e que se tinha sobre o eucalipto. Uma série de preconceitos, desentendimentos, opiniões formadas, assim, as gerações que têm que ser repensadas.
R – Eu não entendi bem a sua pergunta.
P/1 – Desculpe. Eu queria entender o papel da educação ambiental para, digamos assim, entender o eucalipto. Que nós sabemos que existe uma série de mitos sobre o eucalipto, preconceitos. E o papel da educação ambiental para entender de fato o que é o eucalipto, uma análise científica, uma análise não baseada em crendice ou análises que foram derrubadas.
R – Isso. Bom, o papel da educação ambiental não é nem desfazer mitos nem criar mitos, nem explicar nem justificar. Mas se você está num evento de educação ambiental e você é perguntado sobre determinados mitos e situações, você tem de ter respostas científicas para as pessoas entenderem certas situações. Com esse enfoque, a educação ambiental pode se prestar sim a dar respostas, a esclarecer situações, não só sobre eucalipto, como sobre qualquer outra dúvida que o cidadão tenha. Acho que isso dá para você uma ideia da influência que a educação ambiental possa ter. Agora, se há curiosidade, se as pessoas perguntam, o educador ambiental, ele tem de ter algum embasamento para responder ou para dizer com sinceridade que ele não sabe responder aquilo ali. Agora, uma coisa que a gente sempre procurou conversar muito com as pessoas, é que o grande problema não é, por exemplo, o eucalipto, mas a maneira como o ser humano maneja ou planta, assim como é com o café, assim como é com a soja, com o feijão, com o arroz, com o algodão. Você tem produtores que fazem cultivos maravilhosos recuperando solo, conservando nascentes de água e produzindo seus monocultivos, como você tem produtores que são verdadeiros arrasos. Então, o que a educação ambiental busca despertar no ser humano é a sua responsabilidade, a minha responsabilidade no trato com as coisas do ambiente, inclusive os monocultivos. Aí sim a educação ambiental desperta na pessoa o cuidado de que ele, ser humano é agente sobre o ambiente e sobre aquele ser que ele está manejando para ter o seu lucro. É o que a gente chama de desenvolvimento sustentável, que é um misto de econômico, social e ambiental, mesclado com tecnológico para você causar o mínimo impacto ambiental. Nesse ponto de vista, a educação ambiental procura sensibilizar as pessoas simples, principalmente dentro de indústria, que é o setor produtivo.
P/1 – Sim, agora uma pergunta: como foi para você ter recebido o título de cidadã do mundo?
R – Foi uma emoção. Foi… A comunidade Bahá'í do Brasil, ela tem esse prêmio, ele é anual e no ano em que eu me destaquei, a categoria era “Mulheres que se Destacaram”. E houve ano que teve outros temas, outros motes. E eu já tinha escrito uns livros para comunidade Bahá'í, já tinha dado palestras, já tinha trabalhado como educadora ambiental, já tinha um método interdisciplinar, o primeiro método aqui para o Espírito Santo. E eu já tinha ido para Escócia, já tinha, assim, um caminho traçado quando a comunidade… Já tinha publicado seis livros pela editora Bahá'í, quando a editora Bahá'í me deu essa grata surpresa de me premiar com o título de cidadã do mundo, junto com mais, se não me engano, 19 mulheres, por aí do Brasil. Tizuka Yamasaki, a esposa do Fernando Henrique Cardoso, Ruth Cardoso, e tinha várias outras. Tinha escritoras, a Tizuka que era cineasta… Eu tive uma emoção. Primeiro eu tive uma surpresa muito grande, e achei que não merecia, que não era o caso, tinha gente bem mais destacada, mas a comunidade Bahá'í foi bastante assertiva e diz que o título era meu e eu ganhei. Ganhei um troféu muito bonito, ganhei destaque na mídia e ganhei uma grande responsabilidade, porque da hora que você se torna cidadã do mundo para batalhar por um mundo mais justo, fraterno e unido, você não tem mais recuo. Você é cidadã do mundo para isso.
P/1 – Certo. Dois mil e um você se aposentou da Aracruz, foi isso?
R – Não. Em novembro de 2001 eu saí da Aracruz para tocar minha própria empresa, Eco Ambiental, Consultoria e Meio Ambiente, porque daí um ano eu ia me aposentar pela Aracruz. Então, eu já comecei a preparar o meu terreno aqui fora. E apareceu uma oportunidade, eu não deixei de ser consultora da Aracruz, quando eles precisam, eles me chamam. Não trabalho mais nas comunidades indígenas, eu tenho um substituto, que é Jetibá (Fausti?), que é ex-funcionário da Funai. Mas para educação ambiental eventualmente ela me consulta para o Mosteiro, para as coisas, assim, ligadas a educação ambiental. Eu saí da Aracruz Celulose por livre e espontânea vontade para criar minha própria empresa, a Eco Ambiental, Consultoria e Meio Ambiente, na qual eu trabalho hoje prestando consultoria a empresas, prefeituras.
P/1 – Fala um pouco do que é a Eco Ambiental, do que faz.
R – A Eco Ambiental é uma empresa de consultoria e meio ambiente, mas com foque em educação ambiental. E eu desenvolvo projetos para prefeituras, dou palestras, dou cursos, desenvolvo projetos. Não vou citar clientes, eu tenho clientes, e…
P/1 – … No Espírito Santo?
R – No Espírito Santo. Eu tenho clientes no Espírito Santo, dou cursos, dou palestras, desenvolvo projetos, esse é o métier da minha empresa.
P/1 – Certo. E, assim, como foi para senhora ter trabalhado na Aracruz?
R – Foi uma escola de vida. Eu estava acostumada a ser funcionária do governo a vida toda, e com um certo âmbito de abrangência e de compreensão. Quando eu entrei para Aracruz Celulose, uma empresa de ponta, um mundo a se abrir, eu aprendi muito, mas muito. E foi dentro da Aracruz Celulose que eu desenvolvi aquilo que eu trouxe embrionário da Escócia, que era o desenvolvimento sustentável. E eu pude aprender muito lá dentro, nas várias áreas, setores, ela me oportunizou isso. Me oportunizou exercitar e me oportunizou aprender. Então, foram nove anos e um mês muito profícuos e muito gratificantes. E eu confesso que eu fui embora… Eu precisava criar a minha empresa, porque daí um ano eu ia me aposentar, eu precisava pensar na minha parte material, financeira, na minha parte pessoal, familiar. Eu precisava ficar mais perto da minha família, porque eu moro em Vitória e trabalhava em Aracruz. Eu saía cinco e meia da manhã de casa e não tinha hora para voltar, porque eu trabalhava em comunidades indígenas, que, às vezes, tinham reuniões que varavam a noite inteira, que para o índio não tem muito horário. Então, juntou necessidade de estar mais próximo dos familiares, um repensar do futuro, por uma aposentadoria que viria próxima. Eu acabei me aposentando pela Aracruz uma ano depois que eu já tinha saído, porque é permitido, e aí eu criei a minha empresa e estou caminhando.
P/1 – Que legal. E, assim, se você pudesse definir a Aracruz em poucas palavras, como você descreveria?
R – Uma escola de vida, uma casa que me abrigou durante nove anos e um mês. Uma empresa empenhada em fazer tudo o que pode, buscando a excelência, um lugar muito agradável de trabalhar.
P/1 – Certo. E, assim, para senhora, qual o seu maior sonho hoje?
R – Meu maior sonho hoje é poder ter vida e saúde e continuar fazendo o trabalho que eu faço com equilíbrio, com autoconfiança, com oportunidades e acabar de encaminhar minha família, que eu tenho dois filhos fazendo faculdade ________.
P/1 – E alguém seguiu a área ambiental ou não?
R – Não.
P/1 – Não.
R – A minha filha, ela é administradora e ela é gerente geral da minha empresa, trabalha comigo. Um filho está fazendo Direito e o outra está fazendo… Meu Deus, me deu um branco…
P/1 – … Sem problema.
R – Arquitetura.
P/1 – Sim, claro.
R – Descupe, quer voltar esse pedaço aí?
P/1 – Imagina, mas nem pensar. Que ótimo. E, assim, o que é ecologicamente correto para você, que você usou isso no início, tem livros que só…
R – … Pra mim, o ecologicamente correto em literatura é tudo aquilo que não te leva, tudo aquilo que não te leva ao desperdício, a crueldade, as agressões ambientais. É tudo aquilo que te leva a ter responsabilidade com seus resíduos, com suas atitudes, com a sua compreensão de animais e plantas, com seu amor pelo planeta Terra. O que seguir essa linha, o que for pela paz, o que for pela preservação, conservação, recuperação ambiental, prevenção a poluição, não ao desperdício, para mim está voltado para o alvo chamado ecologicamente correto. Porque não existe um ponto escrito ecologicamente correto, aqui fechou, é certa busca pela excelência. E é um exercício diário, porque para você aplicar o ecologicamente correto não é muito fácil.
P/1 – É, eu sei. E se a senhora pudesse mudar alguma coisa na sua trajetória de vida, o que a senhora mudaria?
R – Nada, nada.
P/1 – Perfeito. E, assim, para a senhora, qual a importância de um projeto como esse de resgatar a memória, no caso a memória da Aracruz?
R – Eu acho que um projeto desse é importante, porque a memória guarda a vida. E uma empresa que registra a sua vida, ela guarda exemplos, ela guarda situações, ela mostra pessoas, ela faz as pessoas se sentirem importantes, valorizadas. Ela faz com quem vá assistir e ver os depoimentos possa ter inspiração, possa ver modelos. E eu não estou falando da minha pessoa, eu estou falando do projeto Memória Aracruz. A Aracruz tem muitas pessoas de valor que passaram por ali e que não podem ser esquecidas. Pesquisadores, engenheiros, pessoas da área de RH [Recursos Humanos], pessoas da área de meio ambiente, ela foi construída pelas pessoas. Então, o projeto Memória Aracruz, eu acho ele importante na medida que ele registra, resgata e pode servir de fonte de informação, de inspiração ou só mesmo de registro. Não se perder na poeira do tempo, a história de uma grande empresa. Eu acho fabuloso esse trabalho e me sinto muito honrada em ter sido convidada para ele.
P/1 – Certo. Tem alguma coisa que ao longo da entrevista que eu não perguntei, que a senhora gostaria de ter falado, que eu ou ele não perguntamos?
R – Que eu me lembre não.
P/1 – Não? E o que você achou de ter dado essa entrevista?
R – Foi muito confortável, agradável. Você são muitos simpático, e eu me senti totalmente à vontade.
P/1 – Obrigada, a gente também. Foi ótima a sua entrevista, a gente agradece a sua participação no projeto Memória Aracruz.
R – Eu que agradeço.
P/1 – Obrigada.
--- FIM DA ENTREVISTA ---
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