P/1 – Para começar, gostaria que o senhor dissesse o seu nome completo, data e
local de nascimento.
R – Walter Barelli. Nasci em São Paulo, 25 de julho de 1938.
P/1 – Qual o nome dos seus pais?
R – José Barelli e Elza Grande Barelli.
P/1 – Qual era a atividade profissional dos seus pais?
R – Meu pai era mecânico de manutenção. Minha mãe era tecelã. Mas no fim da
vida era passadeira, que é um grau maior do que tecelã.
P/1 – O senhor tem irmãos?
R – Não.
P/1 – O senhor lembra o bairro, a rua que você morava quando era criança, para
poder descrever para a gente?
R – Meu pai trabalhou na Nitroquímica. Então, assim que eu nasci eu fui para São
Miguel. Com 20 dias estava em São Miguel. Mas de São Miguel eu me lembro
muito pouco. Com quatro anos eu me mudei para o Belém. Rua Arinaia. Me
lembro algumas coisas da rua. E aí mudei para uma vila, que alguns chamavam
de Vila Bois, outros de Vila Matarazzo. Era uma vila operária, na Avenida Celso
Garcia. Ainda existem algumas das casas. Onde eu fiquei, onde minha mãe
morou, eu fiquei lá até mais ou menos 1958. Depois mudei várias vezes pelo
Belém. Mas você deve estar querendo infância. Depois eu conto o resto.
P/1 – Como que era o dia-a-dia na sua casa?
R – Dia-a-dia na minha casa. Olha, meu pai morreu quando eu tinha nove anos.
Então eu não tenho muita memória da rotina geral. Mas quando meu pai estava
vivo minha mãe não trabalhava. Tomava conta da casa. A gente levantava, tomava
café, ia para a escola. De tarde, depois do almoço, tinha lição de casa e tinha as
brincadeiras. Porque a vila dava toda essa condição para a gente. A casa tinha um
quintal que a gente plantava algumas coisas. Tinha umas galinhas. Isso aí é uma
coisa de antigamente em São Paulo, tá?
P/1 – Com a perda do seu pai então sua mãe que assumiu?
R – É, meu pai ficou quatro anos doente. A...
Continuar leituraP/1 – Para começar, gostaria que o senhor dissesse o seu nome completo, data e
local de nascimento.
R – Walter Barelli. Nasci em São Paulo, 25 de julho de 1938.
P/1 – Qual o nome dos seus pais?
R – José Barelli e Elza Grande Barelli.
P/1 – Qual era a atividade profissional dos seus pais?
R – Meu pai era mecânico de manutenção. Minha mãe era tecelã. Mas no fim da
vida era passadeira, que é um grau maior do que tecelã.
P/1 – O senhor tem irmãos?
R – Não.
P/1 – O senhor lembra o bairro, a rua que você morava quando era criança, para
poder descrever para a gente?
R – Meu pai trabalhou na Nitroquímica. Então, assim que eu nasci eu fui para São
Miguel. Com 20 dias estava em São Miguel. Mas de São Miguel eu me lembro
muito pouco. Com quatro anos eu me mudei para o Belém. Rua Arinaia. Me
lembro algumas coisas da rua. E aí mudei para uma vila, que alguns chamavam
de Vila Bois, outros de Vila Matarazzo. Era uma vila operária, na Avenida Celso
Garcia. Ainda existem algumas das casas. Onde eu fiquei, onde minha mãe
morou, eu fiquei lá até mais ou menos 1958. Depois mudei várias vezes pelo
Belém. Mas você deve estar querendo infância. Depois eu conto o resto.
P/1 – Como que era o dia-a-dia na sua casa?
R – Dia-a-dia na minha casa. Olha, meu pai morreu quando eu tinha nove anos.
Então eu não tenho muita memória da rotina geral. Mas quando meu pai estava
vivo minha mãe não trabalhava. Tomava conta da casa. A gente levantava, tomava
café, ia para a escola. De tarde, depois do almoço, tinha lição de casa e tinha as
brincadeiras. Porque a vila dava toda essa condição para a gente. A casa tinha um
quintal que a gente plantava algumas coisas. Tinha umas galinhas. Isso aí é uma
coisa de antigamente em São Paulo, tá?
P/1 – Com a perda do seu pai então sua mãe que assumiu?
R – É, meu pai ficou quatro anos doente. A aposentadoria estava começando. Meu pai morreu em 1947. Ele tinha lá uma aposentadoria, um auxílio de saúde, alguma coisa assim. Mas que era uma pobreza grande. Porque um pouco antes teve a guerra. E grandes dificuldades, por exemplo, meu pai precisava comer uma
comida especial, e precisava de farinha. E não tinha farinha. Então a confusão era
comprar macarrão para moer o macarrão para fazer farinha, para fazer a comida
que o meu pai ia comer. Me lembro de ir às quatro horas da madrugada com a
minha mãe nas padarias para fazer fila. E aí havia as invasões de padaria, por
causa do racionamento. Então era até perigoso. Quando tinha isso, minha mãe se
afastava, a gente ia para outro lugar. Mas foi a experiência de guerra, que no
Brasil ninguém teve, eu tive um pouquinho. Pelo menos as restrições desse tempo
de guerra. E minha mãe então, o que é que ela fazia? Ela fazia muito tricô para
vender para fora. Tinha pessoas que compravam a produção da minha mãe. Ela
também costurava, mas acho que era mais para nós. Mas tricô acho que tinha
mais saída. Então ela fazia blusas de tricô para sustentar a família. Nos papéis do
meu pai eu encontrei uma lista que o pessoal da fábrica, ele trabalhava na fábrica
de papel e papelão do Matarazzo, que era ali ao lado da vila, e o pessoal fez uma
lista: “Para passar o Natal melhor”. Isso mostra a solidariedade que o pessoal
tinha. Meu pai tinha uma certa liderança. Todo mundo falava muito bem dele.
Então, mas não deu para conviver tanto e saber todas as coisas.
P/1 – Então o seu pai, só uma curiosidade, o seu pai adoeceu, mas ele estava
trabalhando quando adoeceu? Foi isso?
R – É, o problema dele foi um problema de coração. Na época ele dizia: “Olha, se
me levarem para os Estados Unidos eles me curam”. Ele queria fazer uma
operação, mas no Brasil ainda não tinha tido o Zerbini, e companhia bela, o
pessoal que fazia cirurgia toráxica, essas coisas todas. Então era um problema,
tinha muita falta de ar, não podia fazer esforço. Ele também fazia algumas coisas,
ele era habilidoso, então consertava relógio. Certamente consertava os relógios do
pessoal da vizinhança. E aí devia ganhar um dinheirinho. Pequeno, mas era o bico
que ele fazia. E aí quando ele morreu minha mãe voltou a trabalhar na fábrica.
Mudou o regime da família. Porque ela trabalhava das cinco a uma da tarde.
Então quando ela saía, eu estava dormindo. Ia para a escola, voltava da escola.
Não! No início, ela trabalhava dois turnos. Devia ser das sete às onze, e depois da
uma às cinco. Alguma coisa assim, dava oito horas. Então era mais ou menos
isso. Mas depois passou das cinco a uma. Nesse período, quando eu voltava da
escola eu tinha de fazer comida. Alguma coisa. Eu sou péssimo cozinheiro. Mas
as coisas elementares eu deixava pronto. Lavar louça, lavar quintal, casa
inteirinha. Essas coisas a gente fazia. Depois ela mudou. Durante um tempo eu
almoçava na casa da vizinha da frente. Era uma espécie de pensão que a minha
mãe pagava. Depois, passei a almoçar na casa de uma tia que era lá do bairro,
mas era mais longe. E minha mãe também pagava uma pensão, um dinheirinho lá
para essa minha tia. Então era mais fácil a coisa.
P/2 – Barelli, só uma pergunta, você teve que assumir responsabilidades muito
cedo. Com a sua casa, você diz até que começou a trabalhar muito cedo. Como
que foi isso para você? E queria saber também se você brincava. Como é que era
essa, se você tinha atividades de criança mesmo.
R – Olha, a vila era um bom lugar, porque eu tinha muitos amigos da mesma
idade. Todo mundo trabalhava, os pais trabalhavam. Algumas mães não
trabalhavam. Então era uma comunidade. E por eu ser filho único, tinha muitos
brinquedos que os outros não tinham. Então o pessoal vinha muito brincar na
minha casa. E o problema de limpar casa, essas coisas, era um negócio meio
imposto mas meio aceito. Porque tinha de fazer. Alguém tinha de fazer. Então,
uma faxina mais grossa minha mãe fazia. Mas limpar, varrer, essas coisas, fazia
eu.
P/2 – E a escola, como que foi?
R – Escola. Primeiro eu estive no Grupo Escolar Amadeu Amaral. Ele existe até
hoje. A gente ia a pé, ele fica no Largo São José do Belém. Saía da vila e ia uma
turminha junto estudar. Eu, pelo que eu me lembro, eu me saí bem na escola.
Quando terminei o quarto ano eu fui tentar trabalhar numa escola profissional
chamada Piratininga que era do governo, ali na Rua Piratininga. Uma espécie de
SENAI [Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial]. Só que eles só aceitavam
depois dos doze anos. Eu tinha onze anos. Então aí eu fiz o quê? Na época, o
quinto ano era chamado Admissão. Foi a maneira de esperar para poder entrar.
Porque a ideia , já na época, era: se você aprender uma profissão você vai ter
chance na vida. Muitos dos meus amigos sequer terminaram a escola, já foram
trabalhar. Aí não tiveram muita coisa na vida. O que foi mais longe foi um que foi
fazer SENAI, então, conseguiu deslanchar. Bem, quando eu estava nessa
Admissão os amigos meus me levaram para a Congregação Mariana de Menores,
que tinha ali na Igreja São José do Belém. A gente frequentava ali. Tinha as
reuniões normais, mas também tinha um esquema de jogos, pingue-pongue. E, na
época, ali nessa região, principalmente no Belém, vários jovens passaram a ir
para o Seminário, adolescentes. Um padre italiano, que era colaborador lá da
paróquia, o adjutor, ele levou num dia toda a meninada para conhecer o Seminário
de São Roque. E era uma maravilha o Seminário. Bem, para entrar naquela
escola você precisava querer ser padre. Eu, para mim, tanto fazia, né? "Vamos
entrar no Seminário”. E foi, eu fui para o Seminário. Eu fiquei lá em São Roque
seis anos. Onde eu fiz a parte referente ao ginásio e colegial. E fiquei um ano no
Central do Ipiranga, que é onde eu fiz curso de Filosofia. Comecei curso de
Filosofia. Que fez eu me diferenciar em relação ao pessoal. Porque eu tive uma
oportunidade de educação mais aprimorada. Mas eu fui mesmo: “Olha, tudo bem,
vamos ser padre”. A minha mãe dizia: “Olha, toda profissão é boa. Lixeiro,
mecânico, padre, o que quer”. Minha mãe não tinha muito a ver com religião.
Quando eu fui para o Seminário ela passou a frequentar bastante a igreja. Agora,
não tinha nenhuma motivação da família para ir para lá. Mas foi uma decisão que
eu tomei. Foi muito bom para mim. Mas foi uma decisão muito apressada. Porque
com doze anos você já dirigir toda a tua vida é uma coisa complicada.
P/2 – E de lá para, qual foi a trajetória a partir dali? Porque você chegou a fazer
um curso superior. A fazer uma opção.
R – Eu comecei depois. Bem, quando eu saí o que eu queria mesmo era dançar.
[risos] Porque aquela vida reclusa tinha coisa boa. Tinha futebol, vôlei, piscina,
estudo, tinha muita coisa interessante. Foram bons anos os anos lá do Seminário
de São Roque. Ora, quando eu saí, bem: “Eu não tenho mais nada a ver com
isso”. O problema era ver como fazer. E aí não tinha muita orientação para onde ir.
Primeiro precisava ter uma fonte de renda. Então eu comecei a trabalhar como
bancário em um banco chamado Banco de São Paulo que foi uma experiência
boa. E aí fiz um cursinho para Engenharia, mas percebi que a base que eu tinha
era muito ruim. Fiz, inclusive, com alguns amigos lá do próprio bairro: “Não,
vamos, tal”. Então eu fui. Mas não tinha base para Engenharia. Não queria fazer
Direito. Os outros amigos que tinham saído foram fazer Direito. Fiz um curso de
Administração Racional do Trabalho, no IDORT [Instituto de Organização Racional
do Trabalho], para ver como que se podia trabalhar em uma empresa. Aí descobri
que tinha faculdade de Administração. Fui atrás da FGV [Fundação Getúlio Vargas]. Era muito cara. Não tinha dinheiro para pagar a mensalidade. O que eu ganhava como bancário não era bom. Aí me falaram: “Olha, tem a Faculdade de Economia da USP.” Aí fui para Economia. Fiz o vestibular, passei. Passei bem. Se não me engano fui o quarto colocado no vestibular. Bem, e começou uma outra trajetória. Aí estudei Economia.
P/2 – Que ano você fez Economia?
R – Ahn?
P/2 – Só para situar, que ano...
R – Que ano que eu comecei lá? 1959.
P/1 – 1959.
P/2 – Você trabalhava nos bancários nessa época?
R – Eu trabalhava. Eu era bancário do Banco de São Paulo. E fui fazer Economia
à noite, porque o banco era à tarde. Na época se trabalhava seis horas, mas era
do meio-dia às seis. Então saía e ia para a faculdade. Começava às sete e ia até
de noite. Bem, na Economia, lá pelo meio do ano, começou um buchicho de que:
“Olha, vai ter concurso no Banco do Brasil, vamos prestar concurso”. Eu disse:
“Olha, Banco do Brasil? Eu quero ser economista, bancário já sou”. “Não, mas
Banco do Brasil paga muito bem.” Eu disse: “Olha, se paga mais pode ser uma
boa coisa”. Mas não tinha essa. Eu faço esse depoimento para se ver como o
pessoal das vilas operárias não tinham noção do que era o Banco do Brasil. Para
outra classe social já era um negócio diferenciado. Pagava bem e tal. Então fiz o
concurso e fui para o Banco do Brasil. Nem todos que me incentivaram a fazer o
concurso passaram. Então aí comecei a trabalhar no Banco do Brasil. E um belo
dia eu mudei o meu horário na faculdade da noite para o dia. Porque eu estava
firme na política universitária, não dava para estudar à noite. Então passei a
trabalhar no banco de manhã. No Banco do Brasil se entrava à uma, saía às sete,
então dava para conciliar as coisas. É a outra trajetória.
P/2 – Você falou política universitária por quê? Você teve algum contato na
universidade com algum movimento nessa época?
R – Logo de cara, no primeiro ano, quando houve a renovação do Centro
Acadêmico, me convidaram para fazer parte da chapa. Se não me engano, foi
chapa única. Não, tinham duas. Então eu comecei já no segundo ano. Tinha lá um
“carguinho” no Centro Acadêmico. Mas, na época, um movimento forte na
universidade era a JUC [Juventude Universitária Católica]. E o pessoal que era da
JUC, na economia só tinha um, que chamava Pedro Calil. E ele queria ampliar o
grupo dele, porque não podia fazer equipe, a JUC tinha equipe. Então vivia dando
em cima de mim: “Olha, vamos participar, vamos não sei o quê.” Até que quando a
gente conseguiu um grupinho maior eu comecei a participar. E aí a JUC foi uma
coisa importante no movimento estudantil. Eu fui da equipe regional da JUC que
fazia a coordenação do movimento estudantil universitário em todo o estado de
São Paulo. Os economistas não tinham vez no Brasil. Os economistas começaram
a aparecer na década de 1960. Um grande ícone nosso era o Celso Furtado.
“Olha, dá para você consertar o Brasil. Vamos planejar. Tem isso, tem aquilo.”
Bem, e dentro da JUC teve um Congresso do qual eu participei em 1960,
chamado Congresso dos 10 Anos. Eram 10 anos de JUC, onde pontificou uma
turma da Universidade de Minas Gerais, e eles passaram a ser grandes líderes
nossos. Um era o Betinho [Herbert José de Souza], que era sociólogo. A faculdade
lá era de Economia e Sociologia. O Betinho, o Aldo Arantes. O Aldo Arantes fazia
Direito no Rio [de Janeiro], mas estava nesse grupo. Tinha o Paulo Haddad que
era economista. Ele foi ministro comigo também. É um cara especialista em
economia regional. Bem, tinha um grupo. A ideia dos 10 anos era discutir a
realidade brasileira. Foi uma coisa que envolveu muito e levou todo esse pessoal
que militava na JUC à uma posição política. Que depois vai desembocar nas
chamadas Reformas de Base. Então essa fase é uma fase muito rica. Essas
transformações, embora por um ano na vida estudantil, é uma geração. Porque
passa logo o nosso tempo de universidade. Mas o pessoal que foi para o
Congresso dos 10 anos, quando voltou disse: “Nós precisamos aqui fortalecer a
nossa base de economistas”. Porque havia uma certa rivalidade nesse grupo, que
era o pessoal da [Faculdade de] Medicina e [Faculdade de] Engenharia. “Nós não
entendemos muito o quê aqueles mineiros falam, mas eles estão falando coisas
no caminho. Nós precisamos pensar essas coisas aqui.” Aí procuraram muito o
Calil e a mim para sermos os fundamentadores de uma série de discussões e
documentos sobre o Brasil, os gargalos de desenvolvimento do Brasil. Daí que
cresceu o chamado movimento político dentro da JUC. A partir daí nós
começamos a disputar eleições também na UEE [União Estadual do Estudantes],
no DCE [Diretório Central dos Estudantes], essas coisas todas. E nós éramos
maioria. Nunca o interior tinha tido vez. No interior o pessoal dizia: “O que vale é
São Francisco [Faculdade de Direito do Largo São Francisco] e Poli [Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo]. [Universidade Presbiteriana]
Mackenzie é reação. Tinha um pouco as meninas lá do [Colégio] São Bento.” O
pessoal do interior não valia muito. Aí nós começamos. Porque nos congressos da
JUC a gente apresentava documentos sobre a situação brasileira, análise de
conjuntura. E o pessoal ia se engajando, era um momento muito rico na política
nacional. Os estudantes estavam tomando a frente da movimentação. Era uma
geração que tinha de fazer alguma coisa. Eu me lembro, por exemplo, quando
houve a renúncia do Jânio [Quadros], houve um movimento sério de, bem, "Como
fazer? Foi dado um golpe. Como que a gente refaz a democracia?”. Então as
reuniões que a gente fazia, todas escondidas, pensando em como tomar posições.
Eu me lembro de uma dessas reuniões que o Plínio de Arruda Sampaio que tinha
sido de JUC, foi chamado para falar. E ele disse que em "1900 e antigamente”,
devia ser 1955, o Padre Lebret disse para a geração dele: “Vocês têm cinco anos
para estarem preparados para tomar o poder no Brasil”. E era 1961, tínhamos
perdido. Então fiquei com aquela coisa na cabeça. Bem, houve a solução de
conciliação no caso do Jânio, mas o movimento estudantil estava cada vez mais
forte. O Jango [João Goulart] com as posições, “uma no cravo, uma na ferradura”,
que ele tinha. Mas que permitia grandes discussões. Pelo nosso lado, nós
começamos a perceber que: “Olha, a política não é uma coisa confessional. Então
nós temos que ter um partido”. Foi daí que surgiu a chamada Ação Popular, um
agrupamento que nasceu desses militantes. Uma parte grande eram os que
tinham participado e participavam ainda da JUC. Outros eram pessoas que não
aceitavam tranquilamente as coisas do Partido Comunista e eram de esquerda.
Então a Ação Popular foi essa experiência que estava começando a se afirmar
mas acabou tendo de enfrentar a ditadura dos militares. Aí ela passou por
transformações. Uma parte praticamente saiu. Porque quando ela chamou-se
Ação Popular Marxista Leninista foi um divisor de águas e uma parte foi para o
PCdoB [Partido Comunista do Brasil]. Foram transformações. Mas aí eu já tinha
saído da faculdade. Então a questão importante foi essa militância. O José Serra
era um jovem da Politécnica, ele conta isso no livro que ele fez quando saiu para
ser presidente. No ano que ele assumiu na UEE a vez era minha. Só que eu,
quando foi feito o conchavo das lideranças, eu disse: “Olha, vocês estão loucos.
Eu trabalho, minha mãe é viúva, vocês querem que eu largue o Banco do Brasil?
Não vai dar para ficar trabalhando e sendo presidente da UEE. Então vamos
escolher. Vocês escolhem outro aí que eu vou continuar trabalhando no
movimento estudantil mas não preciso de cargo para isso”.
Aí surgiu, o pessoal da Poli e apresentou o José Serra que era desconhecido. Nós
ganhamos. Depois eu fiz a campanha dele para presidente da UNE. Então teve
uma transformação. Mas esse movimento todo ele foi derrotado no golpe militar.
Durante o tempo da faculdade, eu tinha me especializado em crédito rural. No
Banco do Brasil eu trabalhava na Carteira de Crédito Agrícola Industrial. Então era
um negócio mais interessante do serviço bancário. Mas a ideia era: “Olha, nós
precisamos de alguém na área de crédito industrial para SUPRA”, que era
Superintendência de Reforma Agrária. Então eu estava precisando me formar para
poder ser contratado pela SUPRA. Só que a minha formatura foi marcada para o
dia primeiro de abril de 1964. Tinha um carro de combate na frente da faculdade.
Não houve e também eu não fui procurar a SUPRA, porque o presidente foi preso
naquele movimento. Depois houve o INCRA [Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária], mas já dentro de um outro contexto. Não em um contexto de
reforma agrária como a gente pensava.
P/1 – Está ótima. Deixa eu voltar só um pouquinho. Pegar um pedacinho do
movimento estudantil, uma coisa que passou batida mas é uma curiosidade aqui
da gente. Por que Economia?
R – Por que Economia? A faculdade era Ciências Econômicas e Administrativas.
Eu fui procurar Administração de Empresas na FGV. Porque eu achava: “Olha,
como não vai dar para ser engenheiro, uma coisa próxima”. Eu não queria
Medicina, não queria Direito. Administração de Empresas era uma coisa charmosa
que estava surgindo. "Então eu vou fazer Administração de Empresas”. Só que
entrei na Faculdade de Economia e Administração. Fiz um bom curso de
Administração, de Introdução à Administração, outro de Introdução à Economia,
que eram matérias do primeiro ano. Mas logo em seguida veio essa visão política
pela JUC. Da chamada "realidade brasileira". Você se dedicar a estudar o Brasil e
saídas para os problemas do Brasil. Tinha de ser Economia. Quando eu entrei o
título que eu receberia seria de Ciências Econômicas e Administrativas. Teria os
dois. Só que quando eu passei para o terceiro ano houve uma reforma do
currículo e passou a ter dois anos básicos, dois anos de Economia, dois anos de
Administração. E eu já fui para Economia, não era mais Administração o que eu
pensava.
P/1 – Sobre o movimento estudantil. Nessa trajetória do movimento estudantil,
você lembra, porque você começou lá na faculdade, você começou a participar da
JUC, e várias outras atividades. Mas teve alguma atividade que tenha sido
marcante para você? Uma Assembléia, alguma coisa, que você lembre?
R – Teve muitas, né?
P/1 – Uma que...
R – Por exemplo, a greve de um terço. Foi uma greve nacional que a UNE fez
ainda na gestão do Vinícius Caldeira Brant ou era do Aldo Arantes, não sei. A
minha faculdade era uma faculdade conhecida como “de direita”. Mas resolvemos
parar. Foi uma grande dificuldade. Aí, houve um debate na faculdade sobre
reforma universitária. Os debatedores eram o Paulo Singer e o Delfim Neto. Cada
um dizendo do seu lado. O Singer defendendo a reforma e o Delfim dizendo que a
reforma era marxista. Aí eu me levantei e disse: “É marxista coisa nenhuma”. Aí o
Delfim me “sinucou”: “Mas, o que é marxismo?” E era muito para um jovem como
eu dar uma aula ali. O Delfim consegue fazer isso muitas vezes. Isso marcou,
porque eu não tinha elementos para retrucar. Teve muitas coisas marcantes.
P/1 – Você falou greve de um terço. O que quê é?
R – A greve de um terço foi uma greve. Você nunca tinha ouvido falar?
P/1 – Não. Não é terço... [risos]
R – A ideia na reforma universitária é que você devia ter: um terço de alunos, um
terço de professores e um terço de sociedade civil [nos órgãos colegiados]. Então
nós alunos queríamos ter uma representação de um terço. Por isso chamava
Greve de Um Terço. E foi longa a greve. Não dava para continuar a greve
indefinidamente. Mas foi um grande movimento sobre reflexão, sobre
universidade. Foi importante.
P/2 – Eu queria te perguntar, uma coisa que para mim passou meio batido, por
que é que te despertou interesse de participar do movimento estudantil? Por que
você foi chamado pela JUC?
R – Dentro da JUC aquela coisa só religiosa não me interessava muito. Mas
quando entrou a coisa social, política, aí mexeu com coisas que eu gostava.
P/2 – E você teve alguma situação anterior da sua infância, ou mesmo da sua
juventude anterior que tenha te despertado atenção pelos movimentos sociais?
R – Não, não que eu me lembre. A gente tinha o nosso grupinho, mas não era
pensado socialmente. Porque era time de futebol, time disso, daquilo. Não entrava
a questão política. A questão política, inclusive, não era muito cultivada nem na
minha família, porque como minha mãe era estrangeira ela disse: “Não dá para se
meter nisso. Tome cuidado”. Meus primos, meus tios também iam na onda.
Político que na época da eleição era aquele político que se apoiava. Mas não tinha
nada disso. E no Seminário também a questão política não era muito colocada
não. Não tinha grandes disputas. A ideia : “Olha, esse é um terreno...” Não se
discutia muito a questão política. Teve coisas, quando morreu o Getúlio Vargas,
que vou contar o que aconteceu. Quem era aquele Carlos Lacerda. Essas coisas
se falavam lá mas não se fazia proselitismo. Não tinha essa coisa. Quando
começou mesmo esse Congresso de 10 anos, foi um negócio que mudou muito a
igreja brasileira. Mexeu com os outros movimentos: JOC [Juventude Operária
Católica], JAC [Juventude Agrária Católica], JEC [Juventude Estudantil Católica],
mas quem tinha começado tudo era a JUC. E, depois, a coisa foi avançando,
chegou na Teologia da Libertação, essas coisas mais recentes.
P/1 – Enquanto você estava estudando, você já estava no banco?
R – Estava.
P/1 – 1960, 1961 você já estava no banco?
R – Não, eu entrei no banco em 1957.
P/1 – 1957.
R – Eu saí do Seminário, primeira coisa foi arrumar um emprego.
P/1 – Sim.
R – No final do ano comecei a trabalhar. Em 1959 entrei no Banco do Brasil, fiquei
até 1966 quando eu vim para o Dieese.
P/1 – Porque nessa época de 1959 a 1966 também teve um movimento muito
forte, bancários no movimento sindical. 1961, é, que você falou do movimento
estudantil mas eu estava pensando em termos do movimento sindical.
R – É, os bancários tiveram movimentos fortes em 1952, 1953, 1954 que inclusive
estão na origem do Dieese, com Salvador Romano Losacco, que foi o primeiro
presidente do Dieese. Em 1961 houve uma greve grande, em que eu apareço nas
assembleias sindicais. Eu já era a pessoa que estava cuidando da parte sindical
do movimento, dentro de uma equipe política da JUC. “Não, você está trabalhando
então você vê essa questão de sindicalismo.” Então fui para o meu sindicato que
era o sindicato dos bancários. Os outros também iam para as outras assembleias
sindicais. Houve um movimento grande também em 1961, que foi no Estádio do
Hipódromo, na Mooca. Vários sindicatos que fizeram greve juntos. E a versão dos
que foram até lá era a seguinte: “Monte de pelegos, os trabalhadores queriam
continuar a greve”. E ele brecaram, encaminharam o movimento para a
conciliação. Foi o que passou lá. Na assembleia dos bancários, eu percebi
também um movimento contra a continuidade da nossa greve. E nós não
tínhamos conseguido aquilo que queríamos. Aí, foi feita uma votação em frente ao
prédio Martinelli e ao prédio do Banco do Brasil, no começo da Rua São João. Lá
tinha um andaime e o presidente do sindicato, a tendência dominante era ser do
Partido Comunista, subiu e deu vitória para um lado. Eu estava do outro lado, com
um grupo de pessoas que também eram bancárias e eram da JOC. Houve uma
revolta, quiseram “pegar” ele, alguns chamavam ele de pelego. Muitos querendo
rasgar a carteirinha do sindicato. Alguns diziam: “Nunca mais!” Então a gente
começou a organizar dizendo: “Olha, não é assim, vamos no Última Hora”, que
era o jornal que falava das causas populares. "Vamos lá e colocamos nossa
posição.” Então fomos em grupo. Daquele grupo que tinha perdido a votação, nem
todos foram. A Última Hora ficava ali, praticamente embaixo do Viaduto Santa
Ifigênia, não era muito longe. Se não me engano é onde hoje fica o metrô. Aí,
chamamos lá um redator para contar as coisas. E aí um vereador, acho que se
chamava, tinha nome de passarinho. O apelido dele acho que era Bem-te-vi, um
nome assim... Usava uma gravatinha, começou falar. Eu disse: “Mas esse cara
não tem nada a ver conosco, por que ele está usando o nosso movimento?” Aí,
pela primeira vez eu falei em público. Gaguejei para burro: “Olha, não é nada
disso. O nosso movimento é de bancários. Não é para nenhum aproveitador”. E foi
aí que comecei uma carreira, não continuada, de dirigente sindical. Porque a partir
dali eu comecei a brigar na assembleia dos Bancários. E tem umas glórias.
Porque não foi só essa greve. Essa foi onde aconteceu isso. Mas aí a obrigação
era continuar a fazer sindicalismo nos bancários. Eu era da Agência Luz, onde
tinha um tesoureiro, que é um cargo importante no banco. Em uma agência, na
época, o tesoureiro era importante, ele era do Partido Comunista. Um
“burguesão”, mas comunista. E disse que se eu aparecesse no sindicato ele me
jogava do prédio Martinelli para baixo. Até que entrou um pessoal do "deixa disso”.
Eu fui para o sindicato e não houve nada. Mas a partir daí eu fiz a Comissão de
Banco da Agência da Luz. E a Luz tinha uma coisa importante, tinha um hallzinho
que levava para a ABB [Associação Banco Brasil]. Que funcionava ali na cidade,
não tinha ainda lá na Estrada de Itapecerica. Então, antes de cada assembleia, eu
reunia o pessoal, qual a posição da Luz na assembleia. E eu falava a posição da
Luz na Assembleia. E a nossa glória foi que quando decretou greve, a Luz não
precisou de piquete, porque todo mundo parou. Aí, nós fomos parar o Banco de
Crédito da Amazônia, que não tinha a mesma força que a gente. A nossa era uma
agência, isso em 1963, enquanto o movimento sindical só foi parar, por
consciência, nas fábricas em 1978. Aí começou a parar essa agência, eram 100
pessoas, era mais fácil. Tinha boas condições, muita amizade, a maioria era gente
nova, era uma agência nova. Então, nós fizemos essa proeza, que aqui eu estou
exaltando.
P/1 – Você falou que você tinha começado uma carreira de dirigente sindical que
não continuou? Até quando você ficou assim, no movimento sindical?
R – Não, eu continuei trabalhando na Luz. Eu ia para a SUPRA, mas depois do
golpe, pensei: “O que é que eu vou fazer? Vou ter de procurar um emprego, vou
ver quando surge alguma coisa interessante”. Então eu continuei no Banco do
Brasil. Nós organizamos um “Grupo dos 11” no Banco do Brasil, que era a
resistência do Leonel Brizola nessa agência. Tudo secreto, ouvindo a “Voz da
Legalidade”, tentando ver o que acontecia com o Brizola e o João Goulart, que
estavam no Uruguai, para ver se voltava a democracia no Brasil. Então tinha essa
militância.
Já que eu não percebia onde trabalhar com gosto, fui fazer pós-graduação em Sociologia do Desenvolvimento com o Octavio Ianni, lá na USP da Rua Maria Antonia. No final do primeiro ano, tinha que apresentar uma espécie de monografia, e eu tinha gostado de uma aula que ele havia falado de inflação e salário. Então eu fiz um trabalho chamado: "Inflação e Reivindicações Trabalhistas". Nesse período, eu acho que é importante também, eu e um outro economista da minha turma, que era da agência Ipiranga, nós estudávamos de manhã. Revíamos economia, porque aquilo que a gente tinha aprendido na escola nos pareceu insuficiente. A gente precisava continuar estudando, por isso, nós dois nos reunimos para estudar. E se aprofundar em Economia. E como nós dois éramos do Banco do Brasil, nós guardávamos uns livretos com a lista de preços da Cooperativa dos Funcionários do Banco do Brasil. O nosso raciocínio era: “O Dieese está fechado, mas um dia ele vai voltar. E ele vai precisar recuperar a série de preços. Então pelo menos uma parte da série de preços nós temos aqui”.
Então, todo mês a gente guardava, e a ideia era oferecer para o Dieese. Voltando à parte anterior: fazendo esse negócio eu descobri que o Dieese tinha voltado a existir. Fui procurar dados do Dieese no Sindicato do Gás, que era onde o Dieese estava. Peguei uma série de dados e fiz um trabalho, que o Octávio Ianni gostou muito e publicou na chamada Revista Civilização Brasileira, que era uma revista de esquerda permitida, mas que avançava pelas coisas importantes do Brasil. Ele apresentou o trabalho para o Enio Silveira, e foi publicado na revista. Eu levei este trabalho para a Heloisa Martins [Heloisa Helena de Souza Martins], e disse: “Olha, o Octávio Ianni elogiou e vai publicar na revista. Eu peguei os dados no Dieese e olha o que eu fiz”. Ela disse que estava fazendo uma seleção para economistas. Eu disse: “Então me bota nisso”. E aí eu entrei para o Dieese através desse convite que a Heloisa fez. Mas, em seguida, eu fui pagar uma conta em um banco chamado Nacional do Comércio. Funcionava ali na Rua Boa Vista e no balcão estava o Salvador Tolezano, que foi presidente do Sindicato dos Bancários e morreu de uma morte estranha. Ele foi jogado com uma pedra em uma represa lá de Sorocaba. Ele foi fazer uma palestra lá em plena ditadura e foi assassinado. Hoje, é uma das mortes que mereceriam uma pesquisa maior. É o nome do Conjunto dos Bancários no Mandaqui, Conjunto Salvador Tolezano. Mas o Tolezano disse: “Ô, Barelli, estamos fazendo uma chapa para concorrer no sindicato. Vamos tirar a junta interventora, vamos fazer uma chapa. Dá para a gente ganhar. Você não quer entrar?” Eu disse: “Puxa, você devia ter me falado na semana passada”. Porque eu tinha acabado de dar baixa na minha carteira. Então já não era mais bancário.
P/1 – E você começou a falar do Dieese. Então um pouquinho antes, como é que
você ficou sabendo do Dieese? Qual a ideia que você tinha antes? Como que
você descobriu o Dieese?
R – Olha, o Dieese é de 1955. E a Lenina [Pomeranz], que foi diretora, foi uma
das minhas professoras. Na época eu acho que ela não estava no Dieese. Mas
como eu militava no Sindicato dos Bancários, sempre que tinha campanha salarial
se falava do Dieese. Já tinha a Revista de Estudos Sócio-Econômicos do Dieese,
cujos artigos eu acabei lendo. A gente valorizava o Dieese. Não sabíamos direito o
que era, mas era da área. Tanto que eu e o Aldino, aquele outro economista que
foi do Banco do Brasil, e que junto comigo guardou os preços da cooperativa para
o Dieese, não tínhamos a ideia de trabalhar no Dieese, mas sim de resgatar a
memória. Mas aconteceu de a gente acabar trabalhando no Dieese.
P/1 – E você lembra como que foi o seu ingresso? Você lembra o dia? Do dia que
você entrou como que foi?
R – Olha, eu comecei no Dieese em dezembro de 1965. Só que fui registrado em
novembro de 1966, porque estava indo para uma instituição pequena. Teria uma
redução salarial indo para o Dieese. Saía de um emprego razoável, mas queria
completar o salário através do ensino, o que depois eu consegui. Uma das coisas
boas do Banco do Brasil eram os planos de Previdência. Então eu gostaria de ter
ficado no Banco do Brasil como contribuinte da Previ. Por isso que eu eu passei a
trabalhar apenas um dos trinta dias do mês, por que assim não era considerado
abandono de emprego. Eu trabalhava um dia e faltava nos seguintes, esperando
uma resposta do Banco do Brasil sobre eu continuar nos planos de Previdência do
Banco do Brasil, contribuindo por fora. Só que a resposta veio negativa. Quando
veio negativa dei baixa e fui para o Dieese. Acredito que foi dezembro de 1965.
P/1 – Onde que funcionava o Dieese?
R – Funcionava lá no Sindicato do Gás. Era uma entidade pequenininha, tinha
além das pesquisadoras, acho que eram duas, tinha a Heloísa [Martins], a
Mariana, o Rubens [Ramacciato], uma espécie de tesoureiro-contador, e o
Fernando que era o boy. Aí entrei eu. Inicialmente me deram a tarefa de contar
ofertas de emprego. Depois para fazer análise de balanço. O grande problema
que teve, logo que entrei, é que houve uma assembleia sobre o Fundo de
Garantia. A Heloisa fala um pouco sobre isso no depoimento dela. Ela foi lá e o
pessoal não gostou do que ela falou. Então foi complicado. O Dieese tinha uma
rotina e a gente foi caminhando com ela. Depois, aos poucos, a gente foi também
encontrando novos trabalhos para o Dieese. Escrevi um trabalho, explicando a
política salarial, e o Estadão publicou nos cadernos de anúncios. Na última página
desse caderno eles sempre publicavam artigos grandes. Então eles publicaram
esse meu trabalho com uma notinha: “Não concordamos com tudo o que está aí
mas não deixa de ser uma discussão, mostrando novos rumos que o sindicalismo
está tomando”. Coisa por aí. Foi daí que o Dieese começou a trabalhar a questão
da política salarial que até então não fazia. O movimento sindical queria que o
Dieese fornecesse um atestado, que a Heloisa dava, de quanto tinha subido o
custo de vida. E era bem burocrático: “Atesto que no período de x a y o custo de
vida da classe trabalhadora na cidade de São Paulo subiu 10 por cento e 11,
vírgula 11. 10 inteiros e 11 centésimos. Então o Tribunal usava essa linguagem. Aí
a gente começou a mudar, dizendo: “O trabalhador perdeu tanto, então ele precisa
de tanto”. E foi, não sei como é hoje, mas foi uma época importante porque dava
rumo para todas as campanhas salariais.
P/2 – Eu queria te perguntar como que era o clima de trabalho dentro do Dieese
nesse comecinho? A Heloisa era diretora técnica, como que era assim a relação
com ela? Clima de trabalho mesmo?
R – A relação entre as pessoas no Dieese era tranquila, afinal éramos apenas três
pessoas. Eu me lembro da Heloisa, ela trazia um pão recheado com não sei o
quê, que era o almoço dela. Ela namorava o José de Souza Martins, que era meu
colega de pós-graduação. A Mariana trazia uns quibes gostosos que a mãe dela
fazia. Lembro das coisas pela culinária. O relacionamento era bom. Não tinha
grandes discussões. A Heloisa falava muito do Aziz Simão e do Albertino [José
Albertino Rodrigues]. falava o que eles faziam e outras coisas. E eu não conhecia
nem um, nem outro. Uma das coisas que começou a diferir é que eu entendia
como o dirigente sindical agia. Sabia mais ou menos como ele se posicionava.
Então, eu tinha mais facilidade de diálogo do que a Heloisa, por ela ser a diretora.
A Mariana fazia levantamento em todos os sindicatos, apesar de ser uma grande
socióloga, o trabalho dela não era muito valorizado. Mas quando precisava fazer
um balanço era ela que apresentava todos os dados. Era bom. Para mim, a
impressão era boa. Mas ainda não era uma equipe, em que as pessoas possuíam
uma prática comum. Isso estava se formando. A Heloisa e a Mariana sim, pois,
vinham juntas, indicadas pelo Aziz Simão. Lembro que elas, principalmente
Heloisa, queriam discutir economia comigo e eu tinha lá os meus palpites. Mas, a
Heloisa ficou pouco tempo, ela foi convidada para ser professora na Ciências
Sociais [da Universidade de São Paulo]. Logo em seguida a Mariana também saiu.
O fato de eu ter sido escolhido diretor técnico e ser mais novo no Dieese do que
ela, pode ter sido a causa dela sair. Mas ela nunca verbalizou isso. Aí fomos
contratando outros tipos de pessoas, que vieram.
P/1 – Como foi a escolha?
R – Olha, quem trouxe a Annez Andraus [Annez Andraus Troyano] foi a Heloisa.
Lembro que ela disse: “Tem lá uma menina do Centro Acadêmico da Ciências
Sociais que vamos trazer para o Dieese, nós estamos precisando de alguém”. Aí
veio a Annez. Em seguida, veio a Cecília Comegno [Maria Cecília Comegno], que
hoje está no SEADE [Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados]. Ela era
historiadora e socióloga e amiga da Annez. No início, os amigos foram trazendo os
amigos. A Cecília assumiu uma parte do trabalho que eu fazia, o
acompanhamento de ofertas de emprego. Em seguida, foi contratado um outro
estudante de Economia, o Antonio, porque os trabalhos estavam começando a
crescer. Nós estávamos começando a pesquisa de 1969, 1970. O Albertino tinha
voltado e a Annez trabalhava como assessora dele, e o Antonio era uma espécie
de factótum, “segurando a peteca” quando ela não estava. E aí tem um fato
interessante: um dos desaparecidos, parece que se chamava Montenegro, foi
levado lá para identificar as pessoas. Ele era pesquisador da pesquisa de 1969.
Identificar as pessoas que tinham trabalhado com ele, coisas desse tipo. E
chegaram lá perguntando: “Mas quem responde pelas coisas aqui?” O Antonio:
“Sou eu.”. Ele disse: “Não, eu sou então do Dops, eu quero isso, isso, isso, isso”.
O cara gelou. Mas isso é história que o Mauricio deve ter repetido nos
depoimentos dele. Ele lembra bem. E o Antonio era muito amigo do Mauricio.
Mais tarde, vieram dois economistas através do Sato [Ademar Sato]. Hoje o Sato é
um monge lá em Brasília, um monge taoísta. O Sato começou a trabalhar no
Dieese dando curso no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. E aí ele disse:
“Tenho dois alunos bons”, ele era professor na Economia da USP, "que a gente
precisa colocar no Dieese”. Então, “nos apertamos um pouco” e entrou o Mauricio
[José Maurício Soares] e o César Conconne. Esses foram os que entraram nesse
período de formação de uma nova equipe, vamos dizer. Logo depois, o Antonio
saiu porque casou com uma professora em Bauru e mudou-se para lá. Os outros
continuaram e foram praticamente a base do Dieese até 1990.
(FIM DO CD 01)
P/1 – Então, duas questões. Uma primeira, quando você assume o Dieese que
tipo de mudanças que foram incorporadas de uma fase, logo que você assumiu,
né? E a relação com os dirigentes sindicais, como que passou a ser essa relação
do Dieese com os dirigentes sindicais?
R – Para fazer política e, principalmente, fazer nucleação, a gente precisa
descobrir o que motiva as pessoas. No movimento universitário, normalmente, era
o restaurante. Se tinha comida estragada ou coisas desse tipo. Aí dá para você
fazer uma bela greve. A mesma coisa acontecia no movimento sindical. Apesar de
tudo ser proibido, os sindicatos conseguiam unir trabalhadores sempre que
pensavam nos problemas concretos que eles tinham. E isso vinha do trabalho de
ação católica, que a gente sabia como ir no ponto e organizar uma atividade a
partir do ponto. E era por aí que tinha que acontecer também no movimento
sindical. Tinha uma pessoa que acompanhou muito o nosso trabalho, eu sempre o
chamei de “meu professor” O neto dele está no Dieese hoje. Trata-se do Miguel
Huertas. Ele era um dirigente sindical diferenciado. Acreditava no Dieese e dava
dicas para a gente: “Olha, nós vamos precisar disso... O problema é esse, é aqui
que é a nossa ação... É assim que se faz...”. E mostrava exatamente esses
“pontos”. A forma de trabalhar foi sempre descobrir onde o “calo doía”. Para mim,
era mais fácil por causa das assembléias sindicais que eu tinha participado. O
Miguel mantinha cursos no Sindicato dos Metalúrgicos e eu era um dos
professores, a Annez era outra e o Sato também. Lá, a gente percebia como devia
transmitir em uma época em que não se podia abrir a boca, afinal era ditadura
militar e havia a possibilidade de ser preso a qualquer momento. "Como andar
nessa corda bamba?" A nossa discussão era por aí. A Annez tinha uma militância
política forte, diferente da Heloisa e da Mariana que não tiveram essa experiência.
A Annez vinha da Polop [Organização Revolucionária Marxista Política Operária],
um grupo forte na [Faculdade de] Filosofia [da Universidade de São Paulo]. Ela
sabia distinguir as coisas. A mesma coisa acontecia comigo, depois de toda a
história que eu contei para vocês. Eu acho que isso facilitou. E facilitou também
porque o César além de ser estudante de Economia, era químico e já tinha
trabalhado muito dentro de empresa. Ele tinha uma outra visão e entendia os
problemas de um ambiente de trabalho. O Mauricio trazia uma outra vantagem,
por ter participado em movimento de alfabetização popular, ele aprendeu como
falar com o trabalhador. Então éramos um grupo que, precisávamos estar unidos
porque estávamos no mesmo barco, se caísse um iriam cair todos. Por exemplo, o
Sato, deu um curso e distribuiu uma apostila. Na apostila ele fez uma pirâmide
social em que desaparecia a classe média e passava a ter apenas patrões e
operários. Apesar de todos os cuidados, a apostila foi cair na mão do DOPS
[Departamento de Ordem Política e Social] que veio prender quem tinha dado o
curso. A sorte foi que o Joaquinzão [Joaquim dos Santos Andrade] , disse: “Não, o
curso quem deu fui eu”. Eles ainda falaram: “Não, mas tinha essa apostila”. "Mas
quem dá os cursos aqui sou eu.” Ele discutia com o pessoal, pois tinha as "costas
mais quentes". Isso acabou salvando o Sato, mas indicando para nós uma das
coisas que o Miguel Huerta dizia: “Falar, você pode falar tudo. Escrever, você não
pode escrever nada”. Por exemplo, você ia dar um curso sobre “mais-valia", você
ensinava o que era mais-valia, mas não escrevia. Porque isso poderia ser visto
como doutrinação. Isso tudo era uma formação constante. Você levava uma
cabeçada aqui, outra ali. Outra coisa que eu trouxe da JUC era a questão das
reuniões. A gente se reunia, trocava ideia s, fazia a avaliação das coisas: “Olha,
está certo assim. Para onde a gente vai, para onde não vai”. O trabalho em equipe
foi uma marca importante, aproximava todo mundo. Não tinha ali quem era menor
ou maior que o outro. Era o grupo. E isso foi uma coisa que funcionou durante
muito tempo no Dieese. E foi responsável pela construção da espinha dorsal do
Dieese. Havia uma ideia que era: "Quem faz política é o dirigente sindical, a gente faz o que o sócio quer". Mas nós sabíamos que estávamos fazendo política, e como o termo deveria ser falado em cada momento. Por exemplo, a esquerda
tinha muito os seus chavões. A gente fugia dos chavões. Eu falei aqui: “mais-
valia". Mas só falava em “mais-valia" se alguém levantasse no grupo. E se
militantes de organizações de esquerda, falassem o que era “mais-valia", a gente
dizia: “Isso que eu estou chamando de lucro é o que você está chamando de
‘mais-valia". Porque, lucro era light. Então a gente podia passar os conceitos
importantes sem fazer de uma maneira que colocasse em risco o aluno e o
departamento também. Foi assim que a coisa se deu.
P/1 – Quando você assumiu a direção técnica, em 1968, aconteceu o MIA [Movimento Intersindical Antiarrocho].
R – Sim.
P/1 – Como é que foi o papel do Dieese nesse processo?
R – Olha, o Dieese teve um pouco de influência porque ele estava começando a
mostrar as perdas que os trabalhadores tinham. E todas as categorias tinham as
perdas. Agora, o MIA] foi uma pausa na transição brasileira. Foi importante o cara que era presidente dos Bancários na época. Foi o que começou. Depois quem ficou responsável foi o Joaquinzão, mas o movimento foi congregando as pessoas porque estava na hora de mudar aquela política salarial. Ter um outro tipo de comportamento. Mas ao mesmo tempo estavam surgindo as reações dentro das fábricas, alguns movimentos, muita gente foi presa. Só nos arquivos do DOPS a gente vai poder reconstituir essa história.
Mas, por exemplo, estava surgindo o Zé Ibrahim [José Ibrahim], no Sindicato [dos
Metalúrgicos] de Osasco. Eu esqueço o nome do cara dos Bancários. Os
funcionários dos Bancários eram da chamada Oposição Bancária. Ou seja, contra
a direção. A direção era do Partidão [Partido Comunista Brasileiro], em geral, uma
das correntes do Partidão. Mas com todo o jeitão de trabalho sindical, sem se
expor demais, buscando uma posição de começar a mudança. Aí se organiza o
Primeiro de Maio na Praça da Sé, em frente ao Fórum João Mendes Junior. O
Sodré [Abreu Sodré] era governador e queria "aparecer". E o movimento sindical,
naquela ideia de conciliação de classes: “Não, é bom que ele vá, por que dá
respaldo para o que a gente vai fazer.” Foi feito lá um palanque, uma
concentração, para comemorar o Primeiro de Maio. Lá pelas tantas, começam a
agredir o pessoal do palanque. Jogar pedras, paus. Foi uma radicalização da
oposição sindical, os grupos que estavam ali e a Bancária e o grupo do Ibrahim,
que foram os que mais apareceram. E com situações engraçadíssimas. Tinha
surgido um dirigente sindical novo, que era um médico, puxa vida, ele era do tal do
Senalba [Sindicato dos Empregados em Entidades Culturais, Recreativas, de
Assistência Social, de Orientação Profissional]. .
[risos]
P/1 – Continuação depoimento Walter Barelli.
R – Esse médico, tem um filho que foi vereador do PT em Santos. Tinha
descoberto o sindicato e era o cara que estava dentro do MIA propondo: “Vamos
agora reconstruir o movimento sindical”. Mas os filhos dele estavam xingando e
jogando pedra nele porque ele estava no palanque no Primeiro de Maio. Quer
dizer, havia um grupo de dirigentes achando, podia-se fazer uma transição ou
coisas desse tipo. E um outro grupo que dizia: “Não, precisamos radicalizar”.
Depois do Primeiro de Maio o pessoal [do primeiro grupo] sai do palanque, vai
para o Sindicato dos Metalúrgicos, continuar a fala de alguns. O grupo com o
Ibrahim, o pessoal da Oposição Sindical Bancária, saem pela Rua Direita, vão até
o Citibank, vão quebrando vidros, coisas de banco. O Vandré [Geraldo Vandré],
que tinha ganho o Festival com a música "Para não Dizer que não Falei das
Flores" [e que era crítico ao poder], vai à tarde hipotecar solidariedade ao
governador. Mas, isso é uma outra história. No Primeiro de Maio anterior, repeti
uma palestra em que mostrava as diferenças entre o Brasil como colônia de
exploração versus uma colônia de povoamento, como foi os Estados Unidos. O
velho esquema do Celso Furtado. E a partir dali, dava para o pessoal entender o
que estava acontecendo com as fábricas, como foi a vinda da indústria
automobilística para o Brasil. Era uma história econômica, de preparação para a
política. Eu já tinha feito isso em ambientes de Congresso de Metalúrgicos. Em um
ano que não ia ter comemoração, o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo me
convidou para fazer essa palestra para o Primeiro de Maio. Não falei do Primeiro
de Maio em si, mas da formação econômica do Brasil, da formação do
proletariado, essas coisas. Sempre com muito cuidado. Nada disso foi motivo de
intervenção em sindicato. Acho que o movimento sindical estava meio morto, e
uma pessoa do Dieese vai lá e faz uma palestra, acho que o governo não ficou
preocupado. A principal comemoração sempre era no Sindicato dos Metalúrgicos.
E a principal foi essa que eu fui o protagonista. Na hora eu não percebi nada
disso. Eu estou falando agora, contando a história, mas eu não tinha consciência
da coisa. É importante para as memórias.
P/2 – Posso fazer uma pergunta? A gente tem conversado com muita gente do
Dieese, especialmente gente mais recente. E o que as pessoas falam é que o
Dieese teve uma visibilidade muito grande, depois da denúncia de manipulação do
índice em 1977, né?
R – Isso foi em 1976, né, o índice foi em 1973.
P/2 – E como era o reconhecimento do Dieese antes disso, dessa época, o
reconhecimento social?
R – Olha, pela esquerda ele era bem visto. Algumas vezes: “Quem é aquele cara
lá? Será que ele é da CIA?”. Tinha essas possibilidades. No ambiente universitário
era tranquilo também. Entre os trabalhadores era crescente porque aprendemos a
falar a linguagem que ia bem nas assembleias. Na imprensa sindical ele tinha
espaço, sempre. E tinha também a imprensa sindical dos "jornalões". A coluna
sindical da Folha [Folha de São Paulo], do Última Hora e do Estado [O Estado de
São Paulo]. O Estado, um pouco menos. Mas, o Estado sempre publicava o nosso
índice de custo de vida. O Dieese tinha respeitabilidade porque as empresas
precisavam de parâmetros, então, ou elas faziam o seu próprio índice de custo de
vida, ou usavam o índice de quem fazia, que era o movimento sindical. As
empresas vinham comprar aqui, vendíamos o índice numa folhinha de papel por
algo equivalente a dez reais. Isso era uma coisa importante. Sobre a questão da
manipulação dos índices de inflação ocorreu o seguinte: o Banco Mundial publicou
algumas tabelas dizendo: “Olha, para 1973 não usamos os dados oficiais mas
uma estimativa que é a mais correta, e esses dados oficiais eram muito próximos
do que o Dieese tinha publicado no ano, aí foi a glória, né? O Herbert Levy, que foi
um político paulista de direita da UDN [União Democrática Nacional], depois da
Arena [Aliança Renovadora Nacional], fundador da Gazeta Mercantil, fez um
discurso na Câmara, dizendo o seguinte: “Então, aquele tal de Dieese estava
certo?” Eu nunca tinha convivido com ele, mas depois disso ele sempre me tratava
muito bem, porque é "aquele tal de Dieese" que tinha mostrado a verdade. E os
militares é que estavam errados. E ele tinha uma "gana" com o Delfim Neto
[Antonio Delfim Neto]. Porque quem manipulou os índices foi o Delfim Neto ou a
turma do Delfim, não foi ele que fez. Bem, aí houve algumas coisas importantes.
Estávamos no Governo Geisel [Ernesto Geisel] e o Mário Henrique Simonsen era
o ministro que tinha apresentado para o Geisel um documento em que dizia:
“Olha, teve problemas no índice de 1973, nós podemos fazer isso, ou isso, ou
isso.”, três hipóteses. E aí começou aquela briga. O movimento sindical, mais uma
vez dividido. O primeiro que viu o negócio, falou: “Então se o índice estava errado,
nosso salário está errado”. Foi o presidente do Sindicato dos Bancários da época
e em seguida o Lula [Luiz Inácio Lula da Silva], não sei se foi no mesmo dia,
apresentou a sua opinião no seu jornalzinho. Todos os sindicatos começaram a
pedir trabalhos para o Dieese. Nós fizemos aqui uma linha de produção. Porque o
cara do Amazonas queria saber: “Quanto eu perdi?” O cara do Rio Grande do Sul,
também. Foi um trabalho grande. E o Governo Federal tentou calar o movimento
sindical de uma forma mais nobre, buscando um diálogo. Então chamou uma
reunião em um prédio da Av. Faria Lima, em que vieram o José Paulo dos Reis
Velloso e o Mário Henrique Simonsen. Lá, a gente discutiu "o que era, como era,
como não era". Mas acabou não dando em nada. Mas ficou aquilo presente e
quando estouraram as greves em 1978, tinha lá essa perda, que era uma das
perdas, mas não foi a única. Os trabalhadores foram perdendo continuamente, em
termos de política salarial. Enquanto durou a política salarial, praticamente,
sempre houve perdas. Eu falei que o movimento estava dividido. Porque o
Joaquinzão, abriu um processo na Justiça Federal reivindicando as perdas. E o
Lula, que estava surgindo como líder sindical autêntico, disse: “Não, nós não
vamos entrar com processo, nós vamos recuperar isso ao longo do tempo. Nós
vamos recuperar os 34,1% que era para o Sindicato dos Metalúrgicos de São
Bernardo nas nossas campanhas salariais”. Só que ele esqueceu. Ele é
presidente, se ele quiser eu lembro que ele falou que ia recuperar. Agora ele tem
mais facilidade. Mas foi essa briga. O processo do Joaquim foi para a frente. Foi
feito uma perícia, nós tivemos uma sorte danada de descobrir nos porões do IBGE
[Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] as fichas onde o IBGE tinha fajutado
os números. Foi um trabalho franciscano. Não, franciscano não, beneditino.
Porque em cima. Eu fui o auxiliar do perito. Mas quem acabou fazendo a coisa
para ele fui eu. A juíza deu vitória para o Sindicato dos Metalúrgicos. Mas quando
o Governo Federal é perdedor via ofício, se apela para o tribunal acima. E aí eu
perdi o contato com esse tipo de coisa. Ninguém teve, ninguém mais foi atrás.
Mas foi um negócio importante, primeiro, porque era confessado. Para nossa
vergonha. Porque foi um documento internacional dizendo: “Olha, as estatísticas
de vocês não prestam. Só aquele tal de Dieese que está certo.” Segundo o
Herbert Levy. E aí foi um período importante de crescimento do movimento
sindical. As primeiras greves em 1978. O novo movimento grevista. A expansão do
Dieese também se deu em cima disso. Os vários escritórios. Porque o pessoal
precisava de dado de imediato. Tinha de ligar para São Paulo, era interurbano,
não tinha fax. Essas coisas todas, né? E a gente tinha de mandar. Então foram
sendo multiplicados os escritórios do Dieese, o que foi bom. Deu unidade ao
movimento sindical, através das lutas comuns. Bem, e aí teve a CONCLAT, que foi
o Primeiro Congresso das Classes Trabalhadoras. A importância maior foi do Hugo Perez que desafiou o Geisel em uma entrevista: “Olha, se os empresários podem fazer Congresso, por que é que nós não podemos?” E aí foi autorizado fazer. E foi um grande Congresso, terminou em conciliação e que depois deu as 20 centrais, ou 16 centrais que estão tendo aí. A ideia era ter uma só, mas fortaleceu. Depois dentro de tudo isso também saiu a questão do Partido dos Trabalhadores. Se vocês forem na origem, a origem está no Congresso dos Metalúrgicos, não do ABC, no Congresso dos Metalúrgicos da Federação dos Metalúrgicos. Com o Jacó Bittar sendo afastado: “Olha, nós estamos lutando pelo Partido dos Trabalhadores, mas isso é um Congresso dos Metalúrgicos”. Coisas da história do movimento sindical.
P/1 – Só uma coisinha, Barelli. Teve um período que o Dieese sofreu uma certa
pressão do governo, não é? Os sindicatos, aliás, foram pressionados a não se
filiarem ao Dieese.
R – Foi.
P/1 – Foi nesse processo?
R – Tem de pegar o chamado ministro Barata. Ele, deve ter sido ministro em 1968,
1969, mais para trás. E o Barata chamou todos os delegados regionais e disse:
“Olha, se aparecer na prestação de contas do sindicato contribuição para esse tal
de Dieese, vocês intervêm no sindicato”. Era antes da Constituição de 1988, o
Ministério intervinha. Como que o Dieese se safou? Primeiro, o delegado regional
de São Paulo, que era um procurador, era um cara pró-governo e tal, mas ele
tinha aprendido a lidar com o movimento sindical de São Paulo. E disse: “Olha, eu
não tenho condição de fazer isso”. Ele ignorou a coisa. Porque se ele fizesse, o
Joaquim era capaz de derrubá-lo. Porque nesse momento São Bernardo vai se
fortalecer, lá em 1977, 1978. O grande Sindicato era Metalúrgicos de São Paulo. O
Joaquim tinha chamado um general, que tinha sido delegado regional do Trabalho,
de general de pijama. E passava. Na boca dele essas coisas eram o que a
ditadura deixava passar. E esse delegado ficou durante muito tempo sendo
delegado do Trabalho. Como eu não tinha ligação com a parte de Delegacia do
Trabalho, não guardo os nomes. Ele não fez essa ameaça para o sindicato de São
Paulo. O delegado do Trabalho de Minas fez. E nós tínhamos alguns sindicatos
fortes em Minas Gerais. Aí o que foi feito? Existia como sócio do Dieese, uma
estrutura que tinha sido criada dentro da CNTI [Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Indústria], chamada Departamento Profissional dos
Metalúrgicos. Hoje seria a Confederação Nacional dos Metalúrgicos, que agora
tem uma de cada lado. Pelo menos duas Centrais tem. Mas o órgão, o
Departamento Profissional, era composto das federações e dos sindicatos
importantes de Metalúrgicos. Que era São Paulo, Rio, Salvador, Recife e Porto
Alegre. E as federações que tinham era São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de
Janeiro e Minas Gerais. Eles eram comandos dos Metalúrgicos dentro da estrutura
sindical. E, nesse momento, quem era o responsável pelo Departamento
Profissional, era alguém do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. Eu não me
lembro quem, não sei se era o próprio Joaquim. Era alguém. Então o que é que
eles faziam? Em vez de pagar o Dieese, eles pagavam para o Departamento
Profissional e o Departamento Profissional passava os dinheiros para o Dieese.
Então deu para viver apesar das ameaças, da forma que foi tomada. Nós
sobrevivemos. Mas sempre o Dieese sobreviveu aos trancos e barrancos, né?
Receber atrasado, três meses depois, não foi só uma vez. Então teve um
problema sério. E nas assembleias, quem sabe até hoje seja assim, quando se vai
discutir: “Olha, a primeira coisa que o sindicato corta é o Dieese. Onde se viu, sem
ele nós não temos condição.” Mas isso fala o diretor do Dieese. Não fala o cara lá
do sindicato. O tesoureiro diz: “Não, tenho de cortar, não vou cortar o dentista, não
vou cortar o médico, vou cortar o Dieese”. É o que sempre aconteceu. Não sei se
está assim. Parece que melhorou um pouquinho mas não muito.
P/1 - Dessas crises que você viveu, qual foi a pior delas, que você se lembra?
R. Olha, a pior foi em plena ditadura, em 1968. O Dieese não tinha como pagar o
meu salário. Então, em acordo com a Diretoria, reduzi minhas horas para trabalhar
meio período, que eram quatro horas. Para equilibrar minha situação fui trabalhar
no Metrô. Quase morri. Eram doze horas de trabalho por dia, quatro no Dieese e
oito no Metrô. Mas, "antes de morrer", eu disse: “Não!” Saí do metrô, voltei para o
Dieese e aí havia já a possibilidade de me pagar por oito horas. Esse foi um
momento ruim, pra mim, pessoalmente. Mas também, era um período em que o
movimento sindical era vagaroso, exigia pouco. Então dava para você reduzir as
atividades.
P/1 – Você chegou a falar dos congressos. Conclat, Congresso dos Metalúrgicos,
também teve Congresso de Mulheres nessa época. Em alguns congressos, alguns
documentos aparecem dados do Dieese que eles utilizaram nos documentos, nas
teses. Então qual foi o papel do Dieese, por exemplo, na organização, se teve
esse papel?
R – A Conclat foi um comando que organizou. Mas os congressos anteriores,
muitos deles, foram feitos pela equipe técnica do Dieese, a montagem pelo
menos, junto com a assessoria jurídica dos sindicatos. Eu me lembro do
Congresso dos Eletricitários, que foi dessa maneira. O Congresso dos
Metalúrgicos de São Paulo, também foi dessa maneira. Já o Congresso da
Federação dos Metalúrgicos possuía um jurídico, que tinha lá a sua maneira de
ser. Mas, eles aprenderam também com os Congressos dos Metalúrgicos do ABC
[São Bernardo do Campo e Diadema]. O segundo e o terceiro tiveram muita
participação nossa. No primeiro, também. O Almir, a Annez, o César e eu tivemos
participação. No Congresso das Mulheres teve lá uma participação de alguns
grupos feministas. Mas quem tentava juntar as coisas era a gente do Dieese, para
desgosto da Annez que não gostava de trabalhar com mulher, ou com aquelas
mulheres lá.
P/1 – Então, nesse período, que inclusive aconteceram as greves do ABC e
depois em São Paulo também, teve um episódio, que foi a sua prisão. Como que
foi isso?
R – A minha prisão foi em 1977. 1977, né?
P/1 – Seis de dezembro de 1979.
R – Ahn?
P/1 – Seis de dezembro de 1979.
R – Foi uma coisa interessante. Porque o Figueiredo tinha ido para Florianópolis e
resolveu ir lá em uma Praça maldita, tomar café com o povão. E aí o pessoal
começou xingar. E ele quis "sair no braço" com o pessoal lá. Chegou a repressão
para segurar, aquela coisa. A visita que ele fez logo a seguir foi à São Paulo. E
nesse dia que ele vinha para São Paulo, foram "recolhidas" algumas pessoas. Era
um dia de "calor do cão”, eu estava andando de bicicleta sem camisa na minha
rua. Vem um Fusquinha "fuleiro". Eu olho, faço sinal, achei que era um dos
pedreiros de uma reforma de um vizinho. Aí, eles param na porta da minha casa,
um deles desce e vem falar comigo. Ele disse: “O senhor tem de acompanhar a
gente. Nós somos do DOPS. O senhor está sendo convocado”. Eu disse: “Eu
conheço o Romeu Tuma. Diz para ele que eu vou lá. Vocês não precisam me
levar. Eu tenho que levar meus filhos à escola, deixa eu levar eles para a escola. E
depois eu me apresento. Não tem problema”. Eu fiquei argumentando. Aí, ele
falou: “Olha, ou o senhor vem por bem ou vem por mal”. Eu disse: “Eu vou assim,
sem camisa?” Ele disse: “O senhor pode tomar um banho e se vestir”. O que eles
queriam é que a minha prisão fosse anunciada. Na época, todos que tinham
atividades perigosas, e trabalhar no Dieese era perigoso, tinham os seus códigos.
Então a minha mulher sabia que se acontecesse qualquer coisa ela tinha de avisar
tais e tais dirigentes, tais e tais deputados. Por exemplo, o deputado Almir
Pazzianotto, o deputado Suplicy [Eduardo Matarazzo Suplicy]. Aí, a Lurdinha
[Lourdes Barelli] volta da padaria. Nem liga muito para os caras que estavam na
porta. Quando entra e me vê, eu digo: “Olha, eu estou indo com eles”. Ela disse:
“O que é isso?”. “Estou indo com eles.” Demora para "cair a ficha" que eu estava
indo preso. Eu disse: “Olha, avisa o pessoal”. Então fui. Me levaram para o "porão
do DOPS “ e lá estava um antigo dirigente, o Afonso Delelis, que foi presidente ou
vice-presidente do sindicato dos metalúrgicos. Sento ao lado dele. Ele diz: “Pô,
Barelli, te prenderam? Olha, eu já fui preso 14 vezes, mas desta vez o negócio é
sério. Se te prenderam, é sinal que aqui vai ser pior que na Argentina. A coisa está
muito séria”. Aí começam a chegar uns estudantes trotskistas. Ele olha e diz:
“Prenderam aqueles? Olha, retiro o que eu disse, nós vamos sair daqui hoje”.
[risos]
R – Bem, então o Delelis disse: “Olha, nós vamos sair hoje mesmo”. Dito e feito. O
que acontece? Me chamam para o gabinete do secretário, do "dono" lá do DOPS,
o diretor do DOPS, o Romeu Tuma. Ele não estava, tinha ido dar proteção ao
Figueiredo. Eu entro e um cara, um delegado famoso que eu esqueci o nome, diz:
“Professor, aconteceu um lamentável engano. Não sei o que aconteceu, mas isso
é um lamentável engano. Não se considere preso. [risos] O senhor, fique à
vontade”. Eu disse: “Mas se eu não estou preso eu quero ir embora para a minha
casa”. Ele disse: “Não se considere preso, nós só estamos aguardando a
liberação do nosso delegado. Estamos entrando em contato. O senhor pode
sentar, aqui é a sala dele. Pode telefonar para quem o senhor quiser, pode ler
jornal”. Aí, a primeira coisa que faço, ligo para a minha mulher e digo: “Eles
disseram que foi um lamentável engano, que eu estou detido e que eles estão
ligando para o Tuma para ver se me soltam”. As rádios já estavam dando a notícia.
De vez em quando eles vinham, falavam mal do Dom Paulo Evaristo Arns e coisas
assim. Baixaria total. Eu não entro na deles. Aí começa a chegar gente. Chega o
Almir Pazzianotto. Dali a pouco vem o Suplicy. Aí, o Suplicy diz: “Vamos lá no
aeroporto esperar o Figueiredo e dizer para ele essa coisa”. Vão os dois para o
aeroporto. Desce o Figueiredo e o Suplicy do jeito dele: “Presidente, prenderam o
Walter Barelli!” Quem é o Walter Barelli para o Figueiredo? [risos] “Prenderam o
Walter Barelli.” Um daqueles seguranças dá uma "gravata" nele, o Figueiredo vai
andando e acaba. Ele volta depois e conta essa história pra mim. Chegam os três
sindicalistas do ABC: o Lula, o Marcílio [Benedito
Marcílio] e o Lins [João Lins]. Depois, chega o Gilmar Carneiro e um outro diretor
do Sindicato dos Bancários de São Paulo e ficam fazendo "chacrinha", contando
coisas. Ao mesmo tempo, o Hugo Peres, que tinha ido ao Rio de Janeiro, chega
no Rio, põe o pé no solo, quando dizem: “O Barelli está preso”. Ele pega o mesmo
avião e volta para São Paulo. Todos os dirigentes sindicais que não foram para o
DOPS, foram para o Dieese, que na época era no Sindicato dos Marceneiros,
aguardar em "vigília cívica". Por volta de duas e meia da tarde chega o Tuma:
“Olha, foi um lamentável engano”. Aí, chega um deputado importante de Ribeirão
Preto, que trabalhava com movimento sindical rural, que foi importante, se não me
engano, na votação das Diretas.
P/1 – Britto.
R – Não. Não era o Britto. Bem, ele chega e diz: "Mas, tem mais gente lá". Então,
eles mandam subir o Delelis. Aí, chega o Tuma e manda eu descer para a porta do DOPS. A minha prisão, acho que foi a primeira da chamada redemocratização, ou como que o Geisel chamava: "democracia relativa". A primeira da redemocratização foi a minha. Durou pouco. Não teve tortura, a não ser a moral.
Teve até uma solidariedade muito grande do pessoal. Agora, a análise feita, é a
seguinte: foi uma operação de Estado Maior [das Forças Armadas]. Porque a ideia
deles era que, prendendo o Delelis, eles prendiam a oposição sindical inteira. O
Delelis tinha todas as ligações com a oposição sindical. Prendendo o Barelli,
prendiam o movimento sindical. E prendendo os trotskistas, os estudantes que o
Delelis chamava de trotskistas. Eu não vi porque estava muito distante, também
não sei qual é o nome das pessoas. Prenderiam também os estudantes. Ou seja,
todo mundo ficaria mobilizado para tirar o Delelis, para tirar o Barelli, para tirar os
estudantes. Todos saíram naquele dia, não sei se os estudantes saíram na noite
ou na manhã seguinte. O Delelis saiu mais ou menos umas seis horas da tarde.
Foi uma operação do DOI - CODI [Destacamento de Operações de Informações -
Centro de Operações de Defesa Interna] responsável por uma série de mortes.
Tinha sido mais ou menos desmobilizado, mas se reativou para fazer uma
"operação protege o presidente". Então aconteceu esse episódio que está no meu
currículo.
P/1 – Barelli, durante a sua gestão como diretor técnico, foi quando surgiram as
centrais sindicais, né? A CUT, depois a CGT, e como, isso trouxe impactos para o
Dieese de alguma forma?
R - O Dieese era chamado de Central Sindical dos Trabalhadores. Porque o
Dieese, apesar de inexistente na estrutura sindical, reunia as lideranças de todas
as categorias independentemente de confederação. Então, ele estava fora da
estrutura sindical, mas era considerado órgão, efetivamente central sindical. Os
movimentos nasceram aqui. O Dieese é fruto de um movimento intersindical. Os
outros movimentos, aquele que eu falei do Fundo de Garantia, que a Heloisa saiu
meio "tostada", era o Dieese que estava fazendo. A fundamentação de todas as
coisas, até terem as centrais, acontecia aqui. Porque na Diretoria, normalmente,
estavam os líderes do movimento sindical. Então na eleição de 1978, se eu não
me engano, tiveram três chapas. Todo mundo queria ser da direção do Dieese.
Tinha uma chapa, acho que foi a que ganhou, onde estava o Hugo Perez, mas
também uma série de outras pessoas que depois iriam fundar a CUT [Central
Única dos Trabalhadores]. A outra, a Chapa 3, era presidida pelo Olívio Dutra. Na
Chapa 2, se não me engano, estava o Lula, mas não como presidente. Então, os
dirigentes que fundaram o PT [Partido dos Trabalhadores] e a CUT estavam
distribuídos nas três chapas. As tendências não eram bem definidas como hoje.
Existiam outros dirigentes importantes. O João Carlos [Gonçalves], dos
Petroleiros, o Arnaldo [Gonçalves] era importante. Tinha o Benedito Marcílio. No
Rio Grande do Sul não tinha só o Olívio, tinha os caras da alimentação. Em Minas
Gerais não tinha só o João Paulo [Pires], havia o pessoal dos Jornalistas. No Rio,
eu me lembro bem do João Carlos. Tinha alguém da Bahia, tinha alguém de
Brasília. Eles estavam divididos na constituição das chapas, mas não por facção
política. Pelo menos não dava para perceber desse jeito. Montaram e
apresentaram as chapas, uma delas ganhou, mas todos continuaram
tranquilamente no Dieese, e gozando uns dos outros: “Olha, eu não deixei você
ser diretor do Dieese, porque eu votei na outra”. Brincadeira de dirigente sindical
que, de vez em quando, é criança também. Então, o Dieese era a central sindical.
O que acontece, quando se formam as centrais sindicais? A maioria da direção
não é os que sentam nas mesas de decisão. A Diretoria do Dieese era que
mandava no movimento sindical, não como diretor do Dieese, mas como sindicato
importante. Era a diferença que tinha do Dieese para o DIESAT [Departamento
Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho]. O
DIESAT só tinha dirigente de segunda linha. Do Centro de Memória Sindical só
tinha dirigente de segunda linha. Do DIAP [Departamento Intersindical de
Assessoria Parlamentar] tinha só dirigente de segunda linha. DIAP era mais
diferenciado porque tinha também a coisa de Brasília, então não dá para dizer
isso. Tinha de pegar gente que estava lá para poder fazer a tal assessoria
parlamentar. E quando surgem as centrais, os dirigentes principais ficam na
Central e mandam, mas nem sempre, o primeiro time para cá. Então de vez em
quando a Diretoria do Dieese sofre. Quando eu estava saindo do Dieese eu fiquei
mais três meses. Porque eu ia sair já em dezembro de 1989 e fiquei mais três
meses ou quatro, pois tinham dois dirigentes sindicais liberados. O Dieese nunca
teve isso. Eram funcionários públicos, então o sindicato deles liberava. Eles
tinham todo tempo, mas não decidiam as coisas nos sindicatos deles, nem no
movimento sindical. Foram os que interferiram muito no andamento dos trabalhos
aqui, né? Foi uma fase muito ruim aquele período. Eu saí e fiz uma carta
denunciando. Disse: “Olha, vocês tem de acreditar na integridade dos funcionários
do Dieese”, alguma coisa por aí. Aí o Gilmar Carneiro: “Vamos segurar, vamos
manter essa Diretoria mais quatro meses”. Bem, mas era efetivamente o pessoal
que desconfiava do técnico, né? Que foi o que aconteceu com a Heloisa e com a
Mariana, nos velhos tempos. Eram vigiados. Os telefones, aquelas coisas todas.
No meu tempo, tranquilo. Nesse período nós respeitávamos esses dois diretores,
e até gostamos quando eles ficaram livres. Desde que eles fizessem a tarefa de
diretores. Mas eles quiseram começar a entrar nas decisões técnicas e coisas ali.
Aí foi complicado. O fato da existência das centrais cria problemas desse tipo.
Então, na reconstituição das diretorias, tanto o Serginho quanto o Clemente, eles
têm um rodízio. Primeiro é desta central, depois é da outra que é o presidente.
Mas os caras ficam juntos, tem um colegiado. Foi feito uma reforma de Estatuto
para acomodar essas coisas. E aí, o que acontece? A maioria desses dirigentes
que passaram pelo Dieese cresceram no sindicalismo, pelo menos no sindicalismo
paulista, né? O que não era paulista era o Lavorato. Ele perdeu o sindicato,
perdeu o vínculo, porque ele era do Rio. Mas na Diretoria constante são três de
São Paulo, né? É um bom estágio, e eles normalmente dão bons frutos para o
movimento sindical. Mas precisa tomar cuidado.
P/1 – Você chegou a falar da sua saída, né? E depois de tanto tempo, tanta coisa
que você viveu no Dieese, em 24 anos, como é que foi o processo da sua saída
do Dieese? Como foi isso para você?
R – A minha saída foi o seguinte: na eleição de 1989, no segundo turno, o Lula
criou equipes de programa de governo. E me botou em uma das equipes. Bem, se
ele perguntasse eu não aceitaria. Mas como ele fez como fato...
P/1 – Consumado?
R – ...fato consumado! Eu não aceitar significaria, talvez, alguma coisa contra a
candidatura dele.[risos]
R – Bem, o...
P/1 – Fato consumado.
R – Fato consumado. É, então eu fui, né? Durante todo esse período eu fui muito
amigo do Lula. Tive relações bastante próximas. Contei aí do caso da prisão, tudo
mais. E ele sabia que eu não ia entrar no PT. A gente se encontrava, quando eu
estava no Dieese, quase sempre. Mesmo ele estando fora do sindicato. Ele
trabalhava com o pessoal de São Bernardo bastante. Era um sindicato muito ativo.
Mas era contra o compromisso que a gente tinha como Dieese. Eu disse: “Bem,
selou, eu tenho de sair do Dieese. Nós não agimos politicamente,
partidariamente”. E aí tive de ter encontro com ministros, discutir lá em Brasília
duas, três vezes. Buscar dados, organizar, dar declarações. Não era ainda equipe
de transição, mas era equipe. E o Sarney tinha liberado os ministros para, no
segundo turno, atenderem as solicitações da equipe do Collor e da equipe do Lula.
Bem, aconteceu isso: “Então eu estou saindo do Dieese”. Era a minha decisão.
Houve esse lance da assembleia onde eu apresentei uma carta denúncia. Carta
tranquila mas denunciando. Não tenho o exemplar dela. Mas o Gilmar põe panos
quentes na situação. “Olha, nós vamos fazer uma reforma geral, fazer um novo
Estatuto, não sei o quê. Mas seria importante você ficar mais uns três meses para
dar tempo para a gente fazer essas coisas, essa transição de uma forma mais
tranquila”. Aí eu aceitei, porque senão era uma crise instalada muito séria. Bem,
então foi assim que eu saí. Aí o Lula criou o Governo Paralelo. Eu fui responsável
pela pasta de Economia. Fiquei o tempo todo até ir para o Ministério, trabalhando
no chamado Governo Paralelo. Que não era unipartidário. Era a tal Frente
Popular. Tinha o pessoal do PSB, alguns que se diziam do PDT. Então era a
minha área. Fiquei nessa fase como contribuição nessa área da Economia. Mas aí
não tenho mais nada a ver com o Dieese. A história que interessa aqui para mais
ou menos nessa saída, né?
P/1 – Ainda sobre o Dieese, mas sobre o futuro. Que é importante até para a
equipe do Dieese. Quais os principais desafios que você vê para o Dieese no
futuro?
R – [Silêncio] Não estou preparado para essa colocação. Eu saí do Dieese. Então
não me sinto uma pessoa que deve... Eu posso falar os desafios que o Brasil vai
ter, aí é outra coisa. Mas do Dieese eu acho que cabe agora à equipe atual. Não
interferi em nada das duas equipes que me substituíram. Eu acho que não cabe a
mim falar sobre isso. O que eu acredito é que seguindo a metodologia, a gente
sempre teve de colocar os problemas em comum, refletir sobre eles, discutir o que
é prioritário, e o Dieese vai encontrar. Porque, inclusive, eu estou afastado do
movimento sindical. Ele mudou muito também desse período. O Brasil de 1990 era
um Brasil vencedor. A Centrais tinham se imposto em um momento ruim em
termos econômicos, mas os trabalhadores estavam ganhando. A partir daí
perderam, perderam, perderam... Então a situação é completamente diferente,
não dá para opinar.
P/1 – Agora, voltando um pouco para você mesmo. Você disse que é casado. Tem
filhos?
R – Três filhos, três netos.
P/1 – Qual o nome deles?
R – Suzana, Pedro e Paulo.
P/1 – Os filhos, né?
P/2 – O que eles fazem?
R – Suzana é jornalista, o Pedro é engenheiro de software e o Paulo é
economista.
P/1 – E os netinhos?
R – Os netinhos ainda não têm profissão. [risos]
P/1 – [risos] Os nomes?
R – Artur, Tatiana, e Gabriela.
P/1 – Como que seus filhos... você tem toda uma trajetória, uma história... Como
que eles, seus filhos vêem sua história, a história desse pai?
R – Olha, /eu acho que vocês têm que perguntar para eles. [risos] Para eles é
muito desgastante. Porque o diretor técnico do Dieese viaja muito. Eu sempre quis
ter uma presença grande com os filhos. Tive o bastante. Mas em determinados
momentos eu não estava presente. Nada muito grave, mais grave pela mulher.
Quando morreu a mãe dela eu estava, nem me lembro, acho que estava no Rio
Grande do Sul. Então não podia estar dando assistência. E ela precisava ir para a
Bahia, onde morava a minha sogra. Bem, tem coisas desse tipo. Agora, tem
coisas hilariantes. A minha filha Suzana, no colégio dela, em uma aula lá de
ginástica com o professor Jair, houve uma discussão. E ele fez coisas que ela não
gostou. E o grupinho dela não gostou também. Disse: “Ó, Jair, você sabe, se você
fizer isso [risos] eu peço para o meu pai me ensinar como faz greve e vou fazer
uma greve contra você”. [risos] Essa é a situação da Suzana. Todos eles
conheceram bem o Dieese. A Suzana mamou no Dieese, porque nos sábados eu
compensava as horas naquele período que, em 1968, eu trabalhava quatro horas
no Dieese e oito no metrô. Quando não dava para fazer nos dias úteis, eu fazia
oito horas no sábado para compensar o Dieese das horas que eu não tinha
trabalhado. Era para ficar louco... Mas então foi isso. O Pedro teve algumas
passagens. O Paulo conhece todo mundo. A nossa turma era muito unida. Tinha
as festas de aniversário da filha da Annez, dos filhos do Mauricio, dos filhos do
César, dos meus filhos. Ou mesmo as festas de fim de ano do Dieese. Aí o
pessoal se reunia. Havia uma integração, uma visão pelo menos de colaborar,
saber o que o pai está fazendo. E apoiar da maneira possível o que a gente fazia.
O Pedro, algumas vezes, para ver programa de computador, que ele entende:
“Olha, estou com essa dificuldade, como que você faz?” Ele se dispunha a estar
presente.
P/1 – E a sua esposa?
R – Minha esposa considera o Dieese uma forma de realização. Ela trabalhou um
pouco no início da educação sindical...
(FIM DO CD 02)
R – ...que o Dieese fez, antes de surgir a Escola Sindical, dando alguns cursos.
Inicialmente eram esporádicos, para as diretorias do ABC, principalmente. Aí ela
passou a ter um trabalho de formação de equipe com o pessoal dos Condutores
de Veículos. Ela estava registrada. Alguns dos diretores foram presos no projeto
da Caderneta de Prestes. E um dos dirigentes, o tesoureiro da época, teve de ficar
a noite inteira respondendo interrogatório, ameaçado de pau-de-arara lá no DOPS,
para dizer que minha mulher era a filha do Prestes. Então ela também viveu..., por
sorte, né? Nosso amigo aguentou firme. Mas até ela explicar que não era, ela ia
sofrer algumas torturas. Mas tortura, só as dificuldades. Porque o Dieese não tinha
horário. Ela foi a que mais sofreu com a ausência. Teve de assumir problemas em
momentos em que eu estava fora do país. E respostas tinham que ser dadas.
Então ela me apoiou o tempo todo. Mas para ela o Dieese foi mais peso do que
alegria.
P/1 – E dessa sua passagem pelo Dieese, que lições que você tirou para a sua
vida?
R – Para a minha vida... Eu passei a acreditar em uma frase do Celso Furtado,
que eu repeti ainda ontem para não sei quem. Ele foi paraninfo desse Kalil que eu
citei. Lá da faculdade, da JUC e tal. E a formatura dele foi no Teatro Municipal e eu
fui assistir, porque era amigo do Kalil. Eu nunca tinha assistido à uma formatura
universitária: “Municipal? Vamos ver”. E o discurso do Celso Furtado era: “Se você
faz política, você tem duas maneiras para fazer política”, falando para os
economistas, "Uma, entrando em um partido político, e aí cumprindo as tarefas.
Subindo na hierarquia ou não. Sendo um militante decente do teu partido. E a
outra, é sendo um bom profissional”. Eu vim para o Dieese quando saí de uma
organização, que era um partido político, a Ação Popular, e fui afastado em um
processo meio neurótico. Na época, o pessoal que vivia na clandestinidade não
tinha porque serem os mais equilibrados do mundo. Mas, saí, de um partido, que
nós queríamos que fosse um partido. E fui para um lugar onde eu tinha de exercer
minha atividade profissional. E foi onde eu me realizei. Então levo isso para a
frente ao longo da vida.
P/1 – De alguma forma essa passagem ela contribuiu para o exercício de outras
atividades como ministro do Trabalho, carreira política?
R – Ah, sem dúvida, sem dúvida. Eu recebi, não me lembro o nome dele, um
antigo, secretário do Trabalho, que é o ministro do Trabalho nos Estados Unidos,
que veio visitar o Dieese em uma missão qualquer. Ele não era mais do governo
americano. Ele tinha sido responsável pela recuperação do Japão. Era um
economista. Pela idade talvez já tenha morrido, mas não sei se morreu. E ele
disse: “Olha, as pessoas que estão mais aparelhadas, mais... “ Não é
aparelhadas, não foi esse o termo que ele usou. "Mais em condições de exercer
cargos de governo, são os que passam pelo mundo do trabalho.” E é verdade.
Porque em uma situação como do Dieese, no Brasil é Dieese, mas pode ser um
outro organismo qualquer. Você é obrigado a pensar em uma forma mais ou
menos holística, são vários interesses. Você tem de fazer opções. Você tem de
negociar. Você tem de negociar para ter os apoios. E tudo isso é o que se usa
quando você é governo. Então para a atividade de Ministério, sem dúvida. De
secretário de Emprego também. Para deputado não. Deputado, minha experiência
é muito pequena. Lógico que serve porque a forma de no Dieese você ter
trabalhado com um leque de categorias, de opções, de problemas, praticamente
você fala de álcool e eu sei do que se trata e as influências do álcool. Controle de
natalidade eu sei o que é e como é. Se é importante, se não é. Siderurgia,
gargalos de desenvolvimento. E vai por aí afora. Porque tudo isso a gente teve de
enfrentar em ponto pequeno, em ponto grande, como diretor do Dieese. Mas não
é só ser do Dieese. Se pudessem, as pessoas que tentassem resolver os
problemas do trabalho, ficariam, começando a resolver os problemas do país.
P/1 – O que você achou de estar participando desse Projeto Memória Dieese, com
o seu depoimento?
R – Olha, eu aprendi que você tem de estar aberto para várias profissões. A minha
ideia aqui era ter uma equipe multiprofissional. Brincava muito com a Sonia, do
Rio de Janeiro, que estava faltando um antropólogo, quando ela estava entrando
no Dieese. Precisamos ver a realidade de várias maneiras. É importante você ter
alguma noção de história para não errar tanto. Não que nada disso que eu falei vai
se repetir na história do Dieese. Isso é um negócio muito particular, dependeu das
circunstâncias do tempo que eu vivi, da equipe maravilhosa que eu tive. Não fui
eu, foi o grupo que trabalhou comigo aqui e nos estados. Então contar um pouco
dessa história serve para algumas coisas. No dia dos 50 anos, eu ia fazer um
discurso mais longo. Mas quando o João Paulo não foi cassado, eu votei pela
cassação, porque ele tinha mentido. Apesar do João Paulo ser um grande cara,
não estou tirando os valores dele, mas ele tinha faltado com a ética. Eu votei pela
cassação e saí porque tinha uma outra coisa [pra fazer]. Quando cheguei em
casa, liguei a televisão, ele tinha sido absolvido. Eu disse: “Eu não volto mais para
o Congresso. Aqui eu não estou feliz, não é uma coisa boa.” No outro dia de
manhã eu fui andar, eu ando sempre, preciso praticar exercícios por causa da
diabetes. Quando eu ando, eu penso e reflito. E uma das coisas que eu refleti foi a
seguinte: “O Dieese foi feito por um número pequeno de pessoas e hoje tem
duzentas pessoas. Mas, de primeiro, era um núcleo de cinco ou seis pessoas,
depois foi crescendo, mas crescendo como podia crescer, sabendo como estava
dando cada passo. Era um negócio importante que teve uma participação muito
grande na história do Brasil". O chamado Novo Sindicalismo tem tudo a ver com a
tese de doutorado da Annez Andraus. Que indicou: “Nós precisamos ir para uma
categoria dinâmica, que vai estar na frente do próximo momento”. Vocês
perguntaram sobre o futuro do Dieese. Na época estávamos fazendo a mesma
pergunta: "O que nós vamos fazer no futuro?" Então, [os trabalhadores] da
indústria automobilística era a categoria escolhida, e deu certo. Foi o Sindicato
[Metalúrgicos de São Bernardo] que cresceu e entrou para a história do Brasil.
Muita coisa que aconteceu na Constituição do Brasil foi por causa do Dieese. Nós
conseguimos colocar muita coisa na agenda política nacional. Então é possível a
um órgão pequeno colocar seu tijolinho em uma grande construção. Eu acho que
o Dieese não colocou um, colocou vários tijolos. Se eu continuasse no Parlamento, onde eu não estava feliz, a ideia era: “Não dá! Para. Vamos ver se eu não gosto assim. Como que é um bom Parlamento? O que se deve fazer.? O que se pode fazer em um mandato integral, não chegando em uma época de
denúncias e CPIs. Quatro anos, o que pode ser feito?” E o exemplo a seguir seria
o exemplo do Dieese. Então isso é importante. Quer dizer, a história do Dieese
pode ser a história de muitas organizações. Elas todas vão começar pequenas,
não vão ter possibilidade de enfrentar o governo militar do jeito que a gente
enfrentou, enfrentar patrões do jeito que a gente enfrentou. Mas tem outros
enfrentamentos, outras características que cada uma das organizações
certamente vão ter pela frente. E trabalhar com elas, modificar situações. Então é
um belo exemplo. A gente passa, mas vai ficar um depoimento. O que menos
importa é a pessoa. O que importa é que houve uma equipe aqui, que conseguiu
com muita integração construir o Dieese. Sobre isso, as pessoas que trabalharam
no Dieese no meu período, posso dizer, foi um pessoal muito bem selecionado.
Era difícil fazer seleção no Dieese, não era qualquer um que entrava, vinha muita
gente vocacionada para aquilo que a gente achava que devia ser. Erramos muito
pouco nesse processo de seleção. Não vou dizer que todos deram certo. Agora,
aqui foi, espero que continue sendo, uma grande escola profissional de ação no
social. A própria realidade do mundo do trabalho está em transformação. De
alguma forma ela já ocorreu e a gente não sabe como que nós estamos dentro
dela. E vai ter que descobrir os caminhos. E precisa ter aí uma massa pensante.
Que se coloca a serviço dessa causa. Tá por aí.
P/1 – Obrigada.
Recolher