Ponto de Cultura
Depoimento de Edson Sespede
Entrevistado por Clarissa Batalha e Gisele Rocha
São Paulo, 17/07/2007
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista PC_MA_HV031
Transcrito por Joselma Siqueira Silva
Revisado por Genivaldo Cavalcanti Filho
R – Você quer que eu olhe para onde de preferência? Onde fica melhor?
P/1 – Pode ficar à vontade.
R – Posso olhar para o meio, para cá, para lá, tanto faz?
P/1 – Isso.
R – Não tem nada assim não, né?
P/1 – Vamos começar. O senhor pode dizer o seu nome completo, por favor?
R – Edson Sespede.
P/1 – Nome de guerra?
R – Dedy Edson, que quer dizer ‘pai Edson’. Foi aportuguesado para Dedy Edson porque meus filhos perguntavam, quando eles eram pequenos, como era pai em inglês. Eu sempre falava daddy, então fiquei sendo o Dedy Edson, ‘pai Edson’.
P/1 – Onde o senhor nasceu e a data?
R – Nasci em São Paulo, na capital, em 07 de setembro de 1937.
P/1 – O nome dos seus pais e dos seus avós?
R – Minha mãe: Arminda Liberata Sespede. Meu pai: Sebastião Sespede. Minha avó: Isabel Ascêncio Sespede. Meu avô: Antonio Ascêncio Sespede.
P/1 – Me fala um pouquinho da atividade dos seus pais e dos seus avós. O que seu pai fazia?
R – O meu avô, por parte de pai, veio da Espanha. Ele era um simples operário. O meu pai era um artista, em diversos horários da vida dele. Em outros horários, ele trabalhava como pedreiro e também era vendedor de rua, vendendo mercadorias com carrinho de mão.
P/1 – E a sua mãe?
R – A minha mãe sempre foi uma operária e também aprendeu costura. Ela sempre foi uma costureira e em regra geral, prendas domésticas, cuidando da casa, da família e dos filhos.
P/1 – Certo. O nome da família é então espanhol, o Sespede?
R – É, a ascendência é espanhola. Sespede quer dizer gramado, um gramado bem verde.
P/1 – E o senhor tem irmãos?
R – Tenho diversos irmãos. A minha mãe se casou duas vezes. A primeira vez com o meu...
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Depoimento de Edson Sespede
Entrevistado por Clarissa Batalha e Gisele Rocha
São Paulo, 17/07/2007
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista PC_MA_HV031
Transcrito por Joselma Siqueira Silva
Revisado por Genivaldo Cavalcanti Filho
R – Você quer que eu olhe para onde de preferência? Onde fica melhor?
P/1 – Pode ficar à vontade.
R – Posso olhar para o meio, para cá, para lá, tanto faz?
P/1 – Isso.
R – Não tem nada assim não, né?
P/1 – Vamos começar. O senhor pode dizer o seu nome completo, por favor?
R – Edson Sespede.
P/1 – Nome de guerra?
R – Dedy Edson, que quer dizer ‘pai Edson’. Foi aportuguesado para Dedy Edson porque meus filhos perguntavam, quando eles eram pequenos, como era pai em inglês. Eu sempre falava daddy, então fiquei sendo o Dedy Edson, ‘pai Edson’.
P/1 – Onde o senhor nasceu e a data?
R – Nasci em São Paulo, na capital, em 07 de setembro de 1937.
P/1 – O nome dos seus pais e dos seus avós?
R – Minha mãe: Arminda Liberata Sespede. Meu pai: Sebastião Sespede. Minha avó: Isabel Ascêncio Sespede. Meu avô: Antonio Ascêncio Sespede.
P/1 – Me fala um pouquinho da atividade dos seus pais e dos seus avós. O que seu pai fazia?
R – O meu avô, por parte de pai, veio da Espanha. Ele era um simples operário. O meu pai era um artista, em diversos horários da vida dele. Em outros horários, ele trabalhava como pedreiro e também era vendedor de rua, vendendo mercadorias com carrinho de mão.
P/1 – E a sua mãe?
R – A minha mãe sempre foi uma operária e também aprendeu costura. Ela sempre foi uma costureira e em regra geral, prendas domésticas, cuidando da casa, da família e dos filhos.
P/1 – Certo. O nome da família é então espanhol, o Sespede?
R – É, a ascendência é espanhola. Sespede quer dizer gramado, um gramado bem verde.
P/1 – E o senhor tem irmãos?
R – Tenho diversos irmãos. A minha mãe se casou duas vezes. A primeira vez com o meu pai, então nasci eu e minhas duas irmãs. Depois que meu pai morreu, minha mãe se casou de novo e nasceram meus 13 irmãos, então eu tenho 13 irmãos só por parte de mãe.
P/1 – Me fale um pouquinho da sua infância: fale da rua onde o senhor morava, do bairro, como era?
R – As minhas lembranças mais chegadas são as que minha mãe me deu em fotografia, porque eu não lembrava, então eu sei pelas fotografias. O que eu consigo lembrar bem mesmo é mais ou menos a partir dos seis anos de idade. Quando a gente morava no Brás, o meu pai tinha um depósito de ferro velho, que hoje em dia é chamado de sucata ou reciclável. Lá, o que eu lembro bem é que a minha mãe sempre me dava dinheiro no domingo para eu ir ao cinema. Eu ia a um cinema que ficava perto, que se chamava Cine Oberdan. Nesse cinema teve um caso interessante: durante a projeção do filme, começou a aparecer um fogo, um incêndio, e todo mundo começou a gritar: “Fogo, fogo, fogo!”. O pessoal começou a sair em debandada e acabou machucando bastante gente. Quando foram ver, o incêndio era só no filme mesmo, não dentro do cinema. Eu tinha seis anos de idade. Dessa fase, meu pai conseguiu ganhar um dinheiro e comprou a casa que minha mãe tem atualmente. Nós nos mudamos para lá quando eu tinha sete anos de idade; fomos para o Tatuapé e no Tatuapé ficamos até hoje.
P/1 – E como era a sua casa quando você era criança?
R –Meu pai e minha mãe tinham uma casa só. Com o passar dos anos, a minha irmã fez mais uma casa, eu fiz mais outra casa, e a minha mãe, com o tempo, passou a ter três casas. O meu plano pelo menos foi esse: ela tinha trabalhado muito, batalhou muito para sustentar a família, então precisava ter um arrimo para o futuro. Então eu fiz uma casa, a minha irmã fez outra, e a partir daí a minha mãe pôde viver do aluguel dessas duas casas e ter a casa dela própria para morar.
A sorte que nós tivemos é que a mais ou menos dez metros da nossa casa tinha um colégio. Era um colégio simples, o nome atual é Colégio Mary Ward. Hoje em dia ele pega o quarteirão todo, mas na época era pequeno, era um colégio de freiras. Tinha uma cerca de arame beirando a nossa casa.
A minha mãe trabalhava, ela sempre trabalhou para ajudar o sustento da família. Nessa época, ela podia pagar escola para mim e depois para a minha irmã. A gente atravessava a cerca e entrava na escola. Foi onde eu me alfabetizei dos sete aos onze anos, o chamado Primário. Também nessa época, antes de eu aprender a ler e a escrever… Meu pai era fã de artistas, revistas e livros e comprava revistas para mim. Eu lia muitas revistas. Livros, ainda eu não lia; via, na verdade. Quando tinha sete, vamos dizer oito, nove anos, eu já estava alfabetizado e eu podia ler, então comecei a ver que nessas revistinhas que ele me trazia tinha muita história, geografia. Eu comecei a ver que era interessante: outras cidades, falava do que aconteceu no Brasil, fora do Brasil. Essas revistas, que eu estudei desde a idade infantil até chegar agora, me ajudaram muito a me alfabetizar e a conhecer muita coisa.
P/1 – E que tipo de revistas eram, histórias em quadrinhos?
R – Eram gibis. Gibis são histórias em quadrinhos, foram as que eu mais li. Nessa época, as histórias em quadrinhos eram assim: cada revista tinha diversos personagens e era por capítulos. A gente lia sobre todos os personagens. Após muitos anos, eu comecei a me interessar por um personagem que estudei durante muitos anos, que é o Fantasma. Acho que já era adolescente e, até chegar agora na idade adulta, eu sempre estudei o Fantasma.
P/1 – Me fale um pouco das brincadeiras da infância.
R – Como a minha mãe estava sempre ausente, o que a gente mais fazia era ir para a escola. Perto da minha casa tinha, e tem, um rio. O que eu gostava mesmo era ir nadar no rio. Então todos os dias eu nadava no rio e logo aprendi a nadar, a ficar em cima da água e não afundar. Eu, desde pequeno, sempre pratiquei natação.
P/1 – Me fale um pouco do cotidiano da sua casa.
R – O cotidiano sempre foi assim: a minha mãe é que era mais a chefe da família porque, como o meu pai era artista, ele andava atrás dos sonhos dele. O que ganhava, gastava tudo e não sobrava muito pra família. O dinheiro do depósito que ele vendeu só deu para comprar a casa. Ele comprou a casa e não conseguiu fazer quase mais nada. Na verdade, ficou tudo a cargo da minha mãe, que acordava às quatro horas da manhã para trabalhar na fábrica, trabalhava até as duas, três horas da tarde, voltava para casa e ficava com a carga ainda de fazer comida, limpar a casa, lavar roupa e cuidar mais ou menos dos filhos. Então nós tivemos uma infância mais ou menos livre e, como eu gostava muito de nadar, o que fazia mais era ir à escola e nadar, nadar e escola, até chegar aos dez anos, aí eu entrei em um grupo de escoteiros. Como na verdade eu tinha tempo, e a minha mãe deixava, eu comecei a viajar. Eu ia acampar em diversas cidades em volta ou mesmo na praia. Comecei essa fase de ficar mais perto da natureza, que eu gostava bastante.
P/1 – E o seu pai?
R – O meu pai [estava] sempre querendo ser artista, dançando e cantando, representando por aí, [ganhando] pouco dinheiro. Ele trabalhava mais em circos, na verdade.
P/1 – O senhor lembra de algumas coisas que ele fazia?
R – Eu sei o que ele fazia. O que ele mais fazia eram improvisações e... como é o nome? Eu vou falar, estou esquecendo um pouco… Ele interpretava outros artistas, como era o nome disso?
P/1 – Imitação?
R – Como é que é?
P/1 – Imitação?
R – Isso, ele fazia imitação. Essa época era década de 1940… Décadas de 30, 40 e 50. Ele imitava os artistas norte-americanos que a gente recebia nos filmes, como por exemplo o Al Johnson, que é um cantor e artista norte-americano, que fez o primeiro filme falado da história, pois antes os filmes eram mudos. Então meu pai os imitava. Ele também cantava, tocava, fazia bastante coisa e trabalhava em circos.
P/1 – E os estudos? Fale mais um pouco, você falou que estudou nessa primeira escola...
R – Nessa época era diferente. Agora se chama [Ensino] Fundamental e Médio. Antes, em quatro anos se fazia o Primário; da primeira até a quarta série e recebia o diploma. Depois estudava da quinta até a oitava série - era o segundo diploma, que era chamado de Ginásio. Eu terminei o Ginásio na oitava série. Depois disso, o que eu estudei foram idiomas e cursos em espaços, de outras coisas.
P/1 – E o que você lembra da escola?
R – Das escolas?
P/1 – É.
R – A princípio, como a minha mãe podia pagar, ela pagava escola particular para eu estudar. Consegui estudar em escola paga mais ou menos até a quinta série. A partir daí, o dinheiro dela foi ficando mais curto e fui estudar em escola do governo. Estudei em escola do governo da quinta à oitava, me formei e parei de estudar regular, não completei o curso Médio. Fiz só cursos separados: idiomas, desenho, diversas coisas.
P/1 – E o que o senhor lembra da escola?
R – As escolas?
P/1 – É.
R – As escolas sempre me ajudaram muito, pois quando eu tinha 14 anos, a minha mãe me encaminhou fora de escola a trabalhar. Eu notei que na escola a gente precisava estudar, porque senão a gente não ia fazer carreira no estudo ou no trabalho. Vamos dizer, no trabalho ia ser mais difícil. O que eu consegui foi ir até a oitava série, não deu para estudar mais. Não deu para fazer curso Médio nem faculdade, mas o que eu aprendi me ajudou muito. Eu me especializei, na verdade, em estudo de idiomas, línguas. Aprendi cinco línguas: a falar, ler, escrever. Isso me ajudou quando já estava um pouco mais adiante, a começar a arrumar empregos onde eu tivesse que falar essas línguas. Esse conhecimento das línguas foi o que me fez ter bons empregos, bons salários, até um dia eu ter coragem de largar de trabalhar para os outros, trabalhar e conseguir vencer trabalhando por conta própria. Consegui melhorar muitas coisas que as pessoas gostam de ter e não têm como, por exemplo, ter uma casa grande, casa de praia, carro - essas coisas que as pessoas gostam de ter e nem sempre conseguem.
P/1 – Certo. E os amigos, o senhor se lembra dos amigos, da adolescência?
R – Lembro sim, eu sou um tipo de pessoa fiel. Eu tenho amigos de quando estava na escola e de quando era adolescente. Eles ainda se encontram comigo ou me encontro com eles. Muitos estão às vezes um pouco distantes, não podem me ver, mas nós trocamos telefonemas. Eu tenho muitos que fazem contato comigo pelo telefone, para falar e lembrar essa vida toda nossa.
Eu tenho, e nessa passagem toda da vida, eu me aliei a muitas amizades. Tanto amizades pessoais, como amizades de escola, quanto amizades comerciais e profissionais, cujos amigos ou conhecidos eu frequento sempre e eles me frequentam também. Eu realmente tenho um grande círculo de amizades e hoje em dia, com a internet, se pode mandar e-mail para todo mundo e receber. Eu mando e recebo e-mail dessa nossa Terra toda, de todos os continentes.
P/1 – E o que o senhor fazia para se divertir com os seus amigos?
R – Eu sempre fui pautado pela dança porque como o meu pai era artista, ele sabia dançar. Quando tinha mais ou menos seis anos de idade, meu pai me ensinou a dançar e como a coisa devia ser. Eu tinha que conduzir a minha irmã porque a regra da dança sempre foi essa: o cavalheiro conduz e a dama se deixa ser conduzida. Se bem que isso mudou um pouco, mas vamos continuar assim, né? Eu sempre dancei, desde menino, desde os seis anos de idade. A minha irmã tinha quatro anos, ela também aprendeu e, com o passar dos anos, eu sempre dancei. A gente ia a festas e outras coisas e na fase da adolescência, com 14 anos, eu comecei a dançar nos salões de baile.
P/1 – Como eram os bailes?
R – Os bailes eram um pouco diferentes: as damas ficavam de um lado e os cavalheiros ficavam do outro. Aí o cavalheiro dava o sinal para ela que estava querendo dançar e, se ela aceitasse, ela dizia que sim. Ele ia lá e dançava com ela. Com o tempo mudou, fica todo mundo junto e nada de pedir nada. Mudou bastante, mas sempre fui pautado por isso. Sempre dancei bastante. E [foram] essas danças que sempre me ajudaram muito a ter que fazer exercício, ajudaram bastante nas outras coisas.
P/1 – O senhor gostava de praticar esporte?
R – O esporte, como já falei, era a natação. Eu sempre nadei muito, sempre. Nado até hoje. Eu faço também muita caminhada.
P/1 – O senhor se lembra como era a moda na época, as roupas que vocês usavam?
R – Lembro sim. Tenho até reclamação disso, pois como o nosso país foi colonizado pelos europeus, os homens, por exemplo, sempre usavam paletó, gravata, sapato de bico fino e as mulheres, de vestido. Isso era a moda desta época.
Com o passar dos anos, e deu certo, o nosso São Paulo aqui, onde nós moramos, faz calor. A gente não deve usar muita roupa; se deve usar uma roupa como, por exemplo, no dia de hoje. Está frio, devemos nos agasalhar, mas normalmente dá para andar. As mulheres também foram mudando a partir da década de 60, elas foram se libertando dos homens nesse sentido. As mulheres eram educadas assim: o pai, a mãe, o namorado, o noivo e o marido mandavam nela, e ela nunca mandava nada. As mulheres deram um basta nisso tudo na década de 50, 60 e 70, tanto é que nos Estados Unidos houve um assunto assim: as mulheres pegavam sutiãs e calcinhas e fizeram uma pilha, botaram fogo e disseram: “Vocês não mandam mais em nós”. Bom, a partir daí as mulheres começaram a usar calça comprida e então a moda mudou. Os homens pararam de usar paletó e gravata, começaram a usar mais calça e camisa. E, a partir desta época, homens e mulheres andam mais ou menos iguais.
P/1 – O senhor se recorda de alguma namorada?
R – Eu sempre tive um monte, desde os 14 anos. Muitas mesmo, até que me casei. Nunca parei de namorar.
P/1 – E a sua ex-esposa? O senhor é divorciado, né?
R – Sim, sou divorciado.
P/1 – Como o senhor conheceu a sua ex-esposa?
R – No baile, dançando. [Eu] a conheci no baile, acabamos nos apaixonando, casando etc. Arrumamos filhos e nos separamos.
P/1 – O senhor se lembra como foi o noivado na época?
R – Foi tudo bem. Isso aí eu não gosto muito, não (risos).
P/1 – Ah é? O senhor se lembra do dia do seu casamento?
R – Tudo bem, ótimo (risos).
P/1 – Fale um pouquinho dos seus filhos.
R – Os filhos sim, dá pra falar (risos). Meus filhos eu encaminhei e procurei que estudassem até onde eles conseguissem. Eu sempre paguei as escolas.
P/1 – Quantos filhos o senhor tem?
R – Dois filhos com certeza, e algumas reclamações no caminho, né?
Bom, esses dois que têm o meu sobrenome, um eu encaminhei, pois sempre trabalhavam comigo quando eles tinham mais ou menos, 14, 16 anos, se não conseguiam trabalhar em algum lugar. O estudo, eles pararam quando quiseram. Eu os trouxe para trabalhar comigo e eles trabalharam, até terem capacidade para trabalhar fora e seguir sua vida.
Um deles achou que deveria trabalhar na PM, Polícia Militar. Ele foi para a Polícia Militar e começou a fazer cursos, cursos e mais cursos, até que acabou se especializando em ser um policial especial, fazendo cursos de escalada em montanhas e sobrevivência na selva. Esse aí entrou nisso e nunca mais saiu, está nisso até hoje. Além disso, ele também gosta desta parte moderna, que é a parte da informática. Ele aprendeu a ser um webmaster e tem hábito de fazer sites. Ele já fez uns três, quatro sites, e como tem coisas que ele tem conhecimento e tem coisas que eu tenho conhecimento, ele sempre pede a minha assistência. Somos sócios em fazer sites, sempre com a intenção de divulgar, mas também vender mercadoria. Estamos sempre juntos nisso.
O meu outro filho parou de estudar no Ginásio e começou a trabalhar comigo também. Na época eu tinha um guarda-volumes, eu guardava as mercadorias dos hippies e dos artesãos da Praça da República. E esse meu filho trabalhava comigo, ele era o office-boy.
P/1 – Lá na Praça da República?
R – Na Praça da República.
P/1 – Esse guarda-volume?
R – Que é [onde acontece] a feira de arte e artesanatos. Um guarda-volume, isso mesmo, lá mesmo. Eles levavam em um carrinho, de carro, numa carrocinha. Tive a idéia de guardar as mercadorias deles; transformei isso numa realidade que deu bastante dinheiro.
Eu tinha um guarda-volumes e esse meu outro filho trabalhava comigo, até os 18 anos, quando ele não quis mais. Ele falou: “Pai, eu não quero mais.” “E o que você vai fazer?” “Vou vender mercadoria”. Eu falei: “Então leva bastante do que nós temos aqui para vender”, tipo uma indenização. Aí ele foi vender mercadoria. Ele voltou e falou: “Disso aí eu também não gostei, vou ser um tatuador”. Ele vendeu tudo e comprou uma maquininha de tatuagem. Como eu vendia coisas para os Estados Unidos, Europa, vendia na América do Sul também, comprei para ele tintas, a maquininha importada e os desenhos. E ele começou a ser um tatuador. Esse conseguiu transformar a vida dele como tatuador mesmo. Conseguiu ir para frente e hoje em dia é um tatuador bem divulgado, bem famoso e conhecido.
P/1 – Como foi a experiência de ser pai para o senhor?
R – Eu fiquei contente porque acho que a realização de cada pessoa são diversas coisas: ser pai, escrever um livro, plantar uma árvore. Eu já fiz todas essas. Eu fiquei contente com isso tudo sim, porque acho que é o certo.
P/1 – Certo. Vamos falar um pouquinho da sua vida profissional. Qual foi e como foi a sua primeira atividade?
R – A minha primeira atividade foi na Votorantim, com que vocês têm ligação. Eu trabalhei na Votorantim durante dois anos. Comecei como office-boy; eu tinha 14 anos e trabalhei até os 16 anos. Comecei como office-boy e saí de lá como arquivista. Foi quando aprendi a fazer arquivos e guardar papéis.
P/1 – E depois?
R – Você quer que eu continue com as outras?
P/1 – Tá. Pode ser.
R – Depois de lá, fui trabalhar numa firma de laboratório, de produtos de beleza. Eu fazia o estoque das mercadorias. Nesse [emprego] é que eu aprendi bastante como guardar, registrar e fazer estoque das coisas. Como saber onde elas estão, encontrar, e sempre que alguém quisesse alguma mercadoria, podia encontrar. Fiquei dois anos lá.
Depois desse, arrumei o meu primeiro emprego com respeito aos idiomas. Eu arrumei para ser recepcionista em um hotel de cinco estrelas. Esse foi o Othon Palace Hotel. Trabalhei lá por um ano como recepcionista. O recepcionista, o que ele faz? Ele recebe os hóspedes que vêm se hospedar no hotel e como os hóspedes vêm de diversas partes do mundo, ele tem que saber falar diversos idiomas. Como eu já dominava bem o inglês, francês, italiano, espanhol e o nosso português, foi mais ou menos fácil de seguir carreira nisso.
Trabalhei por um ano no Othon Palace, saí do mesmo, fui para outro hotel. Sempre na mesma linha, sempre atendendo os hóspedes. E nesse eu fiquei também na portaria, onde ficam as chaves, e os hóspedes pedem as chaves para subir para os seus apartamentos. Nesse tinha uma agência de turismo. Essa agência já era um pouco particular, era de um árabe, o nome dele era Leon. Com o tempo, como eu fazia só seis horas no hotel e ele precisava de um auxiliar, ele me convidou para ser auxiliar dele. Passei a junto com ele vender passagens de avião. E nisso tudo eu sempre utilizava os conhecimentos que tinha de geografia e história, porque sempre fui apaixonado pelo assunto e pelos idiomas também.
Bom, depois desse, alguns norte-americanos se hospedaram no hotel. Eles trabalhavam na empresa de nome Kaiser Engineers International. Esta companhia prestava serviço para a Cosipa - Companhia Siderúrgica Paulista. Faltou um funcionário e me convidaram para trabalhar com eles. Eu fui trabalhar com eles para tomar conta da mapoteca. Nesse tempo era a mapoteca: uns arquivos grandes onde se guardavam as plantas da obra. O meu conhecimento de línguas era útil porque eu tinha que ler os nomes das plantas em diversas línguas. Eu tinha sempre que saber onde estavam as plantas, dar para os engenheiros e falar com eles na sua língua. Isso também foi muito útil. Fiquei na Cosipa por 18 anos.
P/1 – Sempre na mapoteca?
R – Sempre. Depois de cinco anos eu saí. Como não tinha mapoteca e mudou a fábrica, que é em Cubatão, arrumei uma seção pra ficar em São Paulo, que é informação comercial. Eu passei a ser informante comercial. Eu ia visitar firmas, tirar informação, saber se os clientes pagavam bem, quanto pagavam, quanto não pagavam. Nesta [seção] eu fiquei até completar os 18 anos que passei lá.
Eu tenho que falar o que eu estudei um pouco antes. Eu estudei a arte de interpretar, para ser artista. Então, nisso de aprender a arte de interpretar, eu acabei fazendo um show e comecei a fazer esse show aos poucos, até transformá-lo numa realidade que dava dinheiro. Aí eu pedi demissão da Cosipa, comprei um carro novo, zero quilômetro, e fui exibir esses shows pelo Brasil afora. Eu pude visitar mais ou menos uns dez estados fazendo shows. Eu sempre ia e voltava e fazia o meu peão em São Paulo. Depois de tudo isso, parei de trabalhar porque sábado e domingo não podia ter gasolina e tinha que voltar sempre para São Paulo. Quando acabava o show na sexta-feira, tinha que guardar a gasolina em botijões. Era perigoso um dia pegar fogo, aí perdi a vontade de fazer shows.
P/1 – E como eram esses shows? Quero saber os detalhes.
R – Vou falar (risos). Como eu aprendi a arte de interpretar e danças, o show era mais ou menos isso. Striptease e humorismo ao vivo. As bailarinas dançavam e tiravam a roupa e tinha a parte humorística, que era feita sempre por um humorista. Como eu produzia o show e sabia o papel de todos, só não tirava a roupa (risos).
Eu fazia a parte humorística. Sempre faltava o humorista, aí eu ia fazer a parte dele. Eu tinha estudado a arte de interpretar, então tinha condições de fazer. As pessoas que assistiam não queriam me ver, não queriam saber de mim, eles queriam ver as mulheres (risos). Bom, eles tinham paciência de me aceitar, contando as piadinhas, falando, porque eles sabiam que as mulheres tinham que ir para o fundo trocar de roupa ou colocar a roupa para depois tirar e colocar de novo (risos). Eles tinham paciência de me aturar, então eu conseguia fazê-los me aturar, me escutar. Isso me ajudou muito na vida, porque é fazer as pessoas que estão assistindo se sentirem como se estivessem no palco, participando, como se eles estivessem lá. Isso foi muito útil na minha vida.
Após cansar por causa da gasolina, porque era perigoso eu morrer, cansei disso. Aluguei um andar na Praça da República para fazer isso, o que eu fazia. Com o tempo, eu comecei a ver que os artesãos da Praça da República vendiam mercadorias de tarde e iam embora, aí eu falei: “Eu podia guardar essa mercadoria”. Transformei em uma nova realidade: guardar mercadorias dos artesãos, camelôs, o nome que foi dado para esse pessoal das ruas. Fiz disso uma realidade: comecei a alugar cada andar, acabei tendo um prédio de quatro andares e comecei a ver o que eles vendiam. Aí comecei a comprar mercadorias e vender para eles, virei um atacadista. Fiquei 12 anos vendendo mercadoria, até que parei e passei para outra coisa.
P/1 – E o que era a outra coisa?
R – Passei a ter um depósito. Como eu tinha o hábito sempre de guardar coisas, passei a guardar mercadorias, guardar e vender. Passei a ter um depósito para colecionadores, sucateiros e outros tipos de coisas. A partir daí, passei a vender mercadorias para colecionadores e pessoas que querem adquirir sucatas. E estou nessa até hoje. Eu sou um antiquário - vendo mercadorias antigas, coisas usadas e para coleções.
P/2 – No Tatuapé?
R – Fica no Tatuapé. A pedido da minha mãe, eu comprei uma casa velha para ser vizinho dela. Eu mandei derrubar a casa e fiz um prédio de três andares.
P/1 – E as aulas de dança?
R – As aulas de dança? Eu sempre dei aula porque aprendi a dançar cedo, com seis anos. Sempre dancei nos salões de baile. E como a regra sempre foi do cavalheiro conduzir - a não ser a partir da década de 60, [em] que as mulheres também passaram a conduzir. Elas não deixavam os homens conduzir muito, não (risos). Essa é boa, né?
Eu passei a ensinar as minhas parceiras de dança e, com o passar dos anos, comecei a ver que podia transformar isso em profissão. Eu procurei as escolas de balé, para ver como elas ensinavam. Aí fui ver como era a técnica, que é dançar contando: Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete e oito. Baseado na numeração, a pessoa pode ir fazendo e trocando os passos.
Eu sempre dancei, apresentei as danças em televisão. Com o passar dos anos comecei, depois de aprender a técnica de como ensinar as pessoas, a dar aula em escolas, academias de dança e de música. Eu passei a dar aulas em todo tipo de escola que oferece dança. Faz 40 anos que eu dou aula, de lá pra cá eu sempre dei aula.
P/1 – Aulas de que tipo de dança?
R – As danças que estou mais habilitado são forró, samba, bolero e tango, mas dou aula de outras também: valsa, lambada, fox, cha-cha-cha, mambo, salsa. O que vai entrando, eu vou aprendendo. Eu aprendi a coreografia, então cada dança nova que vai entrando, que eu vejo que está dentro das minhas posses, eu vou aprendendo. Algumas não dá porque são muito fortes. Tem que usar muita força, eu já não estou tão [forte] assim.
P/1 – E o Fantasma, qual é a importância dele na sua vida? Fale um pouquinho para a gente.
R – Eu lia o Fantasma desde garoto, como lia também outros personagens. Com o passar dos anos, eu fui ver que o Fantasma tinha muitas coisas interessantes, que tinha muito a ver com o que eu gostava, que são geografia, história e conhecimento do mundo em geral.
O Fantasma foi criado em 1936. O autor é um norte-americano, de nome Lee Falk. O autor já tinha criado também uma história que ficou famosa, que é o Mandrake; ele fez o Mandrake em 1934. Bom, a partir do Fantasma eu comecei a ver que o autor colocava muitos ensinamentos que eram úteis para a humanidade. Ele é frugal na alimentação, quer dizer, ele não come muito, então a pessoa deve sempre comer para se alimentar e fazer o corpo funcionar bem, mas não comer demais e ficar gordo porque acaba fazendo mal para saúde.
O Fantasma não fuma, que é uma coisa que faz mal para a humanidade. Se todos pudessem deixar de fumar, seria ótimo, porque o fumo faz mal. O fumo vai para o pulmão, que é o órgão encarregado de filtrar o sangue do corpo. Então ele filtra o sangue com toxina, nicotina, alcatrão e outras porcarias, que fazem mal para a saúde, e morre muita gente fumando. Toda pessoa que puder largar de fumar, largue de fumar, deixe disso.
O Fantasma não bebe bebida alcoólica, que também pode fazer mal se a pessoa usar muito. Uma vez ou outra a pessoa beber, faz parte da vida de todo mundo. Bebida social, todos bebem para ficar um pouco alegres, contentes, talvez faça até bem para o corpo. Virar um bêbado é que é ruim, ele estraga a vida dele e estraga a vida da família inteira. O Fantasma dá todas essas demonstrações e ensinamentos.
O Fantasma vive entre os pigmeus, que são os indígenas. Ele protege os pigmeus, os indígenas de toda a região, e para isso tudo ele teria de ter dinheiro. Então como o Fantasma tem dinheiro? Ele teve sorte de…. Na praia da cidade onde ele morava, em um dia o vento bateu tanto que a areia foi saindo. Os indígenas encontraram um tesouro e trouxeram o tesouro para ele. Para eles, isso não quer dizer nada; eles cuidam da sobrevivência e não de dinheiro, jóias etc. Mas o Fantasma, muito sabiamente, entendeu que seria bom ter aquele dinheiro para ajudar todos que precisassem dele. O Fantasma saía sempre em campo para ajudar os indígenas e mesmo os reis da região, que plantavam ou criavam gado. Como o Fantasma sempre fazia um benefício para um imperador, um rei, um conselheiro, eles retribuíam de alguma forma e esse tesouro cresceu muito.
A residência do Fantasma era uma caverna em um rochedo; tinha uma abertura e por dentro tinha diversos cômodos. Lá, ele começou acumular esse tesouro e as coisas que precisava; se casou e tiveram filho. Ele treinou o filho desde pequeno para ser um combatente como ele. Treinou [o filho] no contato com armas. Muito exercício, boa alimentação, para ele ser uma pessoa forte, vigorosa, batalhadora; aprender táticas de guerra e como lidar com armas como arco, flecha, lança, e as armas mais novas, que são faca e revólver.
Esse Fantasma morreu. Tinha o filho dele e ele tinha feito um juramento de proteger tudo o que pudesse, sempre proteger as pessoas da crueldade, injustiça e da tirania. Ele usava uma roupa e falou pro filho usar a mesma roupa, usar tudo o que ele usava. Ele tinha como símbolo uma caveira; a caveira era o símbolo de morte, mas pra ele passou a ser um símbolo de justiça. E os indígenas deram pra ele um anel, justamente o anel da caveira. Ele passou a usar essa caveira como símbolo da justiça. Quando ele lutava com um marginal que fez um crime contra algum indígena, ou contra algum comerciante ou uma pessoa em si, ele dava um soco na pessoa e essa pessoa ficava marcada, estigmatizada, porque lutou com o Fantasma, não ganhou e foi julgado que fez uma coisa ruim. Essa passou a ser a marca dele.
Esse foi o segundo Fantasma. Este também criou o filho e assim foi, até chegar no nosso herói, o 21° Fantasma. A história do Fantasma tem aproximadamente 500 anos. O autor inteligentemente colocava, sempre, cada Fantasma viajando para todas as partes do mundo, sempre a pedido de alguém que precisava de justiça ou precisava de ajuda. Essa era a vida do Fantasma.
P/1 – E como o senhor usou essa história do Fantasma na sua vida?
R – Eu usei dela os ensinamentos. Um deles foi o que seria bom estudar um pouco, até onde pudesse, para não ser ignorante e poder melhorar alguma coisa. A outra foi viajar, conhecer muitos lugares. Aprender a dividir a vida da pessoa mais ou menos assim: parte de trabalho e parte de distração, parte de estudo e parte de descanso.
Fazer exercício físico cansa? Senta ou descansa. Fazer trabalhos mentais que cansem? Distraia-se da vida. Escutar música, assistir filme, namorar, fazer tudo o que vai distrair a vida dele, viajar. Se a pessoa conseguir dividir a vida em parte de trabalho e parte de distração, vai ter a vida dele mais ou menos tranquila.
Se ele insistir em ficar somente vagabundo, não fazer nada em 95% e fazer somente 5%, também não é bom. Se ele estudar, por exemplo, vai ser médico, tem que estudar dia e noite. Estuda 95%, também não é bom. A pessoa que aprender isso da vida, vai ter sempre a vida tranquila, que é não ter a estafa e o stress da vida moderna. É difícil a luta pela vida.
P/1 – E esses trabalhos que você faz, as exposições?
R – Isso tudo surgiu porque comecei a ver que os Fantasmas… Como já falei que eu gosto de geografia e história, tinha Fantasma em todas as épocas: em 1600, 1700, 1800. O Fantasma que era o nosso herói, na verdade era o 21° Fantasma. Tinha o Fantasma 20, 19, 18, 17.
Na família do 17° Fantasma nasceu uma mulher. Uma vez, o irmão dela ficou doente e ela tomou o lugar do irmão, só que, claro, ela é mulher, a anatomia dela era de mulher. Os indígenas falavam que ele era um Fantasma; ele tinha diversos títulos como: “Espírito que anda”, “O homem que nunca morre”. Como a roupa era a mesma, os indígenas, os piratas e os marginais falavam que aquele era o mesmo homem sempre, que viveu em 1500, 1600, 1700; ele nunca morria, era um Fantasma. Ela como mulher, podia encarnar o Fantasma, apesar de ter seios e o corpo mais fino que o homem. Os indígenas viam aquela roupa justa e seios grandes [e pensavam]: “Não é possível que ela é um Fantasma.” “Ela tomou essa forma de mulher porque ele é um Fantasma mesmo. Ele pode se transformar no que quer: em lobo, mulher, fumaça.” É uma explicação.
Eu comecei a ver que tinha as datas nas histórias: 1600, 1500, 1800 e comecei a fazer anotações. O Fantasma 17, por exemplo, viveu em 1769. O Fantasma 3 viveu em 1564 e assim fui marcando datas, fui marcando qual Fantasma era referente àquela data. Por exemplo, o 17° Fantasma: nasceram gêmeos, tinha o Fantasma e ela, que era a Mulher-Fantasma, eu comentava isso. O nome dele era Kit, o nome dela Eloíse.
E aí, o que aconteceu? O Fantasma, de prestar serviços para reis e imperadores que precisavam da ajuda dele, começou a ganhar e a melhorar em muitas coisas. Por exemplo, teve um imperador que tinha uma noiva, que tinha sido seqüestrada pelos piratas. Ele chamou o Fantasma, que era amigo do imperador...
O nome dos gêmeos...Todo Fantasma se chama Kit, seria uma abreviação de Christopher porque o nome do Fantasma é Christopher Walker. Walker em inglês seria “o andante”. E se abreviar, Walk é alguém que anda. É um dos nomes e títulos do Fantasma: “Espírito que anda” porque ele é um Fantasma que morreu e apareceu de novo, nunca morreu.
Bom, a marcação. Eu comecei a ver que tinha muita coisa, então, de tanto fazer marcação. Por exemplo, esse imperador que eu estava falando, que mandou o Fantasma ajudar a noiva que tinha sido raptada. O Fantasma foi lá, conseguiu livrar a noiva dele e trouxe a noiva para o imperador. O imperador se casou e depois de um ano ela morreu, na época do parto. Ele ficou muito triste com esse… Ele tinha um lugar que era uma praia, era chamada Praia de Kalawi. Esta praia tinha uma casinha, só que é uma casa de jade, onde ele pretendia se casar - pretendia não, ele se casou. E a noiva dele, ele levou para essa casa de jade. Ele pretendia que cada vez que ele viesse para essa praia, que chama Kalawi, ficasse nessa casinha de jade. Jade é pedra preciosa, coisa cara. Bom, essa praia é uma coisa curiosa. Lá metade é areia e metade é ouro, é uma coisa incrível.
Bom, como a noiva do imperador morreu, ele ficou tão triste que falou com o Fantasma: “Eu vou legar a você essa praia e a casa de jade para sempre. Você e todos os seus parentes vão ser proprietários dessa praia”. Esse Fantasma, o que fez? Quando morreu e o filho dele se casou - porque eles vão recebendo o legado -, esse filho foi também com a noiva passar a lua-de-mel nessa casa de jade, na praia que é metade areia e metade ouro. Ele passou a ter essa parte, que é essa praia de Kalawi.
Logo perto, tinha uma ilha que o Fantasma também recebeu como herança por um trabalho que ele fez, chamada de Ilha do Éden. O Fantasma teve a ideia de levar para essa ilha os animais filhotes, para eles crescerem. Aí o autor faz uma alegoria aos seres humanos. Para essa ilha ele levou os animais selvagens e os não selvagens, os herbívoros e os carnívoros. Ele levou então leões, panteras, tigres, macacos, gazelas, todo tipo de animal, e ensinou esses animais a tentar viver em paz e comer peixe. Uma tribo de índios provia o peixe para eles se alimentarem. Na verdade, o que o autor quis passar por intermédio do personagem Fantasma é o ensinamento à humanidade. É ensinar aos seres humanos que, se os animais que são irracionais - leão, zebra e gazela - podem viver em paz, não brigar e não guerrear, os seres humanos também poderiam aproveitar isso como um motivo de também não guerrear e não brigar; na medida do possível, um ajudar ao outro e respeitar o outro, acabando com as guerras. Se tiver mais uma guerra no nosso planeta, eles são capazes de soltar bomba para tudo quanto é lado e acabar com o nosso planeta, rachar o planeta, e nós vamos todos para o espaço. O autor foi muito inteligente em mandar um ensinamento pra humanidade. Essas coisas todas.. É o que eu gosto, é a parte do comportamento. Eu gosto e sempre que posso vou fazendo as minhas anotações, vou colocando essa parte de ensinamento. E de tanto eu fazer esses textos, as editoras que editavam as revistas do Fantasma acabaram sabendo que eu tinha esses textos e se interessaram em colocá-los como uma coluna nas revistas do Fantasma. Comecei a fazer coluna para as revistas do Fantasma, para sair junto. Essas colunas foram saindo, aí um dos editores da revista pediu: “Por que você não faz uma exposição com o que você tem? Você tem gibi, pôster, card. Faz uma exposição”. Nessa época ia inaugurar a gibiteca. Isso foi em 1981.
P/1 – Em São Paulo?
R – Já se passaram 16 anos. A gibiteca começou em São Paulo. Foi uma ideia da prefeitura: de ter biblioteca para livros e a gibiteca, que seria uma coleção de gibis para as pessoas virem ler os gibis, sem pagar nada e ter uma leitura mais leve. Nessa primeira gibiteca eu fiz a exposição do Fantasma. Houve uma boa repercussão nos jornais e noticiários, [anunciando] que ia ter a exposição. Tive uma boa visita, uma boa frequência. Nos jornais, saiu a página inteira falando do assunto; os canais de televisão também se interessaram.
Os canais de televisão pediram para filmar o que tinha lá: as revistas, os pôsteres e os cards. Era pouca coisa, a princípio. Houve uma boa divulgação por televisão. A partir do próximo ano, eu vi que o herói que fazia aniversário já tinha tantos anos de criação e comecei a aumentar a minha exposição. Comecei a adquirir o que se chama de memorabília.
Memorabília são bonecos, aneis. No caso, o anel do Fantasma, quando ele dá o soco no bandido e fica registrada a marca da caveira, né? Esse é um deles. O Fantasma tem esse, que é o anel da caveira para os bandidos, e tem também outro anel, que é o anel da proteção do Fantasma. Ele coloca levemente no pulso das pessoas e as pessoas que têm essa marca do Fantasma passam a ter a proteção da família dele. Então, de fazer os escritos e as exposições, elas acabaram cada ano crescendo cada vez mais. Comecei a ser chamado... Para cada vez que tinha um movimento qualquer de gibi, eu era chamado para aumentar a divulgação baseada nas imagens, que com o tempo eu fui adquirindo. Depois da memorabília, que eram coisas pequenas, eu comecei a fazer a cenografia. Como o meu herói mora numa caverna e ministra justiça ao pessoal em volta, ele senta num trono, aí mandei fazer o trono. Tem duas caveiras e uma corrente do lado. A corrente é porque tem uma história que dá uma boa mensagem, uma boa lição. Fiz também o boneco do Fantasma com o rosto vazado e um boneco do tamanho que a pessoa possa ir por trás e colocar o rosto e sair na figura do Fantasma.
As pessoas ficam tão contentes que saem ‘de Fantasma’, como se tivessem adquirindo as boas qualidades do Fantasma, que são honestidade, pontualidade e querer ajudar os outros, uma coisa rara porque as pessoas são muito egoístas e aprendem a viver em um mundo em que têm que lutar muito para conseguir fazer as coisas. Esquecem um pouco o lado humano que é se dar bem, ser irmão, esse lado fraterno, que tanto o Fantasma, que é o personagem, como o autor, mostram. Isso tudo são lições para as humanidades, isso tudo o autor coloca por intermédio do personagem, que é o Fantasma.
P/1 – Essa história da corrente que o senhor falou, conta pra gente.
R – A história é interessante porque é uma boa lição. O 21° Fantasma ajuda a ministrar justiça e duas tribos indígenas estavam lutando por causa do rio. Cada uma achava que o lado do rio era dela e queria avançar um pouco para pegar mais peixe que a outra. A outra [tribo] pegava mais peixe. Eles começavam a guerrear. E era guerra de matar uns aos outros. Quando a guerra estava bem feia, chamaram o Fantasma para tentar pacificar. Ele ia, pacificava, conversava com todos os chefes e falava: “Então vamos fazer certo: você fica com essa metade certa, você fica com essa metade. Você pesca aqui, você pesca ali e dá tudo certo”. Por uns tempos eles continuaram pescando e, dali a pouco, um começava a entrar no lado do outro e começava de novo a guerra. Chamavam o Fantasma, ele ia lá e pacificava. Assim aconteceram diversas guerras, sempre guerras, até que um dia ele se encheu e falou: “Não vou mais pacificar ninguém, não vou ajudá-los a resolver isso. Estou cheio”.
No trono que ele sentava tinha uma corrente. Aí veio um dos indígenas, o mais velho da tribo dele. A tribo morava do lado dele; ele veio e falou: “Pai Fantasma, agora eu vou te contar a história da corrente porque o seu pai pediu para que contasse pra você no dia que acabasse a sua paciência com alguma coisa qualquer. Só agora eu poderia contar e vou lhe contar. O seu pai e a sua mãe... Antes de se casarem, eles se conheceram e sua mãe um dia veio para casar com ele. No navio em que ela veio vinha um príncipe também, que era dono de uma terra distante. Era muito corrupto, muito sem vergonha, mas se apaixonou por ela. E o que ele fez? Ele a raptou e a levou para a terra dele.
O Fantasma acabou sabendo disso, o 20° Fantasma, e foi lá na terra desse príncipe tentar resgatar a que seria a esposa dele. Foi difícil, o príncipe conseguiu prendê-lo. Prendeu o 20° Fantasma e o acorrentou em uma corrente em volta de um moinho, que era para dar água, ficar movimentando a água e para o grão se transformar em farinha. Ele ficou lá e ela ficava lá de cima do palácio, o vendo. Ele não conseguia se soltar da corrente, ficava dia e noite, dormia lá mesmo. Ele notou que cada vez que ele dava a volta, um elo da corrente raspava em um lugar. Ele calculou que se aquilo raspasse muitas vezes, talvez aquele elo abrisse e ele poderia se soltar. E ele continuou, que nem um boi, e vinha, vinha, até que um dia [o elo] abriu e ele se soltou. Ele lutou com o príncipe, derrubou o príncipe e combinou com o povo que ele não era bom. O povo chegou em um acordo de tirar o príncipe e colocar um novo administrador. Ele pegou a noiva dele, levou para a casa dele, para a caverna onde ele morava, casou-se com ela e ela é a mãe do 21°Fantasma”.
É a história que se encerra. A moral qual é? Para aprender, as pessoas tem que ter paciência, sabedoria e aprender as coisas da vida. Às vezes são difíceis, mas vai com calma, com jeito. Estuda, pensa qual é a melhor maneira. Essa foi a lição: sabedoria e paciência.
P/1 – O senhor quer falar um pouquinho sobre o site do senhor?
R – Sim. Por eu ser convidado para fazer as exposições, as minhas colunas saírem em revistas, comecei a ser convidado para os canais de televisão, jornais. As revistas também se interessaram, começaram a me entrevistar e fazer colunas do meu trabalho. As estações de rádio sempre me chamaram para dar entrevistas, então a partir daí passei a ser uma pessoa divulgada na mídia, que antes era só televisão, rádio, jornal e revista.
Com a entrada da internet, eu - junto com o meu filho, que me aconselhou a fazer um site -, nós fizemos o primeiro site. Com esse material que eu preparei, nós fomos então preparando; digitar e separar por episódios, capítulos. Esse foi o meu primeiro site. Ele acabou ficando realmente tão bem feito, tão completo, que os jornalistas do Brasil e fora do Brasil pegavam informações dele para utilizar nas suas outras reportagens. Ficou tão bem feito que eu imprimi esse site e ele deu mais ou menos 130 páginas. Eu imprimi e ficou sendo o meu livro, que sempre mostro para os editores, na ideia de um dia algum deles fazer o meu livro. Eu ainda não tenho o meu livro, eu tenho só esse material, que na verdade é em linguagem de site, não é em linguagem de livro, tem algumas páginas que não estão completas porque ele foi impresso pela linguagem de site.
Depois desse site, eu não queria mais tanta informação. Diminuí um pouco e a partir daí eu fiz mais dois sites. Atualmente estou com o recente, que é fantasmafriends.cjb.net. Esse é o meu atual.
P/1 – Agora para finalizar: eu gostaria de perguntar que lições que o senhor tirou dessa vida tão rica que contou para a gente?
R – Como eu já falei quase todas as lições, uma delas é essa: o Fantasma representa um herói. Na verdade, o autor o coloca como uma pessoa de mais ou menos 1,90 a 2 metros. Seria uma pessoa bem alta mesmo, não muito como o brasileiro. O brasileiro é menor, 1,70, 1,60. As mulheres são 1,60, 1,50, não são muito altas. Mas ele simbolizava sempre o herói, o gigante. E isso é muito bom para ele lutar contra os criminosos porque se ele tem 2 metros, ele vai lutar com o de 1,70, ele tem sempre uma vantagem.
Quais as lições que o Fantasma passa e que para mim foram muito úteis? Essas lições de tentar ajudar os outros, essa é uma delas. Na medida do possível ajudar outras pessoas, o que é raro. As pessoas desde cedo são educadas para vencer na vida; vencer é difícil e ainda ficar ajudando todo mundo. É bom cuidar, ajudar o outro.
Outra [lição]: o Fantasma cuida muito da sua alimentação, ele é bem frugal para alimentação, ele come coisas leves, nada de comer coisas muito fortes, que vão fazer o corpo inchar para tudo que é lado, ficar muito gordo. O Fantasma representa um tipo atlético.
Então, o que eu fiz? Eu usei todos os ensinamentos e procurei me manter assim, sempre magro. Quando eu tinha 20 anos eu tinha 60 quilos. Agora eu já tenho 70 anos e tenho a mesma coisa, 60 quilos. Estou sempre com o mesmo peso, eu cuidei muito do meu corpo. Estou sempre passando isso para as pessoas, na medida do possível, se manter com o peso bem baixo, não muito, porque se é muito gordo o coração, o pâncreas, o fígado e o estômago trabalham muito, e é banha para tudo quanto é lado (risos). Outra coisa também, beber leite, que é muito saudável, faz bem. O Fantasma bebe leite e deixa de lado a bebida alcoólica.
Outra coisa, o Fantasma nunca fumou na vida dele. Uma vez eu experimentei fumar para ver como é que era: [um] negócio ruim, horrível, amargo, aí vai beijar outra pessoa com esse cheiro de alcatrão, nicotina. [É] Horrível isso, sai fora.
Essas foram as lições que me serviram muito. E o que eu faço disso tudo é aprender comportamento, como as pessoas se comportam, como eu me comporto e, na medida do possível, tentar entender as pessoas e os outros me entenderem, para não viver em guerra e em briga. Acho que é o que eu tirei disso tudo.
P/1 – E o senhor gostou de dar esse depoimento aqui?
R – Eu gostei porque sei qual a ideia do Museu da Pessoa: é perpetuar a vida das pessoas, que poderão servir de exemplo para outras pessoas que vão ver, de uma maneira ou de outra, o que o museu tem em imagens e sons. Isso tudo vai ajudar as pessoas. Acho que a intenção do Museu da Pessoa é essa: perpetuar a experiência de vida das pessoas para que outros possam ver, se espelhar nisso e procurar fazer coisas boas ou melhores.
P/1 – O Museu da Pessoa agradece a sua entrevista.
R – Obrigado.
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