P/1 – Paulo, boa tarde!
R – Boa tarde.
P/1 – Você poderia começar falando o seu nome completo, local e data de nascimento, por favor?
R – Meu nome é Paulo Roberto de Lima, eu nasci em Vitória de Santo Antão, no dia 2 de fevereiro de 1983.
P/1 – Paulo, você poderia falar um pouco dos seus pais, atividade deles, como eles se conheceram?
R – Meu pai: Samuel Pereira de Lima; minha mãe: Maria Luiza da Silva. Meu pai conheceu minha mãe quando trabalhava no engenho. Meu pai, ele era caminhoneiro e transportava cana, que é uma cultura muito forte lá da região, que era a questão do canavial, e minha mãe cortava cana. Minha mãe era da lavoura e meu pai conheceu ela lá, nessa usina – e lá eles se conheceram, namoraram e terminaram casando.
P/1 – E onde que é a usina?
R – A usina era em Chã de Alegria.
P/1 – E onde ficava, que município?
R – Chã de Alegria.
P/1 – E você nasceu onde?
R – Eu nasci em Vitória de Santo Antão, porque, depois que namoraram, noivaram, casaram, foram morar em Glória do Goitá, que é a cidade onde a gente vive hoje. E lá, em Glória de Goitá, meu pai trabalhou numa granja há 23 anos, e foi lá onde eu nasci, que é a Granja Carvalho. Meu pai, depois desses 23 anos, ele deixou de ser caminhoneiro, abriu seu próprio negócio e é lá que a gente vive até hoje.
P/1 – Você então passou a infância onde? Você podia falar um pouco do lugar onde você passou, descrever onde que era?
R – Eu nasci lá na Granja Carvalho, na época era uma granja muito pequena, meu pai quando chegou lá tinha 17 anos. Ele casou com a minha mãe, tinha 17 anos; casaram muito jovem. Eu vivi do meu nascimento até meus 15 anos nessa granja. Então, com os meus 11 anos, eu já trabalhava nessa granja, que era produção de ovos, lá no município de Glória do Goitá.
P/2 – Você tem irmãos?
R – Tenho, eu tenho duas...
Continuar leituraP/1 – Paulo, boa tarde!
R – Boa tarde.
P/1 – Você poderia começar falando o seu nome completo, local e data de nascimento, por favor?
R – Meu nome é Paulo Roberto de Lima, eu nasci em Vitória de Santo Antão, no dia 2 de fevereiro de 1983.
P/1 – Paulo, você poderia falar um pouco dos seus pais, atividade deles, como eles se conheceram?
R – Meu pai: Samuel Pereira de Lima; minha mãe: Maria Luiza da Silva. Meu pai conheceu minha mãe quando trabalhava no engenho. Meu pai, ele era caminhoneiro e transportava cana, que é uma cultura muito forte lá da região, que era a questão do canavial, e minha mãe cortava cana. Minha mãe era da lavoura e meu pai conheceu ela lá, nessa usina – e lá eles se conheceram, namoraram e terminaram casando.
P/1 – E onde que é a usina?
R – A usina era em Chã de Alegria.
P/1 – E onde ficava, que município?
R – Chã de Alegria.
P/1 – E você nasceu onde?
R – Eu nasci em Vitória de Santo Antão, porque, depois que namoraram, noivaram, casaram, foram morar em Glória do Goitá, que é a cidade onde a gente vive hoje. E lá, em Glória de Goitá, meu pai trabalhou numa granja há 23 anos, e foi lá onde eu nasci, que é a Granja Carvalho. Meu pai, depois desses 23 anos, ele deixou de ser caminhoneiro, abriu seu próprio negócio e é lá que a gente vive até hoje.
P/1 – Você então passou a infância onde? Você podia falar um pouco do lugar onde você passou, descrever onde que era?
R – Eu nasci lá na Granja Carvalho, na época era uma granja muito pequena, meu pai quando chegou lá tinha 17 anos. Ele casou com a minha mãe, tinha 17 anos; casaram muito jovem. Eu vivi do meu nascimento até meus 15 anos nessa granja. Então, com os meus 11 anos, eu já trabalhava nessa granja, que era produção de ovos, lá no município de Glória do Goitá.
P/2 – Você tem irmãos?
R – Tenho, eu tenho duas irmãs, só que meu pai já foi casado, teve outros filhos também. Eu tenho um irmão que mora em Glória do Goitá, onde eu vivo, tenho uma irmã aqui em Recife, e outra em São Paulo, de outro casamento do meu pai.
P/1 – E como era o trabalho na granja? Que tipo de trabalho você fazia?
R – Eu trabalhava no que a gente chama... porque quando numa granja, quando os pintos chegam, tem os processos deles: quando chega novinho, processo quando ele está virando pinto e processo quando ele está em produção. Quando eu iniciei a trabalhar, eu vacinava esses pintos, então, quando eu estava já com idade, meus 12 anos, eu comecei a trabalhar num galinheiro: eu trabalhava apanhando ovos, colocava na bandeja, aquela bandejinha que vai... Com meus 14 anos, eu trabalhei numa máquina de classificar, aí, depois eu aprendi a dirigir. Aí eu fiquei. Como eu já tinha influência do meu pai na granja, então eu fiquei: eu carregava ração para os galinheiros e organizava toda a questão de transporte lá na granja.
P/1 – E seus irmãos, eles ajudavam?
R – Não, minha irmã, a mais nova, tem 15 anos... a mais nova tem 8 anos e a mais velha tem 15 anos.
P/1 – E dava tempo para brincadeira? Que tipo de brincadeira vocês tinham lá?
R – Não, a minha infância foi, assim, muito convívio com pessoas mais idosas, muito trabalho, eu não tive muito espaço para brincadeira não. Fazer estudar e trabalhar. Minha família não era uma família pobre, paupérrima, mas meu pai sempre me envolveu nessa questão de trabalho, me envolvia na questão do trabalho junto com ele.
P/1 – Você ficou na granja até que idade mesmo? Você falou...
R – Até os 16 anos, até os meus 16 anos eu fiquei na granja. E depois de 16 anos foi quando eu saí. Aí, o meu pai fez uma casa para ele na cidade, porque a gente morava também a três quilômetros – a Granja Carvalho fica há três quilômetros da cidade. Aí, quando meu pai fez essa casa, eu passei um ano também sem fazer nada. Depois, eu entrei para trabalhar num mercadinho. Trabalhei durante sete meses no mercadinho, aí, depois eu saí do mercadinho e ia entrar noutra granja. Eu ia trabalhar na mesma profissão, na máquina de classificar, que era uma máquina nova, tinha computador e tal – eu não mexia no computador, mas ficava numa linha que mexia com as máquinas –, e lá foi quando saiu o Projeto Aliança com o Adolescente para o Desenvolvimento Digital do Nordeste, no qual Serta, empresário parceiro, Serviço de Tecnologia Alternativa... aí, eu fiz a inscrição – a primeira inscrição eu fiz errada, aí deram outra oportunidade, porque não preencheu o total de jovens necessário. Aí, fui e passei. Quando eu entrei para o projeto, que é projeto de Agente de Desenvolvimento Local, que tem a duração de dois anos, quando eu entrei, comecei, iniciei o processo de formação, que passava por várias linhas, processo de formação.
P/1 – Talvez seria legal, a gente vai voltar...
R – Vai voltar, né?
P/1 – Um pouco atrás, estou pensando... você falou várias vezes das granjas do município, o que produz o município, assim, qual é a atividade econômica do município? Que tipo de trabalho tem lá, como é que é?
R – O município, aquela região, é um município pobre. A atividade econômica dele... ele na verdade sobrevive dos granjeiros que tem, que hoje tem poucos, que alguns fecharam, e da questão agrícola. A forte produção econômica mesmo, a produção forte, é a questão da agricultura lá no município.
P/1 – Que tipo de produtos? O que é que se produz?
R – Farinha, coco, banana... a questão da agricultura, da bovinocultura, essa é a linha.
P/1 – Cana tem menos?
R – Cana hoje tem muito menos, o pessoal não produz mais essa questão da cana, canavial.
P/2 – Você estudava também?
R – Estudava.
P/2 – E onde era? A escola era perto, quando você morava na granja?
R – Quando eu morava na granja, a minha primeira escola foi no grupo escolar, na área rural, que ficava mais ou menos a um quilômetro. Até a minha quarta série, eu estudei lá. Depois, eu comecei a estudar na cidade, ficava a três quilômetros, eu ia a pé; depois, comprei bicicleta e eu ia de bicicleta, estudei até a sétima série. Aí, depois foi quando eu fui estudar no Dom Miguel, que era uma escola particular, aí já tinha o transporte: o dono da granja também estudava, aí eu pegava carona com ele.
P/1 – E onde que era esse Dom Miguel?
R – Era em Glória também.
P/1 – Na cidade.
R – Uma escola cenecista rede de ensino brasileira, Rede Campanha Nacional de Escolas da Comunidade, ou Rede CNEC, criada em Recife pelo educador Felipe Thiago Gomes, em 1943].
[
P/1 – Fala um pouco, você disse que foi do supermercado que você entrou em contato com a parte de computação? É isso?
R – Não, na verdade, o meu contato com a informática foi em 2000 mesmo. Eu já tinha feito um curso de informática em 1998, mas passei só dois meses, desisti. Não tinha nenhum interesse pela área, nem sabia que eu ia me identificar na área.
P/1 – E o acesso à computação nesses municípios, na vizinhança, entre seus amigos, seus colegas, ou você mesmo, como é que era na sua infância?
R – Na verdade, a questão do acesso não tinha, por ser um município muito pobre. Algumas pessoas que tinham influência na cidade é que tinham computadores. Num dado do IBGE de 2000, só 200 pessoas tinham acesso a informática, e apenas 30 tinham computadores.
P/1 – No município?
R – No município.
P/1 – De Glória do Goitá?
R – De Glória do Goitá.
P/1 – E como foi – agora se desse para retomar e contar o projeto do Serta – como que foi isso?
R – Quando eu trabalhava no supermercado, quis sair. Foi quando anunciou lá na cidade que chegou a ONG, que tinha chegado a ONG, que é o Serta, Serviço de Tecnologia Alternativa, eles em parceria com quatro instituições: Instituto Ayrton Senna, Fundação Odebrecht, o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social] e a Fundação Kellogg. Eles, em parcerias com essas instituições, lançaram o Programa Aliança com o Adolescente para o Desenvolvimento Digital do Nordeste e, nesse programa, eles tinha uma formação que chamam de ADL, Agente de Desenvolvimento Local, que tem a duração de dois anos de formação. E nessa formação, os jovens passavam por várias linhas de ações, que era de acordo com a realidade de cada município: a questão da agricultura, questão de direito e cidadania, questão da arte, da cultura local, questão da informática e, quando eu entrei aí, com três meses a gente conseguiu 40... o certo era conseguir 40 computadores doados pela Fundação Odebrecht e dez pelo Mega Ajuda do CDI [Centro de Documentação e Informação, do estado de Pernambuco], foi quando a gente tornou-se CDI... porque, na verdade, antes de existir o CDI Pernambuco, a gente foi CDI primeiro do que o CDI Pernambuco; chamava CDI Bacia do Goitá e lá apareceram várias oportunidades.
P/2 – Que ano isso?
R – Em 2001. Nisso houve algum convite de alguns jovens que se interessassem pela área para entrar nesse processo, na questão da informática, e tentar criar uma proposta de inclusão digital, que favoreça a potencialidade da localidade. Nisso eu entrei. Não sabia nem manusear um computador praticamente. Foi quando eu passei três meses estagiando e a gente começou a implantar as EICs [Escolas de Informática e Cidadania], e primeira EIC implantada foi em Glória do Goitá, no município, na comunidade de Apoti, que fica a 18 quilômetros do município de Glória do Goitá. Aí, depois, a gente implantou em Feira Nova, que é outro município, depois Pombos, depois Lagoa de Itaenga, que são quatro municípios que fazem parte do projeto Aliança com o Adolescente; são esses quatro municípios que fazem parte da Bacia do Goitá.
P/2 – Tinham quantos jovens envolvidos?
R – Nesse processo de seleção de dois anos, de formação de dois anos, são 30 jovens de cada município. Então, ao todo 120 jovens numa ADL, Agente de Desenvolvimento Local.
P/1 – E o que é que você esperava quando você entrou na ADL? Como foi esse convite, como você ficou sabendo? O que é que você pretendia? Você podia descrever?
R – Eu fiquei sabendo do programa, dessa informação, pela rádio comunitária, e também por um colega meu que me chamou, só que eu não queria ir, porque eu já estava com emprego garantido, ganhava o meu dinheiro, eu não tinha vontade de ir. Só que ainda faltava um mês para eu entrar no emprego, e era o tempo que estava para a seleção, então eu fiz só por fazer, como se diz. Na verdade, eu ia entrar depois desse mês. Eu ia sair para o meu emprego, só que quando eu entrei no programa de formação, eu mudei totalmente no primeiro mês, consegui ter uma outra visão do meu município, das pessoas, de convívio, de relacionamento.
P/1 – O que é que aconteceu?
R – Deu uma viravolta na verdade na minha vida, na questão de relacionamento com pessoas, uma visão em participação com os jovens na questão, essa visão da pessoa estudar, se formar e sair de onde estava para ir para São Paulo, então isso a gente conseguiu reverter. Tem alguns casos que a gente tem até lá comprovado, então foi isso aí.
P/1 – Você poderia falar um pouco do Serta? De onde veio a ideia, como surgiu? Um pouco de história do Serta.
R – O Serta, Serviço de Tecnologias Alternativas, ele foi fundado em 1989 por agricultores, nos municípios de Catende, Orobó e Surubim. Na época, esses técnicos, que hoje são diretores do Serta, eles faziam parte de um programa chamado Cecapas [Centro de Capacitação e Acompanhamento a Projetos Alternativos da Seca], que era um programa contra a seca. Na época, aquela região enfrentava um grande problema com a seca e a migração das pessoas saindo da área rural para a cidade grande. E o Serta tem uma proposta que é chamada de Peads, Proposta Educacional de Apoio de Desenvolvimento Sustentável, e, a partir dessa proposta, eles conseguiram fazer várias mudanças nessa localidade. Quando esse programa acabou, não tinha mais como se sustentar, as professoras, porque a escola também era envolvida, e o município local era envolvido, não queriam... Que as pessoas que iniciaram isso, que isso eram propostas dos técnicos, não era do Cecapas, porque no meio tinha uma pessoa que era filósofa e tal. Então eles tinham uma dinâmica própria desse grupo e, quando o programa acabou, os próprios professores e a própria comunidade assumiu, adotou; na verdade, esses técnicos, cada um na sua casa, eles não tinham salários, mas continuaram um processo de mutirão, de capacitação dessas comunidades, foi de lá que surgiu o Serta, com essa proposta de desenvolvimento local integrado e sustentável. Aí, em 1999, 1997, voltando um pouco... em 1997, eles foram convidados para lançar o programa PETI, que é o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, onde eles tiveram vários sucessos novamente, vários reconhecimentos. Foi premiado em terceiro lugar no prêmio da Unicef [Fundo das Nações Unidas para a Infância, em português], por esse programa. Em 1999 ele foi convidado por instituições para, em parceria com elas, lançar o programa-piloto do projeto Aliança com o Adolescente para o Desenvolvimento Digital do Nordeste. Chegando lá, eles tiveram esse programa, que hoje ampliou-se, hoje tem o que chamava ADL, Agente de Desenvolvimento Local, hoje é Formação de Adolescente para o Desenvolvimento, e hoje tem o que a gente chama de Serta Resultado, que é a formação de educadores, também para o desenvolvimento sustentável, onde se trabalha também a proposta Peads. Tem também a formação de produtores. Dessa formação de produtores, agora recentemente a gente acabou de inaugurar a primeira agroindústria de produtos de beneficiamento de produtos orgânicos. É uma produção muito forte, e próximo ano a gente vai ser reconhecido...
P/2 – Que tipo de produto?
R – Hortaliças, doces, toda essa linha de produto da agricultura, carnes de boi, de bode, orgânico, e próximo ano nós vamos ser reconhecidos pelo estado como centro tecnológico da agricultura familiar orgânica. Agora mesmo, recentemente, a gente ganhou prêmio, ficou em segundo lugar do prêmio da Unicef 2003, participação para o desenvolvimento.
P/2 – Você continuou na instituição?
R – Continuei.
P/2 – Qual foi a sua trajetória dentro da instituição?
R – A minha trajetória é: em 2000 eu entrei na formação, com três meses eu fui convidado a participar do processo da questão da informática – na época quem coordenava era outra pessoa e, nesse meio tempo, a gente começou o processo de formação, e tenho vários colegas que se envolveram, que hoje estão na linha de informática, em outras oportunidades que foram surgindo por parte da empresa. Aí, eu comecei estagiar, passei um período de estágio de sete meses dentro da instituição, na área, onde a gente fazia manutenção, eu estava aprendendo ainda, fazia manutenção das EICs, manutenção dos computadores da empresa ADL, e estudando e sempre fortalecendo – hoje a gente está com a massa muito bem formada na questão da inclusão digital para o desenvolvimento, que a gente chama, sete meses eu passei pelo estágio. Depois eu entrei... eu era coordenador de campo... e depois essa pessoa se afastou, e a gente reorganizou o programa; e hoje a gente está com um espaço que chama Informática, Comunicação e Cidadania, onde a gente tem jovem envolvido na questão de vídeo, na questão da rádio, na questão da informática e criando – tentando criar – tecnologias que favoreçam a questão do município, das potencialidades e das dificuldades que o município enfrenta. Um dos resultados também é essa questão da gente estar vendendo produtos pela internet, onde também tem intervenção de alguns jovens, de produtos orgânicos, de jovens envolvidos na questão da inclusão digital.
P/1 – E como é que vocês estão tratando da utilização da tecnologia para incentivar a agricultura orgânica? Como que está isso?
R – Uma das nossas visões, de quando a gente vai dar [aulas?] aos adolescentes, é de que a informática não pode tirar as pessoas do que elas fazem, a informática tem que potencializar o que elas fazem. A gente fala que, ao contrário da escola de informática tradicional – porque, se um produtor vai ter aula numa escola de informática tradicional, ele é incentivado a deixar o campo, desvalorizar a cultura se aprende nessas escolas tradicionais... e a gente não, diz o contrário –, o campo é negócio, existe forma de sobrevivência, existe tecnologia para o campo e a informática é um dos meios e acesso para que você fortaleça o que você já faz, isso na questão da agricultura, na questão cultural, na questão da arte local, na questão das políticas públicas, envolvimento dos jovens, participação e liderança. Essa é uma das propostas do programa. Próximo ano mesmo a gente está com a ideia de lançar o projeto, para que a gente tenha um telecentro, um EIC telecentro na área rural e outro EIC telecentro na área urbana, que seja um espaço de encontro de mobilização daquela região, o que a gente chama de território, porque a gente traçou essa microrregião, Bacia do Goitá, e definiu os territórios a partir da quantidade de pessoas envolvidas nos programas do projeto. A gente quer que a informática seja um meio, uma ferramenta de apoio ao desenvolvimento sustentável.
P/1 – Voltando talvez um pouco à formação desse CDI regional que você falou, você poderia falar um pouco, desenvolver um pouco como seria o processo de formação e como ele deixou de ser?
R – Na verdade, o Serta, quando chegou, na Bacia de Goitá não tinha nenhuma experiência com informática, o que ele tinha eram dois computadores, 133 e 233, e bem poucas pessoas que sabiam manusear. E Moura, Abdala Moura, que é o presidente do Serta, foi convidado a participar da reuniões no Rio de Janeiro e, chegando lá, Adelino Vieira, que era a pessoa responsável pela articulação do Instituto Aliança com o Serta na época – que hoje não é mais, é outra pessoa, é Marcelo Campos –, conseguiu conhecer o Rodrigo Bajo. E lá apresentou um pouco do projeto, conversou com ele, falou um pouco da região e conseguiram... ele lançou uma proposta de lá se tornar um CDI, aquele espaço, e conseguiu 40 computadores pela Fundação Odebrecht com articulação da ___ mais 10 pelo Mega Ajuda. E nesse meio tempo lançaram ele como coordenador e tal. Aí, montou o CDI, só que a gente não tinha experiência acumulada e nem tinha feito intercâmbio. Na verdade, foi muito pelo resultado e pela mobilização que estava havendo e muito por articulação de pessoas envolvidas num projeto, só que a gente foi ter muito problema por conta disso, porque a gente estava frequentemente reestudando e sendo questionado [sobre] qual é o papel da informática dentro desse projeto. Ele tem que ser diferenciado, ele não pode fazer o que as outras escolas de informática fazem, tem que ter uma política de envolvimento e participação das pessoas. E nesse meio tempo, a gente foi refletindo e refletindo... foi também assim que saiu o CDI Pernambuco. O CDI Pernambuco disparou na frente até pela experiência de pessoas já envolvidas na questão da inclusão digital. O Serta não tem nenhuma experiência; na verdade, até hoje nas reuniões a gente está chamando de novas linhas de ações, que é a questão da inclusão digital. A gente está esquematizando, está organizando as propostas, então a gente foi vendo que a gente não dava para ser CDI, para ser institucionalizado como CDI. Foi quando essa pessoa saiu, aí, eu fiquei, vim conhecer Paulo, Paulo Arraripe, que na época era o coordenador do CDI de Pernambuco, e fui conversar com ele esses problemas, como é que a gente estaria mais próximo, porque a gente não tinha nenhum contato com o CDI de Pernambuco, era o CDI aqui e a gente lá. Como é que a gente se aproxima, a gente une essas forças, essas experiências que vocês tem aqui na zona urbana, na capital, com as da gente lá, na área rural. Então foi quando a gente decidiu não ser mais CDI. Nós temos nossa própria gestão, na questão de gestão nós somos CDI, agora burocraticamente nós somos EICs: cada município tem sua EIC, então de lá para cá a gente está tendo um acompanhamento do CDI. Houve muitas melhoras depois do acompanhamento do CDI Pernambuco, a gente conseguiu sistematizar a questão das aulas técnicas, questão das aulas de cidadania, abordando tema de cidadania, problemas da comunidade, das aulas, os educadores conseguiram se desenvolver mais e mais, e hoje mesmo, agora, o pessoal está lá em capacitação terminando o último módulo de capacitação. Então, houve muitos avanços nessa questão de trazer, unir essa experiência.
P/2 – Vocês articulam essas outras EICs?
R – É.
P/2 – Como se dá essa articulação?
R – Em 2000, como foi que aconteceu? Eu vou pegar 2000 porque todo processo de articulação iniciou em 2000. O que foi que a gente fez? A gente reuniu município, porque todo programa que a gente trabalha a gente tenta envolver o município para que esse programa, esse projeto, se torne, e consiga tornar, e a comunidade consiga tornar... isso é numa política pública, então o que foi que a gente fez? Em 2000, a gente chamou o município para o Serta e a gente reuniu o pessoal e começou a explicar o que seria o programa, o que seria o projeto, qual a visão de futuro do projeto e o que é que eles achavam. Aí, o que é que aconteceu? A gente apresentou o projeto de formato e disse: a gente está com esse projeto, a gente está precisando de um espaço e está precisando de salário ou ajuda de custo para instrutores. Aí, a gente é responsável pela parte pedagógica e acompanhamento e técnica das máquinas e do espaço, e eles sedem o espaço físico e os educadores, e o transporte, computador que queima, precisa de uma fonte, eles ressarcem esses custos. É tudo de parceira.
P/2 – Com a prefeitura?
R – Com a prefeitura.
P/2 – Mas com a prefeitura de...?
R – De todas, Feira Nova, Pombos, Glória de Goitá e Lagoa do Itaenga.
P/2 – E Lagoa?
R – Do Itaenga. São quatro municípios que fazem parte do programa Aliança. Em Lagoa do Itaenga a gente avançou tanto que hoje o município já tem gestão própria da EIC. É um espaço com 15 computadores novos, que eles já compraram, pelo orçamento da prefeitura, dentro do orçamento participativo já, que foi na linha de direitos e cidadania, que a gente chama sempre de resultado.
P/2 – Quem são os alunos dessas escolas? Dessas EICs?
R – São pessoas da comunidade e de escolas...
P/2 – Jovens? Adultos?
R – Tem turmas com jovens e tem turmas com adultos, tem turmas para crianças também, é muito diversificado o grupo. E a gente agora está criando uma linha de curso e está chamando de curso específico, ou curso por demanda; por exemplo, a partir do encontro que houve de mobilização, a gente foi fazendo alguns estudos dentro dos territórios, por exemplo, o que é que eu quero daqui a dez anos na questão da agricultura? O que é que eu quero [daqui] a dez anos na questão da educação? Então, a gente está criando turmas específicas, criou-se o grupo. A gente está fazendo o curso com o pessoal da educação, com o pessoal da agricultura, o pessoal da arte, para, a partir da informática, estar criando ferramentas, ou estar discutindo, ou estar facilitando processo de vivência para esse povo que está envolvido nesses projetos.
P/1 – E esses grupos atuam nas EICs? Como que é isso? Cada EIC é voltada a um grupo? Como é que é?
R – Cada turma, não são todas as EICs, é muito específica por território. Então, a gente tem uma turma lá, por exemplo, na agricultura... então, o pessoal montou uma associação, aí, a EIC estava lá dentro ajudou eles a montar a associação; tem reunião, o pessoal vai para o espaço da EIC, discutem. Aí, tem o educador. Ele já facilita esse processo. A gente está ajudando eles a organizarem um projeto para eles adquirirem computadores, então, para que esse espaço de mobilização, a EIC, não seja só um espaço de aprendizagem, mas de valorização de encontro das pessoas, onde as pessoas se conheçam, façam intercâmbio das experiências.
P/2 – E nesses quatro municípios vocês têm parceria com a prefeitura?
R – Tem parceria com a prefeitura. Em todos os locais que o Serta vai fazer projeto, ele tenta fazer parceria com alguma organização, ou prefeitura, ou associação, mesmo que não faça a gente coloca.
P/2 – Além das prefeituras, vocês têm parceria com outras?
R – Tem, outras instituições.
P/2 – Por exemplo?
R – Por exemplo, associação, sindicatos, associação de moradores... A gente tenta envolver a comunidade, ou alguma liderança local.
P/1 – Como que é a captação de recurso do Serta? Como ele se mantém? Como mantém as EICs?
R – As EICs hoje... eu vou falar um pouco das EICs, e volto para a questão da captação de recurso do Serta. As EICs hoje, na verdade, sobrevivem dessa parceria com o CDI. O CDI Pernambuco, e também com a prefeitura, são as pessoas... são as instituições mantenedoras da EIC. Por exemplo, se quebra um computador, quando a prefeitura não consegue [consertar], o Serta consegue; quando o Serta não consegue, o CDI consegue. Então, é muito nessa articulação, parceiro que chega, aí vem impressora; o que a gente recebe... tem mês lá de a gente receber 3 mil visitantes, a gente já chegou a receber por mês mil instituições lá no Serta. Nós estamos refazendo toda a estruturação de visita, estamos fazendo lá toda organização das UPs que são unidades produtivas. Na foto... no vídeo que vocês forem assistir vocês vão ver, é enorme também o espaço. Então, aos parceiros que chegam, a gente divulga. A gente já recebeu computadores. Prefeitura doa computador, impressora e salário dos educadores e algumas bolsas de alguns voluntários, têm voluntários sem bolsa, sem recurso, os próprios alunos que se identificam dentro desse processo, e assim que a EIC vai sobrevivendo, e o Serta... o Serta, logo em 1989, quando eles começaram – vou pegar do início, em 1990 – foi quando o Cecapas acabou; este grupo queria sair e eles continuaram. Nesse período, quem o manteve foi o município e as professoras. Depois, o Serta foi dando algumas capacitações de alguns cursos no Cabo de Santo Agostinho, e lá conheceu o Centro de Mulheres do Cabo, onde eles pegaram uns projetos do governo, da FAT, Fundo de Amparo ao Trabalhador, e em 1997 o PETI, que segurou o Serta durante dois anos, e em 1999 o programa Aliança com o Adolescente – agora mesmo em outubro está sendo a formatura da última turma do projeto-piloto. A gente não está acabando projeto, mas as instituições parceiras estão saindo da Bacia do Goitá. O projeto Aliança continua, mas os seus parceiros estão indo para uma microrregião na Paraíba. Então, vai ser a reaplicação desse projeto em outra localidade no estado de Pernambuco, porque esse projeto Aliança com o Adolescente tem microrregião – ele aplica em três estados: no Ceará, na Bahia e em Pernambuco. Então, o projeto está completando quatro anos e está saindo. Agora o Serta está com novos programas: está capacitando 40 município no estado de Pernambuco, na proposta que é a Peads, e também estamos com os cursos...
P/2 – Desculpa, a proposta?
R – Peads, Proposta Educacional de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável. A gente está capacitando o projeto Educar, do projeto Dom Helder Câmara, o PDHC, e tem também o projeto da ___, que inicia no próximo ano, que é agricultura urbana, que dura dois anos. Tem um da Petrobras, que foi aprovado também agora faz um mês, que é de quatro anos, que é o reflorestado, um projeto que vai pegar a nascente do rio Tapacurá – e no reflorestamento o Serta entra como parceiro de outras instituições; e projetos assim de dois, três meses que a gente consegue pegar.
P/1 – E na atuação das EICs, como são montadas as atividades das EICs? Em relação a esses projetos, que falam de integração, como se dá essa integração?
R – A integração das EICs com esses outros projetos que existem no Serta entra na linha, tanto de formação, que a gente chega a formar grupos específicos desses projetos, como, por exemplo, de acesso à pesquisa; às vezes, precisa pesquisa, então já teve caso de alunos das EICs serem contratados para fazer essa pesquisa, fazer banco de dados. Então, a EIC, num processo até de levantamento de dados, de discussão, entra nesse processo. Agora mesmo nós vamos – dia 22 de novembro inicia em três municípios do menor IDH [Índice de Desenvolvimento Humano] de Pernambuco, que é Ibimirim, Inajá e Manari –, o pessoal... os educadores estão indo dar um curso de 240 horas pelo projeto Renascer, e estamos negociando esse curso de informática de inclusão digital, com essa proposta nesses outros 40 municípios, que são os 40 municípios de menor IDH, pela Secretaria do Estado. Então estão saindo várias oportunidades e várias organizações. Nosso quadro hoje: o Serta hoje tem 83 funcionários diretos, contratados por uma cooperativa, fora esses indiretos que são em parceria, que dá lá uns 30, 35... que não tem só as EICs, está como parceria. Às vezes, a gente arruma projeto que a instituição financia o salário de um, coisa de outro e tal, sucessivamente. Então é nisso que a gente vai sobrevivendo.
P/1 – Vamos voltar um pouco para a parte pessoal, você disse que tinha feito um curso de informática antes...
R – Em 1998.
P/1 – Você chegou a ser aluno de EIC?
R – Cheguei.
P/1 – E como foi isso aí? Como foi a sua entrada? Por que, afinal de contas, você decidiu entrar na área de tecnologia? Como foi essa entrada?
R – Na verdade, foi o seguinte. Quando eu entrei no programa... quando o Serta chegou lá, recebeu os 10, foram cinco computadores antes dos 40, foi quando montou a escolinha que formava. Na verdade, não tinha uma proposta de inclusão digital, não era voltada para a realidade do município, era para as pessoas aprenderem. Foi aí que eu tive um contato maior com a questão da informática, por isso que eu disse que tive aula em EIC, mas na verdade não tinha ainda a cara da EIC, na verdade não era nem CDI ainda. Na verdade, meu contato foi mais pessoal, porque a pessoa que era coordenadora era uma pessoa que eu já conhecia, então me convidou pra participar desse processo. Eu era voluntário, na verdade, nem recebia nada, depois foi que eu comecei a me engajar na área, entrar na área, mas eu nunca pensava, eu nunca imaginava que eu ia entrar nessa questão da tecnologia, eu tive certeza que ia entrar na área mesmo foi na primeira remessa de computadores que chegou, os 10 primeiros, porque veio em três malotes os computadores, e eu consegui consertar uns três sozinho – e no primeiro encontro que a gente teve lá, foi muito emocionante, porque uma aluna levantou e disse, que foi em Lagoa de Itaenga. Depois daí que minha vida mudou totalmente. Eu não conseguia entender minha família, eu aprendi outra leitura da minha família, do mundo, das pessoas que eu convivo. Hoje eu consigo conversar com o meu pai... de primeiro eu não conseguia, brigava demais. Eu agradeço demais a todos os parceiros. Então eu me vi ali, tinha lá três computadores que eu consegui consertar (risos). Então, foi muito gratificante ouvir aquilo, foi muito gostoso ouvir aquilo, daí eu me identifiquei, entrei de cara. No início meu pai brigou demais comigo, porque ele não queria que eu ficasse, porque eu já tinha emprego garantido, meu pai conhecia muita gente lá e tal, aí meu pai brigou demais, porque eu passei um ano sem gerar renda, passei um ano só... Meu pai chegou até a me dar castigo, porque na época ele tinha comprado uma moto, ele até não deixou mais eu andar na moto por conta disso; então eu ia a pé, andava três quilômetros. Muitas vezes eu não tinha dinheiro, porque eu não estava gerando uma renda, mas eu ia a pé com os meninos mesmo, conversando eu andava três quilômetros, e hoje eu estou lá.
P/2 – Como é a sua situação, você é casado?
R – Hoje eu sou casado, tenho uma filha de 2 anos e 6 meses, gero minha renda a partir desse trabalho que eu faço, estudo social, e vivo bem.
P/1 – Você falou, não sei se é um slogan ou um princípio, “inclusão digital para o desenvolvimento”, o que é isso? De onde surgiu essa...
R – A gente, na verdade... é uma nomenclatura que a gente usa nas linhas de ações e nos projetos bem-sucedidos. A gente chama, por exemplo, agricultura familiar para o desenvolvimento, o que é isso “para o desenvolvimento”? Porque a gente acredita que o desenvolvimento não parte só na questão produtiva, mas também na formação das pessoas, na visão de mundo que as pessoas têm. Então, uma pessoa hoje que se envolve num projeto ela aprende, ela faz uma releitura da sua atuação num município. Hoje lá a gente tem casos de famílias que conseguiram trazer filhos que estavam em São Paulo para trabalhar na agricultura orgânica, então isso a gente chama de uma ação para o desenvolvimento, isso que a gente chama de desenvolvimento local integrado.
(PAUSA)
P/2 – Como é que a questão da cidadania é tratada naquela região? Com é aquele tipo de público dentro da entidade, como é entendida a questão da cidadania?
R – Quando o Serta chegou lá na região, a gente não tinha nenhum conselho da criança nos municípios. O que tinha não funcionava, daí então passou-se a um processo de capacitação para alguns gestores, dentro do município, e conseguiram criar em todos os municípios o conselho da criança, Conselho Tutelar. Para a gente, a cidadania é mais cidadania de vivência do que a própria estatutária. A estatutária a gente fala que é para o conselho gerente e a nossa é a cidadania de vivência, que é a questão da visão que a pessoa do município... a questão das pessoas, relação com as pessoas, essa é a nossa visão da questão da cidadania.
P/1 – E os educadores das EICs, Paulo, como são selecionados? Como que é a formação?
R – Veja bem, hoje são 80%, 85% dos educadores que estão nas EICs passaram pelo mesmo processo de formação que eu passei, então ficou muito fácil dialogar com eles: as sugestões, a proposta de um projeto que todos participam. Então, quando a gente fortaleceu a questão da parceria com o CDI, a gente começou; fez um quadro de capacitações, [tanto] na questão da metodologia quanto na questão da técnica, que era a pedagogia dos projetos e também dentro da Peads, que surgiu a partir da pedagogia que o CDI trabalha hoje, então também ficou muito fácil – e pela pessoa de Cláudia também nos ajudando nessa questão da coordenação de campo – dialogar com os professores, os educadores das EICs. A gente teve muito problema em unir essa questão do desenvolvimento local, da cidadania, dentro das aulas de informática; então, a partir das capacitações, os educadores começaram a entender. Hoje a gente tem aluno de EIC envolvido em projetos de bibliotecas municipais, envolvido em grêmios, envolvido em orçamentos participativos, envolvido na formação, nos territórios, envolvido em várias outras articulações e programas também que não são só do Serta. Tem um programa lá do Pró-MADA, do Governo do Estado [de Pernambuco], onde a gente já tem adolescente, tanto das EICs quanto do processo de formação que fazem parte dessa comissão, que é responsável para definir as prioridades desse programada dentro do município. Tem várias formas de mobilização dos jovens: a gente tem jovens que passaram pelas EICs, que passaram pelo processo de capacitação, que hoje é presidente do Conselho Tutelar.
P/2 – Tutelar?
R – Tutelar.
P/1 – E esses jovens, quando eles entram nas EICs, o que é que eles esperam? A maioria das vezes...
R – A gente tem até escrito algumas coisas, por exemplo, que jovem diz entrar por entrar, que o município não tem futuro, a gente tem muitos casos. Tem uma tese lá que foi feita em 2003, que está até relatada lá, tem uma jovem que fala que está estudando, entrou na EIC, está fazendo por fazer, que sabe que não tem futuro e, ao final do curso, a gente mostra algumas mensagens de algumas dessas pessoas, qual a visão que ela tinha e qual a visão que ela tem hoje, então, ela consegue reverter essa visão, ela consegue ver potencialidade no município. Ela consegue ver solução no município pobre e, agora mesmo – eu não sei se é informação para dar – a gente passou por um momento histórico no nosso município, que a pessoa que era prefeito de lá há 16 anos vivia no poder, então o pessoal agora parece que se uniu e tirou; então o município está respirando, as pessoas estão efervescente, a gente na verdade não esperava essa mudança no município, as pessoas estão sentindo parte também do município, que também é pouco do que a gente trabalha com as pessoas, que é a questão da liderança e do reconhecimento das pessoas.
P/2 – Você disse que teve um depoimento da menina, da moça, que achava que estava estudando por estudar, porque achava que aquilo não ia mudar nada na vida dela...
R – Ela ia e voltava, e hoje ela vê diferente.
P/2 – Por outro lado imagino também que tem pessoas que acham – jovens – que o aprendizado da informática vai mudar completamente a sua vida, não tem?
R – Tem, com certeza.
P/2 – E como é que fica a expectativa também desses?
R – É um dos problemas que a gente tem quando vai trabalhar da cidadania, que é a questão do jovem quando entra ele só quer saber da máquina, não quer saber de nada. Então a gente adota vários tipos de dinâmica nessas turmas. A gente verifica, a gente tem que ter uma concentração muito forte nisso, não, não quero saber disso, eu vi aqui para aprender, então vou sair... a gente tenta nas dinâmicas. Tem caso realmente que a gente não consegue, porque em pessoas, a gente não pode mandar na vontade das pessoas, as pessoas também têm que ter um pouco de humildade ao participar de um programa, porque a gente explica logo no início o que é a EIC, qual é a diferença que existe do nosso espaço para os outros espaços de fora, então a gente tenta logo fazer um processo de mobilização quando eles entram, e tenta fazer com que ele seja parte, se sinta parte daquilo, do processo. Por exemplo, a gente nas EICs mesmo, esses alunos são responsáveis a abrir ela no final de semana. Por exemplo, a gente quer passar o final de semana aqui, para fazer trabalho, para pesquisar, para fazer alguma coisa, eles mesmos ficam responsáveis, ficam com a chave, montam uma comissão; então, assim que eles vão se sentindo parte e reconhecendo qual é a diferença que existe daquele espaço entre outros espaços.
P/2 – As EICs são conectadas à internet?
R – Não, só uma. Só uma que é lá do Serta, é em Campo da Sementeira, que hoje vira mais o espaço de pesquisa para as outras do que mesmo a única.
P/2 – As outras EICs?
R – Não têm.
P/2 – Mas vão pesquisar lá?
R – Vão pesquisar lá, então aquele espaço não para, tem até a noite, porque lá tem também alojamento. O pessoal dorme lá, então pesquisa, passa final de semana, sábado.
P/1 – E ela é integrada nas atividades, nos cursos das EICs também? A internet.
R – A internet é, passou a ser desses seis meses para cá, foi quando a gente conseguiu colocar internet nesse espaço, porque a gente ampliou a conexão da instituição, aí a gente pegou parte para a EIC.
P/2 – Como é que vocês trabalham a questão da internet?
R – Nas EICs, antes da gente ter na ____, não trabalhava. Realmente não tinha, porque até o Serta mesmo quando chegou o acesso era por telefone, que é uma área muito distante da capital e não tem nenhum acesso. Tinha satélite, mas só que satélite estava muito caro, e não funcionava para o trabalho de lá, porque a conexão ficava muito lenta, porque ela não pegava o sinal todo do satélite, então não trabalhava. A gente está começando trabalhar aos poucos, e com algumas turmas, não dá para trabalhar com todas. Próximo ano é que está entrando forte, junto com o CDI, com ___. Essa questão da conexão, a gente espera que até abril do próximo ano a gente tenha processo de comunicação.
P/2 – Vocês têm uma estratégia para trabalhar com a internet? Assim, uma metodologia?
R – Sim, a gente, por exemplo... o pessoal está trabalhando a questão do lixo, então eles estão pesquisando sobre o lixo, sobre a reciclagem, então tem um grupo que está passando em todas as escolas do estado e municipal, no município de Feira Nova, e estão fazendo palestras sobre o lixo, estão levando datashow, que a gente também tem lá na instituição – a gente cede para o pessoal fazer as apresentações, então eles apresentam essas apresentações que eles fazem a partir de conteúdos pesquisados na internet, de temas e trabalhos e, aí, eles fazem os seus conteúdos.
P/1 – Tem alguma questão que não foi colocada que você queria falar? Algum exemplo que você quisesse dar, alguma mensagem que não foi perguntada?
R – Não, eu queria deixar só uma mensagem, eu queria deixar uma mensagem, mesmo que se não seja exibida, mas que passe para Rodrigo, para as pessoas e parceiro, eu queria agradecer em nome dos 3 mil jovens que já passaram pelas EICs, dizer que é muito importante esse projeto hoje na vida de muitas pessoas, mudou muita coisa na região, não só a questão da informática, mas a partir da informática a gente conseguiu potencializar vários outros projetos, muitas pessoas e dizer que a informática hoje naquela localidade é motivo e também é responsável por mudanças em várias outras pessoas, e em mim também.
P/1 – Você poderia dar exemplo dessas mudanças, primeiro na localidade, como a informática está sendo usada no meio rural da localidade?
R – Por exemplo, hoje, como eu falei anteriormente, foi inaugurada recentemente a primeira agroindústria de beneficiamento de produtos orgânicos, o que é que acontece, como é que é gerenciado, por exemplo, tem um acompanhamento dos produtores, tem acompanhamento da produção, então foi feito um banco de dados onde tem uma pessoa, que passou pela EIC, que hoje presta serviço na cooperativa, então essa pessoa também cadastra na internet, no site hortivida ponto com ponto br, www ponto hortivida ponto com ponto br. Cadastra todos os produtos, vende esses produtos, faz o acompanhamento de produção, gráficos da produção, então a tecnologia hoje na verdade está sendo muito usada nesses meios onde a gente está se envolvendo. Agora mesmo a gente está desenhando sistema, que vai acompanhar todos os programas e projetos, porque hoje a gente tem programa no Sertão, no Pajeú, no Sertão do Cariri, e o Sertão do Moxotó, onde a gente está entrando forte, que são os municípios onde tem o menor IDH do estado, estado do Pernambuco. Então, [para] esses programas, a gente não está chamando nenhuma consultoria de fora, a gente mesmo está desenhando esse sistema, está envolvendo voluntários. Nosso quadro de voluntários cresceu, porque está aparecendo várias oportunidades. O pessoal vai para o Sertão – não vai dar a quantidade de pessoas que tem, não está dando – então a gente está envolvendo voluntários, a gente está com essa proposta. O pessoal que está lá na EIC, que a gente está trazendo para lá... o certo hoje é o espaço de produção de conteúdo, de pesquisa e aprendizagem, então, lá hoje é o ponto de concentração para partir para um município.
P/1 – Vocês têm EICs nesses lugares? No Sertão?
R – No Sertão não, mas a gente está conversando com o estado, e a gente já começou alguma articulação com o CDI Pernambuco, para que nesses programas, nesses projetos bem-sucedidos... por exemplo, um projeto de quatro anos: a gente está replicando experiência, então a gente tem uma certa porcentagem de certeza que alguns projetos vão dar certo, então, ao sair outras pessoas... ao sair não, aos autores ficarem responsáveis por esses projetos na região, a gente deixa esses produtos, EICs, conselhos, instalados em parceria com o estado e com a prefeitura, que eles mesmos mantêm. Então essa é uma das iniciativas que a gente deseja.
P/1 – Esses projetos de uso da tecnologia nesses lugares de menor índice de IDH, na parte tecnológica, estão sendo coordenado por você?
R – Justo. Hoje, esse processo no estado está sendo comigo.
P/1 – E como foi a mudança do CDI na tua vida? Afinal de contas há pouco tempo atrás... Como que foi isso daí?
R – Eu, na verdade, eu venho me dar conta da mudança mesmo, assim, que realmente eu mudei enquanto pessoa e tive que tomar algumas outras posturas, foi... estava uma vez numa reunião, estava eu de um lado, estava Jarbas, governador do estado, e José Arlindo. José Arlindo, que é o secretário da Secretária de Assistência Social do Estado de Pernambuco. E eu lá defendendo uma questão da inclusão digital no município... agora mesmo a gente está fazendo uma carta para ele, que no município de Pombos tem 16 computadores que estão presos ainda em Pernambuco, aqui em Recife, porque não vai para a escola, porque a escola não tem capacidade técnica, infraestrutura e tal, e a gente está tentando intervir e ver o que é que a gente pode ajudar nessa questão de mobilização, envolver as pessoas. Não tem dinheiro, então vamos envolver as pessoas para fazer uma mutirão, vamos fazer alguma coisa para arrecadar recurso para botar janela, para botar porta, para trazer esses computadores. A gente quer mostrar para ele qual vai ser a mudança desses 16 computadores.
P/2 – E assim, caso de pessoas, de outros amigos seus, você tem algum caso para contar também? O aprendizado de informática mudou...
R – Mudou, deixa-me ver... olha tenho tanto casos. Manuel mesmo é um dos educadores hoje lá da EIC, e Manuel ele era uma pessoa muito fechada, ele não tinha boa comunicação com a gente, com o pessoal, e a gente estudou junto durante dois anos, no Dom Miguel, então hoje ele é das pessoas atuante nesta questão da inclusão digital. E ele conseguiu, depois que entrou no projeto, ajudar demais a mãe dele na questão agricultura. Não queria se envolver na questão da agricultura, então hoje vai lá e não planta nada, mas ele organiza junto com as pessoas que trabalham, ele ajuda a mãe dele na questão da agricultura, no negócio da mãe dele, quer dizer, ele mudou totalmente.
P/2 – Fazendo o quê? O que é que ele faz?
R – Ele informatizou a questão da propriedade da mãe dele. Ele mesmo, a partir dessa experiência, desse projeto que está desenvolvido, informatizou a lojinha que a mãe dele tem, então ele acompanha todo esse processo, então é um caso de uma pessoa que não queria saber do negócio da família e hoje vê resultado no negócio da família – e ajuda e dá outra visão no negócio da família. E é uma pessoa que constantemente falava em sair do município, que não via futuro no município, e hoje é um dos educadores.
P/1 – Por exemplo, a propriedade da mãe dele é uma grande propriedade? É uma propriedade familiar? Como é que é?
R – É uma propriedade dois, três hectares, porque lá a gente não tem grandes latifundiários. Pequenos produtores.
P/1 – Então, esse projeto de agronegócio é um projeto de agronegócio familiar?
R – Familiar, a gente trabalha a família, porque não é só a questão da agricultura.
P/1 – E a informática [entra] nesse processo de transformar produto familiar?
R – Em alguns casos sim, porque uma das estratégicas que a gente tem para o próximo ano justamente é essa, criar uma EIC na área rural, que a gente vai definir o território pela quantidade de atuantes envolvidos com o projeto. Esse espaço ser que a ferramenta tecnologia ela esteja de acesso a esses negócios, não só os produtores, mas às pessoas que estejam envolvidas nesse processo.
P/2 – A última pergunta que eu queria fazer é assim... que dizer, nós já falamos como a EIC impactou para pessoas, para localidades, agora eu queria saber o impacto que a EIC teve na própria entidade, no Serta, porque primeiro ela tentou sediar um CDI e viu que não podia, mas que impacto teve para o Serta?
R – Eu tinha falado anteriormente, o que o Serta chama de novas linhas de ações, que é questão de direito e cidadania, porque quando ele chegou em 2000 não tinha nenhuma experiência na questão inclusão digital nem também direito e cidadania, intervir em conselhos, orçamento participativo, gestão, então foi um desafio a partir de 2002, foi um desafio enorme para o Serta. Teve hora de dizer: “Não, a gente não vai continuar com isso, porque a gente não tem experiência com isso”. Então a questão da inclusão digital está sendo, na verdade, o Moura, que é um dos presidentes do Serta, o presidente do Serta. Ele fala que a informática, que a questão da inclusão digital foi uma coisa que os jovens trouxeram e colocaram no Serta. No Serta não funcionou isso, então hoje ela está sendo sistematizada, está sendo organizada, é uma força jovem que a gente vai... hoje estamos reconhecidos dentro da instituição, então é mais de luta nossa mesmo do que de o Serta mesmo escrever projeto na área de inclusão digital, porque isso não é o que a gente chama a identidade da instituição. Até 2000, não era essa. Hoje, já perpassa por essa linha. Então hoje a gente está reconhecido no estado. Recentemente esse programa dos três municípios não foi aprovado, então a gente não gostou disso, então o que foi que houve? A gente mandou vários e-mails para lá, mandou convite, então a gente tem uma pessoa que tem uma influência muito forte, nos ajuda demais dentro do estado. Então a gente foi lá, então a gente trouxe o secretário José Arlindo e trouxe a secretária adjunta que fica junto com ele lá, para conhecer os espaços. A gente levou para conhecer várias EICs, apresentou nossa proposta, e aí ele marcou outra reunião com a gente e a gente produziu esse vídeo e mostrou para ele também. Foi na época que a gente tinha terminado de produzir esse vídeo. Aí, no final da reunião, ele falou: “Se vocês não tivessem refeito isso com a gente e a gente não tivesse ido visitar e não tivesse escutado e, depois, soubesse, a gente ia se arrepender de não reaprovar o projeto”. Então hoje a gente está muito forte também nessa questão do reconhecimento.
P/1 – O que é que você achou de dar esse depoimento, Paulo?
R – Eu?
P/1 – Para você, pessoalmente?
R – Pessoalmente, no primeiro dia, eu disse: “Meu Deus, será que vai ser uma rede de televisão?”. Eu não entendi direito. Pra mim é muito gratificante, e o que eu puder fazer até o último dia da minha vida para divulgar e lutar por essa causa eu vou fazer.
P/1 – Beleza, o que você achou da ideia do CDI de coletar a memória do CDI através da memória das pessoas que participaram?
R – Eu acho muito interessante até para divulgar e para dizer ao mundo que existem experiências exitosas, existem formas de se trabalhar em municípios, em regiões onde as pessoas não tem mais esperanças, para dizer ao mundo, dizer ao povo, que existe uma forma de arredondar o país, que existe uma forma de arredondar o estado, existe uma forma de arredondar o mundo, existe uma forma de arredondar as pessoas, basta as pessoas quererem e procurarem. E vários projetos como esse e vários projetos no Brasil, fora do país, em outros estados estão acontecendo e a gente precisa divulgar e dizer ao mundo: “Para de brigar! Vamos trabalhar!”.
P/1 – Está certo, obrigado, Paulo, a gente agradece em nome do CDI e do Museu da Pessoa.
R – Obrigado.
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