Projeto Conte sua História
Depoimento de Aldair Marcos de Jesus
Entrevistado por Jader Chahine e Teresa de Carvalho Magalhães
São Paulo, 17 de outubro de 2019
Realização Museu da Pessoa
Entrevista número PCSH_HV842
Transcrito por Gabriela Ramos
Revisado por Bruna Ghirardello
P/1 - Bem, Alda...Continuar leitura
Projeto Conte sua História
Depoimento de Aldair Marcos de Jesus
Entrevistado por Jader Chahine e Teresa de Carvalho Magalhães
São Paulo, 17 de outubro de 2019
Realização Museu da Pessoa
Entrevista número PCSH_HV842
Transcrito por Gabriela Ramos
Revisado por Bruna Ghirardello
P/1 - Bem, Aldair, obrigado por ter vindo. Para começar eu queria que você dissesse o seu nome completo e o local e a data de nascimento.
R - O local da onde?
P/1 - De onde você nasceu.
R - Ah, tá. Meu nome é Aldair Marcos de Jesus, eu tenho quarenta e cinco anos, nasci em 09 de agosto de 1974, sou de São Paulo.
P/1 - Qual o nome dos seus pais?
R - Meu pai era Antônio dos Santos de Jesus e Durvalina Rosa do Nascimento de Jesus, ambos os dois são falecidos já.
P/1 - Certo. E você pode contar para a gente um pouquinho do que eles faziam?
R - Meu pai era vendedor e a minha mãe era doméstica.
P/1 - E como você descreveria os seus pais?
R - É meio difícil de falar, mas eu vou falar primeiro da minha mãe. Meu pai eu não era muito fã, eu vou ser bem franco, eu nunca fui fã do meu pai, mas a minha mãe é uma excelente pessoa, é um exemplo de mulher, entendeu? Que era ela muito agredida pelo meu pai… Bom, não vou começar a chorar aqui não, hein gente? E hoje eu tenho ela como espelho, de onde ela estiver, e eu tenho certeza que ela está em um lugar muito bom e… É, é isso que eu posso dizer para você, eu tenho ela como espelho.
P/1 - Mas você pode contar um pouquinho das qualidades dela, de como ela era?
R - Minha mãe era muito guerreira, criou oito filhos, um não era dela, era da parte do meu pai com outra mulher. E sofremos muito, meu pai vendeu a casa da gente com a gente dentro… Ai meu Deus do céu… É muito difícil de falar as coisas assim, sabia? Pelo jeito que vocês estão me vendo, eu já tô emocionado já de falar, entendeu? Mas hoje eu posso dizer para você que eu tenho muito ela como espelho, e eu não tenho muito o que falar, entendeu?
P/2 - Você pode falar um pouquinho dos seus irmãos, então?
R - Tenho meus irmãos, tenho meu irmão que hoje tem cinquenta e quatro anos, tenho duas irmãs gêmeas, Ana Regina e Ana Maria, a Ana Lúcia e a Vani… Eles são excelentes irmãos, só que eles vivem na casa deles, são todos casados hoje, e eu sou solteiro, eu gosto de viver no meu canto. Porque cada um tem sua família, né, então a gente não é muito de ficar junto em final de semana, assim… Eu trabalho direto né, e quando tem minhas folgas eu gosto de ficar em casa.
P/1 - Eu queria que você falasse um pouquinho como foi a criação de vocês, quais foram os princípios nessa infância.
R - Olha, a minha infância, eu vou falar para você foi de ver meu pai muito agredindo a minha mãe, né? Então não tenho muito o que descrever, praticamente eu não tive infância. Quando a minha mãe se separou do meu pai, eu comecei a trabalhar muito cedo, com oito anos eu estava começando a trabalhar como feirante, e eu não tive muita infância, entendeu? E hoje eu sou o homem que eu sou porque eu me esforcei muito, eu conheci uma pessoa muito boa na minha vida, o nome dela é Silvia e o marido dela é Gabriel e o que eles puderam fazer por mim na minha adolescência, eles fizeram para mim.
P/1 - Você pode contar um pouquinho?
R - Posso, eu era feirante na época, e eu conheci essa Silvia, ela tinha um bazar e papelaria, chamado Bazar e Papelaria Silvia em Interlagos e eu fazia entrega para ela todo final de semana, toda quarta-feira que tinha feira perto da residência dela e ela me pegou como filho. E hoje conheço ela ainda, não faleceu nem ela nem ele, eu tenho praticamente quatro irmãs por parte deles e é isso aí.
P/1 - E você pode contar um pouquinho também do seu trabalho na feira, como que era? O que você fazia?
R - Meu trabalho na feira era levantar todo dia às três horas da manhã e ir de moto, porque um amigo meu me levava de moto, né, ou, às vezes, em cima do caminhão e era isso aí. Fiquei seis anos, trabalhei seis anos nessa rotina.
P/1 - Era com seus pais?
R - Não, não. Não, eu trabalhava porque precisava trabalhar mesmo, né. Tinha só minha mãe que trabalhava na época, meu irmão era muito novinho, também, meus irmãos… E a gente se virava né? Quando eu pai vendeu nossa casa com a gente dentro, minha mãe, a gente foi morar em um barraco que molhava tudo dentro de casa e a minha mãe cobria a gente com uma lona, minha mãe nem dormia, ficava cuidando da gente a noite inteira, porque pingava mais dentro do que fora. E depois, em um certo dia eu conheci uma pessoa muito especial nas nossas vidas, que foi meu padrasto durante trinta e cinco anos, que ele cuidou dos oito filhos dela.
P/2 - E onde que era essa sua casa da infância? Depois vocês foram morar onde?
R - Ixi, a gente morava em muito lugar. Quando minha mãe se separou, já morei no Jardim das Rosas, morei no Grajaú, Jardim São Bernardo, Jardim Icaraí, Vila São José, Itapecerica… E hoje, até os últimos momentos, que eu lembro bastante, é que a gente praticamente se criou na Avenida Interlagos, lá na Vila da Paz. Depois disso, a minha mãe... Nós fomos morar no contêiner, que eles foram fazer o predinho do CDHU, aí a gente morou mais ou menos dois ou três anos dentro do contêiner e aí fomos morar em um apartamento. A minha mãe vendeu esse apartamento e foi morar no Cantinho do Céu, onde ela residiu até o falecimento dela.
P/1 - Certo. E o primeiro bairro que você…
R - O primeiro bairro, que eu nasci, foi Jardim Rosana, na Estrada de Itapecerica.
P/1 -
E você lembra…
R - Não lembro nada.
P/1 - Nada?
R - Nada, nada, nada, nada dessa infância, não...
P/1 - Qual é o primeiro que você tem memória?
R - Que eu tenho memória, é o Jardim das Rosas, onde a gente morava junto com o meu pai ainda. Meu pai gostava muito de festeira, festeira, festeira e ele agredia muito a minha mãe nessa fase de… Queria que ela passasse, não tinha como, não tinha essa Maria da Penha. Ela era muito agredida, era agredida pelo meu pai direto. Muito, muito, muito. Ou ela passava a roupa dele, para ele ir passear, e quando ela ia atrás dele nesse passeio dele, ela vinha apanhando. Todo santo dia, todos os finais de semana que ele ia para festa, ele vinha agredindo ela. Por isso que eu falo para você que é muito ruim falar isso. Principalmente por parte de pai, assim… É muito dolorido, entendeu?
P/1 - E… Se o senhor não quiser falar sobre isso, tudo bem, mas como era a sua relação com os seus irmãos nesse sentido?
R - Nós éramos muito bem. Era muito bem entre meus irmãos, era muito bem.
P/1 - E você como mais velho, a sua percepção…
R - Não sou o mais velho, sou o caçula.
P/1 - Você é o caçula?
R - Sou o caçula.
P/1 - Tá. Mas a sua percepção de vocês em relação aos seus pais e… como que vocês reagiam quando criança? Como que era?
P/2 - Vocês conversavam sobre isso entre si?
R -
Não, não. Nunca conversou. Meu pai judiava muito da gente, a gente não tinha nem como respirar. Porque se você aprontasse qualquer coisa… Ele colocava a gente de castigo em base de pedras, ajoelhado em cima das pedras ou naquelas tampinhas de garrafa. A gente era ajoelhado ali e se se mexesse, apanhava.
P/2 - E na escola? Você foi à escola?
R - Não, não fui à escola, por isso estou falando para vocês. Eu estudei até a oitava série, aí quando eu conheci essa Sílvia, ela me colocou no eixo. Aí eu fiz até a oitava série e o primeiro ano só, depois eu não quis mais estudar porque eu tive que ajudar minha mãe, né?
P/2 - Você estudou até a oitava série com a Sílvia já?
R - Isso, é. Depois, quando… Não, mas até o primeiro ano, sim. Com ela ainda. Ela que me ajudou bastante. Depois eu não quis mais, porque eu quis ir alavancar. Tipo, procurar alguma coisa para trabalhar para ajudar minha mãe, na época.
P/2 - Sim. E o que você lembra dessa escola?
R - Ah, eu tinha bastante amigos. Tinha uma professora chamada Sílvia (Ratts?) era uma excelente professora de matemática e eu sou péssimo em matemática. Mas ela era uma excelente pessoa, que quando ela podia ajudar a gente, ela vinha até na minha casa no final de semana para dar uma ajuda, principalmente para mim.
P/1 - Tem alguma situação que você lembra com ela?
R - Não, vagamente. Não.
P/1 - Tá. E você tinha amigos no trabalho também?
R - Não. No trabalho, não sou muito de fazer amizades. Sou muito na minha, entendeu? Mas não tinha muitos amigos, não. Sou homem de poucos amigos. Os amigos que eu tenho… Uma amiga que eu tenho, eu prevaleço muito.
P/1 - Certo. E você trabalhava exatamente com o quê na feira?
R - Eu trabalhava em barraca de frutas, legumes, verduras. Mais ou menos em oitenta, eu estava trabalhando na feira ainda.
P/1 - E a interação com as pessoas?
R - Gosto.
P/1 - Como que funcionava?
R -
Eu interagia muito bem, porque ninguém nunca reclamou.
P/2 - E essa escola que você estudou era onde?
R - Lá na Vila Friburgo. Estudei em duas escolas em Interlagos. Uma chama Plácido de Castro, que ainda existe hoje, e Calhim Manoel Abud, que é na Avenida Rio Bonito.
P/1 - Vou só retomar um pouquinho para os seus pais. Você sabe a origem deles?
R - Meu pai era de Salvador, e a minha mãe é de Presidente Prudente.
P/1 - Certo. E você tem alguma coisa para contar dos seus avós também?
R - Minha avó… Eu cheguei a conhecer a minha avó, mãe da minha mãe e a mãe do meu pai. Meu pai agredia muito a minha avó, a mãe dele. Eram excelentes avós, as duas. A mãe da minha mãe era uma excelente pessoa e eu consegui ver ela até a data do falecimento dela.
P/1 - E como era o convívio?
R -
Minha avó com meu pai, era difícil, a mãe da minha mãe. Muito difícil. E a mãe dele também, porque a minha mãe praticamente cuidava da minha avó, a mãe do meu pai. Então ela viu a gente sofrer tudo aquilo, só que ela não podia fazer nada, porque ela era agredida também pelo meu pai, entendeu? Se nessa época existisse Maria da Penha, acho que ele já estava preso.
P/2 - Como que foi a decisão da separação dos seus pais?
R - Minha mãe teve que fugir. Minha mãe fugiu e voltou de novo, foi quando ele vendeu a casa que… A minha mãe tinha comprado uma casa no Jardim Apurá, lá no Pedreira, que existe ainda hoje. Aí ele vendeu. Ela não sabe como ele conseguiu vender a casa, assinou os papéis, não sabe… Porque ela comprou tudo no nome dela, e não sei se ele forjou ou alguma coisa, e conseguiu vender a casa. Vendeu a casa, e com o mesmo carro de mudança que chegou na época para entrar na casa, a gente teve que sair. Vendeu a casa da gente pelo preço de um botijão de gás hoje.
P/1 - E você tinha que idade nessa época?
R - Nessa época, acho que eu tinha mais ou menos entre sete… de seis para sete anos, mais ou menos.
P/1 - E você se lembra disso?
R - Lembro. Até aí, eu me lembro. Depois não me lembro mais. Lembro até quando a minha mãe… Que a gente mudou, aí a gente foi morar no Jardim São Bernardo, foi aquilo que eu te falei, que minha mãe morava em um barraco e pingava dentro. Até aí, eu lembro. Depois, não lembro mais nada.
P/1 - Mas dessa fuga da sua mãe, você lembra como você reagiu na época?
R - Sim, onde ela ia, eu ia atrás. Eu era a tampa da tarja, onde que ela ia, eu estava sempre ali coladinho na saia dela. Mas moramos em muitos lugares, fomos morar em casa de amigos dela, com medo. Ela tinha medo, meu pai ia lá, buscava a gente. Quando foi essa última vez, que foi vendida a casa, ela tomou a decisão de não voltar mais.
P/1 - E como você se sentia criança?
R - Praticamente a gente não se sentia legal, porque você ver a sua mãe sendo agredida e você não poder fazer nada… Por isso que hoje eu estou com 45 anos, eu prezo muito isso, sabe? Ver essas mulheres apanhando aí, gente… é muito ruim.
P/2 - Bom, e depois da feira, o que você… Você foi estudar, você foi trabalhar?
R - É, eu trabalhei com a Sílvia. Trabalhei com a Sílvia durante seis anos, e o marido dela, na época, trabalhava na Pepsi Cola, e aí, um dia, eu estava… Minha mãe arranjou emprego para mim e eu ia e me escondia. Quando minha mãe saía, eu me escondia para fugir, porque eu não gostava daquele emprego. Aí quando chegou uma época, minha mãe falou: “Cadê o seu dinheiro?” Eu falei: “Olha mãe, eu não estou mais trabalhando na empresa. A senhora ia e eu fugia.” Aí foi um dia que eu tomei a decisão de eu mesmo arranjar meu próprio emprego. Aí eu trabalhei seis anos na Transfab, que hoje, o lugar lá chama Gomes da Costa. E em 1990, essa empresa faliu, e eu não desisti. Fiquei procurando emprego e trabalhei de várias coisas já. Aí fui trabalhar em uma empresa que chama ISS Servisystem, que era uma empresa de limpeza. Limpava, não tenho vergonha. Eu trabalhava de limpeza de privada mesmo, de peão. E quando, um certo dia, um gerente viu eu limpando aquele banheiro ali, falou que ali não era meu lugar e me colocou para trabalhar na Coca. Eu trabalhei na Coca um ano e sete meses, na Coca Cola, que era Spal antigamente. E de lá para cá, eu vim trabalhando. Saí de lá porque eu não quis mais ficar lá, naquele lugar. E fui trabalhar no aeroporto, na SATA, trabalhei um ano e seis meses. Depois, eu fui trabalhar na Matec Engenharia, trabalhei cinco anos e seis meses lá. Depois de lá, de cinco anos e seis meses, eu vim para o transporte público. Fiquei no transporte público até 2003, quando a Marta fechou as empresas, e fui para uma empresa chamada Viação Tupi. Lá eu trabalhei treze anos, saí de lá em 2014. E 2014, eu fiquei… No mesmo mês que eu saí, em 2014, em setembro, dia 9 de setembro, eu saí de lá e fui trabalhar na Pullman, na Raposo Tavares, e trabalhei um ano e meio também lá. Depois vim para a Gato. Estou há dois anos aqui na Gato Preto, uma empresa muito boa, não tenho nada de falar dela. Ela abriu as portas, porque eu entrei como especial lá, e estou lá.
No dia que ela pegou carro comigo, eu não quis divulgar nada, porque meio constrangimento, para mim, eu sou deficiente visual, do lado direito.
De repente, ela podia ficar com medo de o rapaz deficiente visual conduzir ela até a residência dela, entendeu? E é isso aí, eu sou especial.(choro)
P/1 - Certo. Esse trabalho com a Sílvia, que você ficou seis anos, você pode contar um pouquinho?
R - Posso. A Sílvia viajava bastante no final de ano com as filhas dela. Até aí, eu não conhecia as filhas dela ainda direito. E eu ficava tomando conta da loja dela. Todo ano, eu ficava tomando conta da loja dela, que ela viajava para descansar e eu cuidava da loja para ela e era isso. Tomava conta… Tomou muita responsabilidade para mim: fazer depósito, ir em banco, receber, separar material de escola… Que ela trabalhava com uma escola chamada Colégio Dimensão, na época. E quando ela estava viajando, eu que tomava conta, né? Fazer a separação desse material para os alunos.
P/1 - Isso você tinha…
R - Eu tinha, na época, mais ou menos entre doze para treze anos.
P/1 - E tinha alguma coisa nessa época que você fazia além do trabalho?
Como era?
R - Não, eu ficava na loja para ela. Depois eu fechava, quando não tinha ninguém para ficar lá, eu fechava a loja e ia para a escola.
P/2 - Nessa juventude, como que era? Os amigos…
R - Eu não tinha amigos, porque eu só vivia para o trabalho e a escola, trabalho e escola… E de balada, eu nunca fui de balada. Não tive infância para balada. Por isso que hoje eu sou meio assim, fechadão, entendeu?
P/1 - Isso permaneceu pela adolescência?
R - Sim, sim. Sempre fui de poucos amigos.
P/1 -
Certo. E você morou com a sua mãe até…
R - Até meus vinte anos. Até meus vinte anos, fui morar com a minha mãe. Aí já estava trabalhando no transporte público, foi quando eu conheci uma PM, uma policial feminina militar dentro do ônibus, ela era minha passageira. Aí nós fomos morar juntos e hoje tenho uma filha com ela, de 16 anos. Foi quando… Agora que é a pior hora. A gente ficou morando nove anos, e em 2003, quando eu estava trabalhando, acho que eu tinha falado um pouquinho para ela… Em 2003, quando a empresa foi fechada, eu fui trabalhar na Viação Tupi. Com três para quatro meses, eu fui baleado nessa empresa e fiquei seis meses em coma. E quando eu acordei do coma, voltei a trabalhar de novo e minha mulher me traiu. Aí eu mudei meu lar, e fui morar em pensão. E depois, mais ou menos com seis meses que eu estava morando nessa pensão, eu conheci um rapaz, um amigo meu, trabalhava na Viação Cidade Dutra. Ele pediu para eu morar com ele. Eu fui morar com ele até o ano retrasado, quando ele arranjou uma pessoa na vida dele, e eu também decidi morar sozinho. Hoje eu moro sozinho. Vejo a minha filha muito pouco, meu filho morar no interior. Tenho um menino de 21 anos, mora no interior. E é isso aí.
P/2 - Como que você foi baleado? Você estava dentro do ônibus?
R - Estava dentro do ônibus, trabalhava na Viação Tupi já. Era na época dos passes, tinha muito passe nessa época. O bandido começou a brincar de roleta russa pensando que eu tinha dinheiro na gaveta. Não tinha dinheiro na gaveta, e ele pedia dinheiro, eu falava que eu não tinha dinheiro, ele engatilhava o revólver na minha cabeça. Engatilhou três vezes e eu reagi. Nesse “reagimento”, me deu um tiro no pescoço e mais dois tiros nas costas. (choro) É isso aí. Em 2011, eu fazia carro direto da Viação Tupi e, descendo a Brigadeiro Luís Antônio, eu comecei a sentir muita dor. Muita dor, parecendo que estava tendo um filho, não sei nem a dor do parto de vocês. Foi que a bala tinha andado e caiu na minha bexiga. Essa bala quase me matou, mas graças a Deus, Deus é maravilhoso comigo, estou aqui. Desculpa, gente. (choro)
P/2 - Imagina. Se quiser tomar uma água, um lencinho…
R - É isso aí. Eu estou aqui hoje. Estou aqui para contar essa história. Mas estou bem. Estou bem. Hoje tenho uns amigos, hoje eu tenho uns amigos, colegas, né? Amiga eu só tenho uma. Mas tenho bastante colega nessa empresa.
P/1 - Quem é essa amiga?
R - Minha amiga chama Gláucia. Nas minhas piores horas, ela sempre está do meu lado.
P/1 - E como vocês se conheceram?
R - A gente se conheceu em um aplicativo de relacionamento, só que não virou nada, virou amizade. Sete anos que eu conheço ela. Aí, nas minhas piores horas… Quando ela quer conversar comigo, a gente conversa. Quando eu quero conversar com ela, eu converso. E é isso aí.
P/1 - Pode falar um pouquinho de como ela é?
R - Excelente pessoa, trabalhadora. Tem uma filha chamada Giovana, que me chama de tio Marcos. E como eu sempre precisei dela assim, nas melhores e nas piores horas, ela estava ali para me servir. Então essa é a minha amiga que eu prevaleço sempre. Tem uns amigos que a gente tem que prevalecer. E a gente sabe o verdadeiro amigo na hora que você mais precisa. E sempre que eu estou precisando, ela está do meu lado. Nunca diz não, e a mesma coisa para mim, nunca digo não. Quando dá, eu faço.
P/2 - Queria voltar um pouquinho e te perguntar quais eram as rotas que você fazia nas diferentes empresas de ônibus que você trabalhou.
R - Na Santa Bárbara, que era transleste, eu trabalhei na linha do Jardim Miriam a Santo Amaro, e essa aqui do 516M, que é o Jardim Miriam, que hoje é Dom Gastão. Fiquei na linha Dom Gastão um ano e sete meses. No Jardim Miriam, eu trabalhei três anos. Santo Amaro a Jardim Miriam, que era 546M.
P/2 - E hoje, você trabalha com qual rota?
R - Hoje eu trabalho… Faço a linha da Cidade Universitária a Princesa Isabel. Tem uns sete meses que estou nessa linha. Eu trabalhava, estava na reserva, e aí a Gato trocou as linhas dela, que eu fazia Socorro, 856R. Aí ela trocou com a outra empresa, que tem duas garagens. E as garagens das linhas da Cidade Universitária ficaram para a gente, aí eu trabalho nela. Pego dezesseis horas e largo uma hora da manhã, que é quando eu vou fazer as corridas do Uber. O Uber, eu estou… Tem um mês que eu estou no Uber. Mas já fui taxista, já fui tudo nessa vida, gente. Pode perguntar, viu? (risos)
P/1 - Eu queria que você contasse um pouquinho sobre o seu filho.
R - Matheus. Matheus foi um relacionamento mal desejado. Mas como ele é meu filho, eu apoio as decisões dele. Não sou fã da mãe dele, de jeito nenhum. A mãe dele, para mim… Ela foi perversa comigo. Mas meu filho está aí, e eu gosto muito dele, sabia? Ele mora no interior. Quando dá para ir, eu vou. Quando não dá, ele liga para mim.
P/1 - Você pode contar um pouquinho desse relacionamento com ela?
R - A gente não tem muito relacionamento, muito convívio. Eu não tenho muito convívio com o meu filho.
P/1 - Mas com a…
R - Com a Laryssa, sim. A Laryssa foi desejada.
P/1 - Foi depois da…
R - É, a Laryssa é a caçula. Com a Laryssa eu tenho mais, assim... um pouquinho mais do que o Matheus. Com a Laryssa eu convivi, eu dei banho nela quando ela nasceu, entendeu? E o Matheus não, o Matheus foi mais indesejado.
P/1 - Mas com a mãe do Matheus?
R -
Nós não temos relações. Está casada hoje com outra pessoa.
P/1 - Mas como você a conheceu?
R - Foi na balada. Eu desfilava na Vai-Vai e nós nos conhecemos lá. E aí ela gostou de mim, a gente namorou… Namorou, assim, era pega, né? Porque a gente não tinha relações nenhuma de namorados. E um dia saímos e aconteceu _____ [00:24:48] do Matheus. Mas a Laryssa, não. É só isso, não teve… Não convivi muito com o meu filho, essa é a realidade.
P/1 - Mas como foi esse processo de descobrir que ela estava grávida?
R - Foi através de um amigo. Eu trabalhava no autódromo de Interlagos, fazendo segurança lá, e o meu amigo falou que ela estava grávida e eu não sabia. Aí quando eu fui descobrir, ela andava com muitos homens na época, e eu quis tirar minhas dúvidas, fiz o teste de DNA e deu que o Matheus era meu filho. Aí eu assumi ele como meu filho.
P/2 - E aí ela mora no interior?
R - Não, só ele que mora.
P/2 - Ah, só ele?
R - É, só ele. Porque a avó dele é de bens. Aí comprou uma casa para ele lá, ele arranjou uma namorada e está morando lá, em Bauru.
P/1 - E você assumiu ele como seu filho, mas…
R - Sim, só que nunca teve o convívio. Agora a Laryssa, não. A Laryssa teve o convívio, e a gente convive muito bem. Quando dá, eu vou para a escola buscar ela. Quando não dá, ela vem para a minha casa.
P/1 - E você falou que não é muito de balada, mas conheceu ela na Vai-Vai.
R - Conheci na Vai-Vai, depois não saí mais para lugar nenhum.
P/1 - Mas teve um período que você frequentou a Vai-Vai?
R - Fiquei quatro anos na bateria da Vai-Vai. Depois desisti, não quis mais. Aí não quis sair mais. Não saio para lugar nenhum mais. Depois disso, não saí para lugar nenhum mais. Balada, nem pensar.
P/1 - E como você descobriu a Vai-Vai? Como você começou a frequentar?
R - Um rapaz que estudava comigo lá no Plácido de Castro, Marcos, ele era da bateria e um dia ele viu eu batendo lata lá na escola, aí ele me chamou para conhecer a Vai-Vai e eu fui conhecer a Vai-Vai. Aí lá eu fiquei fazendo cursos para bateria e fiquei quatro anos.
P/2 - Quantos anos você tinha quando você entrou?
R - Eu tinha uns dezoito anos.
P/2 - E o Matheus nasceu, você tinha quantos anos?
R - Vinte e cinco.
P/2 - Você já era casado com a…
R - Não, nunca fui casado no papel.
P/2 - Ah, nunca?
R - Não, não. Depois disso, depois que ele nasceu que eu arranjei essa namorada, que é a mãe da Laryssa.
P/2 - Mas vocês chegaram a morar juntos?
R - Chegamos. Só a mãe da Laryssa.
P/2 - A mãe da Laryssa.
R - A mãe da Laryssa, sim.
P/2 - Entendi.
P/1 - Mas você falou que a mãe do Matheus não foi boa com você.
R - Não foi, porque ela fez sacanagem comigo. Na época, se ela tivesse falado para mim que ela estava grávida do Matheus, nós estávamos morando juntos, entendeu? Porque o negócio dela, que eu não vou falar o nome dela aqui, é que ela andava com vários homens, entendeu? E na época, eu fiquei com um pé atrás, porque eu falei: “Pô, ela sai com muita gente assim, eu quero saber se o menino é meu, porque se for meu, eu vou assumir.” Porque eu sempre falava para a minha mãe: “No dia que nascer um menino, filho, eu não vou deixar abandonar ele.” Tanto que eu não abandonei meu filho. Eu dava pensão para ele, só não convivi com ele.
P/1 - E sobre o seu trabalho no ônibus, você lembra do seu primeiro dia? Como foi?
R - Ah, meu primeiro dia… Minha primeira empresa que eu trabalhei foi na Viação Santo Estevão, que é o Grupo São Judas, que foi que a Marta fechou as empresas em 2003. Eu era office boy nessa empresa, lá na Santo Estevão, na zona leste. Eu fiquei pouco de office boy. Como a empresa começou a mudar muito de nome, aí foi mudando, falaram se eu queria passar para cobrador, eu falei que queria, porque ganhava um pouquinho mais. Aí foi quando eles fecharam de vez e eu vim para a zona sul, que é a Viação Transleste, que até o final do… Que a Marta fechou as empresas, se tornou Viação Santa Bárbara. Era bom. Era bom, ganhei dinheiro naquela época. Aí depois fechou as empresas e eu vim para essas outras empresas que eu trabalhei. Essa é a minha terceira empresa que eu trabalho, empresa de ônibus.
P/2 - Como que é ser cobrador? Qual é a sua relação com as pessoas?
R - Ah, eu gosto dos idosos. Eu vou ser bem franco com você, eu gosto dos idosos, porque quando você vê aquelas cabecinhas brancas dentro do seu ônibus, que te falam bom dia, e te tratam muito bem, é gratificante. Seu dia se transforma de um jeito que só Deus sabe. E tem uns outros também, tipo vocês assim, que entram… jovens, que entram na USP. Tem gente que é muito mal educada. Tem muita gente mal educada. Eu não, porque eu trato os passageiros como eles me tratam. Se eles me tratarem como bom dia, eu vou tratar como bom dia. Mas arrogância, jamais.
P/2 - E desde que você sentou pela primeira vez na cadeira de cobrador até agora, você sente alguma mudança no tratamento com as pessoas? As pessoas eram mais gentis, ou não?
R - Antigamente, não era.
P/2 - Não era?
R - Não. Hoje está sendo melhor. Hoje, a tendência é muito melhor. Quando eu trabalhava na Tupi, eu fazia ali nas Perdizes. Era muito idoso que eu pegava, muito.
Hoje, não. Hoje, na USP, já é diferente. O pessoal te trata muito bem. O jovem te trata muito bem. Todo mundo, em si, assim, né? Trata você muito bem. É bom dia, é boa tarde. Então isso já é uma coisa que leva você a fazer um serviço de perfeição, entendeu? Trabalhar com qualidade. E eu gosto do que eu faço. Eu vou falar para você uma coisa, eu não gosto de ser cobrador, eu trabalho como cobrador, eu exerço as minhas atividades com perfeição porque eu sou pago para fazer aquilo, e eu nunca vou tratar o passageiro mal porque é através dele que vem o meu pão de cada dia, mas falar para você que eu gosto… Quando eu saí do transporte em 2014, fui trabalhar na Pullman. Vou chegar na situação daqui a pouco. Em 2014, eu saí da Tupi e fui entrar na Pão Pullman, que é a Bimbo do Brasil, e meu sonho era ser motorista lá. Meu sonho era enorme, ser motorista, só que eu não tive o respaldo do meu chefe na época, na Viação Tupi, de passar para motorista, aí eu pedi para sair da empresa. Eu fiz acordo, e fui trabalhar na Pullman, e lá eu fui trabalhar como motorista vendedor, eu trabalhava de segunda à sábado, trabalhava dentro da favela do Heliópolis, lá no São Caetano, e lá o negócio era feio. Fiz muita amizade, fiz muita inimizade, porque lá você trabalhava com dinheiro, a Pullman sempre trabalhou com dinheiro, trabalhava com aqueles “aparelhão”
de _______. Trabalhava com dinheiro, então os bandidos queriam te roubar. Quando você não dava nada para eles: “Tá bom.” Lá na frente, te pegava. Mas não, fiz muita amizade, graças a Deus, nunca fui assaltado. Nunca fui assaltado, trabalhei um ano e meio como vendedor lá dentro, foi quando eu sofri o acidente da visão. Fui abrir a estanteria, lá tem tipo uma janelinha, aquelas “travessinha” de janela, de fechar janelas, eles adaptaram ali e tinha uma mola. Essa mola estourou e pegou no meu olho, então ela cortou minha retina. Então aí eu não consegui mais exercer a minha atividade lá, que era trabalhar vendendo e dirigindo, eu dirigia aqueles furgãozinhos. Aí eu tive que voltar como cobrador de novo, foi quando eu entrei na Gato Preto. Eu entrei como PCD lá, estou lá até hoje como PCD.
P/1 - E você sente alguma diferença… Você falou que agora você está de Uber também, como é a relação com as pessoas?
R - Olha, eu vou falar para você, minha relação com as pessoas é boa, porque eu acho que se você entrou ali no aplicativo para exercer o que você está querendo, você tem que fazer com perfeição, porque vai entrar vários tipos de gente, entendeu? Que nem… Vamos supor, eu vou pegar você e vou te levar na sua residência, eu não conheço seu bairro, vamos supor que é uma periferia. Se tocar a campainha lá, eu não vou pegar, porque eu não conheço quem eu vou pegar dentro da favela, dentro da periferia, entendeu? Mas fora isso, de boa.
P/1 - Mas você sente que as pessoas te tratam diferente no Uber e como cobrador?
R - Não, acho que o tratamento é igual.
P/1 - Igual?
R - Tratam igual, porque vai da sua pessoa. Se você é tratado bem, por que você vai tratar a outra pessoa mal, entendeu? Eu, por mim… Eu trabalho aqui de cobrador no transporte público desde... Vamos colocar que tem uns treze anos. Tem uns treze anos que eu trabalho no transporte, ou mais. Eu trato a pessoa como ela me trata. Graças a Deus, eu nunca tive arrogância, não. Pessoa arrogante, que me tratou não… Sempre me tratou bem.
P/2 - Você se sente seguro no seu trabalho?
R - Eu me sinto. Por enquanto, estou me sentindo seguro, né? É igual eu estava falando com você aquele dia, eles vão acabar o cobrador, mas eu não estou esquentando a cabeça com isso não, porque eu sei me virar para outras coisas, outras áreas, entendeu?
P/2 - Você acha que vai acabar daqui a pouco?
R - Ah, não vai durar muito tempo, não. Pelo andar da carruagem aí, agora com esse negócio de cartão de crédito, de débito aí… Acho que agora vai. Vão ficar poucos, viu? Mas eu me viro, eu me viro. Estou com uns projetos de dar emprego, entendeu? Por enquanto vou deixar primeiro fluir, para ver o que vai acontecer.
P/1 - E no seu trabalho, como PCD, você sentiu alguma diferença também?
R - Não, eu sou tratado como igual, né? Porque se você olhar para mim hoje, se eu não te falar que eu sou deficiente, você não ia saber que eu era deficiente, entendeu? Então me tratam como igual, eu sou tratado que nem você é tratado com ela, ela tratada a você, não tem diferença. Eu sou um funcionário que nem… Se você é cobrador, se você é motorista, eu sou tratado igual, eu não sou tratado diferente.
P/1 - E você sempre esteve confortável?
R - Sim! Estou acostumado, já.
P/1 - E como é a relação com os motoristas? São os mesmos motoristas?
R - Não, eu trabalho com o mesmo motoristas sempre. Só final de semana que... Quando estou trabalhando no sábado, eu tenho um motorista específico e quando estou trabalhando no domingo, estou na reserva. Eu fico jogado, né? Porque eu trabalhava na linha da 7282, aqui, e a prefeitura extinguiu essa linha no final de semana. Não existe essa linha mais no final de semana, aí estou na reserva. Todo final de semana que eu trabalho no domingo, estou em outras linhas diferentes. E é bom, porque você fica rotativo, você fica conhecendo várias pessoas diferentes, entendeu? Inclusive, estou na Vila Madalena, hein gente? (risos) Domingo, fico ali na Barra Funda, faço 21, Barra Funda a Madalena, terminal Madalena.
P/1 - Teve alguém que você conheceu que manteve para além do ônibus?
R - Como assim?
P/1 - Alguma pessoa que você conheceu no trabalho e que você manteve um contato, ou…
R - Não.
P/2 - Que você conheceu no ônibus e virou…
R - Não.
P/1 - Mas tem pessoas que você…
R - Converso bastante.
P/1 - ...convive diariamente.
R - Converso bastante. Eu sou um cara que converso bastante. Se me chamar para conversar, nós vamos conversar. Converso bem.
P/2 - Tem aqueles passageiros que…
R - Não gostam de conversa. É só “bom dia” ou “boa tarde” e vai lá para o fundão dele. Mas sempre tem os passageiros que gostam de conversar com você. Porque tipo assim, tem passageiro que, às vezes, a gente é o psicólogo dele. Às vezes, eles vêm, querem conversar. Principalmente os idosos. Ele começa a conversar com você, praticamente fala a sua vida todinha para você, entendeu? Aí a gente se sente como psicólogo. Mesma coisa a gente, às vezes estamos conversando… entendeu? E vice-versa.
P/2 - Você lembra de alguma história marcante que aconteceu dentro do ônibus?
R - Lembro, lembro. Eu fazia a linha do aeroporto a Perdizes. Entrou um deficiente dentro do meu carro. Na Tupi, eu não tinha problema de visão ainda. Ele falou assim: “Ô cobrador, quando chegar na Avenida Paulista, você me dá um toque?” Desculpa, eu fazia a linha do Jardim Miriam, 5178. “Quando chegar na Paulista, você me dá um toque?” Eu falei: “Dou sim.” Quando chegou na Avenida Paulista, eu falei assim: “Chegou seu ponto, você vai para onde, meu amigo?” Ele falou assim: “Eu vou atravessar a Paulista para pegar o Perdizes.” Aí foi uma coisa inusitada, que foi de mim mesmo, espontâneo, que eu peguei, saí da minha catraca, fui lá, desci pela porta de trás, fui lá e peguei ele, atravessei a avenida, e quando voltei, fui xingado, muito xingado. Aí tinha um passageiro que falou assim: “Gente, vocês tem que dar graças a Deus, porque nenhum cobrador faz isso.” Eu atravessei ele, o ônibus ficou mais ou menos quinze ou dez minutos, mais ou menos. Eu atravessei ele da Brigadeiro Luís Antônio até o outro lado da Paulista e deixei ele no ponto. Quando voltei, fui xingado.
P/2 - Pelos passageiros?
R - Pelos passageiros. Só uma mulher foi a meu favor e o resto, todos ficaram bravos, porque o carro ficou parado lá o maior tempinho, e eu atravessando deficiente, mas eu nem liguei, não liguei. E a outra vez, eu fiquei meio sem graça, foi com uma idosa. Nessa época, eu estava trabalhando na 5175, Praça da Sé. Na Brigadeiro Luís Antônio, fui atravessar ela também, quando voltei, o pessoal começou a bater palma, eu fiquei sem jeito. Mas é muito bom.
P/2 - Pelo menos melhorou, né? (risos)
R - Muito bem. Isso sempre foi de mim. Eu não vou… Eu trato todo mundo pelo que ele é, mesmo não me pedindo, tem deficiente que não gosta. “O cego vai descer onde?” Ele não é cego, ele é deficiente visual, gente. E tem muita gente que trata eles mal, sabia? Tem muito motorista, muito motorista ruim mesmo. Não vou puxar sardinha, não, mas tem os motoristas bons e tem os motoristas ruins. Você entra dentro do ônibus, fala bom dia, o cara te maltrata, não te responde, isso é feio demais. A Gato Preto já é diferenciada, essa empresa é diferenciada, porque todo mundo trata todo mundo igual. Desde o dono até o plantonista, o chefe de tráfego, te tratam muito bem. Eu fui abraçado nessa empresa e hoje eu estou há dois anos nessa empresa, já. Não tem o que falar, nada, da empresa. Tudo certinho. E se for da vontade de Deus eu ficar lá mais uns dois ou três anos, eu quero ficar, entendeu? Mas é uma empresa muito boa.
P/1 - Com motorista, tem algum que você teve uma relação melhor?
R - Tive. Tive um motorista muito bom na Viação Tupi. O nome dele é Biaggio. Nós trabalhamos quatorze anos juntos. Quatorze anos nós trabalhamos juntos. Quatorze para nove anos. Acho que mais ou menos uns dez anos, não chegou a quatorze anos, não. Mas uns nove anos. Tratava muito bem. Todo final de ano, um ia para a casa do outro. Eu mais ia para a casa dele do que ele para a minha. Nessa época eu estava amigado com uma pessoa e tal. Aí eu ia no final de semana para a casa dele, era tipo parente mesmo. Nós nos dávamos muito bem, nos damos bem ainda. De idade já, ele. Mora lá na Vila Natal, e Natal, Ano Novo, festa junina, eu estava na casa dele. Sempre. Nós nos dávamos muito bem, com a família dele, os filhos, a filha, o filho… Nos dávamos muito bem.
P/1 - E os seus irmãos? Hoje em dia você ainda tem…
R - Meus irmãos, eu vou pouco. Vou falar bem franco para você, eu vou bem pouco. Porque quando cada um casou, então cada um quer ter a sua privacidade. Então eu, solteiro, um homem barbado indo na casa dos irmãos, é embaçado. E a minha cunhada é meio chata. (risos) Minha cunhada é meio chata, a esposa do meu irmão. Então eu não sou muito fã, não. Minha casa, quando eu volto do meu serviço, estou em casa, eu fico na minha casa. Natal, ano novo, eu não gosto de ficar enturmado. Eu sou um cara neutro, gosto de ficar no meu cantinho, ali. Passo natal sozinho, ano novo sozinho, gosto de ficar no meu canto, ali. Às vezes vou para a casa de um amigo, quando eles chamam, um churrasco, mas é pouco e voltar para casa. Sou muito fechado.
P/1 - Mas esse afastamento dos seus irmãos se deu quando?
R - Depois que a minha mãe faleceu. Depois que a minha mãe faleceu, eu fiz uma promessa que eu não ia mais para o lugar que ela morava, que é lá no Grajaú, Cantinho do Céu, que de céu não tem nada, tem muito nóia. (risos) Então eu decidi que quando ela fechasse os olhos, eu não ia mais. Não dá para ir. Tanto que minha irmã mora na casa que ela morava. Quando eu fui lá a primeira vez, não me senti bem, depois disso não fui mais. Minha mãe fez dois anos agora, dia 23 de junho, que ela faleceu, e eu não fui lá mais. E não vou mais. Eu converso com meu irmão sempre por telefone, mas para ir lá, não dá. Sabe aquela engasgada de você ir lá e você ver a casa da sua mãe e parece que ela está ali? Então prefiro não ir.
P/2 - E o seu padrasto?
R - Meu padrasto mora no Grajaú, naquele CEU Cocaia, tenho um convívio com ele. Quando dá, eu vou lá visitar ele. Está bem velhinho já. Foi um paizão, tomou conta da gente, namorou com a minha mãe, não fez discriminação, ele assumiu todos os filhos da minha mãe e cuidou da gente, criou a gente, então esse é meu verdadeiro pai, né? Porque pai não é aquele que faz, não, pai é aquele que cria você, te dá carinho, te dá respeito. E meu pai não soube fazer isso aí, dar respeito, ele agredia, muita agressão. E isso machuca, sabia? Você falar do seu pai assim, é muito chato. Você falar que seu pai te agredia… Muita surra, muita surra e isso é real, gente. E antigamente, não se vocês disseram, tortura, de o pai pegar e colocar você ajoelhado. Se você dormisse, você apanhava. Você era torturado ali com pedras, ajoelhado na pedra ou na tampinha de garrafa de refrigerante. Isso é uma tortura. Hoje não acontece mais isso, senão ele ia preso, entendeu? Então meu verdadeiro pai é meu padrasto, que soube cuidar da gente, deu carinho, deu amor.
P/1 - Teve alguma vez que você reagiu ao seu pai?
R - Não, nunca. Não dava para reagir, naquela época a gente era tudo inocente, né? Não sabia o que era bem, o que era bom e o que era mal para a gente. Só quando minha mãe se separou dele que a gente foi realmente saber o que era o mal.
P/1 - E vocês iam para a igreja?
R - Não. Não fui para a igreja, não. Fui para a igreja depois de grande, conhecer. Eu não conheço a palavra, mas de vez em quando eu vou, vou lá para ouvir a palavra que conforta, né? Porque a gente pensa assim, que a gente… Isso eu não estou falando só para mim, não. Isso é para vocês também, que são jovens. Deus não reserva uma hora para a gente, não reserva hora para gente. Uma baladinha que você gasta duas horas, por que você não pode dar uma hora para ele?
P/1 - Mas como foi que você chegou à igreja?
R - Não, eu vou para a igreja de vez em quando, porque eu sou batizado, sou católico. Fiz primeira comunhão, fiz tudo, graças a Sílvia também. Foi através dela que eu fui para a igreja, para conhecer. Nunca tinha entrado em uma igreja na minha vida. E ela, não, ficava ali falando para mim: “Vai para a Igreja, vamos batizar você, para você ser batizado!” Aí eu fui e fiz primeira comunhão com a filha dela, que é a Silvinha. Tudo pequeninha, “tampa de tacho”, eu ia, fui lá conhecer, ela me batizou, ela arranjou uma madrinha e através dela que eu fui para a igreja. Não sou católico frequentador, mas de vez em quando eu gosto de ouvir a palavra. Muito bom, conforta o coração.
P/2 - Como é a sua relação com as filhas da Sílvia?
R - Muito boa! Muito boa! Essa é a melhor parte. Antigamente, não. Quando ela pegou… O marido dela começou a me chamar de filho preto, né? As meninas não gostavam, não. Uma só, a Silvinha, não gostava de mim de jeito nenhum. As outras duas, que é a Daniela e a Gabriela. A Gabriela mora aqui em Interlagos. A Daniela mora em Santo Amaro. A Simone mora na Vila Prudente e a Silvinha mora em Itanhaém. Muito boa, hoje a relação da gente é muito boa. Sempre nós conversamos, quando dá tempo de conversar, sempre que dá eu vou lá também, em Itanhaém. Mas minha relação com elas é muito boa, de irmão mesmo. Elas não tem irmão homem, só tem eu, neguinho aqui. Então é muito bom. O pai dela me trata excelente, muito bem. A mãe dela me trata muito bem, muito bem mesmo. Quando minha mãe faleceu, ela falou assim: “Sua mãe não morreu. Morreu a primeira, mas a segunda está aqui ainda.” Então, sempre que dá, quando tenho oportunidade, vou lá.
P/1 - Eu queria perguntar um pouquinho mais também sobre a Gláucia, a sua amiga.
R - A Gláucia. Pode falar.
P/1 - Você contou brevemente como vocês se conheceram, mas eu queria entender como que se construiu essa relação de vocês, no que vocês se apoiaram.
R - Ah, no respeito um pelo outro, né? Acho que no respeito, porque você conhecer um rapaz no site de relacionamento e colocar ele dentro da sua casa com uma filha de… Hoje ela tem 18 anos. É muito difícil, porque você vê tanta gente… tanta coisa errada na televisão, aí. Você coloca uma pessoa que você nem conhece dentro da sua casa, pode estuprar a sua filha, entendeu? A minha convivência com ela é isso aí, de bons amigos.
P/1 - Mas tem alguma situação que vocês passaram juntos?
R - Olha, eu vou falar para você uma coisa que eu não gosto de falar com ninguém. No dia que aconteceu esse acidente comigo de eu ser baleado, os meninos levaram todos os meus documentos, e… Como que eu posso dizer para você? Sujaram meu nome de um jeito tão grande, tão enorme, que só eu sei o que eu estou passando ainda. Mas eu pago minhas contas, tudo bonitinho, e ela me ajudou muito nessa transição, porque eu precisava morar sozinho, não tinha onde morar, eu dormia no chão. Eu dormia no chão onde eu moro hoje. Na época, eu tinha comprado um carro, um Idea 2007, e eu falei: “Pô, mas o que eu vou fazer morando sozinho nesse chão?” Ela me alavancou, pegou e falou para mim assim: “Vende seu carro e monta sua casa.” E foi o que eu fiz. Muitos apertos, passava muitos apertos. Ela falou: “Eu não vou deixar sua peteca cair, eu vou te ajudar.” Entendeu? Bens materiais assim, ela me ajudava bastante. E nisso, eu vim construindo. Vim construindo essa relação de amizade da gente. Quando eu ajudo ela de um lado, ela me ajuda do outro, entendeu? E hoje, não, graças a Deus, eu estou bem melhor do que eu era antes, gente. Você passar dificuldades assim, é muito ruim. Hoje, graças a Deus, não. Não passo mais dificuldade. Ajudo ela e ela me ajuda. Financeiramente, às vezes eu ajudo ela também e ela me ajuda quando dá, entendeu? Mas a gente convive muito bem por causa disso aí. A relação que era para ser de homem e mulher se transformou em amizade.
P/2 - Esse carro que você usa no Uber, ele é seu?
R - É, eu consegui comprar, adquiri ele. Adquiri ele tem 25 dias.
P/2 - Ah, é agora.
R - É. Eu rezei para Deus, para que Deus abençoasse alguma coisa coisa para mim, porque eu quero trabalhar. Eu adquiri ele, estou pagando ele e vamos que vamos. Adquiri ele há pouco tempo.
P/1 - E como motorista de Uber, já teve alguma situação diferente que você viveu?
R - Não, porque eu já trabalhava com táxi, né? Eu era taxista no ponto da Washington Luís. Então eu adquiri experiência, porque na época, quando eu trabalhava na Tupi, eu trabalhava com um motorista chamado Carlinhos de final de semana. E ele falou: “Ô Marcos, vamos fazer um curso de taxista, vamos fazer um curso de taxista!” “Não vou fazer, não.” Um dia ele falou: “Vamos, meu!” Porque ele queria companhia, aí eu fiz o curso de taxista com ele. Aí eu fui querer tirar experiência, já tinha o curso: “Vou tirar o CONDUTAX, para eu saber, né?” Aí fui, tirei o CONDUTAX, e fui ter experiência. Muito boa, mas já tive umas reações bravas, aí. Já fugi de bandido, já. Capotei uma Livina X- Gear 2014, e vou falar para você, é uma sensação muito louca: o bandido estar atrás de você, você fugindo, o carro não tinha seguro, e o carro capotar com você dentro e você não se machucar, não acontecer nada! Foi o que aconteceu comigo, eu fugindo do bandido na Maria Cândida, na Zona Norte, quando eu cruzei aquele do farol piscante, o carro me pegou no meio da porta e me capotou o carro e eu não morri, não aconteceu nada comigo. Então o Uber já trouxe isso aí. Já pouco tempo que eu estou no Uber aí,
eu tive só um constrangimento, tem uma semana e pouco, peguei uma mulher no Hospital Campo Limpo, e ela me levou em uma bocada e eu fiquei com medo. Mas depois disso, não. Fora isso, tranquilo. Mas eu passei uma dificuldade e com medo, à noite. Porque eu gosto da noite, a noite é gostosa, mas aqui para o lado de cá. Aqui também não é muito flor que se cheire à noite, não, viu? Mas é muito bom, a sensação é muito gostosa, trabalhar e ver o pessoal falando assim: “Ô Uber, você me leva para tal lugar?” Entendeu? Muito bom. Sensação excelente. De pessoas… Tem as pessoas más e tem as pessoas ruins, você não sabe quem é quem à noite. Depende só de Deus mesmo.
P/1 - Mas você pode contar de algum passageiro, ou alguma coisa, tanto com o táxi quanto com o uber, teve algum momento que marcou no trabalho?
R - Não, normal. Eu sou tipo assim, posso falar para você que eu sou vida louca de noite. Eu já trabalhei em vários eventos com táxi, tipo D-Edge, The Week, Villa Country, entendeu? Eu ficava no Villa Country, e foi uma vez só que eu tive um… Nem fui eu, foram os outros taxistas, que teve um desentendimento com o pessoal da noite, essas mulheres de bordel, né? Que não queriam pegar ela de jeito nenhum, e eu era o quarto da fila: “Vai indo, aí.” Ela foi perguntando carro por carro, carro por carro, ninguém queria levar ela só porque ela era garota de programa. Aí, quando chegou no meu carro, ela falou: “Moço, você me leva para tal lugar?” Eu falei: “Por que não levar?” “É que seus amigos estão recusando a corrida porque é corrida curta.” Eu falei: “Não, entra no meu carro que eu te levo.” Mas eu não recuso corrida curta, corrida longa, eu faço tudo. A gente tem que gostar do que a gente faz. Se eu entrei no Uber foi para trabalhar, não foi? Não importa a corrida pequena ou corrida longa. graças a Deus, Deus está me preparando só corridas grandes.
P/2 - E quais são as coisas mais importantes para você hoje?
R - Importante para mim hoje é minha filha e arranjar uma namorada (risos). Porque eu moro sozinho. Mas minha filha em primeiro lugar. Vai querer fazer faculdade de medicina e eu estou no Uber por causa disso. Quero dar o melhor para a minha filha. Apesar que a mãe dela é militar, é polícia militar. Mas eu tenho que ajudar também, porque eu sou o pai. E por isso que eu entrei na Uber, para eu ter um conforto para mim e ter um conforto para eu poder ajudar minha filha, que agora que ela vai precisar de mim.
P/1 - E como ficou a sua relação com a mãe dela depois do que aconteceu?
R - A mãe da Laryssa, a gente não se conversa. A gente não se conversa porque ela me traiu, entendeu? Ela me traiu, não sei se eu cheguei a falar para você. Ela me traiu quando eu voltei do coma, ela me traiu e a gente não se dá bem, eu não gosto nem de falar dessa situação. Então a minha filha é mais importante para mim. Ainda se encontra, quando a gente quer se ver, a gente se encontra, mas lá eu não vou. Deixei tudo: deixei casa, deixei carro, deixei tudo para ela. Não para ela, deixei para a minha filha. Abandonei… Se eu fosse um homem de má índole, eu tinha feito besteira na época. Então eu deixei para lá, abandonei tudo, e hoje estou vivendo minha nova vida.
P/1 - E quais os seus planos para o futuro? Você tem algum sonho?
R - Tenho. Tenho um sonho que eu estou esperando aí faz um tempinho já, que meu advogado deu entrada no meu benefício. Eu não recebo benefício nenhum do governo, porque perdi a visão e hoje sou PCD. Eles não… Eu tive que entrar com advogado para receber. Já ganhei a causa. Estou esperando duas causas, uma da Tupi, que eu botei na justiça. E quero montar minha empresinha e comprar meu apartamento. Tenho um sonho muito grande.
P/2 - Você quer ter uma empresa de quê?
R - Quero ter uma empresa de transporte. Quero dar emprego, já que está faltando emprego. Porque tipo assim, eu tenho um carro no Mercado Livre, entendeu? Eu tenho um voyage no Mercado Livre. Eu não gosto de divulgar para ninguém porque o pessoal é muito curioso. E nesse Mercado Livre, tem meu sobrinho. Meu sobrinho trabalha para mim. Então eu não trato meu sobrinho como empregado, né? Ele me ajuda e eu ajudo ele, eu dou a vara e ele pesca. Aí fui e comprei esse carro no leilão, estou pagando ele ainda. Comprei no leilão, coloquei no Mercado Livre. Quero montar uma empresa tipo de transporte. Tipo, você compra um celular pela internet, eu vou lá e entrego na sua residência. Tem vários mercados nesse segmento aí, só que o Mercado Livre não trabalha com carro descategorizado, e essa empresa que eu estou vendo aí, trabalha. Então quero comprar mais uns dois carrinhos, sair esse dinheiro, comprar mais uns dois carrinhos e colocar alguém para trabalhar. E esse do Uber, eu vou fazer o Uber tipo: de dia faço Uber, ou trabalho à noite, para ter um pouquinho de refresco. Esse é meu sonho.
P/1 - E quando você era criança, você queria trabalhar com alguma coisa?
R - Quando era criança, queria ser feirante. Queria ter uma barraca de feira para mim, só que não se concretizou, e agora eu quero fazer outro segmento. Eu tinha esse sonho de ser feirante e ter uma barraca para mim. Já tive, já trabalhei de meeiro. O que eu posso dizer, como é meeiro? Meeiro é tipo assim, meu patrão vai e faz a compra no CEASA, e lá ele põe a tabela, o custo da mercadoria, e esse custo da mercadoria, você tem que fazer o valor da mercadoria que ele gastou lá e fazer mais um pouco para ser dividido por dois. Já fiz isso aí, já fui meeiro já. Chama meeiro. Então hoje, para mim, isso é fichinha. Hoje eu não quero mais ser feirante não, porque hoje não dá mais dinheiro. (risos) Aí eu corri para o lado do transporte.
P/1 - Você quer dinheiro para...
R - Não, eu não quero dinheiro. Eu vou ser bem franco com você, eu quero ter um padrão de vida legal. No final de semana arranjar uma namorada, a gente vai passear… Não bebo, não tenho vício nenhum.
Passear… “Vamos para um lugar diferente?” “Vamos!” Ter dinheiro para a gente poder usufruir. Não quero ficar rico, não. Ninguém vai ficar rico mais nunca, gente, da água para o vinho. Só ter um padrão de vida melhor, entendeu? Porque eu sou meio da antiga ainda. Vamos supor, você é minha namorada, eu não quero que você gaste dinheiro comigo, entendeu? Esse negócio de divisão para mim não existe. A mulher: “Vamos dividir isso, vamos comer uma pizza, vamos dividir.” Eu sou uma pessoa diferente, eu sou aquele homem da antiga ainda, por isso que eu quero ter um padrão legal.
P/1 - E aí, para encerrar a entrevista, quero perguntar como foi contar um pouco da sua história.
R - Olha, foi um alívio. Foi um alívio muito bom, porque…
P/1 - Tem alguma coisa que você quer contar a mais também, que você não contou?
R - Não, não. Estou aliviado, porque quando ela me falou que queria conhecer um cobrador para fazer,
eu falei: “Estou aí!” Estou muito aliviado, porque eu nunca contei essa história para ninguém, sempre guardada aqui no meu coração. Eu só tenho uma mensagem para falar para vocês: se vocês tiverem mãe, que vocês lembrem dela agora. Nunca deixe para depois, porque quando for embora, gente… é muito dolorido. Vocês podem ver que eu estou falando da minha mãe e eu estou muito emocionado, gente, porque… Guerreira, cuidou dos filhos, um que não era dela, né? Foi batalhadora do início ao fim, foi guerreira até na morte. Faleceu de câncer. A última coisa que eu quero lembrar dela é só no dia das mães, né? Que foi o último dia das mães que eu vi, depois faleceu. Que vocês tenham mãe, cuidem bem, porque depois que vai embora, é muito triste. É só isso.
P/2 - Obrigada, seu depoimento foi muito lindo.
R - Desculpa, gente. Falar de mãe é muito ruim. (choro)
P/1 - Obrigado.
P/2 - Obrigada.
R - Imagina.Recolher