Um Século do Desenvolvimento Industrial no Brasil
100 Anos da White Martins.
Depoimento de Igor César Campos
Entrevistado por Consuelo Monteiro e Débora Querido
São Paulo, 12 de novembro de 2011
Realização Museu da Pessoa
Entrevista número WM_HV057
Transcrito por Patricia Guisordi / MW Transc...Continuar leitura
Um Século do Desenvolvimento Industrial no Brasil
100 Anos da White Martins.
Depoimento de Igor César Campos
Entrevistado por Consuelo Monteiro e Débora Querido
São Paulo, 12 de novembro de 2011
Realização Museu da Pessoa
Entrevista número WM_HV057
Transcrito por Patricia Guisordi / MW Transcrições (Mariana Wolff)
Revisado por Camila Catani Ferraro
P/1 – Igor primeiramente eu gostaria de agradecer em nome do Museu e da White Martins, sua presença aqui.
R – Claro. Eu que agradeço por ter sido selecionado.
P/1 – Para começar a entrevista então, você poderia dizer seu nome completo, local e data de nascimento?
R – Igor César Campos. Eu nasci na cidade de Taubaté, no interior de São Paulo, no dia 31 de dezembro de 1979. Quase na década de 80, acabei saindo na década de 70 ainda.
P/1 – E o nome dos seus pais, Igor?
R – Luis Fernando Camargo Campos e Elisabeth César Campos.
P/1 – Conta um pouco a origem da sua família pra gente.
R – Conto sim. Os meus pais são nascidos, naturais, de Taubaté também. Toda a família. A minha mãe tem uma descendência paterna europeia, o meu pai também, mas é já virou tudo brasileiro realmente. O meu pai era de uma família de jornalista, o meu avô era um jornalista até famoso na cidade de Taubaté. A minha mãe já veio de uma família mais simples. Os dois se viram, um não resistiu ao outro. Seria isso aí.
P/1 – Como é que eles se conheceram?
R – Eles se conheceram, o meu pai trabalhava na Ford e a minha trabalhava na Ford. E foi lá que eles trocaram os primeiros olhares.
P/1 – O que eles faziam lá?
R – O meu pai estava começando, ele ainda... ele é engenheiro elétrico né?
Eletricista. E ele estava começando, na verdade, a vida dele nesta área por que antes disso ele foi físico. Ele fez primeiro física e depois engenharia. Então ele estava começando a vida dele de trabalho na Ford. Minha mãe trabalhava como secretária. Acabaram que se encontraram por lá. Ele não resistiu aos olhos verdes da minha mãe, aí ficou.
P/1 – E qual a cidade... eles vieram da onde da Europa?
R – A descendência do meu bisavô materno, ela é alemã. Do meu pai já é mais para o lado português, espanhol.
P/1 – E essa influência europeia ela marcou a sua infância?
R – Não. Não tive muita marcação em relação a isso. Minha infância foi realmente totalmente uma infância local. Tanto que em Taubaté, ainda é uma cidade do interior. Ainda possui, é uma cidade grande hoje, mas possui um ar de interior ainda hoje. E eu tive sorte de pegar uma fase de morar no que a gente chama de Vila, né? Não é um conjunto, um condomínio fechado, é uma vila realmente. São ruas abertas com pouco movimento, então a gente realmente estudava e passava o dia inteiro brincando na rua. Todas as brincadeiras possíveis que existem aqui. Desde pular corda, amarelinha, taco, todo tipo de brincadeira. Realmente tive sorte de ter uma infância de joelho machucado. Não do dedo, de só ficar no computador. Então realmente foi muito bom.
P/ 1 – Você tinha irmãs?
R – Eu tenho um irmão mais novo e ele tem 28 anos. Já é casado e hoje está morando lá na Alemanha. Ele mora já faz cinco anos na Alemanha.
P/1 – Então seus pais tiveram dois filhos apenas. Nessa vila tinha meninas?
R – Vila?
P/1 – Onde você brincava.
R – Não. Uma vila é um conjunto, então tinha amigos e amigas. Todas as crianças se reuniam na rua e brincavam na rua.
P/1 – Mas era aquele conceito de vila de casinhas na horizontal assim? Como aqui em São Paulo que é casa de Vila?
R – Não. Chama de vila por era um conjunto. Na verdade eram casas normais, cada um com o seu padrão, mas como eram ruas muito exclusivas, não eram ruas de passagem ou movimentação, se tornavam um conjunto fechado que não existia nenhum tipo de cancela ou de guarda. Mas se tornava como se fosse um conjunto fechado, e se chamava de vila, isso daí. Era como se fosse uma mini cidade dentro da cidade. Então era realmente brincando na rua, pessoas da mesma idade. Foi realmente bem interessante.
P/1 – E daí um dia você precisou ir para escola...
R – Um dia precisei ir para escola. Como eu sou de 31 de dezembro, eu acabei conseguindo iniciar um ano mais cedo na escola. Então eu comecei com seis anos na escola.
Fiz alguns estudos de maternal e de pré. Iniciei o primeiro ano com seis anos de idade. Iniciei numa escola estadual, que é da própria vila, do próprio bairro. Era uma escola tida como violenta, mas realmente tinham alunos muito bons na região. Tanto que eu tenho algumas medalhinhas daquela época de melhor aluno, de campeonatos que a gente fazia de Matemática contra outras escolas também. Era bem interessante. A escola ficava na rua paralela a que eu morava. Então dava pra sair e brincar bastante. Não tinha desculpa para faltar à aula, mas não tinha desculpa para não brincar. Foi bem gostoso.
P/1 – Agora eu fiquei curiosa. A escola era tida como violenta, mas você disse que brincava, com sensação de segurança, na vila em que você morava.
R – Completamente. Exatamente.
P/1 – Explica um pouco isso. Você conseguiu entender isso...
R – A escola era tida como violenta porque ela tinha aulas noturnas. A aula noturna, não tinham alunos tão bons naquela época. Ela tinha um estigma de uma escola mais violenta, mas a gente brincava praticamente de manhã e de tarde, não atingia a gente. Era realmente muitas crianças brincando, os pais e as mães ficavam na rua, nas calçadas. Realmente parecia o século passado, não parecia esse século. Era bem século passado. As mães na rua, sentadas nas calçadas, as crianças brincando. Estourando bombinhas né? Hoje você vai dar dinheiro para uma criança comprar uma bomba? É nunca, né? E na época a gente fazia bombinha e punha na lata, na caixa de carta, no cano, estourava a caixa de casa do vizinho (risos). Era aquela infância realmente normal pra época.
P/1 – Você foi criado em Taubaté até que idade?
R – Eu fui criado em Taubaté até a idade em que eu realmente decidi sair da cidade. Porque na verdade eu nasci e cresci e continuei. Os anos foram passando, eu fiz colégio técnico. Técnico em eletrônica em uma universidade, a UniTau, Universidade de Taubaté, que tem colégio técnico. Eu cheguei a fazer um estágio na antiga TELESP, na área do antigo processamento de dados técnicos...
P/1 – Você estava falando do ensino técnico. Mas vamos voltar um pouquinho no ginásio, porque eu queria fazer algumas perguntas desse período. Era uma escola estadual, mista?
R – Escola mista, estadual. Uma escola que cantava o hino na entrada hasteava a bandeira, ainda.
Ainda era essa época, embora já fosse na década de 80, ainda cantava o hino nossa escola.
P/1 – No momento de entrar, todo dia?
R – Todos os dias.
P/1 – No pátio?
R – No pátio.
P/1 - Explica um pouco.
R – Faziam-se filas, as filas tinham que estar impecáveis e cantava-se o hino. E a próxima que eu também estudei que era municipal e tida como uma das melhores da época de Taubaté. Também, no caso não privada, fazia fila todo dia. Não se cantava o hino todo dia, mas pela manhã ouvíamos algumas palavras do Diretor. Falando alguma boa prática, dando algum conselho ou recado. E aí fila por fila a pessoa ia se dirigindo para escolas, para as salas no caso.
P/1 – Na área de Humanas, quais eram as matérias?
R – As matérias de Humanas, Ciências Sociais...
P/1 – Tinha Ciências Sociais?
R – Ciências Sociais.
P/1 – Com esse nome?
R – Ciências Sociais. Tinha Língua Portuguesa, História, Geografia. Todas as da base.
P/1 – Filosofia?
R – Não. Filosofia eu fui ter mais pro curso, realmente, de graduação. Um pouco de filosofia onde eu estudei. Na minha base não teve um curso chamado Filosofia, mas a área de Ciências Sociais. Até a área Artística. Eu acho que eles cuidavam um pouquinho dessa área de Filosofia na área Artística. Que eu me recordo muito bem de uma professora de Educação Artística que conseguia misturar muito bem um pouquinho de Artes com um pouquinho de Filosofia. Tentou dar uma base pra gente com isso daí.
P/1 – Você aprendeu a desenhar?
R- Eu, digamos, tentei aprender a desenhar. Vamos dizer que estou tentando até hoje, porque eu não tenho esse dom. Eu tenho um pouco... Eu tenho uma visão mais técnica, eu digo mais quadrada de fazer desenhos isométricos e visões espaciais. Desenhos redondinhos, com cabelo e corpo eu já não consigo fazer muito bem não. Mas eu aprendi a fazer outro tipo de artes, com papel, dobraduras, expressar um pouco em algo que não precisa ficar tão perfeito. Infelizmente eu não consigo fazer traços de desenho naturais, só realmente técnicos.
P/1 – Isométricos?
R- Isométricos, o que são isométricos? São desenhos com perspectivas. Então que você enxergue uma linha que está dentro de outra proporção. Tem que ter profundidade. Você tem que sentir no desenho, como se fosse quase um 3D. Então para isso ele precisa ser um pouquinho mais reto, mais... Desenhos com um pouquinho mais de visão espacial. Eu lembro que o meu pai, quando ele era muito pequeno. Os meus pais eram muito simples quando eles se casaram e eles começaram numa casinha, que era praticamente uma casa nos fundos de outra casa. Aí mudaram para uma casinha maior. Eu me lembro que até os meus 20 anos nós passamos por umas nove, dez casas. Cada vez dando um passinho. Numa das casas, no quintal, tinha uma lousa bem grande. Então o meu pai sempre pegava uma peça assim, desenhava um lado da peça para gente desenhar o outro lado da peça. Meu pai também é técnico, engenheiro né? Pra tentar incentivar um pouquinho dessa visão. Foi um ponto que eu creio que realmente veio do meu pai, esse lado técnico. Minha mãe que trouxe mais o lado humano. Ela sempre trabalhou na área de Humanas. Era uma mulher que era sempre ouvida pelas pessoas, sempre dava conselho. A gente ia, na minha infância, a gente ia muito no asilo que tinha lá próximo. Todas as velinhas conversavam com ela e ela dava conselhos às velinhas. Então eu tive sorte de ter uma pessoa muita técnica e uma pessoa de humanas na base. Foi bem interessante. Depois até na entrada da White foi uma escolha que eu fiz que eu ainda vou comentar um pouco, que foi até muito interessante. Porque eu participei de dois processos seletivos na época, e um era completamente para uma área técnica e o outro para uma área não técnica, ou seja, uma área de negociação, negócios e vendas. Eu tinha até dificuldade de falar no telefone e eu acabei escolhendo ir para a área que eu tinha mais dificuldade, aproveitei que era... já que eu ia entrar como estagiário num processo super importante que a White criou, eu decidi ir para o lado que eu tinha mais dificuldade. Acabou que completou né? Pra mim foi bom.
P/1 – E a sua mãe quando casou, deixou de ser secretária?
R – Ela deixou quando a gente nasceu. Quando eu nasci, depois o meu irmão nasceu, ela optou por cuidar da gente e hoje ela é professora. Ela dá aula também nessa área Humanas, Ciências Sociais e Ética.
P/1 – Ela voltou a estudar?
R – Voltou a estudar. Fez mestrado e batalhou. Ela realmente parou naquela época, foi uma decisão deles. Ela realmente parou para cuidar da gente, não colocar em creche. E meu irmão e eu não tivemos nenhum tipo de problemas. Conseguimos absorver bem os conhecimentos deles. Meu irmão desde cedo trabalhava também. Fez SENAI, então já trabalhava como técnico, sempre ganhou dinheiro. Deu certa liberdade para escolher se queria ou não trabalhar e não obter pressão nenhuma para trabalhar, ela pode trabalhar de uma forma mais... fazendo o que ela gosta. Fazer mergulho, ia para Fernando de Noronha fazer o mergulinho dela. Arrastou o meu pai para essa vida de mergulho. Então...
P/1 – Diz uma coisa, e as mudanças de casa? Se deviam a... quais eram os motivos assim?
R – Um passo de cada vez. Uma melhoria né? Eles começavam a ter um pouquinho mais de dinheiro: “Pô vamos para uma casa um pouco melhor, em uma região melhor. Agora vamos para uma casa de dois quartos. Agora para uma casa de três quartos. Uma casa mais bem localizada”. Foi realmente passo a passo. Meus pais sempre foram, realmente, muito pés no chão. Eles não davam saltos assim. Eles davam passos bem firmes, um por vez. Esse foi até um ponto que está muito na minha personalidade, que às vezes eu deveria tentar perder um pouco e às vezes tentar dar um passo um pouco mais firme. Até essa minha mudança de São Paulo para o norte. Eu considero que foi uma mudança na filosofia da minha família. Meu pai: “Mas você vai sair daqui, vai para região norte, você não conhece lá”. Eles têm um pouco de dificuldade de tomar algumas decisões extremas de vez em quando até por isso, pelo passo a passo. É uma casinha, devagarzinho invés de dar um salto, se endividar e ter um monte de problemas.
P/1 – Isso determinou, também, as mudanças de escola então?
R – Sim, determinou as mudanças de escola.
P/1 – As mudanças de casa...
R – Sim, cada vez que a gente mudava de casa, na época da minha infância, a gente mudava de escola. Então ...sempre em escola estadual. Eu estudei uma vez, em uma escola chamada Jardim de Nações, que era uma das escolas mais caras lá, mas não me adaptei. Nem eu, nem o meu irmão. A gente realmente não se adaptou ao estilo de ensino e das pessoas. Praticamente foi sempre em escola estadual.
P/1 – E aí com que idade se faz uma escola técnica, e por que essa decisão de não se fazer o colegial científico?
R – A decisão foi um pouco, até em conversa com a família, e pela bagagem técnica do meu pai. Ele comentou conosco os pontos positivos e negativos de cada um e a possibilidade de já trabalhar numa área, já ir escolhendo alguma coisa que seria bom ou ruim. Ou seja, você já poderia arriscar algo invés de arriscar só na Universidade. De repente eu poderia ter entrado num ramo “Pô é esse que eu quero” ou não, mas eu termino ele e na Universidade eu posso mudar. No fundo eu acabei entrando mais por essa questão. Fiz técnico em Eletrônica, foram três anos. É o colegial junto com o técnico. Hoje acho que é um pouco diferente, eles separaram o técnico, se eu não me engano, do colegial. Mas era tudo junto e o meu último ano era o ano de estágio. Aí foi lá que eu decidi e percebi que a matéria me deu muita base pro que eu conheço hoje, mas não era o que eu gostaria de fazer. Foi lá que eu percebi que eu queria realmente não era na área de Eletrônica.
P/1 – E precisou fazer vestibular para entrar na escola técnica?
R – Na escola técnica precisou fazer um vestibular.
P/1 – Você estava preparado?
R – Eu estava preparado naquela época sim. Eu vim do municipal, que era uma escola muito forte, fui para o UniTau um pouco antes de entrar no técnico. Estudei lá também, que era uma escola boa. Eu sempre tive acompanhamento dos pais nos estudos. A gente só podia brincar, fazer qualquer coisa...tinha que chegar, fazer a tarefinha e eles acompanhavam. Foi uma coisa muito normal, fazer e já chamá-los para discutir e ver como que é que tá. A gente estudava sempre junto. A gente pedia para eles: “Ah tira a lição nossa”. Eles começavam a fazer perguntas dos livros e tal. Desde pequeno foi assim. Depois que a gente toma outra forma, começa a dar importância não só ao que estava escrito no papel, mas mais para o lado de relacionamento de pessoas.
P/1 – Quem assinava o boletim?
R – O boletim era os meus pais.
P/1 – Os dois?
R – Os dois, mas a gente era...Eu e meu irmão a gente gostava de mostrar o boletim. Era tudo azulzinho, tudo bonitinho. Naquela época era tudo bonitinho.
P/1 – Era letra ou número?
R – Já tive letra e já tive número. Tive os dois já. Na época eu nunca peguei nem exame. Nunca repeti nenhuma matéria. Com acompanhamento e estrutura que a gente tinha também. Eu gostava de estudar, então nunca tive problema.
P/1 – E na época, no pré-primário, jardim. Vinha aquelas coisas escritas sobre personalidade?
R – Vinha. A professora escrevia, quando ela via as tarefinhas no caderno ela escrevia um recadinho: “Pô, muito boa. Excelente!”, nuvenzinha, solzinho, não tinha esse nível de estreitamento ainda.
P/1 – Depois não, né?
R – Depois não.
P/1 – Só o boletim com as notas. Quando que deixava de ser azul?
R – Quando era de número, quando era abaixo, se não me engano, de cinco. E quando era letra, abaixo de D e E. Aí começava a pintar tudo de vermelho. Era aquela cardenetas. Eu tenho ainda guardado. Eu vou até mandar uma para vocês. Uma caderneta daquela mesmo que você abre e tá lá, matéria por matéria com as notas todas escritas.
P/1 – E a vida social na casa de vocês, como é que era?
R – A gente praticamente jantava sempre junto. Meu pai acordava cedo e ia pro trabalho, deixava a gente na escola, até certo tempo. Depois a gente começou a ir sozinho, porque era uma cidade pequena e dava pra ir. Mesmo com 12, 11 anos a gente já ia para escola sozinhos, né? E na verdade à noite a gente esperava ele voltar e na verdade era todo mundo junto. Meus pais nunca foram de sair. A família era muito unida, tanto que é algo que eles mantém até hoje. Praticamente é só os dois e loucos para que eu o meu irmão volte, né? Porque realmente eram os quatro juntos. O dia a dia nosso era sempre muito próximo, mesmo que estivesse assistindo uma televisão, brincando ou ouvindo música, estava sempre todo mundo junto.
P/1 – E os aniversários de vocês? Das crianças?
R – Os meus aniversários, às vezes, até eu esqueço né? Porque é 31 de dezembro, às vezes estou pensando mais na festa do Ano Novo do que no aniversário. O meu irmão faz em abril, no dia 05 de abril. Então o aniversário tinha festinha, com chapeuzinho, bolo com os desenhos, todos os enfeites necessários. Teve bastante aniversário desse jeito, dessa forma. O meu não dava pra fazer tanto assim. Eu lembro da gente ter feito uma festa grande, mais no começo de dezembro porque não tinha condição de fazer. 31 de dezembro o clima é outro. Mas eu ganhava dois presentes, um do Natal e do aniversário.
P/1 – E vocês conseguiam tirar férias todo mundo junto?
R – As férias eram sempre juntos. A gente sempre, os meus pais tiravam na nossa época de férias da escola. Então a gente viajava nas férias junto, muito para Ubatuba, Campos de Jordão, Sul de Minas. A gente sempre fazia viagens longas. Coisas assim.
P/1 – Então vamos voltar à escola técnica. Você saiu da escola técnica e teve uma hora que você foi fazer estágio. Apareceu algum dizer na escola que precisava de estagiário? Como é que foi isso?
R- Tinha vários processos seletivos de estágio e eu me interessei por esse de telecomunicações. Era eletrônica, mas mexia com telecomunicação e era algo que estava aumentando, estava cada vez mais importante. Eu acabei sendo selecionado, nessa prova que teve, uma provinha técnica né? E teve uma breve entrevista. Eu fui selecionado. Mas foi um contrato de oito meses e por ser uma empresa, naquela época a TELESP ainda era estatal, ela não tinha um processo muito claro ou oportunidade de você ser contratado. Tinha que esperar por algum concurso, ou esperar a hora de abertura de vaga. Então foi interessante porque eu trabalhava com modems, equipamentos de transmissão de dados, tanto tecnicamente como instalando em empresas. Eu pude acompanhar e começar a me soltar um pouco. Porque eu sempre fui muito preso no meu lado...de interagir com as pessoas. Embora eu brincasse na rua com os amiguinhos, eu não tinha tanta facilidade de me expressar em público ou outras coisas. Lá eu comecei a me soltar um pouquinho. Foi o que eu pude realmente aprender e tirar do estágio, foi realmente o lado pessoal do que o lado técnico.
P/1 – Quais eram as atividades? Os projetos?
R - Não tinha tanta complexidade, mas o modems é um equipamento eletrônico que precisa ser configurado. Então a gente abria ele, tinha vários jamperszinhos, várias coisas técnicas de configuração. Tinha toda a parte de teste, você tinha que ir na TELESP. Tinha uma central, e isso foi interessante, ficava dentro da TELESP, todo o lugar de telefonia tem uma sala enorme como se fosse uns prédios cheios de pontinhos assim que você vai com gancho e coloca lá. Cada pontinho é um número de uma casa e aí você coloca ali e você ouve a conversa, é muito sério o negócio sabe? Então você tinha que ir lá, é como se fosse um prédio de apartamentos. Então você quer o número tal do telefone, ele diz para você que está na fileira tal e coluna tal. E aí você acha e faz o teste. No caso do modem é um teste digital e se você pegar o errado você entra, realmente, numa linha telefônica. Então tinham vários tipos de teste que a gente fazia. Testes dentro de clientes.
P/1 – E o teste precisa descobrir o quê?
R – O teste a gente via ruído, se a linha estava com ruído, se a velocidade estava conforme a configurada. Às vezes tinha muito ruído de muita interligação nesse próprio painel, esse painel que eu comentei às vezes tinha algum ruído, algum fio que não estava muito bom e a gente tinha as ferramentas que a gente fisicamente acertava para que a conexão não tivesse ruído. Então tecnicamente não tinha muita coisa agregada neste serviço, mas pelo fato de poder sair, conhecer empresas e clientes foi o que realmente pra mim foi importante e me ajudou depois até na decisão de entrar na White Martins.
P/1 – Como é que você poderia ter conhecido um cliente na função que você exercia no momento? Naquele momento, conhecer clientes, como é que se dava isso?
R – Porque era o seguinte: os modems de alta velocidade na época não existiam em casas, e maior de transmissão de dados e eles compravam esse modem, esse serviço que era ofertado. E aí a gente não só instalava, como fazia os testes e a manutenção. A gente visitava várias empresas, a Volks, a Ford, várias empresas em Taubaté e até as áreas de modems, dos CPDS, Centro de Processamento de Dados, e fazia todos os testes. Comecei a poder interagir com mais pessoas, interagir com outros ambientes, conhecer outros processos. Porque você está no seu processo, mas tem muita coisa acontecendo a sua volta. Você está numa empresa de carros, até você chegar ao CPD você está vendo uma linha de produção de carro. Você começa a enxergar certas coisas e aquilo te dá uma curiosidade que acaba te dando um espírito diferente. Que foi isso que depois foi me ajudando a partir para um caminho menos técnico, e no caso, intragerencial. De conhecer as coisas, os processos e não somente técnico.
P/1 – E nessa ocasião teve alguma empresa que te impactou, te interessou?
R – Na época eu não me lembro de ter tido uma visão que mudasse a minha cabeça, não. Foi um conjunto de situações que foi me moldando na época.
P/1 – E você ficou na TELESP oito meses?
R – Fiquei oito meses, eu tinha dezessete anos.
P/1 – E aí o que aconteceu depois?
R – Eu tinha dezesseis para dezessete anos. Depois encerrou o contrato e estava na época de prestar o vestibular. Aí eu entrei no vestibular. Embora eu soubesse que essa área não era muito a minha área, eu tinha um pouco de dúvida. Por fim eu acabei decidindo antes de realmente bater o martelo onde eu ia entrar. Eu li muito sobre todas as profissões. Comprei revistas das profissões, fui em palestras. Tentei me informar o máximo possível. Aí achei que a Engenharia Química realmente pudesse me abrir portas para conhecer muitos processos. Eu tinha curiosidade de saber como que funciona uma chave para abrir uma porta. Coisas básicas né? Eu achei que a Engenharia Química pudesse me explicar muita coisa. Acabei optando por essa área.
P/1 – Houve uma conversa com os seus pais?
R – Muita conversa com eles.
P/1 – Eles tentaram induzir de alguma forma?
R – Nunca induziram. Eles sempre mostravam os dois lados e deixavam a decisão para gente, tanto pra mim quanto para o meu irmão. Sempre induzindo, entre aspas, a realmente fazer alguma coisa e creio que cursos mais alternativos eles não achariam muito bom, porque eles realmente são tradicionais. Como eu não tinha nenhum curso alternativo nas minhas decisões, eles apenas apontavam os prós e os contras.
P/1 – O que seria um curso alternativo para você?
R – Um curso alternativo para mim é um curso que não te deixa tão preso aos moldes que você tem hoje de trabalhar em uma empresa, de bater cartão de entrada e saída. Qualquer coisa voltado para a arte, cinema. Então você não fica tão preso no dia a dia, naquela rotina que a estamos acostumados a ver numa empresa formal, eu via como um curso alternativo. Porque pra gente tinha um pouquinho, ainda mais pra gente de uma cidade do interior, eu tenho um primo que decidiu ir para área de cinema agora, e o pai dele: “Pô, mas cinema? Como é que você vai fazer?”. As pessoas ainda não têm muito bem claro como que a pessoa trabalha nessa área. Agora um engenheiro eles sabem, que ele pega um martelinho e martela né? Ou pega um capacete, é uma coisa menos figurativa. Então que eu falei de alternativo, mas sem depreciar é claro.
P/1 – Agora então, você chegou a fazer cursinho?
R – Eu fiz, porque eu fiquei um ano sem estudar. Eu fiquei fazendo estágio. Aí eu fiz um intensivo no final do ano só pra puxar, realmente dar uma revitalizada nas matérias. E aí eu prestei só nas escolas estaduais. Prestei na UNESP, na UNICAMP, e na antiga FAENQUIL, Escola de Engenharia de Lorena, que hoje é a USP, onde eu acabei estudando.
P/1 – Fala então um pouco desses anos de formação.
R – Com certeza. Até o cursinho me ajudou um pouco a moldar. Embora fosse um curso rápido eu tive uma matéria muito interessante na área de Literatura, que realmente não era uma área minha. Eu nunca tive uma atração tão grande, mas por sorte a gente teve um professor que conseguia mudar a cabeça da gente em relação à literatura. Aquele cara que induzia assuntos e assuntos sempre muito interessantes. Foi bem legal.
P/1 – A sua mãe não lia para vocês antes...
R – Lia. Lia sim, mas não era algo que me fascinava tanto. Eu acho que realmente o que me mudou foi o cursinho que me aproximou para questões de literatura também. E pra música também. Acho que muito da minha formação foi na escola realmente. Eu me lembro da minha escola ainda no primário, nas aulas de música em que a gente brincava com gramática usando Chico Buarque. Então a gente pegava aquela música “Construção” que vai trocando os versos e tal. Eu tive muita sorte de ter tido bons professores na época, eles usaram muitas ferramentas na época que eu pude carregar até hoje. Então foi bem interessante.
P/1 – E a adaptação na faculdade? Como é que foi isso?
R – Então, ai eu acabei passando na FAENQUIL, que é uma faculdade de Engenharia Química que fica em Lorena e realmente no meio do mato. Então não é aquele campus que eu imaginava. Tanto que eu prestei o vestibular em São José dos Campos e aceitei ir, fechei matrícula, eu passei em nono lugar no vestibular. Quando eu liguei perguntando: “Parabéns, você passou em nono”. Eu me empolguei, era aquilo que eu queria. Fiz a inscrição quase que por telefone. Levei um susto no dia em que eu cheguei, meus pais foram junto, me levaram até lá e realmente era no meio do mato, escuro e eu fiquei meio assustado no começo lá. Não era aquele campus que eu imaginei no meio da cidade, cheio de pessoas e tal. Mas a primeira impressão, aquele preconceito, que a gente faz o conceito prévio, ainda bem que eu não levei em consideração. Foi uma faculdade maravilhosa. Foram seis anos. São seis anos Engenharia e nós carregamos praticamente uma turma que não mudou durante os seis anos. Além de muitos bons amigos, as matérias eram as que realmente eu queria, então eu pude ver muito processo. Fabricação de vidro, fabricação de plástico, fabricação de peças de muita coisa. Eu queria entender um pouquinho como é que funcionava. Para mim foi uma escola, realmente, muito forte.
P/1 – E a moradia?
R – Eu como morava em Taubaté, e Taubaté de Lorena fica 50 minutos, uma hora de ônibus. No começo eu acabei fechando com uma condução, porque tinha muitos estudantes de Taubaté. Era uma van que nos buscava num ponto e a gente voltava. No ano seguinte, como era muita gente e muitas faculdades, a gente juntou com outras faculdades e colocamos um ônibus e esse ônibus nos levava e buscava. Na época eu até pensei em morar, mas como eu estava buscando alguma coisa, eu queria trabalhar durante o dia. Estava fazendo alguns trabalhos no computador, fazer planilhas, alguns programinhas, então eu não queria estar lá. Talvez se eu morasse em uma república em Lorena na época eu me desfocasse um pouquinho. Quer dizer, eu passava alguns fins de semana lá, mas fiquei em Taubaté e acabei não indo morar pra lá porque no meu terceiro ano acabei entrando na White Martins e a White Martins era muito próxima da minha casa, então não tinha porque morar lá. Morava em casa, ia trabalhar na White, pegava o ônibus na esquina da White e ia para faculdade. A minha vida não existia casa mais, era White e faculdade. Acabei não indo morar em Lorena.
P/1- Você nunca tinha ouvido falar em gases na faculdade, eu imagino.
R – Nada, nada. Não conhecia realmente a White Martins no detalhe, não imaginava o tamanho da empresa que havia por trás do nome.
P/1 – E a marca?
R – Conhecia por ser muito próxima de casa. A gente passava em cima de um viaduto e tinha um totem super bonito da White. Não conhecia muito detalhe da White Martins e eu não sei até quando eu escolhi a White Martins eu tinha uma pessoa que começou a fazer estágio lá, que estudava na faculdade. Eu fui perguntar para ela, ela me contou um pouquinho sobre a White e realmente começou a me fascinar. Era uma mistura do que eu fazia, do que eu mais gostei na época do meu outro estágio, que era visitar cliente e conhecer processos, com uma parte que eu tinha muita dificuldade que era negociação. Achei que aquela era hora de tentar juntar o que eu tinha de melhor, que era a técnica, com o que eu tinha de pior e podia desenvolver, que era essa área pessoal de negociação, de conversa, toda essa área de relacionamento que eu tinha muita dificuldade. Essa pessoa comentou sobre a vaga, embora ela tenha sido divulgada. Então eu passei por um processo seletivo bem pesado na época. Vieram várias especialistas de RH, de Recursos Humanos, do Rio de Janeiro. Porque eu fiz parte de um processo que a White chamou de Geração 2000. Era geração de estagiários, um processo único que a companhia fez, provavelmente a gestão da época decidiu: “Puxa, eu quero um processo realmente interessante de estágio”. Foi um processo muito forte, foi o Brasil inteiro. Nós tivemos vários treinamentos oficializados, tivemos job rotation, passamos por todas as áreas. Tivemos uma preparação muito boa. Visitamos várias usinas, não só visita, era como se a gente estivesse realmente numa escola. Cada pessoa do seu setor tinha que nos passar todo o conhecimento e aplicar uma prova de dez quinze páginas de várias questões técnicas. Passamos por uma preparação muito pesada. Eu senti muita seriedade quando eu já vi que o processo seletivo tinha várias pessoas do RH, o gerente da unidade, vários gerentes estavam lá. Foi um processo muito pesado que eles fizeram uma primeira peneira curricular e depois uma peneira por telefone, houve uma conversa. E no dia uma dinâmica bem pesada, daquelas que dividissem em grupos, faz tarefa. Eu me lembro muito bem. Tinha grupo que...uma das tarefas era vender um guarda chuva furado. A gente tinha que vender uma agenda do ano passado. O outro grupo vender uma calculadora que não funciona. Eles queriam realmente que a gente inventasse, reinventasse certas coisas, foi bem interessante o processo. E ao mesmo tempo, esse era o meu terceiro ano da faculdade que é quando realmente você pode começar a fazer o estágio. Como são seis anos, a partir do terceiro você pode, eu tive essa sorte. Ao mesmo tempo eu estava num outro processo, em outra empresa, na área de qualidade para mexer com tubos. Era uma empresa de renome também, muito grande, mas para uma área técnica. Qualidade. Mexer com uma coisa que eu certamente teria muito mais facilidade do que ir para uma área de Negócios. Ter que negociar algo, eu realmente tinha muita dificuldade nisso. Eu tentei me superar no teste, tentei me superar até com criatividade, tentando vender aquele produto que eles pediram, mas de uma forma, sem ser tão mentiroso no caso. Mantendo um pouquinho do meu jeito, acabei tendo a sorte de ser um dos escolhidos naquela época. Fomos três escolhidos, dois escolhidos para Taubaté na época.
P/1 – Lembra quantos candidatos?
R – Eu não sei, porque tiveram várias peneiras. Mas na última peneira tinha pelo menos uns três grupos de seis pessoas que as brincadeiras, entre aspas, que a gente fazia no processo, tinha muita gente lá. Então, foi bem interessante.
P/1 – Você lembra o produto que você teve que vender?
R – Eu tive que vender a agenda do ano passado.
P/1 – E você lembra quais foram...
R – Meus argumentos?
P/1 – Os seus argumentos para tentar vender uma agenda do ano passado?
R – Eu tentei vários argumentos, mas eles… a bancada era um pouco crítica. Eu queria vender, tanto para pessoas muito organizadas que quisessem guardar as melhores recordações e em uma agenda muito rabiscada, poderia usar aquela agenda né? Tentar passar a limpo. Imagina passar a limpo uma agenda? Que ideia, e até para os filhos aprenderem a mexer com agenda na escola, já começar a se organizar, mesmo que a data não batesse, mas começar a ter um senso de organização. Ninguém consegue vender muito bem um produto invendável. Mas acho que eles queria ver como a gente se saia quando eles botavam uma pressão, né? O ponto não era nem vender, o ponto era você ser questionado pela sua argumentação e poder contra argumentar de modo a não parecer tão ridículo, ou não se sentir tão triste por não conseguir rebater um argumento. Acho que foi isso que eles quiseram ver na época. Mas foi interessante. Foi legal porque eu tive sorte, passei nesse processo, e eu me lembro que eu recebi um chamado da Confab num dia e no dia seguinte eu recebi o chamado da White já me chamando: “Olha, você pode vir aqui que você foi selecionado”. Então eu passei uns quatro dias assim, tendo que decidir de uma pra outra. Contei com ajuda dos meus pais para decidir isso, o que seria melhor e o que não seria. Conversei com algumas pessoas, até decidir que realmente eu queria ir para a empresa cuja área eu tinha um pouco mais de dificuldade. Nem conhecia muito bem a empresa. A decisão não foi por ser a White Martins. A decisão foi por ter uma dificuldade naquela área e o processo, realmente, me pareceu ser tão sério e tão forte que pareceu que toda a minha dificuldade, que eu tinha, eu poderia me desenvolver na White. E realmente não foi um erro, eu tive muito treinamento de negociação, de relacionamento e gestão de tempo. A equipe que tinha na época era uma equipe muito experiente, então eu me desenvolvi muito. Eu tenho antes da White e depois da White. A personalidade minha mudou bastante depois que eu entrei na White. No meu interior não, mas a forma de expressão mudou bastante.
P/1 – Vamos ver como que foi esse primeiro ano da White, as suas funções, a equipe e a estrutura. Qual era a missão sua na época?
R – A gente inicialmente fez um job rotation, então o fim era ficar junto com a área de Negócios. A gente ficaria junto com o gerente de Negócios, o que eles fazem? Eles são donos de contas, que a gente fala. A gente tem uma relação de clientes da White Martins, cada cliente tem produtos e processos que a gente oferta, novas possibilidades a serem ofertadas e negociações de outros assuntos. Então a finalidade era a gente trabalhar com eles, mas pra gente chegar lá teríamos que passar por vários pontos dentro da empresa. O primeiro ano foi rodando. Então eu fiquei junto com os motoristas entregando cilindros, a gente saía na boleia do caminhão e rodava. A gente rodava os cilindros, rodar o cilindro, você coloca as luvas e vai girando ele. O cilindro, o pessoal chama de torpedo, cilindro igual você ver no hospital. A gente entregava isso nos clientes para sentir as dificuldades e sentir como era o dia a dia desse pessoal também. Saímos com a parte de líquidos, que é outro produto, fomos para a parte financeira, uma parte de cobrança. A gente via como o responsável pela cobrança da empresa efetuava uma cobrança de um título ou algum pagamento não realizado, você ia entendendo como que você tinha que se portar. Área Administrativa. Área de Call Center, que na época era dentro de cada unidade. Eu acho que fiquei dois meses recebendo telefonema e pessoas “Dúvida nisso”. Você tinha que estar sempre buscando aprender para poder solucionar. Aí realmente, depois que a gente rodou por isso e entre uma área e outra a gente rodava, a gente tinha treinamentos em algumas usinas. A gente ia, passava duas, três semanas. Passei três semanas em Osasco, que tem uma usina muito grande lá de produção de gases especiais, que são gases tóxicos. Foi muito importante, a gente realmente rodou pela empresa toda e no primeiro ano foi passando por todas as áreas para dar uma base. Tudo com prova, com apresentação. Tudo muito formalizado.
P/1 – Isso que significa job rotation?
R – Job rotation é exatamente isso. É você poder passar, sentir o que é cada função da companhia e geralmente poucas empresas dão essa possibilidade. Geralmente eles contratam o estagiário já para uma função pré-estabelecida. “Oh, você vai fazer uma proposta. Vai ficar fazendo cotação. Vai ficar fazendo uma coisa aqui”. É mais, realmente, como um ajudante. Lá, esse projeto Geração 2000, foi realmente para formar um profissional. Esse job rotation justamente poder rodar por todas as áreas, se você é contratado como engenheiro ou gerente de negócios você não vai poder perder o seu tempo rodando em outras áreas você já é cobrado por aquilo. A gente não tinha uma cobrança fixa, então a gente pode se dedicar a várias outras áreas né? O primeiro ano foi basicamente isso.
P/1 – E a faculdade? Três semanas em Osasco, em época de prova, como é que foi?
R – Três semanas em Osasco...
P/1 – Tinha provas na época?
R – Eu tinha, mas a gente negociava com os professores. Porque eles realmente estimulavam muito que a gente fosse para o mercado. Se a gente tinha prova, a gente negociava outra data. Nunca tive problema. Também nunca repeti ou tive exame. Nada na faculdade. Foi tudo bem tranquilo, mesmo tendo os afazeres com a White Martins. Mesmo depois, já trabalhando com a área de Negócios, a partir do segundo ano, tinha dias, a região que a gente atendia era todo o Vale do Paraíba, que estava em Jacareí e a reunião era: cinco, seis horas da tarde e a aula era em Lorena, duas horas de Jacareí, as sete. Então a gente tinha que conciliar muito isso daí junto com a faculdade e a faculdade ajudou um pouco com o lado compreensivo e a gente tinha que correr atrás do atraso para passar pelas provas.
P/1 – Quer dizer… Vamos ver se eu entendi: você ficava três horas, três meses numa seção, em um segmento. Aí tinha que fazer relatório, prova também?
R – Prova, dependendo do segmento. Se o segmento era muito técnico, tinha provas que eles faziam para os próprios técnicos deles, que eles treinavam os técnicos para trabalhar. Então tinham provas técnicas, que eles aplicavam pra gente. As mesmas provas técnicas.
P/1 – Oral?
R – E também oral. E se a área não era muito técnica, sempre o gestor da área fazia uma avaliação da gente para liberar para a próxima área. Foi muito interessante.
P/1 – Então, por exemplo, vamos imaginar num setor. Uma pergunta poderia ser assim: “O que aconteceria se alguma peça arrebentasse? Que tipo de reação você teria, quem você chamaria...”, essas coisas?
R – Sim.
P/1 – Você lembra de alguma pergunta?
R – Tem. Tem detalhes dos próprios cilindros que a gente fala. Ele é de aço carbono muito grosso. Ele é feito, usinado sem solda, então é um processo que o tubo vem, vai girando até ficar quente assim, é muito interessante. E você tem que fazer um teste hidrostático dele. O que seria hidrostático? Você coloca uma pressão para ver se ele vai romper e essa pressão é feita com água não com gás, porque se for com gás e rompe, vira uma bomba. Então ele injeta água dentro desse cilindro, aí tem todo um maquinário que coloca esse cilindro com água dentro de um cilindro maior, tudo fechado, e aí eles injetam água neste cilindro e o aço é um aço que você nunca imagina. Eles expandem na pressão, só que você não consegue enxergar. Quando ele expande, ele está dentro de outra camisa com água, essa água é empurrada e sai por um tubo. Você tem que ver quanto àquela expansão num tubo com água foi. É muito interessante. Depois que você despressuriza, ele tem que voltar também ao que ele era antes. Se não voltar ele também está com problemas. Então, sabe, alguns detalhes técnicos que eles perguntavam: "Qual é o grau de expansibilidade que ele pode ter? Qual a pressão colocada lá dentro? O que é cinco terços da pressão”. Eles sempre entram com algumas perguntas muito técnicas, na época. Ainda bem que eu lembrei que é cinco terços da pressão. Tá vendo? Até hoje eu não esqueci disso daí , e eu não mexo mais com isso. Mas acabou sendo de uma forma tão forte, que a gente fixou tudo realmente nessa época. Tinha muito processo interessante.
P/1 – Então, quanto tempo durou o estágio lá?
R – Esse meu primeiro ano foi só de job rotation. Depois eu fiz mais dois anos, rodando com a área de Negócios. Com a área de Negócios fiz um pouco a rotação. Fiquei um pouco com a pessoa que só atende hospitais, que é um ramo do mercado. Uma pessoa que só atende os industriais, que é outro ramo. E um pouco com a pessoa que só atende gases especiais, que é outro ramo mais especializado, que mexe com centro de pesquisas. A gente participou de muitos projetos com o CTA, projetos muito interessantes. Aí eu fiquei, na verdade, eu entrei em 2000 e fiquei até 2003. Em 2003, em maio, eu fui convidado a ser efetivado, mesmo sem ter me formado, eu me formava no fim do ano de 2003, mas eu consegui ser efetivado como Gerente de Negócios no início de março. Aí pude ter um carro, que eu nunca tive, a empresa dá, então pude passar o último ano da faculdade já com carro, tendo um salário melhor. Pra mim foi um salto interessante. Fui efetivado na área de Gases Especiais. Era Gerente de Negócios, só que em gases especiais. A gente fazia muito projeto com o INPE. Essa parte de lançamento de satélite. Eu fiz um projeto, uma vez lá no CTA, que a gente fez uma linha para colocar gases líquidos, com querosene para fazer o teste de uma turbina de foguete que só os Estados Unidos e a Rússia têm a tecnologia. Então, eu pude passar por vários projetos interessantes. No INPE também, em Cachoeira Paulista, a gente fez um trabalho de perfuração de rocha com gás quente sob pressão. Eu projetei toda a parte de pulmão do projeto, toda a parte de compreensão e aí o pessoal ia perfurando… Um projeto mais maluco do que outro, mas muito interessante. Fiquei três anos nessa área, como Gerente de Negócios já efetivado, até 2006. Aí em 2006 eu mudei para a área de Operações e Logística, que eu estou até hoje.
P/1 – E eles davam oportunidade de você dizer, “Oh prefiro ficar aqui. Não vou”?
R – Sim, total. Eu tive toda oportunidade, tanto para sair como para ficar. Eu tinha muitos projetos. A área de Negócios te dá muita mobilidade, então você pode fazer muitos projetos. Fiz também uma pista de esqui, que a gente fez em Campos do Jordão, que teve um marketing bem legal da companhia. Só que em 2006 eu fiz uma viagem para Austrália, porque eu fazia inglês e espanhol na época e eu nunca tinha viajado para fora. E aí a White me possibilitou guardar um dinheirinho. Em 2006 eu peguei as minhas férias, meus trinta dias de férias, e fiquei os trinta dias na Austrália estudando, realmente, numa escola e casa de família para poder vivenciar mais o idioma, deixar ele mais fluente. E aí foi outro divisor de águas, porque quando eu voltei eu senti que precisava de ares novos dentro da mesma companhia. Mudar um pouquinho de processo e de cidade. Mudar um pouquinho de tudo. Em 2006 eu voltei e havia uma Gerente, Juliana Cabloco, da área de Operações e Logística, e ela me conhecia e conhecia o meu trabalho. Fazia alguns meses que ela estava tentando me mudar e me levar para a área dela, mas eu não queria. E nessa volta eu falei “Olha eu aceito”. Três meses de negociações com ela, mas eu aceitei no fim. Fui assumir uma operação sem nunca ter uma equipe minha. Eu era Gerente de Negócios, não de uma equipe. Fui ter uma equipe, funcionários que respondiam para mim. Operação de transporte terceirizado, numa operação que era a maior do Brasil, que era a de Americana e que estava há seis meses sem ninguém porque era muito complexa e dava muito problema. Então já peguei, dos pepinos, o maior né? Era o pepino mais complexo. Aí mudei de cidade. Saí da área de Negócios e fui para área de Operações, que dentro da companhia é uma mudança grande e foi excelente. Eu pude conhecer a empresa por dentro. É como seu estivesse continuando aquele job rotation, mas de uma forma mais séria. Me mudei para Americana, em Campinas, naquela região. Pude fazer muitos contatos bons na empresa, conhecer a empresa por dentro que eu não conhecia. Até essa viagem da Austrália, que me deu essa vontade de mudar, também me deu a vontade de todo ano viajar e estudar. Então pro ano seguinte eu fui pro Chile, para estudar espanhol. Depois para o Canadá para estudar inglês. O ano passado eu estava no México para espanhol. Esse ano só que eu acabei não indo para estudar, mas fui viajar também. Então me deu aquela vontade realmente, de usar as minhas férias, para tentar me desenvolver também um pouquinho e passear né? Conhecer as coisas. No Canadá eu pude conhecer a Praxair, nos Estados Unidos. Fiquei três dias lá e foi muito legal, me deu possibilidades boas.
P/1 – Tem alguma pergunta que queira fazer, Débora?
P/2 – Você falou das operações em Americana, que era um dos maiores pepinos. Conta um pouquinho pra gente qual era o desafio lá, qual era a estrutura.
R – O desafio era muito grande. Fazia alguns meses que não tinha nenhuma gerência local na área de Operações e era uma operação das maiores do Brasil em logística. A gente atendia tanto todo o interior de São Paulo, como tinha viagens que iam até o Acre, saindo de Americana. Você tinha uma complexidade muito grande na Operação. Era o maior número de clientes, o maior número de programação, ali não exigia nem tanto o conhecimento técnico, tão específico. Exigia talvez um senso maior de controle e de responsabilidade porque você lidar com o produto, que a gente transporta, além da seriedade, porque é um produto que pode explodir. Que se faltar em um hospital, pessoas podem morrer porque ele dá suporte à vida. Se faltar em uma indústria, dependendo do processo, você explode uma usina de petróleo, o num processo de vidro você estoura um forno. Então o processo em si é de um altíssimo grau de responsabilidade e podem ter vários tipos de desvio desse processo. O que precisava realmente ali era uma pessoa que enxergasse o lado da responsabilidade dele, conhecesse o outro lado do cliente. Eu conhecia o lado do cliente, conhecia a responsabilidade daquele produto para o cliente. E o lado do desvio que, eu tive uma base boa, era uma dificuldade que tinha realmente. Eu pude ajudar a colocar um pouquinho da Operação em ordem na época. Foram três anos que eu fiquei em Americana como Supervisor de Distribuição de Líquidos. Eu saí como Gerente de Negócios e mudei para Supervisor de Distribuição de Líquidos. Teoricamente se você for analisar, é um downgrade, que a gente fala, supervisão. Mas era de uma área de Negócios para Operação e eu queria, quando voltei da Austrália, mudar, eu queria ter equipe. Eu tinha uma equipe de subordinados. Eu queria fazer gestão de processos e pessoas. Então o processo era o pior possível e as pessoa aí, podia aprender muito também. Passei três anos nesse cargo de supervisor até que eu tive o convite pra assumir a gerência, aí é uma gerência regional. Eu fui para Gerência Regional Norte, onde eu estou até hoje. Desde 2009, passei, até foi um Gerente que é o Orlando Amorim, que é uma pessoa de personalidade muito forte na companhia, que foi também, se não me engano, o primeiro gerente, o gerente mais novo que a empresa teve. Realmente uma mente brilhante a dele. E eu me lembro muito bem que em 2009 ele começou a me pressionar tanto que eu estava imaginando: “Ou eu vou ser mandando embora, ou eu vou explodir”. Entendeu? Ele realmente me testou, eu aprendi muito com ele, para depois ele falar assim: “Aceita a vaga do Norte?”. Ai, como eu não sou casado, na época eu até namorava, mas não era o meu foco, o meu foco era mais o lado da companhia, o desenvolvimento profissional. Aí eu aceitei o desafio de ir para uma região realmente que não conhecia, nunca tinha ido para lá. Não sabia o que era Manaus, Belém. O que era uma logística de pegar balsa, rio e estrada. Eu aceitei e, na verdade, estou há dois anos lá e já estou acertando o processo de modo que mais um ano eu já vou tentar fazer outro deslocamento. Eu realmente quero conhecer a empresa com um giro a cada três anos.
P/1 – Onde você mora?
R – Estou morando em Manaus. Moro em Manaus hoje. Eu fico muito em Belém. Fico em Belém e Manaus, tem uma equipe nas duas cidades. Que realmente me surpreenderam. Eu tinha uma imagem de Manaus que não condiz com o que é lá e Belém muito menos. Belém a cidade é linda. Além de ter tido esse crescimento profissional eu pude tirar esse preconceito que eu tinha até pelo próprio país. Conhecer um lugar que é realmente muito bonito, que não estava nunca... Eu nunca imaginei viajar para Manaus ou pra Belém. Então realmente eu pude conhecer o outro lado. Não só o lado profissional, mas a própria arquitetura da cidade é linda, a história de lá. Tudo é muito interessante. A culinária, totalmente diferente. A cultura, o modo deles no dia a dia. O clima que você não tem mais frio. Ou seja, o primeiro dia que eu cheguei em Manaus, eu saí daqui era mais ou menos setembro de 2009, tava um frio aqui em São Paulo. Era uma semana de frente fria e eu cheguei todo encapotado lá. Quando abre a porta é aquele bafo, eu peguei o taxista: “Amigo está tendo algum incêndio, alguma coisa aí?”, perguntei até sério. “Não, é normal”. Lá não faz frio, não se usa roupa de frio o ano inteiro. Por isso que o clima é realmente outro, as pessoas têm outro tipo de humor. Você não tem o mau humor do frio, só tem o bom humor do calor ou às vezes o mau humor do calor. Mas é tudo diferente. Eu pude ganhar esse lado também, de conhecer uma cultura diferente da região norte.
P/2 – Você passa, fiscaliza…?
R – Isso. Eu gerencio as operações logísticas que acontecem, distribuição de líquidos, tanto em Belém quanto Manaus. As bases são Belém e Manaus, mas a gente atende quase que a região Norte toda, então a minha logística de Manaus, eu trago produto da Bahia. Tem produto que não tem em Manaus. Tem produto que eu tenho, tem produto que não. Então eu trago da Bahia, de Minas, de Betim, de Cabo que fica próximo a Recife. A gente traz produto do país inteiro e atende o país inteiro. Atende o Pará, o norte de Tocantins. É uma logística muito grande. Tem produtos que saem dos rodoviários, em rodo trens que são gigantescos. A maior operação de rodo trens lá é a nossa, no Norte. É como se fosse duas carretas de tanque interligadas, ele é realmente um monstro. A gente tem uma operação de rodo trem que passa para uma operação de container, que é um que também só tem lá. É específico para você colocar numa balsa e trazer para Manaus. Imagina um produto que sai lá de Camaçari, da Bahia, e que roda quatro, cinco dias até chegar em Belém. Você faz todo um trabalho de transbordo e análise. Embarca aquele produto, mais seis dias para chegar em Manaus de balsa. São de seis a sete dias para chegar, dependendo do rio, porque tem época que o rio está numa vazante no máximo, ou seja, está muito baixo o nível. A gente teve problema de encalhar e de não chegar nada na cidade. A cidade é totalmente isolada. Você tem que atender os clientes imaginando uma logística de 15 dias. Você tem que estar pensando 15 dias pra frente. Isso que é o interessante de lá, você não trabalha para o dia seguinte. Você trabalha precavendo coisas que vão acontecer a 15, 20 dias. É muito interessante a logística da região. Ela é muito grande. Em números, em faturamento para a companhia ela não se destaca igual a São Paulo, mas a complexidade dela é muito grande. E por ser perto da Venezuela eu tive oportunidade de ajudar em uma auditoria lá. Fiquei duas semanas ajudando a Venezuela, em Cagua, com o processo dele. Para mim foi muito bom, essa oportunidade foi excelente.
P/1 – E o mercado seria o mesmo? Ou ele é muito diferente?
R – Não. O mercado é basicamente o mesmo. Tanto têm hospitais como tem as empresas. Os próprios enchedores de cilindros que são os filings, que a gente chama. Cliente interno nosso, da própria White Martins. A gente atende a White Martins também. Então o mercado, basicamente, ele não muda. É mais a complexidade logística e algumas características regionais, ou seja, o que aqui muitos trabalham 24 horas, lá já não se trabalha 24 horas. Algumas dificuldades que a gente tem lá de peças, que a gente não tem aqui. Lá são um pouco mais complicadas. O mercado é o mesmo, só que com mais dificuldades.
P/1 – E se você fosse definir logística, como é que você definiria o significado?
R – Logística é difícil de definir, viu? Porque depende muito do dia. Tem dia que eu definiria o caos da dificuldade. Tem dia que eu definiria que é a falta de possibilidade de dormir (risos). Tem dia que eu definiria como algo emocionante, porque às vezes a gente faz algumas operações complexas para ajudar uma empresa numa coisa específica, então é muito emocionante. Acho que emocionante é a palavra, porque às vezes é emocionante do lado positivo, às vezes é emocionante da dificuldade, emocionante na falta de… é 24 horas. O meu celular aqui, já tocou duas vezes. Às vezes estou de noite e ele está tocando. Feriado, de madrugada, ele está tocando. Porque eu tenho uma equipe rodando, então ele não para. É algo vivo e emocionante. Eu acho que é essa palavra.
P/1 – O que são, em um dia, quais são as coisas que podem acontecer e você tem que resolver?
R – Simplesmente todo o tipo de coisa. Desde um acidente, atropelamento, um acidente de alguém no nosso veículo ou do nosso veículo em alguém. Uma morte, uma falta de produto em uma empresa, isso pode levar a vários outros transtornos. Erros de emissão de nota fiscal, erros operacionais. O dia é recheado de possibilidades de coisas que podem acontecer. Não existe rotina. A rotina é que todo dia tem muita coisa acontecendo.
P/1 – E o segmento seu, quantas pessoas? A infraestrutura, como que é lá?
R – Hoje eu tenho duas equipes. Em Belém a gente tem doze pessoas e em Manaus quatro pessoas, diretas da White. Só que você tem a transportadora que presta serviços pra gente e que está sob a nossa gestão. Então em Belém mais ou menos umas vinte pessoas, desculpa, em Manaus umas vinte pessoas e em Belém, somando-se os motoristas que são 54 mais o administrativo vai para umas setenta pessoas. Se você somar o terceiro com o direto, Belém e Manaus por volta de umas cento e poucos pessoas. É bastante gente no dia a dia, na rua e no escritório. Você tem que cuidar tanto da parte interna; das nossas documentações, programações. Você tem o número X de clientes para atender com uma quantidade de produto aqui. Então você tem que fazer essa programação, estar junto acompanhando o programador para evitar falhas e uma falha, como eu disse, pode ser muito grave. Mexe com vida né? Uma falha pode virar a ser fatal, então não pode ter erro.
P/2 – Em relação aos equipamentos, quais são as tecnologias utilizadas para esse armazenamento e distribuição?
R – A gente trabalha muito próximo das usinas. Uma usina, ela produz os gases nitrogênio, oxigênio e argônio. Produção significa que a gente separa eles. Eles estão no ar, a gente respira eles. Estamos respirando oxigênio, nitrogênio e argônio. Tem todo um processo que você separa esses gases e pra você guardar eles, você guarda como líquido que você consegue guardar uma quantidade muito maior. Esse líquido está a menos 186, a quase menos 200 graus, dependendo do produto, que a gente chama de criogênico. Ou seja, se esse produto tiver contato com a sua mão ele vai queimar, ele vai te machucar. Ele exerce uma pressão sob a estrutura que você quiser armazená-lo, então você tem que ter cuidados com pressão e temperatura. Os tanques, tanto os que se produzem quanto os que armazenam, são muito semelhantes. Ele é um tanque interno e um casco externo. Então quando você vir qualquer tanque rodando na rua da White Martins, você pode imaginar que o que você está vendo é um casco. Ele é só um casco externo. Se você fizer uma rachadura nele ali não vai sair nada, nenhum produto. Entre os dois cascos você tem todo um material que se chama pelita, que é um material isolante térmico, e ainda é feito o vácuo. Então para você evitar a maior troca de calor entre a atmosfera e o produto interno. Se você evita a troca de calor entre a atmosfera e o produto, você evita que ele queira se transformar de líquido para gás, aumentando a pressão. Você consegue conservá-lo melhor para o transporte. Todo transporte é crítico, porque você tem que ter uma manutenção muito boa do seu sistema, porque qualquer rachadura você perde o vácuo. Perdendo o vácuo você perde a eficiência dele de ser um antitérmico, no caso, e você passa a perder mais produto, dele jorrar e acertar alguém, perder ele na estrada por despressurização. Então todo o processo é bem complexo. Você tem todo um equipamento para isso. São termoestados, válvulas...o controle do produto tem que ser muito bem feito. E o sistema logístico hoje tem uma tecnologia embarcada muito pesada. Hoje a gente tem um sistema exclusivo, feito para a White Martins. O motorista hoje entra no caminhão, tem um cartão que se identifica. A gente tem uma central que sabe que o cara está dentro do caminhão. Ele inicia o processo, se ele arranca, acelera um pouco mais forte do que deveria, já tem um sensor que pega a aceleração e frenagem. Ele já manda um sinal, a gente é avisado e pontua para ele como: “Olha, ele teve uma aceleração muito brusca”. Como a gente fala, ou uma frenagem muito brusca. Tudo é muito controlado, justamente para evitar que algum acidente aconteça.
P/1 – Ao tanque você explicou. E agora tem haver com as coisas dentro, né? Com os monitores...
R - Exato. A parte de dentro do veículo, do transporte em si. Então como eu estava falando, a gente tem um sistema que, realmente hoje, controla todos os movimentos do motorista. Para que isso? Justamente para a segurança dele. A gente imagina que algo muito grave para a nossa operação é o que a gente chama de tombamento. Isso significa que o motorista numa curva faz com que o veículo tombe lateralmente. Isso para nós é como se fosse a maior penalidade que a gente pode ter, olhando sob os olhos da Praxair, da White Martins. Porque é de altíssimo risco. Além de você poder cair em cima de alguém com o veículo, o produto pode ali queimar pessoas, ter reação com graxa e vir a explodir. Para evitar tudo isso a gente teve que investir em uma tecnologia que ajudasse a conscientizar e a moldar a forma de dirigir dos motoristas, que é uma mão de obra muito diversificada hoje no mercado. Tem sensores de aceleração lateral, que a gente fala. Se o cara faz uma curva, o líquido que esta lá dentro do tanque, ele chacoalha. É possível você tombar uma carreta a 30 quilômetros por hora em uma rotatória. A 30 quilômetros por hora você tomba um veículo desse. Se ele der uma freiada ou acelerada girando o volante, o líquido ele faz assim e no que ele vai para um lado e volta pro outro, ele empurra o veículo e vem pro tombo. Então quando o líquido se mexe lá dentro, ele faz com o veículo tenha uma aceleração lateral. A gente colocou sensores para que se aquela aceleração, atuação alterar, atingi certo nível, ele também vai ter um alarme lá dentro que vai falar para ele e nós vamos receber um sinal de que aquilo aconteceu. Para que isso? Para justamente a gente tentar... às vezes o cara está dirigindo, o motorista, ele não sabe que aquela manobra dele está muito próximo de acontecer, está colocando em risco e ele não está percebendo. Aquilo ali acaba ajudando a moldar uma boa forma de dirigir. Com vários sensores de lateral, de freagem, ou seja, para evitar que ele ande muito próximo de outros veículos e tenha que ficar freando muito forte, isso acaba ajudando na segurança. Todo o nosso sistema, embarcado no veículo, é visando em primeiro lugar a segurança. Depois vem a confiabilidade e a qualidade. A segurança pra gente realmente em primeiro lugar na operação.
P/1 – E toda essa tecnologia, ela vem da indústria eletroeletrônica?
R – Ela vem da indústria eletroeletrônica.
P/1 – E vocês tem que ir atrás desses fabricantes?
R – Na verdade foi feito um trabalho corporativo. A empresa, a matriz, desenvolveu um fornecedor para isso. Desenvolveu quais eram as ferramentas que ela gostaria de receber junto com essa empresa, fizeram um teste em uma operação nossa. A partir do momento que teve um sucesso nesse teste, expandiu para o Brasil inteiro. A operação nossa da White Martins hoje, ela é homogenizada, de líquido. Todo o Brasil opera seguindo os mesmos parâmetros de segurança e usando os mesmos equipamentos de segurança que faz todo o rastreamento. Então é uma empresa que faz isso para gente.
P/1 – É uma parceria?
R – É uma parceria. É uma compra de produto muito próximo. Não é uma parceria formal. A gente não tem nenhuma parte da empresa deles, nem eles da White Martins. Mas é um trabalho em parceria. É um trabalho que foi desenvolvido exclusivo para a White Martins, justamente para satisfazer essa necessidade de moldar nossa forma de dirigir e tentar dar, realmente, um pouquinho de segurança. O Brasil vinha com os piores índices de tombamento do mundo e a partir do momento em que a gente experimentou esse sistema de segurança, acabou. A gente está com o melhor. Foi uma mudança radical na forma de se fazer uma logística. Isso aconteceu com a gente agora.
P/1 – Se eu entendi bem, vocês vieram com uma demanda, seria um fornecedor diria. E ele atendeu essa demanda e aí estabeleceu-se uma relação comercial.
R – Exatamente. A White vinha com um produto, ela sabia o que queria, mas não existia no mercado. Então ela buscou um fornecedor que tinha um know how sobre o que ela queria e aí a gente montou um equipamento de outra empresa nos moldes do que a gente realmente queria. E foi muito acertado, o que a White escolheu fazer foi justamente o que precisava. Solucionou um grande problema que a gente tinha com tombamento. E isso certamente será replicado para o resto da operação mundial.
P/1 – Você mencionou a perlita. Que produto é esse?
R – Perlita é um material isolante. É como se fosse um isoporzinho. Ele é como se fosse um isopor, uma bolinha de isopor. Ele recheia esse espaço entre tanques, para justamente...se você pegar um isopor e colocar algo muito gelado com o isopor, você não sente a temperatura. Ou seja, ele é um isolante térmico. Então se você colocar várias bolinhas desse material, é um recheio. Ele rechia esse espaço entre tanques. Um está muito gelado e outro você não quer que fique gelado, você recheia ele. Só ele tem uma eficiência, se você faz um vácuo você ganha mais ainda eficiência porque o vácuo dificulta a transmissão de temperatura.
P/1 – E esse isopor depende...qual a matéria prima dele? De onde ele vem?
R – Eu realmente não conheço muito bem o processo da pelita, tá? Porque ele já vem no sistema dos tanques. Então eu realmente não conheço. Eu sei qual é o material, conheço ele, a parte técnica dele, mas eu não posso dizer quem o fabrica ou então o que é realmente, por de isopor.
P/1 – Então, eu quero entender um pouco essa relação com a empresa terceirizada. Conta um pouquinho aí, até onde vai a White Martins e onde entra a empresa.
R – Tá ótimo. A logística da White Martins, no passado, já foi primarizada. Por “N” questões gerenciais, em uma época decidiu-se terceirizar-se a logística. Mas terceirizar a logística de uma forma a manter os controles com a gente, ou seja, você tem várias formas de terceirizar uma logística. Você pode simplesmente passar para eles, uma empresa terceira, fazer todo o planejamento de entrega e a forma de entrega e a execução da entrega. Ou você pode dar só a execução da entrega. Então eles hoje têm somente a execução da entrega. O planejamento tá com a gente e a formatação daquilo tá com a gente. Com a White Martins fica o programador, que vai dizer quem precisa ser atendido, qual o volume a ser descarregado para cada cliente e a gente define os equipamentos que vão ser utilizados, quais são as normas de segurança que serão utilizadas. Agora a operação em si, a execução daquilo, a gente terceiriza. Então ela elimina equipamentos que a gente precisaria ter e dilui isso num custo mensal. Você tira ativos que a empresa deveria ter e coloca como algo mensal, como se você estivesse diluindo esses ativos. Então a transportadora, ela recebe um escopo do que ela tem que fazer no dia. O nosso dia a dia, o programador ele entra de manhã. O administrativo primeiro recepciona as viagens do dia anterior, cada viagem é um movimento que a gente fala que vem com uma folha de rota que o motorista deve seguir, cada cliente que ele deve atender, qual o volume e em que horário e com observações. A partir do momento que foi feito tudo isso, no dia anterior o nosso administrativo recebe de manhã e digita todas as informações que precisam ser digitadas, sendo que muitas já foram feitas automaticamente, porque o motorista nosso tem toda uma tecnologia de informação digital. Todo o motorista nosso anda com um computador de bordo. Ele faz todas as informações de nota fiscal, emite eletrônica e imprimi a nota fiscal. Existe uma impressora nos veículos que imprime a nota fiscal, ele não precisa fazer mais isso manualmente. Ele faz todos os dados, que vai imputando quanto ele carregou, o quanto ele descarregou, o nível em que estava o tanque. Tudo é digital e vai diretamente para o nosso sistema e alimenta o nosso sistema. Ele faz uma pesquisa de satisfação com o cliente. Ele faz duas perguntas para o cliente; se a entrega foi feita com qualidade e se ele tem algum problema com a operação. E aquilo ali é respondido na hora e vai para uma avaliação. O que não é feito de forma digital o nosso administrativo recepciona e imputa no sistema, alimentando o sistema o programador vai pegar as informações dos 500, 600 clientes que ele tem que atender. Existe um sistema logístico, desenvolvido pela White Martins, que vai indicar de acordo com uma posição de nível de cada tanque de cada cliente, ele vai dizer o seguinte: “A gente precisa atender esse, esse e este. Mas é bom olhar esse.” Ele deve analisar o que precisa ser atendido no dia seguinte, considerando as frotas que a gente tem e os volumes que cada frota comporta. A partir do momento que a gente faz isso o outro assistente administrativo emite uma receita de bolo. A gente passa para a transportadora o seguinte: “Amanhã você vai ter 20 viagens. Cada viagem está aqui, oh”. Cada viagem a gente deixa montado a nota fiscal de entrega, certificado e o manifesto. Vai tudo já no movimento que a gente chama. O motorista tem que pegar. A transportadora pega aquilo, ela vai designar o motorista de acordo com o horário e vai de acordo com o que está escrito. Ele simplesmente executam, eles não tomam nenhum tipo de decisão. Eles não podem tomar nenhum tipo de decisão no processo.
P/1 - E os motoristas são escolhidos?
R – Os motoristas são da transportadora, escolhidos pela transportadora, mas passam por um rígido processo de seleção para isso, que está nas normas da White Martins. Que devem ser aplicadas pelo transportador. Tem exigências de experiência e comportamento. Tem testes que precisam ser aplicados e mesmo após, depois de ter passado e contratados eles passam por noventa dias de treinamento com a White Martins. Nós temos motoristas da White também, que nós chamamos de instrutores. Então eles fazem esse treinamento, esse acompanhamento com o motorista até poder liberar e conduzir a frota transportadora.
P/1 – Quantos caminhões são nessa sua região e quantos motoristas?
R – Em Belém a gente tem 54 motoristas e em Manaus 14 motoristas. E no total mais ou menos 50 veículos. Eu falo mais ou menos porque às vezes a gente pega de outra operação. A gente tem um intercâmbio com as operações das outras regionais. E eu tenho rodotrem, caminhão e carreta. São veículos de diferentes dimensões e tamanhos.
P/1 – E uma vez montado é assim que eles ficam, com aquele tanque...
R – Uma vez montados é assim que eles ficam.
P/1 – Não é uma coisa de colocar o tanque e tirar o tanque, nessa carroceria, não?
R – Isso só é feito quando aquela carroceria, o chassi, chega em uma idade que precisa ser trocado, ou está com algum problema e precisa ser trocado. Aí a transportadora traz um novo chassi e a gente leva, tem que erguer aquele tanque, colocar no próximo. É outro trabalho, realmente complexo. Isso acontece, mas não é diário. Isso é um trabalho muito raramente.
P/1 – E pra essa quantidade de motoristas, quantos instrutores precisam?
R – Eu tenho dois instrutores em Belém, que geralmente é um para cada 30 motoristas. Então eu tenho dois em Belém e um em Manaus. Nossa região Norte tem três instrutores.
P/1 – Débora alguma pergunta?
P/2 – Eu queria… Você está falando muito da parte de transportes, né? Além disso, qual seria outra preocupação daquela região? Alguma demanda da região norte que acaba sendo um desafio para vocês também.
R – Além do foco no transporte, existe o foco no cliente. Existem clientes que tem uma situação muito particular, algumas particularidades. Essas particularidades exigem um foco também diferenciado. Então tem clientes, como eu te falei, que o produto não pode realmente faltar, então ele exige uma atenção diferente. Tem clientes que tem uma sazonalidade muito grande, hora eles consomem muito, hora consomem pouco. Nossa logística tem que estar preparada para isso, não só pelo transporte, mas para prever essa sazonalidade. E a gente tem usinas que nem sempre estão dentro do nosso centro de distribuição. A gente tem uma usina no interior do Pará, uma usina do lado de Belém e uma usina em Manaus. Mas uma usina pode ter problemas técnicos e quando ocorre um problema técnico a produção para, e se ela para eu tenho que tirar produto de algum lugar. Porque o mercado não pode parar. Essa preocupação ela também é diária e a gente recebe reports diários de como estão as operações no Brasil inteiro. Do nível de todas as usinas, como que está a produção em todo o Brasil. A gente tem uma equipe que olha isso, mas a gente também recebe esse report. Se a gente sente alguma coisa acontecendo, ou uma tendência a gente envolve também essa área que olha o Brasil inteiro, porque tem casos que eu preciso mudar a minha logística e passar a buscar, de repente, em outras regiões. Então o nosso mercado, nossa operação é muito dinâmica. Tem vezes que as outras operações estão em dificuldade e a gente precisa ajudá-los também. A gente tem que apertar o nosso processo e mandar um pouco de motoristas e veículos para ajudar a outra operação no caso. Não é só aquele foco na entrega do produto.
A gente tem que conhecer muito o cliente. Conhecer a sazonalidade e estar em contato com as usinas e com as outras operações. Esse daí que é o desafio do dia a dia. E com coisas que a gente não tem controle, em 2010 a gente teve um problema grave para atender Manaus por um período porque o rio secou a ponto da balsa não conseguir passar. É uma crise. É um momento que a gente chama de crise emergencial. A gente tem que estar trabalhando para, já imaginando o pior né? Então a gente realmente trabalha dessa forma.
P/1 – E como é que aconteceu? Conta um pouco essa história pra gente.
R – Essa foi aquela da Lei de Murphy, né? Quando você não imagina que vai acontecer tudo ao mesmo tempo e acontece. Aconteceu realmente de o rio ficar baixo e de uma grande operadora de balsas, como o rio ficou baixo, ela cedeu o pátio dela inteiro. O vídeo disso é incrível. Você vê containers gigantes sendo engolidos, que pela imagem câmera parece um monte de caixinhas de fósforos caindo num buraco. Foi um negócio realmente gigantesco. E com esse acidente somado ao nível do rio baixo e somado ao período de maior aquecimento do mercado em Manaus, ou seja, estava em uma sazonalidade alta, aí realmente a situação foi desesperadora. Não era só pra gente, era pra tudo. Faltou alimento, outras peças para as empresas. A gente viu a possibilidade de trazer produtos da Venezuela e outras regiões. Vir produtos de avião. Aí na hora a gente tem que buscar as soluções que vêm de outros lugares. E o mais importante, passamos pelo problema e com a cabeça fria você vai pensar em outras ações para evitá-lo. Então a gente já subiu a nossa estocagem, fizemos ações que pudessem, caso isso se repita, a gente não ter o mesmo tipo de problema. Tem que imaginar realmente que vai secar o rio, que vai cair a ponte. Então a gente trabalha pensando no pior. A gente não deseja o pior, mas trabalha imaginando o pior.
P/1 – E essa questão do estoque, da estocagem né?
R – A estocagem é super crítica né?
P/1 – Como é que é isso?
R – A estocagem é super crítica. Ela é também um tanque, igual o que a gente usa no nosso transporte, mas ele é colocado dentro do cliente. Igual ao da nossa produção, tanque interno e externo, a mesma coisa. Só que você dimensiona um estoque do cliente de acordo com o consumo do cliente e o consumo varia a produção do cliente. Então o estoque tem que ser capaz de aguentar um período, entre uma entrega e outra e isso tem que ser bem dimensionado. Se você não tem o dimensionamento correto do estoque você coloca o nosso cliente, no caso, em um risco de confiabilidade. Por isso que não pode também errar. É um assunto que a gente não pode ter falha também. Todo cliente novo que a gente tem, a gente faz uma vistoria antes, junto com a área de Segurança para ver o acesso. Se não vai ter problema com o acesso do veículo, para vê ser realmente o local do tanque é seguro. Tem que ser muito bem trabalhado antes a parte de estocagem.
P/1 – Todo cliente exige estoque?
R – Todo cliente precisa ter um estoque...
P/1 – Precisa?
R – Pelas características do produto. Um líquido criogênico precisa ser armazenado em um local que a gente chama de tanque, e ele não pode ser pequenininho. Ele tem que ser de um tamanho que supra o consumo por algum período e aí a gente chama de estoque. E existe o nosso estoque, nas nossas plantas e usinas que também deve ser bem trabalhados e administrados, porque também se você não tiver produto para entregar é a mesma coisa que você chegar no cliente e ele já ter consumido o produto, ou seja vai parar do mesmo jeito. Então a gente não pode errar na hora de atender o cliente e na hora de ter o produto para atender o cliente. É uma operação que não pode ter erro realmente. Cada erro, além do custo material, do processo do cliente, ele pode gerar sanções contratuais, descredibilidade no mercado. Realmente o grau de responsabilidade é alto.
P/1 – E com vendas? Você mexe?
R – A gente tem a sorte de estar realmente no olho do furacão. Então a gente tá ali no meio. A gente fala com o cliente, a gente fala com Vendas, com Distribuição, com o Processo de gás, Segurança. A gente é como se fosse o centro das atenções, está todo mundo olhando. É o teto realmente de vidro. A gente faz o que a gente chama de SOP, Sales Operation Planning, que são reuniões mensais que a gente faz reunindo, Vendas, Distribuição justamente para fazer um planejamento de como está, como vai ser o mês que vem, justamente prevendo, buscando prever alguma anormalidade no mercado. A gente tem que estar muito próximo, a área de Mercados e Distribuição e a Logística é praticamente uma só. Ela trabalha hoje como uma só e dá resultado. Se você trabalha distante da área de Negócios, realmente não dá. E isso eu pude compreender porque eu já fui da área de Negócios, eu já estive do outro lado e hoje eu passo muita informação, que eu tinha necessidade quando era da área de Negócios, eu passo para eles. Eu replico para eles informações que eu sei que são importantes e que eles não tinham, isso eu sei que só foi possível por eu ter feito essa andança, essa movimentação.
P/1 – E SOP, os profissionais de que área que participam?
R – De Produção, Distribuição, Logística e a área de Negócios. Os três pilares principais. Você produz, você entrega e você está no cliente, então são os principais. Mas a gente está praticamente em todas as etapas. A gente está muito em cliente, a gente tem reuniões quadrimensais em todos os clientes. A gente é avaliado pelos clientes. A gente faz plano de ação direto com o cliente, então é aquele ponto que eu realmente desde a época do meu colégio técnico, que eu queria ter mais contato com o cliente, hoje eu não posso… Tem clientes externos e os internos, ainda ganhei os internos que eu nem imaginava naquela época que seriam tantos, na TELESP. Hoje eu vejo muitos clientes internos e muitos externos, então eu pude atingir além do que eu imaginava, o que eu queria.
P/1 – Como é que é essa história de cliente interno?
R – Cliente interno… A área de Negócios é uma área da companhia, ela é White Martins, mas ela não deixa de ser um cliente interno. Eu tenho que atender área de Negócios. Se eu atender essa área, eu estou tentando o cliente. Da mesma forma que a produção me vê como um cliente interno. Se eu estou precisando de um produto, se eles me atenderem, ou seja eu sou um cliente interno. Se eles me atenderem, eu atendo negócios que atende o cliente. A gente consegue atender o cliente externo, fazendo todo o cliente interno. É uma visão bem pontual de logística essa visão de cliente interno varia de gestão pra gestão. Eu fiz pós em logística industrial, fiz também alguns outros cursos, mestrado também que eu não consegui concluir nessa área, mas todos mostram que realmente se você tratar dessa forma com grau de clientes internos e clientes externo você pode ter uma melhoria final para o cliente.
P/1 – E qual foi o seu aprendizado na Praxair quando você visitou a empresa?
R – Eu estive no Canadá, na Praxair. Foi até um pedido meu. Eu estava ainda em Americana na época, eu tive a visita de alguns americanos da Praxair. E como eu falo inglês eu pude conduzir a visita naquela época e eu falei que eu estava indo de férias e que eu gostaria da oportunidade de conhecer. Eles foram muito receptivos e quando eu fui estudar inglês, eu aproveitei e tirei uns três dias das férias para ficar só na usina deles. Fui recebido pela diretoria, me explicaram todo o processo. Realmente eles demandaram três dias pra mim, foi muito interessante essa visita. E a outra experiência na Venezuela foi muito boa, eu pude ver operações realmente extremas. Uma que está num grau muito avançado e uma que ainda está num grau mais deficitário, necessitando de melhoria. Por um lado pude aprender muita coisa lá no Canadá e pude passar muita coisa para a Venezuela, foi bem interessante.
P/1 – O que é um grau avançado e um grau atrasado?
R – Um grau avançado seria um grau de controle mais avançado, um grau de desenvolvimento um pouco melhor. Algumas questões que pra gente ainda são difíceis, até culturais como de funcionários, responsabilidades… Lá o pessoal tem um grau de responsabilidade a mais mas passado para todos. O programador praticamente não tem muito intercâmbio com a área de Negócios, é uma coisa mais feita mais profissional. E aqui, lógico que é profissional, mas ainda é feita de uma forma que ainda dá um pouco mais de desgaste. Gera-se um pouco de desgaste em nossos processos. Os equipamentos são melhores, são válvulas de melhor qualidade, são equipamentos de um grau que ainda a gente não tem, mas que a gente ainda deve chegar a ter com certeza.
P/1 – Você chegou a viajar no caminhão? Uma coisa comprida, longa?
R – Sim, sim.
P/1 – Conta pra gente essa viagem.
R – Eu não cheguei, muito longa não. A gente evita. Existe uma política de evitar dar carona, mas é lógico a White Martins não pode dar carona. Mas eu não seria um carona, eu seria uma pessoa trabalhando. Mas a gente evita viagens muito longas com o motorista, até para não atrapalhá-lo no seu dia a dia. Mas eu já fiz algumas viagens de atendimento de cliente, também acompanhando para verificar como que ele tá. Até para conhecer a dificuldade da pessoa no atendimento. É bem interessante.
P/1 – Você lembra de algum fato marcante?
R – Eu tive sorte de não ter nenhum fato marcante, tudo transcorreu na normalidade. Às vezes os fatos marcantes não soam muito bons, mas não tem nenhum fato marcante nessas minhas saídas. O gosto é que sempre tem histórias né? Então você ouve a história do pessoal. Uma vez eu estava com um motorista e a gente estava passando, indo até pra Campo Grande, em direção a Campo Grande, um trecho que eu peguei com ele. E aí passando do lado de um pasto enorme e aí tinha um monte de gado né? E ele começou: “Vou conversar com eles”; e estava muito longe o gado. Ele deu um grito assim, dentro da cabine, que começou todo o gado a mugir. Foi muito engraçado, o nível de conhecimento deles de coisas que a gente nem imagina. Ainda bem que foi um fato marcante engraçado.
P/1 – Igor, me diz uma coisa, quais são, você acha, as competências, as habilidades de um profissional da sua área, que você recomendaria? Se você fosse selecionar hoje um profissional ou estagiário, que habilidades você ia requerer dele?
R – Eu acho que pra qualquer profissional, e principalmente para a área de Logística, você tem que saber trabalhar sob pressão, imaginando situações caóticas. Então se você for muito bom tecnicamente, mas se você estiver em frente a uma situação muito complicada e você não souber sair dessa situação, pode ser o melhor aluno da faculdade, realmente não serviria. Tem horas que você tem que, realmente, parar, respirar e pensar. Nem tudo é conduzido, acontece da maneira que a gente quer. Às vezes tem coisas que, por exemplo, a energia elétrica acabou, a planta parou de produzir, e aí? Não adianta parar e chorar, não adianta cair no desespero. Tem que realmente pensar e envolver as pessoas. Tem que ter esse senso de ação em momentos de crise e facilidade de envolver as pessoas, porque você não resolve nada sozinho. A gente tem que estar sempre trocando as informações, envolvendo as pessoas certas. Então eu acho que hoje é uma característica que eu busco mais do que conhecimento técnico. Eu tenho uma equipe, eu tenho um supervisor que cuida da região norte. E eu estou desenvolvendo ele para a minha vaga. Eu trabalho assim. Se seu tiver que sair, se a empresa tiver que me desligar ou se eu for deslocado, eu tenho que deixar um gerente e um supervisor. Se eles vão ser ou não contratados não caberia a mim. Mas eu tenho que deixar duas pessoas que eu possa falar o seguinte: “Tem um gerente e um supervisor que realmente tocam a operação, tocariam a operação tranquilamente”. O meu supervisor está sendo realmente preparado para isso e eu consegui um estagiário, hoje está difícil a gente conseguir essa vaga, que eu tô trabalhando para deixar como supervisor. Então eu gostaria de deixar duas pessoas encaminhadas.
P/1 – Você já fez o job rotation com eles?
R – A gente está fazendo. Há seis meses estamos fazendo. Ele já ficou na área de Instalações de gases e Vendas. Fez o job rotation, mas ainda não acabou. Ainda não veio comigo. Ele já está há seis meses na operação, mas ainda não sentou comigo para conversar.
P/1 – Nós já estamos chegando ao final da entrevista e agora vou perguntar o que você faz na sua hora de lazer? Como você relaxa?
R – Ultimamente como a operação está complexa eu acabo ficando muito tempo na White. Mas eu gosto muito da hora de lazer, de praia. Que infelizmente eu realmente não tenho isso na região de Manaus, por isso que a minha meta é morar em frente a praia. Adoro muito praia. Sair com os amigos. Tomar um bom vinho, com uma boa companhia. Nada além disso.
P/1 – Então você disse que não era casado.
R – Não sou casado.
P/1 – E não tem namorada.
R – Tenho… (risos)
P/1 – (risos) É lá de Belém?
R – Digamos nada formal (risos). Digamos que é de Belém, de Manaus...
P/1 – Quem nasce em Belém é?
R – Belenense.
P/1 – Belenense?
R – Belenense. E quem nasce em Manaus é manauara ou amazonense.
P/1 – E você surfa, ou não?
R – Olha eu tenho prancha (risos). Tá respondido, né? Eu consigo me equilibrar um pouco, mas é que a prancha ficou muito pequena. O problema é da prancha, ela deve ter um furo que eu ainda não descobri.
P/1 – E lá nos rios, lá em cima em Belém não dá para fazer?
R – Sim, lá em cima o pessoal faz muito esporte aquático. Mas o que eu gosto da praia em si é a possibilidade de uma sombra na areia da praia, olhando o mar e batendo papo. A praia não é simplesmente pra mim a água, eu gosto muito disso. Em Manaus tem possibilidade de fazer vários esportes aquáticos, andar de lancha. Lá tem muita opção de lazer também.
P/1 – Então, que aprendizados você tirou ao longo dessa sua trajetória na White Martins?
R – Olha, eu entrei em 2000 na White Martins. Passei uma década na White Martins e é justamente a década em que você está se desenvolvendo. Eu tenho total certeza que eu sou a pessoa que eu sou porque eu entrei na White Martins. Ela me moldou muito. Eu aprendi muito com a White Martins, não o nome, mas com as pessoas que passaram por minha vida aqui na empresa. E diferente do que hoje eu entro em alguma empresa eu vou carregar muito do que eu sou e eu posso dizer que eu era uma pessoa totalmente diferente da White. Eu tinha muitas dificuldades na área de relacionamentos, muito pouco conhecimento técnico, das dificuldades, do trabalho em equipe. Então eu acredito que eu pude aprender, que tudo o que eu tenho hoje foi realmente com a White Martins.
P/1 – E o que você acha da empresa fazer 100 anos?
R – Eu acho inacreditável. Cem não é qualquer empresa que faz. Sustentabilidade e sendo líder do mercado. E fazendo parte de um grupo muito grande. Eu imagino como ela deveria ser há 100 anos com os fundadores, criando algo que não existia no Brasil. Eu acho espetacular. E poder fazer parte dessa data. Eu entrei, ela acabou de fazer 90 anos, e foi bem comemorado, e agora 100 anos é um marco. Eu me sinto orgulho de fazer parte da equipe desse período, até porque eu entrei em 2000 e da equipe, quando eu entrei na unidade de São Paulo, de Taubaté, essa equipe só sobrou eu. Não tem mais ninguém. Não é fácil hoje você se mantém numa empresa no nível da White Martins. Eu me sinto honrado em estar aqui. O processo realmente difícil de você conseguir acompanhar o ritmo da empresa. Temos profissionais que tem 40 ou 50 anos e tem os outros que não conseguem acompanhar. Ela com 100 anos é muito experiência, difícil de acompanhar realmente.
P/1 – E se você for imaginar o futuro do seu segmento atual, você imagina ele como?
R – Com relação a mim, eu me imagino ainda nesse segmento em outra regiões. Eu quero rodar um pouquinho mais em outras regiões e conhecer mais do meu segmento. E eu imagino que ele vai ser cada vez mais controlado por tecnologia. Cada vez mais a gente vai ter a facilidade da tecnologia de dados. É o que realmente mostrou que dá resultados. Essa ferramenta nos ajuda a ter resultado. Ela não dá resultado, ela nos ajuda, se for bem trabalhada, a ter resultados. Controle. Eu acho que ela tende a ir para essa excelência sim.
P/1 – E esse projeto de contar a história, de ter falado um pouco sobre a sua vida. Esse resgate dessa memória, dessa história de vida. O que você achou de ter participado desta entrevista?
R – Eu achei muito interessante. Eu não sabia que ia chegar nesse nível. Imaginei que, até comentei com a Débora no convite, que eu pudesse de repente fazer por telefone ou mandar um e-mail. Mas realmente foi um grau muito grande de intimidade, você poder compartilhar desde a época da infância até os dias atuais. Nem eu tinha organizado na minha cabeça como que as coisas realmente foram trilhadas. E como algumas coisinhas foram contribuindo com outros, naquele passo a passo. Foi muito interessante poder contar, ir ouvindo e até percebendo como é que eu fui chegar aqui hoje. Foi muito interessante. Surpreso até.
P/1 – Obrigada então pela entrevista. Foi um prazer.
R – Obrigado, eu que agradeço.Recolher