Projeto: SOS Mata Atlântica 18 Anos
Depoimento: Beloyanis Bueno Monteiro
Entrevistado por: Beth Quintino e Rodrigo Godoy
Local: São Paulo, 3 de dezembro de 2004
Realização: Museu da Pessoa
Código de depoimento: SOS_HV001
Transcrito por: Maria da Conceição Amaral da Silva
P/1 – Bom dia, Bellô. Obrigada por você ter vindo. Eu gostaria de começar a nossa conversa com você falando seu nome completo, data e local de nascimento.
R – Beloyanis Bueno Monteiro, nasci em 10 de janeiro de 1954.
P/1 – Você nasceu onde?
R – Anápolis, Goiás.
P/1 – E você ficou quanto tempo em Anápolis?
R – Em Anápolis eu fiquei até os dezoito anos.
P/1 – E sua família, assim, seus pais, irmãos? Você poderia falar um pouco deles? O nome?
R – A minha irmã chama Leni Bueno Monteiro e o meu irmão chama Lenine Bueno Monteiro. Minha irmã tem uma coisa muito especial, ela estudou seis anos na União Soviética e morou dois anos no Peru. Ela estudou na Patrice Lumumba. E meu irmão foi exilado, passou doze anos na Bélgica.
P/1 – E seus pais?
R – Meus pais ainda estão vivos e moram em Anápolis. Meu pai também foi um líder do Partido Comunista e hoje está com noventa e sete anos e minha mãe tem oitenta e dois.
P/1 – E como era a sua infância? Onde você morava? Como era conviver nessa família de combatentes, o pai comunista, o irmão exilado?
R – É, os tempos não foram fáceis, pra quem nessa época viveu a ditadura como a gente viveu. O meu pai foi perseguido político, foi preso político várias vezes. Meu irmão esteve preso no Brasil. E essa dificuldade, a saída dele, do meu irmão, a saída da minha irmã também, quando ela foi estudar na União Soviética, era um tempo meio complicado. Mas, ao mesmo tempo, a gente tinha e tem até hoje, uma união muito grande. Meu pai, ele é uma pessoa muito afetuosa e muitos ensinamentos que a gente aprendeu na vida, a gente aprendeu com o grande velho companheiro.
P/1 – Eu sei, porque...
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Depoimento: Beloyanis Bueno Monteiro
Entrevistado por: Beth Quintino e Rodrigo Godoy
Local: São Paulo, 3 de dezembro de 2004
Realização: Museu da Pessoa
Código de depoimento: SOS_HV001
Transcrito por: Maria da Conceição Amaral da Silva
P/1 – Bom dia, Bellô. Obrigada por você ter vindo. Eu gostaria de começar a nossa conversa com você falando seu nome completo, data e local de nascimento.
R – Beloyanis Bueno Monteiro, nasci em 10 de janeiro de 1954.
P/1 – Você nasceu onde?
R – Anápolis, Goiás.
P/1 – E você ficou quanto tempo em Anápolis?
R – Em Anápolis eu fiquei até os dezoito anos.
P/1 – E sua família, assim, seus pais, irmãos? Você poderia falar um pouco deles? O nome?
R – A minha irmã chama Leni Bueno Monteiro e o meu irmão chama Lenine Bueno Monteiro. Minha irmã tem uma coisa muito especial, ela estudou seis anos na União Soviética e morou dois anos no Peru. Ela estudou na Patrice Lumumba. E meu irmão foi exilado, passou doze anos na Bélgica.
P/1 – E seus pais?
R – Meus pais ainda estão vivos e moram em Anápolis. Meu pai também foi um líder do Partido Comunista e hoje está com noventa e sete anos e minha mãe tem oitenta e dois.
P/1 – E como era a sua infância? Onde você morava? Como era conviver nessa família de combatentes, o pai comunista, o irmão exilado?
R – É, os tempos não foram fáceis, pra quem nessa época viveu a ditadura como a gente viveu. O meu pai foi perseguido político, foi preso político várias vezes. Meu irmão esteve preso no Brasil. E essa dificuldade, a saída dele, do meu irmão, a saída da minha irmã também, quando ela foi estudar na União Soviética, era um tempo meio complicado. Mas, ao mesmo tempo, a gente tinha e tem até hoje, uma união muito grande. Meu pai, ele é uma pessoa muito afetuosa e muitos ensinamentos que a gente aprendeu na vida, a gente aprendeu com o grande velho companheiro.
P/1 – Eu sei, porque assim, você fez um comentário. Eu queria que você me contasse direito essa história. De como foi conhecer o Carlos Prestes.
R – Luís Carlos Prestes.
P/1 – É.
R – O meu pai foi companheiro de Prestes na época da Coluna Prestes. Até para você ter uma ideia, ele tem noventa e sete anos, e ele esteve na minha casa. Visitando a minha casa por algumas vezes. E a primeira vez em que ele esteve, foi lá em minha cidade, eu tinha seis anos de idade. E nós fomos conhecer ele em um Clube Recreativo de Anápolis, onde todo mundo tinha que botar uma roupinha legal para ir conhecer o Cavalheiro da Esperança. Para mim, foi uma emoção muito grande, porque a gente já tinha essa convivência com ele, de ouvir falar desde pequeno, de o meu pai estar falando sempre dele, das notícias e essa história toda.
P/1 – E assim, na sua infância, quando você conheceu o Prestes, como era a sua casa? Era muito movimentada? Tinha sempre o pessoal da esquerda? Como era? As reuniões aconteciam lá?
R – Aconteciam e assim, era uma época que não tinha essa democracia que tem hoje, porque as crianças hoje, participam das conversas dos adultos. Era um tempo muito fechado. Mas era muita gente, companheiros do meu pai que vinham e meu pai recebia em casa, ficavam uma temporada. E eram pessoas que estavam, muitas vezes, refugiadas em Goiás, porque era muito distante dos outros lugares. E, então, meu pai recebia essas pessoas, dava o apoio para todo mundo. Então, quando eu era criança, eu achava que todo mundo fosse parente do meu pai. Eu não entendia muito bem. E depois, quando eu comecei a entender um pouco mais, o meu pai falava assim: “Você não precisa saber disso. O que vocês não sabem, vocês não vão contar”. Então era assim, tinha essa regra. Mas foi uma infância muito legal. Hoje eu agradeço muito, porque você conviver com uma pessoa como meu pai, foi uma experiência de vida que eu acho fantástica. Eu acho que se todo mundo tivesse esse privilégio de ter essa vivência, isso seria muito rico.
P/1 – E assim, você contando isso, de achar que todo mundo era parente, fazia um pouco de parte, como que era a vizinhança? Os outros amigos que você tinha? Que ia lá, provavelmente brincar? Como que era essa relação? As pessoas falavam: “Ah, tudo bem. Você pode ir lá brincar com o Belô”. Ou não?
R – Não era muito bem, não era muito legal. Isso eu estou falando um relato da minha casa, da minha família. Mas quando eu estava na escola, eu tinha uns sete, oito anos, teve um certo momento que falavam assim: “Ah, ele é comunista. O pai dele é comunista”. Então, e eu ficava meio assim. Aí quando chegava em casa chorando, e falando, reclamando, minha mãe falava assim: “Você tem que se orgulhar do seu pai porque seu pai não é reacionário. Porque não sei o quê”. (riso) Então essas palavras-chave assim eu sempre ouvia. Mas me incomodava porque eu queria ter uma família como os outros, que não fosse diferente. E no bairro que a gente morava, o meu pai foi sempre uma pessoa muito querida, porque meu pai sempre resolvia os problemas da comunidade que a gente vivia, a gente morava em um bairro mais afastado. Mas aconteceu um fato que é até interessante. Meu pai estava sendo procurado pela Polícia Federal da época e ele tinha feito um esquema para ir para uma fazenda, até passar essa procura da pessoa dele. E ele ficou dentro de casa escondido. E foi uma época que para a gente foi muito legal, porque como ele sempre viajava muito, essa época ele ficou em casa e ele começou a fazer umas pipas e a gente ia soltar na rua. Então assim, fazia umas pipas superbonitas e para a gente era uma alegria. E um vizinho nosso que era uma pessoa muito reacionária, ele deu guarida para a Polícia Federal ficar na casa dele, observando os passos do que acontecia na minha casa. E o meu pai saiu às cinco horas da manhã, e foi quando a polícia prendeu meu pai. Ele passou um dia inteiro dentro de um carro, preso. Mas, no mais, os outros vizinhos que a gente tinha, foram pessoas que deram apoio para a minha mãe. Nós éramos pequenos, então deram suporte até financeiro para a nossa família. Mas esse foi o único caso assim de vizinho que não gostava do meu pai porque ele era comunista. Então àquela época tinha essa história. “Você era comunista, comia criancinha.”
P/1 – Criancinha.
P/2 – (riso)
P/1 – E ele ficou preso? Ele chegou a ficar preso?
R – Ficou.
P/1 – Quanto tempo?
R – Meu pai ficou preso várias vezes. E nessa vez mesmo, eu não sei precisar a data, mas, nos anos setenta, ele esteve preso. Ele esteve preso nos anos trinta. Porque meu pai, na realidade, morava no Rio e era do Exército. E ele foi para Goiás já com uma outra identidade. Isso mais de setenta anos atrás. E um outro nome, mudando totalmente, saindo fora do roteiro da caça aos comunistas. E aí ele se refugiou em Goiás com outro nome e começou a militar em Goiás. E em Goiás também (riso) começou o ciclo de caça aos comunistas novamente.
P/1 – E assim, nessa época, eu imagino que seu irmão seja mais velho do que você.
R – Meu irmão é mais velho do que eu.
P/1 – E ele também estava envolvido?
R – Meu irmão era muito jovem, porque eu falando isso, eu era menino. Meu irmão era mais velho que eu dez anos. Mas o meu irmão também foi militante, meu irmão foi da UNE, meu irmão foi preso em Ibiúna em 1968. Foi mais ou menos nessa época, ele também estava sendo... Ele foi preso em Ibiúna. Ficou dois anos preso e depois ele foi libertado. Mas aí ele foi condenado a onze anos de prisão e isso foi numa época que para a gente aqui da América Latina, foi muito rica. Foi a época do Allende, que era a democracia. Todo mundo queria ir para o Chile porque o Chile estava recebendo todos os exilados políticos. E meu irmão foi exilado no Chile e ficou lá até 1973, quando teve o golpe de 1973 no Chile. E aí ele foi para o México. Do México ele conseguiu asilo político na Bélgica, onde ele ficou até os anos oitenta, quando voltou para o Brasil. Foi uma pessoa também da militância.
P/1 – E a sua irmã não teve esse envolvimento?
R – Minha irmã foi para a União Soviética no final dos anos setenta. Então, não teve uma participação política muito grande, porque ela passou grande parte da juventude dela na União Soviética, ela ficou seis anos lá e passou dois anos no Peru. Ela saiu daqui no final da ditadura, antes da anistia. E voltou em 1985, e encontrou outro Brasil. Começando outro Brasil. Então ela não pegou Diretas Já. Ela chegou meio estrangeira no país.
P/1 – E assim, em 1970, você era um adolescente.
R – Eu era um adolescente.
P/1 – Quinze anos.
R – É, quinze anos por aí.
P/1 – Como que era essa época? Porque você ficou em Anápolis até os dezoito, né?
R – Certo.
P/1 – O que é que fez você sair de Anápolis?
R – A gente teve uma coisa, que era o desejo de conhecer outros lugares. Acho que a cidade também limitava muito as pessoas. Porque a gente tinha uma bagagem na minha casa já de conhecimento, de convivência com outras pessoas fora daqui do circuito. E já queria sair fora, queria conhecer novos lugares, queria viver novas experiências. Como todo jovem, você tem essa ânsia de um sonho, falar: “Não quero ficar toda vida nesse local. Eu quero sair dessa cidade”. Então foi esse desejo de mudança, de fazer coisas novas. Mas a gente já tinha essa coisa, essa expectativa de um Brasil melhor, de fazer coisas diferentes.
P/1 – E você saiu de Anápolis e veio direto para São Paulo?
R – Não.
P/1 – Não. Então conta um pouquinho.
R – Eu fui para Goiânia para estudar. Em Goiânia eu tinha uns amigos, nós morávamos em uma república. Fomos para Campina Grande prestar vestibular em Areia. Morei em Campina Grande um tempo, estudei, fiquei lá e não entrei no curso. Voltei para Goiânia, comecei a falar assim: “Não, Goiânia é muito limitada”. Já no final dos anos setenta – eu fui para Brasília. Em Brasília, comecei a articular com o pessoal do PT, do Partido dos Trabalhadores (risos) do nosso atual presidente da República. Na época também conheci o Lula. Naquela época, era todo mundo formando o PT, criando diretório, criando núcleo. Então foi uma época muito legal. Uma época que trouxe uma experiência muito grande de militância. Uma época de atuação muito forte, porque a gente estava na luta pela Anistia. Meu pai liderava um dos grupos de Anistia de Goiás. E a gente, então, tinha o desejo que a Anistia fosse assinada logo pelo João Figueiredo, porque além dos companheiros que a gente tinha fora do Brasil, tinha o meu irmão que ainda não tinha voltado. E a luta nossa, do meu pai era para que ele e os amigos e todos os companheiros voltassem. Houve um engajamento muito forte nessa época. E em paralelo, essa época foi a fundação do PT, que foi muito rica na minha vida. Foi uma época importante porque a gente viajou todo o entorno do Distrito Federal, formando os diretórios, conversando com as comunidades, falando da importância desse novo partido político que estava nascendo. E, muitas vezes, as pessoas diziam: “Olha, esses meninos, eles são comunistas”. E, não sei, mas ainda tinha meio o ranço da questão do comunismo que hoje a gente não vê mais, está tudo muito mais tranquilo. Naquela época não era tão tranquilo.
P/1 – E aí, de Brasília?
P/1 – Belô, e aí de Brasília que você veio para São Paulo? Ou você fez escala?
R – Escala em Londres... (riso) Em Brasília eu trabalhava em uma produtora de vídeo, num programa que chamava Terra Viva, que era veiculado na TV Bandeirantes às sete horas de domingo. Aí o povo falava que quem assistia era só minha mãe e os amigos mais próximos. (riso)
P/1 – (risos)
R – Que nessa hora, ninguém merece acordar sete horas. E aí o jornalista com quem eu trabalhava falou: “Olha, nós vamos fechar a unidade em Brasília”. Que era ligada à OCB – Organização das Cooperativas Brasileiras – que financiava esse programa. E ele disse: “Nós estamos indo para São Paulo, e em São Paulo a gente vai montar o nosso núcleo”. E aí eu vim acompanhando ele e esse grupo de pessoas. Foi como eu cheguei aqui em São Paulo em 1980.
P/1 – Esse programa era sobre o quê?
R – Sobre agricultura. Até foi em uma época que essa questão de meio ambiente foi despertada na minha pessoa: a gente, plantio direto. Eu nunca tinha visto plantio direto. Que é uma técnica de plantio que você não aduba tanto a terra. Então, foi a primeira vez que eu tinha visto falar de uma coisa. Tinha já visto falar com a minha avó, minha família. Essa coisa de meio ambiente, você já trás do bojo da infância, da família, esses cuidados. Mas nessa época, a gente conviveu muito com essa técnica. A gente viajou muito para o Paraná. Então foi uma época muito interessante.
P/1 – E me diz uma coisa: você acha que o seu envolvimento com o meio ambiente, ele tem início aí? Com este programa ou é anterior?
R – Não. Eu acho que ele tem início na minha infância, na minha casa. Porque a minha avó morava no interior de Goiás. Eu passava as férias na casa da minha avó. E a minha avó morava em uma casa em que, a gente fala de espaço em São Paulo, o espaço nosso é tão limitado. Ela tinha um quintal enorme, tinha todo tipo de planta e tinha muita hortaliça. Então eu ia passar as férias na casa dela, ela botava todo mundo para trabalhar, para ajudar. Você tinha que acordar cedo e regar as plantas. Então, tinha dia que eu falava: “Puxa, a gente vai acordar cedo para jogar água no...” (riso) E assim, era tirar a água do poço, na cisterna. Mas eu via o cuidado que ela tinha e o carinho que ela tinha, então era uma coisa que já ficou na minha cabeça. Porque eu acho que essa semente sobre o meio ambiente é uma coisa que vem de infância. Eu acredito muito que você começa a sensibilizar a partir da primeira infância as crianças para despertar para o meio ambiente.
P/1 – E aí, quando você chegou em São Paulo, você fez o quê? Voltando assim a história.
R – É, voltando para São Paulo, né? Vamos voltar. Atualizar, né? Eu cheguei em São Paulo e pra mim foi um escândalo, foi uma maravilha, uma cidade maravilhosa, mil oportunidades. Eu fui trabalhar com um pessoal que trabalhava com vídeo, e eu convivia com pessoas que faziam vídeo em São Paulo. E, então, foi interessante porque eram muitas festas, era muita coisa acontecendo. E eu me engajei logo no PT daqui, conheci várias pessoas interessantes. Então assim, foi muito rico o aprendizado de estar em São Paulo. Foi uma descoberta.
P/1 – E aí quando você chegou, você trabalhava com o quê, em São Paulo?
R – Eu continuei trabalhando em uma produtora por dois anos, mas ela, por motivos financeiros, acabou. E aí foi proposto para esse grupo que trabalhava formar uma cooperativa. Então eu também fui participar dessa cooperativa, que chamava Coterra – Cooperativa de Trabalhadores de Informação Rural. Então foi meio uma experiência de me envolver mais com uma coisa de terceiro setor. Que na época, isso nos idos de 1983, não era tão rica quanto é hoje, que a gente tem várias ONGs. E o terceiro setor hoje tem uma transparência muito grande.
P/1 – E como que era esse trabalho?
R – Esse trabalho é o seguinte: essa produtora, essa cooperativa era dos jornalistas, técnicos em VT, cinegrafistas. E a gente pegava institucional e fazia para a Embrapa, para empresas. Depois era rateado em um modelo colaborativo. Mas, também, a gente não tinha muito tino do negócio, muita experiência, as pessoas que estavam envolvidas na história. E a questão econômica no país também era mais complicada do que hoje. Acho que, aí a cooperativa a teve que encerrar as atividades. Depois eu voltei a trabalhar em uma outra cooperativa, uma outra produtora. Trabalhei um tempo. Até que comecei a trabalhar na questão do meio ambiente.
P/1 – E como é que foi assim, quando você começou a trabalhar na questão do meio ambiente mesmo? Onde foi? Que época?
R – Foi na realidade em 1984, 1985, eu conheci várias pessoas que eram da antiga Sudelpa e eram pessoas ligadas ao meio ambiente. E lembro, quando foi a Fundação da SOS Mata Atlântica, eram pessoas ligadas à Associação, não existia a Associação em Defesa da Juréia porque ela nasceu em 1986. Mas já existiam as pessoas que estavam no movimento e que eram meus amigos e: “Olha, vamos! Vai acontecer isso e está acontecendo”. “Olha, tem a questão das usinas, a de Peruíbe.” “Olha, está tendo um movimento.” Então assim, você já ouvia falar muito dessa história e foram pessoas que ficaram muito próximas de minha pessoa. E aí a Associação em Defesa da Juréia foi fundada em 1986 e eu trabalhava em uma produtora. Eu me lembro que eu fazia produção independente. E aí eu estava saindo desse trabalho e uma amiga minha que era do Conselho da Pró-Juréia disse: “Belô, a gente precisava arrumar alguém para trabalhar na Associação em Defesa da Juréia. E eu acho que você podia ir lá para você conversar com o pessoal, porque você tem o perfil, você já vem de uma militância e isso é importante”. Ela falou: “Ó, você vai lá e fala com o Capobianco e com o João Allievi”. Aí eu falei: “Deixa eu ir lá, não sei quem é esses caras”. Tirei meu brinco, botei uma roupa mais séria para poder conversar. Não sabia quem era e fui conversar com o Capobianco. Foi uma conversa super agradável e no outro dia eu já comecei a trabalhar. A gente tinha uma sede ali na Brigadeiro Luís Antônio, que era sede do escritório político do Fabio Feldmann. E era o lugar onde abrigava várias Ongs que estavam nascendo àquela época, Oikos, Associação em Defesa... a gente não tinha nem uma mesa. Depois que eu comecei a trabalhar, conseguimos essa mesa onde eu pudesse sentar e ter um telefone para poder ligar para as pessoas e começar o trabalho. Porque não era só um trabalho, era mais do que um trabalho, era uma causa. Eu fui o primeiro cara naquela época a trabalhar profissionalmente, porque o SOS Mata Atlântica estava lançando, preparando para lançar a campanha do “Estão tirando o verde da nossa terra”. Essa campanha ainda não tinha sido lançada. E a Pró-Juréia ainda estava articulando. Já tinha um movimento, abaixo assinado. E ela não tinha funcionário ainda, depois de um tempo que a SOS começa a contratar. Mas eu já estava trabalhando de seis meses a um ano na Pró-Juréia.
P/1 – E assim, quem eram essas pessoas que trabalhavam na Pró-Juréia que fizeram esse movimento? E o porquê? Por que é que surgiu essa necessidade?
R – Eu acho que a necessidade que é bem óbvio, é a questão da importância da Estação Ecológica da Juréia. Eu acho que foi o primeiro grande movimento ambientalista dos últimos anos. Que foi a questão de várias pessoas se mobilizarem em torno disso. E naquela época, o que era interessante é que muitas dessas pessoas pertenciam ao Governo. Então assim: era da Secretaria do Estado do Meio Ambiente. Então assim, que é um caso meio inédito que estava acontecendo. Tinha uma parte que não era ligada ao Governo e outra parte era ligada ao Governo. Então essas pessoas, todo mundo com uma tal preocupação que a Estação Ecológica fosse tirada do papel. Inclusive a campanha da Pró-Juréia foi feita pela Denison, uma campanha bem legal: “Ajude a transformar um parque de papel em uma Estação Ecológica de verdade”. Que era com os origami. Muito bonito. Então, foi a primeira campanha também de fato, em paralelo com o nascimento da SOS, que é a questão da campanha pela Juréia, que antes era para criar uma usina nuclear. Então essas pessoas se mobilizaram todas em prol dessa causa. Foi muito rica.
P/1 – E como é que foi seu encontro assim, na época, né? Quem era o Capobianco e o João Allievi que você foi conhecer? Como é que foi esse encontro?
R – Foi um encontro muito surpresa. Até que eu estava falando para você que eu tirei o brinco porque não sabia como é que era a figura que eu ia encontrar. Vamos lá: homem naquela época, você usar brinco era uma coisa meio inédita. Hoje já está comum. Mas o Capô era uma pessoa muito especial e uma pessoa muito envolvida. Então foi uma coisa que a gente teve uma empatia muito grande porque já trazia essa coisa da militância nossa, que era uma militância partidária que estava meio passando para a questão da militância ambientalista, que para mim era uma coisa nova. Eu sempre tive uma experiência de partido político, mas você começar a participar de dentro de uma ONG... E nós tínhamos um Conselho e eu era um funcionário que participava, como todos eles, do Conselho. Participava de todas as reuniões, não tinha separação: “Ele funcionário, ele não participa das reuniões do Conselho”. Então foi uma época muito rica e o aprendizado muito grande para mim.
P/1 – Essa militância ambientalista, você que passou por partido político, por uma militância que a gente pode chamar política, você acha que era muito diferente? Você sentiu uma diferença grande?
R – Eu senti, mas eu acho que hoje – até fazendo um comparativo – acho que a gente tem uma necessidade de politizar esse movimento ambientalista. Eu acho que não partidarizar, mas politizar. Eu acho que as ações do movimento têm que ser mais politizadas, as pessoas, eu acho que elas têm que se engajar mais. Eu acho que havia por parte do partido, eu acho que era mais, eu acho que a militância no partido é mais sofrida. Ela era mais carrancuda, mais séria. Também era um tempo de transição em que a gente estava saindo de uma ditadura para uma abertura política. Eu acho que isso é importante frisar. Um partido político novo. Então assim, militar dentro do PT foi uma experiência muito legal porque era um partido que estava nascendo, era novidade. Então, acho que era uma época muito ruim. Mas havia uma diferença que o movimento ambientalista tinha também, a dificuldade da mobilização. E essa história toda era assim, tinha alegria, uma solidariedade entre as pessoas. Você tinha mais uma convergência na sua atuação.
P/1 – E como que era a convivência de vários grupos nessa sede que abrigou várias ONGs? (risos)
P/1 – Como que era isso?
R – (risos) Eu posso dizer a você que era divertido. Eu estou meio saudosista. Eu acho que ego é uma coisa que sempre carregou as pessoas. Mas eu acho que, naquela época, as pessoas tinham mais – independente da ONG que você pertencia – tinham mais união. Um desejo maior que as coisas acontecessem. Essa experiência, eu acho que a gente tem que falar sim, porque foi muito rico. Uma casa que abrigava várias pessoas com organizações diferentes e missões diferentes. Mas tinha um ponto em comum que era a questão do meio ambiente. Eu acho que isso era muito rico, muito novo para aquela época, Hoje a gente não tem essa história.
P/1 – Nessa época, tem alguma coisa que te marcou muito? Algum fato que tenha te marcado?
R – Teve um fato que eu acho que é marcante: foi quando nós fomos ao Palácio do Governo entregar o abaixo-assinado pela criação da Estação Ecológica da Juréia, no Governo Quércia. E a gente tirou cópia de todo o abaixo-assinado e cercamos o Palácio com as cópias, colocadas em uns cordões. E cercamos o Palácio do Governo com esse material e uma comissão de crianças – que hoje já são adultas – foram entregar juntamente com a comissão para o governador Quércia. Então para mim foi... tinha aquele monte de polícia, aquela coisa. Eu achei que foi muito importante porque era resultado de uma mobilização em uma época em que a gente não tinha e-mail, a gente fazia por fax, a gente tinha que usar o telefone. E eu acho que as pessoas, apesar de hoje a gente ter uma divulgação muito grande da mídia, a gente não tinha uma mídia assim tão favorável. Então, os conselheiros das organizações, no caso da Juréia especificamente, eles eram multi-presentes. Então a gente tinha que fazer as coisas com quem pertencia ao Conselho, não era só aquela casta maior. Mas eram as pessoas que botavam a mão na massa também. Porque a gente tinha uma causa pra defender. A gente, todo mundo tinha que trabalhar, tinha que fazer a história acontecer.
P/1 – E, Bellô, me fala uma coisa assim: nessa época, o Brasil tinha um modelo ou era um modelo que vinha de fora, dessa militância, das questões ambientais?
R – Eu acho que tinha. Eu acho que a gente estava sendo criado. Eu acho que não tinha um modelo. As pessoas imitavam muito os Estados Unidos. Não é novidade para ninguém, o Brasil sempre está imitando os norte-americanos. Hoje eu acho que não. Hoje eu acho que o terceiro setor já tem uma cara própria, as pessoas já têm uma identidade própria. As organizações, hoje, já têm uma característica própria. Eu falo mesmo: eu estou na SOS há muitos anos. A SOS vem adquirindo ao longo dos anos um formato dela, uma maneira dela de mobilizar, de estar agregando as pessoas. Então, naquela época era tudo muito novo. A gente estava meio aprendendo a fazer as histórias.
P/1 – E você ficou no Pró-Juréia até que ano?
R – Eu acho que até 1990.
P/1 – E quando que você foi para a SOS? Como é que foi essa sua...
R – A minha ida para a SOS? Eu estou acompanhando a SOS desde a formação em 1986. Mas trabalhar profissionalmente na SOS foi a partir de 1993, quando a SOS foi a ONG sede da rede de ONGs da Mata Atlântica. Porque em 1992 foi criada a rede de ONGs da Mata Atlântica com o sentido de agregá-las. E eu fui trabalhar na rede com o Mauro Quintanilha que era o jornalista para fazer mobilização das entidades. E aí nós fomos contratados pela SOS para trabalhar como funcionários para a rede da Mata Atlântica. E, em 1994, a rede sai da SOS, mas aí eu continuo na SOS ainda.
P/1 – E assim, você conhecia já a SOS Mata Atlântica quando ela foi fundada, quando ela surgiu porque você já estava no movimento.
R – Já.
P/1 – Desse tempo que você conheceu, do tempo que você foi trabalhar, você fez um acompanhamento? Você acha que mudou muita coisa? Como que era?
R – Acho que mudou. Eu venho de uma ONG que é a Pró-Juréia que era uma ONG pequena, de uma estrutura menor. As pessoas, como eu estava citando, do Conselho, se mobilizavam para que essa ONG existisse. E a SOS, eu acho que ela já nasce com uma estrutura de pessoas, já com alicerce bem feito. Eu acho que ela cresceu muito desse tempo. Quando eu fui trabalhar na SOS já tinha uma estrutura muito mais arrumada, programada, estruturada, e nos dias de hoje nem se fala.
P/1 – Essas pessoas que estavam na SOS que fizeram com que ela se estruturasse, aparecesse, eram pessoas que você já conhecia de outras ONGs?
R – Uma das pessoas que foi superintendente da SOS, com quem eu trabalhei muito tempo junto, foi o Capobianco, que é meu amigo, uma das pessoas que mais lutou pela Juréia, pela criação da Estação Ecológica da Juréia. Depois, eu fui trabalhar com ele na SOS quando ele era superintendente da SOS. Ele era o cara que era o elo de ligação com a rede da Mata Atlântica. E o Mário Mantovani, que é também meu amigo e que eu conhecia também de longa data, que já estava na SOS. O Clayton. Então, essas pessoas todas que ao longo dos anos já estavam na SOS.
P/1 – Bellô, eu queria que você falasse um pouquinho desse trabalho da SOS. Desses anos e dessa evolução. Como é que você está vendo.
R – Da evolução do trabalho da SOS?
P/1 – Sim, coisas que você chegou a fazer, ou que você está fazendo.
R – Eu tenho acompanhado mais de perto, a partir do momento que eu passei a ser funcionário da SOS, a gente vê um grande crescimento. A SOS hoje, ela tem um nome muito grande, ela mobiliza muito. Mas isso eu acho que também tem a dificuldade dela. Não é tudo muito fácil, porque acho que até a própria mídia, você tem, às vezes, fatos importantes, você conseguir trazer a mídia para divulgar as suas ações não é fácil. E a luta dela de estar, por exemplo, na questão do Atlas da Mata Atlântica. É uma questão que a gente vem ao longo dos anos lutando. Eu acho que a gente ainda não deu um salto na questão de politizar mais o movimento. A gente não tem hoje mais representantes políticos em Brasília. Eu acho que é fundamental, não adianta, nos movimentos todos: Sem Terra e o ruralistas que fazem grandes lobbies. Eu acho que a gente tem uma estrutura. E eu acho que agora, a gente talvez nos dezoito anos, seja o momento da gente estar dando mais esse salto. Porque eu acho que a SOS já acumulou ao longo dos anos uma experiência em mobilização. Então, eu acho que agora a gente tem que botar mais na prática para fazer com que as causas importantes para a SOS – no sentido da defesa da Mata Atlântica – sejam implementadas. Eu acho que é uma coisa de politizar. Eu acho que o movimento ele não tem que ser partidarizado, mas ele tem que ser politizado. Então, a gente tem que trabalhar com esses, não basta sensibilizar. Você tem que mobilizar essa pessoa e fazer com que essa pessoa entenda realmente a importância da luta pela defesa do meio ambiente e da Mata Atlântica. Eu acho que isso é fundamental.
P/1 – E voltando um pouquinho nesse negócio da fundação, quando você entrou ,você fazia o que na SOS?
R – Quando eu fui para a SOS, em 1993, eu fui para trabalhar como mobilizador das entidades da rede da Mata Atlântica. Então, minha atividade na SOS era o relacionamento com todas as, no início, as cento e poucas organizações. Então encontros e atividades da rede. Tinha um boletim que era elaborado pela Maura e que a gente tinha que fazer o contato. Nessa época, estava começando essa coisa de e-mail. Mas a SOS também não tinha. E a rede também não tinha. Era muito contato por telefone. De estar ligando: “Olha, como é que está? O que é que está acontecendo?”. As notícias eram mais via telefone e via fax. Então, eu comecei nessa fase da SOS, fazendo esse trabalho. Depois, quando eu comecei a trabalhar, em 1994, eu fui ser responsável por organizar cursos, palestras e trabalhar também com mobilização dentro da SOS. “Olha vai ter uma reunião.” “Ah, então o Belô vai organizar, vai mobilizar as pessoas.” “Ó, vamos fazer um evento e tal.” Então, o meu caminho dentro da SOS foi sempre o de mobilização. Depois, em 1996, eu fui para a Itália conhecer a Lei do Ambiente. O Mário Mantovani já tinha ido no ano anterior e quando eu voltei, voltei com a incumbência de implementar um programa de voluntariado da SOS Mata Atlântica. E voltei cheio de ideias e desejos. E aí, em 1997, eu criei um grupo de voluntários da SOS Mata Atlântica, com o objetivo de trabalhar com educação ambiental e cidadania. Então, é o trabalho que eu tenho desenvolvido que é animação de rede. E, muito atualmente, essa minha agenda de palestra, curso e o contato com outras ONGs. Eu sempre estou à frente participando e organizando junto com meus companheiros.
P/1 – Antes de você voltar da Itália e implantar o Programa de Voluntariado, isso não tinha na SOS?
R – Não, a SOS...
P/1 – Como que funcionava?
R – Boa pergunta sua. Eu acho que a gente sempre teve uma tradição nos dezoito anos de voluntariado dentro da SOS. Mas a gente não tinha uma coisa assim, porque, nessa questão de voluntariado, a gente começa com uma nova cultura de voluntariado a partir de 1996. E isso é legal a gente citar. Com o programa da Comunidade Solidária, que foi coordenado pela doutora Ruth Cardoso, que nessa época começou ter as primeiras capacitações do programa da Comunidade Solidária, para capacitar as pessoas que gerenciavam voluntários. Era uma coisa muito nova no Brasil. Então para a gente também era nova. E na SOS, a gente não estava contente com o modelo antigo, porque as pessoas vinham para ser voluntário e, muitas vezes, você não tinha uma atividade específica. E mesmo a organização não tinha muito claro. Hoje, a organização, ela tem claro para ela que o importante do voluntário que participa na SOS é que ele vá desenvolver atividade de educação ambiental, que vá de encontro à missão e ao interesse da organização. Não adianta o voluntário querer uma atividade e a organização outra. Então são os dois, é um encontro. E esse encontro é que vai beneficiar ao terceiro, que é a comunidade onde a SOS atende aquele público. Então, a gente tem hoje trabalhado com um dos princípios do modelo colaborativo. Que foi uma experiência que a gente trouxe do Canadá. E uma outra proposta que foi o Grupo de Estudo do Terceiro Setor – que eu não sei se eu já contei para você – que foi uma articulação nessa época de 1996. Em 1997, a gente cria o Programa de Voluntariado da SOS Mata Atlântica. Começa a desenhar o que é que a gente queria com voluntário, montar, e vai ter ação, fazer atividade de questão ambiental para a SOS. E ele vai ter uma carga horária x. Então assim, já começa a criar uma cara para o voluntariado. Que antes a gente não tinha esse rosto para o voluntariado. As pessoas iam e: “Olha, eu preciso de voluntário. Então você vem, me ajuda e tudo”. Então não era uma coisa sistematizada. A gente foi aprendendo, fazendo essa história. E com os contatos que eu citei para vocês, do programa da Comunidade Solidária, houve várias capacitações, depois, em 1997, a gente lança a organização desse grupo. Mas nessa época a embaixada do Canadá viu a programa da Comunidade Solidária, convidou algumas pessoas que trabalhavam com voluntariado no Brasil. E eu fui um dos convidados para participar desse almoço com os canadenses da United Way do Canadá, que trabalha com voluntariado. E um almoço para discutir e eles contarem da experiência deles no Canadá, de voluntariado. E terminado o almoço, eu falei: “Legal. Mas e nós aqui, né?”. E aí a gente começou esse grupo que estava na reunião, que era umas nove organizações. A única ambientalista era a SOS. E, a gente propôs de ter um encontro. Só que o pessoal da embaixada já achou que a gente já era um grupo formado. Achou que a gente tinha tanta sintonia, e falou: “Olha, há uma possibilidade de desenvolver um projeto”. E aí nós ficamos durante o ano de 1997. Em 1998 nós fomos para o Canadá e, lá, a gente desenhou um projeto de transferência de tecnologia para desenvolver com o apoio da Agência Canadense de Desenvolvimento, a Cida, que aportou recursos. Então, nós viemos com os facilitadores canadenses para o Brasil para estar trabalhando com captação de recurso, voluntariado. E essa metodologia foi desenvolvida em Curitiba, que é o modelo colaborativo. No ano passado a SOS conseguiu aprovar um projeto para desenvolver essa metodologia com o voluntariado e as comunidades que ela está atendendo. Porque são esses princípios de envolvimento comunitário, fortalecimento comunitário que a gente está implementando na SOS.
P/1 – Aí quando chega e você olha assim, tem que ter uma adaptação, né? Porque é uma coisa muito diferente. O que eu sinto, e você vai me falar um pouquinho a respeito, é que o movimento ambientalista fora, a impressão que eu tenho é que ele é mais antigo do que no Brasil. Então ele tem uma estrutura maior e ele é visto de uma outra forma.
R – Com certeza.
P/1 – Como que você acha que ele é visto hoje? E mesmo assim, essa evolução? Ele surgiu com maior força no Brasil nos anos 1970, 1980? Quando que ele toma um rosto?
R – Quando você fala de modelos, só para fazer um resgate, eu acho para a gente utiliza muitos conhecimentos. Eu acho que a gente pega modelos de fora, mas a gente tem que dar o rosto da organização a que a gente pertence. Então mesmo a questão dessa parceria que a gente teve com o Canadá, com essas seis organizações brasileiras, foi fundamental sim toda essa metodologia, a gente adaptar para a nossa realidade. No meu contato de voluntariado com a Itália, no Brasil, eu sabia que a nossa realidade era totalmente diferente. Então a realidade do Brasil e da minha organização a que eu pertenço é diferente. Eu tenho que adaptar para o que é que eu quero ao que é importante para a gente. E na questão do movimento ambientalista, eu acho que ele ganha mais força nos anos 1980 é onde ele está mais presente. As pessoas já começam a se preocupar mais com a questão ambiental. Eu acho que a questão de que houve vários escândalos com partido, as pessoas começam a desacreditar. As pessoas começam a valorizar um pouco, a desacreditar de partido político e a valorizar mais uma qualidade de vida. Hoje em dia, as pessoas, todo mundo tem, quando você fala de meio ambiente, é uma coisa que chama a atenção das pessoas. Para as pessoas já deixou de ser aquela coisa de... O meio ambiente já virou uma história diferente. Nos anos 80 era muito uma coisa do animalzinho, do bichinho, meio localizado. Hoje, a gente já tem uma visão sócio-ambiental por parte de todas as organizações, inclusive da própria SOS. Quando eu falo para você de fortalecimento comunitário que a SOS está fazendo, que a SOS sente, acha fundamental que ela, se ela vai defender uma área e se não tiver esse envolvimento das pessoas, então a questão ambientalista, ela extrapola. Nos anos anteriores era uma coisa muito focada. Hoje ela é sócio-ambiental. As pessoas têm que saber que, para conservar uma área, você tem que contar com ONG que está no local. Você tem que envolver essas pessoas. Porque senão você não vai ter o resultado que você quer. Então, eu acho que esse crescimento da SOS foi no sentido de ter adquirido essa visão sócio-ambiental. E das outras organizações, hoje você pega o movimento ambientalista e ele é um movimento que precisa crescer ainda. Ainda tem um caminho a trilhar, tem que fazer muita coisa. Mas eu acho que hoje, com o crescimento principalmente nos anos 90 após a Eco-92, quando a mídia explorou muito a Eco-92. E de um lado foi muito legal porque deu visibilidade, criou-se várias organizações. Muitas organizações foram criadas nessa época sem estrutura e acabou encerrando suas atividades. Outras que se estabeleceram, outras se firmaram mais. Como o caso da própria SOS, que está criando a sua história.
P/2 – E sobre o meio ambiente em si? A diferença desse período para hoje? O que você vê como, quais são as maiores vitórias nesse, da década de 1980 e 1990 do meio ambiente? A Juréia foi uma, né?
R – A Juréia foi uma.
P/2 – E você disse que assim uma...
R – Fundamental vamos dizer. Foi assim, eu acho que foi a nível de São Paulo e do Brasil, foi uma das maiores vitórias porque até pela própria... Ontem eu estava falando com uma jornalista da dificuldade que você tinha de mobilizar as pessoas. Hoje você dispara um e-mail e vai para várias pessoas. E naquele tempo você usava fax, você usava telefone. As pessoas tinham os encontros presenciais. Hoje tudo: “Ah, por e-mail eu resolvo a situação. Eu faço uma reunião por telefone. Eu faço via Embratel”. Mas não é a mesma coisa de você olho no olho, você fazer o comprometimento de participação das pessoas. Eu acho que houve muitas vitórias e houve muitas derrotas. Eu acho que ainda tem um caminho a ser trilhado, não dá para a gente achar que a gente já se estabeleceu. Eu acho que a gente vai conseguindo, que o meio ambiente ainda está patinando um pouco. Eu acho que não falta dos governantes um comprometimento político de colocar na sua agenda a questão ambiental. Esse ano já é o segundo ano que a SOS lança uma plataforma ambiental. O primeiro ano que a gente lançou foi no ano de 2000. Com pontos, a gente fez com voluntariado um documento pontuando o que é que para a cidade de São Paulo seria interessante na visão do cidadão no meio ambiente. A SOS está fazendo a parte dela. Mas é legal que essa agenda seja implementada nos governos. Então, quando for indicação de um secretário, que o secretário tenha comprometimento com as organizações para poder crescer mais o movimento. Eu acho que a gente já teve um crescimento com a própria ministra que foi indicada. Mas assim, não adianta a ministra também sozinha porque ela não vai conseguir. Então tem que ter uma força de governo, para ter isso na agenda do próprio governo, que a questão ambiental ela é fundamental. E, a nível Federal, dos Ministérios todos, que tenha uma, Ministérios, Secretarias Municipais, em todas as áreas de governo que tem comprometimento. Porque não adianta, uma Secretaria pensa uma coisa, um outro pensa outra coisa, mas o foco do meio ambiente ainda fica muito superficial. Eu acho que tem que ser implementado. Mas eu acho que nós, como cidadãos, a gente tem um papel fundamental. As ONGs têm um papel, o cidadão tem um papel que é de politizar esse movimento, multiplicar, criar mais agentes multiplicadores. Com essa crença, tendo essa crença de mudança. Porque senão a gente não vai mudar. Eu não sei se eu respondi direito a sua pergunta.
P/2 – Sim, claro. E em sua opinião qual é a maneira mais eficaz de trazer esse assunto para as pessoas, para o grande público? É através de campanhas publicitárias? É através de...
R – Eu acho que é uma ferramenta, mas não é a única. Eu acho que eu acredito muito na coisa do pertencimento. É de você criar a ferramenta que você possa envolver as pessoas para estar participando das atividades, capacitando. Eu acho que hoje quando você fala dessa questão de mobilização está muito ligado à questão do voluntariado. Eu acho que, inclusive, nós temos pessoas, agentes multiplicadores com esse perfil, nós temos que nos preocupar em capacitar, informar. Então eu acho que criar o espírito do pertencimento. Eu acho que a SOS fez ao longo desses anos um papel muito importante que foi o papel, que a gente começou timidamente abrindo espaço. Por exemplo, hoje a SOS ela tem uma agenda desde 1995 de palestras que acontecem na sede dela. E acho que isso é fundamental porque é uma maneira que as pessoas têm de ter um contato com a questão ambiental. Eu acho que a gente tem hoje grandes lideranças em meio ambiente, mas a gente precisa abrir e agregar mais pessoas, trazer essas pessoas para o movimento, aumentar essa participação das pessoas. Talvez assim, a gente ainda está aprendendo e fazendo, mas assim, foi uma das únicas, a SOS foi a única organização – hoje tem vários relatos de pessoas: “Olha, foi um espaço que eu vi”. Então a gente tem que ter mais organizações como a SOS fazendo esse papel. Porque aí sim a gente está cumprindo esse dever da gente de estar mudando essa questão do meio ambiente.
P/2 – E você trabalha diretamente com o voluntariado, né?
R – Trabalho diretamente com o voluntariado.
P/2 – Como você definiria o perfil médio do voluntariado hoje? Dos voluntários hoje? São...
R – Você fala...
P/2 – Qual a idade média, mais ou menos qual o perfil do voluntário da SOS?
R – Estou falando da SOS, né?
P/2 – Da SOS.
R – Eu acho que a gente tem uma faixa de dezoito a cinquenta anos, um pouco mais. Agora recentemente entrou uma voluntária com setenta e cinco anos. Então tem crescido bastante. Nós temos trabalhado com pessoas que já estão com mais comprometimento, querem participar, querem se envolver. A gente tem muita gente está saindo da universidade, estão estudando Biologia, estão com desejo de participar. Então assim, ele tem, eu calculo entre dezoito e cinquenta anos mais ou menos.
P/2 – Então bem abrangente.
R – Bem abrangente e bem heterogêneo porque a gente não tem um perfil só. Não é só um biólogo profissional. A gente tem dentista, tem contador, tem vários tipos de pessoas. Só que a gente tem entendimento de voluntariado diferente. Ao longo desses anos, a gente respeita, acredita no Brasil com tantas diferenças sociais. O voluntariado filantrópico, ele foi fundamental para a estruturação desse país, eu acho que ajudou muito. Mas no meio ambiente, esse voluntário tem outro perfil. Tem um papel de participante, de agente multiplicador. Então não basta a pessoa querer participar de uma ação. Ele tem que se envolver, ele tem que estudar, ele tem que ler para poder multiplicar. Ele não precisa ser um especialista, mas ele tem que se informar, ele tem que se capacitar, ele tem que se envolver. Então eu acho que tem esse perfil que eu acho diferente para o movimento, para o voluntariado do meio ambiente. Acho que já cria um novo perfil.
R – Beth, eu não sei se eu falei, mas tem uma história nesse processo aí que foi fundamental para a SOS e para várias organizações. Que eu não sei se eu ressaltei legal, que é a questão desse GETS – Grupo de Estudos do Terceiro Setor – que a gente participou. Tinham seis organizações brasileiras, uma canadense.
P/1 – Ah, não, você pode contar.
R – Com o apoio da Agência Canadense, durante 4
quatro anos foram desenvolvidas capacitações. E essas capacitações foram fundamentais para todas as organizações e em especial para a SOS. Porque assim, a gente conseguiu muito da experiência nossa com o voluntariado. Eu acho, a gente sempre fala de voluntariado: a gente acabou formando um grupo que trabalha com voluntariado que foi uma faculdade para as organizações essa oportunidade. Então foi um momento importante.
P/1 – Isso é importante. (risos)
R – Eu sou um rapaz meio tímido.
P/2 – Ah.
R – Só para ressaltar, que eu acho que essa experiência da gente com o Canadá, ela foi fundamental. Não só porque o Canadá é um país desenvolvido, mas pelas pessoas que a gente conheceu no Canadá. Que foi o projeto Gets, que é o Grupo de Estudo do Terceiro Setor. Que era composto pela Abong – Associação Brasileira de ONGs; SOS Mata Atlântica; Fundação Travessia; Fala Preta!; Pastoral da Criança; Centro do Voluntariado de São Paulo; Programa da Comunidade Solidária e Centro de Voluntariado de Curitiba. Ficaram no final do projeto seis pessoas e durou dois anos. Nesse período houve várias capacitações. Essas capacitações sobre voluntariado, captação de recursos, modelo colaborativo foram fundamentais e foram decisivas para a própria SOS que estava formatando seu programa de voluntariado. No sentido que a gente trabalha com princípios do modelo colaborativo. E nós conseguimos aprovar o ano passado uma proposta de um projeto sobre a metodologia do modelo colaborativo. Onde nós estamos desenvolvendo oficinas, tanto para o voluntariado como para as comunidades que a SOS atende com esses princípios de modelo colaborativo que para nós é uma ferramenta fundamental. E que essa questão do social para a SOS ainda está nova. Então para nós, isso foi um avanço. E a própria relação com organizações que não eram ambientalistas, mas do campo social, para a gente trouxe uma experiência, trouxe uma troca e foi muito rica. E a Agência Canadense foi quem me deu esse aporte. E a United Way no Canadá para fazer esse relacionamento e trazer essa experiência para nós.
P/1 – Aproveitando o que você falou dessa relação com essas ONGs que não são ambientalistas.
R – É.
P/1 – Você acha que elas têm maior destaque do que as ambientalistas? Assim, no imaginário popular mesmo, na sociedade?
R – Você me fez uma pergunta interessante. Eu acho que talvez as ONGs sociais elas têm uma tradição de ONG maior que as ambientalistas. Pela própria necessidade, essa história toda. E o movimento ambientalista é visto muito como uma coisa de moda. Eu acho que hoje já ultrapassou essa história que as ONGs de meio ambiente é moda. A gente já vê uma necessidade de se conservar, de se preservar o meio ambiente. E a questão social, trabalhar com criança, adolescente, são assuntos, causas que já vêm de longa data. Então já tem uma estrutura diferenciada. Eu acho que talvez o movimento ambientalista tenha mais visibilidade pelo próprio status que foi dado para ele nos últimos anos. Mas eu acho que não. Acho que é diferente. Aliás, até aproveitando a tua pergunta, eu acho que a gente tem que trabalhar mais em conjunto com o social para fazer essa troca para poder ter o intercâmbio. Porque tem muito aprendizado a ser feito pelas duas partes.
P/2 – Exatamente por ser algo novo na época da sua fundação, como que a SOS era vista publicamente? Quando ela se formou, quando ela começou as suas atividades. Em sua opinião, como a sociedade via a SOS?
R – Eu acho que tem uma história muito legal que a própria bandeira da SOS é uma história que mobiliza, chama atenção. Eu acho que, eu até citei para vocês que a SOS já nasce com uma estrutura bem formada. Foi uma primeira ONG que já contrata pessoas para trabalhar profissionalmente. As pessoas trabalhavam como voluntários. Eu acho que esse é um fator diferenciador. Também faz parcerias com empresa, capta recursos de empresas para desenvolver seus projetos. Então ela trás esse know how, que hoje outras organizações ambientalistas já estão procurando as empresas para estar fazendo parcerias para desenvolver o projeto. Mas ela foi uma das pioneiras nesse ramo.
P/2 – E quais as frentes de atuação nessa época desse início da SOS?
R –O Tietê que foi um marco muito grande, Rodovia do Sol. Era muita coisa, que a gente lembrar assim de, é mais complicado. Confesso para você que foram tantos... A própria rede da Mata Atlântica que a SOS abrigou no início dos anos 1990, dentro da SOS. Que a SOS recebe essa... É a ONG sede da Rede. Tem essa articulação com várias organizações que foi muito interessante. Foi um avanço. Você fala de meio ambiente, mas é legal que você tenha a força de ter outras organizações falando sobre meio ambiente e que seja da Mata Atlântica. Então eu acho que esse foi um ponto forte da própria SOS. A questão do Núcleo Tietê que eu acho que é uma luta longa, é uma luta mais paulista. A questão do Atlas da Mata Atlântica, que eu acho que é uma ferramenta fundamental da SOS. A questão de mobilização que ela tem nas lutas. Eu acho que o Atlas vem de encontro a essa mobilização. Porque você deixa aquela militância puramente coração, para partir para uma militância mais profissional. Uma militância: “Olha, vamos defender a área tal. Nessa área houve um desmatamento, houve isso”. Então você tem um embasamento técnico, você tem um corpo técnico para te respaldar. Ou seja, no meu caso como mobilizador, eu não preciso ser um cara formado tecnicamente, mas eu tenho que receber essa informação técnica para eu poder divulgar, para eu poder envolver as pessoas, poder mobilizar. Então hoje eu acho que já traz essa coisa mais responsável. Ter esses dados técnicos, eu acho que na luta dos dias de hoje é fundamental. Não sei se eu respondi adequadamente a tua pergunta.
P/2 – E ainda nesse período inicial da SOS, quais eram os principais nomes da Fundação? As principais pessoas que você se lembra?
R – Das pessoas que...
P/2 – Que faziam parte da organização.
R – Da SOS?
P/2 – As pessoas importantes para a Fundação nesse período?
R – Acho que uma das pessoas que ainda faz parte do Conselho e está aí é o Teleginski. É uma pessoa que é um advogado, ele tem uma atuação muito grande e muito importante. O próprio Clayton Lino que também faz parte do Conselho. Capobianco que foi um dos pioneiros. Rodrigo Mesquita, que também foi presidente da SOS. Fabio Feldmann, que foi o primeiro presidente da SOS. Isso são nomes de referência e outras pessoas. Acho que tem muita gente que teve uma participação, uma importância dentro do processo da SOS.
P/1 – Bellô, assim, voltando um pouquinho no que você tinha falado, a gente falou um pouquinho da atuação da SOS quando ela deu início, né?
R – É.
P/1 – E hoje como é que você vê, qual é a principal frente de atuação da SOS?
R – Eu acho que até esse ano a gente fez em dois espaços diferentes. Um espaço foi lançado em Brasília, que foi uma Plataforma Ambiental para todos os municípios, que foi coordenado pelo Mário Mantovani. E a gente fez em São Paulo, coordenado por mim, junto com os voluntários, uma Plataforma Ambiental para São Paulo. Então, eu acho que uma das coisas é você politizar essas frentes de atuação, com esses documentos, o que a SOS está querendo é trazer mais para a agenda tanto dos municípios essa questão da preocupação de mobilizar mais pessoas para essa causa. Eu acho que é um ponto fundamental. Essa questão eu já falei, do Atlas, da Plataforma Ambiental, a questão da Lei da Mata Atlântica, que ainda não é um assunto resolvido.
P/1 – Como que está essa coisa da Lei da Mata Atlântica?
R – Foi aprovado em uma instância e ainda está no Congresso. É uma luta porque apesar de todos os esforços desenvolvidos durante esses anos todos, eu acho que o outro lado, tem uma força maior. Os ruralistas com seus interesses, a questão econômica desse país. Então você sempre está emperrando nesse processo. Eu acho que o nosso desafio é trazer para o cidadão comum a questão da Mata Atlântica. Ele está em uma cidade de Mata Atlântica e precisa ter essa consciência. E essa consciência não é só ele participar de atividades dentro da SOS, mas é atividade dele como cidadão. A partir do momento que ele vai eleger um candidato a vereador, a deputado, a prefeito que ele tenha essa preocupação. Porque quem vai dar as diretrizes e vai votar as leis que são importantes para o meio ambiente são essas pessoas. Então eu acho que a gente tem que trazer essa consciência para as pessoas. Eu acho que é um papel que a SOS é uma facilitadora desse processo.
P/1 – E assim, a sede da SOS fica aqui em São Paulo, cidade.
R – São Paulo.
P/1 – Aonde que pode encontrar outras pessoas? Tem alguma outra base?
R – A SOS tem uma base em Iguape, que é uma base justamente tão antiga até quanto a de São Paulo. E que tem uma equipe de pessoas que trabalha, desenvolve projeto em Iguape. A ideia é descentralizar em um futuro próximo e ter mais parceiros trabalhando em conjunto com a SOS. Mas ainda a gente ainda não deu esse salto. A gente está em um processo de descentralização, que eu acho que vai ser fundamental. Porque aí você vai poder estar trabalhando com mais parceiros. Mas, hoje mesmo a SOS tem trabalhado e a gente mesmo na minha área, quando as pessoas me procuram para ser voluntárias em outros locais onde a gente não tem programa para voluntários, eu estou indicando entidades parceiras. Então a gente está trabalhando muito com essa questão de parceria de ONGs locais. O próprio jurídico da SOS trabalha também com denúncia com as ONGs do local da denúncia, encaminhando. O que eu acho um ponto forte da SOS e que tem que cada dia mais ser desenvolvido é a questão da mobilização e a questão do jurídico, porque é um norte para as pessoas. A gente, às vezes, fica meio perdido em saber como é que vai encaminhar uma denúncia. E a SOS tem feito isso muito bem. No sentido de estar encaminhando as denúncias, de estar preservando o nome de quem faz a denúncia. Que é uma preocupação dela: “Eu vou denunciar, mas alguém vai ver meu nome?”. E a gente sabe que a coisa não é fácil. A SOS tem resguardado o nome das pessoas.
P/1 – E, Bellô, por que é que Iguape foi escolhido?
R – Porque no estatuto da SOS essa região do Lagamar é uma região importante, estatutária. Então foi escolhido ter uma sede em Iguape. Pelo estatuto da SOS, a região do litoral sul de São Paulo e norte do Paraná, que é a região de Lagamar, é uma região importante. O Lagamar é importante. Então, quando a SOS em 1987 abre essa sede em Iguape, é no sentido de que o Vale do Ribeira é uma região fundamental para a SOS.
P/1 – E aproveitando, a gente está falando essa coisa de Iguape, dessa região, como que é o trabalho da SOS, como ele é recebido pelas pessoas da terra? Pelas pessoas que moram lá? Como que é essa relação?
R – Eu acho que a equipe que trabalha em Iguape, a Elci e o Gazzetta, eles são heróis. Eles construíram, eles conquistaram um espaço, porque não é fácil. Eu militei durante e antes na Juréia e tive um contato também no Vale do Ribeira muito grande. Tanto em Iguape como Peruíbe, então o que as pessoas viam a gente, falavam assim: “Ah, o meio ambiente é contra nós”. Porque sempre tem a coisa de colocar a questão ambiental contra o desenvolvimento econômico. Então a gente não é visto como, sabe? Com bons olhos. Hoje eu acho que já está mudando bastante por conta mesmo desse viés de pensar a questão sócio ambiental. De falar: “Não, não estamos pensando em acabar com vocês. Estamos pensando em ter responsabilidade, que as coisas aconteçam de modo a não ter uma agressão para a natureza”. Mas existe uma dificuldade em ter um projeto de gestão da Serra do Guararu, que para a conquista da comunidade local não é fácil. A gente, às vezes, está aqui na Avenida Paulista, é lindo e maravilhoso, mas quando você está na comunidade, que você vai ter reuniões com as pessoas até você provar, estabelecer as relações de confiança com essa comunidade, porque a necessidade do povo é muito grande. A miséria desse país é muito grande. Então, eles sempre falam: “Não, eles querem preservar isso aqui, fechar, e eles não querem saber das pessoas que estão aqui”. E não é essa a realidade. A gente quer compatibilizar as duas coisas. Então eu acho que hoje já tem um avanço pelo próprio perfil que a SOS está desenvolvendo. Hoje é diferente do início, quando estava em 1986 que as pessoas falavam do meio ambiente: “Vamos fechar, e vamos preservar tudo”. Hoje em dia não. “Vamos fazer levantamento.” Quando eu falo da questão técnica é isso: “Isso pode, isso não pode”. Então hoje já tem esse respaldo. Então eu acho que isso dá uma segurança maior. E até as próprias pessoas das comunidades, elas já recebem a gente com um olhar diferenciado, mas não é fácil. A gente tem tido uma luta. Você está em São Paulo, falar de SOS Mata Atlântica para os meninos que moram nos Jardins é outra coisa. Mas você falar em uma área que a gente vive aí no Vale do Ribeira, em muitos lugares onde a questão econômica é fundamental, é complicado. E a gente como técnico, você acaba sempre sendo o testa de ferro para quebrar esse paradigma das pessoas.
P/1 – Pegando o Vale do Ribeira, que é o que a gente está falando. Você acha que é mais complicado o pessoal que é de lá, que trabalha com os plantadores que são os donos das plantações de banana, de chá. É mais complicado com eles entenderem esse processo ou os donos das plantações?
R – O dono da plantação ou quem vive da terra? Eu acho que tem interesses diferentes. Então você tem que criar projetos que possam envolver esse cara que trabalha na terra para que ele possa ter sustentação e possa ser empoderado. Um cara que é dono da terra, um grande proprietário, ele tem que ver que se ele for criar uma RPPN – Reserva Particular do Patrimônio Natural – para ele é uma história interessante, que vai trazer um benefício para ele. Então assim, são benefícios diferentes, eu acho que são. As pessoas tendo essa visão que elas podem captar algum interesse, e pode ser legal para as duas partes eu acho que dá para você trabalhar. Por exemplo, hoje em dia com essa questão de RPPN, eu tenho visto que a gente tem conseguido agregar uma série de pessoas, que é uma coisa nova. No caso, criar uma reserva na própria terra dela. Então isso é assim, é um avanço, é uma coisa legal. Eu acho que é fundamental. Porque, às vezes, o cara também, ele quer preservar, mas ele não tem nem recurso. Então é você criar mecanismos para você poder fazer com que esse cara que é o proprietário, que ele possa também ter essa noção. E o que vive da terra, que dê recurso para ele também. Porque não adianta eu falar para ele: “Olha, não pode fazer isso”. Sem que eu possa dar condição. Criar programas em que eu possa estar desenvolvendo com ele.
P/2 – E sobre a Mata Atlântica, especificamente, quais são as perspectivas para você? Como você vê as perspectivas para Mata Atlântica a médio e longo prazo?
R – E acho que a gente, apesar de toda luta que a gente tem desenvolvido ao longo desses anos, tem que ter um envolvimento maior, um comprometimento da classe política. Eu acho que a gente tem que ter uma história, muita gente pode até ser contra o que eu estou falando, mas é uma opinião minha. Eu acho que a gente tem que ter políticos que, independente de partido, defendam a questão da Mata Atlântica. E a gente tem que frear, as leis têm que funcionar. A Justiça não pode ser tão morosa. A gente vê muito caso, “olha até que defina uma situação...” aí assim, a mata já foi embora. Então eu acho que tem que ter uma articulação maior da sociedade. Eu acho que todo mundo tem um papel. E se a gente não avançar, não criar essas ferramentas de envolver, de envolvimento maior, de aplicabilidade de leis. Eu não sou advogado, mas eu vejo falar: o Brasil tem as melhores leis do mundo. Então falta aplicar essas leis. Então esse não é o papel da SOS. A SOS é uma facilitadora nesse processo, nem das ONGs, mas do Poder Judiciário. Então, tem que fazer, a gente tem que pressionar para que essas leis sejam cumpridas, para a gente poder preservar o pouco que resta. Não dá para a gente deixar ir embora. A gente está vendo aí hoje tantas doenças, tantas coisas acontecendo, esse nosso clima totalmente desregulado. Então a gente precisa fazer isso, é um comprometimento, uma responsabilidade que apesar dos dezoito anos da SOS, a gente vai continuar tendo e tendo que brigar muito ainda, porque a luta não terminou. Não sei se eu respondi direitinho.
P/2 – E essa luta, ainda não terminou, né?
R – E não vai terminar.
P/2 – Tão cedo.
R – Quando terminar a gente tem que fechar as portas e ir embora, né?
P/2 – Mas quais são os maiores problemas enfrentados na defesa e na preservação da Mata Atlântica, em sua opinião?
R – Legal você ter falado da minha opinião. Porque, às vezes, pode um ban, ban, ban e falar: “Não, esse cara está errado”. Eu acho que é a questão econômica, porque esbarra sempre nos interesses econômicos. Na questão de, sabe? Então eu acho que no Brasil é muito complicado por conta disso. Eu acho que o cara tem um interesse de fazer um mega hotel em uma região tal. Apesar de que hoje a gente tem muitas barreiras de leis e coisa e tal. Mas eu acho que tem esse fator que é fundamental. E a falta de comprometimento das pessoas. Eu acho que as pessoas têm que trazer essa agenda. Não basta separar o lixo. Isso é o básico do guia doméstico ambiental. Mas você tem que ter uma visão maior. E a visão de política. Tem que politizar. Eu tenho que pensar que quando eu vou votar, e se a pessoa vai ser responsável, eu enfatizo várias vezes essas coisas, porque eu acho que é fundamental. Porque são as pessoas que vão para o Congresso, vão para as Prefeituras, vão para as Câmaras dos Vereadores. São as pessoas que vão fazer leis. São pessoas que vão barrar, são as pessoas que vão nos representar. Se, esses representantes, eles não têm a mínima preocupação com o meio ambiente, a gente fica ali amassando barro. Então, a gente tem que mudar a visão das pessoas. Nós fizemos uma campanha, mais ou menos há dois anos: “Vote para proteger”. E quando a gente chegava nas avenidas e conversando com as pessoas: “Mas o que é? Ninguém presta. Em quem que eu voto?” “Pelo menos você já ouviu o que é que a pessoa vai fazer? Não basta votar. E depois que eu votar, eu vou cobrar desse candidato?” Ora, qual que é o seu comprometimento? É fazer a pessoa ter o comprometimento com a questão do meio ambiente. Eu acho que essa é uma luta que a gente tem que ter. É da SOS, é da sociedade como um todo. Tem que ter gente para fazer essa defesa e a gente tem que fiscalizar. Não adianta também a gente ficar chorando e: “Ah, porque não”. Não, nós temos que fiscalizar. Nós somos responsáveis. Nós temos como cidadão, a gente tem esse papel.
P/2 – E você falou da campanha: “Vote para proteger”, né? Qual foi a campanha da SOS que mais te marcou nesses dezoito anos?
R – Olha, eu acho que “Vote para proteger”.
P/2 – Foi essa mesma. Por quê?
R – Porque eu acho que foi a primeira vez. Porque a gente sempre teve a história de na SOS, como a gente é uma ONG, nós não podemos nos envolver com a questão política. Foi uma questão de estatuto que é perfeitamente legítima em qualquer organização. Mas foi a primeira vez que a gente saiu para a rua para falar para as pessoas: “Olha, preste atenção no candidato em que você vai votar, se ele vai trazer para você uma pauta de meio ambiente”. De a gente trazer essa sensibilização. Na realidade, a gente tem que avançar mais nesse histórico. Eu até colocaria duas, se você me permitir.
P/2 – Claro.
R – Essa do “Vote para proteger” e “Respira São Paulo”. Que foi uma campanha que a gente fez com um lençol em 1996. Falando para as pessoas da questão da poluição, cada cidadão medir a poluição. Porque estava tendo em todos os sentidos. São essas campanhas que eu acho que sensibilizam e trazem às pessoas um pertencimento para que elas falem: “Eu também posso fazer isso. Eu vou botar meu lençol aqui e depois eu vou avaliar se esse meu lençol está mais poluído, qual o grau de poluição que recebeu”.
P/1 – Você acha que tinha que ter mais campanha, Bellô?
R –Eu acho que campanha é fundamental. Mas tem que ter campanha tipo... formas que a gente faça que todo mundo sinta-se um pouco responsável. No seu local de trabalho, na sua escola. Que ele possa desenvolver, atuar mais como cidadão. Eu acho que a gente tem, ainda tem uma missão para cumprir nessa questão da mobilização. Que é esse envolvimento, esse pertencimento das pessoas. Porque aí sim a gente vai ter um resultado interessante.
P/1 – Ela tem que se identificar, é isso?
R – Ela tem que se identificar.
P/1 – E me diz uma coisa assim, na sua opinião, como é que você vê a Fundação hoje?
R – Eu sou suspeito, suspeitíssimo para falar da Fundação. (riso) Porque eu tenho uma relação afetiva, não tenho uma relação apenas profissional da SOS. Eu tenho uma relação afetiva de trabalhar muitos anos. E mais do que trabalhar, estar envolvido com a SOS. Eu acho que a gente tem um potencial muito grande. Muito, muito grande. E, às vezes também, apesar da estrutura que a SOS tem, a questão econômica também é uma coisa que impede. Às vezes, o pessoal pensa: “Ah, a SOS é uma grande ONG.” Mas a gente também tem problema de caixa. Eu me lembro que semana passada eu fui para o Guarujá, eu falei com um: “Ah, mas aí não tem problema de dinheiro”. Eu falei: “Não, a gente tem problema de dinheiro. A gente não é do Banco Central”. Mas assim, então eu acho que a gente tem o potencial porque, a SOS consegue mobilizar. Ela consegue ser simpática. Ela é uma ONG que abraça as pessoas. Principalmente na minha visão. Eu acho que a gente ainda tem muito para fazer, a gente ainda tem muita expectativa. Desde quando eu estou lá, de crescimento, de fazer, de realizar. Eu acho que ainda tem uma missão a cumprir lá dentro.
P/1 – Você só me falou das coisas boas. Mas assim, pensando na SOS, o que é que você acha que tem que mudar. Assim, um balanço desses dezoito anos. Na verdade essa é a pergunta. Se você fizer um balanço desses dezoito anos e o que é que precisa mudar?
R – Eu acho que tem esse lado legal, esse lado interessante. Mas eu acho que a gente sempre está brigando muito para ter uma politização. Eu falo, eu estou, às vezes, repetitivo. Mas eu falo assim, há algum tempo atrás, o povo falava assim: “Você está um disco furado. Está ficando velho, chato”. “O que é que a SOS quer ser quando crescer?” Eu acho que a SOS tem que ter definido muito claro a proposta dela política, e quais as respostas que ela vai fornecer para a sociedade, agora, a partir de que ela está com dezoito anos. Então, a direção dela tem que ter, nós todos, enfim, estamos trabalhando na SOS há muito tempo. Passar para a sociedade quais são as inquietudes dela. Mas ela já tem que dar respostas. Já dar encaminhamento. Eu acho que a gente não pode ficar em cima do muro. A gente tem que ter uma postura correta. Às vezes fica muito na coisa das definições, não pode demorar. Não dá para a Mata Atlântica esperar muito. Eu acho que a gente tem uma série de dificuldades até com outras organizações. Porque no Brasil a gente tem uma dificuldade muito grande. Porque se a SOS é uma Ong grande, você chega, as pessoas já acham que você vai resolver tudo. Eu tenho passado para as pessoas assim: “Olha, nós somos facilitadores. Nós não temos que resolver isto de imediato. Nós temos que fazer em conjunto”. Então eu acho que a gente tem que ter isso claro. Como a SOS vem de uma carga de mídia, às vezes, a gente chega no local, assusta. Então, muitas vezes já aconteceu comigo, eu chego, começo a conversar. E a proposição. A pessoa fala assim: “Olha, eu tinha uma outra visão da SOS.” “Não, mas essa é a visão que você tem que ter. A SOS pode facilitar, mas ela não está para resolver. Ela tem facilidade de contato. No que ela tem facilidade, ela vai poder encaminhar.” Então eu acho que nenhum governo chega e resolve tudo. E não é a SOS que vai da noite para o dia resolver tudo. Ela tem que ter um papel, e esse papel dela é importante. É o papel de facilitador. De uma organização que é facilitadora e pode articular. Acho que ela tem que desenvolver mais, incrementar que é uma coisa muito forte. E de mobilizadora. Eu acho que para o papel de mobilizadora se ela não responder, chega um certo tempo, a gente perde essa credibilidade. Então é isso que a gente não pode perder.
P/1 – Você acha que a visão que o SOS passa as pessoas, não enxergam isso? Que ela é uma facilitadora, uma mobilizadora. As pessoas não conseguem perceber isso? Elas esperam mais da SOS?
R – Eu acho que esperam mais da SOS, mais do que a SOS tem estrutura. Porque as pessoas chegam na SOS e falam: “Mas quantas pessoas trabalham aqui?”. Você fala: “Ah, vinte, trinta pessoas”. “Nossa, só isso?” Às vezes, ela faz mais barulho do que o número de pessoas que ela tem no seu staff. Que por um lado é legal e por um outro lado é ruim. Porque aí você cria uma expectativa de que você vai solucionar tudo, que você vai ter todas as portas abertas para você fazer toda a resolução dos conflitos existentes. E por um lado também é legal porque você tem uma credibilidade. Eu acho que tem esses dois lados. Tem a história que é boa e a história que é ruim. Mas eu prefiro chegar em você e ter a transparência de jogar limpo: “Olha, isso nós podemos fazer. Isso nós não podemos fazer. Isso nós podemos alcançar. Nós podemos fazer isso e melhor se você for nossa parceira ou nosso parceiro. Se você estiver junto com a gente, a gente pode desenvolver”. Então eu acho que tem todo esse lado que a gente tem que passar. Se você chega muito assim naquela empáfia, você acaba até criando certa antipatia por parte do público. Então eu acho que essa coisa dá para você criar, esse outro lado.
P/1 – E, Bellô, assim, você consegue projetar a SOS daqui a dez anos?
R – Daqui dez anos, viu, é muito tempo, né? Eu posso falar de um sonho que eu tenho.
P/1 – Tá bom.
R – Eu tenho um sonho de que daqui a dez anos a gente tenha essa questão da Mata Atlântica e do meio ambiente – acho que a SOS hoje é uma ONG que tem a missão de trabalhar com a Mata Atlântica, mas ela acaba fazendo o papel da questão do meio ambiente, meio responsável. Que a gente tenha nos cem mil filiados da SOS um agente multiplicador. Uma pessoa que seja, quando eu volto à questão do voto, que ele tenha um compromisso político. Que a gente tenha uma bancada de deputados, de vereadores com o comprometimento com a Mata Atlântica. E que aí nas eleições vamos ter um lobby para aprovar essas leis. Que a SOS de fato possa cacifar com esse número de pessoas que ela tenha mobilizado para implementar as leis. Para fazer valer a sua força política. Esse é o meu sonho. Que a SOS tenha isso.
P/1 – Voltando assim, pegando, você falou de cem mil filiados.
R – É.
P/1 – Você acha que, esses cem mil filiados, eles têm a conscientização da Mata Atlântica, do meio ambiente? Ou muitas vezes não?
R – Eu acho que não. Eu acho até um desafio que a SOS tem de ter essas pessoas todas engajadas. Porque muitas dessas pessoas muitas assumem essa preocupação. Outras acham legal ser do meio ambiente, mas assim, não é na sua totalidade. Se a gente tivesse essa força política de pessoas, a gente teria um outro quadro político. Então eu acho que é um sonho a ser alcançado. Eu acho que a gente já avançou muito, mas para a gente avançar mais e ter essa visão de dez anos que você fala para mim, eu acho que é a gente ter uma bancada. Muita gente pode discordar da minha posição, mas eu ainda sou da gente conseguir ter uma bancada forte. Hoje, acho que o nome da SOS, eu já tive experiência aqui em São Paulo de enviar ofício pedindo algumas melhorias de alguns lugares em que a gente trabalha na periferia de São Paulo. E assim ser prontamente atendido, ser recebido. Se a gente tem esse lado, o Mário Mantovani em Brasília, ele tem um trânsito legal. A gente aqui em São Paulo nessa gestão que passou, a gente teve um trânsito legal. A gente tem tido vários gestores municipais aqui. Agenda uma reunião: “Ah, SOS Mata Atlântica”. Então você tem um nome. Mas eu acho que você precisa de mais. Você precisa ter ali pessoas comprometidas. E tipo, vai ter uma eleição, a gente conseguir emplacar, eleger dez deputados, vinte vereadores. A gente ter uma bancada verde. Que é um sonho. Mas eu acho que ele pode se tornar realidade.
P/1 – E, Bellô, o que é que significa a Fundação para você na sua vida? Qual é o peso dela?
R – (risos) É interessante a pergunta. Ah, é um local de trabalho onde eu trabalho. Eu tenho um lado profissional, eu recebo o meu salário. E tenho estabelecida essa coisa como qualquer pessoa, qualquer cidadão. Mas tem um outro lado maior que é um lado afetivo. Porque trabalho na SOS há doze anos. Então, você já cria um histórico, uma relação de afetividade com as pessoas. Com a causa, com o projeto que a gente desenvolve lá há alguns anos. Então isso tem um peso muito importante. Por isso, às vezes, você fica muito chato, brigador e cobra das pessoas. E fica naquele empenho danado porque você quer que a Fundação tenha o melhor nome possível. Porque às vezes acontece uma coisa se alguém, você fala da Fundação, mas você não quer ouvir outra pessoa falar. Quando fala mal, está falando mal de um, sabe? Então eu tenho muita expectativa de a gente a cada dia crescer mais e o que eu puder contribuir também para esse processo, eu quero contribuir. Porque eu acredito na causa. E acredito que a gente tenha uma força de atuação e que a gente possa melhorar a performance da gente a cada dia, em todas as áreas. E isso significa muito para mim.
P/1 – E, Bellô, tem alguma coisa que eu não te perguntei que você acha interessante falar? Que você lembra agora.
R – Esse ano fez sete anos. Dos dezoito da SOS, a gente tem um grupo que está com sete anos. E nesse grupo tem pessoas que estão lá desde o início. Então assim, que veio na primeira reunião e estão até hoje. Então é um grupo também muito especial. Então eu acho que...
P/1 – É um grupo de voluntários?
R – Voluntários da SOS, é uma história importante da minha vida também, esse grupo. Apesar de todas as atividades que eu estou fazendo na SOS atualmente, eu estou trabalhando muito com a questão comunitária. Eu, nesse grupo, eu é que sou animador dessa Rede. Então eu acho que ele é fundamental.
P/2 – E hoje a SOS conta com quantos voluntários?
R – Ah, isso eu falei ontem para a jornalista, ela falou: “Ai, cem mil?”. Aí quando você fala cem mil, você coloca um universo imenso. A SOS tem mil e poucos voluntários cadastrados. O que é que é isso? Ele vai à uma reunião de integração e, às vezes, por volta de cento e cinquenta a duzentas pessoas que circulam nas ações da SOS. A gente tem uma reunião de integração a cada dois meses quando a gente capta voluntário. E porque é o seguinte: na nossa atividade de voluntariado, a gente precisa ter alguns encontros presenciais. Porque a gente tem que ter planejamento, avaliação. Quando você vai à uma comunidade, eu tenho que estabelecer com os voluntários certa confiança para eles fazer uma palestra. Eu sentir a firmeza que ele tenha um background para ele poder estar falando pela instituição. Ele vai à uma escola, eu vou trabalhar com criança de sete a doze anos. Ou, então, eu vou trabalhar com a comunidade, como no caso do Guarujá, a gente precisa ter esse voluntário já preparado. Então a gente precisa ter os nossos encontros de planejamento que a gente faz. A gente tem mais ou menos umas cento e poucas pessoas. Nem todo mundo vai em todas as ações. A gente tem um calendário, tem uma reunião que a gente faz. Uma reunião geral, que é uma vez por mês. Que é das pessoas que já fazem parte do grupo, já são cadastradas. Então, aí a gente tem um: “Olha, vai ter ação dia”... Tem uma agenda. Para essas ações, a gente vai ter um calendário de reuniões de planejamento para pensar e discutir com vocês o que é que vai ser feito e o dia. Atividade com criança, atividade com os adultos. “Como que é a condução política das discussões que a gente vai fazer com os adultos.” Então assim, a gente sempre tem esse cuidado.
P/2 – E esses voluntários estão em diferentes cidades, tem em vários lugares.
R – Não tem. Porque a gente não tem essa capilaridade ainda. Com a descentralização, aí sim. Porque não adianta eu falar para você: “eu tenho lá no Rio de Janeiro.” Não tenho. A gente tem um grupo de voluntário aqui em São Paulo.
P/2 – Na cidade?
R – Na cidade de São Paulo. Porque, para você ter um grupo de voluntariado, você tem que criar uma agenda. Você tem que criar um comprometimento. Você tem que dar condição para esse voluntário para ele ir às ações. Você tem que preparar a ida dele. Não basta falar: “Não, você vai ser voluntário, você vai lá e faz isso por mim”. Você tem que estar. Essa articulação toda ela é fundamental dentro do voluntariado.
P/1 – Assim, nesses dezoito anos que a SOS está comemorando, o que é que você gostaria de dizer para eles? Para todo mundo, para a SOS assim, um recado.
R – Um recado para a SOS, né? Eu acho que nós temos que continuar tendo espírito de união, solidariedade, participação, envolvimento. E um espírito de saber que a questão do meio ambiente, da Mata Atlântica é fundamental para todos nós. Então, a gente tem que ter garra, tem que ter luta e tem que acreditar. Acreditar que o que a gente está fazendo pode ser pequeno, mas é com a melhor das intenções. E só a gente acreditando é que a gente vai mudar as coisas nesse país. Eu acho que cada um tem um papel. E esse papel individual é que vai refletir no coletivo. Eu acho que é esse o desejo que eu tenho, que a SOS cresça cada vez mais. Porque é um resultado de um trabalho de dezoito anos e que eu tenho o prazer de ter participado juntamente com todo mundo.
P/1 – Bellô, terminamos nosso depoimento, super obrigada por você ter vindo, estar aqui com a gente.
R – Eu é que agradeço, achei muito agradável ficar conversando aqui, falando. Uma oportunidade única. Obrigado.
P/1 – Obrigada.
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