Emilio Vedolin e Egydio Fagnani eram vizinhos. No início do século XX, viviam em uma Vila Operária no bairro do Belenzinho, Zona Leste da cidade de São Paulo. Ambos eram italianos, chegados ao Brasil ainda crianças e aqui constituíram suas famílias. Suas casas eram unidas por um quintal, de tal forma que as cantorias e as brigas de família podiam ser ouvidas e convenientemente esquecidas, como era de se esperar naqueles dias em que a autoridade paterna era respeitada como força de lei.
O filho mais novo de Emilio Vedolin – Attilio – e a neta caçula de Egydio Fagnani – Wilma – eram, portanto crianças próximas, e seguiram a rotina de freqüentarem a escola primária da Vila Operária, seus jardins, o Clube Social, tornando-se mais tarde, como tantos então, namorados, noivos e finalmente marido e mulher, com casamento realizado na Igreja São José do Belém, seguindo a tradição de seus irmãos e irmãs.
Attilio e Wilma por sua vez, iniciaram sua própria família na década de 50, trazendo consigo os valores que aprenderam com esses italianos de personalidades tão distintas e um roteiro de vida determinado pela vizinhança naquela Vila Operária.
Emilio Vedolin nasceu em 21 de Fevereiro de 1887 na cidade de Campo San Martino, ao norte de Padova, que fica a 45km de Veneza. Sua chegada ao Porto de Santos foi registrada em 19 de Março de 1888. Visto que as viagens de navio demoravam pouco mais de um mês, podemos observar que o primeiro aniversário de Emilio aconteceu em pleno Oceano Atlântico, no vapor “Ila de Lozana”, com destino ao Brasil.
Sua mulher Corina Sacchi, que na verdade se chamava Corinda, nasceu em 05 de Outubro de 1891, na cidade de Gonzaga, província de Mantova, região da Lombardia e chegou ao Brasil em 24 de Janeiro de 1895.
Oswaldo Vedolin, sua esposa Catharina Riello, a filha Anunziata e o pequeno Emilio foram enviados a uma fazenda de café na cidade de Casa Branca, interior do estado de São Paulo. O que consta...
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Emilio Vedolin e Egydio Fagnani eram vizinhos. No início do século XX, viviam em uma Vila Operária no bairro do Belenzinho, Zona Leste da cidade de São Paulo. Ambos eram italianos, chegados ao Brasil ainda crianças e aqui constituíram suas famílias. Suas casas eram unidas por um quintal, de tal forma que as cantorias e as brigas de família podiam ser ouvidas e convenientemente esquecidas, como era de se esperar naqueles dias em que a autoridade paterna era respeitada como força de lei.
O filho mais novo de Emilio Vedolin – Attilio – e a neta caçula de Egydio Fagnani – Wilma – eram, portanto crianças próximas, e seguiram a rotina de freqüentarem a escola primária da Vila Operária, seus jardins, o Clube Social, tornando-se mais tarde, como tantos então, namorados, noivos e finalmente marido e mulher, com casamento realizado na Igreja São José do Belém, seguindo a tradição de seus irmãos e irmãs.
Attilio e Wilma por sua vez, iniciaram sua própria família na década de 50, trazendo consigo os valores que aprenderam com esses italianos de personalidades tão distintas e um roteiro de vida determinado pela vizinhança naquela Vila Operária.
Emilio Vedolin nasceu em 21 de Fevereiro de 1887 na cidade de Campo San Martino, ao norte de Padova, que fica a 45km de Veneza. Sua chegada ao Porto de Santos foi registrada em 19 de Março de 1888. Visto que as viagens de navio demoravam pouco mais de um mês, podemos observar que o primeiro aniversário de Emilio aconteceu em pleno Oceano Atlântico, no vapor “Ila de Lozana”, com destino ao Brasil.
Sua mulher Corina Sacchi, que na verdade se chamava Corinda, nasceu em 05 de Outubro de 1891, na cidade de Gonzaga, província de Mantova, região da Lombardia e chegou ao Brasil em 24 de Janeiro de 1895.
Oswaldo Vedolin, sua esposa Catharina Riello, a filha Anunziata e o pequeno Emilio foram enviados a uma fazenda de café na cidade de Casa Branca, interior do estado de São Paulo. O que consta nas histórias de família, é que após a morte de sua mãe, e o segundo casamento de seu pai, Emílio então um rapaz já voluntarioso saiu da casa paterna para viver por sua conta e risco.
Ao se casar com Corina, voltou á vida de família tão própria aos italianos, uma vez que sua jovem esposa era irmã de Lorenzo, Saide, Emma, Ida, Virgínia, Rosa e Gertrudes.
Em meados dos anos vinte, Emilio e Corina foram viver na Vila Operária Maria Zélia , porque Corina empregou-se como operária na então Companhia Nacional de Tecidos de Juta. Emilio continuou sendo motorista de carros de aluguel, na cidade de São Paulo.
As filhas Angelina e Rosa chegaram à Vila como pré-adolescentes, mas os três meninos Guerino, Oswaldo e Attilio nasceram e desfrutaram dos benefícios da creche, jardim-de-infância, farmácia, escola, tendo ao fundo um Rio Tietê imaculado.
Emílio, um homem franzino e de poucas palavras, era o chefe da casa, mas a efetiva tarefa de administrar a vida financeira da família ficava por conta de Corina. Ela fazia seu próprio macarrão, criava, matava e cozinhava galinhas, além de fabricar o pão consumido pela família.
Ele, porém maravilhava a todos com o som de seu acordeom e, sem nunca haver estudado música, era reconhecido pelas valsas, tangos e mazurcas que fazia ecoar pela vizinhança.
A Vila era cortada por seis ruas principais e quatro transversais, com casas de diferentes tamanhos, providas de janelas e portas de madeira maciça. Isso não impedia, porém que cheiros, vozes e sons se misturassem em casas e quintais tão próximos. A cooperação sempre esteve presente entre os vizinhos operários, a despeito dos pequenos dramas familiares de cada lar.
Não poderia haver personalidade mais diversa de Emilio Vedolin do que a de seu vizinho de quintal, Egydio Fagnani. Alto, forte, voz tonitruante, era um disciplinador de sua enorme prole, que foi ao longo dos anos sendo acrescida pelos filhos de uma filha. Aos cinqüenta anos, viu-se compelido a tornar-se pai de seus próprios netos.
Egydio nasceu em Lucca, cidade com a província de mesmo nome na região da Toscana, em 18 de Outubro de 1876. Chegou em Santos pouco antes dos Vedolin, em 24 de Fevereiro de 1888. Casou-se com Serafina Gianni, também nascida em Lucca, e chegada ao Brasil em 1894.
Egydio e Serafina, após passarem por vários casarões do bairro do Brás, na cidade de São Paulo, ocuparam a casa 108 da Rua 5, na Vila Maria Zélia por volta de 1933.
Como era natural nas famílias do início do século XX, tiveram muitos filhos:Júlia, Judith, América, Olga, Natalina, Norma, Íris e Oswaldo. O traço incomum porém é que Norma, Natalina e Oswaldo nasceram surdos-mudos.
Pode-se imaginar como um filho necessitando de tratamento especial seria um complicador numa família de recursos limitados. Três deles, incluindo o único varão da prole, exigiu dobrados cuidados que foram efetivamente tomados, pois todos chegaram à vida adulta perfeitamente alfabetizados.
Muito se fala sobre a acolhida que as famílias italianas dispensam a quem se mostrar necessitado. Quando a filha Judith casou-se com Carlos e, ao contrário das irmãs passou a ter uma vida nômade, Egydio e Serafina foram além da ajuda material.
Carlos, o marido de Judith tinha o ofício de pedreiro e não conseguia alimentar os inúmeros filhos que se sucediam, o que causava especial sofrimento a Serafina . Nunca era possível saber se essa filha tão meiga e apaixonada por seu marido conseguiria nutrir a si própria e à família.
Assim, quando Judith, debilitada por sucessivos partos, morreu deixando os filhos Itália, Renato, Edy, Maria, Sonia, Wilma e Mário, sendo a mais velha adolescente, e o mais novo com seis anos de idade, os avós foram aos poucos acolhendo um a um de seus netos.
A casa da Rua 5, passou então a ter outro aspecto: mais bocas para alimentar, mais pratos, copos, garfos, colocados meticulosamente à mesa já que Egydio fazia absoluta questão da família reunida às refeições. Duas meninas para cada cama, tarefas para todos, escola, piqueniques e muita música pela casa.
Não havia acordeom, mas um rádio tinha um lugar especial na sala, e através dele as notícias, os programas humorísticos e óperas chegavam aos ouvidos dos que podiam ouvir. Os surdos-mudos preferiam ir aos cinemas da Av. Celso Garcia, cujas programações diárias incluíam filmes americanos legendados. Assim conseguiam acompanhar o mundo em que o resto da família, indiferente aos obstáculos do dia-a-dia adorava estar.
A Vila Maria Zélia continuou proporcionado escola, igreja e lazer aos netos, já que os filhos casados passaram a morar nos vizinhos bairros da Mooca e Brás. Egydio, com a responsabilidade de criar tantas criaturas do sexo feminino, exercia sua autoridade de pai-avô com mão-de-ferro, o que não o impedia de ser mais do que temido, adorado pelos netos.
Serafina fazia o contraponto na imposição das regras de conduta da família, facilitando a abertura de uma providencial janela a ser pulada quando a hora combinada escapava ao controle de uma das meninas. Confiava nas netas, mas também nos filhos daquela vizinhança com padrões de vida iguais aos seus.
Durante a Segunda Grande Guerra, alguns italianos da cidade de São Paulo chegaram a ser hostilizados, o que levou Egydio a manter uma atitude mais reservada em público.
Emílio, Egydio, Corina e Serafina foram vizinhos, tiveram segredos de família involuntariamente divididos, partilharam um cotidiano de trabalho e lazer.
Assumiram a responsabilidade pelas vidas que geraram, errando, acertando e deixando seu toque pessoal em cada um.
Viveram em tempos sem tecnologia, nunca ouviram falar em psicologia, e ainda assim estiveram presentes nas vidas dos que os cercavam.
Vieram de outro país e no Brasil estabeleceram mais do que as bases de seu sustento material, pois que a simples menção de seus nomes produz, já no início do século XXI, sentimentos de gratidão e ternura que os eterniza em nossos corações.
Dedicado a Attilio Vedolin, o eterno morador
da Vila Maria Zélia.
Texto elaborado por Ieda Maria Vedolin em 2007.
Fontes:
Wilma Thomé Vedolin – Depoimento
Eduardo Viana Vedolin – Pesquisa
Archivio di Stato di Padova
Memorial do Imigrante – São Paulo
Álbum S.A.Scarpa – Cotonifício Scarpa
1926 – Fotos
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