P1 – Para começar, Ailton, eu queria que você dissesse seu nome completo, local e data de nascimento. R - Meu nome é Ailton Alves Monteiro, eu nasci em São Paulo, na capital, e nasci em 28 do 10 de 65. P1 – E quando é que você começa a trabalhar no Aché? Como é que foi isso? R - Bom, eu estava desempregado, passei um período desempregado, eu tinha trabalhado no IBGE, eu era supervisor de pesquisas no IBGE, mas como é trabalho temporário, então durou 6 meses, 6 a 7 meses, então logo eu fiquei desempregado. E estava passando por um momento super difícil. Apesar de eu ter certa experiência, muita experiência em trabalhos anteriores, só que a minha carteira tinha assim uma coisa que era, não tinha estabilidade, então assim, as empresas elas questionavam isso: “Pô, você fica muito pouco aqui, muito pouco ali...” Então assim, eu tinha passado por muitos lugares, só que pouco tempo. Então, quando eu cheguei aqui no Aché, a moça que me entrevistou, aliás virou minha grande amiga, Soraia, ela questionou isso, ela falou: “Nossa, você tem muita experiência, legal, você já trabalhou em lugares muito legais, só que, sabe, a sua carteira depõe um pouco contra você, porque a impressão que dá é que você não fica em lugar nenhum, né?” Aí eu falei: “Olha, cada um tem uma história, eu sai aqui por determinado motivo, ali por isso...”Aí ela falou que na verdade não tinha muito a intenção de me contratar, mas aí ela me deu um voto de confiança e eu comecei a trabalhar. P1 – Isso foi quando? R - Foi em 97. P1 – E você entrou para fazer o quê? R - Para trabalhar na produção, fazer uma coisa que eu nunca tinha feito na vida, trabalhar numa fábrica, entrar muito cedo, em todos os meus trabalhos anteriores eu entrava, o mais cedo era 10:00 horas da manhã, trabalhei em banco, trabalhei em um monte... Então era uma experiência totalmente nova. Acordar muito cedo,...
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P1 – Para começar, Ailton, eu queria que você dissesse seu nome completo, local e data de nascimento. R - Meu nome é Ailton Alves Monteiro, eu nasci em São Paulo, na capital, e nasci em 28 do 10 de 65. P1 – E quando é que você começa a trabalhar no Aché? Como é que foi isso? R - Bom, eu estava desempregado, passei um período desempregado, eu tinha trabalhado no IBGE, eu era supervisor de pesquisas no IBGE, mas como é trabalho temporário, então durou 6 meses, 6 a 7 meses, então logo eu fiquei desempregado. E estava passando por um momento super difícil. Apesar de eu ter certa experiência, muita experiência em trabalhos anteriores, só que a minha carteira tinha assim uma coisa que era, não tinha estabilidade, então assim, as empresas elas questionavam isso: “Pô, você fica muito pouco aqui, muito pouco ali...” Então assim, eu tinha passado por muitos lugares, só que pouco tempo. Então, quando eu cheguei aqui no Aché, a moça que me entrevistou, aliás virou minha grande amiga, Soraia, ela questionou isso, ela falou: “Nossa, você tem muita experiência, legal, você já trabalhou em lugares muito legais, só que, sabe, a sua carteira depõe um pouco contra você, porque a impressão que dá é que você não fica em lugar nenhum, né?” Aí eu falei: “Olha, cada um tem uma história, eu sai aqui por determinado motivo, ali por isso...”Aí ela falou que na verdade não tinha muito a intenção de me contratar, mas aí ela me deu um voto de confiança e eu comecei a trabalhar. P1 – Isso foi quando? R - Foi em 97. P1 – E você entrou para fazer o quê? R - Para trabalhar na produção, fazer uma coisa que eu nunca tinha feito na vida, trabalhar numa fábrica, entrar muito cedo, em todos os meus trabalhos anteriores eu entrava, o mais cedo era 10:00 horas da manhã, trabalhei em banco, trabalhei em um monte... Então era uma experiência totalmente nova. Acordar muito cedo, ficar até as cinco horas da tarde numa empresa, numa linha de produção, então assim, quando eu vi, a princípio eu me assustei para caramba, porque era uma coisa muito, sabe, mecânica mesmo, aquela coisa, tá, tá, tá. E eu falei: “Puta, não vou conseguir, não vou conseguir fazer isso.” Na primeira semana eu pensei em desistir, porque eu achava assim: “Eu nunca vou conseguir me adaptar.” Mas aí o tempo foi passando, eu fui me adaptando e... P1 – Você já está há algum tempo aqui... R - Já, já. Eu tenho cinco anos e alguns meses, já. P1 – E aí você teve uma trajetória aqui dentro, não é? Você podia contar um pouquinho que trajetória foi essa? R - Assim, mudança de... P1 – É, de função. R - Depois de seis meses lá na linha de produção, eu passei para controlador de estoque, que já não era aquela pauleira, aquela correria. Era uma coisa mais, não tão tranqüila, mas era mais tranqüila, bem mais tranqüila, eu tinha tempo de, por exemplo, eu tinha que abastecer as linhas, então assim, dependia mais de mim, era uma coisa mais autônoma, sabe, eu tinha que ir ver o que estava faltando, eu ia lá, tal, e abastecia, fiquei seis meses. Aí depois apareceu uma vaga para o almoxarifado, e eu fiz um R.I., que é um recrutamento interno da empresa, eu passei e fui para lá, e lá estou até hoje. P1 – A tua atividade hoje é auxiliar...? R - É auxiliar de almoxarifado. P1 – E hoje é um dia especial no Aché, é o dia do Fórum de Cidadania. Para você o que é ser cidadão? R - Ser cidadão... Bom, quando eu penso em cidadão penso em cidade, me vem com a convivência em grupo, você tem que conviver com outras pessoas, você tem que tornar a sua vida viável. Então assim, tanto para você quanto para outras pessoas. Então assim, você tem que fazer alguma coisa, você não pode ser cidadão e não fazer nada, você tem que fazer alguma coisa, mesmo que seja para sobreviver, para sua própria sobrevivência. Então, ser cidadão é você tentar melhorar a sua cidade, melhorar os serviços públicos... O meu celular está tocando... (INTERRUPÇÃO) P1 – Você estava dizendo que ser cidadão implica em fazer alguma coisa... R - É, em fazer alguma coisa para tentar melhorar a sua rua, começa na sua vizinhança mais próxima, então a sua rua, você quer a sua rua asfaltada, você quer a sua rua com os bueiros não entupidos. Então, para isso você não joga lixo na rua, para isso você cuida que o seu vizinho também não jogue. Aí depois vai para o seu bairro, você quer que tenha água, você quer que tenha segurança, então você quer que tenha uma delegacia próxima, e você faz alguma coisa, você se engaja num movimento de amigos de bairro, entende? Então assim, o cidadão tem que estar fazendo alguma coisa para o bem estar dele próprio, da sua família e, consequentemente, dos outros, porque assim vai para todo mundo. Então ser cidadão é participar, eu acho que é aquele cara que participa, que não fica fora, entende? “Ah, não, eu tenho...” Muitas pessoas falam: “Eu cuido da minha vida, eu cuido da minha vida, eu trabalho, não encho o saco de ninguém, não vou na casa de ninguém, não peço nada para ninguém, pago as minhas contas, fico aqui dentro da minha casa, no meu espaço.” Mas isso não é... É uma forma egoísta de pensar, porque você não sabe o que o seu vizinho está passando, as necessidades dele, a tristeza, e de repente você pode precisar dele, às vezes acontece muito isso, no meio da noite alguém passa mal, você precisa do carro dele, você precisa do telefone dele, você precisa da ajuda dele, uma conversa, então cidadania também é isso, é relacionamento entre pessoas. P1 – E você se lembra de alguma ocasião em que você realmente se sentiu assim: “Eu sou um cidadão”? R - “Eu sou um cidadão”? P1 – É, alguma situação que você vivenciou em que você se sentiu realmente um cidadão. R - Já participei de algumas coisas assim, mas não sozinho, sempre em grupo, com alguns grupos eu já... Por exemplo, uma vez, eu tenho uns amigos que nós fizemos um cadastramento de famílias carentes numa favela aqui em Guarulhos, na favela do 15 aqui, para saber as necessidades, tal, quantas pessoas moravam lá, quem estava desempregado. A gente tinha pouca coisa para oferecer, mas a gente queria assim, ver quem estava mais no sufoco para a gente tentar ajudar de alguma forma, com comida. Então nós preparamos algumas cestas e distribuímos para essas pessoas, sem fazer muito alarde, sabe? Mesmo porque se a gente chamasse muito a atenção, iria muita gente e a gente não iria poder atender a todo mundo. Então a gente: “Olha, isso aqui é para você.” Tal, algumas famílias, e foi muito legal, algumas pessoas ficaram satisfeitas. P1- E o teu trabalho de teatro aqui no Aché? (risos) Você acha que não contribui para esse trabalho? R - Ah, com certeza, o meu trabalho... Por exemplo, nós fizemos uma peça aqui, foi adaptada... O meu professor de teatro adaptou um poema, dramatizou um poema do Carlos Drummond de Andrade, “José”. Ele fez uma coisa rapidinha, de quinze minutos, tal. Aí a gente precisava falar sobre desperdício de água, desperdício de energia, sobre ser cidadão mesmo, lixo, essas coisas. E aí eu peguei e adaptei, dei uma readaptada e estiquei, transformei numa coisa. Aí a gente fez um grande musical, fez um musical, uma coisa que as pessoas riam no começo e depois se emocionavam, porque mostrava, todo mundo se enxergava um pouco sendo meio José, os personagens eram todos Josés. E assim, antes de trazer para o Aché nós apresentamos no Bosque Maia, quer dizer, foi para a comunidade mesmo, as pessoas lá que a gente nem conhecia, não sabia de nada. E as pessoas ficaram muito impactadas, sabe, ficaram impressionadas mesmo. A gente ouvia comentários assim, sabe: “Ah, é assim mesmo na minha casa...” “Eu não vou mais fazer isso, agora eu vou fechar a torneira quando eu fizer a barba, agora eu vou....” Sabe? Então assim, a gente se sentia muito bem, muito bem, podendo passar uma mensagem sem pregar, sem falar: “Olha, vocês... não sei o quê...” Sabe, porque às vezes as pessoas não querem ouvir isso, então através da arte sensibilizar as pessoas de uma forma natural, suave, tal. E aqui no Aché aconteceu isso, até hoje. Muitas vezes no vestiário um cara está lá, esquece a torneira aberta, o outro grita e fala: “Ô José, fecha essa torneira, ô meu” Então é uma coisa que... P1 – Você vê o resultado, não é? R - O resultado, nós vimos resultado. O teatro é uma coisa que, é uma forma de comunicação muito legal que mexe com as pessoas. Mesmo quem, a maioria das pessoas fala: “Ah, eu não gosto de teatro, detesto teatro.” Mas nunca foi ao teatro. Aí a primeira vez que tem um contato fica, não sabe direito o que é aquilo: “Nossa, que coisa estranha...” Mas mexe, é uma coisa muito legal. Eu tenho tido experiências assim, veio um amigo meu outro dia, ele ficou muito emocionado, muito emocionado mesmo, e me agradeceu muito, falou: “Cara, eu nunca vi uma coisa dessa” Legal, né? P1 – Muito bom. E, por fim, Ailton, a gente podia ficar conversando por mais tempo, mas a proposta é que ela seja mais curtinha mesmo, eu queria saber o que você achou de ter contado um pouquinho da tua história? R - Achei legal, achei muito legal. Eu acho que, apesar de que aqui tem pessoas que têm 30 anos, 35 anos, às vezes eu fico pensando: “Puxa vida, quanto tempo.” Essas pessoas viram tudo aqui, eu fico imaginando como era, porque quando eu entrei aqui esse prédio não existia, esse prédio onde nós estamos não existia, então eu fico pensando como era antes, 30 anos antes? Não era nada disso aqui, era um terreno, sei lá, brejo como tantos outros que têm aqui, vizinhos. Então eu fico pensando: “Mas eu faço parte da história, também.” Não sei o que vai acontecer comigo, meu futuro aqui dentro, mas assim, eu faço parte, eu passei por aqui. Então, as pessoas, alguém vai falar: “Ele passou por aqui.” P1 – E marcou, não é? R - É, de alguma forma, espero que de uma forma positiva. Mas é uma empresa que eu gosto muito, me ajudou muito num momento muito importante da minha vida, porque assim, sabe quando você precisa de um norte, precisa de um rumo? E a Soraia falou: “Ah, você não pára em lugar nenhum.” Parei. (risos) Cinco anos, legal. P1 – Que bom. Muito obrigada, viu? R - Imagina, obrigado eu.
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