No nosso tempo de criança, as coisas eram bem singelas. Nossos vizinhos da mercearia mantinham a tradição: faziam uma fogueira bem alta no meio do Largo da Batalha; soltavam balões muito grandes e muito coloridos, que levavam um tempão para encher e subir, e exigiam que alguém subisse no muro ...Continuar leitura
No nosso tempo de criança, as coisas eram bem singelas. Nossos vizinhos da mercearia mantinham a tradição: faziam uma fogueira bem alta no meio do Largo da Batalha; soltavam balões muito grandes e muito coloridos, que levavam um tempão para encher e subir, e exigiam que alguém subisse no muro para soltá-los. Uma mesa na calçada, com pipocas e paçoca, e um panelão de quentão completavam a noite. O nosso pai comprava fogos, estrelinhas, rojões, vulcão, buscapé. Era uma coisa mágica: as fagulhas da fogueira, o frio do sereno, os fogos de artifício tão pobrezinhos. Quase nada comparados à pirotecnia das festas de hoje Tudo muito autêntico e feito em casa.
Com a construção da Igreja de Santo Ivo, vieram as quermesses no largo, obra de Frei Casto e suas beatas, para angariar fundos. Foi a vez da festa junina com barracas, prendas e muitas paqueras com o correio elegante
E havia também as festas juninas no clube Ipê, do qual éramos sócios.
Mas inesquecível mesmo, para mim, foi uma festa junina da escolinha do Ipê, que vou contar agora.
Meu irmão Armando estudava lá. Devia estar com 6 anos. A Silvana já estava no Dante, no 1º ano primário, e eu, a mais velha, no 3º.
A Dona Iná, professora do meu irmão, organizava lindas festas – e nas juninas se esmerava. Quadrilha e casamento na roça, tudo completinho. Não podia faltar nada. Mas, naquele ano, faltou. Faltou gente para dançar. Um garoto ficara sem par, e ela pediu à minha mãe que me “emprestasse” para a quadrilha. A Silvana também deve ter sido emprestada, não me lembro.
Achei ruim dançar com um pirralho numa festinha boba de pirralhos do Jardim de Infância, afinal, eu já tinha 9 anos
Desnecessário dizer que não fui consultada. Assim, mesmo a contra gosto, e principalmente devido à falta de alternativa, fui. Toda vestida de caipira, de trancinhas e tudo, me achando uma nerd (que na época se chamava “bolha”).
Chega a hora da quadrilha: todos a postos, aguardando a música. O sanfoneiro ataca, e lá vamos nós, dançando. Eu com meu par, um baixinho que me batia no queixo, num baita mau humor.
E vai no caminho da roça Olha a cobra Olha a chuva Balancê Le dancê De repente, a tragédia Meu parceiro, no auge da empolgação, perde as calças no meio do salão e sai chorando para o colo da mãe
E eu acabei a quadrilha dançando sozinha. Literalmente.Recolher