Sonhei que tinha uma grande ferida em minha perna, na região da coxa, uma ferida aberta, bem característica de úlceras profundas. Eu corria em alguma movimentação estranha com uma aglomeração muito grande de pessoas que também corriam, mas, aparentemente, exceto eu todos pareciam tranquilos, conversavam normalmente. Eu procurava minha namorada para tentar contá-la sobre a ferida, preocupada e sem me lembrar como ela havia se formado, mas quando eu a encontrava ela me dizia com tom de obviedade que eu mesma é que devia cuidá-la. A partir de então eu passava a buscar pelos materiais para cuidar da lesão, mas sabia que naquele contexto não haviam materiais, e sem eles, eu provavelmente perderia minha perna. A sensação de desespero era resolver sozinha algo que dependia de materiais que não estavam ali. Não me lembro de como terminou após esse momento.
Que associações você faz entre seu sonho e o momento de pandemia?
Sou enfermeira e um dos maiores desafios da minha carreira sempre foi aprender a cuidar de feridas grandes que é algo que eu não gosto mas preciso aprender. Em um momento em que me sinto impotente, correndo para todos os lados em busca de ajuda, ter de resolver algo que tenho limitações práticas sozinha e sem materiais me relacionou muito com o sentimento que venho sentindo como profissional nesta pandemia. Um sentimento de solidão em meio ao caos, em que algumas pessoas agem com certa normalidade e banalização dos fatos, e sem suporte, sem materiais de proteção, com risco de perder entes queridos. É como a ferida aberta em minha perna do sonho.